Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00481/22.1BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/13/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL- NULIDADE DA SENTENÇA-FALTA DE INTERESSE EM AGIR;
CASO JULGADO-INADEQUAÇÃO DO MEIO PROCESSUAL;
CAUSA DE NÃO ADJUDICAÇÃO ( ART.º 79.º, N.º1 DO CCP);
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo:

I. RELATÓRIO
TU..., LDA. com sede na Avenida ..., ... ..., TJ..., LDA., com sede na Rua ..., ... ..., e TM..., S.A. com sede na Rua ..., … , ... ..., moveram a presente ação de contencioso pré-contratual contra a ÁREA METROPOLITANA DO PORTO (doravante entidade demandada, R., ou AMP), com sede na Palácio dos Correios – Rua do Estêvão, 21, 4000-200, Porto.
Foram indicadas como contrainteressadas, as seguintes empresas:
TE..., LDA., Rua ..., ... ..., ...;
TN..., S.L., sociedade incorporada de acordo com as Leis Espanholas, com sede em Calle ..., ..., ..., ... / Sucursal em Portugal, na Rua ..., ..., ... ...;
TM... SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA., Praça ..., ...;
TA..., LDA., Avenida ... …, ... e TL..., LDA., Rua ... – CC..., ... ... (concorrentes em Agrupamento);
TB..., LDA., Rua ..., ... ...; e TF..., LDA., Avenida ..., ... ..., ... (concorrentes em Agrupamento);
TO..., com sede na Rua ..., ..., ..., ..., ...; e TX..., S.A., com sede na Rua ..., 1, 8ª Pl, ..., ..., ... (concorrentes em Agrupamento).
As Autoras formularam os seguintes pedidos:
a) A anulação do ato de adjudicação;
b) A condenação da Ré a substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede,
Subsidiariamente a b):
c) Ser determinado o reinício do procedimento adjudicatório, com nova aprovação das peças do procedimento e a fixação de um novo prazo para a apresentação de propostas, anulando-se, neste caso, todos os atos praticados na e a partir da fase de apresentação de propostas;
d) Ainda subsidiariamente, ser determinada a exclusão da proposta do agrupamento concorrente TB..., Lda. e TF..., Lda..
Como fundamento da sua pretensão alegam, em síntese, que a proposta das CI TB..., Lda. e TF..., Lda. deveria ter sido excluída porquanto consubstancia uma proposta de preço ou custo anormalmente baixo, nos termos dos requisitos de ordem material impostos pelas alíneas e) e f) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, e, no limite viola regras da concorrência, nos termos no disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP.
Ademais, a AMP não poderia ter procedido à adjudicação antes de ser proferida decisão pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo 1973/20.2BEPRT, no qual foi declarada a ilegalidade da cláusula 53º, n.º 3, alínea i), n.º 4 alínea m), e n.º 5 alínea n) do caderno de encargos, e que determinou que as referências deverão, em conformidade, ser expurgadas das respetivas peças procedimentais, com as legais consequências;
O ato de adjudicação é ainda ilegal, por violar o n.º 10 do artigo 285.º do Código do Trabalho, imediatamente aplicável ao Concurso por força da Lei n.º 18/2021 de 8 de abril de 2021;
Ademais, desde a apresentação das propostas até à data da decisão de adjudicação, verificou-se uma grande alteração das circunstâncias, que deveria implicar o lançamento de novo concurso, concretamente os efeitos da Covid-19 e todos os seus confinamentos, que levaram a uma forte redução da procura e a um brutal aumento dos custos de manutenção da frota, aquisição de novos equipamentos, custos com pessoal e, sobretudo, dos encargos com custos de energia e combustível, agravados com a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Foi proferido despacho que determinou às AA. o aperfeiçoamento da petição inicial nos seguintes termos:
a. No que se reporta aos pedidos formulados, clarificando se pretendem impugnar o ato de adjudicação apenas quanto ao lote 4 ou relativamente a todos os autos e se pretendem a condenação da ED a proferir decisão de não adjudicação ou a retomar o procedimento concursal apenas quanto ao Lote 4 ou relativamente a todos os Lotes;
b. Em conformidade com a resposta a procederem à cabal identificação dos contrainteressados;
c. Em conformidade com a resposta a a. clarificarem o seu interesse em agir.
d. Esclarecerem o valor atribuído à causa.
As AA. apresentaram requerimento, esclarecendo, designadamente que “optam por circunscrever os pedidos relativos ao ato de adjudicação aos seguintes: à impugnação do ato de adjudicação apenas na parte correspondente ao Lote 4 e, bem assim, à condenação da Entidade Demandada a proferir decisão de não adjudicação ou a retomar o procedimento concursal, apenas quanto ao Lote 4, com nova aprovação das peças do procedimento – se expurgadas das normas ilegais e se adaptadas aos novos pressupostos económico-financeiros – e com a fixação de um novo prazo para a apresentação de propostas, anulando-se, neste caso, todos os atos praticados na e a partir da fase de apresentação de propostas” e identificando como contrainteressados: (i)TB..., LDA., com sede na Rua ..., ... ...; (ii)TF..., LDA., com sede na Avenida ..., ... ..., ...; (iii)TO..., com sede na Rua ..., ..., ..., ..., ...; (iv) TX..., S.A., com sede na Rua ..., 1, 8ª Pl, ..., ..., ...; (v) TS..., LDA., com sede na Rua ..., ... ....
Quanto ao interesse em agir invocam que o mesmo resulta de a proposta apresentada incorrer no vício de preço anormalmente baixo e também porque as AA. entendem que o procedimento deve ser anulado, devendo ser aberta a possibilidade de apresentação de novas propostas, consonantes com a extraordinária e manifesta alteração das circunstâncias – tendo as AA. interesse em apresentar nova proposta (pelo menos) ao Lote 4.
Apresentaram p.i. aperfeiçoada na qual peticionam:
a) A anulação do Ato de adjudicação no Lote 4 – e a anulação do subsequente contrato, prevenindo a hipótese de ter sido, entretanto, celebrado;
b) A condenação da Ré a substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede em relação ao Lote 4,
Subsidiariamente a b):
c) Ser determinado o reinício do procedimento adjudicatório relativo ao Lote 4, com nova aprovação das peças do procedimento – se expurgadas das supra referidas normas ilegais e se adaptadas aos novos pressupostos económico- financeiros – e a fixação de um novo prazo para a apresentação de propostas, anulando-se, neste caso, todos os atos praticados na e a partir da fase de apresentação de propostas;
Ainda subsidiariamente, pediram que seja determinada a exclusão da proposta do agrupamento concorrente TB... Lda. e TF... Lda.
Foi proferido despacho que admitiu liminarmente a petição inicial com a advertência do art. 103.º-A n.º 1 do CPTA.
As AA. juntaram um parecer aos autos.
A TF... Lda. e a TB..., Lda. solicitaram a apensação a estes autos do processo 484/22.6BEPRT.
As AA. pronunciaram-se sobre o pedido de apensação.
A Área Metropolitana do Porto contestou pugnando pela procedência das exceções invocadas e pela improcedência da ação.
As contrainteressadas, TB..., Lda. e TF..., Lda. contestaram pugnando pela procedência das exceções invocadas e pela improcedência da ação.
Proferiu-se despacho pelo qual foi indeferido o pedido de apensação aos autos do processo 484/22.6BEPRT.
A TX..., S.A. e TO... apresentaram contestação pugnando pela procedência da matéria de exceção e pela improcedência da ação.
As AA. apresentaram réplica pugnando pela improcedência das exceções, sustentando, que detêm interesse em agir quanto ao lote 4 e aos demais lotes, que não ocorre a violação do caso julgado respeitante ao problema dos trabalhadores de toda a área geográfica da AMP no âmbito do serviço ora adjudicado a novas empresas, nem quanto à alteração das circunstâncias.
As AA. apresentaram articulado superveniente aduzindo que, na pendência dos autos foi proferido o Ac. do STA julgando improcedente o recurso interposto da decisão proferida no processo 1973/20.2BEPRT, mantendo a declaração de ilegalidade das disposições da Cláusula 53.ª [n.º 3 alínea i), n.º 4 alínea m), e n.º 5 alínea n)] do Caderno de Encargos do Concurso Público, atinente às sanções contratuais pecuniárias, o que determina a invalidade/anulação do ato de adjudicação em crise nos autos.
A ED deduziu incidente de levantamento do efeito suspensivo automático.
A AMP pronunciou-se sobre o articulado superveniente defendendo a sua inadmissibilidade, e , bem assim, que é manifesta a irrelevância que resultaria para a escolha de concorrente e para o conteúdo das propostas da procedência do vício apontado à cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos.
Nenhum operador deixou de apresentar proposta com fundamento no conteúdo da cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos, nem o conteúdo das propostas apresentadas foi minimamente condicionado por tal conteúdo;
O expurgo do Caderno de Encargos daquelas disposições não conduz a uma alteração de aspeto fundamental do Caderno de Encargos
Nos termos do art. 285.º, n.º 3 do CCP sempre poderá o Caderno de Encargos e o contrato manter-se, operando-se a redução quanto às disposições em causa, sem que daí resulte qualquer dano para a concorrência ou para os demais interesses invocados pelas Autoras, pois não está em causa um dos elementos essenciais do contrato, elencados no artigo 96.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos, mas disposições meramente acessórias.
A existir algum impacto sobre as propostas resultante da invalidade da cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos, tal suposto impacto ocorre sobre todas as propostas em termos idênticos, e não apenas sobre a proposta das autoras, sendo, a essa luz, evidente que a ordenação das propostas nunca se teria alterado em razão desse ajustamento.
A ED apresentou requerimento, pronunciando-se sobre a réplica pugnando que seja dada por não escrita a matéria contida nos artigos 159.º a 185.º da réplica; seja julgado improcedente o novo vício invocado nos artigos 152.º a 158.º da réplica, porquanto não se impunha a notificação da atualização do EVEF pois não integra a decisão de contratar e a validade e eficácia da decisão de adjudicação não dependem da prévia ou posterior notificação da atualização do estudo de viabilidade económico-financeira.
As AA. responderam ao incidente de levantamento do efeito suspensivo.
A ED apresentou requerimento.
Foi proferido despacho dando como não escritos os pontos 160.º a 194.º da réplica, considerando-se admissível o articulado superveniente e inadmissível o requerimento da ED de 17.6.2022.
As AA. apresentaram requerimento a pugnar pelo desentranhamento da resposta à réplica, pronunciando-se sobre o pedido de desentranhamento do seu articulado e sobre a alegada inadmissibilidade do seu articulado superveniente.
A ED pronunciou-se sobre o requerimento das AA. de serem dados por não escritos artigos da sua resposta ao articulado superveniente.
Foi proferido despacho que julgou improcedente o pedido de desentranhamento da resposta à réplica e, bem assim, quanto a serem dados como não escritos os pontos 25.º a 65.º e 97.º a 126.º da resposta ao articulado superveniente, dando-se como não escritos os artigos 9.º a 14.º, 15.º a 22.º, 45.º a 60.º e 94.º a 101.º do requerimento das AA. de 20.6.2022 e, bem assim, os pontos 21.º a 25.º do requerimento de 24.6.2022 da R..
Realizou-se diligência de prova no âmbito do incidente e proferiu-se decisão que julgou procedente o incidente do levantamento do efeito suspensivo automático.
As partes apresentaram requerimentos.
Considerando que os autos já dispõem dos elementos necessários, sem necessidade de maiores indagações ou de realização de diligências de prova adicionais, para conhecer dos pedidos formulados, proferiu-se despacho a julgar desnecessária a produção de prova pericial e testemunhal requerida pelas AA., entidade demandada e contrainteressadas, indeferiu-se os requerimentos de prova, nos termos do art. 90.º, n.º 3 do CPTA.
Dispensou-se a realização da audiência prévia.
Fixou-se o valor da causa em € 59.790.269 (cinquenta e nove milhões setecentos e noventa mil e duzentos e sessenta e nove euros).
Seguidamente, proferiu-se sentença da qual consta o seguinte segmento decisório:
«Nestes termos, e pelas razões aduzidas, julga-se
a. Procedente a exceção de falta de interesse em agir e, em consequência, absolve-se a R. e contrainteressadas da instância no que respeita aos pedidos de (i) condenação da Ré a substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede em relação ao Lote 4 e de (ii) anulação do ato de adjudicação de lote 4 e, consequentemente, do contrato, com fundamento na verificação da(s) causa(s) de exclusão prevista(s) nas alíneas e), f) e g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP da proposta das CI, TB... e TF..., Lda., e exclusão da proposta do agrupamento concorrente/adjudicatário;
b. Procedente a exceção de caso julgado e, em consequência, absolve-se a R. e contrainteressadas da instância, no que respeita às pretensões de anulação do ato de adjudicação do lote 4 e do correspondente contrato, e de anulação do procedimento concursal e seu reinício, com nova aprovação das peças do procedimento e a fixação de um novo prazo para a apresentação de propostas, tendo como fundamentos (i) a falta de disponibilização de informações sobre o número e o regime dos trabalhadores afetos à atividade, alegadamente em violação do art. 285.º, n.º 10 do CT e (ii) a verificação de causa de não adjudicação prevista no art. 79.º, n.º 1 do CCP fundada na redução da procura, aumento dos custos de manutenção da frota, aquisição de novos equipamentos, custos com pessoal e encargos com custos de energia e combustível, emergente dos efeitos da Covid-19 e confinamentos;
c. Procedente a exceção dilatória inominada de inadequação do meio processual e, em consequência, absolve-se a Entidade Demandada e contrainteressadas, quanto às pretensões de anulação do ato de adjudicação do lote 4 e do correspondente contrato, e de anulação do procedimento concursal e seu reinício, com nova aprovação das peças do procedimento e a fixação de um novo prazo para a apresentação de propostas, com fundamento no julgado proferido nos processos 1973/20.2BEPRT e apensos;
d. Improcedente, quanto ao mais, a ação.
Vencidas na causa são as AA. responsáveis pelas custas (cfr. artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º do CPTA, artigo 7.º, n.º 1 da tabela II-A do RCP).
Notifique.»

Inconformadas com a sentença proferida, as Autoras interpuserem o presente recurso de apelação que concluíram nos seguintes termos:
«A. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, nos autos em epígrafe, que julgou improcedente a ação intentada pelas AA. (aqui Recorrentes), a propósito de várias invalidades/ilegalidades assacadas ao Ato de adjudicação do “Concurso Público para a Aquisição do Serviço Público de Transporte Rodoviário de Passageiros na Área Metropolitana do Porto”, na sua maioria, por procedência de exceções dilatórias;
Tendo, em consequência, absolvido a Ré “ÁREA METROPOLITANA DO PORTO” (doravante “AMP”) e as contrainteressadas (todas aqui Recorridas) da instância e, quanto ao restante (de mérito), julgado improcedente a ação.
B. O que está em causa no presente Recurso são, por isso, as exceções dilatórias julgadas procedentes pelo Tribunal a quo:
(a) exceção de falta de interesse em agir (quanto ao exposto entre os artigos 3.º a 78.º da petição inicial aperfeiçoada e nas alíneas b) e d) do petitório das AA.),
(b) exceção de caso julgado (quanto ao exposto entre os artigos 84.º a 91.º e 93.º da petição inicial aperfeiçoada),
(c) exceção dilatória inominada de inadequação do meio processual (quanto ao exposto entre os artigos 79.º a 83.º da petição inicial aperfeiçoada e no articulado superveniente das AA.),
C. Bem como, consequentemente, as invalidades /ilegalidades assacadas pelas AA. ao Ato de adjudicação as quais o Tribunal a quo não chegou a conhecer, obstado pelas exceções dilatórias que julgou procedentes:
(i) A verificação de causas de exclusão, previstas nas alíneas e), f) e g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, da proposta das contrainteressadas/ agrupamento concorrente/adjudicatário do lote 4, “TB..., Lda.” e “TF..., Lda.”,
(ii) A violação do artigo 285.º n.º 10 do Código do Trabalho,
(iii) A verificação de causas de não adjudicação, previstas no artigo 79.º, n.º 1, alíneas c) e d), do CCP, emergentes da alteração das circunstâncias, por força dos efeitos emergentes da situação de Pandemia Covid-19,
(iv) A ilegalidade da Cláusula 53ª, n.º 3 alínea i), n.º 4 alínea m), e n.º 5 alínea n), do Caderno de Encargos do Concurso Público em crise, julgada (e transitada em julgado) pelo TAF do Porto, e confirmada pelos TCA Norte e STA, sob o processo n.º 1973/20.2BEPRT e apensos, impressa no Ato de Adjudicação,
D. E as restantes invalidades/ilegalidades do Ato de adjudicação em crise, apreciadas mas julgadas improcedentes pelo Tribunal a quo:
(v) A verificação de causas de não adjudicação, previstas no artigo 79.º, n.º 1, alíneas c) e d), do CCP, emergentes da profunda alteração das circunstâncias atinentes às bases económico-financeiras subjacentes à decisão de contratar e à definição da regulação da execução contratual estabelecida no Caderno de Encargos e, por conseguinte, das bases económico-financeiras de que partiram os concorrentes aquando da apresentação das propostas, adveniente da superveniente e imprevista crise energética pelo impacto da invasão da Ucrânia pela Rússia, concretizada sobretudo no aumento dos preços dos combustíveis.
E. E, ainda, as peticionadas consequências de tais invalidades / ilegalidades igualmente julgadas improcedentes pelo Tribunal a quo:
a) A anulação do Ato de adjudicação no Lote 4 e a anulação do correspondente contrato (prevenindo a hipótese de ter sido, entretanto, celebrado),
b) A condenação da Ré em substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede em relação ao Lote 4, ou, subsidiariamente a b),
c) A condenação da Ré ao reinício do procedimento concursal em relação ao Lote 4, com nova aprovação das peças do procedimento – se expurgadas das normas ilegais e se adaptadas aos novos pressupostos económico-financeiros – e a fixação de um novo prazo para a apresentação de propostas, anulando-se, neste caso, todos os atos praticados na e a partir da fase de apresentação de propostas,
Ainda subsidiariamente,
d) A exclusão da proposta do agrupamento concorrente/adjudicatário do lote 4, “TB..., Lda.” e “TF..., Lda.”.
(Cf. petitório da petição inicial aperfeiçoada das AA.)
F. As Recorrentes não se conformam com o decidido na sentença recorrida, porquanto a mesma enferma de erro de julgamento quanto aos vícios alegados e imputados ao Ato de adjudicação, por força de uma errónea qualificação dos factos e de uma incorreta interpretação e aplicação do direito.
G. E ademais, desde logo, padece de nulidade, nos termos do previsto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC no que toca ao concreto segmento decisório de (exceção de) falta de interesse em agir das AA. sobre a alínea b) do seu petitório/pedido a título principal (cf. petição inicial aperfeiçoada), uma vez que se constata certa ambiguidade e incoerência que resultam numa oposição entre os fundamentos e o decidido.
H. Primeiramente, resulta que a sentença recorrida é parcialmente nula: porque do segmento decisório de (exceção de) falta de interesse em agir das AA. sobre a alínea b) do seu petitório/pedido a título principal (cf. petição inicial aperfeiçoada), resulta uma clara contradição entre a decisão contida na sentença recorrida e a sua fundamentação – constante da pág. 189 ao 5.º parágrafo da pág. 197 e de a.(i) da pág. 224 da sentença recorrida.
Assim é porquanto o raciocínio da Mm.ª Juiz aponta num sentido e, no entanto, decide em sentido oposto, veja-se:
H.1. Peticionaram as AA. (aqui Recorrentes), a título principal e na sequência do primeiro pedido de anulação do Ato de adjudicação (do Lote 4 a Concurso), a condenação da Ré a substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede em relação ao Lote 4 (que corresponde ao pedido formulado em b) da petição inicial aperfeiçoada).
H.2. Foi precisamente quanto ao peticionado a título principal pelas AA. em b) que o Tribunal a quo julgou pela falta de interesse em agir das AA., para tanto utilizando o fundamento de que “as AA., em primeira linha (quanto a b)), apenas pretendem a remoção da ordem jurídica, ou como sustentam a ED e as contrainteressadas, a destruição do procedimento concursal” […] “Isto é, pretendem que o efeito reconstitutivo da anulação do ato de adjudicação (e do contrato) se reconduza, apenas e só, à não adjudicação com a inerente eliminação do procedimento concursal e, só subsidiariamente, no caso de improcedência, é que pugnam pela abertura de um novo procedimento concursal, ao qual poderão apresentar nova proposta.”
“Considerando o exposto, não há que fazer assentar o interesse em agir das AA. quanto ao pedido formulado em b) num efeito que não foi por elas pretendido, qual seja o de haver lugar a um novo procedimento concursal (ou reinício do concurso em causa nos autos) ao qual poderão apresentar proposta.”
Na realidade a possibilidade de apresentar nova proposta num novo procedimento apenas existe relativamente à pretensão deduzida (subsidiariamente) em c) do petitório.”
H.3. Entendendo, deste modo, o Tribunal a quo que só haveria interesse em agir no pedido das AA. (subsidiário) de condenação ao reinício (ao invés da anulação) do procedimento concursal, porque apenas com o reinício não se pretende a destruição do concurso e nem a manutenção eterna do status das AA. de operadoras de parte daquele serviço da AMP ao abrigo de autorizações provisórias.
H.4. Sucede que no cenário da anulação do Concurso (cf. b) do petitório), é consequência lógica e forçosa o lançamento/abertura de um novo Concurso até 15 de novembro de 2023: porque é consabido que a lei o impõe [Regulamento (CE) 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de outubro de 2007 e Lei n.º 52/2015 de 9 de junho], sendo inevitável a caducidade das autorizações provisórias sob as quais as AA. prestam atualmente aquele serviço na AMP, as quais vigorarão somente até tal data, para as atuais incumbentes/operadoras de todas as “parcelas” do serviço público objeto do Concurso (o que inclui, logicamente, a região geográfica do Lote 4 que é objeto destes autos).
H.5. Pelo que o pedido de lançamento de um novo concurso na sequência da anulação peticionada pelas AA. não era necessário para se assentar o seu interesse em agir, mas apenas redundante, porquanto o lançamento de um novo concurso é, in casu, efeito/consequência certo e obrigatório (não eventual, facultativo ou meramente hipotético) da anulação do presente (concurso).
H.6. Desta feita, é, precisamente, desta parte da fundamentação da sentença recorrida que emergem as ambiguidades e obscuridades que culminam numa clara oposição em relação à decisão tomada afinal, uma vez que o Tribunal a quo também fundamenta e admite, em simultâneo, que:
o procedimento concursal em causa nos autos tem como objetivo a legalização da exploração do serviço de transportes públicos assente num procedimento adjudicatório conforme aos princípios gerais de contratação pública e a conformação com as imposições que para o Estado Português emergem do ordenamento jurídico comunitário”,
por força, pois, da “Lei n.º 52/2015 – que aprovou o Regime Jurídico do Serviço Público do Transporte de Passageiros regulando o acesso e a exploração do serviço público de transporte de passageiros (…) [que] tem subjacente o Regulamento (CE) 1370/2007, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, entrado em vigor 3.12.2009, que tem como objetivo a regulação do mercado de transportes públicos assente em procedimentos de adjudicação transparentes, equitativos e concorrenciais (art. 5.º) e que previu um período de transição de 10 anos, exigindo que a adjudicação de contratos de serviço público de transporte ferroviário e rodoviário deve dar cumprimento ao disposto no Regulamento a partir de 3 de Dezembro de 2019 (art. 8.º, n.º 2)”.
Chegando o Tribunal a quo até mesmo a referir ser inegável que, por um lado, considerando as obrigações que emergem do Regulamento (CE) 1370/2007, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, que impõe que a adjudicação de contratos de serviço público de transporte ferroviário e rodoviário deve dar cumprimento ao disposto no Regulamento a partir de 3 de dezembro de 2019 (…) e, por outro, que atualmente o mercado de transportes coletivos na Área Metropolitana do Porto não obedece a tais exigências legais, assentando em autorizações provisórias cujo limite é 3.12.2023, que a entidade adjudicante não perdeu o interesse em contratar subjacente à decisão de contratar tomada”.
H.7. Ao que se soma a obscuridade constante da fundamentação do Tribunal a quo, quando insiste em assumir que as AA. assentaram o seu interesse em agir no facto de deterem atualmente autorizações provisórias sob as quais prestam atualmente aquele serviço na AMP constituindo tal facto como a vantagem/utilidade pretendida pelas AA. a retirar da ação; ao passo que, na verdade, se por um lado, não resulta de escrito algum das AA. nos autos a referida “associação” ou “nexo”, por outro lado, cf. já se viu, o próprio Tribunal a quo expõe que a destruição in limine do procedimento concursal e a (consequente) manutenção ad eternum um status quo das AA. (que, reitere-se, não foi peticionada nem resulta do petitório das AA.) é juridicamente impossível.
H.8. Com efeito, a própria exposição e conclusões do Tribunal a quo a propósito das exigências legais que emergem da Lei 52/2015 e do ordenamento jurídico comunitário nem lhe permitiam tal “dedução” nem tampouco a conclusão pela falta de interesse em agir das AA. na pretensão em b) do petitório aperfeiçoado.
H.9. Deste modo, se a possibilidade de apresentar nova proposta foi reconhecida pelo Tribunal a quo como facto constitutivo da existência do interesse em agir das AA. e o Tribunal a quo desenvolveu a sua fundamentação no sentido de que tal facto resulta também como reflexo do b) do petitório das AA. – por força da legalização da exploração do serviço de transportes públicos na AMP, imposta pela lei nacional e comunitária,
H.10. Pelo que quer a título subsidiário (alínea do c) do petitório) quer a título principal (alínea do b) do petitório) se permite assentar o interesse em agir das AA., porquanto a utilidade/vantagem a retirar é a mesma:
a apresentação de nova proposta, seja no âmbito do novo concurso a lançar obrigatoriamente in casu de anulação/destruição deste, seja no âmbito do mesmo concurso reiniciado/retrocedido, cf. resulta inequivocamente da fundamentação do Tribunal a quo.
H.11. Assim, ao passo que o discurso fundamentador do Tribunal a quo expresso na sentença está direcionado no sentido de que o resultado prático e necessário do peticionado em b) e em c) do petitório das AA. é igual, não pode reconhecer interesse em agir das AA. apenas quanto a um destes pedidos…
O que constitui, por conseguinte, ambiguidade, obscuridade e oposição entre os fundamentos explanados na sentença (págs. 189-196) e a decisão tomada a final acrescida da conclusão por abuso de direito das AA. (1.º ao 5.º parágrafo da pág. 197 da sentença recorrida).
H.12. Adicional e consequentemente, também será nula a parte do segmento decisório no qual o Tribunal a quo suprime o direito das AA. a fazerem valer em juízo a pretensão deduzida em b) do petitório com base no abuso de direito,
H.13. Porque se a pretensão de reinício do mesmo procedimento concursal (alínea c) do petitório) constitui exercício normal e legítimo do direito pelas AA., a pretensão de não adjudicação com consequente anulação do presente procedimento concursal (alínea b) do petitório) nunca poderá constituir atuação anormal ou ilegítima das AA.; na medida em que ficou demonstrado que o objetivo com o qual foi (e é) peticionada a referida anulação do presente procedimento concursal não é o da manutenção ad eternum de um status quo que sabem só existe provisoriamente, mas é sim o da possibilidade de apresentação de nova proposta (como em c), mas num novo concurso obrigatoriamente a lançar).
H.14. Assim, ao pretender o pedido, quer em c) quer em b), as AA. visam, de todo o modo, a reposição da legalidade e da concorrência, pelo que o Tribunal a quo incorre em nulidade ou em erro de julgamento ao concluir pelo exercício abusivo do direito pelas AA. na pretensão formulada em b) do petitório aperfeiçoado, cf. parágrafos 1.º a 5.º da pág. 197 da sentença recorrida.
H.15. É de sublinhar que “[a] oposição entre os fundamentos e a decisão corresponde a um vício lógico”, “se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/05/2021, proc. 69/11.2TBPPS.C1.S1); “[a] nulidade da sentença prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. c), do Código de Processo Civil pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la.
Ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03/03/2021, proc. 3157/17.8T8VFX.L1.S1).
H.16. A final, por violação do princípio da coerência lógica da sentença, é (parcialmente) nula a sentença proferida, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, porquanto determina que é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
H.17. Devendo, com o máximo respeito devido, ser (parcialmente) anulada no que respeita ao julgamento de abuso de direito e de falta de interesse em agir quanto a alínea b) do petitório das AA., por força da constante ambiguidade, obscuridade e oposição entre o discurso fundamentador na sentença (págs. 189-196) e o decidido (1.º ao 5.º parágrafo da pág. 197 e a.(i) da pág. 224 da sentença recorrida) – o que se Requer.
I. Quanto aos erros de julgamento do Tribunal a quo, estes começam pela inexistência de exceções dilatórias, que foram erradamente julgadas procedentes.
J. A respeito do interesse em agir na alínea b) do petitório das AA.: caso não se entenda pela nulidade parcial da sentença (cf. artigo 615.º n.º 1 alínea c) do CPC) -o que apenas se concebe a benefício do raciocínio-, a procedência da exceção de falta de interesse em agir sempre constituirá um erro de julgamento do Tribunal a quo.
J.1. E assim é porque, por um lado, o Tribunal a quo interpretou e/ou aplicou mal as normas atinentes ao pressuposto processual do interesse em agir e a jurisprudência sobre o mesmo que expôs na sua fundamentação; e, por outro lado, do decidido resulta uma distorção da realidade factual, isto é, distorção da utilidade prática que se permite retirar da alínea b) do petitório das AA. e também uma interpretação errada dos factos aduzidos pelas AA. a propósito de tal utilidade/vantagem pretendida.
J.2. Avesso a isso, o Tribunal a quo aplicou mal o direito restringiu a amplitude e o alcance do pressuposto processual do interesse em agir previsto no CPTA e consolidado na jurisprudência nacional; e também andou mal o Tribunal a quo quando considerou “jurisprudência do TJUE a respeito da questão de saber se um concorrente cuja proposta tenha sido excluída e não impugne essa exclusão não tem legitimidade, por falta de interesse pessoal e direto, para impugnar o ato de adjudicação a outro concorrente” – que em nada se permite transpor para o caso concreto dos presentes autos, porquanto a proposta das AA. ao concurso foi aceite e ordenada/classificada em 3º lugar no lote 4.
J.3. Além do mais, da própria jurisprudência do TJUE, se extrai a existência de interesse em agir, in casu, das AA. na alínea b) do seu petitório, porquanto “[o] Tribunal de Justiça da União Europeia vem adotando orientação no sentido do artigo 1.º, n.º 1, 3.º parágrafo, e n.º 3, da Diretiva 2007/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 11 de dezembro de 2007, deverem ser interpretados no sentido de se reconhecer interesse em agir a qualquer concorrente que tenha visto a sua proposta ser excluída, ainda que seja de manter tal decisão, na impugnação da decisão de adjudicação e pretensão de ver excluídas as demais propostas, desde que seja equacionável a possibilidade de abertura de um novo procedimento e de poder participar no mesmo, no qual poderá obter a adjudicação do contrato95.
95 Cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 20/01/2022, proc. 1119/21.0BELRA.
J.4. Ou seja, impõe-se reconhecer interesse em agir a qualquer concorrente mesmo quando a abertura de um novo procedimento e a participação no mesmo (no qual poderá obter a adjudicação do contrato) seja apenas uma possibilidade equacionável.
J.5. Com efeito, “(…) no sempre delicado equilíbrio entre o acesso irrestrito à justiça e a imposição de limites processuais a esse acesso, o TJUE fez aqui inclinar a “balança” para o primeiro daqueles dois “pratos”, o que tem potencialmente efeitos no (aumento do) número de litígios desencadeados e, a prazo, na (redução da) celeridade na obtenção da própria tutela requerida. (…) o que parece resultar da decisão do TJUE é que um concorrente tem legitimidade para impugnar a decisão de adjudicação mesmo que a sua própria proposta devesse ser excluída do procedimento pré-contratual em causa, bastando, aparentemente, que exista uma (pura e simples) possibilidade de a entidade adjudicante dar por findo o referido procedimento e, eventualmente, vir a dar início a um novo. (…)”96.
96 Conforme aduz, recentemente, MARCO CALDEIRA, “Quão plena deve ser a jurisdição no contencioso pré-contratual?”, in Revista de Direito Administrativo N.º 9, setembro-dezembro, 2020, págs. 25 e 26.
J.6. Nesta esteira, o interesse em agir só poderá ser afastado -sem desrespeitar a doutrina que decorre da jurisprudência do TJUE citada- quando o benefício esperado pelo impugnante/recorrente é impossível, pelo que só há margem para a discussão sobre afastamento/inexistência de interesse em agir quando a abertura de um novo concurso não seja obrigatória (nesse sentido, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 02/12/2021, proc. 484/21.3BELRA).
J.7. Ora, se a existência de interesse em agir é ainda suscetível de ser concedida naqueles casos em que a utilidade/benefício/vantagem jurídica prática a retirar da ação é eventual mas é possível …
… não existe margem para se interpretar -como erradamente fez o Tribunal a quo- no sentido da falta de interesse em agir em casos, como o dos autos, em que a utilidade a retirar da pretensão é, além de possível, certa (uma vez que o lançamento de um novo procedimento é obrigatório em caso de anulação do presente, porque tal é imposto por lei).
J.8. Com efeito, a utilidade/benefício a retirar da alínea b) do petitório das AA., não só é possível como também é certa – de resto, como o próprio Tribunal a quo admitiu; pelo que não pode resultar outra interpretação e aplicação do direito que não a da existência de interesse em agir das AA. quando peticionam a anulação de um procedimento concursal e é consabido ser obrigatória a abertura de um novo procedimento concursal na sequência dessa anulação; nessa medida haverá sempre a possibilidade de o impugnante/recorrente participar nesse novo procedimento.
J.9. Em segundo lugar, reitere-se, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quando interpretou, erradamente, que a utilidade/vantagem pretendida pelas AA. na formulação da pretensão de anulação do presente procedimento concursal era a da manutenção ad eternum das autorizações provisórias sob as quais prestam atualmente aquele serviço na AMP; uma vez que é facto consabido, notório e incontornável que aquelas autorizações são somente provisórias, tendo por limite temporal fixado o dia 3 de dezembro de 2023 ou até à entrada em funcionamento do operador no novo contrato de serviço público celebrado com a Área Metropolitana do Porto, na sequência de procedimento concorrencial, consoante a data que ocorrer primeiro.
J.10. Sendo que, cf. já se viu, o próprio Tribunal a quo expõe que a destruição in limine do procedimento concursal e a (consequente) manutenção ad eternum do status quo das AA. (que, reitere-se, não foi peticionada nem resulta do petitório das AA.) é in casu juridicamente impossível.
J.11. Aliás, mais se diga que as próprias AA. (aqui Recorrentes) sempre aduziram, ao longo do iter processual, no sentido do respeito pelo carácter transitório deste facto, bem como da consciência do necessário/obrigatório lançamento de um novo concurso, em caso de anulação deste (vejam-se os artigos 9.º, 12.º, 25.º, 65.º-69.º da réplica apresentada pelas AA. aos autos),
J.12. Realidade fáctica (e jurídica) que afasta, absolutamente, a interpretação do Tribunal a quo no sentido de as Autoras pretenderem “manter ad eternum um status quo” (pág. 197) por via da procedência da alínea b) do petitório a título principal.
K. A respeito do interesse em agir na alínea d) do petitório das AA.:
K.1. Além de ter julgado pela falta de interesse em agir das AA. quanto ao pedido formulado, a título principal, na alínea b), o Tribunal a quo julgou também pela falta de interesse em agir das AA. quanto ao pedido formulado, a título subsidiário, na alínea d) do petitório aperfeiçoado (cf. 6.º parágrafo da pág. 197 até pág. 201 da sentença recorrida e segmento decisório a.(ii) na sua pág. 224),
que corresponde à pretensão de exclusão da proposta do agrupamento concorrente “TB..., Lda.” e “TF..., Lda.”(adjudicatário do lote 4 do concurso em crise) – com fundamento na verificação de vícios/causas de exclusão previstas nas alíneas e), f) e g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, por força do preço anormalmente baixo que constitui tal proposta, e que abrange também a pretensão anulatória do ato de adjudicação do lote 4, e conexamente do contrato, com este fundamento).
K.2. Para tanto, o Tribunal a quo concluiu que dali “nenhuma utilidade advém para as AA.”, e fê-lo, essencialmente, com base no facto de a proposta do agrupamento composto pelas AA. (aqui Recorrentes) se encontrar ordenada/classificada em 3.º lugar no lote 4 a concurso, isto é, ao invés de se encontrar em lugar subsequentemente/imediatamente elegível à adjudicação neste lote; juntamente com base no facto de as AA. não terem peticionado, em sequência, a adjudicação da sua proposta.
K.3. Ressalvado o devido respeito, no seu discurso fundamentador o Tribunal a quo erra duas vezes:
A primeira vez, erra quando exige -à satisfação do preenchimento do pressuposto de interesse processual/interesse em agir- que as AA. tivessem peticionado expressamente a adjudicação da sua proposta ao lote 4, como (con)sequência da peticionada exclusão da proposta ordenada em 1.º lugar/adjudicada.
A segunda vez -já aceitando que a pretensão formulada pelas AA. comporta o pedido de adjudicação à sua proposta-, erra quando não reconhece o interesse em agir das AA. por entender que o mesmo só é reconhecido ao proponente classificado em 2.º lugar (quando não sejam invocados fundamentos de exclusão ou reclassificação das propostas que medeiam classificadas entre o 1.º lugar e o lugar das AA.).
K.4. Ao decidir assim o Tribunal a quo, uma vez mais, impõe uma forte restrição da amplitude e do alcance do pressuposto processual do interesse em agir que não se encontra pressuposta, nem é exigida, pelo CPTA e nem pela jurisprudência nacional consolidada em sede de contencioso pré-contratual (error juris),
K.5. E, também uma vez mais, fundamenta o seu entendimento com base numa realidade factual por si distorcida (error facti); incorrendo, por conseguinte, em erro de julgamento quer quanto a matéria de facto quer quanto a matéria de direito:
K.6. Em primeiro lugar, o Tribunal a quo interpretou e/ou aplicou mal as normas atinentes ao pressuposto processual do interesse em agir constantes do CPTA e da jurisprudência dos tribunais administrativos e dos tribunais da União Europeia, porque daquelas resulta que a existência de interesse em agir não equivale, exclusivamente, à “hipótese de adjudicação imediata”, bastando-se ao seu preenchimento e reconhecimento que a adjudicação seja possível/equacionável; o que foi precisa e suficientemente demonstrado in casu por via dos factos aduzidos pelas AA.
K.7. Ora, impossível adjudicação seria ao concorrente cuja proposta se afigurasse definitivamente excluída do procedimento concursal – o que não sucede, de todo, in casu, sendo de reiterar que se trata de um lote a concurso (Lote 4) no qual as AA. apresentaram proposta em agrupamento, que foi aceite e ordenada pelo Júri e que ficou classificada em 3.º lugar no lote 4.
K.8. Como refere VERA EIRÓ, justamente a propósito da delimitação do interesse em agir no contencioso pré-contratual, “(…) resulta que as Directivas Recursos impõem, pelo menos, que (i) os concorrentes/candidatos que não tenham sido excluídos de um procedimento possam impugnar as decisões tomadas em procedimentos de formação de contratos públicos, quando aleguem um interesse de facto na decisão final do processo de impugnação – não carecendo de fornecer ao tribunal a prova deste interesse de facto; (…)”.97
97 VERA EIRÓ in A obrigação de indemnizar das entidades adjudicantes. Fundamentos e pressupostos, Almedina, 2013, págs. 496-498.
K.9. É, por conseguinte, absolutamente desprovida de sentido jurídico a “tese” da exclusiva equivalência entre interesse em agir e “hipótese de adjudicação imediata”.
K.10. Pelo que, a este respeito, é claro que o interesse em agir, in casu, não se afere pela “hipótese de adjudicação imediata”, mas pela hipótese, mesmo que seja mediata ou indireta, de tal suceder.
K.11. (Em todo o caso sempre se diga que, em bom rigor, as AA. sempre ficarão/permanecem “imediatamente” incumbentes do serviço ao abrigo das referidas autorizações provisórias de exploração…até ao lançamento de novo Concurso98, ou até ao reinício do mesmo Concurso99, ou até a reclassificação da sua proposta100).
98 Consequência/utilidade da pretensão, a título principal, da alínea b) do petitório aperfeiçoado das AA.
99 Consequência/utilidade da pretensão, a título principal, da alínea c) do petitório aperfeiçoado das AA.
100 Consequência/utilidade da pretensão, a título principal, da alínea d) do petitório aperfeiçoado das AA.
K.12. Acrescendo ainda que as AA., além da invocação de fundamentos que conduzem à exclusão da proposta classificada em 1.º lugar/adjudicada, aduziram fundamentos que conduzem à reclassificação das propostas dos 2.º e 3.º classificados (ou seja, as únicas que teoricamente medeiam entre as AA. e o 1.º classificado/adjudicatário), cf. adiante se aludirá.
K.13. Em segundo lugar, o Tribunal a quo incorreu decidiu pela falta de interesse em agir das AA. com base numa clara distorção da realidade factual exposta (cf. parágrafo 4 da pág. 199 a pág. 201 da sentença recorrida),
quando interpretou, erradamente, que da mera exclusão da proposta das contrainteressadas/adjudicatárias, à míngua da dedução de pedido e invocação de fundamentos que conduzissem à exclusão ou à reclassificação das propostas dos 2.º e 3.º classificados (TS.... e agrupamento TO.../TX... S.A.), não emerge esse seu direito a ver a sua proposta posicionada num lugar apto a, por força da exclusão da proposta classificada em 1.º lugar, se tornarem adjudicatárias”.
K.14. Deste modo, o Tribunal a quo decidiu contra a própria realidade factual que diz respeito à pretensão formulada pelas AA. em d) do petitório a título subsidiário, porquanto a verdade é que: – Entre a proposta classificada em 1.º lugar/adjudicada e a proposta das AA. apenas medeia uma única proposta (a da concorrente TS...., classificada em 2.º lugar), pelo que a proposta das AA. se encontra ordenada em 3.º lugar no lote 4; – O referido agrupamento TO.../TX... S.A., pelo Tribunal a quo, como 3.º classificado no lote 4 é já adjudicatário/1.º classificado do lote 5 desse mesmo Concurso…sendo esse, precisamente, um dos limites à adjudicação previstos no artigo 15.º n.º 1 al. a) do Programa do Concurso que prevê que: “[r]elativamente ao conjunto dos cinco lotes, só pode ser adjudicada uma proposta de entre As apresentadas pelo mesmo concorrente”; -Pelo que o agrupamento TO.../TX... S.A. nunca poderia ser o adjudicatário (seguinte à TS....) no lote 4; cf. consta do “quadro de iteração 4” no Relatório Final elaborado pelo Júri: “a proposta [da “TX.../TO...”] foi desconsiderada [do Lote 4] pelo concorrente já ter lote atribuído”; – A concorrente “TS....” -que constitui a única proposta que medeia entre a proposta classificada em 1.º lugar/adjudicada e a proposta das AA. no lote 4- encontra-se ordenada em 2.º lugar em dois dos cinco lotes a Concurso (nos Lotes 2 e 4); ficando impedida, pelos referidos limites à adjudicação do 15.º do Programa do Concurso, de ser adjudicatária em ambos os lotes (2 e 4); – Os critérios e limites da adjudicação deste Concurso não consagram, sem mais, que a consequência da exclusão de uma proposta é a da adjudicação da proposta imediatamente subsequente; – Ao invés, o Programa do Concurso prevê a ordenação e adjudicação por via de uma equação que interliga todos os lotes, o que promove a resultados diversos e reclassificações “inter-lotes” em caso de exclusão de uma proposta; – Deste modo, em caso de exclusão de uma proposta ordenada em 1.º lugar é necessário aferir quer da existência de outas propostas deste mesmo concorrente a outros lotes também em 1.º lugar, quer a maior diferença de pontuação entre as 1.º e 2.º classificadas em cada um dos respetivos lotes (ao invés de se adjudicar, sem mais, a proposta imediatamente subsequente à excluída), cf. artigo 15.º n.ºs 3 e 4 e ss. do Programa do Concurso.
K.15. Consequentemente, para o que aqui releva, a título de exemplo do sobredito: de facto, a concorrente TS.... (em 2.º lugar nos lotes 2 e 4, sendo a única proposta que medeia entre a adjudicada no lote 4 e a das AA.) poderá ver a sua proposta (i) ascender ao 1.º lugar no lote 4, em caso de exclusão da proposta adjudicada no lote 4, ou (ii) ascender ao 1.º lugar no lote 2, em caso de exclusão da proposta adjudicada no lote 2, ou ainda (iii) ascender ao 1.º lugar no lote 2, em caso de exclusão da proposta adjudicada no lote 1, porquanto esta última conduz a que a atual adjudicatária do lote 2 transite para adjudicatária do lote 1, uma vez que a proposta que apresentou também a este lote passou a ter uma maior diferença de pontuação em relação ao 2.º classificado nesse lote 1.
K.16. A propósito, como escreve LUÍS VERDE DE SOUSA101, precisamente para o que releva a este respeito: “nos casos em que, por se admitir o package bidding ou por se estabelecer um número máximo de lotes a adjudicar ao mesmo concorrente, existe uma ligação ou interdependência entre os diferentes lotes. Com efeito, a introdução da possibilidade de uma adjudicação combinada ou de uma limitação do número de lotes a adjudicar a um mesmo concorrente pode fazer com que os resultados, em diversos lotes a concurso ou mesmo em todos, sejam completamente diferentes dos que existiriam se a adjudicação se fizesse lote a lote sem tal limite. Neste cenário, o atraso na análise e avaliação das propostas apresentadas no âmbito de um lote pode impedir a ordenação das propostas no âmbito de um outro lote (porque, por exemplo, não se sabe, ainda, se é ultrapassado o número máximo de lotes a adjudicar ao mesmo concorrente) ou até em todos os lotes (quando é admitida uma adjudicação combinada). Acresce que, a necessidade de excluir uma proposta, que tenha sido ordenada em primeiro lugar em algum dos lotes ou num determinado “pacote”, pode ter um “efeito cascata”, determinando a alteração da ordenação das propostas em diversos ou mesmo todos os lotes em disputa. Neste cenário, pode revelar-se impossível proceder a qualquer adjudicação autónoma sem que antes esteja definitivamente firmada pela entidade adjudicante a ordenação respeitante à totalidade dos lotes. Esta ligação ou interdependência entre os diferentes lotes colocará algumas dificuldades em matéria processual. Na verdade, não é de afastar a possibilidade de um determinado concorrente ter um interesse direto e pessoal em estender a impugnação à adjudicação realizada no âmbito de um determinado lote ou conjunto de lotes, não porque esse lote ou conjunto de lotes alguma vez lhe possa vir a ser adjudicado, mas porque a anulação da respetiva adjudicação lhe permitirá ascender à posição de adjudicatário num outro lote ou conjunto de lotes.”
101 “Algumas Notas sobre a adjudicação por lotes”, Revista Eletrónica de Direito Público – Instituto de Ciências Jurídico-Políticas & Centro de Investigação de Direito Público da FDUL, e-Pública Vol. 4 No. 2, novembro 2017.
K.17. Ora, por consequência, o interesse em agir não é, in casu, limitável dentro de cada lote; pelo que, com efeito, não é correto concluir -como o Tribunal a quo fez- que nunca seria possível se conduzir à adjudicação da proposta das AA.
K.18. Com efeito, nem de direito aplicável se exige o petitório da exclusão de todas as propostas cimeiras para que se reconheça o interesse em agir, nem tampouco de facto, in casu, é necessária a exclusão de todas aquelas propostas para que se conduza à ascensão das AA. a adjudicatárias do lote 4; sendo bastante o facto de ser possível que a concorrente classificada em 2.º lugar no lote 4 (única que medeia entre as AA. e a adjudicatária cuja exclusão é peticionada) transite para adjudicatária de outro lote.
L. Deste modo, mal esteve o Tribunal a quo ao julgar pelo abuso de direito das AA. (aqui Recorrentes) quanto a alínea b) do seu petitório e pela falta de interesse em agir das AA. sobre o mesmo, e ao julgar pela falta de interesse em agir das AA. quanto a alínea d) do petitório, incorrendo em erro de julgamento nos segmentos decisórios constantes (respetivamente, das págs. 189 ao 5.º parágrafo da pág. 197 e de a.(i) da pág. 224; 6.º parágrafo da pág. 197 a 201 e de a.(ii) da pág. 224) da sentença recorrida, com violação do disposto nos artigos 55.º n.º 1 alínea a), 39.º, 68.º, n.º 1 alínea a), todos do CPTA e com violação da Diretiva 2007/66/CE e respetiva jurisprudência comunitária; constituindo, além do mais, uma grave e infundamentada restrição do direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva nos termos dos artigos 20.º e 268.º n.º 4 da CRP e 7.º do CPTA.
M. O interesse em agir das AA., na ação de contencioso pré-contratual que impulsionaram, se extrai, por si só, do petitório global das AA., porquanto o facto de terem as AA. formulado e deduzido pretensões condenatórias102, não limitando o seu petitório à mera pretensão impugnatória103 (do ato de adjudicação), comprova, desde logo, a utilidade e a necessidade do uso do processo/da ação.
102 b), c) e d) do petitório aperfeiçoado.
103 a) do petitório aperfeiçoado.
M.1. Entendimento que está precisamente em linha com o recente posicionamento do mesmíssimo Tribunal a quo quando entendeu “que não está em causa exigir que a utilidade das AA. fosse, apenas, obter para si a adjudicação, admitindo-se que a mesma se pudesse traduzir na prática de um ato de não adjudicação e revogação da decisão de contratar, com vista a indiretamente obterem para si a adjudicação do contrato pela via da abertura de um novo procedimento concursal” (cf. pág. 9 da decisão/despacho que proferiu no processo 460/22.9BEPRT, em 22/03/2022, referenciada pelo próprio Tribunal a quo na nota de rodapé 3 da pág. 189 da sentença recorrida).
M.2. Tal entendimento revela, com o devido respeito, uma notória divergência e incoerência na interpretação e aplicação do (mesmo) pressuposto processual do interesse em agir perante idêntico caso concreto que é o do referido processo 460/22.9BEPRT.
N. A exceção de caso julgado, parcialmente sobre duas questões distintas, foi julgada procedente pelo Tribunal a quo, com base, para ambas, no julgado proferido nos processos 1973/20.2BEPRT e apensos (cf. IV.2. das págs. 201 a 211 e em b.(i) e (ii) da pág. 224 da sentença recorrida):
- Exceção de caso julgado quanto a violação do (novo) n.º 10 do artigo 285.º do Código do Trabalho
[cf. págs. 201 a 211 e em b.(i) da pág. 224 da sentença recorrida], e
- Exceção de caso julgado quanto a verificação de causa de não adjudicação previstano artigo 79.º n.º 1 do CCP fundada na alteração de circunstâncias/efeitos emergentes dos efeitos da Pandemia Covid-19
[cf. págs. 201 a 211 -em especial pág. 211- e em b.(ii) da pág. 224 da sentença recorrida].
N.1. Também aqui, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento, porquanto o discurso fundamentador do segmento decisório, em ambas, padece de incorreções (nomeadamente carências, inconsistências e distorções) da realidade factual (error factis) e jurídica (error juris).
N.2. Primeiramente, é inequívoca a inexistência de caso julgado quanto a violação do (novo) n.º 10 do artigo 285.º do Código do Trabalho, e assim é porquanto o Tribunal a quo incorreu em erro ao julgar o preenchimento dos requisitos (cumulativos) necessários à verificação da exceção de caso julgado, porquanto entre os processos 1973/20.2BEPRT (e apensos) e o presente processo (481/22.1BEPRT) não existe identidade de pedidos nem tampouco identidade de causa de pedir. Veja-se:
N.3. No processo n.º 2019/20.6BEPRT -no qual as AA. e aqui Recorrentes foram autoras- que é apenso ao citado processo 1973/20.2BEPRT, invocaram-se, entre outros vícios do procedimento concursal em crise, “a ilegalidade da cláusula 26º n.2 do Caderno de Encargos, «decorrente da falta de divulgação no Caderno de Encargos de informação relativa aos trabalhadores», por violação dos princípios gerais da contratação pública e também do artigo 4º n. 5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e do artigo 21º n.1 da Lei n.º 52/2015” (cf. ponto 46 dos Factos Provados, págs. 125-126 da sentença recorrida).
N.4. Nesta esteira, cumpre desde logo notar que o referido processo (2019/20.6BEPRT) foi instaurado em 27/10/2020 pelas aqui Recorrentes (ali autoras)104, sendo que naquela data não existia o novo n.º 10 do artigo 285.º do Código do Trabalho105, cuja violação foi aduzida, como uma das causas de pedir, pelas AA. e aqui Recorrentes na petição inicial dos presentes autos.
N.5. Para a procedência da exceção de caso julgado sobre esta matéria, o Tribunal a quo entendeu que já estão discutidas e apreciadas, tendo sido julgadas improcedentes com trânsito em julgado, as questões da invalidade da Cláusula 26.ª do Caderno de Encargos e da falta de disponibilização de informação sobre trabalhadores (sob aquele processo n.º 1973/20.2BEPRT e apensos), concluindo que as AA. estão a invocar, tão só, o mesmo vício: “a falta de disponibilização de informações sobre o número e o regime dos trabalhadores afetos à atividade determinante da ilegalidade da Cláusula 26º do Caderno de Encargos”.
104 Cf. ponto 46 dos Factos Provados (pág. 125 da sentença recorrida).
105 Que somente entrou em vigor em 09/04/2021, por força da Lei n.º 18/2021, de 8 de abril.
N.6. Nesta esteira, fundamentou o Tribunal a quo se verificam a identidade de sujeitos e a identidade de pedidos, entre o processo 1973/20.2BEPRT (e apensos) e o presente processo (481/22.1BEPRT),
N.7. Contudo, quanto ao terceiro requisito cumulativo -que compõe a tríplice identidade da verificação da exceção de caso julgado exigida pelo artigo 581.º CPC- entendeu o Tribunal a quo e que “existe, ainda, que parcialmente, identidade na causa de pedir”.
N.8. Isto exposto, não podia ter procedido a exceção de caso julgado, porque, desde logo, falha um dos requisitos (cumulativos) da sua verificação: o da identidade da causa de pedir, uma vez que os factos e quadro jurídico que servem de fundamento às pretensões deduzidas constituem vias jurídicas absolutamente diversas:
- No referido processo 2019/20.6BEPRT (apensado ao processo 1973/20.2BEPRT) estava em causa a violação do n.º 5 do artigo 4.º do Regulamento (CE) N.º 1370/2007,
- Ao passo que está em causa nos presentes autos a violação do regime jurídico da transmissão da unidade económica decorrente da Lei n.º 18/2021 de 8 de abril de 2021 que altera o Código do Trabalho, introduzindo, sobretudo, o novo n.º 10 do artigo 285.º.
N.9. Tendo sido esse esforço legislativo também descrito como uma “imposição de normas anti-abuso nos concursos públicos”106.
106 Projeto de Lei N.º 414/XIV/1.ª, “Densifica o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento clarificando a sua aplicação nas situações de fornecimento de serviços de vigilância, alimentação ou limpeza (16.ª alteração do Código do Trabalho)”, Exposição de motivos do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, 29 de maio de 2020, p. 3.
N.10. Acresce que o alcance de cada uma das referidas questões (i.e., efeito jurídico/ pedidos deduzidos) é, também, de impacto/amplitude absolutamente distinto; na medida em que não está apenas em causa na presente demanda a ilegalidade da Cláusula 26.ª do Caderno de Encargos e/ou falta de disponibilização da informação relativa aos recursos humanos, mas sim o impacto de uma alteração legislativa em matéria laboral especialmente aplicável em sede da contratação pública cujo efeito prático-jurídico não se resume à disponibilização da referida informação.
N.11. Deste modo, está-se perante a necessidade de adaptação das peças procedimentais à nova lei (laboral), que torna ilegal o ato de adjudicação e do conexo subsequente contrato – o que não se basta com uma alteração da Cláusula 26.ª do Caderno de Encargos.
N.12. Sendo, de resto, consabido que, avessamente à atuação da AMP (aqui Recorrida), o novo normativo da legislação laboral nacional especialmente aplicável em sede de contratação pública vem sendo (recentemente) aplicado e adaptado por várias entidades públicas adjudicantes (e.g. C.M. de Lamego, Santo Tirso, V.N. de Famalicão, Vieira do Minho), por via da inclusão, como anexo às peças procedimentais, de uma tabela com indicação (anónima) dos trabalhadores afetos ao respetivo serviço público a concurso bem como informação dos encargos atinentes aos mesmos (os quais terão o direito de transmissão para o futuro operador),
N.13. Importando assinalar um consabido exemplo de texto “modelo”, que vem sendo usado por tais entidades no âmbito de procedimentos concursais, em nome da aplicação prática dessa nova lei laboral: “A Lei n.º 18/2021 de 8 de abril, estende o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento às situações de transmissão por adjudicação de fornecimento de serviços que se concretize por concurso público, ajuste direto ou qualquer outro meio, alterando o Código do Trabalho. Pelas razões acima pontadas, veio tornar obrigatório que em caso de transmissão de estabelecimento, designadamente em resultado de concurso público no setor dos transportes, existe a obrigação de transmissão dos trabalhadores do operador incumbente para o novo operador. Assim, torna-se necessário que o operador que executa carreiras públicas no Concelho de Vieira do Minho, preencha a tabela em anexo, com indicação (anónima) dos trabalhadores atualmente afetos às linhas a incluir no futuro concurso para concessão da rede pública de transportes rodoviários de passageiros do concelho de Vieira do Minho, os quais terão o direito de transmissão para o futuro operador. Tal informação deve incluir, não só a identificação (anónima) dos trabalhadores em questão, como o valor anual (relativo ao ano 2019) de encargos com esses trabalhadores. Mais se informa que a tabela será posteriormente incluída como anexo no concurso mencionado no assunto deste e-mail.”
N.14. Pelo que torna ilegal a execução do contrato a celebrar nos termos inicialmente fixados (no tempo da elaboração dos documentos conformadores deste procedimento concursal).
N.15. Consequentemente, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, por violação do ditado no artigo 581.º do CPC, porquanto entre os processos 1973/20.2BEPRT (e apensos) e o presente processo (481/22.1BEPRT) não existe identidade de pedidos nem tampouco identidade de causa de pedir; o que impõe a revogação deste segmento decisório (cf. págs. 201 a 211 e em b.(i) da pág. 224 da sentença recorrida) pelo Tribunal de recurso.
O. Seguidamente, é simples de ver a inexistência de caso julgado quanto a verificação de causa de não adjudicação prevista no artigo 79.º n.º 1 do CCP fundada na alteração de circunstâncias/efeitos emergentes dos efeitos da Pandemia Covid-19,
E assim é porquanto o Tribunal a quo incorreu em erro ao julgar o preenchimento dos requisitos (cumulativos) necessários à verificação da exceção de caso julgado: entre os processos 1973/20.2BEPRT (e apensos) e o presente processo (481/22.1BEPRT) não existe, uma vez mais, o requisito (cumulativo) da identidade da causa de pedir. Veja-se:
O.1. Pese embora as aqui Recorrentes e ali autoras tenham invocado (no processo 2019/20.6BEPRT, apensado ao processo 1973/20.2BEPRT) a Pandemia Covid-19 como circunstância superveniente e imprevista desconsiderada pela AMP (aqui Recorrida),
A verdade é que o Tribunal Central Administrativo Norte (naquele processo 1973/20.2BEPRT e apensos) entendeu que: “torna-se possível vislumbrar que o surgimento da pandemia provocada pelo novo vírus SARS-CoV-2 é idóneo, por princípio, a constituir uma circunstância superveniente com impacto nos pressupostos que serviram de base à decisão de contratar proferida antes da sua emergência, e, nessa medida, perfeitamente suscetível, em tese, de fundamentar uma decisão de não adjudicação e consequente extinção do procedimento, à luz do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 79.º do CCP. […]” [apesar de os efeitos económico-financeiros da Pandemia Covid-19 existentes e concretos naquela data (relembre-se: o referido processo foi instaurado em 27/10/2020) tenham conduzido o Tribunal a concluir pela improcedência do vício invocado].
O.2. Isto exposto, nos presentes autos (481/22.1BEPRT) as AA. e aqui Recorrentes invocaram a Pandemia da doença Covid-19 enquanto circunstância atualmente agregada no (mais vasto atual) elenco da alteração das circunstâncias.
O.3. Em primeiro lugar, a questão do impacto da pandemia constitui um complexo duradouro, cujos efeitos, públicos e notórios, estão (ainda) em constante evolução e revelação; não tendo já nada que ver com efeitos projetados ainda em 2020, no âmbito do processo n.º 2019/20.6BEPRT (apenso ao processo 1973/20.2BEPRT), que eram muitíssimo mais limitados; e que não são os mesmos sabidos e conhecidos à data de março de 2022.
O.4. Sendo “a matéria da pandemia e dos seus efeitos, naturalmente, volátil” – como a própria Ré já confessou –, é seguro afirmar que à medida que se estabilizam, os seus impactos e efeitos na contratação pública, revelam-se, hoje, muitíssimo agravados,
O.5. Precisamente no caso dos procedimentos pré-contratuais que se iniciaram antes da Pandemia e que se prolongaram durante esta…Veja-se que: “(…) “a situação pós-pandémica deve também ser considerada de alto risco, onde a situação pandémica era de altíssimo risco107.
107 PEDRO SANTOS AZEVEDO, Ensaio sobre a Contratação Pública Pandémica, in Revista de Contratos Públicos 24, agosto de 2020.
O.6. Acresce que o fenómeno da pandemia foi invocado no processo n.º 2019/20.6BEPRT (apenso ao processo 1973/20.2BEPRT) como causa única e isolada de não adjudicação,
O.7. Diversamente, integra agora um amplo conjunto de alteração das circunstâncias económico-financeiras e de prejuízos para o interesse e erário públicos, que comprometem a manutenção do procedimento concursal em crise [à luz do exposto a artigos 92.º e ss. da petição inicial] – e que são posteriores ao Acórdão do TCA Norte citado pelo Tribunal a quo.
O.8. Com efeito, se já numa ótica isolada esse fenómeno está muitíssimo agravado, e suscetível (“em abstrato”) de constituir causa de não adjudicação; na ótica agregada subjacente a esta demanda ganha uma relevância acrescida, quando concatenado com todas as circunstâncias ocorridas após a decisão de contratar, após a elaboração e revisão das peças do procedimento, após a apresentação de propostas, após o último relatório final do Júri e após a adjudicação… e, de resto, após o Acórdão do TCA Norte no processo 1973/20.2BEPRT.
O.9. De tal maneira que é hoje absolutamente evidente não poder manter-se o procedimento concursal nos exatos termos em que foi lançado (i.e., com base no modelo económico-financeiro de 2019),
O.10. Como se estivesse o procedimento imune e inabalável aos efeitos (para as empresas e para os cidadãos) de uma economia pandémica e pós-pandémica a nível nacional e de uma economia de guerra a nível da União Europeia.
O.11. Tanto mais que o decidido no referido processo 1973/20.2BEPRT e apensos (entre eles, o 2019/20.6BEPRT) foi à luz da conjuntura de “(…) não have[r] ainda uma estabilização sobre a perspetiva da evolução da crise pandémica”.
O.12. Além disso, e como é fácil de ver, a decisão final no citado processo 1973/20.2BEPRT e apensos teve por base/fundamento, exclusivamente, o único documento junto àqueles autos (pela AMP) para justificar a irrelevância do impacto da Pandemia nos pressupostos do Concurso: o memorando de 22/06/2020 – elaborado apenas cerca de três meses após a declaração da situação de Pandemia pela Organização Mundial da Saúde e encontrando-se, por isso, manifestamente desatualizado e ultrapassado pela realidade-;
O.13. Sendo certo que a AMP veio posteriormente (ao citado Acórdão do TCA Norte) desconsiderar tal memorando, confessando, em juízo, que sobre o mesmo “não recaiu qualquer deliberação dos órgãos da AMP” e admitindo que, afinal, “[t]rata- se de um memorando interno da AMP, e não de um parecer contratado”
O.14. De resto, já também depois do aludido Acórdão do TCA Norte no processo 1973/20.2BEPRT e apensos, a AMP (aqui Recorrida), admite, com efeito, que “caso tenha efetivamente ocorrido uma alteração das circunstâncias em razão da pandemia, essa verificação constitui fundamento para que seja tomada uma decisão de não adjudicação, nos termos legais”.
O.15. Consequentemente, na ausência do preenchimento da tríplice identidade a que o artigo 581.º do CPC faz referência, o Tribunal a quo incorreu em erro ao julgar procedente a exceção de caso julgado, porquanto entre os processos 1973/20.2BEPRT (e apensos) e o presente processo (481/22.1BEPRT) não existe identidade de causa de pedir e, mesmo que se concebesse existir parcialmente (por se referir ao evento da “Pandemia Covid-19”), a mesma sempre seria diversa no seu conteúdo.
P. O Tribunal a quo julgou erradamente pela procedência de uma exceção dilatória inominada de inadequação do meio processual (cf. IV.3, págs. 211 a 214 e em c) da pág. 224 da sentença recorrida):
Perante Articulado Superveniente apresentado pelas AA. aos autos em 01/06/2022, a fim de carrear aos autos o Acórdão do STA no mesmo processo 1973/20.2BEPRT, que veio confirmar, em sede de revista, a declaração da ilegalidade da Cláusula 53.ª (“Sanções contratuais pecuniárias”) n.º 3 alínea i), n.º 4 alínea m), e n.º 5 alínea n) do Caderno de Encargos do Concurso em crise nos presentes autos e a condenação da AMP ao expurgo das normas julgadas inválidas das peças procedimentais, com as “legais consequências”, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto e, até então, confirmada pelo Tribunal Central Tribunal Central Administrativo Norte.
P.1. Tal Articulado Superveniente foi entendido pelo Tribunal a quo como meio processual inadequado, utilizado à formulação da pretensão de invalidação do ato de adjudicação (e do contrato) fundada na sua desconformidade com o julgado do processo n.º 1973/20.2BEPRT (e apensos) – sob o fundamento de que “as AA. utilizam a ação de contencioso pré-contratual para obter resultados/efeitos […] que só em sede de ação de execução poderiam obter”.
P.2. Avesso a isso, no referido Articulado Superveniente as AA. não deduziram nenhum pedido equivalente ao pedido a formular em sede de execução de sentença do processo n.º 1973/20.2BEPRT (e apensos), uma vez que ali não requereram, a final, que o Tribunal a quo promovesse ou compelisse, de modo coercivo, a AMP (Ré e aqui Recorrente) ao expurgo das normas julgadas inválidas das peças procedimentais, com as “legais consequências”; ou seja, as AA. não peticionaram, por via do Articulado Superveniente, o cumprimento daquela condenação por via de um poder coercivo do Tribunal a quo.
P.3. Os resultados/efeitos visados com o Articulado Superveniente são o da decisão no processo n.º 1973/20.2BEPRT enquanto pressuposto material de parte da nova decisão, ficando, com aquele caso julgado, assente um elemento da causa de pedir (“efeito positivo do caso julgado”).
P.4. Daquele modo, as AA. tão só carrearam e invocaram a ilegalidade (de relevante Cláusula do CE) declarada – pelo poder jurisdicional, confirmada pelos tribunais administrativos superiores e transitada em julgado – enquanto vício/causa certa de ilegalidade/invalidade do Ato de adjudicação: esse último sob escrutínio e cujo julgamento cabia ao Tribunal a quo, enquanto questão prejudicial e dependente.
P.5. Assim, o Articulado Superveniente das AA. serviu, ao invés da suposta “petição de execução de sentença”, para deduzir os relevantes factos constitutivos e modificativos supervenientes à petição inicial apresentada e advenientes do Acórdão proferido pelo STA (no processo n.º 1973/20.2BEPRT) já no decurso da ação (em 05/05/2022); cumprindo precisamente a sua função prevista no artigo 86.º do CPTA.
O que de resto se impunha à AMP (Ré e aqui Recorrida) carrear, mas que não fez; violando, uma vez mais, o estabelecido em 8.º do CPTA.
P.6. Deste modo, o julgado proferido no mesmo processo 1973/20.2BEPRT (e apensos) não mereceu, na sua vertente positiva, nenhuma consideração de mérito pelo Tribunal a quo,
P.7. Como, ao invés, forçosamente se lhe impunha, por força do efeito positivo/a função positiva do caso julgado, isto é, que vincula o Tribunal (a quo) e a Ré a acatar o que ali (no processo 1973/20.2BEPRT) ficou decidido no âmbito da decisão aqui a ser proferida.
P.8. Isto posto, a verdade é que se impunha ao Tribunal a quo o reconhecimento e respeito pela autoridade de caso julgado no processo 1973/20.2BEPRT e apensos, nos termos do estabelecido no n.º 1 do artigo 619.º do CPC (ex vi artigo 1.º do CPTA):
P.9. Ora tal decisão tem força obrigatória dentro e fora do processo e impede, dessa forma, que a mesma relação material venha a ser definida em moldes diferentes pelo Tribunal ou qualquer outra autoridade.
P.10. Consequentemente, o Tribunal a quo incorreu em claro erro ao julgar procedente a exceção dilatória inominada de inadequação do meio processual, porquanto o Articulado Superveniente não só era o meio processual adequado, como era o único meio próprio para carrear e dar conhecimento da decisão proferida, no decurso do presente processo, pelo STA no processo 1973/20.2BEPRT – confirmando definitivamente a ilegalidade das disposições da Cláusula 53.ª do CE do concurso público cujo Ato de adjudicação é impugnado nos presentes autos.
P.11. O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento também quando afastou, totalmente, a operação do efeito positivo do caso julgado no 1973/20.2BEPRT, isto é, não reconheceu nem cumpriu a autoridade de caso julgado do processo 1973/20.2BEPRT (onde se julgou a invalidade de normas dos documentos conformadores do procedimento concursal) em relação aos presentes autos do processo 481/22.1BEPRT (onde se julga a invalidade do Ato de adjudicação do mesmo procedimento concursal).
P.12. Em violação, sobretudo, do disposto nos artigos 7.º e 86.º do CPTA e n.º 1 do artigo 619.º do CPC (ex vi artigo 1.º do CPTA).
P.13. Com efeito, a relevância e o impacto da declaração da ilegalidade da Cláusula 53.ª n.º 3 alínea i), n.º 4 alínea m), e n.º 5 alínea n) do Caderno de Encargos – uma vez que implica, por si só, a invalidade / a anulação do ato de adjudicação em crise nos presentes autos – não podia nem pode ser desconsiderada, e deve ser conhecida em sede do presente recurso;
Tanto mais que, não pode ser ignorado, o próprio Tribunal a quo revelou-se (pelo menos teoricamente) ciente desse impacto relevante quando enunciou que: “Daí que a pretensão de anulação do procedimento concursal abrange, necessariamente, a remoção da ordem jurídica dos atos procedimentos e administrativos que hajam sido praticados no âmbito desse procedimento pré-contratual, incluindo, pois, o ato de adjudicação e o contrato que seja celebrado. De resto, atenta essa sucessão ordenada, a ocorrência de invalidades numa fase do procedimento, incluindo as imputadas às peças do procedimento, são aptas a determinar a invalidade dos atos consequentes e/ou conexos, designadamente do ato de adjudicação108.
108 Pág. 210 da sentença recorrida.
Q. Do elenco de erros de julgamento do Tribunal a quo, ficaram, forçosamente, a constar vícios do Ato de adjudicação não conhecidos pelo Tribunal a quo, porque ficou impedido de conhecer da maioria dos vícios/invalidades/ilegalidades invocados pelas AA. sobre o Ato de adjudicação impugnado, obstado por força da errada procedência das supra expostas exceções dilatórias.
Q.1. Consequentemente, os vícios/ invalidades /ilegalidades assacadas pelas AA. ao Ato de adjudicação os quais o Tribunal a quo não chegou a conhecer foram e são os seguintes: (i) a verificação de causas de exclusão, previstas nas alíneas e), f) e g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, da proposta das contrainteressadas/ agrupamento concorrente/adjudicatário do lote 4, “TB..., Lda.” e “TF..., Lda.”, (ii) a violação do artigo 285.º n.º 10 do Código do Trabalho, (iii) a verificação de causas de não adjudicação, previstas no artigo 79.º, n.º 1, alíneas c) e d), do CCP, emergentes da alteração das circunstâncias, por força dos efeitos emergentes da situação de Pandemia Covid-19, (iv) a ilegalidade da Cláusula 53ª, n.º 3 alínea i), n.º 4 alínea m), e n.º 5 alínea n), do Caderno de Encargos do Concurso Público em crise, julgada (e transitada em julgado) pelo TAF do Porto, e confirmada pelos TCA Norte e STA, sob o processo n.º 1973/20.2BEPRT e apensos, impressa no Ato de Adjudicação.
Q.2. Com efeito, dada a errada procedência daquelas exceções dilatórias e a necessária revogação das mesmas, devem ser conhecidas, apreciadas e julgadas pelo Tribunal de recurso, à luz do consagrado pelos artigos 7.º e 149.º do CPTA, as seguintes matérias constantes da petição inicial aperfeiçoada: (i) Artigos 3.º a 78.º da petição inicial aperfeiçoada (pela verificação de causas de exclusão, previstas nas alíneas e), f) e g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, da proposta das contrainteressadas/ agrupamento concorrente/adjudicatário do lote 4, “TB..., Lda.” e “TF..., Lda.”), com a consequente procedência do pedido em d) do petitório aperfeiçoado109; (ii) Artigos 84.º a 91.º da petição inicial aperfeiçoada (pela violação do novo n.º 10 do artigo 285.º do Código do Trabalho)110; (iii) Artigo 93.º da petição inicial aperfeiçoada (pela Pandemia da doença Covid-19 enquanto circunstância imprevista e superveniente integrada no elenco da alteração das circunstâncias -aduzido entre os artigos 92.º a 97.º da petição inicial aperfeiçoada- de verificação de causas de não adjudicação, previstas no artigo 79.º, n.º 1, alíneas c) e d), do CCP)111; (iv) Artigos 79.º a 83.º da petição inicial aperfeiçoada e Articulado Superveniente das AA. (pelo impacto, no Ato de adjudicação, da declaração da ilegalidade da Cláusula 53.ª n.º 3 alínea i), n.º 4 alínea m), e n.º 5 alínea n) do Caderno de Encargos do Concurso em crise nos presentes autos, transitada em julgado, no processo 1973/20.2BEPRT e apensos)112.
109 Por força da improcedência da exceção dilatória de falta de interesse em agir.
110 Por força da improcedência da exceção dilatória de caso julgado.
111 Por força da improcedência da exceção dilatória de caso julgado.
112 Por força da improcedência da exceção dilatória inominada de inadequação do meio processual.
Q.3. E [tais vícios/ilegalidades em (ii), (iii) e (iv)] com as consequente procedência dos pedidos formulados pelas AA. em a) e b)113 e- subsidiariamente a b) e cumulado à a)- c) no seu petitório na petição inicial aperfeiçoada, condenando-se a AMP (Ré e aqui Recorrida) naqueles termos.
113 Por força da improcedência da exceção dilatória de falta de interesse em agir.
R. Do elenco de erros de julgamento do Tribunal a quo, constam, por fim, vícios/ilegalidades do Ato de adjudicação conhecidos e apreciados na sentença recorrida (cf. V. Questões a decidir, págs. 214 e ss. da sentença) e erradamente julgados improcedentes pelo Tribunal a quo. Veja-se.
R.1. No segmento decisório contido em V.1. Da emissão do ato de adjudicação em momento anterior ao trânsito em julgado da decisão proferida nos processos 1973/20.2BEPRT e apensos (págs. 215-219 da sentença recorrida) e em d. (da Decisão, pág. 225), entendeu o Tribunal a quo que “nada obsta[va] a que, ainda na pendência dos processos 1973/20.2.BEPRT e apensos, fosse praticado o ato de adjudicação impugnado”, concluindo que a presente ação se mostra improcedente quanto a este fundamento aduzido pelas AA.
R.2. Sucede que, muito mal andou o Tribunal a quo nos fundamentos através dos quais procurou suportar a decisão, porquanto:
– afirmou que a impossibilidade [da prática do ato de adjudicação antes de ser proferida decisão pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo 1973/20.2BEPRT] apenas resultaria da suspensão do procedimento concursal, seja ao abrigo do art. 38.º do CPA, seja ao abrigo do art. 103.º-B do CPTA,
– sublinhou que o incidente de adoção de medida provisória de suspensão do procedimento concursal, deduzido naquele processo 1973/20.2.BEPRT, foi indeferido por decisão proferida em 22.1.2021 (data na qual não existia nenhuma decisão proferida de ilegalidade da Cláusula 53.ª do CE),
– justificou a não censurabilidade da atuação da AMP -”ainda que se considerasse estarmos perante “questão prejudicial”- remetendo-se à pronúncia “interna” da AMP de 02/03/2021 no sentido da validade da Cláusula 53.ª do CE;
R.3. Tudo isto quando, bem sabe o Tribunal a quo que, na verdade, o que importa é que à data da prática do Ato de adjudicação (28/02/2022) a própria AMP já sabia que, quer o TAF do Porto, quer o TCA Norte, julgaram inválidas/ilegais as disposições da Cláusula 53.ª do CE (para além de saber também que o STA julgara admissível a revista por força da importância da questão) … pelo que não se pode crer que a AMP, permanecia, crente da sua pronúncia proferida há um ano atrás… (!)
O que, para além de nada relevar para a questão apreciada, ainda torna mais obscuro, incoerente e ambíguo o corpo da sentença recorrida.
R.4. Isto posto, dada a grave repercussão daquela declaração de ilegalidade da Cláusula 53.ª do CE (“Sanções contratuais pecuniárias”), e na iminência de ser confirmada no tempo da data da prática do Ato de adjudicação, certo é que a AMP preferiu avançar com a adjudicação, literalmente, “a todo o custo”,
R.5. Pelo que esteve mal o Tribunal a quo em “desresponsabilizar” a AMP quando, em bom rigor, a verdade é que esta atuou em violação dos mais basilares princípios de atuação, como o da prossecução do interesse público e da boa administração (artigos 4.º e 5.º do CPA), numa acentuada violação dos princípios da economicidade e da eficiência, e contra a própria segurança jurídica.
R.6. Por conseguinte, impõe-se concluir que aquela impossibilidade da prática do Ato de adjudicação, in casu, não resultaria “apenas”, cf. referiu o Tribunal a quo, da adoção de medidas nos termos do artigo 103.º-B do CPTA114; antes resultaria do respeito dos referidos princípios.
114 Pág. 216 da sentença recorrida.
R.7. E, desde logo, em respeito do artigo 38.º do CPA, que foi erradamente interpretado e aplicado pelo Tribunal a quo com base numa interpretação distorcida da realidade, porquanto, contrariamente ao afirmado, a Cláusula 53.ª do CE constitui um pressuposto da decisão de adjudicação ao ponto de não ser possível decidir a adjudicação (legal) sem que tal questão estivesse decidida.
R.8. Sendo, pois, inequívoco que a questão atinente ao processo 1973/20.2BEPRT é uma questão prejudicial nos termos do artigo 38.º do CPA, que obstava à prática do Ato de adjudicação enquanto a mesma não fosse resolvida e que, ademais, impõe ao próprio Tribunal a quo o conhecimento e consideração no andamento e na resolução do objeto dos presentes autos.
R.9. Ademais, sempre se diga, para o que aqui releva, também muito mal esteve o Tribunal a quo por não ter, no mínimo, sobrestado na decisão final dos presentes autos até que se aferisse se a AMP cumpriu a condenação ao expurgo das ilegalidades declaradas e as legais consequências, ditados pela decisão definitiva tomada no processo 1973/20.2.BEPRT, à luz do seu poder-dever de gestão processual (7.º-A CPTA), por via de eventual suspensão da presente instância -nos termos do disposto no artigo 15.º do CPTA,
R.10. Por se encontrar em causa, precisamente, questão prejudicial (por cumprir voluntariamente pela AMP ou por executar pelo Tribunal competente em sede de execução de sentença), cujo conhecimento do objeto da presente ação depende em parte. Ora, é de assinalar que “no domínio das questões prejudiciais, verifica-se o antagonismo entre o interesse da celeridade processual e o da justiça e do acerto da decisão115; sendo inequívoco que, in casu pelas ordens de razão apontadas, relevava a salvaguarda e garantia, sobretudo, da segurança jurídica.
115 JOSÉ LEBRE DE FREITAS/ISABEL ALEXANDRE. Código de Processo Civil Anotado, Volume 1.º – 3.ª edição, Coimbra Editora, p.185.
R.11. Isto posto, é de concluir que era alternativa do Tribunal a quo ter se munido do citado mecanismo processual – isto sem prejuízo do aduzido sobre ser certo que a “mera” declaração de ilegalidade por via do processo 1973/20.2.BEPRT é bastante, por si só, para se concluir pela invalidade/ilegalidade do ato de adjudicação impugnado, sem se ter de esperar, para uma boa decisão, pelo cumprimento do expurgo ditado por via daqueloutro processo.
R.12. Consequentemente, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao entender por improcedente o fundamento de que a AMP (Ré e aqui Recorrida) estava impedida – na pendência do recurso de revista no processo 1973/20.2.BEPRT sobre a ilegalidade da Cláusula 53.ª do CE, declarada pelo TAF do Porto e confirmada pelo TCA Norte – de praticar o Ato de adjudicação, pelo facto de ter julgado que tal questão não é “prejudicial” e que, ainda que se considerasse “prejudicial”, a AMP reputava que a mesma era legal e válida (mesmo após a declaração de ilegalidade por duas instâncias – TAF do Porto e TCA Norte, à data), por via de uma errada interpretação dos factos e de uma errada interpretação e aplicação do direito, sobretudo no artigos 38.º do CPA, mais ignorando o disposto no artigo 15.º do CPTA.
R.13. Com efeito, foi deste modo que, uma vez mais, o Tribunal a quo preferiu ignorar e desconsiderar o julgado no processo 1973/20.2.BEPRT (na sua vertente positiva), mesmo estando ciente da relevância decisiva e impacto dali advenientes – cf. o próprio admite na citada pág. 210 da sentença recorrida.
S. No segmento decisório contido em V.2. Das circunstâncias supervenientes (págs. 219-224 da sentença recorrida) e em d. (da Decisão, pág. 225), o Tribunal a quo julgou erradamente pela improcedência do fundamento de invalidade/ilegalidade do Ato de adjudicação pela verificação da causa de não adjudicação prevista no art. 79.º, n.º 1 do CCP, por força das circunstâncias supervenientes (desde o lançamento do concurso, em 2020, até à data da decisão de adjudicação, em 2022) que constituem alteração das circunstâncias concretizada, sobretudo mas não só, no cenário de crise energética e custos com combustível agravados e inéditos por força da invasão da Ucrânia pela Rússia.
S.1. Para tanto, fundamentou o Tribunal a quo que “as referenciadas circunstâncias supervenientes são inócuas aos pressupostos da decisão de contratar”; reiterando que “ainda que se admitisse que os efeitos da guerra na Ucrânia ao nível do aumento de custos dos combustíveis representassem a ocorrência de circunstâncias supervenientes, elas em nada se repercutem nos pressupostos da decisão de contratar. […] nenhuma interferência as vicissitudes sociais, económicas e financeiras seriam aptas a eliminar a necessidade de satisfação do interesse público subjacente à decisão de contratar”.
S.2. Acontece que nunca as AA. pugnaram que a (gravosa) alteração das circunstâncias económico-financeiras (desde o lançamento do concurso, em 2020, até à data da decisão de adjudicação, em 2022) torna desnecessária a contratação do serviço lançado a concurso; Isto é, não se trata de impactar na decisão de contratar/interesse e obrigação de contratar (como erradamente entende e fundamenta o Tribunal quo), mas sim nos seus termos. Significa o mesmo dizer que impacta, negativamente, nos pressupostos e bases económico-financeiras – que se reportam a 2019 (pré-pandemia e pré-guerra/pré-crise energética mundial)...
S.3. Isto posto, uma análise meramente perfunctória da fundamentação do Tribunal a quo permite logo concluir pela existência de notório erro de julgamento, porquanto é patente uma distorção da realidade factual bem como dos factos notórios emergentes da conjuntura económico-financeira atual, uma má e errada apreciação da prova documental (error facti) e ainda uma errada aplicação do direito (error juris).
S.4. Com efeito, o escrutínio e reparo são necessários porque o Tribunal a quo “fundamenta” a sentenciada “não alteração de circunstâncias” nos termos no 79.º do CCP, essencialmente, com base em notícias do Jornal Público online que, para além de voláteis, não possuem qualquer solidez dogmática económico-financeira116… (!)
116 Veja-se a pág. 221 da sentença recorrida.
S.5. Nesta linha, para além de o Tribunal a quo ter desde logo decidido pela desnecessidade da produção de prova pericial (requerida pelas AA. neste domínio) e de ter desconsiderado totalmente o Parecer Jurídico do Professor Pedro Costa Gonçalves, de março de 2022, precisamente a respeito desta questão concreta.
S.6. Além de ter o Tribunal a quo também desconsiderado (este por desentranhamento) um parecer económico-financeiro de 22 de abril de 2022 da autoria do Professor Amílcar Arantes.
S.7. Ao invés, o Tribunal a quo deveria, para o que aqui muito releva, ter considerado e apreciado o douto Parecer Jurídico do Professor Pedro Costa Gonçalves, de março de 2022, bem como os factos notórios atinentes à atual situação de crise, diversamente oposta ao quadro económico-financeiro e energético nacional/europeu/mundial de 2019, que serviu de base à arquitetura e lançamento do concurso em crise.
S.8. Em lugar disso, o Tribunal a quo ainda, erradamente, preferiu, a acrescer, crer superficialmente no «Estudo de Viabilidade Económica e Financeira (análise custo benefício para efeitos do art.º 36.º do CCP), Atualização (fevereiro de 2022)» – enquanto comprovador da manutenção da validade dos pressupostos económico-financeiros inicialmente assumidos pela e demonstrador da viabilidade na concretização da operação… Quando, desde logo, uma mera leitura do mesmo permite que se afirme, sem reservas, que o mesmo não teve em consideração a eclosão da crise energética com particular gravidade em matéria de preços dos combustíveis,
S.9. Tanto mais que, nem que se quisesse tal se podia deduzir da data do mesmo (como parece ter feito o Tribunal a quo), porquanto: se a decisão de adjudicação data de 28 de fevereiro de 2022, esse referido “estudo” prévio de suporte “financeiro” à adjudicação nunca poderia ter tido tempo para incorporar o novo contexto que emergiu 4 dias antes (i.e., a invasão russa da Ucrânia que se deu em 24 de fevereiro).
S.10. Além do mais, resulta dos presentes autos que tal documento nunca foi notificado às concorrentes – o que se impunha por lei (desde logo, pelo n.º 5 do 36.º do CCP); aliás, a própria Ré admite que essa “atualização” não integra o procedimento pré-contratual – o que efetivamente se comprova, conforme resulta do processo administrativo instrutor atualizado que a AMP juntou aos presentes autos.
S.11. Sendo ainda de assinalar que a AMP chegou mesmo a vedar expressamente, às concorrentes, o conhecimento desse estudo, precisamente (e pelo menos), antes da prática do ato de adjudicação/ decisão de adjudicação aqui em crise (cf. Documento n.º ... junto pelas AA. com a Réplica).
S.12. Mais: além de o único “estudo” aludido pelo Tribunal na sua fundamentação se revelar logo desatualizado à data da adjudicação praticada [quer pela sua data, quer pelo seu conteúdo], é ainda de relembrar que não seria a primeira vez a verificar-se a falta de diligência da AMP neste domínio: porquanto a própria AMP já veio desconsiderar (“pós- sentença”, no processo 1973/20.2BEPRT) o seu próprio “estudo”/memorando de 20/06/2020, que outrora lhe servia como “base única e sólida” da manutenção dos pressupostos económico-financeiros/imunidade dos mesmos aquando da eclosão da situação de pandemia e que, ademais, serviu também erradamente à fundamentação única do Tribunal no processo 1973/20.2BEPRT e apensos nesta matéria.
S.13. Com efeito, a verdade é que “no momento da adjudicação que identifica a proposta que melhor responde ao caderno de encargos e que será efetivamente objeto de execução”.
Contudo, avesso a isso, certo é que o ato de adjudicação aqui em causa foi praticado mais de 8 meses depois da elaboração da última análise / Relatório Final do Júri do presente procedimento concursal (de 9 de junho de 2021) (!)
S.14. Ao contrário do que a AMP quer fazer crer, é facilmente demonstrável que, nas circunstâncias atuais, nenhum operador (sério e realista, bem entendido) pode propor um o valor de 1.71 euros/km a título de custo unitário117.
É também falso que Estudo de Viabilidade Económica e Financeira, que suportou a decisão de contratar, cfr. Anexo VII do Caderno de Encargos, integrante do processo administrativo inicial / que suportou a decisão de contratar tenha sido “defensivo” ou “conservador” ou que tenha considerado “valores prudentes em relação à procura”, cf. aduziu a AMP nos presentes autos.
117 Remetendo-se aqui para a conclusão do “Parecer Económico” junto na Petição Inicial como Documento n.º 2, págs. 18-26, em especial, pág. 25).
S.15. Aliás, a própria AMP já confessou publicamente que o lançamento do concurso, em 2019, coincidiu com o tempo de um aumento da procura de 24% ao ano… E que, “a partir desse momento começámos com um processo de pandemia, este processo de pandemia alterou tudo: alterou aquilo que é o valor hoje da compra de um autocarro, alterou aquilo que é o preço dos combustíveis”… Reconhendo que “os dados socioeconómicos / económico-financeiros que estiveram subjacentes ao estudo económico e financeiro para o concurso em 2019 hoje são muito diferentes”.
S.16. Mais reconheceu a AMP (Ré e aqui Recorrida) as “circunstâncias anormais que hoje se vivem ao nível dos custos”…E que, se fossem hoje apresentadas propostas, os preços propostos pelos concorrentes não seriam os mesmos – conduzindo a um contrato “extremamente onerado” (cf. artigos 92.º-93.º e 131.º da Contestação aos presentes autos). S.17. Além disso, a AMP também sabe que a sua “atualização” do EVEF não considera as restantes circunstâncias (que se somam à conjuntura pandémica e pós-pandémica) que alteraram os pressupostos socioeconómicos e económico-financeiros, sobretudo a nova conjuntura europeia de economia de guerra e a eclosão de uma crise energética global provocada pela guerra na Ucrânia.
S.18. Pelo que, como é do senso comum e contrariamente ao que a AMP “espera” / “estima”, tal alteração das circunstâncias perdurará.
S.19. Por fim, não podem as Recorrentes deixar de assinalar, no que concerne a ausência de fundamentação constante da pág. 221 da sentença recorrida, as notícias que correm no presente setembro sobre os graves níveis históricos de inflação no país (e no mundo) e mais, em concreto, o novo diploma do Governo português que fixa – no âmbito das medidas de apoio às famílias para mitigar o peso da inflação – o congelamento de todas as atualizações dos preços dos passes dos transportes públicos em 2023,
Que constituem factos notórios que podem e devem ser considerados pelo Tribunal (também de recurso), sempre nos termos do artigo 5.º n.º 2 al. c) CPC (ex vi artigo 1.º do CPTA).
S.20. Consequentemente, o Tribunal a quo andou mal na sua decisão, tendo baseado a sentença recorrida numa desatualizada/insuficiente, ausente e errada interpretação da realidade factual e errada interpretação e aplicação do direito aplicável, sobretudo dos termos do artigo 79.º do CCP.
Destarte, as alegações das AA. deveriam ter sido julgadas procedentes pelo Tribunal a quo.
Nestes termos e nos demais de Direito deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença proferida pelo Tribunal a quo, com as legais consequências, com o que fará este Venerando Tribunal inteira e sã,
JUSTIÇA!»

A AMP contra-alegou mas não formulou conclusões.
O Ministério Público junto deste TCA Norte, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não se pronunciou sobre o mérito do recurso.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
*
II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
Conforme jurisprudência firmada, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.

Assentes nas mencionadas premissas, as questões que se encontram submetidas à apreciação deste TCAN resumem-se a saber se a sentença recorrida:
b.1. enferma de nulidade pos obscruridade ou contraição entre a fundamentação e a decisão.
b.2. incorreu em erro de julgamento ao considerar que as Autoras não tinham interesse em agir quanto ao pedido formulado na alínea b) do petitório;
b.3. incorreu em erro de julgamento ao considerar que as Autoras não tinham interesse em agir quanto ao pedido formulado na alínea d) do petitório;
b.4. incorreu em erro de julgamento ao considerar que se verifica a exceção do caso julgado quanto à questão da falta de informação sobre os trabalhadores e quanto à questão da pandemia provocada pelo COVID 19 na alteração dos pressupostos que presidiram à decisão de contratar;
b.5 incorreu em erro de julgamento ao considerar que se verifica a exceção da inadequação do meio processual;
b.6. do não conhecimento dos vícios imputados ao ato de adjudicação, no caso de procedência do recurso quanto às exceções.
b.7. do erro de julgamento decorrente da prolação da decisão de adjudicação previamente à prolação do Acórdão do STA no âmbito do recurso de revista deduzido contra o Acórdão deste TCAN;
b.8 do erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo ao decidir não verificada a causa de não adjudicação prevista no n.º1 do artigo 79.º do CCP.
**
III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO
3.1. A 1.ª Instância julgou provados os seguintes factos:
«1. Com data de 09.01.2020, a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes remeteu à R. AMP um ofício, sob o «Assunto: Concurso Público para a Aquisição do Serviço Público de Transporte Rodoviário de Passageiros na Área Metropolitana do Porto», cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…) vimos pelo presente habilitar V.Exa. com o Parecer n.º 04/AMT/2020, de 9 de janeiro, desta autoridade, nos termos do consignado na alínea b) do n.º 2 do artigo 34.º do Decreto- Lei n.º 78/2014, de 14 de maio, quanto ao procedimento supra referenciado. (…)”. – cfr. fls. 4 do processo administrativo.
2. Do “Parecer n.º 04/AMT/2020 || Supervisão – Avaliação de políticas públicas e Monitorização Setorial”, datado de 09.01.2020, que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “(…)
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


(…)” – cfr. fls. 5 a 64 do processo administrativo;
3. Em 13.1.2020 o Primeiro Secretário da Comissão Executiva da Área Metropolitana do Porto emitiu proposta para, além do mais, abertura de procedimento de concurso público, com publicidade internacional, para “Aquisição do serviço público de transporte rodoviário de passageiros na Área Metropolitana do Porto”, doravante apenas Concurso, e aprovação do Programa de Concurso e Caderno de Encargos, da qual consta,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


- fls. 67 e ss. do p.a.
4. Por deliberação tomada em reunião de 16.1.2020 da Comissão Executiva Metropolitana do Porto a referida proposta foi aprovada, procedendo-se à abertura do procedimento de concurso público, com publicidade internacional, para “Aquisição do serviço público de transporte rodoviário de passageiros na Área Metropolitana do Porto” (doravante Concurso), com o preço base de € 394.485.119,00 e à aprovação das peças do procedimento. – cf. págs. 66 e ss. do p.a.
5. O Concurso foi publicitado no Diário República, II Série, n.º 17, de 24.1.2020, e no JO/S S17, de 24.1.2020, estabelecendo que o prazo de apresentação de propostas terminava em 20.3.2020 pelas 23.59h. – págs. 2082 e ss. do p.a.
6. Foram apresentados, entre outros, os seguintes pedidos de esclarecimentos, retificação e alteração das peças procedimentais, relativamente aos quais foram dadas as respostas que se indicam
Questão n.º 25
Objeto: Cláusula 53.ª do Caderno de Encargos
1) Erro ou omissão n.º 21 da TC...:
A Cláusula 53.ª do Caderno de Encargos viola manifestamente, o princípio da proporcionalidade (previsto no n.º 1 do artigo 1.º-A do CCP) e, ainda, o artigo 281.º do CCP, uma vez que prevê sanções que se revelam extremamente onerosas em face das concretas infrações. Exemplo paradigmático disso mesmo é a possibilidade de o Contraente Público aplicar uma coima variável entre 1.500,00€ e 5.000,00€ no caso de o Cocontratante “manter, num veículo do Material Circulante em serviço, o sistema de bilhética sem contacto avariado pelo período de duas horas, sendo cada veículo que permanece nessa situação em cada período adicional de 120 (cento e vinte) minutos, ainda que incompleto, considerado como uma infração sancionável autonomamente” [cf. al. b) do n.º 4 da Cláusula 53.ª do Caderno de Encargos]. Assim, a referida Cláusula deverá ser reformulada no sentido de passar a assegurar uma efetiva proporcionalidade entre as sanções impostas e as infrações cometidas.
Apreciação:
Não existe qualquer erro ou omissão na cláusula referida do Caderno de Encargos.
Para a entidade adjudicante, as infrações tipificadas na Cláusula 53.ª são incumprimentos com gravidade que justificam a aplicação de sanções que se situam entre os limites mínimos e máximos previstos nessa cláusula.
2) Erro ou omissão n.º 44 da ABREU ADVOGADOS:
53º do CE
A redação do art. 53º do CE e as situações descritas como passíveis de serem consideradas infrações são muito vagas, senão abrangentes, podendo gerar uma aplicação desmedida, sistemática e automática de sanções. Veja-se, a título de exemplo, que é considerada infração leve desde a não manutenção dos equipamentos afetos ao serviço em perfeitas condições de higiene e limpeza; ao desrespeito dos procedimentos de higiene e segurança no trabalho; à não manutenção em bom estado de conservação os materiais de informação ao público até à não atualização de informação ao público.
Em face do exposto, estamos perante um erro do Caderno de Encargos, por um lado porque traduz um risco imposto ao adjudicatário e, por outro lado, uma discricionariedade da AMP no preenchimento dos factos que geram infrações que se afigura, salvo o devido respeito, desconforme com a realidade, nos termos do art. 50º, n.º 2, alínea a) do CCP, pelo que se requer a sua retificação, de modo a que se possam concretizar, em relação a cada uma das alíneas do art. 53º, n.º 3 do CE as situações concretas que podem ser qualificadas como infrações leves.
Apreciação:
Não existe qualquer erro ou omissão na cláusula referida do Caderno de Encargos. Todas as infrações tipificadas na Cláusula 53.ª correspondem ao incumprimento de algumas obrigações contratuais fixadas no Caderno de Encargos.
[…]
Esclarecimento n.º 48 Objeto: Clausula 53.ª do Caderno de Encargos
2) Pergunta (Questão 6.2 da Arriva):
Tendo em conta a sanção referida na alínea a) do nº 4 desta Cláusula, solicita-se o esclarecimento de quem é a responsabilidade da fiscalização de títulos. Caso o concessionário opte por ter uma equipa de fiscalização perguntamos se o pode fazer e qual o mandato para o fazer?
Resposta: Compete ao Cocontratante garantir que os passageiros detêm títulos de transporte válidos, conforme previsto na alínea e) da Cláusula 33.ª do Caderno de Encargos. A credenciação dos agentes de fiscalização encontra-se regulada na Lei nº 28/2006, de 4 de julho, designadamente no seu artigo 5º.
- fls. 2132 e ss. do p.a.
7. Em reuniões de 12.3.2020 e 21.7.2020 da Comissão Executiva Metropolitana do Porto foram aprovadas a lista de erros e omissões e a retificação das peças do procedimento. – cfr- fls. 2096 e ss. do p.a.
8. Do Programa do Concurso revisto consta, além do mais,
Artigo 1.º
Objeto do concurso
1. O presente concurso público internacional, designado por “Concurso público para a contratação de serviço de transporte rodoviário de passageiros na Área Metropolitana do Porto” (doravante “Concurso”) tem por objeto a adjudicação de uma proposta para:
a) Lote 1: Prestação do serviço público de transporte de passageiros rodoviário regular na Rede “Norte Centro” constante do Anexo II ao Caderno de Encargos;
b) Lote 2: Prestação do serviço público de transporte de passageiros rodoviário regular na Rede “Norte-Nascente” constante do Anexo II ao Caderno de Encargos;
c) Lote 3: Prestação do serviço público de transporte de passageiros rodoviário regular na Rede “Norte-Poente” constante do Anexo II ao Caderno de Encargos;
d) Lote 4: Prestação do serviço público de transporte de passageiros rodoviário regular na Rede “Sul-Poente” constante do Anexo II ao Caderno de Encargos;
e
e) Lote 5: Prestação do serviço público de transporte de passageiros rodoviário regular na Rede “Sul-Nascente” constante do Anexo II ao Caderno de Encargos.
2. Cada concorrente pode apresentar proposta para todos ou só algum(ns) dos lotes identificados no número anterior.
(…)
3. O Anexo I ao Programa do Concurso contém informação estimativa respeitante à oferta relativa à exploração do serviço público de transporte de passageiros rodoviário objeto do concurso, sintetizada com base nas autorizações provisórias emitidas pela AMP e registadas no SIGGESC, a qual é apresentada a título meramente indicativo e não enquanto pressuposto que deva ser assumido para efeitos da preparação da proposta pelos concorrentes.
4. O Anexo VII contém informação, obtida através da execução do Programa de Apoio à Redução Tarifária (PART), relativa às validações dos títulos de assinatura mensal do sistema intermodal Andante e à receita tarifária associada, referentes ao último quadrimestre de 2019,
5. A informação que consta do Anexo I e do Anexo VII ao Programa do Concurso é apresentada a título meramente indicativo e não enquanto pressuposto que deva ser assumido para efeitos da preparação da proposta pelos concorrentes.
6. Foi obtido o parecer prévio vinculativo da Autoridade para Mobilidade e Transportes, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 78/2014, de 14 de maio, na redação atual.
[…]
Artigo 7.º
Concorrentes
1. (…)
2. Em cada lote, cada concorrente pode apresentar uma única proposta.
3. Em cada lote, o membro de um agrupamento concorrente não pode ser concorrente nem integrar outro agrupamento concorrente.
4. Todos os membros de um agrupamento concorrente são solidariamente responsáveis, perante a entidade adjudicante, pela manutenção da proposta apresentada.
5. (…)
6. Em caso de adjudicação, os membros do agrupamento adjudicatário, e apenas estes, devem constituir uma sociedade comercial nos termos previstos no presente Programa do Concurso.
[…]

Artigo 12.º
Prazo da obrigação de manutenção das propostas
O prazo da obrigação da manutenção das propostas é de 240 (duzentos e quarenta) dias.

Artigo 13.º
Critério de adjudicação e critério de desempate
1. Sem prejuízo do disposto no artigo 15.º, a adjudicação é feita segundo o critério da proposta economicamente mais vantajosa, tendo em conta o modelo de avaliação previsto no anexo V ao presente Programa do Concurso.
2. Em caso de empate, é utilizado como critério de desempate o fator Preço, sendo adjudicada a proposta que obtiver melhor pontuação parcial nesse fator.
3. Caso persista o empate após aplicação do(s) critério(s) definido(s) no(s) número(s) anterior(es), o desempate é feito por sorteio realizado pelo Júri na presença de um representante de cada um dos concorrentes.
4. Para a realização do sorteio nos termos do número anterior, o Júri deve comunicar aos concorrentes com propostas empatadas a data, a hora e o local da realização do sorteio, com antecedência mínima de 10 (dez) dias.
5. A falta, justificada ou não, de qualquer concorrente convidado nos termos do número anterior não impede a realização do sorteio referido no número anterior.
[…]
Artigo 15.º
Limites à adjudicação
1. Relativamente ao conjunto dos cinco lotes, só pode ser adjudicada uma proposta de entre:
a) As apresentadas pelo mesmo concorrente;
b) As apresentadas por concorrentes que sejam sociedades comerciais que estejam entre si em relação de domínio ou de grupo ou que se encontrem numa relação de domínio ou de grupo com uma mesma entidade;
c) As apresentadas por um concorrente individual e por um agrupamento concorrente em que um dos seus membros, cuja participação no capital social da sociedade comercial a constituir nos termos do Artigo 19.º seja igual ou superior a 50%, seja aquele concorrente individual;
d) As apresentadas por concorrente que seja sociedade comercial e por agrupamento concorrente em que um ou mais dos seus membros, cuja participação no capital social da sociedade comercial a constituir nos termos do Artigo 19.º seja, individual ou conjuntamente, igual ou superior a 50%, esteja(m) em relação de domínio ou de grupo com aquela ou em que esse(s) membro(s) do agrupamento concorrente e aquela se encontrem numa relação de domínio ou de grupo com uma mesma entidade;
e) As apresentadas por agrupamentos concorrentes em que um ou mais dos membros de um, cuja participação no capital social da sociedade comercial a constituir nos termos do Artigo 19.º seja, individual ou conjuntamente, igual ou superior a 50%, sejam membro (s) de outro, cuja participação no capital social da sociedade comercial a constituir nos termos do Artigo 19.º seja, individual ou conjuntamente, igual ou superior a 50%;
f) As apresentadas por agrupamentos concorrentes em que um ou mais dos membros de um, cuja participação no capital social da sociedade comercial a constituir nos termos do Artigo 19.º seja, individual ou conjuntamente, igual ou superior a 50%, esteja(m) em relação de domínio ou de grupo com um ou mais dos membros de outro, cuja participação no capital social da sociedade comercial a constituir nos termos do Artigo 19.º seja, individual ou
conjuntamente, igual ou superior a 50%, ou em que esse(s) membro(s) de um e outro agrupamento concorrentes se encontrem numa relação de domínio ou de grupo com uma mesma entidade.
2. Exclui-se do âmbito de aplicação do número anterior o(s) lote(s) em que exista uma única proposta suscetível de adjudicação.
3. Caso, de entre as propostas apresentadas por concorrentes que se encontrem entre si nalguma das situações previstas nas alíneas a) a f) do n.º 1, apenas uma estiver ordenada em primeiro lugar, esta é adjudicada.
4. Se, na sequência da aplicação do disposto no número anterior, existirem ainda lotes sem adjudicação em que as propostas ordenadas em primeiro lugar foram apresentadas por concorrentes que se encontrem entre si nalguma das situações previstas nas alíneas a) a f) do n.º 1 e aos quais não foi ainda adjudicada qualquer proposta nos termos do número anterior, a escolha da proposta a adjudicar rege-se, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 5 e 7, pelo seguinte:
a) São identificadas as propostas ordenadas em segundo lugar em cada um dos lotes em causa, sem consideração das propostas que se encontrem nalguma das situações previstas nas alíneas a) a f) do n.º 1 relativamente à proposta ordenada em primeiro lugar e daquelas que se encontrem nalguma das situações previstas nas alíneas a) a f) do n.º 1 relativamente a propostas apresentadas por concorrentes a quem venha a ser adjudicada proposta nos termos do n.º 3;
b) É adjudicada a proposta ordenada em primeiro lugar, relativamente à qual haja maior diferença de pontuação para a proposta ordenada em segundo lugar, identificada nos termos da alínea anterior;
c) Caso seja igual a diferença de pontuação, a escolha da proposta a adjudicar é feita segundo a seguinte ordem de preferência de lotes: Lote 2 > Lote 1 > Lote 4 > Lote 5 > Lote 3.
5. Se, na sequência da aplicação do disposto nos n.ºs 3 e 4, ainda existirem lotes sem adjudicação, deve repetir-se, com as devidas adaptações, a aplicação desses n.ºs 3 e 4 para os efeitos da adjudicação nesses lotes, sem consideração das propostas que se encontrem nalguma das situações previstas nas alíneas a) a f) do n.º 1 relativamente a propostas apresentadas por concorrentes a quem venha a ser adjudicada proposta nos termos do n.º 3 ou do n.º 4.
6. Se, na sequência da aplicação do disposto no número anterior, ainda existirem lotes sem adjudicação, é sucessivamente aplicável o disposto nesse número.
7. Se a regra de desconsideração de propostas prevista na alínea a) do n.º 4 e no n.º 5, conduzir à impossibilidade de aplicação dos mecanismos de seleção de propostas previstos nesses números, são adjudicadas as propostas ordenadas em primeiro lugar nos lotes em causa, independentemente do limite à adjudicação previsto no presente artigo.
8. Para efeitos do disposto no presente artigo, são relações de domínio ou de grupo, independentemente de os domicílios ou sedes das sociedades em causa se situarem em Portugal ou no estrangeiro, as relações previstas, respetivamente, no artigo 486.º e nos artigos 488.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais.
9. Será celebrado um contrato para cada lote.
Artigo 16.º
Documentos de habilitação
1. No prazo de 10 (dez) dias a contar da notificação da decisão de adjudicação, o adjudicatário deve, em cumprimento do disposto na Portaria n.º 372/2017, de 14 de dezembro, apresentar na plataforma referida no artigo 4.º:
a) Os documentos de habilitação referidos no n.º 1 do artigo 81.º do Código dos Contratos Públicos; e
b) A licença emitida pela entidade legalmente competente para o exercício da atividade de transporte rodoviário de passageiros, que se encontre válida à data da respetiva apresentação.
2. Caso o adjudicatário revista a forma de um agrupamento, os documentos de habilitação devem ser apresentados por todos os seus membros, com exceção do documento previsto na alínea b) do número anterior, o qual deve ser apresentado por pelo menos um dos membros do agrupamento.
3. Os documentos referidos no n.o 1 devem ser redigidos em língua portuguesa ou, no caso de não o serem pela sua própria natureza ou origem, são obrigatoriamente acompanhados de tradução devidamente legalizada e em relação à qual o adjudicatário declare a respetiva prevalência sobre os originais.
4. Caso se verifique um facto que determina a caducidade da adjudicação nos termos do n.º 1 do artigo 86.º do Código dos Contratos Públicos e esse facto não seja imputável ao adjudicatário, este dispõe de um prazo adicional para a apresentação dos documentos em falta, a conceder em função das razões indicadas, de até 30 (trinta) dias, podendo ser renovado, pelo mesmo prazo, a pedido do adjudicatário, sob pena de caducidade da adjudicação.
Artigo 17.º
Caução
1. Para garantia da celebração do contrato e do exato e pontual cumprimento de todas as obrigações legais e contratuais, o adjudicatário ou a sociedade comercial constituída nos termos do Artigo 19.º (caso já se encontre constituída), deve prestar uma caução correspondente a 10,5 (dez e meio) % do produto do preço unitário por quilómetro indicado na Proposta, para efeitos da alínea a) do n.º 1 da cláusula 42.ª do Caderno de Encargos, pelo valor da produção quilométrica anual previsto para o lote em causa no Anexo III ao Caderno de Encargos.
2. A caução deve ser prestada no prazo de 10 (dez) dias a contar da notificação da decisão de adjudicação da proposta, em conformidade com um dos modelos constantes do Anexo VI ao presente Programa do Concurso, devendo a sua prestação ser comprovada até ao dia imediato ao do termo do prazo para a respetiva prestação.
Artigo 18.º
Decisão de adjudicação e notificação à AdC
1. Caso da decisão de adjudicação resulte uma operação de concentração notificável à Autoridade da Concorrência (AdC) ao abrigo do regime jurídico da concorrência aplicável, o adjudicatário deve, no prazo de 20 (vinte dias) após a notificação da decisão de adjudicação, notificar a operação de concentração à AdC.
2. O adjudicatário informa imediatamente a entidade adjudicante da notificação referida no número anterior e mantém‐na atualizada sobre os desenvolvimentos do procedimento.
3. No caso previsto no n.º 1, fica suspensa a fase pós‐adjudicatória do presente concurso, sem prejuízo da necessidade de cumprimento integral do disposto nos Artigos 16.º e 17.º pelo adjudicatário.
4. A decisão final da AdC no procedimento deve ser comunicada pelo adjudicatário à entidade adjudicante, no dia imediatamente subsequente.
5. No caso de a decisão da AdC ser de não oposição à operação, sem imposição de condições ou obrigações (expressa ou tácita, nos termos legalmente admissíveis), ou no sentido de a operação não estar abrangida por procedimento de controlo prévio de acordo com a lei aplicável, reinicia‐se a fase pós‐adjudicatória do presente
concurso a partir da data de comunicação referida no número anterior.
6. No caso de a decisão da AdC ser de oposição à operação, a entidade adjudicante, após tal decisão lhe ter sido comunicada nos termos do n.º 4, declara a caducidade da decisão de adjudicação, após audiência prévia do adjudicatário.
7. No caso de a decisão da AdC ser de não oposição, com imposição de condições ou obrigações, o adjudicatário deve pronunciar‐se, no prazo de 15 (quinze) dias a contar da data de notificação da decisão da AdC, sobre as condições e obrigações impostas pela AdC, com observância do disposto nos números seguintes.
8. Se o adjudicatário considerar que as condições ou obrigações impostas pela decisão da AdC subvertem o equilíbrio financeiro do contrato a celebrar, ou que, em qualquer caso, não está em condições de dar cumprimento a alguma dessas condições ou obrigações, o adjudicatário comunica os factos à entidade adjudicante e esta declara a caducidade da decisão de adjudicação.
9. Se a entidade adjudicante considerar que as condições ou obrigações impostas pela decisão da AdC implicam uma alteração substancial do caderno de encargos ou, caso entenda que o cumprimento dessas condições e/ou obrigações, pelo adjudicatário, não é legalmente admissível, a entidade adjudicante declara, após audiência prévia, a caducidade da decisão de adjudicação.
10. No caso de não se verificar o disposto no número anterior e, cumulativamente, de o adjudicatário manifestar que aceita cumprir as condições e/ou obrigações impostas pela AdC, ou de o adjudicatário não se pronunciar depois de decorrido oprazo de 15 (quinze) dias previsto no n.º 7, reinicia‐se a fase pós‐adjudicatória do presente concurso, a partir da data de notificação do adjudicatário à entidade adjudicante da aceitação das condições impostas pela AdC ou do termo do prazo de 15 (quinze) dias referido no n.º 7, consoante o caso.
11. Declarada a caducidade da adjudicação nos termos do presente artigo, é adjudicada no lote em causa a proposta melhor classificada de acordo com o critério de adjudicação previsto no Artigo 13.º, sem consideração dos limites à adjudicação previstos no artigo 15.º.
12. A declaração de caducidade da adjudicação previstas no presente artigo não conferem ao adjudicatário o direito a qualquer indemnização e, além dos efeitos próprios da caducidade, pode determinar ainda a responsabilidade pré‐contratual do adjudicatário, nos termos gerais.
13. Caso, de acordo com o regime jurídico aplicável, esteja em causa uma operação de concentração notificável a outras entidades competentes que não a AdC, aplica‐ se, com as devidas adaptações, o regime previsto no presente artigo.
Artigo 19.º
Constituição da sociedade comercial em caso de adjudicação a agrupamento concorrente
1. O adjudicatário que seja um agrupamento de pessoas singulares ou coletivas, deve constituir uma sociedade comercial, com a qual irá ser outorgado o Contrato, devendo a participação dos membros do agrupamento adjudicatário no capital social observar o indicado na Proposta.
2. O adjudicatário deve comprovar o cumprimento do disposto no número anterior, incluindo a realização integral do capital social da sociedade cocontratante no momento da sua constituição, através da entrega à entidade adjudicante, no prazo de 30 (trinta) dias a contar da notificação da decisão de adjudicação ou no prazo de 10 (dez) dias a contar do reinício da fase pós-adjudicatória do presente concurso nos termos do n.º 5 ou do n.º 10 do artigo anterior, caso haja lugar à aplicação do disposto no n.º 3 do mesmo artigo, dos seguintes documentos:
[…]
3.No caso de a caução prevista nos termos do Artigo 17.º ter sido prestada pelo adjudicatário, a sociedade cocontratante deve, no prazo de 35 (trinta e cinco) dias contados da notificação da decisão de adjudicação, ou no prazo de 15 (quinze) dias a contar do reinício da fase pós-adjudicatória do presente concurso nos termos do n.º 5 ou do n.º 10 do artigo anterior, quando haja lugar à aplicação do disposto no n.º 3 do mesmo artigo, prestar, em observância do disposto no Artigo 17.º, uma caução equivalente que substitui aquela prestada pelo adjudicatário nos termos do Artigo 17.º ou apresentar à entidade adjudicante comprovativo da assunção pela sociedade cocontratante da totalidade dos direitos e obrigações do adjudicatário
associados à caução por este prestada desde que os termos dessa assunção sejam previamente considerados satisfatórios pela entidade adjudicante.
4. No prazo de 50 (cinquenta) dias contados da notificação da decisão de adjudicação ou no prazo de 30 (trinta) dias a contar do reinício da fase pós-adjudicatória do presente concurso nos termos do n.º 5 ou do n.º 10 do artigo anterior, quando haja lugar à aplicação do disposto no n.º 3 do mesmo artigo, a sociedade cocontratante deve comprovar à entidade adjudicante que é titular da licença emitida pela entidade legalmente competente para o exercício da atividade de transporte rodoviário de passageiros, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 3/2001, de 10 de janeiro, que se encontre válida à data da respetiva apresentação.
5. A pedido fundamentado do adjudicatário, a entidade adjudicante pode prorrogar os prazos estabelecidos nos n.ºs 2, 3 e 4.
6. Em caso de incumprimento do disposto no presente artigo, a entidade adjudicante, após audiência prévia dos interessados, declara a caducidade da decisão de adjudicação e executa a caução prestada.
7. No caso de caducidade da adjudicação nos termos do número anterior, é adjudicada no lote em causa a proposta melhor classificada, de acordo com o critério de adjudicação previsto no artigo 13.º, sem consideração dos limites à adjudicação previstos no artigo 15.º.
8. A caducidade da adjudicação prevista na presente cláusula não confere ao adjudicatário, nem à sociedade cocontratante (caso se encontre já constituída), o direito a qualquer indemnização e pode determinar, nos termos gerais de direito, a sua responsabilidade pré‐contratual.
- cfr. fls. 2468 do p.a.
9. O Programa de Concurso é integrado, além do mais, pelos Anexos I – “Rede existente 2017” e 5 – Modelo de Avaliação das Propostas, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, constando deste último,
1. A avaliação das propostas será efetuada de acordo com o modelo seguinte e com o disposto no artigo 139.º do Código dos Contratos Públicos.
2. A pontuação global de cada proposta resultará da aplicação de um modelo aditivo simples de agregação das pontuações parciais obtidas por cada proposta p em cada um dos seguintes fatores e respetivos coeficientes de ponderação:
1. Preço: 50 %
2. Qualidade: 50 %
O referido modelo aditivo simples é operacionalizado pela seguinte expressão:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
Em que,
PG(p) é a pontuação global da Proposta p
PFi(p) é a pontuação parcial da Proposta p nos fatores i º (1; 2)
Ki é o coeficiente de ponderação da pontuação parcial obtida nos fatores i º (1; 2)
Será adjudicada a proposta que obtenha a pontuação global, PG(p), mais elevada.
3. Fator Preço
No fator Preço, as propostas são pontuadas de acordo com a seguinte expressão matemática:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
em que
PF1 – é a pontuação atribuída à Proposta no fator Preço;
Pi – é o valor em euros, constante da Proposta, para o preço unitário por quilómetro a que se refere a alínea a) do n.º 1 da Cláusula 42.ª do Caderno de Encargos, o qual não pode ser superior a € 1,70 (um euro e setenta cêntimos) sob pena de exclusão da proposta.
4. Fator Qualidade
No fator Qualidade, as propostas são pontuadas de acordo com a seguinte expressão matemática:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
em que
PF2 – é a pontuação atribuída à Proposta no fator Qualidade;
Pi – é a pontuação, de acordo com a tabela seguinte(1)(2), atribuída à classe de emissões mínima, indicada na Proposta, nos termos do n.º 4 da Cláusula 18.ª do Caderno de Encargos, para cada veículo que integra o Material Circulante, a qual não pode ser inferior a EURO III durante os primeiros três Anos Contratuais:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
ni – é o número de veículos que integram a Proposta em cada classe de emissões apresentado na tabela acima.
A pontuação global da proposta p resulta de:
PG(p) = PF1 x 0,50 + PF2 x 0,50
5. Todas as pontuações obtidas são arredondadas à 2.ª casa decimal, de acordo com as regras da norma portuguesa NP37/2009.
– fls. 94 a 106 do p.a.
10. Do Caderno de Encargos revisto extrai-se que,
“CLÁUSULA 5.ª
Objeto
1. O Contrato tem por objeto a aquisição do serviço público de transporte de passageiros regular, por modo rodoviário, abrangendo um dos seguintes lotes:
a) Lote 1: Prestação do serviço público de transporte de passageiros regular, por modo rodoviário, na unidade territorial “Norte Centro”, delimitada nos termos do Anexo I ao Caderno de Encargos, e cuja Rede consta do Anexo II ao Caderno de Encargos;
b) Lote 2: Prestação do serviço público de transporte de passageiros regular, por modo rodoviário, na unidade territorial “Norte Nascente”, delimitada nos termos do Anexo I ao Caderno de Encargos, e cuja Rede consta do Anexo II ao Caderno de Encargos;
c) Lote 3: Prestação do serviço público de transporte de passageiros regular, por modo rodoviário, na unidade territorial “Norte Poente”, delimitada nos termos do Anexo I ao Caderno de Encargos, e cuja Rede consta do Anexo II ao Caderno de Encargos;
d) Lote 4: Prestação do serviço público de transporte de passageiros regular, por modo rodoviário, na unidade territorial “Sul Poente”, delimitada nos termos do Anexo I ao Caderno de Encargos, e cuja Rede consta do Anexo II ao Caderno de Encargos; e
e) Lote 5: Prestação do serviço público de transporte de passageiros regular, por modo rodoviário na unidade territorial “Sul Nascente” delimitada nos termos do Anexo I ao Caderno de Encargos, e cuja Rede consta do Anexo II ao Caderno de Encargos.
2. O serviço público objeto do Contrato nos termos do número anterior está sujeito às obrigações de serviço público expressamente impostas no presente Caderno de Encargos, designadamente:
a) A obrigação de operar a Rede nos termos previstos no Caderno de Encargos;
b) A obrigação de disponibilizar os títulos de transporte e aplicar as tarifas previstos no Anexo VI;
c) A obrigação de prestar a informação prevista no Caderno de Encargos.
3. A Rede constante do Anexo II ao Caderno de Encargos deve ser complementada com a descrição da oferta exigida na Prestação de Serviços que consta do Plano de Oferta descrito no Anexo III ao Caderno de Encargos para o primeiro Ano Contratual e dos Planos de Oferta anualmente elaborados pelo CONTRAENTE PÚBLICO para os Anos Contratuais seguintes, nos termos da Cláusula 11.ª.
4. A produção quilométrica mensal e anual de referência de cada uma das Redes referidas no n.º 1 é a prevista no Plano de Oferta constante do Anexo III ao Caderno de Encargos, sendo relevante, designadamente, para os efeitos da aplicação do disposto na Cláusula 42.ª.
5. O COCONTRATANTE goza do direito de prestar o serviço objeto do Contrato em regime de exclusivo, nos termos previstos no artigo 27.º do RJSPTP, sem prejuízo da tomada e largada de passageiros pelo operador interno SP..., S. A., pelo(s) adjudicatário(s) dos demais lotes previstos no n.º 1, bem como pelos operadores das linhas inter-regionais não abrangidas na Rede e cuja gestão foi atribuída a outras autoridades de transportes.
6. Exceto quando especificamente previsto para qualquer dos lotes referidos no n.º 1, as disposições do Caderno de Encargos aplicam-se a todos os lotes.
CAPÍTULO III
DURAÇÃO DO CONTRATO
CLÁUSULA 6.ª
Produção de efeitos e duração do contrato
1. O Contrato produz efeitos a partir das 00h00m do primeiro dia do mês seguinte àquele em que ao COCONTRATANTE seja notificada pelo CONTRAENTE PÚBLICO a emissão de visto prévio pelo Tribunal de Contas.
2. O Contrato tem a duração de 7 (sete) anos contados da data do início do Período de Funcionamento Normal.
CAPÍTULO IV
FASES DE EXECUÇÃO DO CONTRATO
CLÁUSULA 7.ª
Período de transição
1. Com o início da vigência do Contrato inicia-se um Período de Transição durante o qual o COCONTRATANTE não assume obrigações de Operação e Manutenção e deve obter, caso ainda não tenha obtido, todas as licenças e autorizações necessárias para a Prestação de Serviços, assim como ultimar o desenvolvimento de todas as ações de preparação da sua estrutura (incluindo, entre outros, recursos humanos e meios técnicos) que se mostrem adequadas ou necessárias para assumir as obrigações decorrentes da Prestação de Serviços.
2. Sem prejuízo do disposto nos n.ºs 8 e 10, o Período de Transição termina no último dia do 6.º (sexto) mês a contar do início da vigência do Contrato, contando-se como 1.º mês o mês do início da produção de efeitos do Contrato nos termos do n.º 1 da cláusula anterior.
(…)
8. No caso de o COCONTRATANTE conseguir reunir todas as condições necessárias para a assunção plena de todas as obrigações do Contrato antes do termo do prazo de 6 (seis) meses previsto no n.º 2, o COCONTRATANTE pode pedir ao CONTRAENTE PÚBLICO a redução, em um, dois, três ou quatro meses, da duraçãodo Período de Transição, devendo este decidir no prazo de 5 (cinco) dias a contar da data de receção do requerimento.
9. O disposto no número anterior não implica a atribuição ao COCONTRATANTE de algum direito à redução da duração do Período de Transição.
10. No caso de o COCONTRATANTE não reunir, findo o Período de Transição, as condições necessárias para a assunção plena de todas as obrigações do Contrato por facto que não lhe seja imputável, o COCONTRATANTE deve informar imediatamente, e nunca depois de iniciados os últimos 15 (quinze) dias imediatamente anteriores a esse termo, o CONTRAENTE PÚBLICO, podendo este, tendo em conta a informação fundamentada prestada, conceder-lhe uma prorrogação da duração do Período de Transição para a conclusão das diligências em falta. (…)
12. A duração da prorrogação referida no n.º 10 depende do tipo e da gravidade dos factos invocados não imputáveis ao COCONTRATANTE.
[…]
CLÁUSULA 8.ª
Período de Funcionamento Normal
1. O Período de Funcionamento Normal, durante o qual a Prestação de Serviços produz a plenitude dos seus efeitos, inicia-se no dia seguinte ao termo do Período de Transição e termina na data em que o Contrato se extinguir, qualquer que seja a causa da extinção.
2. Durante o Período de Funcionamento Normal, o COCONTRATANTE deve cumprir integralmente todas as obrigações constantes da lei aplicável e do Contrato, não sendo admitida qualquer interrupção ou quebra de continuidade nas atividades objeto do Contrato, salvo situações especialmente previstas na Lei ou no Contrato.
[…]
CLÁUSULA 10.ª
Obrigações gerais do COCONTRATANTE
1. O COCONTRATANTE obriga-se a realizar a Prestação de Serviços em perfeita conformidade com o disposto no Contrato, designadamente cumprindo a Rede correspondente ao lote que lhe é adjudicado, bem como com as disposições legais e regulamentares que, em cada momento, estejam em vigor.
2. Constitui obrigação do COCONTRATANTE disponibilizar, para efeitos da Prestação de Serviços, todos os bens que se mostrem necessários ou convenientes à boa prossecução das atividades compreendidas no Contrato, por forma a assegurar, nomeadamente, que os serviços são prestados com o grau de qualidade estabelecido no Contrato e que é satisfeita a procura a cada momento verificada.
3. Os bens referidos no número anterior incluem, designadamente:
a) O Material Circulante, nos termos da Cláusula 18.ª;
b) O sistema de bilhética, nos termos da Cláusula 17.ª; e
c) O equipamento para transmissão da informação de operação em tempo real, nos termos previstos na Cláusula 38.ª. 4. Os bens a disponibilizar pelo COCONTRATANTE para efeitos da Prestação de Serviços pelo COCONTRATANTE devem, sem prejuízo de outras exigências legais, regulamentares e contratuais aplicáveis, satisfazer os seguintes requisitos mínimos:
a) Ter características e qualidade adequadas à finalidade a que se destinam e terem sido fabricados e executados de acordo com as respetivas especificações técnicas, ou, se estas não existirem, de acordo com as melhores regras e métodos da arte, salvo no caso de se tratar de soluções inovadoras, desde que previamente aceites pelo CONTRAENTE PÚBLICO; e
b) Ser concebidos de acordo com os requisitos de segurança e as normas adequadas ao funcionamento fiável de um sistema de transporte rodoviário de passageiros, moderno, seguro e plenamente operacional.
(…)
6. Caso se verifique que os bens utilizados pelo COCONTRATANTE para a execução do Contrato são desadequados ou insuficientes para assegurar a boa prossecução da Prestação de Serviços, o CONTRAENTE PÚBLICO pode, no âmbito dos seus poderes de direção, emitir ordens e orientações com vista a corrigir a desadequação ou insuficiência verificada, a que o COCONTRATANTE fica vinculado, nos termos legais.
(…)
9. No âmbito das atividades de Operação, o COCONTRATANTE é designadamente responsável por:
a) Garantir a boa execução do Contrato, de forma regular e contínua, de modo a assegurar um serviço público de transporte de passageiros de qualidade, rápido, seguro e eficiente, satisfazendo as necessidades de procura verificadas em cada momento;
b) Assegurar o cumprimento do Plano de Operação referido na Cláusula 11.ª;
c) Prestar os serviços de transporte objeto do Contrato a todos os Utentes, sem qualquer discriminação quanto às condições de acesso e de realização, para além das que sejam impostas pelo regime tarifário;
d) Dispor de recursos humanos em qualidade e número adequados para levar a cabo as ações exigidas pela Operação;
e) Cumprir os condicionamentos ou limitações impostas pelas autoridades competentes e que se projetem na atividade de Operação, nos termos das disposições legais e regulamentares vigentes em cada momento;
f) Obter e atualizar todas as autorizações e/ou licenças para os recursos humanos e para a Operação;
g) Cumprir as normas legais, contratuais e regulamentares aplicáveis às atividades de Operação, incluindo as previstas no Decreto-Lei n.º 9/2015, de 15 de janeiro, relativo ao contrato de transporte rodoviário de passageiros;
h) Cumprir devidamente todos os deveres gerais de informação e comunicação previstos na legislação e regulamentação aplicáveis, sobretudo os constantes do artigo 22.º do RJSPTP e dos regulamentos da AMT; e
i) Articular-se com terceiros que interajam na Prestação de Serviços, designadamente com os operadores dos serviços públicos integrantes dos outros lotes previstos na Cláusula 5.ª que não se encontram adjudicados ao COCONTRATANTE, com o operador interno SP..., S. A. e com os operadores da linhas inter-regionais e municipais da competência de outras autoridades de transportes. […]
CLÁUSULA 12.ª
Gestão de eventos não previstos e de variações pontuais de procura
1. O COCONTRATANTE é responsável pela gestão da Operação de modo a adequá-la, imediatamente e por sua iniciativa, a eventos não previstos nos Planos de Operação em vigor ocorridos durante a Operação, nomeadamente condicionamentos de trânsito, de modo a salvaguardar o interesse público do serviço objeto da Prestação de Serviços, com o menor transtorno possível para os Passageiros e minimização de desvios aos Percursos e horários definidos no Plano de Operação em vigor.
2. A gestão de eventos imprevistos referidos no número anterior está dispensada de autorização prévia do Contraente Público e da adaptação ao Plano de Operação em vigor prevista na Cláusula 11.ª quando a mesma não seja compatível com a ocorrência dos eventos em causa, mas deve ser comunicada ao COCONTRATANTE no prazo mais curto possível.
3. O COCONTRATANTE deve proceder, por iniciativa própria, ao reforço da oferta do serviço público de transporte para satisfazer o aumento ocasional de procura que previsivelmente se verificará em determinado(s) horário(s), designadamente, em virtude da ocorrência de eventos, feiras ou festas sociais, populares ou culturais em alguma(s) parte(s) da área geográfica abrangida pela Rede.
4. O reforço da oferta do serviço público de transporte previsto no número anterior concretiza-se na adoção das medidas mais adequadas às circunstâncias concretas, designadamente através da disponibilização de Material Circulante com maior capacidade de passageiros e/ou do aumento das frequências.
5. O COCONTRATANTE apenas pode adotar medida diferente da utilização de Material Circulante com maior capacidade de passageiros quando não exista disponibilidade de Material Circulante com essas características no horário em causa.
6. As alterações previstas na presente cláusula conferem ao COCONTRATANTE o direito previsto no n.º 4 da Cláusula 42.ª, na medida da verificação dos pressupostos aí estabelecidos, ou nos n.ºs 3 e 4 da Cláusula 48.ª, consoante o caso.
CLÁUSULA 13.ª
Ajustamentos pontuais
1. O CONTRAENTE PÚBLICO pode, por razões de interesse público e mediante decisão unilateral fundamentada, determinar ajustamentos pontuais dos serviços incluídos no Contrato, nos termos do artigo 31.º do RJSPTP.
[…]
CLÁUSULA 14.ª
Variação da produção quilométrica
1. Independentemente da possibilidade de determinar serviços complementares e serviços a menos nos termos da lei e para além do disposto na cláusula anterior, a produção quilométrica mensal prevista, para cada mês, no Anexo III ao Caderno de Encargos (sem consideração de quaisquer alterações a este anexo ao longo da vigência do Contrato) pode variar, a pedido do CONTRAENTE PÚBLICO ou mediante autorização deste ou ainda nos casos comunicados ao CONTRAENTE PÚBLICO nos termos do n.º 2 da Cláusula 12.ª, conquanto, em cada mês, a produção quilométrica correspondente não varie mais de 10 (dez) %.
2. Para efeitos do número anterior, são variações à produção quilométrica mensal as que ocorram por força do disposto nas Cláusula 11.ª, Cláusula 12.ª, por força de alguns desvios dos percursos constantes dos Planos de Operação por causa não imputável ao COCONTRATANTE devidamente autorizados pelo CONTRAENTE PÚBLICO ou na sequência de quaisquer pedidos pelo CONTRAENTE PÚBLICO, com fundamento designadamente nos planos de transporte escolar aprovados nos termos da lei, nas variações supervenientes da procura, nas alterações
urbanísticas ou na concretização de novas políticas públicas respeitantes ao setor
do transporte público de passageiros.
3. À verificação do limite percentual previsto no n.º 1 aplica-se o disposto no n.º 5 da Cláusula 42.ª.
4. O COCONTRATANTE está obrigado a executar o serviço de transporte correspondente às variações da produção quilométrica previstas na presente cláusula, nos exatos termos previstos no presente Caderno de Encargos e no Contrato.
5. As variações à produção quilométrica previstas na presente cláusula conferem ao COCONTRATANTE os direitos previstos no n.º 4 da Cláusula 42.ª, na medida da verificação dos pressupostos aí estabelecidos.
CLÁUSULA 15.ª
Títulos de transporte
1. Não podem ser transportados Utentes sem título de transporte válido.
2. Os únicos títulos de transporte que o COCONTRATANTE pode disponibilizar no serviço público de transporte integrado na Prestação de Serviços são os títulos Andante, cuja configuração vigente à data de lançamento do concurso está prevista no Anexo VI ao Caderno de Encargos, com exceção do título referido no n.º 4 seguinte.
3. Para efeitos do cumprimento do disposto no número anterior, o COCONTRATANTE deve aderir ao Sistema Intermodal Andante (SIA).
[…]
CLÁUSULA 16.ª
Tarifário
1. O tarifário a aplicar pelo COCONTRATANTE e o regime da respetiva atualização encontram-se definidos no Anexo VI ao Caderno de Encargos.
CLÁUSULA 17.ª
Sistema de bilhética
1. O COCONTRATANTE deve utilizar um sistema de bilhética integrado sem contacto credenciado pelo TIP que tem de estar em plena operação no início do Período de Funcionamento Normal e em integral conformidade com o disposto no Caderno de Encargos, particularmente no Anexo VII, e na legislação vigente, designadamente em matéria de proteção de dados pessoais e de informação confidencial ou segredo de negócio.
2. No que se refere aos equipamentos do sistema de bilhética, o COCONTRATANTE é responsável:
a) Pela instalação, manutenção e substituição de equipamentos que permitam a validação dos títulos de transporte no Material Circulante;
b) Pela proteção e preservação dos equipamentos de bilhética, nomeadamente os validadores, de modo a que não sejam danificados; e
c) Pelas atividades de Manutenção.
3. O COCONTRATANTE deve ainda:
a) Assegurar a sua compatibilidade integral com a unidade central do Sistema Intermodal Andante (SIA);
b) Prestar assistência aos Utentes na utilização do sistema de bilhética;
c) Supervisionar o funcionamento dos equipamentos de bilhética, reparando de imediato quaisquer anomalias ou avarias neles detetadas;
d) Implementar ações de melhoria contínua no Sistema de Bilhética tendo por base as informações recolhidas junto de Utentes;
e) Zelar pelo normal funcionamento do sistema de bilhética.
CLÁUSULA 18.ª
Material circulante
1. O COCONTRATANTE obriga-se a disponibilizar o Material Circulante necessário à Operação, o qual deve observar, no mínimo, as exigências previstas na legislação aplicável, no presente Caderno de Encargos e na Proposta
2. O COCONTRATANTE deve utilizar a tipologia de veículo mais adequada à execução regular e eficiente da Prestação de Serviços, tendo em conta, designadamente o nível de procura do serviço e as condições rodoviárias que caracterizam o percurso do serviço.
3. O COCONTRATANTE deve afetar à Operação, no mínimo, o número de veículos indicado na Proposta, o qual, consoante o lote em causa, deve respeitar os seguintes limites máximo e mínimo durante todo o Contrato, salvo se as alterações supervenientes à produção quilométrica prevista no Anexo III ao Caderno de Encargos justificarem a disponibilização pelo COCONTRATANTE de uma quantidade diferente de veículos necessária à Prestação de Serviços:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
4. Durante os primeiros três Anos Contratuais, cada um dos veículos que integram o Material Circulante a que se refere o número anterior deve apresentar, no mínimo, a respetiva classe de emissões indicada na Proposta, a qual não pode ser inferior a EURO III, de acordo com a classificação prevista na legislação aplicável.
5. A partir do primeiro dia do 4.º (quarto) Ano Contratual, todos os veículos que integram o Material Circulante devem apresentar, no mínimo, a classe de emissões EURO IV, sem prejuízo da necessidade de respeitar a respetiva classe de emissões indicada na Proposta nos termos do número anterior, caso esta seja superior à classe de emissões EURO IV.
6. Ao longo da vigência do Contrato, a idade média do Material Circulante, ponderada pelos quilómetros realizados por cada veículo que o integra, não pode ultrapassar os seguintes limites máximos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
[…]
8. O Material Circulante deve apresentar ainda as seguintes características mínimas:
a) Dispor de painel para informação ao público, visível do exterior, com indicação do código da linha que o veículo serve (à frente e atrás do veículo) e do destino da linha em operação (à frente do veículo);
b) Ter ar condicionado;
c) Ser equipado com o sistema de bilhética referido na Cláusula 17.ª, um sistema de geolocalização por GPS – Global Positioning System ou sistema de posicionamento global e o sistema de transmissão de dados referido na Cláusula 38.ª;
d) Ter um layout em conformidade com o disposto no manual de imagem a entregar pelo CONTRAENTE PÚBLICO nos primeiros 20 (vinte) dias do Período de Transição.
9. Ao longo da execução do Contrato, o COCONTRATANTE pode substituir veículos do Material Circulante, disponibilizar mais veículos à Prestação de Serviços ou retirar veículos do Material Circulante, desde que, independentemente da alteração da tipologia do veículo:
a) Os novos veículos cumpram as exigências do Caderno de Encargos e da legislação aplicável e respeitem as características indicadas na Proposta;
b) A idade média mensal, ponderada pelos quilómetros realizados, do Material Circulante que se encontre afeto à Prestação de Serviços à data da alteração da composição do Material Circulante seja mantida ou reduzida;
c) Os novos veículos apresentem uma classe de emissões igual ou superior àquela dos substituídos ou, em caso de veículos suplementares, devem apresentar, no mínimo, a classe de emissões prevista nos n.ºs 4 ou 5, consoante o caso;
[…]
CLÁUSULA 19.ª
Utilização dos bens e direitos para outras atividades
1. Para o efeito do disposto no n.º 8 da Cláusula 10.ª, fica autorizada, nos termos da presente cláusula, a utilização dos bens e direitos previstos na Cláusula 10.ª para o exercício pelo COCONTRATANTE das seguintes atividades:
a) Atividades publicitárias;
b) Serviço público de transporte de passageiros que não integre o presente Contrato, designadamente serviço público de transporte expresso;
c) Serviço de transporte comercial de passageiros, considerado como tal qualquer serviço de transporte que não é qualificável como “serviço público de transporte de passageiros” nos termos da alínea n) do artigo 3.º do RJSPTP.
2. O COCONTRATANTE deve garantir que a utilização dos bens referidos no número anterior para os efeitos aí previstos seja realizado em plena conformidade com a legislação aplicável e não prejudique o funcionamento normal e com qualidade da Prestação de Serviços, devendo sempre prevalecer o cumprimento da Prestação de Serviços no caso da impossibilidade de cumprimento em simultâneo desta e das demais atividades do COCONTRATANTE.
3. O COCONTRATANTE assume a totalidade de risco inerente à utilização dos bens e direitos referidos no n.º 1 para o exercício das atividades ali previstas, cabendo-lhe totalmente a responsabilidade pelo investimento nessas atividades
[…]
CLÁUSULA 20.ª
Manutenção
1. O COCONTRATANTE obriga-se a realizar a Manutenção dos bens que disponibiliza nos termos da Cláusula 10.ª, em perfeita conformidade com o disposto no Contrato, observando, designadamente, o disposto na presente Secção e nas disposições legais e regulamentares em vigor.
2. Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o COCONTRATANTE é responsável, designadamente, pela realização das seguintes atividades ou conjunto de atividades de Manutenção:
a) Programar, planear, implementar e executar todas as atividades de manutenção dos bens que o COCONTRATANTE disponibiliza para a Prestação de Serviços nos termos da Cláusula 10.ª, que se mostrem necessárias e/ou adequadas para assegurar a sua plena funcionalidade e garantir o bom estado de higiene, limpeza e segurança desses bens;
b) Adquirir e manter todos os materiais, instrumentos, serviços e autorizações/licenças necessários à realização das atividades de Manutenção;
c) Proceder à rápida reparação/resolução de todas as deficiências, avarias, acidentes e incidentes, que se tornem necessárias para a plena realização das atividades de Operação, adotando para tal as medidas, incluindo de articulação com terceiros, necessárias para a concretização destas ações;
d) Promover e implementar um adequado sistema de gestão de ocorrências anómalas, incidentes e acidentes, em coordenação com as prestações de Operação;
e) Elaborar e manter atualizado o cadastro e registo de custos de todas as alterações ou intervenções realizadas no Material Circulante;
f) Cumprir todas as normas legais, contratuais e regulamentares aplicáveis em concreto às atividades de Manutenção.
3. Excluem-se da obrigação de manutenção do COCONTRATANTE os bens a que se refere a Cláusula 9.ª.
4. A Manutenção deve ser realizada com recurso a meios técnicos e humanos adequados, em qualidade e quantidade, por forma a serem efetuadas todas as intervenções necessárias.
5. No caso de o COCONTRATANTE não dar cumprimento às obrigações de Manutenção referidas na presente cláusula, o CONTRAENTE PÚBLICO pode promover os investimentos e a realização dos trabalhos necessários para o efeito, sendo as respetivas despesas suportadas, na sua íntegra, pelo COCONTRATANTE, com a possibilidade de recurso à caução prestada por este último ou, caso esta não seja suficiente, pela compensação com créditos do COCONTRATANTE sobre o CONTRAENTE PÚBLICO.
CLÁUSULA 21.ª
Situações de vandalismo
1. O COCONTRATANTE é exclusivamente responsável, a expensas próprias, por proceder à reposição e reparação de quaisquer componentes, elementos ou bens disponibilizados para a Prestação de Serviços que sejam danificados por atos de terceiros, nomeadamente vandalismo, e por repor a normalidade da situação no mais curto período de tempo.
[…]
CLÁUSULA 22.ª
Situações de emergência
Quando a funcionalidade de quaisquer bens disponibilizados para a Prestação de Serviços seja temporária ou definitivamente afetada pela ocorrência de situações de emergência, o COCONTRATANTE deve proceder de imediato à sua reposição ou reparação.
[…]
SECÇÃO III
OUTRAS DISPOSIÇÕES RELATIVAS À PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
CLÁUSULA 23.ª
Gestão e controlo de riscos
1. O COCONTRATANTE deve colaborar com o CONTRAENTE PÚBLICO na adoção das medidas razoáveis de gestão e controlo dos riscos inerentes à exploração das atividades objeto do Contrato, devendo, designadamente:
[…]
CAPÍTULO VI
RECURSOS HUMANOS
CLÁUSULA 26.ª
Estrutura de recursos humanos
1. O COCONTRATANTE obriga-se a estabelecer e a manter uma estrutura de recursos humanos que permita dar integral cumprimento às obrigações decorrentes do Contrato, devendo dispor, durante todo o Período de Funcionamento Normal, de um número suficiente de pessoal dotado de experiência e formação adequadas e qualificação ou licenciamento necessário (quando aplicável) para desenvolver, de forma contínua ou pontual, as atividades incluídas na Prestação de Serviços.
2. O COCONTRATANTE obriga-se a respeitar integralmente a obrigação de suceder na posição contratual de empregador nas relações laborais existentes com trabalhadores que prestam o seu trabalho aos operadores que à data da celebração do Contrato prestam o serviço público correspondente ao objeto do Contrato, no caso de essa obrigação ser imposta pelos instrumentos de contratação coletiva aplicáveis, pelo regime jurídico aplicável em caso de
transmissão de unidade económica, previsto na Diretiva n.º 2011/23/CE, do Conselho, de 12 deMarço de 2001, e pelos artigos 285.º e seguintes do Código do Trabalho.
3. Fora do caso previsto no número anterior, o COCONTRATANTE, caso tenha necessidade de contratar recursos humanos para assegurar o cumprimento das obrigações emergentes do Contrato durante o Período de Transição e durante o primeiro Ano Contratual, obriga-se, nos termos dos n.ºs 4 a 9, seguintes, a contratar os trabalhadores que, à data da celebração do Contrato, exerçam funções correspondentes àquelas que o COCONTRATANTE pretenda contratar ao serviço dos operadores que, nessa data, prestem o serviço público
correspondente ao objeto do Contrato (“Trabalhadores Antigos”) e manifestem interesse nessa contratação.
4. Sempre que, durante o Período de Transição e durante o primeiro Ano Contratual, tenha necessidade de contratar recursos humanos, o COCONTRATANTE comunica ao público, através da sua página de internet e de anúncios em, pelo menos, um jornal de âmbito regional ou nacional, a sua intenção de contratação, acompanhada das seguintes informações mínimas:
a) Número de vagas;
b) Funções e categoria profissional inerentes a cada um dos postos em recrutamento;
c) Local(ais) para a prestação do trabalho e o âmbito territorial do lote
em causa;
d) Indicação de que beneficiam das regras preferenciais de recrutamento constantes do disposto no n.º 6 os Trabalhadores Antigos que:
i. Na data correspondente à da celebração do Contrato e que deve ser expressamente indicada, exerciam funções correspondentes às indicadas na alínea b); e
ii. Que juntem os elementos probatórios relevantes para verificação do preenchimento dos requisitos referidos na subalínea anterior;
e) Local onde esteja disponível, a título gratuito, cópia do correspondente modelo de contrato de trabalho, no qual se preveja as condições contratuais mínimas que o COCONTRATANTE está disposto a assumir na qualidade de empregador, em integral conformidade com o regime jurídico-laboral, incluindo o regime convencional coletivo aplicável, sem prejuízo de eventual negociação, na medida do legalmente admissível, de condições contratuais mais favoráveis com cada um dos trabalhadores;
f) Endereço eletrónico e prazo, o qual não pode ser inferior a 7 (sete) dias úteis a contar da data da comunicação da intenção de contratação, para manifestação do interesse na posição indicada no anúncio.
5. O COCONTRATANTE obriga-se a enviar ao CONTRAENTE PÚBLICO, no dia seguinte à respetiva publicitação, cópia do anúncio e cópia do modelo de contrato de trabalho a que se refere o número anterior e indicação dos meios de publicitação usados.
6. Se, em relação a uma mesma vaga, concorrerem um Trabalhador Antigo e candidato que não o seja, o COCONTRATANTE obriga-se a contratar o Trabalhador Antigo, exceto se demonstrar que este não reúne as qualificações, habilitações, experiência e certificações exigidas para a ocupação do correspondente posto de trabalho ou que tal trabalhador recusou as condições contratuais previstas no modelo de contrato disponibilizado pelo COCONTRATANTE nos termos e para o efeito da alínea e) do n.º 4.
7. Caso o número de Trabalhadores Antigos que tenham manifestado interesse na posição indicada no anúncio nos termos da alínea f) do n.º 4 seja superior ao número de vagas fixado nesse anúncio, o COCONTRATANTE pode escolher livremente, de entre esses e em conformidade com critérios legítimos e objetivos, de natureza gestionária, quais os trabalhadores a contratar.
8. O contrato de trabalho a celebrar com os Trabalhadores Antigos nos termos dos números anteriores deve respeitar, no mínimo, as condições contratuais previstas no modelo de contrato disponibilizado pelo COCONTRATANTE nos termos e para o efeito da alínea e) do n.º 4, sem prejuízo da integral conformidade com o regime jurídico-laboral, incluindo o regime convencional coletivo, aplicáveis à data da celebração do contrato de trabalho.
9. Nos casos em que o COCONTRATANTE seja uma sociedade constituída nos termos do artigo 19.º do Programa do Concurso, a obrigação prevista nos n.ºs 3 a 8 apenas lhe é aplicável quando contrate recursos humanos para efeitos do presente Contrato que não sejam trabalhadores que, à data da celebração do Contrato, estivessem ao serviço dos sócios fundadores do COCONTRATANTE.
10. Até 40 (quarenta) dias antes do termo do Período de Transição, o COCONTRATANTE deve apresentar, para aprovação do CONTRAENTE PÚBLICO, a lista da estrutura de recursos humanos a utilizar para a Prestação de Serviços no primeiro dia do Período de Funcionamento Normal, informando quais os recursos humanos que foram contratados ao abrigo da obrigação prevista nos n.ºs 3 a 8,a justificação para a não contratação daqueles que, nos termos dos n.ºs 3 a 8, nesta tenham demonstrado interesse, e, se for o caso, aqueles que estavam ao serviço dos sócios da SOCIEDADE COCONTRATANTE constituída nos termos e para o efeito do artigo 19.º do Programa do Concurso à data da sua constituição, incluindo ainda aqueles que pertencem a entidades subcontratadas, com indicação da função e categoria profissional e identificação completa de cada elemento integrante da equipa de recursos humanos.
11. O CONTRAENTE PÚBLICO deve pronunciar-se sobre a lista referida no número anterior no prazo de 20 (vinte) dias a contar da data da sua receção.
12. O COCONTRATANTE é responsável pelo atraso no início do Período de Funcionamento Normal que resulte da não aprovação dos recursos humanos nos termos dos números anteriores.
13. O COCONTRATANTE obriga-se a apresentar provas das qualificações, habilitações e experiência do seu pessoal ou do pessoal subcontratado, sempre que tal seja solicitado pelo CONTRAENTE PÚBLICO.
14. O COCONTRATANTE obriga-se a assegurar que todos os meios humanos utilizados no âmbito da Prestação de Serviços, incluindo o pessoal de entidades subcontratadas, empregam toda a sua competência e diligência na realização das tarefas que lhe forem cometidas.
15. Qualquer alteração à composição dos recursos humanos durante a execução do Contrato deve ser comunicada de imediato pelo COCONTRATANTE ao CONTRAENTE PÚBLICO, demonstrando o cumprimento do disposto nos números anteriores.
16. O COCONTRATANTE deve cumprir todas as disposições legais e regulamentares e o previsto em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho aplicáveis, sendo da sua responsabilidade os encargos que daí resultem.
17. O COCONTRATANTE, na qualidade de entidade empregadora e responsável pelo tratamento dos dados pessoais dos seus trabalhadores, obriga-se a dar cumprimento ao dever legal de informar os trabalhadores que utilizar na Prestação dos Serviços dos tratamentos que efetuar quanto aos seus dados pessoais, nos termos previstos na legislação aplicável, e, em particular, das finalidades e dos fundamentos jurídicos da comunicação desses dados pessoais,
nos termos do Caderno de Encargos, ao CONTRAENTE PÚBLICO.
CLÁUSULA 27.ª
FORMAÇÃO
1. O COCONTRATANTE obriga-se a providenciar a todos os recursos humanos afetos à Prestação de Serviços uma formação técnica inicial adequada às funções que vão exercer, de modo a que possam ser integralmente cumpridos os procedimentos, exigências e finalidades das atividades objeto do Contrato.
2. Para além da formação inicial a que se refere o número anterior, o COCONTRATANTE deve ainda promover e ministrar a todos os trabalhadores, com a regularidade adequada e em cumprimento das regras de boa gestão de recursos humanos e da legislação aplicável, formação técnica adequada, tendo em vista o constante melhoramento da qualidade dos serviços e a contínua atualização e o acompanhamento sustentado dos desenvolvimentos técnico e tecnológico que se forem verificando, nomeadamente, na área de Operação e Manutenção.
3. Todos os custos com as ações de formação referidas nesta cláusula são da responsabilidade do COCONTRATANTE.
[…]
CLÁUSULA 29.ª
Deveres de informação e comunicação
1. O COCONTRATANTE obriga-se a prestar ao CONTRAENTE PÚBLICO todas as informações e todos os esclarecimentos necessários ao acompanhamento e fiscalização da execução do Contrato, sobretudo as respeitantes às atividades de Operação e de Manutenção, que lhe sejam solicitados pelo CONTRAENTE PÚBLICO, e no prazo que venha a ser fixado por este. 2. Sem prejuízo do disposto no número anterior e das demais obrigações de informação e de reporte previstas no Contrato e na lei, designadamente as previstas no artigo 22.º do RJSPTP, o COCONTRATANTE obriga-se, durante todo o período de vigência do Contrato, a prestar por iniciativa própria as seguintes informações ao CONTRAENTE PÚBLICO:
a) Ocorrência de situações que afetem o normal funcionamento do serviço;
b) Ocorrência de eventos que possam vir a prejudicar, a impedir, ou a tornar mais oneroso ou difícil o cumprimento pontual e atempado de qualquer das suas obrigações ou que possam constituir causa de suspensão ou interrupção da Prestação de Serviços;
c) Ocorrência de situações de emergência ou incidente que ocorram na Prestação de Serviços;
d) Relatórios circunstanciados e fundamentados das situações constantes das alíneas a), b) e c), bem como das reclamações recebidas com indicação das correspondentes medidas tomadas ou a implementar para a superação daquelas situações; e
e) Relatórios anuais com todas as informações desagregadas (por linha) previstas no anexo ao Regulamento n.º 430/2019, de 16 de maio, da AMT, por referência às atividades objeto do Contrato e a outras atividades desenvolvidas pelo COCONTRATANTE.
[…]
CLÁUSULA 31.ª
Propriedade intelectual
(…)
3. O COCONTRATANTE deve assegurar que dispõe dos direitos necessários à utilização de todos os bens por si disponibilizados para a Prestação de Serviços, incluindo os decorrentes de marcas registadas ou logótipos, patentes, desenhos ou modelos de utilidade ou direitos de autor ou, em alternativa, licenças de utilização por períodos correspondentes à vigência do Contrato.
4. O COCONTRATANTE é exclusivamente responsável pela correta e devida utilização de quaisquer direitos de propriedade intelectual, independentemente da titularidade do direito em causa.
5. O COCONTRATANTE é também exclusivamente responsável por todas e quaisquer infrações a direitos de propriedade intelectual resultantes da sua atuação (ação ou omissão), mesmo depois de terminado o Contrato, por qualquer causa.
[…]
CLÁUSULA 33.ª
Relação com utentes
1. Na sua relação com os Utentes, para além das demais obrigações previstas no Caderno de Encargos e na lei, designadamente no Decreto-Lei n.º 9/2015, de 15 de janeiro, e no Regulamento (UE) n.º 181/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de fevereiro de 2011, respeitante aos direitos dos passageiros no transporte de autocarro e que altera o Regulamento (CE) n.º 2006/2004, o COCONTRATANTE e todos os recursos humanos afetos à Prestação de Serviços, independentemente da natureza do vínculo que vigora entre si e o COCONTRATANTE (doravante designados “trabalhadores”) devem, designadamente:
a) Fiscalizar o cumprimento pelos Utentes das condições de utilização dos transportes coletivos constantes da legislação aplicável, sobretudo do Decreto-Lei n.º 9/2015, de 15 de janeiro, não podendo, porém, fixar ou aplicar condições adicionais de utilização do serviço não previstas na lei, sem que haja autorização prévia por parte do CONTRAENTE PÚBLICO nos termos legais;
b) Proporcionar, de maneira não discriminatória, o(s) serviço(s) público(s) de transporte de passageiros incluído(s) na Prestação de Serviços; c) Pautar-se por critérios e regras de rigor, diligência, eficiência, urbanidade e responsividade, que permitam manter e zelar pelo bom-nome e reputação da Prestação de Serviços;
d) Oferecer os melhores níveis de limpeza, higiene e segurança, para o Material Circulante e para outros bens utilizados na Prestação de Serviços; (…)
i) Colocar nas paragens com abrigo com dimensões apropriadas para o efeito o mapa da Rede e a ficha de horários das Linhas que passam nessas paragens, de acordo com o modelo a fornecer pelo CONTRAENTE PÚBLICO com a antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias em face do termo do Período de Transição;
j) Publicitar, através dos mesmos meios mencionados na alínea anterior, a informação relativa a quaisquer alterações temporárias ou permanentes às matérias referidas na mesma alínea, com a antecedência mínima de 5 (cinco) dias úteis em face da data de entrada em vigor das alterações;
k) Colocar no interior do Material Circulante informação sumária sobre a Rede e avisos sobre quaisquer alterações temporárias ou permanentes e introduzir essas informações com a antecedência mínima de 5 (cinco) dias úteis em face da data de entrada em vigor das alterações;
l) Comunicar aos Utentes todas as alterações imprevisíveis causadas à Prestação de Serviços, com a maior brevidade possível e através dos meios mais adequados e eficazes em face das circunstâncias concretas;
(…)
n) Assegurar aos Utentes com mobilidade condicionada a satisfação dos seus direitos previstos na legislação aplicável, bem como os previstos nos seguintes:
i. Prestar auxílio aos Utentes com mobilidade condicionada nos momentos de acesso e desembarque do Material Circulante; e
ii. Informar os Utentes com mobilidade condicionada dos lugares reservados (caso existam) para estes.
[…]
CAPÍTULO VIII
DIREÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO CONTRATO PELO CONTRAENTE PÚBLICO
CLÁUSULA 35.ª
Direção e fiscalização pelo CONTRAENTE PÚBLICO
1. O CONTRAENTE PÚBLICO detém, nos termos previstos na lei e no Contrato, poderes de direção e fiscalização do cumprimento das obrigações do COCONTRATANTE.
2. Para o efeito do número anterior, o CONTRAENTE PÚBLICO pode, designadamente, realizar inspeções ao Material Circulante. […]
CLÁUSULA 38.ª
Sistema de informação e transmissão de dados
1. O COCONTRATANTE obriga-se a instalar um sistema de informação e transmissão de dados, que cumpra o disposto na presente cláusula e no Anexo VIII ao Caderno de Encargos, devendo garantir a sua plena operação durante todo o Período de Funcionamento Normal do Contrato.
2. A função do sistema de informação e transmissão de dados consiste em proporcionar às Partes um instrumento de gestão e monitorização organizada e integrada da execução do Contrato.
[…]
CAPÍTULO IX
AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DO COCONTRATANTE
CLÁUSULA 40.ª
Avaliação do desempenho do COCONTRATANTE
1. Sem prejuízo de outros mecanismos previstos no Contrato e na lei, a partir do início do 4.º (quarto) mês do Período de Funcionamento Normal, a avaliação do desempenho do COCONTRATANTE ou das entidades que atuem sob sua conta ou orientação, incluindo os subcontratados, realiza‐se através da aplicação dos indicadores constantes do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
2. Para o efeito da avaliação referida no número anterior, o desempenho do COCONTRATANTE é calculado com base nos dados reais sobre a execução da Prestação de Serviços obtidos através do sistema de informação e transmissão de dados referido na Cláusula 38.ª, sem prejuízo da possibilidade de o CONTRAENTE PÚBLICO exigir ao COCONTRATANTE a entrega de alguns documentos adicionais para o efeito do apuramento do respetivo desempenho nos termos das Cláusula 29.ª e Cláusula 30.ª.
3. Em função do resultado obtido da aplicação dos indicadores nos termos dos n.ºs 1 e 2, há lugar a penalizações ou bónus à remuneração devida ao COCONTRATANTE nos termos previstos no Anexo IX ao Caderno de Encargos.
[…]
5. Após a pronúncia do Cocontratante nos termos do número anterior ou esgotado o prazo para o efeito e após a receção da fatura prevista no n.º 7 da Cláusula 42.ª, o CONTRAENTE PÚBLICO emite o relatório final de acompanhamento da Prestação de Serviços, notificando-o ao COCONTRATANTE, o qual deve indicar o saldo final dos bónus e penalizações aplicados nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos, para efeitos de emissão da fatura correspondente.
6. Com base no relatório final referido no número anterior, a Parte que seja credora do mencionado saldo emite a fatura correspondente, a qual deve ser paga no prazo de 10 (dez) dias úteis a contar da sua receção, sem prejuízo da possibilidade de compensação de créditos pelo Contraente Público.
7. O procedimento de aplicação do indicador “Índice de satisfação dos Utentes” previsto no Anexo IX ao Caderno de Encargos é regulado no ponto 5 do mesmo anexo e na cláusula seguinte, devendo o bónus ou penalização aplicável nos termos do mesmo anexo ser considerado no saldo final mensal previsto no n.º 5 para efeitos de faturação conjunta nos termos do n.º 6.
8. A aplicação dos bónus ou penalizações prevista na presente cláusula não libera o COCONTRATANTE do cumprimento pontual das obrigações subjacentes aos níveis de desempenho violados.
(…)
CLÁUSULA 41.ª
Inquérito de satisfação
1. O CONTRAENTE PÚBLICO realiza, anualmente, um inquérito aos Utentes sobre a respetiva satisfação com o serviço prestado pelo COCONTRATANTE no âmbito da Prestação de Serviços.
2. O inquérito pode ter lugar em qualquer mês do primeiro Ano Contratual, desde que comunicado ao COCONTRATANTE com a antecedência mínima de 30 (trinta) dias em face da data da sua realização efetiva, devendo realizar-se no mês
correspondente nos Anos Contratuais seguintes.
3. O CONTRAENTE PÚBLICO informa o público, através dos meios de comunicação adequados e eficientes, a realização de inquérito, a sua finalidade e a entidade contratada para o efeito com a antecedência mínima de 5 (cinco) dias em face da data da sua realização, esclarecendo o conteúdo do inquérito e o carácter não obrigatório da participação no mesmo.
4. O COCONTRATANTE deve colaborar lealmente com o CONTRAENTE PÚBLICO na realização do inquérito.
5. O inquérito deve realizar-se com observância integral dos termos estabelecidos no Anexo IX.
6. O resultado do inquérito é comunicado ao COCONTRATANTE no prazo de 30 (trinta) dias a contar do seu termo, podendo o COCONTRATANTE pronunciar-se no prazode 15 (quinze) dias a contar da data de comunicação.
7. O CONTRAENTE PÚBLICO notifica o COCONTRATANTE do resultado definitivo do inquérito de satisfação, o qual deve indicar o bónus ou penalização mensal aplicado nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
8. O resultado definitivo do inquérito releva para efeitos do indicador de desempenho “Índice de satisfação dos Utentes” previsto no Anexo IX ao Caderno de Encargos.
[…]
CAPÍTULO X
REGIME FINANCEIRO
CLÁUSULA 42.ª
Remuneração do COCONTRATANTE
1. Como contrapartida pela execução integral do Contrato, a partir do início do Período de Funcionamento Normal, o COCONTRATANTE tem direito a receber do CONTRAENTE PÚBLICO:
a) Uma remuneração mensal, acrescida do IVA à taxa legalmente aplicável, calculada nos termos seguintes, sem prejuízo dos ajustamentos nos termos do n.º 4:
R(n) = P * K(n)
Sendo:
R(n): o valor da remuneração mensal devida ao COCONTRATANTE respeitante
ao mês n;
P: o preço unitário por quilómetro indicado na Proposta, o qual nunca pode ser superior a 1.70€ (um euro e setenta cêntimos), sem prejuízo da possibilidade de atualização anual nos termos do n.º 2; e
K(n): o valor de produção quilométrica mensal previsto para o mês n no Anexo III ao Caderno de Encargos (sem consideração de quaisquer alterações ao longo da vigência do Contrato), em função do respetivo número de dias úteis, sábados, domingos e feriados desse mês, calculado através do produto do número de Serviços pela respetiva extensão;
b) 25 (vinte e cinco) % da receita tarifária proveniente da venda dos títulos intermodais do Sistema Intermodal Andante (cuja configuração vigente à data de lançamento do concurso está prevista no Anexo VI ao Caderno de Encargos) recolhida, repartida e imputada mensalmente pelo TIP à Prestação de Serviços nos termos previstos no Anexo X ao Caderno de Encargos, líquida de comissões, incluindo a receita associada aos bilhetes de assinatura nos termos do Decreto-Lei n.º 21/2019, de 30 de janeiro, e as compensações devidas pela prática dos descontos referidos no Anexo VI ao Caderno de Encargos, acrescida do IVA à taxa legalmente aplicável;
c) 25 (vinte e cinco) % da receita tarifária proveniente da venda dos bilhetes de bordo Andante (cuja configuração vigente à data de lançamento do concurso está prevista no Anexo VI ao Caderno de Encargos), cobrada diretamente aos Utentes pelo COCONTRATANTE em nome do CONTRAENTE PÚBLICO, acrescida do IVA à taxa legalmente aplicável.
2. O preço unitário por quilómetro indicado na Proposta referido na alínea a) do número anterior é objeto de atualização anual em função do valor máximo da TAT previsto na Portaria nº 298/2018, de 19 de novembro, ou, quando seja o caso, em função da atualização tarifária extraordinária que seja determinada pelo CONTRAENTE PÚBLICO nos termos do artigo 8.º da Portaria nº 298/2018, de 19 de novembro.
3. O risco de procura associado à percentagem da receita tarifária prevista nas alíneas b) e c) do n.º 1 corre por conta do COCONTRATANTE.
4. Caso, por força do disposto nas Cláusula 11.ª, Cláusula 12.ª, Cláusula 14.ª ou por força de alguns desvios dos percursos constantes dos Planos de Operação, o COCONTRATANTE realize, no mês n, um número de quilómetros diferente do valor de K(n) referido na alínea a) do n.º 1, a remuneração mensal devida ao COCONTRATANTE calculada nos termos da alínea a) do n.º 1 é objeto de ajustamento nos termos seguintes:
a) Caso o número de quilómetros realizados pelo COCONTRATANTE no âmbito da Prestação de Serviços no mês n seja superior ou inferior ao valor de K(n) referido na alínea a) do n.º 1 em até 1 (um) %, não há lugar a qualquer ajustamento da remuneração;
b) Caso o número de quilómetros realizados pelo COCONTRATANTE no âmbito da Prestação de Serviços no mês n seja superior ao valor de K(n) referido na alínea a) do n.º 1 em até 10 (dez) %, o valor de R(n) obtido nos termos da alínea a) do n.º 1 deve ser ajustado para o valor correspondente ao resultado da seguinte fórmula:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Q(n): o número de quilómetros realizados pelo COCONTRATANTE no mês n no âmbito da Prestação de Serviços, cujo cálculo deve ter em conta o disposto no n.º 5;
K(n): o valor de produção quilométrica mensal previsto para o mês n no Anexo III ao Caderno de Encargos, em função do respetivo número de dias úteis, sábados, domingos e feriados desse mês, calculado através do produto do número de serviços pela respetiva extensão;
c) Caso o número de quilómetros realizados pelo COCONTRATANTE no âmbito da Prestação de Serviços no mês n seja inferior ao valor de K(n), referido na alínea a) do n.º 1 em até 10 (dez) %, o valor de R(n) obtido nos termos da alínea a) do n.º 1 deve ser ajustado para o valor correspondente ao resultado da seguinte fórmula:
R(n) = P * (Q(n) + 0,01 * K(n))
Sendo:
R(n): o valor da remuneração mensal devida ao COCONTRATANTE respeitante ao mês n;
P: o preço unitário por quilómetro mencionado na alínea a) do n.º 1 e no n.º 3;
Q(n): o número de quilómetros realizados pelo COCONTRATANTE no mês n no âmbito da Prestação de Serviços, cujo cálculo deve ter em conta o disposto no n.º 5; e
K(n): o valor de produção quilométrica mensal previsto para o mês n no Anexo III ao Caderno de Encargos (sem consideração de quaisquer alterações ao longo da vigência do Contrato), em função do respetivo número de dias úteis, sábados, domingos e feriados desse mês, calculado através do produto do número de Serviços pela respetiva extensão;
5. Para o efeito da aplicação do número anterior, não são tidos em conta:
a) Os quilómetros realizados pelo COCONTRATANTE fora do exercício da Prestação de Serviços;
b) Os quilómetros realizados na Prestação de Serviços pelo COCONTRATANTE, mas não previstos no Anexo III ao Caderno de Encargos e nos Planos de Oferta, salvo os que decorram de qualquer autorização expressa do CONTRAENTE PÚBLICO e os que resultem do disposto na Cláusula 12ª;
c) Os quilómetros dos Serviços que o COCONTRATANTE prestou ou deixou de prestar de acordo com as decisões de ajustamento pontual adotadas pelo CONTRAENTE PÚBLICO nos termos da Cláusula 13.ª com invocação expressa do artigo 31.º do RJSPTP
(…)
8. A partir das datas de receção das informações referidas no n.º 6, ou da data de notificação da decisão final do CONTRAENTE PÚBLICO caso o COCONTRATANTE se pronuncie sobre as informações nos termos do número anterior, o COCONTRATANTE pode emitir ao CONTRAENTE PÚBLICO as faturas mensais referentes aos respetivos créditos pecuniários, apurados mediante dedução, à soma dos valores indicados pelo CONTRAENTE PÚBLICO nos termos das alíneas c) e d) do n.º 6 ou ao valor indicado na decisão final do CONTRAENTE PÚBLICO, consoante o caso, do valor correspondente a 75 (setenta e cinco) % da receita
tarifária proveniente da venda dos bilhetes de bordo Andante registada no mês a que se refere a fatura, acrescido do respetivo IVA.
9. O CONTRAENTE PÚBLICO dispõe de um prazo de 10 (dez) dias úteis para efetuar o pagamento das faturas emitidas pelo COCONTRATANTE nos termos do número anterior.
10. A remuneração atribuída ao COCONTRATANTE ao abrigo da presente cláusula constitui a única contrapartida pecuniária que lhe é devida pelo CONTRAENTE PÚBLICO pelo cumprimento do Contrato e das obrigações de serviço público nele previstas, sem prejuízo das deduções ou acréscimos à remuneração nos termos previstos na Cláusula 40.ª.
11. O risco da variação dos custos da Prestação de Serviços corre por conta do COCONTRATANTE, qualquer que seja a sua causa, incluindo alterações legislativas, com exceção das alterações legislativas de caráter específico
CLÁUSULA 43.ª
Compensação de créditos
1. O CONTRAENTE PÚBLICO pode compensar pagamentos por ele devidos ao COCONTRATANTE com eventuais créditos sobre este, designadamente relativos a
(…)
CLÁUSULA 44.ª
Partilha de benefícios
1. O CONTRAENTE PÚBLICO tem direito, nos termos do artigo 30.º do RJSPTP, à partilha dos benefícios da realização do serviço público de transporte objeto do Contrato obtidos pelo COCONTRATANTE, no caso de ocorrerem:
a) Modificações unilaterais das condições do Contrato pelo CONTRAENTE PÚBLICO com efeito económico favorável ao COCONTRATANTE; b) Alterações legislativas de caráter específico, que tenham impacto direto favorável sobre os gastos e/ou rendimentos do COCONTRATANTE relativos às atividades objeto do Contrato; ou c) Outras situações identificadas na lei.
2. Excluem-se do âmbito de aplicação do número anterior os benefícios obtidos pelo COCONTRATANTE no exercício das atividades autorizadas nos termos do no n.º 8 da Cláusula 10.ª e da Cláusula 19.ª.
CLÁUSULA 45.ª
Reposição do equilíbrio económico-financeiro
1. Sem prejuízo dos casos legalmente impostos e dos previstos expressamente noutras cláusulas do Caderno de Encargos, o COCONTRATANTE tem apenas direito à reposição do equilíbrio económico-financeiro do Contrato quando se verifique um aumento de gastos ou uma diminuição de rendimentos provenientes do exercício das atividades objeto da Prestação de Serviços que altere os pressupostos nos quais o COCONTRATANTE determinou o valor das prestações a que se obrigou e desde que tal efeito seja o resultado direto da modificação unilateral, imposta pelo CONTRAENTE PÚBLICO, nos termos da Cláusula 48.ª, das condições de desenvolvimento das atividades objeto do Contrato, exceto no caso de serviços complementares e de serviços a menos, aos quais se aplica o disposto nos n.ºs 3, 4 e 5 da mesma cláusula.
2. Só há lugar à reposição do equilíbrio financeiro da Concessão se, em resultado direto e acumulado de um ou vários eventos referidos no n.º 1, resultar, comprovadamente, uma diminuição das receitas ou aumento dos custos resultantes da execução do Contrato que provoque uma variação do VAL acionista superior a 100.000€ (cem mil euros), desde a data em que ocorreu o(s) evento(s) gerador(es) da reposição do equilíbrio financeiro até ao termo da Concessão.
(…)
4. A determinação das consequências do exercício do direito à reposição do equilíbrio económico-financeiro é feita por acordo resultante de negociação entre as Partes nos termos dos números seguintes.
(…)
CLÁUSULA 47.ª
Seguros
1. O COCONTRATANTE deve assegurar a existência e manutenção em vigor das apólices de seguro necessárias para garantir uma efetiva e compreensiva cobertura dos riscos inerentes ao cumprimento do Contrato celebrado com empresas de seguros devidamente autorizadas para o exercício da atividade seguradora.(…)
8. Os encargos referentes a todos os seguros, incluindo, além do mais, os prémios e qualquer dedução efetuada pela companhia seguradora a título de franquia em caso de sinistro indemnizável, são da responsabilidade do COCONTRATANTE.
[…]
CAPÍTULO XII
MODIFICAÇÕES OBJETIVAS E SUBJETIVAS
CLÁUSULA 48.ª
Modificação do contrato
1. Para além das modificações contratualmente previstas, designadamente as reguladas nas Cláusulas 12.ª, 13.ª e 14.ª, durante a execução do Contrato, o CONTRAENTE PÚBLICO pode, nos termos da lei, determinar alterações ao Contrato, ficando o COCONTRATANTE obrigado a executar a Prestação de Serviços nos termos resultantes dessa modificação.
2. Com exceção do disposto no Código dos Contratos Públicos a respeito dos serviços complementares e dos serviços a menos e do disposto no número seguinte, a modificação objetiva do Contrato nos termos da presente cláusula confere ao COCONTRATANTE direito à reposição do equilíbrio económico-financeiro do Contrato, nos termos da lei e da Cláusula 45.ª.
3. Tratando-se de serviços complementares previstos no artigo 454.º do Código dos Contratos Públicos (isto é, aqueles que excedam o limite mensal de variação de produção quilométrica referido na Cláusula 14.ª), os quilómetros a mais realizados pelo COCONTRATANTE num determinado mês são remunerados pelo preço unitário mencionado na alínea a) do n.º 1 da Cláusula 42.ª, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
4. No caso em que o COCONTRATANTE demonstre que a realização de serviços complementares implica um aumento do custo por quilómetro que o COCONTRATANTE suportaria não fora a realização dos serviços complementares, os quilómetros a mais são remunerados pelo preço referido no número anterior majorado em função da medida, expressa em valor percentual, do aumento do custo por quilómetro demonstrado pelo COCONTRATANTE, a qual não pode, em caso algum, ser superior a 10 (dez) %.
5. Em caso de modificação objetiva do Contrato nos termos da presente cláusula, o COCONTRATANTE obriga-se, sempre que aplicável, a adaptar o Plano de Operação, aplicando-se com as necessárias adaptações o disposto no n.º 10 da Cláusula 11.ª.
[…]
SECÇÃO I
RESPONSABILIDADE
CLÁUSULA 51.ª
Princípio geral de responsabilidade do COCONTRATANTE
1. O COCONTRATANTE, ainda que em caso de subcontratação, é o único e direto responsável pelo pontual e perfeito cumprimento das obrigações relacionadas coma Prestação de Serviços decorrentes do Contrato, das normas legais, regulamentos ou disposições administrativas que, em cada momento, lhe sejam aplicáveis, não podendo opor ao CONTRAENTE PÚBLICO qualquer contrato ou relação com terceiros para exclusão ou limitação dessa responsabilidade.
2. O COCONTRATANTE responde, nos termos da lei geral, por quaisquer prejuízos causados na execução da Prestação de Serviços, pela culpa ou pelo risco, não sendo
assumido pelo CONTRAENTE PÚBLICO qualquer tipo de responsabilidade neste âmbito.
3. O COCONTRATANTE responde, ainda, nos termos gerais da relação comitente comissário, pelos prejuízos causados por atos ou omissões das pessoas e entidades a que tenha recorrido, seja a que título for, para o cumprimento do Contrato.
4. O COCONTRATANTE é ainda responsável pelo cumprimento de todas as obrigações acessórias do Contrato, designadamente os deveres de cuidado, de informação, de sigilo e, em geral, todos os que sejam instrumentais à execução das obrigações principais, ainda que estas sejam objeto de subcontratação
5. A responsabilidade do COCONTRATANTE implica serem da sua conta quaisquer despesas incorridas por ou exigidas ao CONTRAENTE PÚBLICO por inobservância de disposições legais ou contratuais cujo cumprimento incumba ao COCONTRATANTE.
[…]
CLÁUSULA 53.ª (Sanções contratuais pecuniárias)
1. Sem prejuízo da possibilidade de resolução sancionatória do Contrato nos termos do artigo 333.º do Código dos Contratos Públicos, o CONTRAENTE PÚBLICO pode, com observância das regras previstas nos artigos 325.º e 329.º do Código dos Contratos Públicos e no artigo 45.º do RJSPTP, aplicar sanções contratuais pecuniárias em caso de incumprimento pelo COCONTRATANTE das suas obrigações, incluindo as resultantes de determinações do CONTRAENTE PÚBLICO emitidas nos termos da lei ou do Contrato.
2. Para efeitos da presente cláusula, os incumprimentos do COCONTRATANTE classificam-se em leves, graves e muito graves.
3. Consideram-se infrações leves, sancionáveis com sanção contratual pecuniária entre 500 € (quinhentos euros) e 1500€ (mil e quinhentos euros):
a) Não manter os equipamentos afetos ao serviço em perfeitas condições de higiene e limpeza, com exclusão daqueles bens cuja responsabilidade de Manutenção não cabe ao COCONTRATANTE nos termos do Contrato;
b) Não respeitar os procedimentos de higiene e segurança no trabalho;
c) Não manter em bom estado de conservação os materiais de informação ao público;
d) Não atualizar a informação ao público;
e) Incumprimento das regras constantes do manual do motorista, referido na alínea g) do n.º 6 da Cláusula 7.ª;
f) Falta de identificação do pessoal que desempenhe funções em contacto com o público;
g) Incumprir os prazos previstos no Contrato;
h) Não respeitar as regras do uso do Material Circulante para o exercício de atividades publicitárias previstas na Cláusula 19.ª;
i) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 4 e 5 que resultem de um comportamento de culpa leve por parte da COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
4. Consideram-se infrações graves, sancionáveis com multa contratual de 1500€ (mil e quinhentos euros) a 5000€ (cinco mil euros):
a) Transporte de Utentes sem título de transporte válido, salvo quando tal se deva a circunstâncias extraordinárias não imputáveis ao Cocontratante; cada situação singular registada por Utente é considerada como uma infração sancionável autonomamente;
b) Manter, num veículo do Material Circulante em serviço, o sistema de bilhética sem contacto avariado pelo período de duas horas, sendo cada veículo que permanece nessa situação em cada período adicional de 120 (cento e vinte) minutos, ainda que incompleto, considerado como uma infração sancionável autonomamente;
c) Manter, num veículo do Material Circulante em serviço, os painéis exteriores de informação ao público avariados pelo período de duas horas, sendo cada veículo que permanece nessa situação em cada período adicional de 120 (cento e vinte) minutos, ainda que incompleto, considerado como uma infração sancionável autonomamente;
d) Conduta inadequada dos funcionários, na sua relação com os Utentes e CONTRAENTE PÚBLICO, sendo cada evento reportado com procedência como uma infração sancionável autonomamente;
e) Qualquer obstrução ao trabalho de inspeção do CONTRAENTE PÚBLICO ou de outras autoridades competentes, sendo cada dia de atraso causado aos trabalhos de inspeção considerado como uma infração sancionável autonomamente;
f) Incumprimento das regras respeitantes à comunicação das alterações da Operação e anomalias que ponham em causa o regular e bom funcionamento do serviço;
g) Não realização de qualquer Serviço que prejudique o cumprimento dos horários escolares por parte dos alunos, sendo cada ocorrência considerada como uma infração sancionável autonomamente;
h) Desvio do itinerário estabelecido, sem causa justificada, por cada serviço;
i) Incumprimento das indicações e/ou instruções do CONTRAENTE PÚBLICO emitidas nos termos da lei ou do Contrato;
j) Não parar nas paragens para tomada/largada de passageiros sempre que tal seja solicitado, sendo cada ocorrência considerada como uma infração sancionável autonomamente;
k) Utilização de veículo do Material Circulante que não cumpra as exigências respeitantes à classe de emissões previstas na CLÁUSULA 18.ª, considerando se cada dia de utilização, por veículo, como uma infração sancionável autonomamente;
l) Falta de observância do disposto quanto a livro de reclamações;
m) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 3 e 5 que resultem de um comportamento de negligência grosseira por parte do COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
5. Consideram-se infrações muito graves, sancionáveis com multa contratual de 5000€ (cinco mil euros) a 10000€ (dez mil euros):
a) Falta de obtenção prévia da autorização expressa do CONTRAENTE PÚBLICO para a prática de atos que, nos termos da lei ou do Contrato, dependa de tal autorização;
b) Prática de tarifários diferentes dos definidos pelo CONTRAENTE PÚBLICO ou pelas autoridades competentes, sendo cada prática irregular, por título de transporte, considerada como uma infração sancionável autonomamente;
c) Emissão de títulos de transporte diferentes dos aprovados pelo CONTRAENTE PÚBLICO ou pelas autoridades competentes, sendo cada prática irregular considerada como uma infração sancionável autonomamente;
d) Utilização de veículo do Material Circulante que não cumpra o disposto na legislação e regulamentação aplicáveis, considerando-se cada dia de utilização, por veículo, como uma infração sancionável autonomamente;
e) Ter ao serviço, por Linha, um veículo do Material Circulante que não cumpra a classe de emissões prevista na lei ou no Contrato em 4 (quatro) ou mais dias, durante um período de 7 (sete) dias consecutivos, sendo cada ocorrência considerada como uma infração sancionável autonomamente;
f) Não admissão no Material Circulante de qualquer Utente que reúna as condições para tal, sendo cada não admissão ilegítima, por Utente, considerada como uma infração sancionável autonomamente;
g) Interrupção da Prestação de Serviços numa Linha em todos os horários previstos durante 24 (vinte e quatro) horas, salvo casos excecionais admitidos na lei ou no Contrato, sendo cada período de 24 (vinte e quatro) horas adicional de incumprimento contínuo, ainda que incompleto, considerado como uma infração sancionável autonomamente;
h) Falsificação de qualquer informação ou documentos que o COCONTRATANTE deva facultar ao CONTRAENTE PÚBLICO ou a outras autoridades competentes;
i) Atraso no início do Período de Funcionamento Normal da Prestação de Serviços, sendo cada dia, ainda que incompleto, de mora considerado como uma infração sancionável autonomamente;
j) Fraude na execução da Prestação de Serviços;
k) Não apresentação da documentação necessária e solicitada pelo CONTRAENTE PÚBLICO para a obtenção pelo CONTRAENTE PÚBLICO de quaisquer subsídios e apoios financeiros no âmbito do objeto do Contrato;
l) Subcontratar terceiros na Prestação de Serviços sem a autorização do CONTRAENTE PÚBLICO;
m) Usar os veículos que integram o Material Circulante para o exercício de atividades fora da Prestação de Serviços sem autorização prévia do Contraente Público nos termos do n.º 8 da Cláusula 10.ª e da Cláusula 19.ª;
n) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 3 e 4 que resultem de um comportamento doloso por parte do COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
6. A determinação da medida concreta da multa, dentro dos limites suprarreferidos de cada categoria de infrações, é feita em função da gravidade da infração.
7. Sem que tal constitua um direito ou sequer uma legítima expetativa do COCONTRATANTE, o CONTRAENTE PÚBLICO pode atenuar ou revogar, total ou parcialmente, qualquer sanção pecuniária aplicada, quando se vier a verificar que a situação de incumprimento foi totalmente recuperada dentro do prazo definido na notificação referida no n.º 1 da cláusula anterior e que o incumprimento não causou qualquer impacto significativo na realização das atividades incluídas no Contrato.
8. No caso de infrações leves, o CONTRAENTE PÚBLICO pode, consoante a gravidade da infração, substituir a multa contratual pela sanção de simples advertência.
9. Independentemente do tipo de infração praticada, caso o COCONTRATANTE não proceda ao pagamento voluntário das multas contratuais aplicadas no prazo de 10 dias a contar da sua notificação, pode o CONTRAENTE PÚBLICO determinar a perda da caução no valor correspondente à multa aplicável, sendo o COCONTRATANTE obrigado a repor a mesma nos termos da Cláusula 46.ª.
10. A aplicação de sanções contratuais pecuniárias nos termos dos números anteriores não impede, com referência ao mesmo facto, a aplicação cumulativa das deduções por avaliação de desempenho previstas na Cláusula 40.ª e no Anexo IX ao Caderno de Encargos.
11. O pagamento das sanções pecuniárias contratuais não isenta o COCONTRATANTE do cumprimento integral do Contrato, nem de responsabilidade criminal, contraordenacional e civil a que eventualmente haja lugar, nem exclui o exercício do poder de fiscalização, de controlo e sancionatório de outras entidades que decorra da lei.
12. À aplicação das sanções previstas na presente cláusula são aplicáveis os limites máximos do respetivo valor acumulado previstos nos n.ºs 2 a 4 do artigo 329.º do Código dos Contratos Públicos.
[…]
CLÁUSULA 65.ª
(Invalidade parcial do contrato)
1. Se alguma das disposições do Contrato vier a ser considerada inválida, tal não afeta automaticamente a validade e eficácia do restante clausulado do mesmo, o qual se mantém plenamente em vigor, salvo quando qualquer das partes consiga provar que sem esta(s) cláusula(s) não celebraria o Contrato ou celebraria nos termos diferentes.
2. No caso de se verificar uma situação de invalidade nos termos do número anterior, as Partes comprometem-se, de boa fé e pela via amigável, a modificar ou substituir a(s) cláusula(s) inválida(s) ou ineficaz(es) por outra(s), caso tal seja necessário, o mais rapidamente possível e por forma a salvaguardar a plena validade e eficácia do Contrato e a realização das suas prestações de acordo com o espírito, finalidades e exigências deste.
- cfr. págs. 2489 e ss. do p.a.
11. O Caderno de Encargos mostra-se integrado, além de outros, pelos seguintes anexos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido,
(i) ANEXO II REDE – Apêndice II.d Rede UT 4 (fls. 470 e ss. do p.a.)
(ii) ANEXO III PLANO DE OFERTA – Apêndice III.d Oferta UT 4 (fls. 720 e ss. do p.a.)
(iii) ANEXO V PLANO DE OPERAÇÃO – Apêndice V.a. – Horário (fls. 746 e ss. do p.a.)
Apêndice V.b. – Frota (fls. 746 e ss. do p.a.)
(iv) ANEXO VI SISTEMA TARIFÁRIO (fls. 754 e ss. do p.a.)
(v) ANEXO VII SISTEMA DE BILHÉTICA (fls. 768 e ss.)
“Especificação do sistema de bilhética
1. Objeto
O presente Anexo define os requisitos mínimos do Sistema de Bilhética do Operador (SBO), de forma a garantir a integração com o SIA (Sistema Intermodal Andante).
[…]”
(vi) ANEXO VIII SISTEMA DE INFORMAÇÃO E TRANSMISSÃO DE DADOS
[…]
3. Especificações Técnicas
O sistema de informação e transmissão de dados, referido na Cláusula 38.ª do Caderno de Encargos, deve basear‐se numo processo de troca de informação que compreenda as seguintes duas fases:
• Produção do catálogo NeTEx com informação dos serviços a realizar;
• Envio da informação em tempo real da execução dos serviços.
I‐ Informação a Comunicar De forma a cumprir com as indicações europeias foi eleito o formato NeTEx com o perfil
português. O catálogo NeTEx conterá toda a informação necessária para identificar o
serviço objeto do Contrato
Neste catálogo serão identificados:
• Os horários;
• Os dias de operação;
• As paragens;
• As linhas;
• Os itinerários;
• Os serviços;
O Contraente Público é responsável pela produção deste catálogo assim como da sua atualização, que será efetuada sempre que necessária. Cada atualização será identificada com um número incremental e estará disponível on‐line. As referências definidas neste catálogo serão usadas para referenciar a informação enviada em tempo real.
As Cocontratantes devem enviar em tempo real a informação da execução do serviço.
De forma a seguir as indicações europeias para o envio de informação em tempo real de transportes público, foi eleito o formato SIRI, que usa como base o catálogo NeTEx para referenciar a informação.
O Cocontratante deve enviar a informação necessária para que o Contraente Público consiga aferir o cumprimento da Prestação de Serviços. Para isso cada veículo do Material Circulante em serviço deve enviar uma mensagem de 5 em 5 segundos com a informação do serviço que está a efetuar.
A informação necessária em cada mensagem (ver IV‐ Modelo SIRI) é:
• Data da informação – Data e hora da aquisição de informação relativa à localização dos veículos do Material Circulante. A referência deve ser Hora local de Portugal Continental (base UTC) no formato ISO 8601 YYYY‐MM‐ DDThh:mm:ssTZD. Para sincronização horária deve ser usado o serviço de NTP do Observatório de Lisboa
• Referência da linha – Referência da linha referente ao catálogo NeTEx disponibilizado pelo Contraente Público;
• Referência do serviço – Referência do serviço referente ao catálogo NeTEx disponibilizado pelo Contraente Público;
• Localização do veículo (latitude/longitude) – Localização em coordenadas geográficas decimais obtidas por GPS. As coordenadas geográficas devem ser expressas no formato WGS84/GML (EPSG:4326). A precisão dos valores deve ser no mínimo de 5 casas decimais equivalente a aproximadamente 1 metro.
• Referência do veículo – Referência do veículo do Material Circulante constante do Plano de Operação aplicável;
• Velocidade – Velocidade atual do veículo do Material Circulante na data e hora da aquisição de informação relativa à respetiva localização. A velocidade do veículo terá de ser enviada em m/s, (unidade padrão do protocolo SIRI);
• Paragem atual – Paragem em que o veículo do Material Circulante se encontra. A Cocontratante deve enviar pelo menos o registo do veículo na primeira e última paragem [ver exemplo em IV‐Modelo SIRI (nós XML de «MonitoredCall»)]. Todas as referências usadas a paragens, serviços e viagens têm de existir no catálogo NeTEx
[…]
VII‐ Cálculo de indicadores
O Contraente Público usa a informação enviada pelo Cocontratante nos termos do presente Anexo para efeitos de aplicação dos indicadores de avaliação do desempenho do Cocontratante, conforme previsto no Anexo IX ao Caderno de Encargos.
O Contraente Público tem ao seu dispor vários mecanismos automáticos de validação da informação.
Especialmente em relação à aplicação dos indicadores que avaliem a pontualidade da Prestação de Serviços, deve considerar‐se as seguintes definições técnicas de “início de viagem” e “fim de viagem”:
Inicio de serviço: a horário de envio da última mensagem SIRI‐VM pelo Cocontratante com o posicionamento do veículo do Material Circulante na paragem inicial do percurso (considerando esta como um círculo de raio igual a 25 metros, centrado na posição da paragem), imediatamente anterior à transmissão da mensagem SIRI‐VM com o posicionamento do veículo fora desta paragem inicial.
Fim de serviço: o horário do envio da primeira mensagem SIRI‐VM pelo Cocontratante com o posicionamento do veículo do Material Circulante na última paragem do percurso, considerando esta como um círculo de raio igual a 25 metros, centrado na posição da paragem.
(vii) ANEXO X MODELO DE REPARTIÇÃO DE RECEITAS E COMISSÕES
[…]
1. A receita tarifária proveniente da venda dos títulos de transporte intermodais do Sistema Intermodal Andante (SIA) na rede de vendas (referida no Anexo VII ao Caderno de Encargos), é recolhida pelo TIP.
2. Periodicamente, o TIP procede à repartição desta receita tarifária entre os operadores aderentes do SIA, segundo as regras pré‐fixadas para o efeito.
3. Sem prejuízo da obrigação do Cocontratante de observar as regras vigentes em cada momento emitidas pelas entidades competentes que regulam a repartição de receita tarifária referida nos números anteriores, apresentam‐se neste Anexo as regras da repartição vigentes à data de lançamento do Concurso.
4. A parte da receita tarifária proveniente da venda dos títulos de transporte intermodais do SIA imputada pelo TIP à Prestação de Serviços, nos termos do n.º 2, pertence ao Contraente Público, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
5. Em conformidade com o disposto na alínea b) do n.º 1 da Cláusula 42.ª do Caderno de Encargos, o Contraente Público atribui ao Cocontratante 25% (vinte e cinco por cento) da receita tarifária, proveniente da venda dos títulos de transporte intermodais do SIA, imputada pelo TIP à Prestação de Serviços.
(…)
4. PROCESSAMENTO DA REPARTIÇÃO DA RECEITA
4.1. Frequência de Pagamento
De modo a ser possível repartir a receita referente aos títulos Andante pelos operadores antes do final de cada mês, considera‐se que a repartição da receita de títulos é realizada com base em períodos, no máximo, de 1 mês.
A repartição e pagamento da receita de títulos suprarreferida é processada pelo TIP, de acordo com o seguinte procedimento bifaseado:
a) Até ao final do mês n, é paga aos operadores (neste caso, à AMP) um valor correspondente a pelo menos 80% da receita de títulos estimada para o mês n;
b) Até ao dia 20 do mês n+1, o TIP realiza o acerto da receita de títulos do mês n e paga aos operadores (neste caso, à AMP) o valor correspondente.
4.2. Inclusão de acertos
Quando, designadamente por falha de comunicação dos equipamentos embarcados do SIA, algumas validações do mês n não foram devidamente consideradas no momento de acerto realizado no mês n+1 nos termos da alínea b) do segundo parágrafo do ponto anterior, o TIP procede à sua inclusão superveniente no procedimento de repartição da receita de títulos referente ao mês no qual a falha seja detetada.
4.3. Arredondamento de cálculos
Os resultados são apresentados com 4 casas decimais.
(…)
6. Comissões
A comissão do TIP é formada por duas componentes:
6.1.1. COMISSÃO DE RECEITA
A comissão de receita a cobrar pelo TIP consiste em 2,5% da receita intermodal repartida.
6.1.2. COMISSÃO POR VALIDAÇÃO
A comissão por validação corresponde a 0,010 euros por validação não repetida registada em sistema, dos títulos de transporte intermodais.
7. DISPONIBILIZAÇÃO DE SAM
Os Security Access Modules (SAM) que sejam fornecidos aos operadores para estes integrarem nos respetivos equipamentos de bilhética serão sempre propriedade do TIP e serão entregues contra o pagamento de 50 € por unidade.
No caso de alguma empresa deixar de ser operador de transportes no SIA o TIP efetuará a retoma dos referidos SAM pelo valor referido no parágrafo anterior.
(viii) ANEXO IX AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO
1. INTRODUÇÃO
Para o efeito do disposto nas Cláusula 40.ª e Cláusula 41.ª do Caderno de Encargos, o desempenho do Cocontratante é avaliado pelo Contraente Público com base nos seguintes indicadores:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
[…]
MEMÓRIA DESCRITIVA
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO
1. Enquadramento
O Regulamento 1370/2007 e o Regime Jurídico do Serviço Público de Transportes de Passageiros (RJSPTP) determinam que, a partir de 3 de dezembro de 2019, a exploração do serviço público de transporte de passageiros terá de ser atribuída através da celebração de contratos de serviço público, cuja adjudicação deve, em regra, ser realizada com base num concurso público que garanta a aplicação dos princípios da transparência e da igualdade de tratamento dos operadores concorrentes. Neste contexto foi adotado o modelo de concorrência regulada em que a concorrência entre os operadores de transporte é assegurada externamente ao serviço público de transportes e não na sua exploração, isto é, a competição é manifestada na atribuição dos serviços e não na realização dos serviços propriamente ditos.
Trata‐se de um processo complexo em que a falta de experiência e o deficit de informação neste setor, particularmente no que respeita à procura, constitui uma considerável limitação nesta nova conjuntura, que agrava a dificuldade do seu tratamento e exige um esforço suplementar para a sua superação. O desafio consiste em substituir um serviço de transportes públicos, que no caso da área metropolitana do Porto é explorado por um número significativo de operadores (cerca de 30), segundo um modelo de concessões linha a linha outorgadas, a seu pedido, de acordo com o Regulamento de Transportes em Automóveis, publicado em 1948 e, entretanto, revogado pela Lei nº 52/2015, de 9 de junho, por um serviço que, com o enquadramento legal vigente, resultar do concurso público promovido pela autoridade de transportes competente, que passa a exercer um papel determinante na sua definição.
[…]
2. Objetivos e limitações
No início deste processo foram identificados os objetivos estratégicos a alcançar tendo necessariamente em conta o contexto local onde se desenvolverá o serviço público de transportes de passageiros e que poderá limitar as opções a tomar.
Assim, tomando os interesses dos cidadãos como foco principal, a AMP teve em conta não só as necessidades de mobilidade da população, mas também o financiamento disponível, procurando conjugar a qualidade do serviço a prestar com os recursos a mobilizar para se atingir essa qualidade.
A questão relevante será conhecer‐se o que se deseja alcançar a nível da política de transportes, nomeadamente, em termos da repartição modal, dos grupos‐alvo a servir e da intermodalidade, que no seu conjunto vão contribuir para a definição das características gerais do serviço que será disponibilizado.
O serviço a implementar pretende assegurar uma melhoria na qualidade da oferta dos transportes públicos, nas suas várias vertentes de cobertura espacial e temporal, mas também do material circulante, atendendo às necessidades específicas de cada segmento da população e, em particular, à acessibilidade a pessoas com mobilidade reduzida, promovendo a inclusão social e territorial.
O objetivo estratégico consiste em proporcionar uma maior atratividade do transporte coletivo que conduza a um crescimento na sua utilização e, por outro lado, contribua para um ambiente mais saudável, reduzindo o congestionamento, as emissões poluentes e o ruído, ou seja criando as condições para uma efetiva melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.
A auscultaço permanente dos municípios permitiu a sua participação ativa neste processo, quer no desenho da rede e dos serviços que responda às necessidades e aos anseios dos seus munícipes, mas também na identificação das limitações de vária natureza que as circunstâncias locais impõem, em especial no que respeita à infraestrutura viária
[…]
CAPÍTULO II – MODELO DE CONCURSO E EXECUÇÃO DO CONTRATO
3. Tipo de procedimento
O procedimento concursal adotado é o de um concurso público internacional, sem prévia qualificação, organizado por lotes que correspondem a espaços geográficos. Esta organização por lotes segue a orientação genérica do atual Código de Contratos Públicos. Dada a dimensão do serviço público de transportes a explorar, a não organização do concurso em lotes exigiria a presença de um operador com uma capacidade disponível a nível de material circulante que exigiria cerca de um milhar de viaturas ao serviço, o que, com o conhecimento do mercado atual das empresas de transporte a nível regional e mesmo nacional, limitaria de forma expressiva a concorrência, pois inviabilizaria uma grande parte delas, ou mesmo todas, de se apresentarem a concurso.
Nos termos permitidos no Código dos Contratos Públicos, a cada concorrente, e a concorrentes que se encontrem em relação de domínio ou de grupo nos termos previstos no Programa de Concurso, não poderá, em regra, ser adjudicado mais do que um lote, a menos que existam lotes com apenas um concorrente ou no caso de se verificar um número de concorrentes inferior ao número de lotes. Esta regra tem em vista evitar o esvaziamento futuro do mercado de transportes com a concentração da totalidade do serviço na área metropolitana do Porto num único operador de transportes, garantindo à AMP a diversidade de operadores no território, minimizando a dependência de um único operador e fomentando também a concorrência num futuro contrato.
4. Lotes
A constituição dos lotes baseia‐se na criação de Unidades Territoriais constituídas por concelhos contíguos e que apresentam uma maior proximidade em termos de interdependência funcional, medida quer pelo número de viagens pendulares realizadas entre eles, de acordo com o resultado obtido no Censos 2011, quer pelo número de serviços intermunicipais da atual rede de transportes públicos rodoviários que os ligam.
Exclui‐se deste processo o concelho do Porto, já que a rede de transportes públicos que o serve é explorada em regime de exclusividade pela STCP até 2023, de acordo com o contrato de serviço público entretanto celebrado.
A opção em definir as Unidades Territoriais por agregação de concelhos resulta dos dados existentes de mobilidade apresentarem este tipo de desagregação, mas também por uma maior simplicidade na futura gestão dos contratos, em particular na definição e aplicação de regras de repartição dos encargos municipais para o financiamento do sistema de transportes.
Por outro lado, a atribuição do serviço de transportes públicos por lotes/unidades territoriais também irá facilitar não só a gestão dos contratos, como também a informação ao público, distribuindo‐a por unidades mais pequenas.
A determinação do número de lotes e respetiva dimensão atendeu quer à coerência do território em matéria de mobilidade, quer ao volume de serviço público de transportes associado a cada um, de forma a dispor‐se de uma solução equilibrada entre Unidades Territoriais e simultaneamente se garanta uma exploração com uma dimensão mínima suficientemente atrativa que justifique, por parte dos operadores, a mobilização dos recursos materiais, humanos e financeiros que cumpram as exigências pretendidas de qualidade do serviço público de transporte de passageiros.
Assim, foram criados os cinco lotes seguintes:
[…]
5.2 A opção pelo contrato de serviço público
A AMP analisou as duas modalidades de contrato de serviço público previstas na Lei 52/2015 – contrato de concessão de serviço público de transporte de passageiros e contrato de prestação de serviço público de transporte de passageiros – e o modelo contratual escolhido para a contratualização do serviço público de transporte rodoviário de passageiros foi o de contrato de prestação de serviço público de transporte de passageiros (contrato em que o operador de serviço público se obriga a prestar o serviço público de transporte de passageiros em condições e por um período determinado pela autoridade de transportes competente, mediante o pagamento de uma determinada remuneração por parte da mesma).
Entende‐se que o contrato de prestação de serviço público de transporte de passageiros corresponde ao modelo que melhor se ajusta à situação concreta da AMP
[…]
Assim, o valor a pagar ao operador compreende a soma de 2 parcelas, sendo que uma corresponda um valor fixo que resultar da concorrência no mercado, com um valor máximo de 1, 70 € por quilómetro e uma outra parcela de valor igual a 1/4 da totalidade da receita tarifária, constituindo os restantes 3/4 receita da AMP.
Como referido, para além deste pagamento regular há também um mecanismo de incentvos e penalizações ajustados a objetivos concretos da qualidade de serviço e que no máximo podem representar uma variação de 8 % relativamente ao valor fixo correspondente à 1ª parcela atrás descrita. Isto é, a melhoria da qualidade de serviço, refletir‐se‐á quer na 1ª parcela através do sistema de “bónus e malus”, quer na 2ª parcela por atrair naturalmente mais passageiros. Em conclusão, esta solução de um contrato de prestação de serviço, que combina, em alguma medida, transferência do risco de procura para o operador, evita que se coloque a totalidade desse risco do lado da AMP, sem prejudicar as vantagens que este modelo de contrato apresenta com uma maior flexibilidade na implementação de políticas tarifárias e na alteração do serviço. Deste modo, conclui‐se que a opção pela celebração de contrato de prestação de serviços de transporte público com um operador de serviço público selecionado através de um procedimento concorrencial consubstancia a decisão mais adequada que permite promover a sustentabilidade do sistema do serviço público de transporte de passageiros na AMP, garantindo uma partilha equilibrada de riscos, custos e responsabilidades entre aquela e o operador e que seja simultaneamente compatível com os interesses públicos e privados subjacentes à exploração do serviço público em causa com recurso à colaboração de entidades privadas. […]
6. Preço base
O preço base para a remuneração de um quilómetro de serviço foi estabelecido atendendo à estrutura de custos da produção nomeadamente ao custo da mão‐de‐obra (motoristas) que representa cerca de 37% do custo global, do gasto em energia (combustível), cujo valor é de cerca de 35%, do investimento e manutenção do material circulante responsável por cerca de 21% e do custo da estrutura fixado em cerca de 7%.
O valor apurado correspondente ao valor máximo que o operador em fase de concurso poderá propor, é de 1,70 €, ao qual se terá de acrescentar a parcela correspondente a 25 % da receita tarifária, que se estima ser, em média, de 0,25/0,30 €. Deste modo o valor máximo previsto de pagamento por cada quilómetro de operação será, em média, cerca de 2,00 €, que se ajusta à informação recolhida em situações análogas em Portugal. 7. Duração do contrato
A duração do contrato é de 7 anos, cumprindo a legislação aplicável que estabelece, como regra, uma duração máxima de 10 anos. Sendo contratos de 1ª geração com falhas de informação sobre o setor, em particular no que se refere à procura, poder‐se‐ia justificar durações do contrato mais curtas, o que limitaria as exigências de qualidade do serviço, em particular no que respeita ao material circulante a disponibilizar, por não permitir a recuperação do capital investido.
O contrato com a duração de 7 anos, tem um tempo suficiente para a recuperação dos investimentos efetuados, de acordo com o estudo económico‐financeiro.
8. Risco (…)
A afetação do risco às partes (autoridade de transportes e operadores) está representada na tabela seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
[…]
10. Execução do contrato
No início do contrato decorre um Período de Transição, com uma duração máxima de 6 meses, em que o serviço público de transporte de passageiros continuará a ser assegurado pelos atuais operadores. Considera‐se que a duração desse período é suficiente para o adjudicatário se preparar para realizar o serviço, efetuando todas as diligências e desenvolvendo todas as ações necessárias para poder cumprir com as suas obrigações contratuais.
A este período segue‐se o Período de Funcionamento Normal durante o qual o operador assume em pleno a prestação do serviço público de transporte de passageiros contratualizado.
A definição do serviço a prestar, designadamente no que respeita ao percurso das linhas, amplitude e frequência do serviço, tarifário e características do material circulante é estabelecida anualmente pela AMP no Plano de Oferta, cabendo ao operador definir a correspondente proposta de Plano de Operação a aprovar pela AMP, onde constam os horários de cada serviço e o material circulante a utilizar.
[…]
11. A (limitada) elasticidade do objeto contratual e a minimização de modificações contratuais
Durante a execução do contrato estão previstas eventuais alterações ou ajustamentos do serviço, quer por iniciativa da AMP, quer do operador, de forma a garantir flexibilidade na adaptação do serviço a futuras características da procura, cujo conhecimento rigoroso é complexo de prever, em particular num horizonte com esta extensão temporal de 7 anos. Especial atenção é dada às linhas que fazem serviço às Escolas de modo a garantir‐se horários compatíveis com os horários dos alunos.
Não obstante o rigor com que foi elaborada a Rede e a oferta incluídas no Anexo III ao Caderno de Encargos, tem de assumir‐se que as necessidades de mobilidade da população não se manterão estáticas ao longo de toda a duração do contrato, sendo previsível que haja necessidades de novos serviços de transporte e ajustamento de outros. O serviço público de transporte de passageiros constitui uma necessidade dinâmica, que a AMP não pode ignorar.
Por essa razão, procedeu‐se a um recorte flexível (ainda que não ilimitadamente flexível) do objeto do contrato. Sendo certo que a rede e a oferta objeto do anexo III ao Caderno de Encargos abrange uma determinada produção quilométrica mensal, para cada lote, define‐se na cláusula 14.ª que tal produção quilométrica mensal pode sofrer variações ao longo de cada mês que não excedam 10% dessa produção quilométrica mensal. O limite de variação de 10% corresponde ao máximo de incerteza que se entende aceitável transferir para o operador, atendendo ao serviço que está em causa e às especiais necessidades de recursos que o mesmo supõe que podem ter de ser mobilizados perante variações da quantidade de serviços a prestar.
Esta delimitação flexível do objeto do contrato tem a virtualidade de oferecer à AMP maior estabilidade contratual, evitando a justificação de tais necessidades de transporte à luz do regime previsto para os serviços complementares previstos no artigo 454.º do CCP, já posicionados no plano das modificações objetivas do contrato. Até 10% da produção quilométrica mensal – tanto para mais como para menos – o operador tem de realizar (ou não realizar) o serviço em causa, que ainda está incluído no objeto contratual, e a sua remuneração obedece ao regime previsto na cláusula 42.ª do caderno de encargos. As variações da produção quilométrica em causa podem resultar:
a) Dos planos de oferta anuais elaborados pela AMP, que ajustam a Rede e a oferta a necessidades entretanto verificadas, designadamente decorrentes de alterações aos planos de transporte escolar (cláusula 11.ª);
b) Da necessidade de o operador dar resposta a aumentos previsíveis da procura, em caso de tal resposta ter de ser feita através do aumento do numero de frequências (clausula 12.ª) – esta situação, embora parta da iniciativa do operador, tem de ser autorizada pela AMP;
c) Na sequência de alguns desvios dos percursos constantes dos Planos de Operação por causa não imputável ao operador devidamente autorizados pela AMP
d) Na sequência de pedidos a qualquer momento da AMP.
Fora deste limite dos 10% ficam evidentemente os ajustamentos pontuais previstos no artigo 31.º do RJSPTP (e cláusula 13.ª do caderno de encargos), determinados pela AMP por razões de interesse público e mediante decisão unilateral fundamentada, os quais, desde que respeitados os requisitos previstos na lei, não conferem ao operador direito a qualquer compensação ou remuneração suplementar.
Neste quadro, só quando seja atingido o limite de 10% da produção quilométrica mensal, nos termos previstos na cláusula 14.ª, fica a AMP perante a iminência de ter de recorrer ao instituto dos serviços complementares, previstos no artigo 454.º do CCP, para fazer face a novas necessidades de transporte, caso em que o regime previsto na lei terá de ser cumprido. No entanto, mesmo nesse caso, procurou‐se minimizar a necessidade de acordo com o operador, conferindo‐se estabilidade ao contrato, estipulando‐se desde já o preço a pagar pela AMP por tais serviços complementares dentro da margem de liberdade de estipulação contratual conferida pelo CCP. Prevê‐se, assim, na cláusula 48.º que o preço a pagar pelos serviços complementares é o preço indicado na proposta do operador, a menos que este demonstre que a realização de quilómetros a mais implica um aumento do custo por quilómetro que suportaria não fora a realização dos serviços complementares, devendo nesse caso os quilómetros a mais serem remunerados pelo preço proposto majorado em função da medida, expressa em valor percentual, do aumento do custo por quilómetro que o operador demonstre e, em todo o caso, com o limite de 10 %. 12. Remuneração do operador
A partir do início do Período de Funcionamento Normal é pago ao operador, com periocidade mensal um valor que resulta da soma de 2 parcelas, correspondentes, por um lado, à oferta/produção e, por outo lado, à procura:
I. Preço correspondente à produção quilométrica, calculada pelo produto da remuneração unitária (por quilómetro) proposta pelo operador, pelo número de quilómetros elegíveis
II. Parcela correspondente a 25 % da receita tarifária
Os quilómetros elegíveis são os realizados pelo operador devidamente autorizados pela AMP, na fase de apresentação do Plano de Oferta, eventualmente corrigidos pelas alterações/ajustamentos que se venham a considerar necessárias e após aprovação pela AMP.
O preço unitário referido na alínea i) é corrigido anualmente pelo valor máximo da Taxa de Atualização Tarifária (TAT).
Estão, ainda, previstos bónus e penalizações, em função das condições em que o serviço é prestado, com uma variação máxima de 8%, aplicados ao valor unitário proposto pelo operador. A avaliação da qualidade do serviço é feita com base no cálculo de indicadores de pontualidade, de cumprimento do serviço, de cumprimento da 1º e último serviço e da idade média da frota, com regularidade mensal, e como resultado do inquérito de satisfação aos passageiros realizado anualmente.
Acresce ainda como receita própria do operador a resultante do exercício de atividades publicitárias, desde que autorizadas pela AMP.
CAPÍTULO III – ESPECIFICAÇÃO DO SERVIÇO
13. Princípios gerais
A definição do serviço público de transporte de passageiros a contratar contou com a participação ativa dos municípios e foi sujeito a várias iterações, nas quais se procurava verter em aproximações sucessivas as necessidades e limitações das diferentes comunidades.
De um modo geral o serviço atual foi o ponto de partida, já que o comportamento das pessoas no acesso ao transporte público é adaptado à sua existência e seriaprovavelmente imprudente recomeçar tudo de novo, sujeitando a alterações dos seus hábitos, sem atender ao passado, como se ele não existisse.
Este pressuposto de reconhecimento da importância em conhecer efetivamente o serviço efetuado exigiu um levantamento tanto quanto possível exaustivo da situação presente, que envolveu a consulta das linhas registadas pelos operadores no SIGGESC e posterior validação pelos municípios e também pelos próprios operadores dado o conhecimento que tinham do serviço oferecido, a fim de corrigir a informação e suprir as falhas. Neste trabalho participativo estiveram igualmente envolvidas as Comunidades Intermunicipais vizinhas, sempre que as linhas em causa tinham natureza inter‐regional.
Reconhecendo‐se que o SIGGESC não esgotava o conhecimento exaustivo do serviço público de transportes de passageiro, particularmente no que se refere aos horários e tarifário praticado nas linhas de transporte público, foi desenvolvida uma Base de Dados, que complete a informação disponibilizada pelo SIGGESC e, por outro lado, seja concebida de forma a responder às necessidades particulares da área metropolitana do Porto.
No total foram verificadas 629 linhas base, das quais 248 são linhas municipais, 292 são linhas intermunicipais e 89 linhas interregionais, não incluindo a oferta da STCP, pelos motivos já referidos anteriormente. Como resultado desta primeira etapa foram elaboradas e disponibilizadas fichas que, com recurso a uma bateria de indicadores, continham a caracterização e avaliação do serviço atual em cada município.
Igualmente foi realizada uma avaliação dos níveis mínimos de serviço em cada município, de acordo com o Anexo ao Regime Jurídico do Serviço Público de Transporte de Passageiros.
No Anexo III apresenta‐se, por município, o resultado desta análise que serviu de ponto de partida para a definição dos serviços de transporte público a contratualizar. Este
estudo preliminar foi apresentado a cada um dos municípios que integram a AMP, com
exceção do município do Porto dada a singularidade do seu serviço estar assegurado
pela STCP, em regime de exclusividade.
A estrutura do estudo comum aos 16 municípios compreende os seguintes capítulos:
1. Caracterização do território, com referência à população e densidade populacional em cada freguesia do município, bem como a proporção da população residente em função do seu escalão etário, em particular com idade superior a 65 anos, e da sua condição perante o trabalho.
2. Caracterização dos padrões de mobilidade de acordo com a última informação censitária do INE (censos 2011), com referência especial aos movimentos pendulares classificados em função do seu destino (municipais, intermunicipais e inter‐regionais) e do meio de transporte utilizado (automóvel, transporte coletivo rodoviário e ferroviário, a pé, etc.
A relação entre o transporte coletivo e o transporte individual e também a identificação dos municípios de destino foram desagregadas por freguesia.
Em cada município foi comparada a população noturna (residente) com a população diurna que resulta dos movimentos de entrada e saída, tendo sido, ainda, analisadas as lógicas de interdependência municipal, identificando‐se os municípios de origem e de destino das viagens realizadas.
3. Caracterização da oferta, recorrendo‐se aos seguintes indicadores:
a) Por operador
i. Número de linhas e respetiva classificação por tipo (base ou parcelar) e por alcance (municipais, intermunicipais e inter‐regionais)
ii. Número de linhas integradas no Sistema Intermodal Andante
iii. Extensão total das linhas base classificadas por alcance iv. Número de paragens e distância média entre paragens das linhas
classificadas por alcance
v. Número médio de viagens diárias das linhas classificadas por tipo e por alcance
vi. Oferta anual em veic*km das linhas classificadas por tipo e por alcance
b) Por período escolar e não escolar
i. Número de linhas, número de viagens anual e oferta anual (veic*km) em dias úteis, sábados, domingos e feriados
ii. Número médio de viagens por hora nos períodos das 0 às 7; das 7 às 10; das 10 às 17; das 17 às 20 e das 20 às 24 em dias úteis, sábados, domingos
iii. Proporção das viagens diárias realizadas no período de ponta (7‐10) em dias úteis, sábados e domingos e feriados
iv. Número de linhas que no período de ponta (7‐10) tem frequência alta (>= 9), média (>= 4) e baixa (<4)
v. Número de linhas com índice de reversibilidade que compara o número de viagens de ida com o número de viagens de volta, alto (inferior a 10% de viagens com apenas 1 sentido), médio (inferior a 30% de viagens com apenas 1 sentido) e baixo (igual ou superiora 30% de viagens com apenas 1 sentido)
c) Por freguesia (CAOP 2011)
i. População residente e população servida (a menos de 250 metros de uma paragem)
ii. Área total e área servida
iii. Extensão total das linhas base classificadas por alcance
iv. Número de paragens
v. Oferta anual (veic*km)
vi. Cobertura populacional e territorial
vii. Cobertura linear das linhas por habitante e por unidade de área
viii. Relação da oferta anual por habitante e por unidade de área
ix. Densidade de paragens por habitante e por unidade de área
x. Caracterização do transporte escolar, considerando os seguintes indicadores:
xi. Número de alunos matriculados no ensino básico e secundário, por escola
xii. Número previsto de alunos que usam transporte público, por escola
xiii. Número e Identificação das linhas de transporte regular e respetivo operador que transportam alunos
xiv. Número e identificação dos circuitos especiais e respetivo número de alunos beneficiados
xv. Encargos globais anuais e por aluno transportado com o transporte escolar, repartido pelos gastos na aquisição de passes e na contratação dos circuitos especiais
d) Avaliação dos níveis mínimos de serviço com recurso à seguinte metodologia
i. Identificação dos locais (BGRI e lugares) com população residente superior a 40 habitantes
ii. Identificação dos equipamentos e serviço públicos de referência a nível municipal objeto de análise
1. Câmara Municipal
2. Tribunais
3. Repartição de Finanças
4. Hospitais e Centros de Saúde
5. Escolas Básicas do 2º e 3º Ciclo
6. Escolas Secundárias e Profissionais
iii. Identificação das linhas rodoviárias/ferroviárias que servem osequipamentos (com paragem a uma distância inferior a 250/500 m)
iv. Identificação dos locais com ligação direta aos equipamentos garantida pelas linhas referidas no ponto anterior
v. Identificação de linhas que intersetam os locais não servidos que cruzam com as linhas de ligação direta
vi. Produção de informação cartográfica, por equipamento com a identificação dos locais com e sem a respetiva ligação
vii. Proposta de rede mínima a utilizar como ponto de partida no processo de conceção da rede de transportes públicos e respetiva caracterização sumária
14. Descrição sumária do serviço
No desenho da rede de transportes públicos a contratualizar foram adotados os seguintes princípios gerais:
a) Definição do serviço de transporte público a partir da rede atual
b) Aumento da cobertura populacional da rede quer em termos espaciais, quer principalmente em termos temporais
c) Racionalização da oferta em canais onde atualmente há excesso de serviço
d) Criação de um maior grau de conetividade da rede, em particular no que respeita à ligação ao transporte ferroviário
e) Eliminação das principais sobreposições com a rede da STCP, cujo serviço definido no Contrato de Serviço Público existente constituiu uma invariante em todo este processo.
No seguimento destes princípios gerais foram adotadas algumas regras na definição do
serviço:
a) Manutenção do serviço ao longo de todo o ano em todas as linhas, evitando linhas que funcionam apenas em período escolar
b) Reconversão dos circuitos especiais de transporte escolar em linhas de transporte regular
c) Garantia da cobertura territorial especificada pelos Níveis Mínimos do Serviço Público de Transporte de Passageiros
d) Adoção de uma frequência mínima de 2 serviços de ida e volta nos dias úteis
e) Garantia de serviços de ida e volta em todas as linhas
Embora na grande maioria das situações estas regras tenham sido adotadas, há algumas exceções que, por dificuldades de vária natureza, designadamente pela necessidade de uma mobilização excessiva de recursos ou por dificuldades criadas pelas condições da rede viária, não foi possível implementá‐las.
Na tabela seguinte apresentam‐se os dados mais importantes do serviço proposto agrupados por Unidade Territorial. [imagem que aqui se dá por reproduzida]
A contribuição dos operadores neste processo, pelo conhecimento que dispõe da realidade, pode ser valiosa e não deve ser desperdiçada. É evidente que no caso do modelo adotado de Prestação de Serviço, este deverá ser rigorosamente especificado, o que pode limitar as contribuições dos operadores. No caso presente e tendo em conta o potencial benefício em incorporar estes contributos na proposta de rede foi fixada, por linha, uma oferta global e uma oferta base que compreende apenas a oferta correspondente ao serviço base, isto é, a serviços completos. A oferta em serviços parcelares é proposta posteriormente pelos operadores, sujeita à aprovação da AMP.
Do mesmo modo, apenas são fixadas as frequências pretendidas, por período do ano e tipo do dia, bem como a amplitude do serviço deixando ao operador a definição dos horários, mais uma vez após aprovação da AMP. Esta flexibilidade para que os operadores possam definir os horários e as viagens parcelares permite a coordenação e encadeamento dos serviços, tendo um impacto muito relevante na eficiência da operação. Esta possibilidade traduz‐se numa melhor afetação dos recursos humanos e materiais, resultando no final um menor custo global do contrato.
No que respeita ao sistema tarifário e de bilhética a opção foi adotar o Sistema Intermodal Andante em toda a rede, incluindo nas linhas inter‐regionais. (…)
No que respeita à frota, que apresentará uma imagem comum em todo o território, prevê‐se uma evolução faseada, obedecendo a limites mínimos para a emissão de poluentes, tendo sido fixado o EURO III nos três primeiros anos e o EURO IV nos quatro anos seguintes. Igualmente são definidas algumas características mínimas e dispositivos tecnológicos que cada viatura deve obedecer e são estabelecidos limites máximos mensais para a idade média ponderada pelos quilómetros realizados pelas viaturas. Finalmente em relação à informação ao público da responsabilidade dos operadores de transporte será criado um modelo único que facilitará não apenas a sua leitura, mas também a sua produção.
15. Níveis mínimos do serviço público de transporte de passageiros
O atual Regime Jurídico do Serviço Público de Transporte de Passageiros (RJSPTP) determina que as autoridades de transportes no âmbito das suas competências de planeamento e atribuição das redes e linhas do serviço público de transportes de passageiros devem assegurar, no mínimo, os níveis de serviço definidos no Anexo do RJSPTP.
Neste sentido foi realizado uma análise da garantia de oportunidade do acesso dos cidadãos a um conjunto de serviços essenciais para o seu quotidiano atendendo à oferta global do sistema de transportes na AMP, incluindo não apenas a rede rodoviária proposta, mas também a rede dos operadores públicos, STCP, Metro do Porto e CP.
No Anexo V apresenta‐se o resultado deste estudo.
CAPÍTULO IV – AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO
16. Monitorização
Assume especial relevância durante a execução do contrato a monitorização do serviço, não apenas para se verificar o (in)cumprimento das obrigações contratuais pelo operador e facilitar a realização de inspeções e auditorias, mas também pelos eventuais reflexos no valor a pagar ao operador de transporte pelo serviço prestado, o que requer que se obtenha informação fiável, completa e de fácil acesso e tratamento. Para além destes objetivos a monitorização permite, ainda, avaliar a qualidade do serviço oferecido, identificando as suas fragilidades e assim, contribuir para a melhoria do sistema.
(…)
17. Prémios e penalizações
Como referido anteriormente é criado um sistema de prémios e penalizações resultantes da avaliação do serviço com recurso aos seguintes indicadores.
i. Pontualidade do serviço – permite avaliar em cada serviço o grau de cumprimento do horário planeado
ii. Cumprimento do número de viagens – permite avaliar se os serviços planeados foram ou não realizados
iii. Cumprimento do 1º e último serviço – permite avaliar se o 1º e último serviço previstos em cada dia foram ou não realizados
iv. Idade média do material circulante – permite avaliar a idade média da frota ponderada pela extensão realizada por cada viatura
v. Índice de satisfação dos passageiros – permite avaliar o nível de satisfação dos passageiros do serviço prestado.
A informação relativa aos quatro primeiros indicadores é recolhida diariamente a partir do sistema de informação e transmissão de dados que o operador terá de disponibilizar nas condições previstas no Caderno de Encargos e respetivos Anexos. Quanto ao quinto indicador a sua periodicidade é anual e resulta de um inquérito de satisfação, em que a apreciação do serviço prestado ao passageiro é baseada em critérios relacionados quer com as características da viatura, quer com o comportamento do pessoal afeto ao serviço.
CAPÍTULO V – FUNDAMENTAÇÃO ECONÓMICO‐FINANCEIRA
[…]
18. Metodologia da análise custo benefício e comparador público
18.1. Método
Pressupostos e metodologia geral – Operação privada e pública:
O presente capítulo densifica, em complemento aos capítulos anteriores, designadamente à matriz de risco sistematizada em 8. a análise custo/benefício nos termos e para efeitos do n.º 3 do art.º 36.º do CCP.
Os resultados obtidos foram elaborados com base em informação recolhida pelos serviços da Área Metropolitana do Porto (AMP) e com base nos rácios médios do setor.
Para a concretização da análise custo benefício, foi utilizado o método dos fluxos de tesouraria descontados – Discounted Cash Flow (DCF) em conformidade com a Guia para Análise Custo‐Benefício de Projetos de Investimento (Guide to Cost‐benefit Analysis of Investment Projects – Economic appraisal tool for Cohesion Policy 2014‐2020, seguindo a metodologia prevista no artigo 100.º do Regulamento (UE) N.º 1303/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013 e de acordo com o Artigo 18.º do Regulamento Geral dos FEEI (DL Nº 159/2014, de 27 de outubro) aplicando este método a duas variantes: Operação Pública e Operação Privada, do qual resulta o comparador público.
O DCF é atualmente o método mais utilizado para fins de avaliação de empresas e projetos, sendo reconhecidamente o mais objetivo.
No método do DCF, o valor da empresa ou projeto corresponde ao somatório do valor atual dos cash‐flows futuros gerados pela mesma ao qual poderá acrescer o valor patrimonial presente.
O método DCF tem duas características principais:
1. Só são considerados os fluxos de tesouraria, ou seja, o montante real de dinheiro pago ou recebido. Assim, categorias contabilísticas que não constituam numerário, como, por exemplo, as depreciações/amortizações e as imparidades/provisões para imprevistos, não são incluídas na análise DCF;
2. Os fluxos de tesouraria futuros são descontados para o valor atual utilizando um fator de desconto que diminui com o tempo e cuja ordem de grandeza é determinada pela escolha da taxa de desconto a utilizar na análise DCF.
A rentabilidade financeira nas variantes operador privado e público foi, desta forma, avaliada calculando‐se o valor atual líquido financeiro. Este indicador representa a capacidade de as receitas líquidas remunerarem os custos de investimento, independentemente da fonte de financiamento.
Assim, o Valor Atual Líquido (VAL) resultou da diferença entre:
• As receitas líquidas atualizadas (apuradas pela diferença entre a soma de receitas atualizadas e os custos de funcionamento e exploração atualizados);
• Os custos de investimento acrescidos do valor residual calculado no final do período.
Ou, esquematicamente:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
Em que:
It – investimento em t;
Rt – receitas brutas de exploração em t;
Dt – despesas brutas de exploração em t;
i – taxa de atualização
n – período de referência, em anos.
Foram considerados dois métodos de avaliação:
Free Cash Flow to Equity – No método de avaliação pelo desconto de fluxos de caixa líquido do acionista (FCFE – do inglês Free Cashflow to Equity), o objetivo é avaliar diretamente o património líquido da empresa.
Free Cash Flow to Firm – Em linhas gerais, o método dos fluxos de caixa descontados consiste em estimar‐se os fluxos de caixa futuros da empresa e trazê‐los a valor presente por uma determinada taxa de desconto (WACC). Em outras palavras, o valor de uma empresa pode ser expresso como o valor presente do fluxo FCFF (fluxo de caixa líquido para a firma, do inglês Free Cash Flow to Firm).
Foram considerados ainda os seguintes pressupostos assumidos no estudo.
Período de referência – Operação privada e pública:
Como período de referência foi utilizado o período do procedimento, 7 anos.
Assim, foi considerado o período de 2020 a 2026.
Taxa de desconto – Operação privada:
[…]
Taxa de desconto – Operação pública:
[…]
Investimento e financiamento – Operador privado e público:
[…]
Valor residual – Operação privada e pública:
[…]
Vendas e outros rendimentos – Operação privada e pública:
Para estimar a RMV foram utilizados os valores reais que estão a verificar‐se desde a implementação do PART, uma vez que será este o regime tarifário imposto nos futuros contratos.
[…]
Receita Média por Passageiro – Operação privada e pública
O valor global da RMV líquida de comissões e sem IVA, no trimestre de maio a julho de 2019, foi de 0,581 €.
[…]
Número de Passageiros – Operação privada e pública
Quanto ao nº de passageiros, recorreu‐se a duas fontes:
a) Valores do Inquérito Geral da Mobilidade (IGM) realizado pelo INE
b) Valores comunicados pelos operadores para efeitos da aplicação do PART (estes apenas referentes a títulos de assinatura mensal)
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
[…]
Conclusões:
a) O valor do nº de passageiros pode ser balizado entre 43 e 54,4 milhões (valores de 2017), considerou‐se, por prudência, o limite inferior daquele intervalo;
b) Foi considerada a RMV de 0,581 €;
c) Foi ainda considerado como rendimento incremental a dotação do OE e Municípios para financiamento do PART – que ascende a cerca de 20 M€/ano.
[…]
Recursos humanos – Operação privada e pública:
Não existe um benchmark sólido sobre o n.º de motoristas nem os incumbentes atuais disponibilizaram dados que permitam esta extrapolação.
Não obstante, consideraram‐se as seguintes informações:
a) A STCP apresenta um rácio de cerca de 24.000 km por motorista.
b) Anuários publicados por entidades do setor apontam para cerca de 40.000 km/motorista (que poderão incluir serviços para além do transporte regular).
c) Será expectável que a STCP apresente um valor menor por se tratar de serviço urbano com velocidade comercial mais baixa.
Nesta conformidade, foi assumido um valor intermédio de 32.000 km por motorista para a análise na ótica do operador privado e 24.000 km por motorista na ótica do operador público.
Na análise custo benefício em cada uma das óticas utilizou‐se o valor médio dos
respetivos setores, público (operador interno) e privado, cujos valores mensais constam dos mapas em anexo.
Fornecimentos e serviços externos – Operação privada e pública:
Para a estimativa dos fornecimentos e serviços externos da operação consideraram‐se os gastos médios do sector, mantendo‐se para ambos os cenários em apreço.
No que concerne aos gastos inerentes à frota, consideram‐se os seguintes custos por km:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
[…]
CAPÍTULO VI – CONCLUSÕES
19. Resultado da análise custo benefício e comparador público
Concluindo, da análise custo/benefício apurada nos pontos anteriores resulta que a operação privada é a que melhor salvaguarda os interesses da AMP e dos Municípios associados uma vez que:
• Minimiza os exfluxos a cargo da AMP e Municípios associados em 12.000.000 €/ano (valor necessário incremental para assegurar a viabilidade e sustentabilidade na variante operação pública);
• Não exige o recurso ao endividamento bancário para financiamento da frota de autocarros não onerando, a divida total dos Municípios associados em 46.125.000,00 €;
• Não onera o equilíbrio corrente dos Municípios associados em 12.000.000 €/ano;
• Assenta na especialização do operador privado na operação com ganhos de eficiência e eficácia mantendo, no entanto, o controlo da operação na AMP;
• Permite à AMP ganhos de know‐how capitalizando um conhecimento e base de dados que lhe permite no futuro reponderar as várias opções legalmente disponíveis;

O diferencial de viabilidade, sustentabilidade e rentabilidade evidenciado entre as duas variantes de operação, privada e pública, seria ainda mais agravado, reforçando que a opção mais racional e vantajosa para a AMP era a da operação privada, se se atualizassem outras variáveis do custo de operação, designadamente os gastos de manutenção e reparação, mais caros na operação pública.
(…)
Anexo VII – RESULTADOS DO ESTUDO DE VIABILIDADE ECONÓMICA FINANCEIRA
(…)
LISTA DOS ANEXOS
ANEXO I CONTRATOS INTERADMINISTRATIVOS COM OS MUNICÍPIOS
ANEXO II CONTRATOS INTERADMINISTRATIVOS COM AS COMUNIDADES
INTERMUNICIPAIS
ANEXO III CARACTERIZAÇÃO DO SISTEMA DE TRANSPORTES EM CADA
MUNICÍPIO
ANEXO IV ZONAMENTO ANDANTE
ANEXO V NÍVEIS MÍNIMOS DE SERVIÇO DA PROPOSTA DE REDE
ANEXO VI SISTEMA DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
ANEXO VII RESULTADOS DO ESTUDO DE VIABILIDADE ECONÓMICO‐
FINANCEIRO
Apêndice VII.a – Operação Pública
Apêndice VII.b – Operação Privada- fls. 244 e ss. do p.a.
- cfr. fls. 826 e ss., 2033 e ss. e 2267 e ss. do p.a.
12. Em 20.6.2020, pelo Chefe de Divisão da AMP, foi elaborado Memorando do qual se extrai,
MEMORANDO IMPACTO DA PANDEMIA NO CONCURSO DE TRANSPORTE PÚBLICO DA AMP 20.06.2020
1. Enquadramento O presente memorando pretende analisar do ponto de vista técnico as implicações da pandemia de Covid19 no concurso público internacional para a contratação dos transportes público (TP) na AMP, que se encontra a decorrer, e as possíveis decisões face à alteração das suas condições de origem. A atual situação de exceção que decorre da pandemia veio trazer enormes disrupções na procura do TP, e consequentemente no respetivo nível de oferta, situação esta que levará algum tempo a normalizar. A questão que se coloca nesta fase é a de perceber se os impactos e a sua duração são suficientes para colocar em causa a decisão de lançamento do concurso público tomada em janeiro e manter o seu calendário atual. É importante ter em mente que se encontra a decorrer o prazo para apresentação de propostas pelos concorrentes, que termina no dia 30 de junho, estando prevista a abertura das propostas no dia 1 de julho. Esta data é importante na medida em que uma eventual decisão de anulação do concurso deve ser tomada e notificada aos interessados antes de 30 de junho, sob pena do aumentar do risco legal para a AMP, designadamente dos pedidos de indemnização por parte dos interessados, questão que é analisada mais à frente neste documento.
2. Impacto no nível de procura O impacto da pandemia no TP decorreu da quebra quase total na procura durante o período de confinamento. Apesar de se verificar a subida gradual do número de passageiros com o desconfinamento, esta ainda está longe dos valores normais. O sistema intermodal Andante tem verificado no mês corrente uma procura de cerca de 30% do normal, enquanto no caso específico da STCP esta já ultrapassa os 50%. No entanto, quando analisamos o impacto do nível de procura no concurso, devemos ter em consideração não os valores atuais, mas sim aqueles que são esperados durante a vigência dos futuros contratos. A este respeito convém referir que, apesar do prazo limite para apresentação de propostas terminar no final deste mês, existe uma série de tramitações subsequentes que levará a que os contratos apenas entrem em vigor, na melhor das hipóteses, no 2º trimestre de 2021. De facto, após a apresentação das propostas será necessário proceder à elaboração do relatório preliminar, audiência prévia dos interessados, relatório final, decisão de adjudicação, envio para visto do Tribunal de Contas, etc. A este processo soma-se o período de 6 meses para a transição para os novos operadores (apesar desta fase se reportar já à vigência do contrato). Este prazo será muito provavelmente dilatado devido à previsível litigância que o processo vai gerar por parte dos operadores preteridos no resultado do concurso.
É importante não esquecer também que os futuros contratos irão vigorar por um prazo de 7 anos, pelo que o horizonte temporal a ter em consideração na análise do nível da procura corresponderá a um período em que esta estará muito mais próximo do normal. No entanto, há alguns fatores que indiciam que o nível de procura existente antes da pandemia poderá ser difícil de atingir, dos quais destacamos: um maior nível de desemprego, maior utilização do teletrabalho mesmo em situação normal, receio de utilização do TP e preferência pelo transporte individual (TI). Salientamos que esta tendência não é, apesar de tudo, irreversível, uma vez que existe um conjunto de ferramentas ao dispor dos municípios (e do Estado) para a promoção do TP em detrimento do TI, como por exemplo a política de estacionamento nas cidades, a criação de faixas Bus, ou o aprofundamento da política de redução tarifária. 3. Risco do concurso ficar deserto Este é um dos riscos em que naturalmente se pode pensar quando equacionamos a continuidade do concurso, principalmente quando temos conhecimento de concursos de TP de CIM’s ou municípios em que não foram apresentadas propostas por falta de interesse económico dos operadores. No entanto importa salientar as diferenças entre esses concursos e o concurso da AMP (e da AML para o caso). A principal diferença reside no facto das áreas metropolitanas terem lançado concursos para contratos de prestação de serviços (gross cost), em que o risco tarifário é da autoridade, ao contrário da maioria das restantes autoridades de transportes que lançaram concursos para contratos de concessão (net cost). Nos contratos de prestação de serviços, como o da AMP, o risco de ficar deserto é diminuto, uma vez que operador é remunerado em função dos km que realiza e não em função dos passageiros transportados. Apesar do concurso da AMP ser misto, em que o operador partilha o risco da receita tarifária ao ser remunerado num valor por km mais 25% da receita tarifária, este fato não irá seguramente levar à inexistência de propostas, uma vez que as propostas dos concorrentes serão submetidas já com a internalização das expectativas futuras da receita tarifária e poderão compensar a eventual menor procura futura com a subida do preço por km solicitado. A existência de um preço-base no concurso da AMP de 1,70 €/km continua a ser suficiente para a atratividade do concurso segundo o conhecimento que a AMP tem do mercado e da auscultação aos operadores. Poderá também ser considerada a menor capacidade dos incumbentes apresentarem propostas competitivas devido à degradação das suas condições financeiras e capacidade de endividamento, levando desta forma a um menor número de concorrentes. Mas a continuação da situação atual apenas levará a um agravamento das condições dos operadores atuais e à degradação do serviço oferecido. A redução do número dos operadores atuais seria sempre uma realidade com a decisão de reduzir o número de operadores para 5 correspondendo ao número de lotes a concurso. De qualquer forma, os atuais operadores continuam a apresentar vantagens pelo conhecimento que têm da procura, por terem motoristas que conhecem a operação, terem garagens e instalações no território, etc. Pelo exposto, consideramos que o risco do concurso ficar deserto é muito reduzido e não se afigura como razão para alterar a tramitação do concurso.
4. Risco de insuficiência tarifária
Considerando que não existe risco do concurso ficar deserto principalmente pelo facto do risco tarifário ficar do lado da AMP, temos de considerar o reverso da medalha, ou seja a possibilidade da receita tarifária ser insuficiente para que a AMP remunere os operadores. Recordamos que a possibilidade de haver necessidade de financiamento por parte dos municípios no âmbito dos futuros contratos já estava equacionada e balizada através do estudo do Prof. Mota e Costa, no qual se projetou o valor máximo expectável anual do défice tarifário dos contratos. Este valor eventual (cerca de 6,9 M€ anuais) foi calculado de forma indireta dada a falta de informação rigorosa quanto à receita tarifária do sistema de TP. Assim, foi considerado que a rede atual seria equilibrada (caso contrário os operadores atuais não a estariam a realizar), e que os futuros contratos apenas estariam a impor um custo acrescido nas exigências da qualidade da frota, tendo-se chegado assim ao valor de 6,9 M€ anuais. Naturalmente, se considerarmos que no futuro o nível de procura será menor, este valor poderá ser insuficiente para colmatar o eventual défice tarifário, mas tal poderá não vir a acontecer pelas razões que se expõem a seguir: • Conforme já referido anteriormente, poderão ser adotadas pelos municípios políticas de incentivo à utilização do TP que permitam aumentar o número de passageiros • O financiamento estatal poderá ser aumentado através do PART ou outros programas (conforme se prevê já em breve através do orçamento suplementar em aprovação). Relembramos que o PART é uma fonte importante para o financiamento dos contratos que permite complementar a receita tarifária desde que foi implementada a redução das tarifas. Um aumento na verba disponibilizada pelo Estado (que permita tornar mais equitativa a distribuição entre a AMP e a AML por exemplo) poderá colmatar a perda de receita tarifária que resulte da menor procura. • Os municípios com maior dispersão populacional, onde os índices de procura são menores, são aqueles que têm uma procura garantida assente no transporte escolar. Os gastos com transporte escolar serão alvo de uma poupança, uma vez que nos futuros contratos apenas existirá o tarifário intermodal andante, sendo o transporte escolar assegurado através dos passes de 30€. Desta forma serão libertadas verba que poderão ser utilizadas no financiamento do défice tarifário. • Redução do volume de km contratados através de racionalização da rede. Apesar de não ser desejável a diminuição do serviço de TP oferecido às populações, a formatação dos contratos teve o cuidado de permitir um nível elevado de flexibilidade. Deste modo, a AMP pode unilateralmente reduzir até 10% dos km contratados sem oposição do operador. Para reduções além deste valor, o operador poderá solicitar a reposição do equilíbrio financeiro do contrato, mas este reequilíbrio encontra-se balizado no próprio contrato e o preço por km nunca poderá aumentar mais de 10%. Nota: o mais razoável é, em caso de ser necessário o financiamento do défice tarifário pelos municípios, ser fixado o montante que estão disponíveis para financiar a rede de TP e complementar com a combinação dos restantes instrumentos para que o défice não exceda esse montante.
5. Manter o concurso versus Anulação do concurso
A única razão que nos parece plausível para a anulação do concurso prende-se com o risco de insuficiência tarifária atrás explanado, ainda que existam ferramentas que o permitem mitigar. Neste caso seria razoável argumentar que o estudo que sustentou a tomada de decisão de lançamento do concurso estaria já desatualizado, bem como as respetivas previsões de receita tarifária futuras. Relembramos que este estudo de viabilidade económico-financeiro é obrigatório para concursos deste valor (no caso da AMP o valor global do concurso representa cerca de 400 M€). A este respeito refira-se que este entendimento colocaria em causa todos os restantes concursos lançados com base em estudos realizados antes da pandemia, como por exemplo o concurso para a construção das novas linhas de metro que também foram baseados em estudos de procura ou o concurso do TP da AML, que no caso de manter a sua tramitação irá certamente suscitar interrogações quanto ao diferente entendimento adotado pelas duas áreas metropolitanas. O referido estudo (EVEF) foi elaborado com base nos dados de procura estimados através do inquérito geral à mobilidade (IGM) realizado pelo INE, cujos resultados (reportados a 2017) nos parecem subavaliar o nível de procura, quando comparados por exemplo com os dados conhecidos da procura na STCP. Apesar do EVEF assentar em valores subavaliados da procura, apresentou ainda assim uma taxa interna de rentabilidade positiva que pode permitir encarar os futuros contratos como sustentáveis apesar de uma projeção mais pessimista da procura. Em todo o caso, as ferramentas de ajustamento do volume de km contratados permitiriam sempre manter a sustentabilidade do mesmo. Apesar desta ferramenta não ser desejável, a anulação do contrato resultará exatamente nesta realidade, situação que se verifica já atualmente. De facto, se a razão para anulação do concurso for a insuficiência tarifária, por maioria de razão, a manutenção das concessões em que os operadores são remunerados por essa mesma receita tarifária levará à redução da sua oferta. Esta redução é ainda agravada pelo facto de ser difícil de controlar pela autoridade, uma vez que não existem neste enquadramento meios para monitorizar a operação no terreno. Se a única opção for a redução da oferta de TP, será preferível que esta se faça no âmbito dos futuros contratos, nos quais a AMP terá total controlo e conhecimento da operação, quer ao nível da oferta, quer ao nível da procura de modo a utilizar os recurso disponíveis da forma mais eficiente e ao mesmo tempo promover a coesão territorial. Apenas a conclusão do concurso permitirá a melhoria do serviço de TP oferecido às populações, mesmo num contexto de redução de procura, ao mesmo tempo que permitirá à AMP assumir de forma mais cabal as suas competências de autoridade de transportes com o acesso a toda a informação que lhe permita, além do controlo dos serviços realizados, uma efetiva capacidade de planeamento da rede. Por outro lado, resolveria a incerteza que a situação atual provoca nos operadores e que os limita na sua capacidade de investimento para melhoria da sua operação.
6. Riscos legais
A anulação do concurso, ou mais concretamente a revogação da decisão de contratar tomada pela Comissão Executiva da AMP em janeiro, acarreta dois tipos de riscos legais. Por um lado, o risco de pedidos de indemnização por parte dos interessados. Este risco é maior se a decisão de revogar a contratação for tomada após a submissão de propostas pelos interessados, uma vez que o CCP regula expressamente esta situação ao conceder o direito de indemnização a todos os que apresentaram propostas não excluídas. Se a decisão de revogação for tomada antes da submissão das propostas, apesar do CCP não regular expressamente, poderá ainda assim a AMP ser alvo de pedidos de indemnização ao abrigo da lei geral, uma vez que os interessados poderão já ter incorrido em custos com a preparação das propostas ou alegar perdas face às expectativas criadas.
Por outro lado, a revogação da decisão de contratar colocaria a legalidade do TP autorizado pela AMP num limbo legal. Relembramos que a prorrogação das autorizações provisórias ao abrigo das quais se encontra autorizado o TP apenas foi possível pelo facto de já se encontrar em curso o lançamento do concurso (mais concretamente já ter sido submetido a pedido de parecer à AMT). A anulação do concurso poderá tornar ilegal a prorrogação das autorizações provisórias. Mesmo que tal não suceda com base na situação excecional que vivemos e que justificaria a anulação do concurso, manter-se-iam as autorizações provisórias cujo limite de validade termina em dezembro de 2021. Continuaria a ser premente o lançamento de novo concurso num prazo curto que poderá não representar qualquer vantagem em relação à manutenção do concurso atual, ou a necessidade de proceder a contratos por ajuste direto com riscos acrescidos.
- fls. 4597 e ss. do p.a.
13. Por deliberações da Comissão Executiva do prazo de apresentação de propostas foi prorrogado até às 23.59h do dia 28.9.2020. – págs. 2428, 2430, 2438, 2614 do p.a.
14. Apresentaram proposta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, os seguintes concorrentes,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cfr. págs. 2627 e ss. do p.a.
15. A proposta da VC... (Agrupamento constituído por SG... S.L. e PS..., S.A.) ao Lote 4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, mostra-se integrada, além do mais, por
(i) Proposta económica,
“V. Que se comprometem a executar os serviços registados no Plano de Exploração do Lote 4: Prestação do serviço público de transporte de passageiros rodoviário regular na Rede “Sul‐Poente” pelo seguinte preço unitário por quilómetro indicado em euros (indicar quantias por extenso e em números), nos termos do que está disposto na alínea a) do nº. 1 da cláusula 42.ª do Caderno de Encargos.:
um euro e quinze cêntimos (1,15)
(ii) Proposta Qualidade,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
- fls. 2627 e ss. do p.a.
16. Da proposta da TZ.... ao Lote 4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta,

[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- fls. 2793 e ss. do p.a.
17. A proposta do agrupamento TB..., Lda./TF..., Lda. ao Lote 4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, mostra-se integrada, além do mais,
(i) Proposta de frota,

[imagem que aqui se dá por reproduzida]
(ii) Proposta de preço,

[imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cfr. fls. 3124 e ss. do p.a.
18. Da proposta da TN... SL ao Lote 4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- fls. 3190 e ss. do p.a.
19. Da proposta da RD..., S.A. ao Lote 4 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta,

[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- fls. 3263 e ss. do p.a.
20. Da TS..., Lda. ao Lote 4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
- fls. 3314 e ss. do p.a.
21. Da proposta da ON... – Viagens e Turismo, Lda. cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- fls. 3496 e ss. do p.a.
22. Da proposta das AA. cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- fls. 3518 e ss. do p.a.
23. Da proposta da TE..., Lda.. cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


- fls. 3645 e ss. do p.a.
24. Da proposta da TX... S.A. (agrupamento constituído por Empresa TO... SAU e TX... S.A) cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- fls. 3749 e ss. do p.a.
25. Em 15.10.2020 o Júri elaborou o relatório preliminar, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – págs. 3927 e ss. do p.a.
26. Apresentaram pronúncia, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em sede de audiência prévia ao relatório preliminar, TA..., Lda., TC..., S.A., AC..., Lda., agrupamento ..., AP... e VL... e o Agrupamento constituído pelas AA. – págs. 3948 e ss. e 4238 e ss. do p.a.
27. Em 10.02.2021 o Júri elaborou o 2.º relatório preliminar, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – págs. 4480 e ss. do p.a.
28. Apresentaram pronúncia, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em sede de audiência prévia ao segundo relatório preliminar, o agrupamento SG.../PSM e a AC..., Lda.– págs. 4553 e ss. do p.a.
29. Em reunião de 2.3.2021 a Comissão Executiva Metropolitana deliberou aprovar proposta, cujo teor aqui se dá por reproduzido, e da qual resulta,
“[…]
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

[…]

- fls. 4648 e ss. do p.a.
30. Em 4.3.2021 o Júri elaborou o terceiro relatório preliminar, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – págs. 4678 e ss. do p.a.
31. Apresentou pronúncia, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em sede de audiência prévia ao terceiro relatório preliminar, a AC..., Lda.– págs. 4764 e ss. do p.a.
32. Em 5.4.2021 o Júri elaborou o relatório final de avaliação de propostas e proposta preliminar de adjudicação dos lotes 1 a 5, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – págs. 4767 e ss. do p.a.
33. Apresentaram pronúncia, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em sede de audiência prévia, a AC..., Lda., TE.../RE..., .../AVP/VL... e o agrupamento constituído pelas AA. – págs. 4862 e ss. do p.a.
34. Em 18.5.2021o Júri elaborou o 2.º relatório final de avaliação de propostas, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – fls. 4900 do p.a.
35. Em 9.6.2021 o Júri elaborou o 3.º relatório final de avaliação de propostas, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual consta, além do mais,
“[…]
6. Entidades que apresentaram propostas
A lista de concorrentes por cada lote é a seguinte:
a) Lote 1
• TM... Sociedade Unipessoal, Lda.
• EL...
• Porto ... (Agrupamento constituído por TC..., S.A. e
TL..., Unipessoal, Lda.)
• TN... SL
• RD..., S.A.
• VT..., Lda.
• TE..., Lda.
• TE..., S.A. (Agrupamento constituído por TE..., S.A. e RE..., S.A.)
b) Lote 2
• EL...
• TN... SL
• RD..., S.A.
• CT..., Lda.
• TS....
• EG..., Lda. (Agrupamento constituído por EG..., Lda., AP..., Lda. e VL... – AP..., S.A.)
• ON... – Viagens e Turismo, Lda.
c) Lote 3
• VC... (Agrupamento constituído por SG... SL e PS..., S.A.)
• EL...
• TZ....
• TA..., Lda. (Agrupamento constituído por TM... Sociedade Unipessoal, Lda., TA..., Lda. e TL...)
• TN... SL
• RD..., S.A.
• AC..., Lda.
• TX..., S.A. (Agrupamento constituído por TO... e TX..., S.A.)
d) Lote 4
• VC... (Agrupamento constituído por SG... SL e PS..., S.A.)
• EL...
• TZ....
• TB..., Lda. (Agrupamento constituído por TB..., Lda. e TF..., Lda.)
• TN... SL
• RD..., S.A.
• TS....
• ON... – Viagens e Turismo, Lda.
• TM..., S.A. (Agrupamento constituído por TJ...
SI..., Lda., TU..., Lda. e TM..., S.A.)
• TE..., Lda.
• TX..., S.A. (Agrupamento constituído por TO... e TX..., S.A.)
e) Lote 5
• VC... (Agrupamento constituído por SG... SL e PS..., S.A.)
• EL...
• TC..., S.A. (Agrupamento constituído por TC..., S.A., e por TF..., Lda.)
• TN... SL
• RD..., S.A.
• TE..., Lda.
• TX..., S.A. (Agrupamento constituído por TO... e TX..., S.A.)
7. Primeiro Relatório Preliminar
[…]
8. Audiência Prévia e apreciação das pronúncias pelo Júri
[…]
8.5.3. Exclusão de propostas com fundamento em preço anormalmente baixo
Pronúncia do agrupamento concorrente:
Sem prejuízo de apenas ter apresentado proposta no âmbito do Lote 2, o EG... inicia este ponto da sua pronúncia em sede de audiência prévia alegando genericamente que as propostas classificadas em primeiro lugar em todos os lotes revelam um preço anormalmente baixo, pelo que, no seu entendimento, o Júri deveria efetuar uma análise discricionária do custo dessas propostas ao abrigo do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 71.º do CCP. O Agrupamento não fundamenta este seu entendimento em relação aos lotes 1, 3, 4 e 5, remetendo para um Parecer que junta.
Já em relação à proposta apresentada pela concorrente TN... no âmbito do lote 2, o EG... desenvolve a sua tese, pugnando pela exclusão daquela proposta com base no argumento de que, estando em causa, segundo o seu entendimento, um preço anormalmente baixo, tal violaria simultaneamente, não só o regime do preço anormalmente baixo previsto na alínea e) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, mas também os “princípios jurídicos fundamentais que visam a proteção e defesa da concorrência”, e nessa medida, estaria também em causa o motivo de exclusão previsto na alínea f) daquele preceito do Código.
Apreciação do Júri:
Após análise detalhada das observações apresentadas, o Júri concluiu pela improcedência do argumento em apreço, com os fundamentos que de seguida se expõem.
No que respeita ao fundamento a que se refere a alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do Código dos Contratos Públicos, remete-se para o que já anteriormente se referiu a esse propósito.
Quanto ao fundamento a que se refere a alínea e) do n.º 2 do artigo 70.º do Código dos Contratos Públicos, considera-se que, mesmo na ausência de definição de um limiar de preço anormalmente baixo, o Júri do Concurso dispõe de competência discricionária para aferir se uma proposta se apresenta com um preço anormalmente baixo. Sendo de uma verdadeira competência discricionária que se trata, cabe ao Júri do Concurso e à entidade adjudicante proceder a esse juízo perante os dados de facto que concretamente se lhes apresentam. E caso considerem estar perante uma proposta de preço anormalmente baixo, a respetiva exclusão não é automática, antes carecendo sempre do exercício de um contraditório orientado junto dos concorrentes que apresentaram tais propostas. Sucede que, no caso concreto, o Júri do Concurso não considera estar perante propostas de preço anormalmente baixo pelos motivos que seguidamente se expõe.
O Agrupamento não fundamenta este seu entendimento de que os concorrentes colocados em primeiro lugar nos lotes 1, 3, 4 e 5 apresentam propostas de preço anormalmente baixo.
Em todo o caso, importa, em primeiro lugar, verificar que a pronúncia em análise começa por apresentar os desvios percentuais da classificação das propostas classificadas em primeiro lugar em cada um dos lotes relativamente à classificação média das propostas do respetivo lote. Atendendo a que se pretende demonstrar que os preços destas propostas são anormalmente baixos, tal exercício de comparação das propostas melhor classificadas poderá ser efetuado, não com as pontuações finais, que incluem a pontuação relativa à qualidade da frota, mas com os preços que as propostas apresentaram, chegando-se, assim a valores de desvios de: 8,5%, 12,2%, 31,9%, 21,2% e 8,5%, para os lotes 1 a 5, respetivamente. Estes valores são bastante distintos e menos impressivos dos que são apresentados na pronúncia apresentada pelo EG... e ajudam a colocar a questão nos seus devidos termos.
Acresce, noutro plano, que a simples comparação entre as pontuações de todas as propostas apresentadas se afigura desadequada, por incluir no valor médio de classificações apurado as classificações mais baixas das propostas apresentadas. Basta verificar que no Lote 2 a diferença entre o primeiro e o terceiro lugar é inferior à diferença que se registou entre o terceiro e o quarto lugar; e que as pontuações entre o quarto e o sexto lugar são de tal modo baixas que tornam inútil qualquer apuramento da média das pontuações alcançadas. Aliás, se do concurso fossem excluídas as propostas provisoriamente classificadas em primeiro e segundo lugar, ter-se-ia que a proposta apresentada pelo EG... sofreria um desvio percentual face à média de classificações atribuídas às propostas não excluídas de 36,28%, enquanto comprada a média da totalidade das propostas com aquela classificada em primeiro lugar, se alcança apenas um desvio de 33,21% (inferior, portanto). Em suma o esforço de comparação da proposta classificada em primeiro lugar com a média no Lote 2 prova de menos.
Noutro plano, verifica-se que os valores obtidos no estudo que acompanha a pronúncia baseiam-se em custos que em alguns casos, estão sobredimensionados. É o caso, por exemplo, dos custos associados aos recursos humanos, quer no valor de remuneração anual, quer ainda de forma mais expressiva no ratio motorista/viatura considerado de 1,6 motoristas por viatura. Comparando este valor com o valor apresentado em outras pronúncias, traduz-se num aumento implausível dos custos com motoristas.
Porém, a situação mais evidente respeita à dimensão da estrutura no que aos recursos humanos diz respeito com valores que conduzem a um custo associado à estrutura que é cerca de 50% superior aos valores normais, considerados nas outras pronúncias.
Igualmente apresenta-se excessivo o custo associado à frota, quer porque não contempla, o valor residual dos veículos, quer porque o seu custo de aquisição tem valores acima do que se considera nas outras pronúncias, quer, ainda, na tipologia usada que poderá não ser a observada no futuro.
Finalmente, do lado da receita não foram consideradas as receitas provenientes da publicidade e dos serviços ocasionais (a que acima se fez referência, em termos que aqui se dão por reproduzidos), nem os bónus que eventualmente venham a receber pela qualidade do serviço prestado, que no caso presente podem atingir um máximo de 12%. Vale o mesmo por referir que, adotando-se pressupostos mais realistas, e em linha com os restantes estudos apresentados nas outras pronúncias quanto ao custo com motoristas e aos custos da estrutura, invalida-se a conclusão assumida na pronúncia do EG....
Conclui-se, assim, que não se verifica o motivo de exclusão de propostas com fundamento em preço ou custo anormalmente baixo, previsto na alínea e) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, nem, consequentemente, e em igual medida, o previsto na alínea f) do mesmo preceito legal.
[…]
8.6. Pronúncia do Agrupamento TM..., S.A
8.6.1. Invalidades do procedimento e das peças do concurso
Pronúncia do concorrente:
O Agrupamento TM..., S.A alega na sua pronúncia em sede de audiência
prévia que (i) no contexto e sequência da Pandemia COVID-19, ocorreram circunstâncias supervenientes imprevistas que ditariam a necessidade de alteração de aspetos fundamentais das peças do procedimento, assim como circunstâncias supervenientes relativas aos pressupostos da decisão de contratar, o que configuraria causa de não adjudicação, nos termos das alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 79.º do CCP, bem como que (ii) se verifica um conjunto de invalidades das peças do procedimento.
Apreciação do Júri:
A este respeito, cabe apenas referir que o relatório de análise e avaliação das propostas
– cuja autoria é, nos termos do 69.º, n.º 1, alínea d), do CCP, do Júri do concurso – não é a sede própria para apreciação de alegadas invalidades das peças do procedimento e do procedimento, as quais não se reconduzem a matéria respeitante à análise ou à avaliação das propostas, em conformidade com o previsto nos artigos 146.º e 148.º do CCP. Acresce ainda que quer a aprovação das peças do procedimento e da respetiva modificação, quer a apreciação da sua (i)legalidade, incumbe ao órgão competente para a decisão de contratar, e não ao Júri.
Neste sentido, o Júri deliberou em 10.02.2021 – embora fora do contexto do presente Relatório Preliminar – remeter imediatamente ao órgão competente para a decisão de contratar, a Comissão Executiva Metropolitana, a Parte III da pronúncia apresentada pelo Agrupamento TM..., S.A, para os efeitos tidos por convenientes.
[…]
8.6.4. Exclusão de propostas com fundamento no preço anormalmente baixo
Pronúncia do agrupamento concorrente:
Sem prejuízo de apenas ter apresentado proposta no âmbito do Lote 4, o Agrupamento
TM..., S.A inicia este ponto da sua pronúncia em sede de audiência prévia alegando genericamente que as propostas classificadas em primeiro lugar em todos os lotes revelam um preço anormalmente baixo, pelo que, no seu entendimento, o Júri deveria efetuar uma análise discricionária do custo dessas propostas ao abrigo do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 71.º do CCP. O Agrupamento não fundamenta este seu entendimento em relação aos lotes 1 a 3 e 5, remetendo para um Parecer que junta.
Já em relação às propostas apresentadas pelo Agrupamento SG.../PSM e pelo Agrupamento constituído por TB..., Lda. e TF..., Lda. (doravante, “TB...”), no âmbito do lote 4, o Agrupamento pronunciante desenvolve a sua tese, pugnando pela exclusão daquelas propostas com base no argumento de que, estando em causa, segundo o seu entendimento, um preço anormalmente baixo, tal violaria não só o regime do preço anormalmente baixo previsto na alínea e) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, mas também o “princípio da sã concorrência”, pelo que, nessa medida, estaria também em causa o motivo de exclusão previsto na alínea g) daquele mesmo preceito do Código.
Apreciação do Júri:
Após análise detalhada das observações apresentadas, o Júri concluiu pela improcedência do argumento em apreço, com os fundamentos que de seguida se expõem, a que acrescem os fundamentos aduzidos em 8.5.3, visto que os argumentos parecem, afinal, ser os mesmos.
O Agrupamento não fundamenta este seu entendimento em relação aos lotes 1 a 3 e 5, remetendo para um Parecer que junta.
A pronúncia começa por apresentar os desvios percentuais da classificação das propostas classificadas em primeiro lugar em cada um dos lotes relativamente à classificação média das propostas do respetivo lote. Atendendo a que se pretende demonstrar que os preços destas propostas são anormalmente baixo, tal exercício de comparação das propostas melhor classificadas poderá ser efetuado, não com as pontuações finais, que incluem a pontuação relativa à qualidade da frota, mas com os preços que as propostas apresentaram, chegando-se, assim a valores de desvios de: 8,5%, 12,2%, 31,9%, 21,2% e 8,5%, para os lotes 1 a 5, respetivamente Estes valores são bastante distintos e menos impressivos dos que são apresentados na pronúncia ora em análise e ajudam a colocar a questão nos seus devidos termos.
Por outro lado, a utilização do valor médio da classificação das propostas fica sujeito à sensibilidade deste aos valores das classificações mais baixas das propostas apresentadas, ou seja, a existência de propostas com classificações muito baixas arrasta o valor médio para baixo, empolando a diferença entre este valor e o das propostas mais bem classificadas.
Noutro plano, verifica-se que os valores obtidos no estudo que acompanha a pronúncia baseiam-se em custos que em alguns casos, estão sobredimensionados. É o caso, por exemplo, dos custos associados aos recursos humanos, quer no valor de remuneração anual, quer ainda de forma mais expressiva no ratio motorista/viatura considerado de 1,7 motoristas por viatura. Comparando este valor com o valor apresentado em outras pronúncias, traduz-se num aumento implausível dos custos com motoristas.
Porém, a situação mais evidente respeita à dimensão da estrutura no que aos recursos humanos diz respeito com valores que conduzem a um custo associado à estrutura que é cerca de 50 % superior aos valores normais, considerados nas outras pronúncias.
Igualmente apresenta-se excessivo o custo associado à frota, quer porque não contempla, o valor residual dos veículos, quer porque o seu custo de aquisição tem valores acima do que se considera nas outras pronúncias, quer, ainda, na tipologia usada que poderá não ser a observada no futuro.
Finalmente, do lado da receita não foram consideradas as receitas provenientes da publicidade e dos serviços ocasionais (a que acima se fez referência, em termos que aqui se dão por reproduzidos), nem os bónus que eventualmente venham a receber pela qualidade do serviço prestado, que no caso presente podem atingir um máximo de 12%. Vale o mesmo por referir que, adotando-se pressupostos mais realistas, e em linha com os restantes estudos apresentados nas outras pronúncias quanto custo com motoristas e aos custos da estrutura, invalida-se a conclusão assumida na pronúncia do agrupamento TM..., S.A.
Conclui-se, assim, que não se verifica o motivo de exclusão de propostas com fundamento em preço ou custo anormalmente baixo, previsto na alínea e) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, nem, consequentemente e em igual medida, o previsto na alínea g) do mesmo preceito legal.
[…]
9. Avaliação das propostas
Tendo em conta a proposta de exclusão da proposta apresentada pelo Agrupamento SG.../PSM, o Júri procedeu à elaboração de novos quadros com os atributos das propostas admitidas em cada lote, bem como com a respetiva avaliação à luz do modelo de avaliação previsto no Programa do Concurso.
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

[…]
18.1. Ordenação das propostas, por lote, nos termos do n.º 1 do artigo 14 do Programa do Concurso, sem aplicação dos limites à adjudicação previstos no artigo 15.º do Programa do Concurso
Como referido, e conforme estabilizado e decidido já em pelo Júri em sede de Segundo Relatório Preliminar (cf. alínea e) do ponto 11., supra, e pontos 10., 13., alínea a), 15. e 16., alínea c)), a ordenação das propostas, por lote, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 14.º do Programa do Concurso – não atendendo ainda às regras sobre limites à adjudicação previstas no artigo 15.º do Programa do Concurso – é a que se encontra descrita no ponto 10. supra, que, para facilidade de referência e sistematização do presente Relatório, se reproduz:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]




18.2. Aplicação dos limites à adjudicação previstos no artigo 15.º do Programa do Concurso
A) Iteração 1
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
Considerando:
i) A classificação e ordenação das propostas, por lote, reproduzida no ponto 18.1. supra (ainda sem atender às regras sobre limites à adjudicação previstas no artigo 15.º do Programa do Concurso), bem como,
ii) Que, face às diligências instrutórias efetuadas pelo Júri para efeitos de aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 15.º do Programa do Concurso, descritas no ponto 17.5. supra – cujo teor se dá aqui por reproduzido, por razões de economia e simplicidade de exposição –, e na sequência da análise de todos os elementos acima referidos, se apurou não se verificar entre os concorrentes e/ou os membros dos agrupamentos concorrentes TE..., TN..., Agrupamento TA..., TB... e TX..., qualquer relação de domínio ou de grupo, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 486.º e 488.º e seguintes do CSC, em observância do disposto nos n.os 1 e 8 do artigo 15.º do Programa do Concurso, da apreciação efetuada no âmbito do quadro supra (“iteração 1”) resultam as seguintes conclusões:
a) Propor, preliminarmente, no âmbito do Lote n.º 4, a adjudicação da proposta do concorrente n.º 8 (TB...), por ser a única proposta ordenada em primeiro lugar de um mesmo concorrente (cf. n.º 3 do artigo 15.º do Programa do Concurso, e considerando que não se verifica o disposto nos antecedentes n.os 1 e 2 do mesmo artigo);
b) Tendo o concorrente n.º 9 (TN...) duas propostas ordenadas em primeiro lugar, no âmbito dos Lotes n.os 1 e 2, deverá proceder-se à aplicação do disposto no n.º 4 do artigo 15.º do Programa do Concurso;
c) Tendo o concorrente n.º 20 (TX...) duas propostas ordenadas em primeiro lugar, no âmbito dos Lotes n.os 3 e 5, deverá proceder-se à aplicação do disposto no n.º 4 do artigo 15.º do Programa do Concurso.
B) Iteração 2
Considerando os pressupostos e conclusões no âmbito da iteração 1, e por aplicação do disposto no n.º 4 do artigo 15.º do Programa do Concurso, procede-se à identificação das propostas ordenadas em segundo lugar em cada um dos lotes, em que um mesmo concorrente tenha propostas ordenadas em primeiro lugar, sendo adjudicada a proposta que apresente uma maior diferença de pontuação para a proposta ordenada em segundo lugar, conforme descrito no quadro infra.
Do exposto conclui-se no sentido de propor, preliminarmente, no âmbito do Lote n.º 5, a adjudicação da proposta do concorrente n.º 20 (TX...), por apresentar a maior diferença de pontuação (11,32, conforme quadro infra) entre as propostas ordenadas em primeiro e segundo lugar31, por força do disposto no artigo 15.º, n.º 4, do Programa do Concurso, e, em particular, da sua alínea b).
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

C) Iteração 3
Considerando os pressupostos e conclusões no âmbito das iterações antecedentes, nomeadamente o facto de se propor, preliminarmente, no âmbito do Lote n.º 5, a adjudicação da proposta do concorrente n.º 20 (TX...), por força do disposto no artigo 15.º, n.º 4, do Programa do Concurso – não podendo, à luz das regras do artigo 15.º, ser-lhe adjudicada proposta apresentada para outro lote –, conclui-se no sentido de propor, preliminarmente, no âmbito do Lote n.º 3, a adjudicação da proposta do concorrente n.º 5 (Agrupamento TA...)
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

(cf. quadro infra), por força do disposto no artigo 15.º, n.os 5 e 3 (por remissão do n.º 5), do Programa do Concurso
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

D) Iteração 4
Considerando i) os pressupostos e conclusões no âmbito das iterações antecedentes; que, em face do exposto, ii) permanecem por adjudicar apenas os lotes n.os 1 e 2; e que, iii) em ambos os lotes, a proposta apresentada pelo concorrente n.º 9 (TN...), se encontra ordenada em primeiro lugar, procede-se, em aplicação do disposto no n.os 5 e 4 (por remissão do n.º 5) do artigo 15.º do Programa do Concurso, ao apuramento das diferenças de pontuação entre as propostas ordenadas em primeiro e segundo lugares32 no âmbito desses lotes n.os 1 e 2, concluindo-se no sentido de propor, preliminarmente, no âmbito do Lote n.º 2, a adjudicação da proposta do concorrente n.º 9 (TN...), por ser a que configura uma maior diferença na pontuação (cf. quadro infra).
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


E) Iteração 5
Considerando i) os pressupostos e conclusões no âmbito das iterações antecedentes; que, em face do exposto, ii) permanece por adjudicar apenas o Lote n.º 1, no âmbito do qual se encontram ordenadas em primeiro lugar a proposta do concorrente n.º 9 (TN...), e em segundo lugar a proposta do concorrente n.º 18 (TE...); iii) foi já proposta, preliminarmente, a adjudicação da proposta do concorrente n.º 9 (TN...) no âmbito do Lote n.º 2 (cf. iteração 4, supra), pelo que não pode, à luz das regras do artigo 15.º, ser-lhe adjudicada proposta apresentada para outro lote; em aplicação do disposto nos n.os 5 e 3 (por remissão do n.º 5) do artigo 15.º do Programa do Concurso, conclui-se no sentido de propor, preliminarmente, no âmbito do Lote n.º 1, a adjudicação da proposta do concorrente n.º 18 (TE...), por ser a que se encontra ordenada em lugar subsequente à da TN...
(cf. quadro infra).
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

F) Conclusões da Proposta Preliminar de Adjudicação
Em face do exposto, após apreciação das pronúncias apresentadas em sede de audiência prévia e reapreciação da proposta preliminar de adjudicação efetuada em sede de (Primeiro) Relatório Final e Proposta Preliminar de Adjudicação, nos termos acima descritos, o Júri procede à (re)formulação da proposta preliminar de adjudicação para cada lote, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 5 do artigo 14.º e no artigo 15.º do Programa do Concurso, nos seguintes termos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

[…]
21. Conclusões do Terceiro Relatório Final de Avaliação das Propostas
Atendendo ao exposto nos pontos anteriores, bem como aos fundamentos de facto de Direito constantes do Segundo Relatório Final e dos demais relatórios que o antecederam, que, por razões de economia processual, aqui se dão como integralmente reproduzidos para os legais efeitos, o Júri, nos termos e para o efeito do disposto no artigo 148.º do Código dos Contratos Públicos e no n.º 8 do artigo 14.º do Programa do Concurso, delibera, por unanimidade, o seguinte:
a) Manter o teor e as conclusões do Segundo Relatório Final de Avaliação das Propostas, propondo à Comissão Executiva Metropolitana do Porto (enquanto órgão competente para a decisão de contratar do presente Concurso):
i. A exclusão das propostas apresentadas pelas concorrentes:
a. EL..., Lda.;
b. AC..., e
c. Agrupamento SG.../PSM;
ii. A admissão das demais propostas apresentadas nos vários lotes;
iii. A ordenação das propostas apresentadas, por lote, nos termos do n.º 1 do artigo 14.º do Programa do Concurso;
iv. A adjudicação, no âmbito de cada lote, das propostas dos concorrentes seguintes:
a. Lote 1: TE..., Lda.;
b. Lote 2: TN..., SL;
c. Lote 3: Agrupamento constituído por TM... Sociedade Unipessoal, Lda., TA..., Lda., e TL...;
d. Lote 4: Agrupamento constituído por TB..., Lda. e TF..., Lda.;
e. Lote 5: Agrupamento constituído por TO... e TX..., S.A.;
b) Enviar o presente Terceiro Relatório Final, juntamente com os relatórios do Júri que o antecederam, as propostas dos concorrentes e os demais documentos que compõem o processo de concurso, à Comissão Executiva Metropolitana do Porto, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 148.º do Código dos Contratos Públicos.
– fls. 6765 a 6878 do p.a.
36. Em fevereiro de 2022 a AMT elaborou “Estudo de viabilidade económica e financeira (análise custo benefício para efeitos do art. 36.º do CCP) – Atualização”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, extraindo-se
Conclusão
A atualização e resultados supra sintetizados reforçam a decisão de contratar porquanto se mantêm válidos os pressupostos inicialmente assumidos.
A atualização sistematizada nos quadros anteriores demonstra a viabilidade na concretização da operação na perspetiva da AMP.
- cfr. doc. ... junto ao requerimento do incidente.
37. Em reunião de 28.2.2022 a Comissão Executiva Metropolitana do Porto deliberou aprovar as propostas contidas no 3.º relatório final e
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

[…]

[imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cfr. págs. 6879 a 6887 do p.a.
38. A adjudicação e minuta do contrato foram notificadas em 28.2.2022. – cfr. fls. 6891 e ss. do p.a.
39. Em 14.3.2022 a TB..., Lda. e TF... Lda. apresentaram à AMT, os documentos de habilitação, incluindo além do mais,
o Licença n.º 201154 para transporte rodoviário internacional de passageiros em autocarro por conta de outrem emitida pelo IMT para a TD... Lda., em 9.9.2021 e válida até 8.9.2026. (fls. 7441 do p.a.)
o Declarações de situação contributiva regularizada emitidas pela Segurança Social e Autoridade Tributária e Aduaneira, relativamente à TD... Lda.,
o Certidão Permanente da TD... Lda. da qual resulta na inscrição ... Ap. ...12, a constituição da sociedade tendo como titulares das quotas a TF..., Lda. e a TB..., Lda.
o Declaração de habilitação emitida pela TD..., Lda. em 9.3.2022;
o Certificado de registo criminal da TD..., Lda.;
o Certidões de registo comercial da TF..., Lda. e a TB..., Lda.
o Contrato de sociedade da TD... Lda., com data de 12.5.2021;
o Declaração de depósito do capital social da TD..., Lda.;
o Guia de depósito bancário/caução,
- cfr. docs. de fls. 7440 e ss. do p.a.
40. A presente ação de contencioso pré-contratual foi instaurada em 14.3.2022 e a AMP citada em 22.3.2022. – fls. 1 e 1237 dos autos.
Mais se provou que,
41. As AA. TU..., Lda., TJ... Lda. e TM..., S.A. são titulares de autorizações, com validade até 31.12.2019, de exploração, em regime provisório, do serviço público de passageiros regular de linhas que abrangem a área do lote 4 do Concurso, nos termos definidos nas respetivas autorizações. – facto não controvertido, doc. ... junto ao requerimento do incidente.
42. Por deliberação de 15.11.2021 a Comissão Executiva Metropolitana do Porto as referidas autorizações provisórias foram prorrogadas “até à entrada em funcionamento do operador no novo contrato de serviço público celebrado com a Área Metropolitana do Porto, na sequência de procedimento concorrencial, ou até 3 de dezembro de 2023, consoante a data que ocorrer primeiro, sem prejuízo da sua alteração ou revogação a todo o tempo”.– doc. ... da réplica, doc. ... junto ao requerimento do incidente.
43. Em 20.10.2020 foi instaurado pela TC... S.A. contra a AMP, sendo ali contrainteressadas, entre outras, sendo ali contrainteressadas, entre outras, as aqui AA., TU..., Lda., TJ... Lda. e TM..., S.A., e as aqui contrainteressadas (TB..., Lda., TF..., Lda., TO... SA, TS..., Lda.), a ação de contencioso pré-contratual, a que foi atribuído o número de processo 1973/20.2BEPRT, na qual era peticionada a anulação do Concurso, assacando ao procedimento concursal em apreço, diversas invalidades procedimentais, como seja “a não submissão a parecer, obrigatório e vinculativo, da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes”, da versão final das peças do procedimento, em violação do disposto no artigo 34º n.2 alínea b) do decreto- Lei n.º 78/2014, de 14 Maio; “a não divulgação do parecer “prévio” emitido pela Autoridade da Mobilidade e dos Transportes e consequente violação do princípio da transparência e do artigo 36º n.3 do Código de Contratos Públicos”; a violação do artigo 36º n.3 do Código de Contratos Públicos”; e, bem assim, as seguintes ilegalidades às peças do procedimento: a invalidade do artigo 15º do programa de procedimento; a invalidade caderno de encargos, por incumprimento do disposto no artigo 4º n.1 alínea c) do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e artigo 21º n.1 alínea i) do RJSPTP (Lei n.º 52/2015, de 9 Junho); a invalidade da cláusula 26º do caderno de encargos, por violação do disposto no artigo 4º n.5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e dos princípios da transparência, concorrência e igualdade, nos termos que aqui se dão por integralmente reproduzidos. – fls. 1 e ss. do processo 1973/20.2BEPRT constante do SITAF.
44. Em 21.10.2020 foi instaurado pela EG..., Lda., AP... e VL... – AP... S.A. contra a AMP, sendo ali contrainteressadas, além do mais, as aqui AA., TU..., Lda., TJ... Lda. e TM..., S.A., e as aqui contrainteressadas (TB..., Lda., TF..., Lda., TO... SA, TS..., Lda.), a ação de contencioso pré-contratual, a que foi atribuído o número de processo 1977/20.5BEPRT, na qual era peticionada a anulação do procedimento concursal, assacando as ali autoras ilegalidades diversas às peças do procedimento, desde logo: por “desconsideração de existência de circunstâncias supervenientes imprevistas”, invocando que a “(…) Pandemia COVID-19 veio alterar, significativa e profundamente, o planeamento e o dimensionamento da operação de serviço público aqui em causa e, muito em especial, o regime remuneratório definido que foi flagrantemente afetado, (…)”, do que é reflexo o teor do disposto no artigo 13º-A do Decreto- Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março; por incumprimento do regime das parcerias público-privadas (Decreto- lei n.º 111/2012, 23.05), maxime artigos 9º a 14º, o qual seria aqui aplicável atento o objecto do contrato e as normas constantes do caderno de encargos; a violação do artigo 34º n.2 alínea b) dos Estatutos da Autoridade da Mobilidade e Transportes (Decreto- Lei n.º 78/2014, de 14.05) por ausência do referido parecer prévio vinculativo quanto à versão final das peças do procedimento; a violação do artigo 36º n.3 do Código de Contratos Públicos, por ausência da avaliação custo/ beneficio na fundamentação da decisão de contratar; a invalidade dos artigos 1º e 15º do programa de concurso, por violação da “teleologia da divisão em lotes do artigo 46º-A do CCP”, do artigo 46º-A n.4 do CCP e do princípio da concorrência, quer no que respeita à divisão por lotes, quer no tocante à limitação de que “(…) a cada concorrente só poderia ser adjudicado um único lote. (…)”; a ilegalidade do artigo 18º n.12 do programa de concurso, por violação dos princípios da boa-fé, tutela da confiança e da proporcionalidade; a ilegalidade do artigo 21º do programa de concurso, por violação do disposto no artigo 20º n.1 alínea a), 21º n.1 alínea a) e inaplicabilidade do disposto no artigo 27º, todos do CCP, e bem assim violação do disposto no artigo 4º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007; por ausência de disposição no caderno de encargos relativa “(…) às modalidades de repartição de custos ligados à prestação de serviços (…)” em violação do disposto no artigo 4º alínea c) do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e artigo 21º n.1 alínea i) da Lei n.º 52/2005; a ilegalidade da cláusula 26º n.2 do Caderno de Encargos, “decorrente da falta de divulgação no Caderno de Encargos de informação relativa aos trabalhadores”, por violação dos princípios gerais da contratação pública e também do artigo 4º n.5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007; (16) a ilegalidade da cláusula 53º n.3 alínea i), n.4 alínea m) e n.5 alínea n) do Caderno de Encargos, por violação do disposto no artigo 302º alínea d) e 329º n.1,ambos do CCP, alegando que “(…) as sanções contratuais têm de encontrar-se expressamente previstas na lei ou no contrato. (…)”, nos termos que aqui se dão por integralmente reproduzidos. – fls. 1 e ss, do processo 1977/20.5BEPRT.
45. Em 22.10.2020 foi instaurado pela TE... S.A. e RE... S.A. contra a AMP, sendo ali contrainteressadas, além do mais, as aqui AA., TU..., Lda., TJ... Lda. e TM..., S.A., e as aqui contrainteressadas (TB..., Lda., TF..., Lda., TO... SA, TS..., Lda.), a ação de contencioso pré-contratual, a que foi atribuído o número de processo 1985/20.6BEPRT, na qual era peticionada a anulação do procedimento concursal, invocando, a “alteração dos pressupostos em que assentou a decisão de contratar, e da violação do princípio da sustentabilidade previsto no artigo 1º do Código dos Contratos Públicos” decorrente da «pandemia COVID19»; a ausência da avaliação custo/ beneficio na fundamentação da decisão de contratar, em violação do disposto no artigo 36º n.ºs 1 e 3 do CCP; a ausência do parecer prévio vinculativo quanto à versão final das peças do procedimento, em violação do artigo 34º n.2 alínea b) dos Estatutos da Autoridade da Mobilidade e Transportes (Decreto- Lei n.º 78/2014, de 14.05) e do princípio da transparência; a ilegalidade do artigo 18º n.12 do programa de concurso, por violação do artigo 105º n.3 do CCP e dos princípios da boa-fé, tutela da confiança e da proporcionalidade; a ausência de disposição no caderno de encargos relativa “(…) às modalidades de repartição de custos ligados à prestação de serviços que constitui objeto do contrato (…)” em violação do disposto no artigo 4º alínea c) do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e artigo 21º n.1 alínea i) da Lei n.º 52/2005; a ilegalidade da cláusula 7º n.6 alínea l) do caderno de encargos, por violação dos princípios da boa-fé, da tutela da confiança e da transparência; a ilegalidade da cláusula 53º n.3 alínea i), n.4 alínea m) e n.5 alínea n) do Caderno de Encargos, por violação do principio da legalidade e transparência; a ilegalidade da cláusula 10º n.2 do caderno de encargos, por violação dos princípios da boa-fé, tutela da confiança e da transparência; a ilegalidade da cláusula 45º n.2 do caderno de encargos, por violação do disposto no artigo 282º do CCP e do princípio da proporcionalidade; a ilegalidade da cláusula 62º n.7 do caderno de encargos, por violação dos princípios da proporcionalidade e da transparência, nos termos que aqui se dão por integralmente reproduzidos. – fls. 1 e ss. do processo 1985/20.6BEPRT.
46. Em 27.10.2020 foi instaurado pelas aqui autoras, TU... Lda., TJ... Lda. e TM..., S.A. contra a AMP, sendo ali contrainteressadas, além do mais, as aqui contrainteressadas TB..., Lda., TF..., Lda., TO... SA, TS..., Lda, a ação de contencioso pré-contratual, a que foi atribuído o número de processo 2019/20.6BEPRT, na qual era peticionada a anulação do procedimento concursal, invocando, nos termos que aqui se dão por integralmente reproduzidos: a violação do artigo 36º n.s 1 e 3 do Código de Contratos Públicos, por ausência da avaliação custo/ beneficio na fundamentação da decisão de contratar; a ausência de disposição no caderno de encargos relativa “(…) às modalidades de repartição de custos ligados à prestação de serviços (…)” em violação do disposto no artigo 4º alínea c) do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e artigo 21º n.1 alínea i) da Lei n.º 52/2005; a “desconsideração da existência de circunstâncias supervenientes imprevistas”, invocando que a “(…) Pandemia COVID-19 veio alterar, significativa e profundamente, o planeamento e o dimensionamento da operação de serviço público aqui em causa e, muito em especial, o regime remuneratório definido que foi flagrantemente afetado, (…)” , do que é reflexo o teor do disposto no artigo 13º-A do Decreto- Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março; o incumprimento do regime das parcerias público-privadas (Decreto- lei n.º 111/2012, 23.05), maxime artigos 9º a 14º, o qual seria aqui aplicável atento o objecto do contrato e as normas constantes do caderno de encargos; a invalidade dos artigos 1º e 15º do programa de concurso, por violação da “teleologia da divisão em lotes do artigo 46º-A do CCP”, do artigo 46º-A n.4 do CCP e do princípio da concorrência, quer no que respeita à divisão por lotes, quer no tocante à limitação de que “(…) a cada concorrente só poderia ser adjudicado um único lote. (…)”;a ilegalidade do artigo 21º do programa de concurso, por violação do disposto no artigo 20º n.1 alínea a), 21º n.1 alínea a) e inaplicabilidade do disposto no artigo 27º, todos do CCP, e bem assim violação do disposto no artigo 4º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007; a ilegalidade da cláusula 26º n.2 do Caderno de Encargos, “decorrente da falta de divulgação no Caderno de Encargos de informação relativa aos trabalhadores”, por violação dos princípios gerais da contratação pública e também do artigo 4º n.5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e do artigo 21º n.1 da Lei n.º 52/2015; a ilegalidade da cláusula 53º n.3 alínea i), n.4 alínea m) e n.5 alínea n) do Caderno de Encargos, por violação do disposto no artigo 302º alínea d) e 329º n.1,ambos do CCP, alegando que “(…) as sanções contratuais têm de encontrar-se expressamente previstas na lei ou no contrato. (…)” e que a Ré decidiu “(…) não aplicar o artigo 15º do programa do concurso, por intermédio dos esclarecimentos e do relatório preliminar, [o que] é absolutamente ilegal, além de violar os art.ºs 14º e 15º do Programa do concurso, art.ºs 1º, 1º-A, 50º e 146º do Código dos Contratos Públicos e com violação dos princípio e normas do procedimento, inclusive quanto à estabilidade do mesmo. (…)”. – fls. 1 e ss. do processo 2019/20.6BEPRT
47. Por despacho de 12.11.2020 foi determinada a apensação dos processos 1977/20.5BEPRT, 1985/20.6BEPRT e 2019/20.6BEPRT ao processo 1973/20.2BEPRT. – cf. processo 1973/20.2BEPRT.
48. As AA. apresentaram contestação no processo 1973/20.2BEPRT e apensos pugnando pela procedência da ação. – cf. processo 1973/20.2BEPRT.
49. No âmbito dos processos 1973/20.2.BEPRT e apensos foi, em sede de incidente, por decisão proferida em 22.1.2021, recusada a adoção de medida provisória de suspensão do procedimento concursal. – cf. processo 1973/20.2BEPRT.
50. Em 20.4.2021 a TV..., S.A. instaurou ação de contencioso pré-contratual, a que foi atribuído o número de processo 1125/21.4BEPRT, contra a AMP, indicando (após convite do Tribunal) como contrainteressadas, além do mais, as aqui autoras, e contrainteressadas TB..., Lda., TF..., Lda., TO... SA, TS..., Lda, peticionando a declaração de ilegalidade da Cláusula 26º, n.º 2 e n.ºs 3 a 8 do Caderno de Encargos do Concurso Público Internacional n.º 711/2020, invocando, nos termos que aqui se dão por reproduzidos, que a Lei n.º 18/2021, de 8 abril veio alterar a redação dos artigos 285º, 286º e 286ºA do Código de Trabalho, atinente ao regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento, com vista a estender a sua aplicabilidade “(…) às situações de transmissão por adjudicação de fornecimento de serviços que se concretize por concurso público, ajuste direto ou qualquer outro meio, (…)”; e que dessa alteração resulta “(…) a obrigatoriedade de uma automática transferência dos contratos de trabalho em vigor, nos casos em que exista um acto de adjudicação cujo objecto seja a celebração de um contrato de serviços de vigilância, alimentação, limpeza ou transportes, na sequência de um concurso público, no sector público ou privado- (…)”, mais estatuindo, em disposição transitória, que as referidas alterações se aplicam “(…) aos concursos públicos ou outros meios de seleção, no setor público e privado, em curso durante o ano de 2021, incluindo aqueles cujo ato de adjudicação se encontre concretizado” (…)”, sustentando que o disposto na cláusula 26º n.2 do Caderno de Encargos é ilegal, (i) na medida em que “(…) tornou-se inequívoca a necessidade de plasmar em sede de CE a obrigatoriedade de transmissão dos contratos de trabalho, por força do disposto das normas do Código do Trabalho que regulam a transmissão de empresa ou estabelecimento ou unidade económica que, agora, foram retroativamente alteradas para abranger o sector dos transportes, em casos em que um novo operador adquire essa posição na decorrência de procedimento concurso público ou por outro meio de seleção público ou privado. (…)”, (ii) que tal alteração tem impacto, igualmente, no disposto nos subsequentes n.ºs 3 a 8 da identificada Cláusula 26º, alegando que “(…) com esta alteração legislativa é inequívoco que todos os contratos de trabalho têm de ser transmitidos de um (ex) operador para outro, (…) E, nessa medida, deixa de fazer sentido falar em “trabalhadores antigos”, para designar os trabalhadores que, “à data da celebração do Contrato, exerçam funções correspondentes àquelas que o COCONTRATANTE pretenda contratar ao serviço dos operadores que, nessa data, prestem o serviço público correspondente ao objeto do Contrato”, (…) Se os operadores em causa forem aqueles que irão perder o serviço em benefício do adjudicatário ou adjudicatários dos lotes a concurso, parece ser evidente que tais entidades terão de assumir os contratos existentes, ou, na linguagem dos CE os contratos dos “trabalhadores antigos”, (…)”, (iii) que a cláusula contratual em apreço é “(…) igualmente desconforme com a lei laboral vigente ao tempo da abertura deste procedimento (…)”, pugnando pela declaração de ilegalidade da cláusula 26º n.2 e n.s 3 a 8 do Caderno de Encargos; e, conclui, que dessa declaração de ilegalidade deve resultar “(…) em sede de execução (voluntária) de sentença, de proceder à alteração das peças procedimentais, conforma-las com a legalidade vigente e convocar novamente a consulta pública, a partir da fase de disponibilização dos documentos concursaais, permitindo apresentação de propostas. (…)” e, bem assim que “(…) alteração das peças procedimentais tem de ser acompanhada pela junção de elementos que permitam aos concorrentes elaborar a sua proposta financeira levando em conta a obrigatoriedade de assumir contratos de trabalho em vigor. (…)”, com o que sustenta o seu interesse processual para a lide.
- fls. 1 e ss. do processo 1125/21.4BEPRT.
51. Em 7.9.2021 foi proferida sentença no processo 1973/20.2BEPRT e apensos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e da qual se extrai,
“IV. SEGMENTO FÁCTICO-JURÍDICO
Nos presentes autos, a questão decidenda acima enunciada traduz-se em saber se o procedimento concursal enferma de ilegalidade no tocante aos pressupostos em que assentou a sua decisão de contratar e, bem assim, se padecem de ilegalidade os artigos 1º, 15º, 18º n.12 e 21º do programa de concurso, e as cláusulas 7º n.6 alínea l), 10º n.2, 26º n.2 e 3, 45º n.2, 53º n. alínea i), n.4 alínea m) e n.5 alínea n) e 62º n.7 do Caderno de Encargos.
Apreciemos.
[…]
Da alegada “desconsideração de existência de circunstâncias supervenientes imprevistas” [(7); (17); (29)]
Alegam as AA. ET EG..., TE... e TU... que os pressupostos em que assentou a decisão de contratar “(…) têm por referência os dados de procura e de oferta referente ao último quadrimestre de 2019. (…)”, os quais descrevem como sendo atinentes a “(…) um mercado de transporte rodoviário de passageiros dinâmico e saudável, com perspetivas de crescimento progressivo da procura e com potencial de rentabilidade crescente. (…)” [pi A. ET EG...]; defendem que a pandemia provocada pelo vírus SARS-COV-2 alterou “(…) significativa e profundamente, o planeamento e o dimensionamento da operação de serviço público aqui em causa e, muito em especial, o regime remuneratório definido que foi flagrantemente afetado, (…)”, a curto prazo e, igualmente, a médio/longo prazo.
Clamam que “(…) o princípio da sustentabilidade e do interesse público [exigiam] que tivessem sido confirmados pela AMP os pressupostos que estiveram na base do lançamento do Concurso, e que foram alterados pelos efeitos decorrentes da pandemia COVID 19.(…)” [pi A. TE...].
E, afirmam que esse impacto está reflectido no “(…) artigo 13.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março (alterado por último pelo Decreto-Lei nº 39-A/2020, de 16 de julho), que veio prever que “as entidades públicas ou privadas responsáveis por transporte coletivo de passageiros devem assegurar, cumulativamente:
a) Lotação máxima de 2/3 da sua capacidade para o transporte terrestre, fluvial e marítimo;
b) A limpeza diária, a desinfeção semanal e a higienização mensal dos veículos, instalações e equipamentos utilizados pelos passageiros e outros utilizadores, de acordo com as recomendações das autoridades de saúde”.; a que acrescem outras obrigações/limitações.
Concluem, por isso, pela ilegalidade das peças procedimentais (na versão de Julho 2020), por desconsideração das circunstâncias supervenientes; e pugnam por uma decisão de não adjudicação à luz do disposto no artigo 79º n.1 alínea c) do CCP.
Em sede de contestação, a R. AMP defendeu, por um lado, a existência de um estudo datado de 20.06.2020, que procedeu à análise do impacto da pandemia no presente procedimento concursal e nas respectivas peças, onde se concluiu “(…) fundamentadamente a desnecessidade de alteração dos aspetos fundamentais das peças do Concurso por causa da pandemia COVID-19 (…).” [contestação R. no processo n.º 1977/20]; por outro, defende que tendo em conta a tramitação do procedimento concursal, as formalidades pós-adjudicatórias e o período de transição previsto, o período normal de funcionamento e com ele a integral produção de efeitos do contrato a concurso, tal “(…) corresponde a um período em que, muito provavelmente, a pandemia deverá já estar ultrapassada ou, pelo menos, significativamente controlada. (…)”.
Acrescenta, contudo, que tendo o contrato em causa uma duração de 7 anos, “(…) segundo um juízo técnico e objetivo de prognose, dificilmente se consegue dizer que, no início do Período de Funcionamento Normal do contrato (que ocorrerá previsivelmente em novembro de 2021) e durante os 7 anos da sua vigência, os fenómenos desencadeados atualmente pela pandemia COVID-19 e que justificam as preocupações da EG.../AUTOVIAÇÃO/VL... – tais como, a quebra no turismo, o receio na utilização de transportes públicos, a suspensão das aulas presenciais, o cancelamento de eventos culturais e a limitação de atendimento presencial em serviços públicos – irão permanecer, e com impactos significativos, no setor de transporte público.(…)” [contestação R. no processo n.º 1977/20].
Declara, igualmente, que nas cláusulas 13º e 14º “(…) o próprio Caderno de Encargos já incluiu cláusulas que contratualizam e regulam os “riscos” quanto a acontecimentos que possam exigir ajustamentos das condições da execução do contrato. (…)”, o mesmo sucedendo na cláusula 54º, onde se previu e regulou a “(…) problemática de força maior e a sua repercussão no contrato. (…)” [contestação R. no processo n.º 1977/20].
Analisemos.
É notório que a pandemia provocada pelo vírus SARS-COV-2 impactou, profundamente, na vida das pessoas e nos seus hábitos, designadamente, no tocante à utilização dos meios de transporte colectivos.
Todavia, resulta da factualidade assente [cfr. ponto AB) do probatório] que estas circunstâncias e o seu impacto na execução do programa a concurso foram devidamente consideradas e ponderadas, designadamente quanto à manutenção das peças procedimentais e, também, relativamente à subsistência do próprio procedimento concursal.
Assim tendo em consideração a discricionariedade que assiste às entidades adjudicantes na elaboração das peças concursais – obviamente num quadro de razoabilidade e proporcionalidade – o Tribunal julga in casu devidamente fundadas, não padecendo de qualquer erro grosseiro que sustente a sua sindicância jurisdicional, as razões constantes do memorando de 20.06.2020, e bastantes para que se considere ter existido uma adequada ponderação da alegada “alteração superveniente das circunstâncias”, concluindo-se pela ausência de impacto relevante na tramitação do presente procedimento contratual.
Assim, por carecer de suporte fundamentação fáctico-legal, improcede a alegação vertida a este propósito.
[…]
Da alegada a ausência de disposição no caderno de encargos relativa “(…) às modalidades de repartição de custos ligados à prestação de serviços que constitui objeto do contrato (…)” em violação do disposto no artigo 4º n.1 alínea c) do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e artigo 21º n.1 alínea i) da Lei n.º 52/2015 [(5); (14); (21); (28)]
Alegam as AA. que analisando o caderno de encargos se verifica que do mesmo não consta a repartição de custos ligados à prestação dos serviços, “(…) nos quais se incluem, por exemplo, os custos com recursos humanos. (…)” [pi A. TC...].
Invocam que a informação em falta “(…) tem relevância essencial para a execução do contrato, pois, como facilmente se percebe, se, durante a vida do contrato, houver uma alteração substancial de qualquer um dos mencionados custos (por exemplo, subida vertiginosa do gasóleo, dos custos de pessoal, ou de qualquer outro custo), só é possível aplicar o mecanismo de reposição do equilíbrio económico-financeiro, previsto na Cláusula 45ª do Caderno de Encargos, se se conhecerem os pressupostos de custos em que assenta o contrato e o preço a pagar pela AMP aos adjudicatários de cada lote. (…)” [pi ET EG...].
Concluem, por isso, que o caderno de encargos viola, por omissão, o disposto no artigo 4º n.1 alínea c) do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, de 23.10 e artigo 21º n.1 do Lei n.º 52/2015.
Contestando, a R. AMP defende, em primeiro lugar, que as AA. procedem a uma errónea interpretação do artigo 4º n.1 alínea c) do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, de 23.10 e artigo 21º n.1 do Lei n.º 52/2015 ao considerar que a mesma visa “(…) acautelar a aplicação do mecanismo de reposição do equilíbrio económico-financeiro contratualmente previsto. (…)”; alegando que “(…) Do que se trata ali é tão-só da exigência de o contrato regular como se repartem os custos entre as partes (o que se apresenta elementar em qualquer contrato relativo à prestação de um serviço),… (…)” [contestação R. AMP no Processo n.º 1977/20].
Sustenta que à luz do estipulado nos artigos 450º e 452º, ambos do CCP, “(…) resulta da própria natureza de um contrato de prestação de serviços que os custos são integralmente assumidos pelo cocontratante (…)”.
Pugna, por isso, que não está em falta qualquer elemento necessário à eventual reposição do equilíbrio financeiro uma vez que este mecanismo se encontra regulado no CCP, maxime artigos 282º n.s 5 e 6 e 314º n.s 1 e 3.
Mais esclarece que a cláusula 42º do Caderno de Encargos prevê uma “(…) remuneração global para a execução integral do contrato pelo cocontratante (…)” e que, a modalidade de repartição de custos resulta, em análise, da modalidade de repartição de obrigações prevista no caderno de encargos do que é exemplo, destaca, o preceituado nos n.s 1 a 3 da respectiva cláusula 20º, quanto a custos com a manutenção de bens; o disposto na cláusula 26º n.1, quanto a custos com pessoal; e ainda o previsto nas cláusulas 9º n.2, 21º n.s 1 e 2, 31º n.6, 52º n.s 1 e 2 e 42º n.11.
Por fim, chama à colação o teor da Comunicação Interpretativa “Orientações para a interpretação do regulamento (CE) n.º 1370/2007 relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros” da Comissão Europeia, e estribando-se no ponto 2.4.4. da mesma, clama que “(…) aquele preceito legal, conjugado com o anexo ao Regulamento, exige que, no caso de o cocontratante exercer outras atividades para além das atividades de serviço público objeto do contrato (as designadas atividades comerciais ou mesmo outras atividades de serviço público) e de as várias atividades partilharem meios e recursos, os custos devem ser adequadamente imputados às diferentes atividades, remetendo assim – o que expressamente vem estabelecido no anexo ao Regulamento 1370/2007 – para regras contabilísticas que permitam a separação de contas. (…)” – o que é observado no caderno de encargos e de que é exemplo o estipulado na cláusula 10º n.s 7 e 8.
Analisemos.
Prevê o Regulamento (CE) n.º 1370/2007, do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de Outubro de 2007:
“Artigo 4º (Conteúdo obrigatório dos contratos de serviço público e das regras gerais)
1. Os contratos de serviço público e as regras gerais devem:
(…)
c) Estabelecer as modalidades de repartição dos custos ligados à prestação dos serviços. Esses custos podem incluir, designadamente, os custos de pessoal, de energia, os encargos com as infra-estruturas, os custos de manutenção e reparação dos veículos de transporte público, do material circulante e das instalações necessárias à exploração dos serviços de transporte, os custos fixos e uma remuneração adequada dos capitais próprios.
(…)”
Por sua vez, o artigo 21º do Lei n.º 52/2015 (Regime Jurídico do Serviço Público de Transporte de Passageiros, adiante RJSPTP), prescreve:
“Artigo 21º (Forma e conteúdo do contrato)
1 – O contrato de serviço público é obrigatoriamente reduzido a escrito, dele devendo constar de forma clara os direitos e obrigações de cada uma das partes e as características do serviço público de transporte a prestar, designadamente, e quando aplicável:
(…)
i) As modalidades de repartição dos custos ligados à prestação dos serviços, nomeadamente, os custos de pessoal, de energia, de gestão, de manutenção e de operação de veículos;
(…)”.
Acresce que, sobre o disposto no artigo 4º n.1 alínea c) do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, a Comissão Europeia emitiu a “Comunicação | Orientações para a interpretação do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros”, qual escreveu, além do mais, o seguinte: “(…)
2.4.3. Artigo 4.º, n.º 1, e anexo. Noção de «lucro razoável»
De acordo com o artigo 4.o, n.o 1, alínea c), os custos a ter em conta no âmbito de um contrato de serviço público podem incluir «uma remuneração adequada dos capitais próprios». O anexo especifica que a compensação pela obrigação de serviço público não pode exceder o efeito financeiro líquido, definido como os custos incorridos, deduzidas as receitas geradas pelas atividades de serviço público e as receitas potenciais geradas na rede explorada, acrescidos de um «lucro razoável».
De acordo com o anexo, deve entender-se por «lucro razoável» uma taxa de remuneração do capital que seja habitual no setor num determinado Estado-Membro e que deve ter em conta o risco, ou a inexistência de risco, incorrido pelo operador do serviço público em resultado da intervenção da autoridade pública. Não são dadas, todavia, outras indicações sobre o nível correto de «remuneração do capital» ou de «lucro razoável».
(…)
2.4.4. Artigo 4.º, n.ºs 1 e 2, e anexo. Prevenir a utilização da compensação recebida em contrapartida da obrigação de serviço público para subsidiar atividades comerciais
Quando o prestador do serviço público exerce também atividades comerciais, é necessário assegurar que a compensação pública que ele recebe não é utilizada para reforçar a sua posição concorrencial nas atividades comerciais. O anexo do regulamento estabelece regras destinadas a prevenir a subsidiação das atividades comerciais com as receitas das atividades de serviço público. Tais regras consistem essencialmente na separação das contas dos dois tipos de atividade (serviço público e serviço comercial) e num método sólido de repartição de custos que reflita os custos reais da prestação do serviço público.
Os n.ºs 1 e 2 do artigo 4.o do regulamento, em combinação com as regras estabelecidas no anexo, preveem a correta repartição, pelos dois tipos de atividade, dos custos e receitas associados respetivamente à prestação dos serviços no âmbito do contrato de serviço público e à atividade comercial, no intuito de possibilitar a monitorização eficaz da utilização dada à compensação pública e da eventual subsidiação cruzada. A adequação das modalidades de repartição dos custos e das medidas de delimitação das obrigações de serviço público e das atividades comerciais é crucial neste contexto. Por exemplo, quando o serviço público e a atividade comercial compartilham os meios de transporte (material circulante ou autocarros) ou outros ativos ou serviços necessários à prestação do serviço público (escritórios, pessoal ou estações), os custos conexos devem ser imputados aos dois tipos de atividade na proporção do seu peso relativo no total das prestações de transporte fornecidas pela empresa.
(…)”
Da análise do estatuído no artigo 4º n.1 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, conjugado com o teor da “Comunicação | Orientações para a interpretação (…)” supra vertido, o Tribunal considera que a enunciação do modelo de repartição de custos ali identificados se destina não a uma eventual reposição do equilíbrio económico-financeiro do contrato, mas sim, a permitir que nos contratos com este objecto, seja determinada uma adequada remuneração dos capitais próprios, uma vez que a “(…) compensação pela obrigação de serviço público não pode exceder o efeito financeiro líquido, definido como os custos incorridos, deduzidas as receitas geradas pelas atividades de serviço público e as receitas potenciais geradas na rede explorada, acrescidos de um «lucro razoável». (…)”.
Ora, in casu o preço / a compensação pela obrigação do serviço público à cocontratante está, expressamente, definido na cláusula 42º do caderno de encargos [cfr. ponto R) do probatório] em termos não impugnados por qualquer dos concorrentes, donde decorre que estes, na elaboração das suas propostas, consideraram que os termos em que a respectiva remuneração ali estava prevista eram suficientes para a adequada remuneração dos capitais próprios, não carecendo de qualquer outro elemento relativo à modalidade de repartição de custos.
Acresce que, da leitura do caderno de encargos se verifica que a repartição de custos – ainda que não quantificada – se encontra ali realizada. Com efeito, (i) na cláusula 10º do caderno de encargos assaca-se à cocontratante a obrigação de disponibilizar todos os bens necessários à prossecução do objecto do contrato; (ii) na cláusula 20º do caderno de encargos imputa-se à cocontratante os custos com a manutenção dos bens relativos à prestação de serviços em causa (com excepção dos que estão enunciados na cláusula 9º antecedente); (iii) do teor da cláusula 26º resulta, igualmente, ser obrigação da cocontratante suportar os custos de pessoal.
E, como bem afirma a R. AMP, na falta de estipulação em contrário sempre terá plena aplicabilidade o disposto no artigo 452º do CCP, onde se determina que “Na falta de estipulação contratual, as instalações, os equipamentos e quaisquer outros meios necessários ao exato e pontual cumprimento das obrigações contratuais são da responsabilidade do prestador de serviços.”
Assim, conclui o Tribunal pela improcedência da invocada violação, por omissão, do disposto no artigo 4º n.1 alínea c) do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, de 23.10 e artigo 21º n.1 do Lei n.º 52/2015, assacada ao Caderno de Encargos.
[…]
Da alegada invalidade da cláusula 26º n.2 e 3 do caderno de encargos [(6); (15); (33)]
As AA. TC..., ET EG... e TU... invocam a ilegalidade do disposto nos n.s 2 e 3 da cláusula 26º uma vez que esta, no seu n.2 que “(…) impõe aos Cocontratantes uma obrigação genérica de sucessão, enquanto futuros prestadores do serviço, na posição contratual de empregador dos actuais prestadores de serviços, querendo isto dizer que, na prática, os Cocontratantes deverão assumir como seus os trabalhadores que, à data da celebração do contrato, estejam a prestar o serviço correspondente ao seu objecto. (…)”, mais obrigando, no seu n.3, a que “(…) mesmo fora do quadro legal do n.º 1 da Cláusula 26.ª, o Cocontratante opte pelos “Trabalhadores Antigos” (…)” [pi A. TC...]. Idêntica obrigação decorrendo do preceituado nos n.º 6, 7 e 8 da mesma cláusula. [pi ET EG...]
Sustentam as AA. que tal obrigação porque poderá ter repercussões no teor da proposta carece de concretização, pelo que “(…) à Entidade Adjudicante incumbia materializar e completar aquela obrigação com todos os dados necessários à tomada de uma decisão informada e à elaboração de uma proposta que os ponderasse devidamente. (…)” [pi A. TC...].
Mais afirmam que, pese embora essa informação haja sido solicitada em sede de esclarecimentos, o júri do procedimento limitou-se a declarar que não dispunha da mesma, e “(…) apenas soube indicar quais os operadores que, actualmente, prestam os serviços públicos correspondentes ao objecto do contrato levado a concurso, (…)” [pi A. TC...].
Defendem por isso a violação, por parte da entidade adjudicante, da obrigação de fornecer os elementos em causa prevista no disposto no artigo 4º n.5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e, bem assim, do princípio da transparência e da concorrência.
Acrescentam que a obrigação constante no artigo 26º n.2 do caderno de encargos, nos termos em que está redigida, viola os princípios da concorrência e da igualdade porque prevê a obrigação dos adjudicatários de sucessão na posição contratual dos actuais prestadores de serviços relativamente aos seus trabalhadores, além do mais, quando esta seja imposta pelos instrumentos de contratação colectiva aplicável. E, neste especifico inciso, invocam, reside a ilegalidade, pois que os contratos colectivos de trabalhos são aplicáveis, apenas, às partes contratuais que nele intervenham.
Concluem que “(…) na prática, poderão existir operadores económicos sujeitos àquela obrigação de transferência dos trabalhadores e outros que, por não fazerem parte da associação sindical à qual o CCT é aplicável, se veem, sem mais, livres dessa obrigação. (…)”, o que conduz, também por este motivo, à violação dos princípios da igualdade e concorrência [pi A. TC...].
Em sede de contestação a R. AMP refuta a descrita ilegalidade, que por inexistência de violação do disposto no artigo 4º n.5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, quer por ausência de violação dos princípios da concorrência e igualdade.
Alega, com efeito, que o preceituado no n.2 da citada cláusula “(…) se limita a reiterar o que, na sua ausência, sempre decorreria de regime legal imperativo. (…) Contém, tão-só, a reprodução genérica de obrigações legal ou normativamente impostas a transmitente e transmissário, se e (na medida em que) se verifique uma hipótese juridicamente qualificável como transmissão de unidade económica. (…)”, defendendo que as obrigações ali enunciadas podem decorrer quer do disposto na Directiva n.º 2001/23/CE do Conselho, de 12 Março, quer do regime constante do artigo 285º e ss. do Código de Trabalho (na redacção da Lei n.º 7/2009, 12.02), quer de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho., verificados que sejam os pressupostos da sua aplicabilidade [contestação R. AMP p. 1973/20].
Afirma, por isso, que o conteúdo da referida cláusula é “neutro”; que o “(…) o regime laboral da transmissão de unidade económica previsto no CT “opera ope legis, ficando o adquirente da unidade empresarial sub-rogado ex lege, obrigatoriamente, na posição contratual do anterior titular” (…)”; que também a “(…) diferenciação quanto aos destinatários desses regimes resulta das regras legais vigentes em matéria de contratação coletiva acolhidas no nosso ordenamento jus-laboral, em decorrência de um princípio estruturante: o da autonomia coletiva (cfr. n.os 3 e 4 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa). (…)”, o que não é susceptível de ser imputado à aqui R. AMP.
Defende, pois, que o teor do n.2 só teve por intuito articular a sua interpretação e aplicação com o estatuído no subsequente n.3 e seguintes.
Pugna, ainda, a R. AMP que “(…)
a) A Entidade Demandada não ocupa a posição de empregador nos contratos de trabalho em causa;
b) Não dispõe (nem seria viável dispor) de informação a respeito de tais relações laborais (como se indicou, o serviço atual não está sequer organizado em zonas geográficas coincidentes com os lotes do concurso, sendo ainda realizado fora do território da Entidade Demandada);
c) Não assume, para efeitos do enquadramento reservado pela Diretiva 2001/23/CE e dos arts. 285.º e ss. do CT, a posição de transmitente;
d) Não impende sobre a Entidade Demandada qualquer obrigação legal de informação ou consulta aos trabalhadores ou aos empregadores. (…)”.
No que concerne à invocada violação do artigo 4º n.5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e Comunicação da Comissão 2014/C 92/01 – maxime ponto 2.2.8, a R. AMP sustenta que à luz das disposições do mesmo Regulamento, a entidade adjudicante poderia optar por: (1) não adoptar qualquer medida de salvaguarda quanto aos direitos dos trabalhadores, ou (2) exigir a transferência do pessoal anteriormente contratado, ou (3) exigir a adopção de determinadas normas sociais, ou ambas as últimas opções.
E, uma vez que no caso concreto, a entidade adjudicante não impôs aos novos operadores a assunção da posição contratual de empregador nos contratos de trabalho em vigor, limitando-se a remeter para o regime laboral vigente, a R. AMP conclui que não tem aplicação do disposto no n.5 do artigo 4º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007.
O mesmo sucedendo em relação à previsão do n.3 da cláusula 26º já que ali apenas se prevê “(…) um regime de preferência na contratação, não confundível com qualquer obrigação de contratação. (…)”, acrescendo que “(…) nessas hipóteses, as condições contratuais aplicáveis serão aquelas que o cocontratante definir, não sendo estabelecida qualquer obrigação de manutenção de condições laborais pretéritas, no que aos trabalhadores anteriormente ao serviço concerne. (…)”. Do assim previsto decorre, afirma, a “(…) autonomia dos operadores quanto ao teor das propostas laborais a apresentar, (…)” e, consequentemente, a ausência de qualquer “(…) informação contratual relevante a disponibilizar pela Emtidade Demandada, no que concerne a condições laborais pretéritas, (…)”.
Conclui, por isso e pelos mesmos motivos, pela inexistência de qualquer violação do estipulado no artigo 4º n.5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 nos n.ºs 4 a 9 da citada cláusula 26º do caderno de encargos.
Apreciemos.
Estipula a cláusula 26º do caderno de encargos, sob a epígrafe “Estrutura de recursos humanos”, que:
“1. O COCONTRATANTE obriga-se a estabelecer e a manter uma estrutura de recursos humanos que permita dar integral cumprimento às obrigações decorrentes do Contrato, devendo dispor, durante todo o Período de Funcionamento Normal, de um número suficiente de pessoal dotado de experiência e formação adequadas e qualificação ou licenciamento necessário (quando aplicável) para desenvolver, de forma contínua ou pontual, as atividades incluídas na Prestação de Serviços.
2. O COCONTRATANTE obriga-se a respeitar integralmente a obrigação de suceder na posição contratual de empregador nas relações laborais existentes com trabalhadores que prestam o seu trabalho aos operadores que à data da celebração do Contrato prestam o serviço público correspondente ao objeto do Contrato, no caso de essa obrigação ser imposta pelos instrumentos de contratação coletiva aplicáveis, pelo regime jurídico aplicável em caso de transmissão de unidade económica, previsto na Diretiva n.º 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de Março de 2001, e pelos artigos 285.º e seguintes do Código do Trabalho.
3. Fora do caso previsto no número anterior, o COCONTRATANTE, caso tenha necessidade de contratar recursos humanos para assegurar o cumprimento das obrigações emergentes do Contrato durante o Período de Transição e durante o primeiro Ano Contratual, obriga-se, nos termos dos n.ºs 4 a 9, seguintes, a contratar os trabalhadores que, à data da celebração do Contrato, exerçam funções correspondentes àquelas que o COCONTRATANTE pretenda contratar ao serviço dos operadores que, nessa data, prestem o serviço público correspondente ao objeto do Contrato (“Trabalhadores Antigos”) e manifestem interesse nessa contratação.
4. Sempre que, durante o Período de Transição e durante o primeiro Ano Contratual, tenha necessidade de contratar recursos humanos, o COCONTRATANTE comunica ao público, através da sua página de internet e de anúncios em, pelo menos, um jornal de âmbito regional ou nacional, a sua intenção de contratação, acompanhada das seguintes informações mínimas:
a) Número de vagas;
b) Funções e categoria profissional inerentes a cada um dos postos em recrutamento;
c) Local(ais) para a prestação do trabalho e o âmbito territorial do lote em causa;
d) Indicação de que beneficiam das regras preferenciais de recrutamento constantes do disposto no n.º 6 os Trabalhadores Antigos que:
i. Na data correspondente à da celebração do Contrato e que deve ser expressamente indicada, exerciam funções correspondentes às indicadas na alínea b); e
ii. Que juntem os elementos probatórios relevantes para verificação do preenchimento dos requisitos referidos na subalínea anterior;
e) Local onde esteja disponível, a título gratuito, cópia do correspondente modelo de contrato de trabalho, no qual se preveja as condições contratuais mínimas que o COCONTRATANTE está disposto a assumir na qualidade de empregador, em integral conformidade com o regime jurídico-laboral, incluindo o regime convencional coletivo aplicável, sem prejuízo de eventual negociação, na medida do legalmente admissível, de condições contratuais mais favoráveis com cada um dos trabalhadores;
f) Endereço eletrónico e prazo, o qual não pode ser inferior a 7 (sete) dias úteis a contar da data da comunicação da intenção de contratação, para manifestação do interesse na posição indicada no anúncio.
5. O COCONTRATANTE obriga-se a enviar ao CONTRAENTE PÚBLICO, no dia seguinte à respetiva publicitação, cópia do anúncio e cópia do modelo de contrato de trabalho a que se refere o número anterior e indicação dos meios de publicitação usados.
6. Se, em relação a uma mesma vaga, concorrerem um Trabalhador Antigo e candidato que não o seja, o COCONTRATANTE obriga-se a contratar o Trabalhador Antigo, exceto se demonstrar que este não reúne as qualificações, habilitações, experiência e certificações exigidas para a ocupação do correspondente posto de trabalho ou que tal trabalhador recusou as condições contratuais previstas no modelo de contrato disponibilizado pelo COCONTRATANTE nos termos e para o efeito da alínea e) do n.º 4.
7. Caso o número de Trabalhadores Antigos que tenham manifestado interesse na posição indicada no anúncio nos termos da alínea f) do n.º 4 seja superior ao número de vagas fixado nesse anúncio, o COCONTRATANTE pode escolher livremente, de entre esses e em conformidade com critérios legítimos e objetivos, de natureza gestionária, quais os trabalhadores a contratar.
8. O contrato de trabalho a celebrar com os Trabalhadores Antigos nos termos dos números anteriores deve respeitar, no mínimo, as condições contratuais previstas no modelo de contrato disponibilizado pelo COCONTRATANTE nos termos e para o efeito da alínea e) do n.º 4, sem prejuízo da integral conformidade com o regime jurídico-laboral, incluindo o regime convencional coletivo, aplicáveis à data da celebração do contrato de trabalho.
9. Nos casos em que o COCONTRATANTE seja uma sociedade constituída nos termos do artigo 19.º do Programa do Concurso, a obrigação prevista nos n.ºs 3 a 8 apenas lhe é aplicável quando contrate recursos humanos para efeitos do presente Contrato que não sejam trabalhadores que, à data da celebração do Contrato, estivessem ao serviço dos sócios fundadores do COCONTRATANTE.
10. Até 40 (quarenta) dias antes do termo do Período de Transição, o COCONTRATANTE deve apresentar, para aprovação do CONTRAENTE PÚBLICO, a lista da estrutura de recursos humanos a utilizar para a Prestação de Serviços no primeiro dia do Período de Funcionamento Normal, informando quais os recursos humanos que foram contratados ao abrigo da obrigação prevista nos n.ºs 3 a 8,a justificação para a não contratação daqueles que, nos termos dos n.ºs 3 a 8, nesta tenham demonstrado interesse, e, se for o caso, aqueles que estavam ao serviço dos sócios da SOCIEDADE COCONTRATANTE constituída nos termos e para o efeito do artigo 19.º do Programa do Concurso à data da sua constituição, incluindo ainda aqueles que pertencem a entidades subcontratadas, com indicação da função e categoria profissional e identificação completa de cada elemento integrante da equipa de recursos humanos.
11. O CONTRAENTE PÚBLICO deve pronunciar-se sobre a lista referida no número anterior no prazo de 20 (vinte) dias a contar da data da sua receção.
12. O COCONTRATANTE é responsável pelo atraso no início do Período de Funcionamento Normal que resulte da não aprovação dos recursos humanos nos termos dos números anteriores.
13. O COCONTRATANTE obriga-se a apresentar provas das qualificações, habilitações e experiência do seu pessoal ou do pessoal subcontratado, sempre que tal seja solicitado pelo CONTRAENTE PÚBLICO.
14. O COCONTRATANTE obriga-se a assegurar que todos os meios humanos utilizados no âmbito da Prestação de Serviços, incluindo o pessoal de entidades subcontratadas, empregam toda a sua competência e diligência na realização das tarefas que lhe forem cometidas.
15. Qualquer alteração à composição dos recursos humanos durante a execução do Contrato deve ser comunicada de imediato pelo COCONTRATANTE ao CONTRAENTE PÚBLICO, demonstrando o cumprimento do disposto nos números anteriores.
16. O COCONTRATANTE deve cumprir todas as disposições legais e regulamentares e o previsto em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho aplicáveis, sendo da sua responsabilidade os encargos que daí resultem.
17. O COCONTRATANTE, na qualidade de entidade empregadora e responsável pelo tratamento dos dados pessoais dos seus trabalhadores, obriga-se a dar cumprimento ao dever legal de informar os trabalhadores que utilizar na Prestação dos Serviços dos tratamentos que efetuar quanto aos seus dados pessoais, nos termos previstos na legislação aplicável, e, em particular, das finalidades e dos fundamentos jurídicos da comunicação desses dados pessoais, nos termos do Caderno de Encargos, ao CONTRAENTE PÚBLICO.”
No Código de Trabalho, com relevo para a apreciação da questão sub iudice, estipula-se o seguinte:
“(…)
Artigo 3.º (Relações entre fontes de regulação)
1 – As normas legais reguladoras de contrato de trabalho podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, salvo quando delas resultar o contrário.
2 – As normas legais reguladoras de contrato de trabalho não podem ser afastadas por portaria de condições de trabalho.
3 – As normas legais reguladoras de contrato de trabalho só podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que, sem oposição daquelas normas, disponha em sentido mais favorável aos trabalhadores quando respeitem às seguintes matérias:
(…)
m) Transmissão de empresa ou estabelecimento;
(…)
4 – As normas legais reguladoras de contrato de trabalho só podem ser afastadas por contrato individual que estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador, se delas não resultar o contrário.
5 – Sempre que uma norma legal reguladora de contrato de trabalho determine que a mesma pode ser afastada por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho entende-se que o não pode ser por contrato de trabalho.
(...)
SUBTÍTULO II
Instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho
CAPÍTULO I
Princípios gerais relativos a instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho
SECÇÃO I
Disposições gerais sobre instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho
Artigo 476.º (Princípio do tratamento mais favorável)
As disposições de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho só podem ser afastadas por contrato de trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador.
(…).”
Versando sobre a aplicação do artigo 476º, o Tribunal da Relação do Porto proferiu acórdão, no qual afirmou, entre o mais, que: “(…) IV – Estando nesse caso em causa a aplicação de cláusula estabelecida em CCT que vincula as partes, sendo aplicável o princípio estabelecido no artigo 476.º ao contrato de trabalho ao acordo das partes, esse princípio é a este aplicável, assim sobre exercício de funções e categoria associada, em particular, no que aqui importa, à transição, imposta pela citada cláusula, do trabalhador para a categoria correspondente às funções que exerceu durante o período em causa.
V – Estando nesse caso em causa a aplicação de princípio plasmado na lei, assim o disposto no artigo 476.º do CT, que impõe o primado de que as disposições de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho só podem ser afastadas quando se trate de estabelecer condições mais favoráveis para o trabalhador, impõe-se o nesse estabelecido, independentemente pois de qualquer eventual acordo anterior em contrário celebrado entre as partes, sem que se possa dizer que ocorre abuso de direito, na modalidade venire contra factum proprium.” – vd. «Sumário», do Acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 14891/15.7T8PRT.P1, em 10.09.2018.

Especificamente, sobre o regime da transmissão de empresa ou estabelecimento, o Código de Trabalho – na redação em vigor à data da aprovação das peças procedimentais em apreço – estipulava:
“Artigo 285.º (Efeitos de transmissão de empresa ou estabelecimento)
1 – Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
2 – O disposto no número anterior é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes tenha exercido a exploração.
3 – Com a transmissão constante dos n.os 1 ou 2, os trabalhadores transmitidos ao adquirente mantêm todos os direitos contratuais e adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos.
4 – O disposto nos números anteriores não é aplicável em caso de trabalhador que o transmitente, antes da transmissão, transfira para outro estabelecimento ou unidade económica, nos termos do disposto no artigo 194.º, mantendo-o ao seu serviço, excepto no que respeita à responsabilidade do adquirente pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
5 – Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados que constitua uma unidade produtiva dotada de autonomia técnico-organizativa e que mantenha identidade própria, com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória.
6 – O transmitente responde solidariamente pelos créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, bem como pelos encargos sociais correspondentes, vencidos até à data da transmissão, cessão ou reversão, durante os dois anos subsequentes a esta.
7 – A transmissão só pode ter lugar decorridos sete dias úteis após o termo do prazo para a designação da comissão representativa, referido no n.º 6 do artigo seguinte, se esta não tiver sido constituída, ou após o acordo ou o termo da consulta a que se refere o n.º 4 do mesmo artigo.
8 – O transmitente deve informar o serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral:
a) Do conteúdo do contrato entre transmitente e adquirente, sem prejuízo do disposto nos artigos 412.º e 413.º, com as necessárias adaptações;
b) Havendo transmissão de uma unidade económica, de todos os elementos que a constituam, nos termos do n.º 5.
9 – O disposto no número anterior aplica-se no caso de média ou grande empresa e, a pedido do serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral, no caso de micro ou pequena empresa.
10 – Constitui contraordenação muito grave:
a) A conduta do empregador com base em alegada transmissão da sua posição nos contratos de trabalho com fundamento em transmissão da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, ou em transmissão, cessão ou reversão da sua exploração, quando a mesma não tenha ocorrido;
b) A conduta do transmitente ou do adquirente que não reconheça ter havido transmissão da posição daquele nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores quando se verifique a transmissão da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, ou a transmissão, cessão ou reversão da sua exploração.
11 – A decisão condenatória pela prática de contraordenação referida na alínea a) ou na alínea b) do número anterior deve declarar, respetivamente, que a posição do empregador nos contratos de trabalho dos trabalhadores não se transmitiu, ou que a mesma se transmitiu.
12 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 7, 8 ou 9.
(…)”
Este regime, veio a ser alterado na pendência do procedimento concursal em apreço e da presente instância, pela Lei n.º 18/2021, de 8 abril, na qual se prevê:
“Artigo 1.º (Objeto)
A presente lei estende o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento às situações de transmissão por adjudicação de fornecimento de serviços que se concretize por concurso público, ajuste direto ou qualquer outro meio, alterando o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
(…)
Artigo 3.º (Disposição transitória)
As alterações introduzidas pela presente lei aplicam-se, igualmente, aos concursos públicos ou outros meios de seleção, no setor público e privado, em curso durante o ano de 2021, incluindo aqueles cujo ato de adjudicação se encontre concretizado.
(…)”
Diploma este que, igualmente, procedeu à alteração do normativo que regula a transmissão de empresa ou estabelecimento, que passou a ter a seguinte redacção:
“Artigo 285.º (Efeitos de transmissão de empresa ou estabelecimento)
1 – Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
2 – O disposto no número anterior é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes tenha exercido a exploração.
3 – Com a transmissão constante dos n.os 1 ou 2, os trabalhadores transmitidos ao adquirente mantêm todos os direitos contratuais e adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos.
4 – O disposto nos números anteriores não é aplicável em caso de trabalhador que o transmitente, antes da transmissão, transfira para outro estabelecimento ou unidade económica, nos termos do disposto no artigo 194.º, mantendo-o ao seu serviço, excepto no que respeita à responsabilidade do adquirente pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
5 – Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados que constitua uma unidade produtiva dotada de autonomia técnico-organizativa e que mantenha identidade própria, com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória.
6 – O transmitente responde solidariamente pelos créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, bem como pelos encargos sociais correspondentes, vencidos até à data da transmissão, cessão ou reversão, durante os dois anos subsequentes a esta.
7 – A transmissão só pode ter lugar decorridos sete dias úteis após o termo do prazo para a designação da comissão representativa, referido no n.º 6 do artigo seguinte, se esta não tiver sido constituída, ou após o acordo ou o termo da consulta a que se refere o n.º 4 do mesmo artigo.
8 – O transmitente deve informar o serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral:
a) Do conteúdo do contrato entre transmitente e adquirente, sem prejuízo do disposto nos artigos 412.º e 413.º, com as necessárias adaptações;
b) Havendo transmissão de uma unidade económica, de todos os elementos que a constituam, nos termos do n.º 5.
9 – O disposto no número anterior aplica-se no caso de média ou grande empresa e, a pedido do serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral, no caso de micro ou pequena empresa.
10 – O disposto no presente artigo é aplicável a todas as situações de transmissão de empresa ou estabelecimento por adjudicação de contratação de serviços que se concretize por concurso público ou por outro meio de seleção, no setor público e privado, nomeadamente à adjudicação de fornecimento de serviços de vigilância, alimentação, limpeza ou transportes, produzindo efeitos no momento da adjudicação.
11 – Constitui contraordenação muito grave:
a) A conduta do empregador com base em alegada transmissão da sua posição nos contratos de trabalho com fundamento em transmissão da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, ou em transmissão, cessão ou reversão da sua exploração, quando a mesma não tenha ocorrido;
b) A conduta do transmitente ou do adquirente que não reconheça ter havido transmissão da posição daquele nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores quando se verifique a transmissão da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, ou a transmissão, cessão ou reversão da sua exploração.
12 – A decisão condenatória pela prática de contraordenação referida na alínea a) ou na alínea b) do número anterior deve declarar, respetivamente, que a posição do empregador nos contratos de trabalho dos trabalhadores não se transmitiu, ou que a mesma se transmitiu.
13 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 7, 8 ou 9.
14 – Aos trabalhadores das empresas ou estabelecimentos transmitidos ao abrigo do presente artigo aplica-se o disposto na alínea m) do n.º 1 do artigo 3.º e no artigo 498.º
(…).”
Por sua vez, a Directiva 2001/23/CE do Conselho, 12 de Março 2001, “relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos”, preceitua que: “(…)
Artigo 1.º
1. a) A presente directiva é aplicável à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, quer essa transferência resulte de uma cessão convencional quer de uma fusão.
b) Sob reserva do disposto na alínea a) e das disposições seguintes do presente artigo, é considerada transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória.
c) A presente directiva é aplicável a todas as empresas, públicas ou privadas, que exercem uma actividade económica, com ou sem fins lucrativas. A reorganização administrativa de instituições oficiais ou a transferência de funções administrativas entre instituições oficiais não constituem uma transferência na acepção da presente directiva.
2. A presente directiva é aplicável se e na medida em que a empresa, o estabelecimento ou a parte de empresa ou de estabelecimento a transferir esteja abrangido pelo âmbito de aplicação territorial do Tratado.
3. A presente directiva não é aplicável aos navios.
(…)
Manutenção dos direitos dos trabalhadores
Artigo 3.º
1. Os direitos e obrigações do cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes à data da transferência são, por esse facto, transferidos para o cessionário.
Os Estados-Membros podem prever que, após a data da transferência, o cedente e o cessionário sejam solidariamente responsáveis pelas obrigações resultantes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes antes da data da transferência.
2. Os Estados-Membros podem adoptar as medidas adequadas para assegurar que o cedente notifique o cessionário de todos os direitos e obrigações transferidos para este último nos termos do presente artigo, na medida em que esses direitos e obrigações sejam, ou devessem ser, do conhecimento do cedente no momento da transferência. A não notificação pelo cedente ao cessionário de qualquer desses direitos ou obrigações não afectará a transferência desses mesmos direitos ou obrigações nem os direitos de quaisquer trabalhadores contra o cessionário e/ou cedente relativamente a esses direitos ou obrigações.
3. Após a transferência, o cessionário manterá as condições de trabalho acordadas por uma convenção colectiva, nos mesmos termos em que esta as previa para o cedente, até à data da rescisão ou do termo da convenção colectiva ou até à data de entrada em vigor ou de aplicação de outra convenção colectiva.
Os Estados-Membros podem limitar o período de manutenção das condições de trabalho desde que este não seja inferior a um ano.
4. a) Salvo determinação em contrário dos Estados-Membros, os n.os 1 e 3 não são aplicáveis aos direitos dos trabalhadores a prestações de velhice, invalidez ou sobrevivência concedidas por regimes complementares de previdência, profissionais ou interprofissionais, não compreendidos nos regimes legais de segurança social dos Estados-Membros.
b) Mesmo quando não prevejam, nos termos da alínea a), que o n.os 1 e 3 se aplicam aos direitos nela mencionados, os Estados-Membros adoptarão as medidas necessárias para proteger os interesses dos trabalhadores, bem como das pessoas que no momento da transferência já tenham deixado o estabelecimento do cedente, no que respeita aos direitos adquiridos ou em vias de aquisição a prestações de velhice, incluindo as prestações de sobrevivência, concedidos pelos regimes complementares referidos na alínea a) do presente número.
(…)”
Ora, as directivas enquanto fonte de direito da União Europeia vinculam os Estados-membros quanto ao resultado a obter, conferindo liberdade aos mesmos para definir a forma e os meios, carecendo, por isso, de transposição para o ordenamento jurídico nacional. Todavia, é jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia que, a título excepcional, os particulares podem invocar a directiva e esta produzir efeitos directos num Estado-membro, desde que “a) a transposição para o direito interno não tenha sido efetuada ou o tenha sido incorretamente; b) as disposições das diretivas sejam imperativas e suficientemente claras e precisas; as disposições das diretivas confiram direitos aos particulares. (…)”
Analisemos, pois.
Entre os institutos aqui descritos existe um ponto em comum: a imperatividade da sua aplicação à situação jurídica dos trabalhadores, caso se verifique uma transmissão de empresa ou estabelecimento, nos termos em que a mesma está definida nos institutos jurídicos ali referidos, independentemente da remissão que estes seja feita em sede de caderno de encargos.
Especificamente sobre o âmbito de aplicação do regime da transmissão de empresa ou estabelecimento e da interpretação dos conceitos que o integram pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça afirmando, entre o mais e no que ora releva, que: “(…)
Resulta da alínea a), do n.º 1, do artigo 1.º, da Directiva, que o regime estabelecido é aplicável «à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento», quer essa transferência resulte de uma cessão convencional ou de uma fusão.
Por força do disposto na alínea b), do n.º 1, deve entender-se como abrangida pela transferência ali disciplinada, e respeitado «o disposto na alínea a) e das disposições seguintes deste artigo», a «transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória».
Por conseguinte, a transferência de titularidade dos contratos de trabalho prevista na presente Directiva abrange não apenas a transferência de empresa ou de estabelecimento, mas também a parte de empresa ou de estabelecimento que se constitua como uma «entidade económica», entendida esta nos termos estabelecidos na norma citada, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica não restringida ao exercício da actividade principal.
Daqui decorre, da conjugação do regime legal previsto na Directiva nº 2001/23/CE – arts. 1.º, n.º 1, alínea a), e 2.º, n.º 1, alíneas a) e b) – com o art. 285º, nºs 1 e 3, do Código do Trabalho de 2009, que o conceito de transmissão, para efeitos laborais, é especialmente amplo.
(…)
Essencial é que tenha ocorrido, efectivamente, a transmissão de um negócio ou actividade, que constitua uma unidade económica autónoma na esfera do transmitente para a do transmissário, «mantendo a sua identidade» (art. 1.º, n.º 1, da Directiva), e que demonstre o animus translativo da operação pelo facto de o primeiro ter deixado de exercer a actividade correspondente a tal unidade e o segundo passar a exercê-la nos mesmos moldes.
3.3. O conceito nuclear inserido nesta Directiva, conforme resulta da sua análise, não é tanto o de transferência/transmissão de empresa, mas sim o de “transferência de uma entidade económica” – cf. a alínea b), do nº 1, do seu art. 1º.
Conceito que reencontramos explicitado no art. 285.º do Código do Trabalho, no seu n.º 5, com a noção aí consagrada de “unidade económica”, como o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória.
Reproduzindo na nossa ordem jurídica o citado art. 1.º, n.º 1, alínea b), da Directiva nº 2001/23/CE, de 12 de Março, em consonância com o entendimento da Jurisprudência do TJUE, segundo o qual é considerada como tal a transferência de uma unidade económica que mantém a sua identidade, entendida esta nos mesmos termos: “como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória”.
Asserção vertida claramente no atrás citado Acórdão do TJUE, de 09.09.2015, com a seguinte narrativa:
«Segundo jurisprudência constante, a Diretiva 2001/23 tem em vista assegurar a continuidade das relações de trabalho existentes no quadro de uma entidade económica, independentemente da mudança de proprietário. O critério decisivo para demonstrar a existência de uma transferência, na acepção dessa diretiva, consiste na circunstância de a entidade em questão preservar a sua identidade, o que resulta, designadamente, da prossecução efetiva da exploração ou da sua retoma».
Sendo considerado como elemento determinante dessa definição e reconhecimento de unidade económica, pela Jurisprudência Comunitária, a autonomia de parte da empresa ou do estabelecimento transmitidos.
Podendo ler-se, a este propósito, no Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, exarado no Proc. C-458/05 (Ac. Jouini), de 13/09/2007, que o Tribunal de Justiça acentuou a necessidade de a unidade económica manter a sua própria identidade no seio do transmissário, o que se revela pela prossecução de um objectivo próprio.[14]
Identidade a aferir pelo conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória – cf. nº 5, do art. 285º, do Código do Trabalho de 2009.
Importa, assim, avaliar se a unidade económica mantém a sua identidade, se se mostra dotada de autonomia técnico-organizativa própria, constituindo uma unidade produtiva autónoma, com organização específica.
(…)
3.4. Aquilatar da subsistência de uma unidade económica exige a ponderação de determinados elementos indiciários, sendo frequentemente enunciados pelo TJUE, como relevantes, os seguintes:
- Avaliar o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata;
- Apurar se houve a transferência ou não de bens corpóreos, tais como os edifícios e os bens móveis, bem como o valor dos elementos incorpóreos existentes no momento da transmissão;
- Verificar se se operou a reintegração, ou não, por parte do novo empresário, do essencial dos efectivos, v.g., no domínio dos recursos humanos;
- Confirmar se ocorreu a transmissão, entendida enquanto continuidade, da respectiva clientela;
- Comprovar o grau de similitude entre as actividades exercidas antes e depois da transmissão e a duração de uma eventual suspensão dessas actividades.
Elementos parciais indiciários a valorizar numa avaliação de conjunto, enquanto critérios orientadores e coadjuvantes da decisão a proferir, que dependerá da ponderação que se faça desses factores em função de cada caso concreto.
Conclusão corroborada, nesta parte, por Júlio Manuel Vieira Gomes[17] quando refere que:
«Decisiva para o Tribunal de Justiça é sempre a manutenção da entidade económica, e para se verificar se essa entidade continuou a ser a mesma, o tribunal destacou que há que recorrer a múltiplos elementos cuja importância pode, de resto, variar no caso concreto, segundo o tipo de empresa ou estabelecimento, a sua actividade, ou métodos de gestão, sendo que estes elementos devem ser objecto de uma apreciação global, não sendo em princípio decisivo nenhum deles».
E explicita:
«Podem ser relevantes elementos como a transmissão de bens do activo da entidade, designadamente, bens imóveis, ou equipamentos, mas também bens incorpóreos como a transmissão de know-how, a própria manutenção da maioria ou do essencial dos efectivos, a duração de uma eventual interrupção da actividade desenvolvida antes e a actividade desenvolvida depois da transferência».
(…)”. – cfr. Acórdão proferido em 06.12.2017, no âmbito do processo n.º 357/13.3TTPDL.L1.S1

Ressalta, pois, do enquadramento vertido no acórdão citado – que aqui se acolhe – que a verificação da existência, ou não, de uma transmissão de empresa ou estabelecimento decorre da aferição de múltiplos elementos, cuja relevância pode inclusive variar em cada caso.
E, sendo assim, mesmo com a sujeição ao regime da transmissão de empresa ou estabelecimento constante no artigo 285º n.10 do Código de Trabalho de “(…) todas as situações de transmissão de empresa ou estabelecimento por adjudicação de contratação de serviços que se concretize por concurso público ou por outro meio de seleção, no setor público e privado, nomeadamente à adjudicação de fornecimento de serviços de vigilância, alimentação, limpeza ou transportes, produzindo efeitos no momento da adjudicação. (…)” [na redação da Lei n.º 18/2021]; não se pode afirmar, peremptoriamente, que o n.2 da cláusula em apreço constitua para os concorrentes do presente procedimento uma obrigação de sucessão na posição contratual de empregador, em relação aos trabalhadores dos actuais operadores, porquanto do enunciado da mesma resulta, tão-só, a remissão para institutos jurídicos cuja aplicabilidade terá de ser objecto de apreciação in casu, em face dos critérios legais enunciados.
Assim, inexistindo a aludida obrigação/ exigência, não se aplica neste caso o disposto no artigo 4º n.5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, quando prevê que “5 – Sem prejuízo do direito nacional e comunitário, incluindo os acordos colectivos celebrados entre os parceiros sociais, as autoridades competentes podem exigir aos operadores seleccionados que proporcionem ao pessoal previamente contratado para a prestação dos serviços os direitos que teriam sido concedidos a esse pessoal caso tivesse sido efectuada uma transferência na acepção da Directiva 2001/23/CE. Sempre que as autoridades competentes exijam dos operadores de serviço público o cumprimento de determinados padrões sociais, os documentos relativos aos concursos e os contratos de serviço público devem incluir uma lista dos membros do pessoal em causa e fornecer informações transparentes relativas aos seus direitos contratuais e às condições nas quais os trabalhadores são considerados vinculados aos serviços. (…)”.
Relativamente à pretensa violação do princípio da transparência, julga o Tribunal que a remissão para os institutos jurídicos e respectivos regimes, constante da cláusula 26º n.2 torna acessível e evidente a qualquer interessada em participar no presente procedimento concursal as obrigações que sobre si impendem, se se verificarem os critérios de transmissão de empresa e estabelecimento. Acresce que, sem prejuízo de – como se decidiu – sobre a R. AMP não recair a obrigação de fornecer qualquer lista de pessoal, respectivos direitos contratuais e condições, atenta a mudança de paradigma na prestação dos serviços objecto do presente concurso, pelo facto de actualmente serviços serem prestados noutros moldes, por operadores económicos individualizados, sem coincidência de áreas com as ora determinadas nos lotes a concurso, é razoável e justificada a afirmação da R. AMP de que não dispõe dos aludidos documentos. Conclui-se, por isso, que a ausência de tal informação não constitui uma qualquer violação do princípio da transparência.
O mesmo se diga quanto à suscitada violação do princípio da igualdade e da concorrência pela circunstância de, com a remissão para os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalhos, poderem existir concorrentes que estejam obrigadas a observar determinada convenção colectiva, e outras não. A tal respeito, julga o Tribunal que, por um lado, a entidade adjudicante se limitou a remeter para institutos jurídicos de natureza imperativa e, por outro, que esta é alheia à circunstância de poderem existir diferentes instrumentos de regulamentação colectiva de trabalhos, com diferentes obrigações que se possam repercutir no teor das propostas a elaborar por cada um dos concorrentes, já que, a celebração de uma convenção colectiva de trabalho depende de um acto de vontade da parte que a subscreve, sem interferência da R. AMP na formação da mesma.
É que, se é certo que sobre a entidade adjudicante impende a obrigação de não criar factores perturbadores da concorrência; é, igualmente, verdadeiro que a esta são indiferentes as individuais e especificas circunstâncias de cada um dos concorrentes: se celebrou ou não qualquer instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, se tem trabalhadores antigos, se terá de contratar novos trabalhadores, se tem de adquirir um viaturas para a prestação do serviço, ou mesmo se tem de contratar recursos humanos para a elaboração da proposta a apresentar no procedimento; e se, a final, tudo isto se vai repercutir no preço/ teor da sua proposta. A consideração de tais factores diferenciadores, aquando da elaboração do programa de concurso e / ou do caderno de encargos cujas normas se pretendem de aplicação abstracta, essa sim, constituiria uma violação do princípio da igualdade e da concorrência.
Pelo exposto, improcede, por isso, a alegação relativa à violação do referido normativo, e dos princípios da transparência, igualdade e concorrência, quanto ao teor do n.2 da cláusula 26º do caderno de encargos.
No tocante à alegação de ilegalidade do n.3 da cláusula 26º, e bem assim da subsequente regulamentação constante dos n.s 4 a 9, com base nas mesmas invalidades – a violação do n.5 do artigo 4º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e dos princípios da transparência, igualdade e concorrência – atenta a sua redacção o Tribunal, adianta-se, julga que a mesma não se verifica.
Vejamos.
Preceitua o CCP:
“Artigo 42º (Caderno de Encargos)
1 – O caderno de encargos é a peça do procedimento que contém as cláusulas a incluir no contrato a celebrar.
2 – Nos casos de manifesta simplicidade das prestações que constituem o objeto do contrato a celebrar, as cláusulas do caderno de encargos podem consistir numa mera fixação de especificações técnicas e numa referência a outros aspetos essenciais da execução desse contrato, tais como o preço ou o prazo.
3 – As cláusulas do caderno de encargos relativas aos aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência podem fixar os respetivos parâmetros base a que as propostas estão vinculadas.
4 – Os parâmetros base referidos no número anterior podem dizer respeito a quaisquer aspetos da execução do contrato, tais como o preço a pagar ou a receber pela entidade adjudicante, a sua revisão, o prazo de execução das prestações objeto do contrato ou as suas características técnicas ou funcionais, bem como às condições da modificação do contrato, devendo ser definidos através de limites mínimos ou máximos, consoante os casos, sem prejuízo dos limites resultantes das vinculações legais ou regulamentares aplicáveis.
5 – O caderno de encargos pode também descrever aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência, nomeadamente mediante a fixação de limites mínimos ou máximos a que as propostas estão vinculadas.
6 – Os aspetos da execução do contrato, constantes das cláusulas do caderno de encargos, podem dizer respeito, desde que relacionados com tal execução, a condições de natureza social, ambiental, ou que se destinem a favorecer:
a) A aplicação de medidas de promoção da igualdade de género e da igualdade salarial no trabalho;
b) O aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho;
c) A conciliação da vida profissional com a vida familiar e pessoal dos trabalhadores afetos à execução do contrato;
d) A inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
7 – (Revogado.)
8 – (Revogado.)
9 – (Revogado.)
10 – (Revogado.)
11 – Para efeitos do disposto nos n.os 3 e 5, consideram-se aspetos submetidos à concorrência todos aqueles que são objeto de avaliação de acordo com o critério de adjudicação, e aspetos não submetidos à concorrência todos aqueles que, sendo apreciados, não são objeto de avaliação e classificação.”
Sobre esta matéria, o autor PEDRO COSTA GONÇALVES escreve “(…) O caderno de encargos define outros aspetos de execução do contrato, como, por ex., o preço, o prazo do contrato, o prazo de garantia, o local de entrega de um produto ou as condições de modificação do contrato.
No caderno de encargos são ainda definidos aspetos da execução do contrato que podem dizer respeito, desde que relacionadas com tal execução, a condições de natureza social ou ambiental: por ex., pode estabelecer-se que, na execução do serviço contratado, têm de ser utilizados veículos elétricos ou produtos de limpeza com um rótulo ecológico ou equivalente, que no fabrico de um produto não podem ser usados elementos tóxicos, que o cocontratante deve empregar pessoas desfavorecidas ou desempregados de longa duração. (…).
(…)
Conforme se estabelece no mesmo n.º6 do artigo 42.º, após a revisão de 2017, as cláusulas do caderno de encargos sobre aspetos da execução do contrato podem dizer respeito a outras condições que se destinem a favorecer: a) a aplicação de medidas de promoção da igualdade de género e da igualdade salarial no trabalho; b) o aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho; c) a conciliação da vida profissional com a vida familiar e pessoal dos trabalhadores afetos à execução do contrato; d) a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Trata-se, em geral, de aspetos da execução do contrato que especificam ou densificam condições de natureza social. (…)”. – in «Direito dos Contratos Públicos», 4ªed., Almedina, 2020, p. 633 e ss.
E, sobre o mesmo assunto escreve o autor PEDRO SÁNCHEZ, que “(…) É sabido que a progressiva evolução do direito dos contratos Públicos levou à ampliação das hipóteses de instrumentalização do regime de contratação pública em beneficio de politicas sociais, laborais ou ambientais que sejam definidas como relevantes pela normação comunitária. Aceitou-se definitivamente o pressuposto de que, embora o regime de contratação pública se destine primariamente ao duplo objectivo de promoção da concorrência num mercado interno e de selecção de uma proposta que satisfaça as necessidades de interesse público subjacentes ao contrato, a escolha da proposta a adjudicar pode ser também orientada, colateralmente, para o incentivo do mercado ao cumprimento de políticas públicas em áreas de relevo para o interesse comunitário, onde justamente se enquadram os sectores sociais, laborais ou ambientais. (…)
(…)
Ora, não se discute que as exigências que a entidade adjudicante inscreve no caderno de encargos devem ser pautadas pela razoabilidade e pela proporcionalidade: é ilegítimo impor exigências que restringem o universo potencial de concorrentes se o seu cumprimento é inútil ou desnecessário para a satisfação das necessidades públicas em causa – não sendo então a restrição imposta ao princípio da concorrência compensada com qualquer mais-valia na prossecução do interesse público subjacente ao contrato. (…)
Todavia, as políticas horizontais agora em apreço impõem uma flexibilização desta premissa, atendendo a que o regime de contratação pública pode ser utilizado como instrumento privilegiado de satisfação de outros interesses públicos, concretamente através da fixação no caderno de encargos de requisitos mínimos relativos a condições sociais ou ambientais que as propostas devam respeitar sob pena de exclusão ou, ainda, através da integração de tais condições no critério de adjudicação. Ainda que tais condições não sejam estritamente indispensáveis para a satisfação directa da necessidade que justifica a celebração do contrato, a sua integração no caderno de encargos pode consistir num dos instrumentos mais eficazes para o envolvimento dos co-contratantes privados na prossecução de interesses públicos sociais ou ambientais. (…)” – in «Direito da Contratação Pública, Vol. I», AAFDL Editora, 2020, p.682 e ss.
Posto isto, o Tribunal julga que a disposição constante do n.3 – e subsequentes n.ºs 4 a 9 – ao estabelecer uma obrigação de preferência na contratação de trabalhadores dos prévios operadores do serviço, constitui o exercício da liberdade que está acometida à entidade adjudicante pelo disposto no artigo 42º do CCP, maxime no seu n.6., designadamente no que toca à integração de condições de cariz social.
Todavia, é de salientar que essa obrigação de preferência nos termos em que está regulada não obriga os futuros adjudicatários / empregadores a assumir qualquer compromisso relativo à manutenção das condições/ direitos de trabalho que os trabalhadores detinham junto dos antigos operadores económicos; e sendo assim, não a constitui, obviamente, na obrigação de entregar os elementos a que alude o n.5 do artigo 4º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, por serem inócuos à nova relação de emprego a constituir.
Destarte, reiterando a fundamentação expendida quanto à ausência de violação dos princípios da transparência, igualdade e concorrência no n.2 da cláusula 26º, conclui-se, também aqui, pela inexistência dessa violação nos n.ºs 3 a 9 da mesma cláusula.
Em suma, improcede a alegação das AA. a este propósito.
[…]
Da alegada invalidade da cláusula 53º n.3 alínea i), n.4 alínea m), e n. 5 alínea n) do caderno de encargos [(16); (23); (34)]
Alegam as AA. ET EG..., TE... e TU... que a cláusula 53º n.3 alínea i), n.4 alínea m), e n. 5 alínea n) do caderno de encargos é ilegal, porque introduzem uma “cláusula genérica e absolutamente abstrata” de incumprimento não tipificado [pi processo n.º 1985/20].
Defendem, pois, que “(…) para além de se sujeitar a que lhe seja aplicada uma sanção contratual pecuniária por situações que o contrato tipifica como incumprimento, o Adjudicatário ainda se vê na circunstância de lhe poder ser aplicada sanção contratual pecuniária por ação ou omissão cuja tipificação, como incumprimento contratual, depende exclusivamente do poder arbitrário da AMP, e que este não pode, aquando da apresentação da proposta ou durante a execução do contrato, equacionar qual possa ser. (…)” [pi A. TE...].
Concluem que o disposto nas identificadas cláusulas viola os artigos 302º alínea d) e 329º n.4, ambos do CCP, e bem assim os princípios da legalidade e transparência.
A R. AMP sustentou a legalidade das identificadas normas, quer à luz do estipulado no CCP, quer considerando os princípios da legalidade e transparência.
Clama, pois, que as cláusulas em causa “(…) não deixam de estipular os pressupostos de aplicação de sanções contratuais pecuniárias: o incumprimento de obrigações perfeitamente determinadas previstas no Caderno de Encargos, a sua imputação ao cocontratante e a respetiva culpa. (…)” [contestação processo n.º 1985/20].
Afirma que as mencionadas alíneas da cláusula 53º “(…) são totalmente transparentes, limitando-se apenas a adotar a técnica de remissão sistemática interna (i.e. dentro do próprio contrato), que é comum e completamente legítima em quaisquer contratos, quer de direito público, quer de direito privado. (…)”, e que diferenciam a gravidade da sanção aplicável em função do tipo de culpa imputável ao incumprimento. [contestação processo n.º 1985/20].
Conclui, por isso, pela respectiva legalidade.
Vejamos.
Estatui a cláusula 53º do caderno de encargos, sob a epígrafe “Sanções contratuais pecuniárias”, que:
“1. Sem prejuízo da possibilidade de resolução sancionatória do Contrato nos termos do artigo 333.º do Código dos Contratos Públicos, o CONTRAENTE PÚBLICO pode, com observância das regras previstas nos artigos 325.º e 329.º do Código dos Contratos Públicos e no artigo 45.º do RJSPTP, aplicar sanções contratuais pecuniárias em caso de incumprimento pelo COCONTRATANTE das suas obrigações, incluindo as resultantes de determinações do CONTRAENTE PÚBLICO emitidas nos termos da lei ou do Contrato.
2. Para efeitos da presente cláusula, os incumprimentos do COCONTRATANTE classificam-se em leves, graves e muito graves.
3. Consideram-se infrações leves, sancionáveis com sanção contratual pecuniária entre 500 € (quinhentos euros) e 1500€ (mil e quinhentos euros):
(…)
i) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 4 e 5 que resultem de um comportamento de culpa leve por parte da COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
4. Consideram-se infrações graves, sancionáveis com multa contratual de 1500€ (mil e quinhentos euros) a 5000€ (cinco mil euros):
(…)
m) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 3 e 5 que resultem de um comportamento de negligência grosseira por parte do COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
5. Consideram-se infrações muito graves, sancionáveis com multa contratual de 5000€ (cinco mil euros) a 10000€ (dez mil euros):
(…)
n) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 3 e 4 que resultem de um comportamento doloso por parte do COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
(…).
Com relevo, sobre esta matéria o CCP prevê:
“CAPÍTULO IV
Conformação da relação contratual
Artigo 302.º (Poderes do contraente público)
Salvo quando outra coisa resultar da natureza do contrato ou da lei, o contraente público pode, nos termos do disposto no contrato e no presente Código:
(…)
d) Aplicar as sanções previstas para a inexecução do contrato;
(…).
(…)
Artigo 329.º (Aplicação das sanções contratuais)
1 – Nos termos previstos no presente Código, o contraente público pode, a título sancionatório, resolver o contrato e aplicar as sanções previstas no contrato ou na lei em caso de incumprimento pelo cocontratante.
2 – Quando as sanções a que se refere o número anterior revistam natureza pecuniária, o respetivo valor acumulado não pode exceder 20 /prct. do preço contratual, sem prejuízo do poder de resolução do contrato prevista no capítulo seguinte.
3 – Nos casos em que seja atingido o limite previsto no número anterior e o contraente público decida não proceder à resolução do contrato, por dela resultar grave dano para o interesse público, aquele limite é elevado para 30 /prct..
4 – Para efeitos dos limites previstos nos n.os 2 e 3, quando o contrato previr prorrogações expressas ou tácitas, o valor das sanções a aplicar deve ter por referência o preço do seu período de vigência inicial.
(…)”
Sobre a matéria das “sanções contratuais administrativas”, PEDRO COSTA GONÇALVES escreveu: “(…)
i) Finalidades das sanções contratuais administrativas
Como vimos, as sanções contratuais administrativas cumprem imediatamente uma função de castigo ou punitiva, de reacção a uma conduta censurável do co-contratante. Além desta função, as sanções contratuais, introduzindo um elemento desproporcional – na medida em que representam um custo que acresce ao que decorre da indemnização de prejuízos –, cumprem ainda uma função coercitiva, de constrangimento ao cumprimento (esta função de constrangimento indirecto surge com especial clareza nas sanções pecuniárias compulsórias).
ii) Princípio da legalidade das sanções contratuais
Nos termos da lei, a aplicação de sanções contratuais corresponde ao exercício de um poder público, o qual aliás se exterioriza pela forma do acto administrativo: cf. artigos 302.º, al. d), e 307.º, n.º 2, al.c).
Dada essa configuração, a previsão de sanções contratuais encontra-se sob reserva de lei. Afigura-se, contudo, suficiente, a mera autorização legal para a previsão, no contrato, de sanções contratuais, dispensando-se uma indicação legal taxativa do elenco de sanções aplicáveis. Esta foi de resto a opção do CCP, como resulta das disposições legais acima referidas. Destas decorre, contudo, que só podem ser previstas sanções para a «inexecução do contrato», quer dizer, para a inexecução das obrigações contratuais: a autorização legal já não abrange a previsão de sanções para a inexecução de obrigações impostas por lei ou por acto administrativo.
(…)” – vd. “Cumprimento e incumprimento do contrato administrativo”, in «Estudos da Contratação Pública – I», p. 601 e ss.
Feito, pois, o devido enquadramento legal da determinação / aplicação das sanções contratuais, o Tribunal julga que as normas em apreço violam não as normas do CCP supra enunciadas, mas antes o principio da legalidade e tipicidade subjacente à previsão de sanções contratuais.
Com efeito, se é pacifico que a previsão de sanções contratuais está sob reserva lei, bastando a mera autorização legal para a sua previsão no contrato, e que à entidade adjudicante é reconhecida discricionariedade, num quadro de razoabilidade e proporcionalidade, para a elaboração das peças procedimentais; a verdade é que, não é razoável nem legal, a imposição de uma sanção contratual pecuniária – que pode variar entre leve, grave ou muito grave, consoante o grau de culpa – para o incumprimento das mesmas obrigações contratuais, que podem ser principais ou acessórias, as quais, ainda que previstas no contrato, não se encontram, contudo, objectivamente tipificadas nas alíneas em apreço.
Tratam-se, pois, de incumprimentos geradores de uma sanção contratual pecuniária – que pode ser leve, grave ou muito grave – cujo enquadramento fáctico o futuro cocontratante desconhece. E, considerando, que à previsão das sanções contratuais está subjacente uma finalidade punitiva e coercitiva, não se encontrando suficientemente enunciado qual o comportamento censurado, de modo a permitir a sua determinabilidade objectiva, de forma clara e precisa, o Tribunal julga que o estatuído nos n.3 alínea i), n.4 alínea m), e n.5 alínea n) da cláusula 53º do caderno de encargos viola o princípio da legalidade.
Conclui-se, portanto, pela procedência da alegação da A. a este propósito.
[…]
*
Em suma, ante a argumentação fáctica e legal expendida, improcedem nos termos supra expostos as alegações das AA. quanto às invalidades das peças procedimentais assacadas, com excepção da ilegalidade do artigo 18º n.12 do programa de concurso, apenas no tocante ao inciso “não confere ao adjudicatário o direito a qualquer indemnização” e da cláusula 53º n.3 alínea i), n.4 alínea m), e n. 5 alínea n) do caderno de encargos, cuja ilegalidade se declara.
V. DISPOSITIVO
Pelo exposto, julgo:
(i) improcedentes as excepções de ilegitimidade activa da A. TC... e de falta de interesse em agir da A. TC..., da A. ET EG..., da A. TE... e da A. TU...;
(ii) parcialmente procedente a presente acção, e em consequência declaro ilegal o artigo 18º n.12 do programa de concurso, apenas no tocante ao inciso “não confere ao adjudicatário o direito a qualquer indemnização” e a cláusula 53º n.3 alínea i), n.4 alínea m), e n. 5 alínea n) do caderno de encargos, – cujas referências deverão, em conformidade, ser expurgadas das respectivas peças procedimentais, com as legais consequências.
- cfr. processo 1973/20.2BEPRT.
52. Em 13.9.2021 as AA. apresentaram contestação no processo 1125/21.4BEPRT pugnando pela procedência da ação. – fls. 849 e ss. do processo 1125/21.4BEPRT.
53. Por despacho de 23.9.2021 as aqui Autoras foram absolvidas da instância no processo 1125/21.4BEPRT. – fls. 918 e ss. do processo 1125/21.4BEPRT.
54. Em 27.9.2021 as AA. interpuseram recurso, cujo teor aqui se dá por reproduzido, da decisão proferida nos processos 1973/20.2BEPRT e apensos pugnando, em suma, pelo erro de julgamento quanto à improcedência dos vícios: (i) violação do disposto no s n.º s 1 e 3 do artigo 36.º do CCP ; (ii) a violação da alínea c) do artigo 4.º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e da alínea i) do n.º 1 do artigo 21.º da Lei n.º 52/2015 ; (iii) a desconsideração nas peças do concurso da existência de circunstâncias supervenientes imprevistas decorrentes da pandemia provocada pelo vírus SARS – COV – 2 (Covid – 19) ; (iv) o incumprimento do Regime das PPP ; (v) a violação da teleologia da divisão em lotes do artigo 46.º – A do CCP, a violação do n.º 4 do artigo 46.º – A do C CP e do princípio da concorrência ; (vi) a ilegalidade do artigo 21.º do Programa do Concurso por violação do CCP, do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e do regime das PPP e (vii) a violação decorrente da falta de divulgação no Caderno de Encargos da informação relativa aos trabalhadores. – cf. processo 1973/20.2BEPRT.
55. Da sentença proferida nos processos 1973/20.2BEPRT e apensos, interpuseram, ainda, recurso a .../AVC/VL..., a TE... SA/RE..., S.A. e a AMP, esta última na parte em que foi julgada procedente a ação, e declarada a ilegalidade do artigo 18º n.12 do programa de concurso, apenas no tocante ao inciso “não confere ao adjudicatário o direito a qualquer indemnização” e da cláusula 53º n.3 alínea i), n.4 alínea m), e n. 5 alínea n) do caderno de encargos, determinando que as referências fossem expurgadas das respectivas peças procedimentais, com as legais consequências. – cf. processo 1973/20.2BEPRT.
56. Em 3.12.2021 o Tribunal Central Administrativo Norte proferiu Acórdão no processo 1973/20.2BEPRT do qual se extrai,
“[…]
III.B.DE DIREITO
111.13.1- DO RECURSO INTERPOSTO PELA JUNTA METROPOLITANA DO ...
b.1. da nulidade da sentença por excesso de pronúncia e da nulidade secundária prevista no artigo 195.º, n.º1 do CPC.
[…]
Termos em que, se impõe declarar a nulidade da sentença, por excesso de pronúncia e por violação do princípio do contraditório, quanto ao segmento decisório em que nela se decide: ««(ii) parcialmente procedente a presente ação, e em consequência declaro ilegal o artigo 18.º, n.º12 do programa de concurso, apenas no tocante ao inciso “não confere ao adjudicatário o direito a qualquer indemnização”»
[…]
Passemos, assim, à apreciação do erro de julgamento que a Apelante AMP assaca à sentença recorrido no trecho em que invalidou a cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos.
A Apelante AMP impetra erro de julgamento à sentença recorrida por nela se ter declarado ilegal a cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos, e determinado que tais referências «deverão, em conformidade, ser expurgadas das respetivas peças procedimentais, com as legais consequências».
Conforme se retira da alínea R) do elenco dos factos provados, é o seguinte o teor da cláusula 53.ª do CE:
«CLÁUSULA 53.ª (Sanções contratuais pecuniárias)
1. Sem prejuízo da possibilidade de resolução sancionatória do Contrato nos termos do artigo 333.º do Código dos Contratos Públicos, o CONTRAENTE PÚBLICO pode, com observância das regras previstas nos artigos 325.º e 329.º do Código dos Contratos Públicos e no artigo 45.º do RJSPTP, aplicar sanções contratuais pecuniárias em caso de incumprimento pelo COCONTRATANTE das suas obrigações, incluindo as resultantes de determinações do CONTRAENTE PÚBLICO emitidas nos termos da lei ou do Contrato.
2. Para efeitos da presente cláusula, os incumprimentos do COCONTRATANTE classificam-se em leves, graves e muito graves.
3. Consideram-se infrações leves, sancionáveis com sanção contratual pecuniária entre 500 € (quinhentos euros) e 1500€ (mil e quinhentos euros):
a) Não manter os equipamentos afetos ao serviço em perfeitas condições de higiene e limpeza, com exclusão daqueles bens cuja responsabilidade de Manutenção não cabe ao COCONTRATANTE nos termos do Contrato;
b) Não respeitar os procedimentos de higiene e segurança no trabalho;
c) Não manter em bom estado de conservação os materiais de informação ao público;
d) Não atualizar a informação ao público;
e) Incumprimento das regras constantes do manual do motorista, referido na alínea g) do n.º 6 da Cláusula 7.ª;
f) Falta de identificação do pessoal que desempenhe funções em contacto com o público;
g) Incumprir os prazos previstos no Contrato;
h) Não respeitar as regras do uso do Material Circulante para o exercício de atividades publicitárias previstas na Cláusula 19.ª;
i) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 4 e 5 que resultem de um comportamento de culpa leve por parte da COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
4. Consideram-se infrações graves, sancionáveis com multa contratual de 1500€ (mil e quinhentos euros) a 5000€ (cinco mil euros):
a) Transporte de Utentes sem título de transporte válido, salvo quando tal se deva a circunstâncias extraordinárias não imputáveis ao Cocontratante; cada situação singular registada por Utente é considerada como uma infração sancionável autonomamente;
b) Manter, num veículo do Material Circulante em serviço, o sistema de bilhética sem contacto avariado pelo período de duas horas, sendo cada veículo que permanece nessa situação em cada período adicional de 120 (cento e vinte) minutos, ainda que incompleto, considerado como uma infração sancionável autonomamente;
c) Manter, num veículo do Material Circulante em serviço, os painéis exteriores de informação ao público avariados pelo período de duas horas, sendo cada veículo que permanece nessa situação em cada período adicional de 120 (cento e vinte) minutos, ainda que incompleto, considerado como uma infração sancionável autonomamente;
d) Conduta inadequada dos funcionários, na sua relação com os Utentes e CONTRAENTE PÚBLICO, sendo cada evento reportado com procedência como uma infração sancionável autonomamente;
e) Qualquer obstrução ao trabalho de inspeção do CONTRAENTE PÚBLICO ou de outras autoridades competentes, sendo cada dia de atraso causado aos trabalhos de inspeção considerado como uma infração sancionável autonomamente;
f) Incumprimento das regras respeitantes à comunicação das alterações da Operação e anomalias que ponham em causa o regular e bom funcionamento do serviço;
g) Não realização de qualquer Serviço que prejudique o cumprimento dos horários escolares por parte dos alunos, sendo cada ocorrência considerada como uma infração sancionável autonomamente;
h) Desvio do itinerário estabelecido, sem causa justificada, por cada serviço;
i) Incumprimento das indicações e/ou instruções do CONTRAENTE PÚBLICO emitidas nos termos da lei ou do Contrato;
j) Não parar nas paragens para tomada/largada de passageiros sempre que tal seja solicitado, sendo cada ocorrência considerada como uma infração sancionável autonomamente;
k) Utilização de veículo do Material Circulante que não cumpra as exigências respeitantes à classe de emissões previstas na CLÁUSULA 18.ª, considerandose cada dia de utilização, por veículo, como uma infração sancionável autonomamente;
l) Falta de observância do disposto quanto a livro de reclamações;
m) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 3 e 5 que resultem de um comportamento de negligência grosseira por parte do COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
5. Consideram-se infrações muito graves, sancionáveis com multa contratual de 5000€ (cinco mil euros) a 10000€ (dez mil euros):
a) Falta de obtenção prévia da autorização expressa do CONTRAENTE PÚBLICO para a prática de atos que, nos termos da lei ou do Contrato, dependa de tal autorização;
b) Prática de tarifários diferentes dos definidos pelo CONTRAENTE PÚBLICO ou pelas autoridades competentes, sendo cada prática irregular, por título de transporte, considerada como uma infração sancionável autonomamente;
c) Emissão de títulos de transporte diferentes dos aprovados pelo CONTRAENTE PÚBLICO ou pelas autoridades competentes, sendo cada prática irregular considerada como uma infração sancionável autonomamente;
d) Utilização de veículo do Material Circulante que não cumpra o disposto na legislação e regulamentação aplicáveis, considerando-se cada dia de utilização, por veículo, como uma infração sancionável autonomamente;
e) Ter ao serviço, por Linha, um veículo do Material Circulante que não cumpra a classe de emissões prevista na lei ou no Contrato em 4 (quatro) ou mais dias, durante um período de 7 (sete) dias consecutivos, sendo cada ocorrência considerada como uma infração sancionável autonomamente;
f) Não admissão no Material Circulante de qualquer Utente que reúna as condições para tal, sendo cada não admissão ilegítima, por Utente, considerada como uma infração sancionável autonomamente;
g) Interrupção da Prestação de Serviços numa Linha em todos os horários previstos durante 24 (vinte e quatro) horas, salvo casos excecionais admitidos na lei ou no Contrato, sendo cada período de 24 (vinte e quatro) horas adicional de incumprimento contínuo, ainda que incompleto, considerado como uma infração sancionável autonomamente;
h) Falsificação de qualquer informação ou documentos que o COCONTRATANTE deva facultar ao CONTRAENTE PÚBLICO ou a outras autoridades competentes;
i) Atraso no início do Período de Funcionamento Normal da Prestação de Serviços, sendo cada dia, ainda que incompleto, de mora considerado como uma infração sancionável autonomamente;
j) Fraude na execução da Prestação de Serviços;
k) Não apresentação da documentação necessária e solicitada pelo CONTRAENTE PÚBLICO para a obtenção pelo CONTRAENTE PÚBLICO de quaisquer subsídios e apoios financeiros no âmbito do objeto do Contrato;
l) Subcontratar terceiros na Prestação de Serviços sem a autorização do CONTRAENTE PÚBLICO;
m) Usar os veículos que integram o Material Circulante para o exercício de atividades fora da Prestação de Serviços sem autorização prévia do Contraente Público nos termos do n.º 8 da Cláusula 10.ª e da Cláusula 19.ª;
n) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 3 e 4 que resultem de um comportamento doloso por parte do COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
6. A determinação da medida concreta da multa, dentro dos limites suprarreferidos de cada categoria de infrações, é feita em função da gravidade da infração.
7. Sem que tal constitua um direito ou sequer uma legítima expetativa do COCONTRATANTE, o CONTRAENTE PÚBLICO pode atenuar ou revogar, total ou parcialmente, qualquer sanção pecuniária aplicada, quando se vier a verificar que a situação de incumprimento foi totalmente recuperada dentro do prazo definido na notificação referida no n.º 1 da cláusula anterior e que o incumprimento não causou qualquer impacto significativo na realização das atividades incluídas no Contrato.
8. No caso de infrações leves, o CONTRAENTE PÚBLICO pode, consoante a gravidade da infração, substituir a multa contratual pela sanção de simples advertência.
9. Independentemente do tipo de infração praticada, caso o COCONTRATANTE não proceda ao pagamento voluntário das multas contratuais aplicadas no prazo de 10 dias a contar da sua notificação, pode o CONTRAENTE PÚBLICO determinar a perda da caução no valor correspondente à multa aplicável, sendo o COCONTRATANTE obrigado a repor a mesma nos termos da Cláusula 46.ª.
10. A aplicação de sanções contratuais pecuniárias nos termos dos números anteriores não impede, com referência ao mesmo facto, a aplicação cumulativa das deduções por avaliação de desempenho previstas na Cláusula 40.ª e no Anexo IX ao Caderno de Encargos.
11. O pagamento das sanções pecuniárias contratuais não isenta o COCONTRATANTE do cumprimento integral do Contrato, nem de responsabilidade criminal, contraordenacional e civil a que eventualmente haja lugar, nem exclui o exercício do poder de fiscalização, de controlo e sancionatório de outras entidades que decorra da lei.
12. À aplicação das sanções previstas na presente cláusula são aplicáveis os limites máximos do respetivo valor acumulado previstos nos n.ºs 2 a 4 do artigo 329.º do Código dos Contratos Públicos.
(…)
A 1.ª Instância considerou inválidas as referenciadas disposições do CE, por entender que as mesmas violam «o princípio da legalidade e tipicidade subjacente à previsão de sanções contratuais», afirmando que «não é razoável nem legal, a imposição de uma sanção contratual pecuniária- que pode variar entre leve, grave ou muito grave, consoante o grau de culpa- para o incumprimento das mesmas obrigações contratuais, que podem ser principais ou acessórias, as quais, ainda que previstas no contrato, não se encontram, contudo, objetivamente tipicadas nas alíneas em apreço”, e sublinhando que no caso estão em causa «incumprimentos geradores de uma sanção contratual pecuniária- que pode ser leve, grave ou muito grave- cujo enquadramento fático o futuro cocontratante desconhece.E, considerando, que à previsão das sanções contratuais está subjacente uma finalidade punitiva e coercitiva, não se encontrando suficientemente enunciado qual o comportamento censurado, de modo a permitir a sua determinabilidade objetiva, de forma clara e precisa, o Tribunal julga que o estatuído nos n.ºs 3, alínea i), n.º 4, alínea m) e n.º 5, alínea n) da cláusula 53º do caderno de encargos viola o princípio da legalidade».
A Apelante discorda do julgamento realizado pela 1.ª Instância, que concluiu pela invalidade das referidas disposições da cláusula 53.ª, n.º3, al.i), n.º 4, al.m), e n.º 5, al.n), do CE, contrapondo que ao invés do decidido, as referidas disposições dessa cláusula do CE prevêem a aplicação de sanções para outros incumprimentos contratuais cujos comportamentos não se encontram expressamente tipificados, procedendo a uma remissão intra-sistemática para os deveres obrigacionais contidos no Caderno de Encargos, nos termos pemitidos pelo princípio da legalidade.
Afirma que o artigo 29.º, n.º 1, da Constituição não se opõe a que as normas que preveem disposições administrativas sancionatórias não obedeçam ao grau de tipicidade que prescreve para as normas penais e os artigos 266.º, n.º 2, da Constituição e 329.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos não impõem essa densificação.
Refere que no campo do direito administrativo sancionatório é suficiente que a infração seja tipificada através da referência à violação de deveres, como sucede no caso das obrigações contratuais, admitindo-se, inclusivamente, a técnica da cláusula geral com enumeração exemplificativa, bastando-se a afirmação como ilícito o comportamento que atente contra tais deveres, e isso mesmo que a conduta adotada não esteja descrita na previsão de qualquer preceito.
Exige-se apenas condições mínimas de determinabilidade, que permitam considerar que os destinatários da disposição sancionatória têm conhecimento de que a respetiva violação é passível de gerar a aplicação de uma sanção – o que é alcançado através da previsão dos deveres contratuais a que se encontrará sujeito o cocontratante.
Nota que no caso das disposições contidas na cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos, deve ter-se em consideração que os destinatários não são todos e quaisquer administrados, considerados de modo indiferenciado, mas apenas os operadores económicos experientes que, após analisar detidamente o Caderno de Encargos, resolveram apresentar proposta para prestar serviço durante 7 anos num contrato cujo valor ascende a muitos milhões de euros em cada lote posto a concurso.
São, antes, sujeitos qualificados, operadores económicos experientes, apenas se podendo presumir que têm total e completa consciência das obrigações contratuais previstas no Caderno de Encargos, pelo que têm igualmente conhecimento de quais os comportamentos que poderão gerar a aplicação de sanção – apenas os incumprimentos de obrigações contratuais que não estejam de outro modo tipificadas.
Conclui que estão plenamente satisfeitas as obrigações que o princípio da legalidade impõe à determinação de sanções administrativas contratuais, não se incluindo no princípio da legalidade previsto no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição, o dever de tipificar comportamentos ilícitos nos termos exigidos pelo artigo 29.º, n.º 1, da Constituição, o mesmo sucedendo com o disposto nos artigos 302.º, alínea d), e 329.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos.
E, sendo assim, o Tribunal a quo, ao considerar que não se encontra suficientemente enunciado qual o comportamento censurado, de modo a permitir a sua determinabilidade objetiva, exigindo que essa determinação fosse feita de forma clara e precisa para que pudesse respeitar o princípio da legalidade e da tipicidade, incorreu em erro de julgamento, com violação do disposto nos artigos 266.º, n.º 2, da Constituição, e 302.º, alínea d), e 329.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos.
Adiantamos que neste conspeto falha razão à Apelante AMP. O facto de não vigorar noutros domininios sancionatórios, como é o caso do direito disciplinar, que a Apelante bem demonstrou, com uma proeficiente exposição da doutrina e da jurisprudência, o mesmo grau e a intensidade que o princípio da tipicidade reveste no Direito Penal, por força do disposto no artigo 29.º, n.º1 da CRP, tal não significa que em matéria de “sanções contratuais administrativas” a tipicidade não exista.
Salta à vista, em bom rigor, que aquelas disposições insertas na cláusula 53.ª do CE conferem à Entidade Adjudicante uma ampla liberdade para decidir a futura tipificação dos comportamentos que podem ser adstritos à aplicação de sanções contratuais quando violados pelo Cocontratante, sem que, à partida, saibam quais das condutas adotadas serão relvantes para esse efeito, o que é bem demonstrativo da total atipicidade dos incumprimentos contratuais passiveis de serem sancionados pecuniariamente com base no Contrato, assim se franqueando a porta à AMP para à aplicação de sanções pecuniárias por ações ou omissões que decida considerar como incumprimento contratual relevante para tal fim.
Para evitar esta indefinição e imprevisibilidade, é que certamente o legislador previu a necessidade de as sanções contratuais serem tipificadas nas peças concursais que integram já o próprio contrato a celebrar ou na lei (vide artigo 329.º/1 do CCP). De resto, compreende-se que a aplicação de sanções tenha que estar prevista nas peças do concurso e na lei, e que os comportamentos (incumpridores) relevantes para esse efeito, ou seja, que possam originar a aplicação de multas contratuais, tenham de estar discriminados, pois só assim os seus destinatários saberão de antemão quais as condutas que uma vez adotadas podem determinar a sujeição a multas contratuais durante a execução do contrato, no caso de vir a ser-lhe adjudicado o serviço e, por conseguinte, decidirem conscientemente como agir.
E não se diga, como pretende a Apelante, que nas referidas disposições da cláusula 53.ª do CE as situações que se pretendem abranger se encontram «perfeitamente determinadas» porque «os tipos de infração em causa estão preenchidos por cada uma das obrigações previstas claramente no Caderno de Encargos», ou seja, na afirmação de que existe uma «remissão intrasistemática da previsão do comportamento sancionado para as demais disposições do Caderno de Encargos». É que, como bem aduzem as apeladas, qualquer norma remissiva que se tente retirar daquelas disposições da cláusula 53.ª do CE falha, desde logo, nas exigidas “condições mínimas de determinabilidade dos comportamentos proibidos” e, sobretudo não permite a “determinabilidade objetiva, de forma clara e precisa” dos possíveis incumprimentos contratuais sancionáveis pelo Contraente Público.
Ponderando nas referidas disposições da cláusula 53.ª do CE é patente que nelas não se fornece qualquer indicação em termos de conteúdo que permita determinar qual ou quais os comportamentos que darão azo à aplicação de multas contratuais no universo das restantes disposições do CE.
E, o facto de, como alega a Apelante AMP, os destinatários do artigo 53.ª do CE serem «sujeitos qualificados, operadores económicos experientes» e, como tal « se pode presumir que têm total e completa consciência das obrigações contratuais previstas no Caderno de Encargos, pelo que têm igualmente conhecimento de quais os comportamentos que poderão gerar a aplicação de sanção” não é aceitável como argumento em abono da sua tese, uma vez que, por muito bem que conheçam as suas obrigações só no campo da futurologia poderiam determinar o universo das condutas, de entre as possíveis, que estariam abrangidas pela aplicação de multas contratuais, para além de, como a própria Apelante reconhece, estarem em causa um universo de obrigações contratuais cuja descrição se afigura “virtualmente impossível”.
Acrescente-se que mesmo no campo das denominadas “normas sancionatórias administrativas em branco (não penais)” exige-se que o Legislador fixe “de modo esclarecedor, inequívoco e objetivamente cognoscível- quer um comando proibitivo, quer o correspondente comando sancionatório da conduta proibida” ( cfr. Miguel Prata Roque, Direito sancionatório enquanto bissetriz (imperfeita) entre o direito penal e o direito administrativo – a pretexto de alguma jurisprudência constitucional, in Revista de Concorrência e Regulação, Ano IV, n.º 14/15, 2013, pág.146). Logo, a “previsão de uma norma sancionatória em branco” exige que o conteúdo precetivo mínimo da norma seja fixado pela “norma de remissão” e que da sua combinação com a “norma complementar” resulte uma cognoscibilidade razoável do respetivo conteúdo- “condição de determinabilidade” (cfr. ob. cit. Pág. 144 a 149 e Ac. do TConstitucional n.º 635/2011).
Por conseguinte, em face do que se expendeu, cremos ser forçoso concluir pela improcedência do invocado fundamento de recurso, impondo-se a confirmação da sentença recorrida neste segmento.
[…]
b.5. as peças concursais são manifestamente ilegais porquanto desconsideram a existência de circunstâncias supervenientes imprevistas decorrentes da pandemia provocada pelo vírus sars-cov-2 (covid-19)- questão igualmente colocada pelas Apelantes “G.”-B.12 e “B.”-b.19.
As Apelantes impetram à sentença recorrida erro de julgamento por nela não se ter tido em consideração o impacto que a emergência da pandemia provocada pela disseminação do Sars-Cov-II terá na procura num setor de atividade como é o transporte público.
No essencial, afirmam que o Tribunal a quo considerou como assente o conteúdo do anexo VII: “V). O teor do “anexo VII” ao programa de concurso, com a redacção de Julho de 2020, intitulado “Procura”, resultando desse documento, que os elementos em que se alicerça todo o planeamento e o dimensionamento das cinco operações de serviço público aqui em causa nos sete anos de duração e que, portanto, estão na base do Caderno de Encargos, têm por referência os dados de procura e de oferta referente ao último quadrimestre de 2019.
Afirmam ser manifesto que é no modelo constante dos anexos I e VII que assenta e se alicerça o Caderno de Encargos e, consequentemente, todo o regime contratual definido para o período de duração de sete anos, muito em especial, o regime remuneratório. E referem que nos últimos anos e em especial no último quadrimestre de 2019, registaram-se valores estáveis e regulares de diminuição de custos operacionais e de aumento da procura do serviço de transporte rodoviário de passageiros que se vinha verificando por força do aumento dos preços dos combustíveis rodoviários e de aquisição de automóvel por parte dos particulares, da aposta pública de diminuição de faixas de trânsito e do estacionamento disponível nos centros urbanos, da política de mobilidade sustentável e, bem assim, do crescimento exponencial do turismo nos centros urbanos.
Porém, afirmam que a Pandemia provocada pelo vírus SARS-COV-2 veio alterar, significativa e profundamente, o planeamento e o dimensionamento da operação de serviço público aqui em causa e, muito em especial, o regime remuneratório definido que foi flagrantemente afetado.
Consideram que essa circunstância foi categoricamente ignorada e totalmente desconsiderada pela Recorrida e pelo Tribunal a quo, não tendo a AMP introduzido qualquer alteração nas peças do concurso no sentido de acautelar ou mitigar contratualmente este evento disruptor.
Daí que, afirmam, tivessem alertado o Tribunal a quo, requerendo que este declarasse a ilegalidade das peças procedimentais (na versão de julho 2020), por desconsideração das circunstâncias supervenientes e pugnado por uma decisão de não adjudicação à luz do disposto no artigo 79.º, n.º 1, alínea c) do CCP.
Vejamos.
Sobre esta questão o Tribunal a quo considerou ser “notório que a pandemia provocada pelo vírus SARS-COV-2 impactou, profundamente, na vida das pessoas e nos seus hábitos, designadamente, no tocante à utilização dos meios de transporte colectivos”, concluindo, porém, que no caso resultava “da factualidade assente [cfr. ponto AB) do probatório] que estas circunstâncias e o seu impacto na execução do programa a concurso foram devidamente consideradas e ponderadas, designadamente quanto à manutenção das peças procedimentais e, também, relativamente à subsistência do próprio procedimento concursal” e, fundando-se na discricionariedade que assiste às entidades adjudicantes na elaboração das peças concursais, o Tribunal a quo acabou por julgar “in casu devidamente fundadas, não padecendo de qualquer erro grosseiro que sustente a sua sindicância jurisdicional, as razões constantes do memorando de 20.06.2020, e bastantes para que se considere ter existido uma adequada ponderação da alegada “alteração superveniente das circunstâncias”, concluindo-se pela ausência de impacto relevante na tramitação do presente procedimento contratual”, pelo que, conclui o Tribunal a quo, “por carecer de suporte fundamentação fáctico-legal, improcede a alegação vertida a este propósito”.
As Apelantes consideram que a factualidade assente relativa ao conteúdo dos documentos conformadores do procedimento e todos os factos carreados para os autos, assim como todos os factos notórios, de todos conhecidos, que não carecem de alegação ou de prova, impunham decisão diversa ao Tribunal a quo, e nem a discricionariedade administrativa a que alude o mesmo é suficiente para legitimar a apreciação levada a cabo.
O que dizer?
Consta do ponto AB) do elenco dos factos provados que “com data de 20.06.2020, os serviços da R. AMP elaboraram documento denominando ¯ MEMORANDO | IMPACTO DA PANDEMIA NO CONCURSO DE TRANSPORTE PÚBLICO DA AMP”. Desse documento consta, além do mais, o seguinte: “O impacto da pandemia no TP decorreu da quebra quase total na procura durante o período de confinamento. Apesar de se verificar a subida gradual do número de passageiros com o desconfinamento, esta ainda está longe dos valores normais. (…) »
Nesse documento, percebe-se que é posta uma especial enfase na necessidade de, na aferição do impacto da pandemia no nível de procura no concurso, se ter em «consideração não os valores atuais, mas sim aqueles que são esperados durante a vigência dos futuros contratos (…) que irão vigorar por um prazo de 7 anos, pelo que o horizonte temporal a ter em consideração na análise do nível da procura corresponderá a um período em que estará muito mais próximo do normal.
No entanto, há alguns fatores que indiciam que o nível de procura existente antes da pandemia poderá ser difícil de atingir, dos quais destacamos: um maior nível de desemprego, maior utilização do teletrabalho mesmo em situação normal, receio de utilização do TP e preferência pelo transporte individual (TI).Salientamos que esta tendência não é, apesar de tudo, irreversível, uma vez que existe um conjunto de ferramentas ao dispor dos municípios ( e do Estado) para a promoção do TP em detrimento do TI, como por exemplo a politica de estacionamento nas cidades, acriação de faixas Bus, ou o aprofundamento da politica de redução tarifária.
(…).
4. Risco de insuficiência tarifária.
Considerando que não existe o risco do concurso ficar deserto principalmente pelo facto do risco tarifário ficar do lado da AMP, temos de considerar o reverso da medalha, ou seja a possibilidade da receita tarifária ser insuficiente para que a AMP remunere os operadores.
(…)
Nota: o mais razoável é, em caso de ser necessário o financiamento do défice tarifário pelos municípios, ser fixado o montante que estão disponíveis para financiar a rede de TP e complementar com a combinação dos restantes instrumentos para que o défice não execeda esse montante»
A primeira observação a respeito da pandemia provocada pelo SARS-CoC-2 que nos apraz referir é a de que não há ainda uma estabilização sobre a perspetiva da evolução da crise pandémica.
De seguro, sabe-se que em ordem a conter os efeitos negativos provocados pela disseminação do SARS-CoV-2, que as autoridades nacionais ( Governo, Assembleia da República e Presidente da República) se viram constrangidas a adotar/aprovar um conjunto de medidas graves, como sejam:
(a) Declarações de Estado de Emergência cf. (i) Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de março, (ii) Decreto n.º 17-A/2020, de 2 de abril, (iii) Decreto n.º 20-A/2020, de 17 de abril; Declarações de Situação de Calamidade cf. (iv) Resolução do Conselho de Ministros n.º 33-A/2020, de 30 de abril, (v) Resolução do Conselho de Ministros n.º 38/2020, de 15 de maio, (vi) Resolução do Conselho de Ministros n.º 40-A/2020, de 29 de maio, (vii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 43-B/2020, de 9 de junho, (viii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 51-A/2020, de 25 de junho, (ix) Resolução do Conselho de Ministros n.º 53-A/2020, de 14 de julho;
(b) Declarações de Situação de Alerta em todo o território nacional continental (com exceção da Área Metropolitana de Lisboa, onde foi declarada a situação de contingência) cf. (x) Resolução do Conselho de Ministros n.º 55-A/2020, de 30 de julho, (xi) Resolução do Conselho de Ministros n.º 63-A/2020, de 13 de agosto, (xii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 68-A/2020, de 28 de agosto, (xiii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 70-A/2020, de 10 de setembro, (xiv) Resolução do Conselho de Ministros n.º 81/2020, de 24 de setembro, (xv) Resolução do Conselho de Ministros n.º 88-A/2020, de 14 de outubro;
(c)Declaração da Situação de Calamidade em todo o território nacional continental cf. (vxi) Resolução do Conselho de Ministros n.º 92-A/2020, de 31 de outubro;
(d)Declarações do Estado de Emergência cf. (xvii) Decreto do Presidente da República n.º 51-U/2020 de 6 de novembro, (xviii) Decreto do Presidente da República n.º 59-A/2020, de 20 de novembro, (xix) Decreto do Presidente da República n.º 61-A/2020, de 4 de dezembro, (xx) Decreto do Presidente da República n.º 66-A/2020, de 17 de dezembro, (xxi) Decreto do Presidente da República n.º 6-A/2021, de 6 de janeiro, (xxii) Decreto do Presidente da República n.º 6-B/2021, de 13 de janeiro, (xxiii) Decreto do Presidente da República n.º 9-A/2021, de 28 de janeiro, (xxiv) Decreto do Presidente da República n.º 11-A/2021, de 11 de fevereiro, (xxv) Decreto do Presidente da República n.º 21-A/2021, de 25 de fevereiro, (xxvi) Decreto do Presidente da República n.º 25-A/2021, de 11 de março, (xxvii) Decreto do Presidente da República n.º 31-A/2021, de 25 de março, (xxviii) Decreto do Presidente da República n.º 41-A/2021, de 14 de abril;
(e)Declarações de Situação de Calamidade cf. (xxix) Resolução do Conselho de Ministros n.º 45-C/2021, de 29 de abril, (xxx) Resolução do Conselho de Ministros n.º 46-C/2021, de 6 de maio, (xxxi) Resolução do Conselho de Ministros n.º 59-B/2021, de 13 de maio, (xxxii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 62-A/2021, de 20 de maio, (xxxiii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 64-A/2021, de 27 de maio, (xxxiv) Resolução do Conselho de Ministros n.º 70-A/2021, de 2 junho, (xxxv) Resolução do Conselho de Ministros n.º 74-A/2021, de 9 de junho, (xxxvi) Resolução do Conselho de Ministros n.º 76-A/2021, de 18 de junho, (xxxvii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 77-A/2021, de 24 de junho, (xxxviii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 86-A/2021, de 1 de julho, (xxxix) Resolução do Conselho de Ministros n.º 91-A/2021, de 8 de julho, (xl) Resolução do Conselho de Ministros n.º 92-A/2021, de 15 de julho, (xli) Resolução do Conselho de Ministros n.º 96-A/2021, de 22 de julho, (xlii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 101-A/2021, de 29 de julho;
(f)Declaração da situação de Contingência cf. (xliii) Resolução do Conselho de Ministros n.º 114-A/2021, de 20 de agosto.
Sabe-se também, que a pandemia provocada pelo SARS-CoV-2 teve graves consequências em praticamente todos os setores de atividade, com repercussões tremendas na vida das pessoas, das empresas e das instituições. Foram impostos confinamentos à população, fortes restrições à mobilidade, tudo com o propósito de reduzir a possibilidade de contágio e disseminação do vírus SARS-Cov-2.
Daí que, naturalmente, que se tenha de dar como certo que a pandemia também impactou profundamente o transporte público rodoviário de passageiros, designadamente, uma vez que provocou uma redução da procura, a alteração dos padrões de mobilidade, uma notória quebra do turismo, tudo factos, que de resto, a comunicação social foi cuidando de retratar com frequência em vários dos seus blocos noticiosos e de todos conhecidos.
Dizem as Apelantes que o Tribunal a quo , caso tivesse considerado na sentença que proferiu e ora em crise, que em consequência da pandemia houve uma redução drástica do número de passageiros transportados, registando-se uma alteração profunda dos padrões de mobilidade associados a um conjunto de fatores tão distintos como o aumento do desemprego, a acentuada quebra no turismo, o receio natural na utilização de transportes públicos, dinamização de meios alternativos de transporte individual (como trotinete, bicicletas, táxis ou tvde), a inexistência da totalidade de aulas presenciais (sobretudo nos planos universitários e técnico), o cancelamento de festivais, de eventos culturais e musicais, encerramento de serviços públicos e de locais de atendimento ao público e, inclusivamente, a opção pelo teletrabalho pela quase totalidade das entidades empregadoras, com profundo impacto no perfil da mobilidade antes da Pandemia, teria dado como verificada a ocorrência do fundamento de não adjudicação previsto no art.º 79.º, n.º1, al.d) do CCP.
Discordamos deste entendimento. Na verdade, afigura-se-nos seguro concluir que Tribunal a quo teve em consideração as mencionadas consequências da pandemia, tanto assim que expressamente afirma na sentença recorrida quanto a esta matéria que a pandemia teve efeitos impactantes, designadamente, no setor do transporte público de passageiros. Ademais, essa realidade foi objeto do memorando a que supra aludimos, que o Tribunal a quo deu como provado e cujo teor ponderou. Logo, não temos nenhuma dúvida quanto ao conhecimento, pelo Tribunal a quo, dos factos notórios que as Apelantes reafimam nesta sede recursiva a respeito das consequências trazidas pela pandemia.
O que acontece é que o Tribunal a quo não considerou que por via da emergência da pandemia, a avaliação efetuada sobre a sua repercussão na estabilidade dos pressupostos em que assenta este concurso e as conclusões retiradas nesse memorando de 20.06.2020 padecessem de erro ostensivo e, como tal, concluiu que o facto da AMP não ter optado pela não adjudicação nos termos previstos na al. d) do n.º1 do artigo 79.º do CCP com base nos pressupostos de avaliação contidos no referenciado memorando, não a fez incorrer numa atuação ilegal, porquanto não se lhe impunha que tivesse decidido pela não adjudicação nos termos da al.d), n.º1 do art.º 79.º do CCP.
Percorrido o rol de fundamentos que, na esteira do preceituado nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 79.º do CCP, podem servir de base a uma putativa decisão de não adjudicação, torna-se possível vislumbrar que o surgimento da pandemia provocada pelo novo vírus SARS-CoV-2 é idóneo, por princípio, a constituir uma circunstância superveniente com impacto nos pressupostos que serviram de base à decisão de contratar proferida antes da sua emergência, e, nessa medida, perfeitamente suscetível, em tese, de fundamentar uma decisão de não adjudicação e consequente extinção do procedimento, à luz do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 79.º do CCP.
Porém, pese embora a pandemia provocada pelo SARS-CoV-2 preencha, em abstrato, o conceito de circunstância superveniente com suscetibilidade de ter um forte impacto nos pressupostos da decisão de contratar, que pode permitir a prática de uma decisão de não adjudicação com consequente extinção do procedimento, importa saber se, no caso concreto, se pode dar como certo que as consequências decorrentes da mesma teve esse forte um impacto nos pressupostos da decisão de contratar de tal modo que impunha que a AMP tivesse proferido uma decisão de não adjudicação. Caso se conclua pela positiva, importa ainda saber se a decisão de não adjudicação tem uma natureza vinculada, isto é, se verificada a existência de uma causa de não adjudicação, a entidade adjudicante tem a obrigação jurídico-legal de praticar uma decisão de não adjudicação e, por consequência, extinguir o procedimento e revogar a decisão de contratar, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 80.º do CCP.
Conforme referem Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, in “CONCURSOS E OUTROS PROCEDIMENTOS DE CONTRATAÇÃO PÚBICA”, Almedida, pág.1042, a questão «não deve, porém, colocar-se tanto entre proibição de adjudicar e a mera faculdade de não adjudicação, mas na distinção entre pressupostos vinculados e pressupostos discricionários da decisão de não adjudicação- discricionários ou que, ao menos, em maior ou menor medida, dependem de juízos típicos da função administrativa».
A decisão de contratar, é o ato pelo qual uma entidade adjudicante decide recorrer ao mercado, «a um negócio com o mercado (“contracting out”), em vista da satisfação de uma determinada necessidade sua, sendo que nela se conterá uma especificação sumária das características fundamentais desse negócio» ( ob. cit. pág.1048).
Logo, são pressupostos da decisão de contratar os seguintes: «o de que há uma necessidade ( materializada na aquisição de uma certa obra, serviço ou bem), de que ela deve ser satisfeita de determinado modo ( através de determinado tipo de contrato), de que com isso não se prejudicam quaisquer interesses públicos ponderosos, de que a entidade adjudicante não dispõe dos meios adequados ou necessários à sua satisfação (por isso optou por recorrer ao mercado) e de que dispõe das quantias necessárias para pagar ao co-contratante ( se se tratar de um contrato que implique despesa)». ( ob.cit., pág.1048).
Deste modo, caso se conclua que a emergência da pandemia provocada pelo SARS-CoV-2 que sobreveio, fez «esvanescer os concretos pressupostos em que assentou tal decisão, a entidade adjudicante deve optar pela não adjudicação».
É neste quadro de referência, ou seja, tomando em consideração o “Memorando-Impacto da Pandemia no Concurso de Transporte Público da AMT” ( vide alínea AB do elenco dos factos provados), cujas conclusões acima tivemos o cuidado de transcrever em parte, que somos levados a concluir que nas circunstâncias concretas da situação em análise, designadamente, tendo em conta estar-se perante um contrato cujo início de execução se perspetivava para nunca antes de novembro de 2021 e cuja duração era de 7 anos, que a emergência da pandemia provocada pelo SARS-CoV-2, no caso, não impunha de forma inquivoca que fosse proferida uma decisão de não adjudicação sob pena de ilegalidade.
Tendo em conta que não é possível traçar um cenário seguro sobre a evolução da pandemia, designadamente, no sentido mais catastrofista de que a mesma não será controlada, e bem assim, tendo em consideração que seja qual for a evolução que esta doença venha a conhecer, a vida das pessoas e das empresas não se compadece com medidas como as que foram adotadas durante muito tempo, pelo que, forçosamente, a atividade económica terá de ser retomada, o cenário mais aceitável para a escolha dos prestadores do serviço público de passageiros em causa com este procedimento será o cenário conhecido antes da pandemia. É que, estando-se perante um concurso que visa a celebração de um contrato por um período de 7 anos, cujo início de execução apenas se previa, na melhor das hipóteses, para o mês de novembro de 2021, e por conseguinte, não sendo previsível à data, nem presentemente, afirmar que no início do Período de Funcionamento Normal do contrato e durante 7 anos da sua vigência iriam, ou irão permanecer, e com impactos significativos, no setor do transporte público, os fenómenos então desencadeados pela pandemia, não se verificam, a nosso, os pressupostos que justificariam uma decisão de não adjudicação do contrato.
Note-se que, no presente momento, embora se assista a um aumento relevante do número de casos de pessoas infetadas com o COVID 19, e até com uma nova variante, é também irrefutável que a vacinação contra esse vírus revelou ser instrumento poderoso no controlo da doença, impedindo designadamente as manifestações mais graves dessa doença, o que permitiu já uma retoma da economia. Ademais, é inequívoco o esforço gigantesco que as Nações se encontram a desenvolver para que todas as pessoas se vacinem, e para as que já se encontram vacinadas tomem a dose de reforço, numa férrea determinação em controlar a pandemia e em criar as condições necessárias para que a atividade económica e a vida das pessoas retome a normalidade, sendo quanto a nós de afastar cenários catastrofistas, dada os resultados muito positivos já obtidos no controlo desta doença.
No caso, também não é despiciendo ter presente, como bem observa a AMP, que à data da apresentação das propostas já a situação de pandemia existia, pelo que as propostas apresentadas tiveram de ser conformadas por essa realidade, pelo que, por este ânigulo, não se poderá falar na ocorrência de uma alteração anormal e imprevisível das circunstâncias para os concorrentes. De resto, convém não esquecer que o risco tarrifario corre por conta da AMP!
Em conclusão, não é seguro traçar-se um cenário de redução drástica permanente da procura ao nível do transporte público, como decorrência da pandemia provocada pelo SARS-CoV-2, aquando da execução do contrato em causa, que ainda nem sequer se iniciou, de modo que possa concluir-se que a única decisão que devia ser tomada pela AMP, fosse a de não adjudicação.
Assim, anuímos que no caso em análise, não estavam reunidos pressupostos inequívocos que autorizassem o Tribunal a quo a concluir pela imperatividade de uma decisão de não adjudicação do contrato em causa.
Por isso, não resta senão julgar como improcedentes os invocados fundamentos de recurso.
[…]
b.9. da invalidade da cláusula 26.º do caderno de encargos relativa aos trabalhadores (questão também colocada pela Apelante “G.”- b.17)
As Apelantes assacam à sentença recorrida erro de julgamento decorrente de o Tribunal a quo não ter reconhecido e julgado a ilegalidade do n.º 2 da cláusula 26.ª do CE e não ter exigido da apelada AMP que o CE fosse claro e isento de dúvidas e, bem assim, por ter considerado que nos n.ºs 3 a 9 da referida cláusula, a AMP não impunha nenhuma obrigação de sucessão para daí concluir que, por esse facto, não estava adstrita à obrigação de fornecimento de informação relativa aos trabalhadores.
Na ótica das Apelantes o Tribunal a quo devia ter declarado a ilegalidade da cláusula 26.ª do CE, por entenderem que a redação da mesma viola, por um lado, (i) os princípios da transparência, igualdade e concorrência (previstos no artigo 1.º-A do CCP) e, por outro (ii) a obrigação de disponibilização de informações relativas aos trabalhadores que seriam objeto de transmissão (cf. n.º 5 do artigo 4.º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007).
Bem vistas as coisas, as Apelantes identificam na Cláusula 26.ª do CE a imposição de uma obrigação de contratação dos trabalhadores que atualmente prestam serviços aos operadores que se encontram em atividade, v.g., através da sucessão da posição contratual na posição de empregadores, incorporando na sua esfera os trabalhadores com todos os direitos que lhes assistem.
Quanto a esta matéria, a 1.ª Instância entendeu, primeiro, que não existe no concurso a imposição pela AMP aos concorrentes da obrigação de sucessão na posição contratual de empregador, pelo que, por essa razão, a AMP não está adstrita à obrigação prevista no n.º 5 do artigo 4.º do Regulamento (CE) N.º 1370/2007 de disponibilização de informações relativas aos trabalhadores. E, depois que (ii) “a remissão para os institutos jurídicos e respectivos regimes, constante da cláusula 26º n.º2 torna acessível e evidente a qualquer interessada em participar no presente procedimento concursal as obrigações que sobre si impendem, se se verificarem os critérios de transmissão de empresa e estabelecimento”, pelo que inexiste por isso qualquer violação dos princípios da transparência, igualdade e concorrência (previstos no artigo 1.º-A do CCP). E quanto ao disposto nos n.ºs 3 a 9 da Cláusula 26.ª do CE concluiu que aí se trata tão só de estabelecer uma obrigação de preferência que “não obriga os futuros adjudicatários/empregadores a assumir qualquer compromisso relativo à manutenção das condições/direitos de trabalho que os trabalhadores detinham junto dos antigos operadores económicos; e sendo assim, não a constitui, obviamente na obrigação de entregar os elementos a que alude o n.º5 do artigo 4.º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, por serem inócuos à nova relação de emprego a constituir”.
É do assim decidido que as Apelantes discordam.
Vejamos.
A Cláusula 26.ª do CE, sob a epígrafe “Estrutura de recursos humanos” prevê que:
« 1. O COCONTRATANTE obriga-se a estabelecer e a manter uma estrutura de recursos humanos que permita dar integral cumprimento às obrigações decorrentes do Contrato, devendo dispor, durante todo o Período de Funcionamento Normal, de um número suficiente de pessoal dotado de experiência e formação adequadas e qualificação ou licenciamento necessário (quando aplicável) para desenvolver, de forma contínua ou pontual, as atividades incluídas na Prestação de Serviços.
2. O COCONTRATANTE obriga-se a respeitar integralmente a obrigação de suceder na posição contratual de empregador nas relações laborais existentes com trabalhadores que prestam o seu trabalho aos operadores que à data da celebração do Contrato prestam o serviço público correspondente ao objeto do Contrato, no caso de essa obrigação ser imposta pelos instrumentos de contratação coletiva aplicáveis, pelo regime jurídico aplicável em caso de transmissão de unidade económica, previsto na Diretiva n.º 2011/23/CE, do Conselho, de 12 de Março de 2001, e pelos artigos 285.º e seguintes do Código do Trabalho.
3. Fora do caso previsto no número anterior, o COCONTRATANTE, caso tenha necessidade de contratar recursos humanos para assegurar o cumprimento das obrigações emergentes do Contrato durante o Período de Transição e durante o primeiro Ano Contratual, obriga-se, nos termos dos n.ºs 4 a 9, seguintes, a contratar os trabalhadores que, à data da celebração do Contrato, exerçam funções correspondentes àquelas que o COCONTRATANTE pretenda contratar ao serviço dos operadores que, nessa data, prestem o serviço público correspondente ao objeto do Contrato (“Trabalhadores Antigos”) e manifestem interesse nessa contratação.
4. Sempre que, durante o Período de Transição e durante o primeiro Ano Contratual, tenha necessidade de contratar recursos humanos, o COCONTRATANTE comunica ao público, através da sua página de internet e de anúncios em, pelo menos, um jornal de âmbito regional ou nacional, a sua intenção de contratação, acompanhada das seguintes informações mínimas:
a) Número de vagas;
b) Funções e categoria profissional inerentes a cada um dos postos em recrutamento;
c) Local(ais) para a prestação do trabalho e o âmbito territorial do lote em causa;
d) Indicação de que beneficiam das regras preferenciais de recrutamento constantes do disposto no n.º 6 os Trabalhadores Antigos que:
i. Na data correspondente à da celebração do Contrato e que deve ser expressamente indicada, exerciam funções correspondentes às indicadas na alínea b); e
ii. Que juntem os elementos probatórios relevantes para verificação do preenchimento dos requisitos referidos na subalínea anterior;
e) Local onde esteja disponível, a título gratuito, cópia do correspondente modelo de contrato de trabalho, no qual se preveja as condições contratuais mínimas que o COCONTRATANTE está disposto a assumir na qualidade de empregador, em integral conformidade com o regime jurídico-laboral, incluindo o regime convencional coletivo aplicável, sem prejuízo de eventual negociação, na medida do legalmente admissível, de condições contratuais mais favoráveis com cada um dos trabalhadores;
f) Endereço eletrónico e prazo, o qual não pode ser inferior a 7 (sete) dias úteis a contar da data da comunicação da intenção de contratação, para manifestação do interesse na posição indicada no anúncio.
5. O COCONTRATANTE obriga-se a enviar ao CONTRAENTE PÚBLICO, no dia seguinte à respetiva publicitação, cópia do anúncio e cópia do modelo de contrato de trabalho a que se refere o número anterior e indicação dos meios de publicitação usados.
6. Se, em relação a uma mesma vaga, concorrerem um Trabalhador Antigo e candidato que não o seja, o COCONTRATANTE obriga-se a contratar o Trabalhador Antigo, exceto se demonstrar que este não reúne as qualificações, habilitações, experiência e certificações exigidas para a ocupação do correspondente posto de trabalho ou que tal trabalhador recusou as condições contratuais previstas no modelo de contrato disponibilizado pelo COCONTRATANTE nos termos e para o efeito da alínea e) do n.º 4.
7. Caso o número de Trabalhadores Antigos que tenham manifestado interesse na posição indicada no anúncio nos termos da alínea f) do n.º 4 seja superior ao número de vagas fixado nesse anúncio, o COCONTRATANTE pode escolher livremente, de entre esses e em conformidade com critérios legítimos e objetivos, de natureza gestionária, quais os trabalhadores a contratar.
8. O contrato de trabalho a celebrar com os Trabalhadores Antigos nos termos dos números anteriores deve respeitar, no mínimo, as condições contratuais previstas no modelo de contrato disponibilizado pelo COCONTRATANTE nos termos e para o efeito da alínea e) do n.º 4, sem prejuízo da integral conformidade com o regime jurídico-laboral, incluindo o regime convencional coletivo, aplicáveis à data da celebração do contrato de trabalho.
9. Nos casos em que o COCONTRATANTE seja uma sociedade constituída nos termos do artigo 19.º do Programa do Concurso, a obrigação prevista nos n.ºs 3 a 8 apenas lhe é aplicável quando contrate recursos humanos para efeitos do presente Contrato que não sejam trabalhadores que, à data da celebração do Contrato, estivessem ao serviço dos sócios fundadores do COCONTRATANTE.
10. Até 40 (quarenta) dias antes do termo do Período de Transição, o COCONTRATANTE deve apresentar, para aprovação do CONTRAENTE PÚBLICO, a lista da estrutura de recursos humanos a utilizar para a Prestação de Serviços no primeiro dia do Período de Funcionamento Normal, informando quais os recursos humanos que foram contratados ao abrigo da obrigação prevista nos n.ºs 3 a 8,a justificação para a não contratação daqueles que, nos termos dos n.ºs 3 a 8, nesta tenham demonstrado interesse, e, se for o caso, aqueles que estavam ao serviço dos sócios da SOCIEDADE COCONTRATANTE constituída nos termos e para o efeito do artigo 19.º do Programa do Concurso à data da sua constituição, incluindo ainda aqueles que pertencem a entidades subcontratadas, com indicação da função e categoria profissional e identificação completa de cada elemento integrante da equipa de recursos humanos.
11. O CONTRAENTE PÚBLICO deve pronunciar-se sobre a lista referida no número anterior no prazo de 20 (vinte) dias a contar da data da sua receção.
12. O COCONTRATANTE é responsável pelo atraso no início do Período de Funcionamento Normal que resulte da não aprovação dos recursos humanos nos termos dos números anteriores.
13. O COCONTRATANTE obriga-se a apresentar provas das qualificações, habilitações e experiência do seu pessoal ou do pessoal subcontratado, sempre que tal seja solicitado pelo CONTRAENTE PÚBLICO.
14. O COCONTRATANTE obriga-se a assegurar que todos os meios humanos utilizados no âmbito da Prestação de Serviços, incluindo o pessoal de entidades subcontratadas, empregam toda a sua competência e diligência na realização das tarefas que lhe forem cometidas.
15. Qualquer alteração à composição dos recursos humanos durante a execução do Contrato deve ser comunicada de imediato pelo COCONTRATANTE ao CONTRAENTE PÚBLICO, demonstrando o cumprimento do disposto nos números anteriores.
16. O COCONTRATANTE deve cumprir todas as disposições legais e regulamentares e o previsto em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho aplicáveis, sendo da sua responsabilidade os encargos que daí resultem.
17. O COCONTRATANTE, na qualidade de entidade empregadora e responsável pelo tratamento dos dados pessoais dos seus trabalhadores, obriga-se a dar cumprimento ao dever legal de informar os trabalhadores que utilizar na Prestação dos Serviços dos tratamentos que efetuar quanto aos seus dados pessoais, nos termos previstos na legislação aplicável, e, em particular, das finalidades e dos fundamentos jurídicos da comunicação desses dados pessoais, nos termos do Caderno de Encargos, ao CONTRAENTE PÚBLICO.»
Considerando o conteúdo do n.º2 da Cláusula 26.ª do CE, o que se retira da mesma é que aí se prevê que o cocontratante deverá suceder na posição contratual de empregador no caso de essa obrigação: (i) ser imposta pelos instrumentos de contratação coletivas; (ii) ser imposta pelo regime jurídico aplicável em caso de transmissão de unidade económica, previsto na Diretiva n.º 2011/23/CE, do Conselho, de 12 de março de 2001; (iii) ou ser imposta pelos artigos 285.º e seguintes do Código de Trabalho.
Caso essa obrigação não resulte de nenhuma destas situações, o n.º 2 da Cláusula 26.ª do CE também a não impõe, sendo por outro lado evidente, que os instrumentos de contratação coletiva aplcáveis, a Diretiva n.º 2011/23/CE e os artigos 285.º e ss do Código do Trabalho sempre se aplicariam, mesmo na ausência da referida cláusula do CE, donde forçoso é concluir que a Cláusula 26.ª não impõe ex novo qualquer obrigação ou encargo ao cocontratante que não resultasse já das normas legais aplicáveis.
Na verdade, se o CE nada previsse a este respeito, os regimes legais/ regulamentares em vigor continuariam a ser aplicáveis.
Como bem nota a apelada AMP, o regime laboral da transmissão de unidade económica previsto no Código do Trabalho “opera ope legis, ficando o adquirente da unidade empresarial sub-rogado ex lege, obrigatoriamente, na posição contratual do anterior titular” ( vide AC. do TRP, de 05/03/2018, proc. n.º 430/13.8TTPRT.P1). E o mesmo se diga de regimes relativos à transmissão de trabalhadores constantes de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, desde que verificados os respetivos pressupostos de aplicação.
Em conclusão, o n.º2 da Cláusula 26.ª do CE não é inovador e apenas teve como intuito clarificar a articulação do regime previsto no n.º3 dessa Cláusula com o regime legal e normativo aplicável, limitando-se a acolher uma obrigação legal, sem que por essa via tivesse criado qualquer obrigação com a qual as Apelantes não devessem contar.
Trata-se de uma norma de conteúdo neutro, que se limita a remeter para o regime legal aplicável, não criando novas obrigações , pelo que não tem aplicação o disposto no n.º 5 do artigo 4.º do Regulamento(CE) n.º 1370/2007, que dispõe que “ sempre que as autoridades competentes exijam dos operadores de serviço público o cumprimento de determinados padrões sociais, os documentos relativos aos concursos e os contratos de serviço público devem incluir uma lista dos membros do pessoal em causa e fornecer informações transparentes relativas aos seus direitos contratuais e às condições nas quais os trabalhadores são considerados vinculados aos serviços”.
Refira-se ainda que, como bem considerou o Tribunal a quo, a aplicação do n.º 10 do artigo 285.º do Cód. Trabalho não tem qualquer impacto no âmbito do concurso ora em apreço. Na verdade, já era entendimento da jurisprudência, tanto europeia como nacional, a sustentação de uma noção flexível de ato translativo de estabelecimento, prescindindo de qualquer ato direto/imediato entre transmitente e transmissário.
Note-se ainda que, diferentemente do que sustentam as Apelantes, o regime de transmissão de trabalhadores não é automática, não sabendo a AMP e, bem assim, as Apelantes se haverá ou não uma tal transmissão, ficando a aplicação efetiva do regime em causa dependente de ser ou não, em cada hipotese, identificável uma “unidade económica” suscetível de transmissão, o que implica atender a um conjunto de indícios, enunciados na jurisprudência europeia e nacional
Por fim, também não se vislumbra que tenham sido violados, designadamente, os princípios da transparência e da concorrência, uma vez que, conforme decorre de tudo o que se expendeu, a AMP não impõe nenhuma obrigação ao cocontratante de assunção dos contratos de trabalho dos atuais operadores, quer porque a existir essa obrigação a mesma é decorrente da vigência do bloco legal aplicável. E sendo assim, o disposto na Cláusula 26.ª, n.º2 do CE não acarreta para a AMP nenhuma obrigação de informação acrescida, sendo do risco próprio do cocontratante avaliar se, caso lhe venha a ser adjudicada a prestação do serviço, do seu interesse em adquirir ativos significativos ao atual titular do contrato em recrutar a totalidade ou parte do seu pessoal ou se será obrigado a fazê-lo e se eventualmente se encontrará numa situação de transferência de empresa ( ver Ac. do TJUE, de 25/01/2001, Oy Liikenne, processo n.º C-172/99, ECLI:EU:2001:59).
Como tal, a referida cláusula não contém qualquer previsão que coloque em crise os referidos princípios.
Em face do exposto, conclui-se pela falta de fundamento da invalidade assacada à Cláusula 26.ª do CE e, consequentemente, pela improcedência do invocado fundamento de recurso.
[…]
IV- DECISÃO
Nesta conformidade, acordam os Juízes Desembargadores deste Tribunal Central Administrativo do Norte em julgar a presente apelação parcialmente procedente, e em consequência;
-declaram a nulidade da sentença, por excesso de pronúncia e por violação do princípio do contraditório, quanto ao segmento decisório em que nela se decide: ««(ii) parcialmente procedente a presente ação, e em consequência declaro ilegal o artigo 18.º, n.º12 do programa de concurso, apenas no tocante ao inciso “ não confere ao adjudicatário o direito a qualquer indemnização”» e, em consequência, determina-se a eliminação desse segmento decisório
- no mais, confirmam a sentença recorrida.
- doc. 008128564 do processo 1973/20.2BEPRT.
57. Em 27.12.2021 a AMP interpôs recurso de revista do Acórdão referido no ponto anterior na parte em que julgou improcedente o recurso interposto pela AMP no que respeita à invalidade do disposto na cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos. – doc. 008128583 do processo 1973/20.2BEPRT.
58. Em 5.5.2022 o STA proferiu Acórdão no processo 1973/20.2BEPRT do qual se extrai,
“[…]
DIREITO
Área Metropolitana do Porto [AMP] vem interpor revista do acórdão do TCAN, de 03.12.2021, que manteve a sentença do TAF do Porto que declarou ilegais as cláusulas 53ª, nº3 alínea i), nº4 alínea m), e nº5 alínea n), do Caderno de Encargos – do «Concurso Público para a Aquisição do Serviço Público de Transporte Rodoviário de Passageiros na Área Metropolitana do Porto» – e, em conformidade, determinou que fossem expurgadas do mesmo.
Pretende a aqui recorrente que a decisão recorrida que manteve a decisão de 1ª instância, no sentido de declarar a ilegalidade das «cláusulas 53ª, nº3 alínea i), nº4 alínea m), e nº5 alínea n), do Caderno de Encargos», que versam sobre «sanções contratuais pecuniárias» padece de erro de direito.
Para tanto alega que, diferentemente do entendido na decisão recorrida e na que esta manteve, não se impunha uma total discriminação de cada um dos comportamentos sancionados no referido preceito, podendo essa previsão ser feita por referência aos deveres/obrigações assumidos pelo cocontratante ao celebrar o contrato, por tal resultar do artigo 329º, nº1, do CCP, que tem uma redação distinta da do artigo 29º, nº1, da CRP.
Conclui que não se inclui no princípio da legalidade o dever de tipificar – através da descrição fechada dos concretos comportamentos censurados – o comportamento contratualmente ilícito gerador da aplicação da sanção contratual.
As entidades recorridas pugnam pela manutenção da decisão recorrida.
A 1ª instância tinha considerado inválidas as cláusulas do art. 53º supra referido por entender que as mesmas violavam «o princípio da legalidade e tipicidade subjacente à previsão de sanções contratuais», e que não seria razoável nem legal «a imposição de uma sanção contratual pecuniária – que pode variar entre leve, grave ou muito grave, consoante o grau de culpa – para o incumprimento das mesmas obrigações contratuais, que podem ser principais ou acessórias» e que «ainda que previstas no contrato, não se encontram, contudo, objetivamente tipificadas nas alíneas em apreço».
A 2ª instância considerou fundamentalmente que a ilegalidade das cláusulas resultava da atipicidade dos comportamentos sancionáveis, a qual seria contrária à exigência de tipificação contida no artigo 329º, nº1, do CCP.
Então vejamos.
A prerrogativa do contraente público de aplicar sanções pecuniárias, ou seja, multas contratuais está genericamente consagrada na alínea d) do artigo 302.º do Código dos Contratos Públicos e traduz-se no poder de intimar e compelir o cocontratante ao bom cumprimento das obrigações contratualmente assumidas.
Como resulta do artigo 329º, nº1 do CCP «o contraente público pode, a título sancionatório, resolver o contrato e aplicar as sanções previstas no contrato ou na lei em caso de incumprimento pelo cocontratante».
Conforme se diz no acórdão do STJ, de 27-09-2011 (processo n.º 81/1998.C1.S1), «A cláusula penal pode revestir três modalidades: cláusula com função moratória ou compensatória, dirigida à reparação de danos mediante a fixação antecipada da indemnização em caso de não cumprimento definitivo ou de simples mora do devedor; cláusula penal em sentido estrito ou propriamente dita, em que a sua estipulação substitui o cumprimento ou a indemnização, não acrescendo a nenhum deles; e cláusula penal de natureza compulsória, em que há uma pena que acresce ao cumprimento ou que acresce à indemnização pelo incumprimento, sendo a finalidade das partes, nesta última hipótese, a de pressionar o devedor a cumprir, e já não a de substituir a indemnização».
No caso, esta prerrogativa de impor uma multa contratual tem a natureza de uma cláusula penal sancionatória consagrada legalmente, podendo assacar-se à mesma uma dupla natureza ou função:
1_ uma função preventiva ou dissuasora, com objetivos semelhantes à das coimas aplicadas por incumprimento de obrigações de conduta.
2_ uma função reintegradora ou indemnizatória dos prejuízos sofridos pelo dono da obra com esse incumprimento, independentemente de o valor dos prejuízos reais ser superior ou inferior a esse valor.
O atual regime caracteriza-se, segundo Mário Aroso de Almeida “(…) por conferir à entidade pública uma posição de supremacia jurídica sobre o seu contratante, mediante a qual ela ficava investida em prorrogativas que as partes estão colocadas no âmbito de uma relação de poder público vs. sujeição (e não de direito vs. dever))” Cfr. Mário Aroso de Almeida – “Contratos administrativos e poderes de conformação do contraente público no novo Código dos Contratos Públicos” in CJA nº 66. Novembro/Dezembro 2007 pág. 9.
Como aí se refere, conforme o preceituado no referido artigo 302º do CCP, os poderes de conformação da relação contratual que o contraente público tem ao seu dispor podem ser completados e densificados no próprio contrato celebrado, no entanto, “… o CCP fixa claramente os poderes do contraente público no contrato administrativo regulando-os e, por vezes, com alguma minúcia. Desta forma, o legislador demonstra de forma clara e inequívoca a sua preocupação em detalhar estes poderes.
Esta possibilidade de densificação dos referidos poderes em sede contratual não pretende desregular a determinação daqueles poderes, mas sim, conferir às partes a possibilidade de que estas possam completar e densificar aqueles poderes, alinhando-os ao contrato em especifico. É certo que na prática esta possibilidade de densificação dos referidos poderes recai primordialmente sobre o ente público, uma vez que em grande parte dos contratos existe um procedimento pré-contratual onde o ente público promotor do concurso fixa o caderno de encargos, quer isto dizer, o conteúdo do contrato a celebrar. Excluindo o âmbito da possibilidade de densificação contratual, poderão enquadrar-se os poderes de modificação unilateral do conteúdo e do modo de execução das prestações contratuais por razões de interesse público. Adicionalmente, o poder de resolução unilateral do contrato com o fundamento no interesse público também se pode enquadrar, visto que estes se encontram disciplinados de forma precisa e completa no CCP, não deixando margem para essa densificação.
No entanto, segundo o artigo seguinte daquele diploma legal, artigo 303º nº2, o exercício daqueles poderes, de direção e de fiscalização, deve salvaguardar a autonomia do cocontratante, limitando-se ao estritamente necessário, nomeadamente à prossecução do interesse público.”
O poder de fiscalização vem enunciado no artigo 305º do CCP onde, no seu nº 1, se refere que o contraente público dispõe de poderes de fiscalização técnica, financeira e jurídica do modo de execução do contrato, com vista a determinar as necessárias correções e aplicar as devidas sanções se a elas houver lugar. Segundo o nº 2 daquele preceito legal, este controlo, esta fiscalização, deve prender-se apenas com o modo de execução do contrato, podendo materializar-se através de inspeção ao local, equipamentos, documentação, registos informáticos e contabilidade ou mediante pedidos de informações.
O poder de direção surge como forma de colmatar eventuais lacunas de regulação ou densificação do modo de execução das prestações, evitando assim que o escopo do contrato administrativo seja diminuído ou mesmo desviado do seu objetivo de prossecução do interesse público (artigo 304º/1 do CCP). Consiste na emissão de ordens, diretivas ou instruções e incide sobre os domínios técnicos, financeiros ou jurídicos de execução (artigo 304º/2).
Estes poderes estão de certa forma interligados, complementando-se mas, como vimos, referem-se ao momento da execução do contrato.
Ora, a natureza do ilícito contraordenacional é administrativa, tal como a competência para aplicar a sanção, a coima.
E, como diz FIG. DIAS, D. Penal, Parte Geral, I, 2ª ed., 7, §11, embora o princípio geral da legalidade tenha, no direito contraordenacional os mesmos efeitos gerais que tem no direito penal quanto à tipicidade, há uma clara diferença material e qualitativa entre o crime e a contraordenação, nomeadamente quanto à responsabilidade das pessoas coletivas, ou à censura da culpa, ou à comparticipação, ou à medida concreta da pena, ou ao processo, ou ao acusatório, ou à imediação e oralidade, enfim, quanto aos pressupostos e critérios respetivos, do crime e da contraordenação atendendo a que, no Direito contraordenacional o bem jurídico é somente motivo do tipo de ilícito e não também conteúdo e a ilicitude é só consequência da proibição legal e não causa.
De qualquer forma, entre direito penal e direito sancionatório administrativo continua a existir um parentesco apesar da questão da diferença entre sanções administrativas e penais ter repercussões ao nível prático, nomeadamente ao nível das garantias que se concedem aos cidadãos já que formalmente, o processo penal oferece maiores garantias que o procedimento sancionador administrativo.
A distinção torna-se fácil quando se trata de sanções administrativas especiais ou de autotutela, derivadas do exercício do poder sancionatório da administração no âmbito de relações de supremacia especial estabelecidas com os administrados.
De facto, as diferenças entre sanções administrativas e penais esbatem-se quando nos referimos a sanções impostas no âmbito das relações de supremacia geral da administração, quando esta não atua estritamente no âmbito de autotutela, protegendo bens jurídicos idênticos e cumprindo funções muitas vezes extraídas do Direito Penal através da técnica da descriminalização.
Como refere CEREZO, citado por Blanca LOZANO, “Panorâmica ...”, pág. 402) “Até ao momento não foi possível encontrar um critério que permita apreciar uma diferença qualitativa entre o ilícito penal e o ilícito administrativo”, pelas contradições que acarretam e porque a própria evolução do processo despenalizador se tem orientado por exigências jurisdicionalizadoras, por critérios e principias penalísticos que têm vindo a confirmar a identidade substancial das duas ordens punitivas”.
No entanto, segundo Costa Andrade, o relativo insucesso registado pelas diferentes tentativas de descoberta de um critério de distinção qualitativa entre crimes e contraordenações não implica, contudo, que se imponha o recurso a uma distinção puramente quantitativa. Por ser, desde logo, evidente a impossibilidade de reconduzir todas as contraordenações à categoria de meras bagatelas penais. Depois, porque um critério puramente quantitativo acabaria no plano operativo por cair na mesma aporia dos critérios qualitativos.
Não será, na verdade, fácil identificar o quantum de gravidade (de ilicitude ou censurabilidade) capaz de, com um mínimo de objetividade, ordenar a repartição das infrações pelos dois domínios do ordenamento jurídico. (…) Em vez disso, deverá antes partir-se da existência, ao lado do direito penal, de um ordenamento jurídico sancionatório, o direito das contra-ordenações. Este aparece hoje claramente autonomizado em relação a cada um dos singulares caudais de infrações ou delitos que vieram a converter-se em contraordenações.”. “Contributo para o conceito de contra-ordenação ...”, pág. 116.
Em suma, não existe um critério seguro e inequívoco de distinção material ou qualitativo entre penas propriamente ditas e sanções administrativas gerais, especialmente as destinadas a punir os ilícitos de mera ordenação social, tendo a multa contratual que se insere num poder sancionatório da administração similitudes com o direito contraordenacional.
Por outro lado, e como se diz na decisão recorrida:
“Acrescente-se que mesmo no campo das denominadas “normas sancionatórias administrativas em branco (não penais)” exige-se que o Legislador fixe “de modo esclarecedor, inequívoco e objetivamente cognoscível – quer um comando proibitivo, quer o correspondente comando sancionatório da conduta proibida” (cfr. Miguel Prata Roque, Direito sancionatório enquanto bissetriz (imperfeita) entre o direito penal e o direito administrativo – a pretexto de alguma jurisprudência constitucional, in Revista de Concorrência e Regulação, Ano IV, n.º 14/15, 2013, pág. 146). Logo, a “previsão de uma norma sancionatória em branco” exige que o conteúdo precetivo mínimo da norma seja fixado pela “norma de remissão” e que da sua combinação com a “norma complementar” resulte uma cognoscibilidade razoável do respetivo conteúdo­ “condição de determinabilidade” (cfr. ob. cit. Pág. 144 a 149 e Ac. do TConstitucional n.º 635/2011).”
No mesmo sentido, também Carla Amado Gomes in “A conformação da relação contratual no CCP”: «(...) 2.4. Poder de sancionamento. (...) no que tange à aplicação de sanções, a previsão deste poder e a configuração concreta daquelas deverão constar de lei aplicável à categoria de contratos em causa, ou do próprio contrato, em homenagem a um princípio de tipicidade inarredável neste domínio».
Mas esta exigível determinabilidade não tem que resultar diretamente da norma que prevê a sanção (em si mesma, e isoladamente, considerada). Pode resultar da “combinação” desta norma com outras que, complementando-a, prevejam as condutas tidas por censuráveis (sancionáveis).

É, aliás, o que resulta do extrato transcrito no Projeto atribuído ao Acórdão do TC nº 635/2011: «a previsão de uma norma sancionatória em branco exige que o conteúdo precetivo mínimo da norma seja fixado pela “norma de remissão” e que da sua combinação com a “norma complementar” resulte uma cognoscibilidade razoável do respetivo conteúdo – “condição de determinabilidade”».
Ora, é o seguinte o teor da cláusula 53.a do CE (Sanções contratuais pecuniárias):
“1. Sem prejuízo da possibilidade de resolução sancionatória do Contrato nos termos do artigo 333.º do Código dos Contratos Públicos, o CONTRAENTE PÚBLICO pode, com observância das regras previstas nos artigos 325.º e 329.º do Código dos Contratos Públicos e no artigo 45.º do RJSPTP, aplicar sanções contratuais pecuniárias em caso de incumprimento pelo COCONTRATANTE das suas obrigações, incluindo as resultantes de determinações do CONTRAENTE PÚBLICO emitidas nos termos da lei ou do Contrato.
2. Para efeitos da presente cláusula, os incumprimentos do COCONTRATANTE classificam-se em leves, graves e muito graves.
3. Consideram-se infrações leves, sancionáveis com sanção contratual pecuniária entre 500 € (quinhentos euros) e 1500€ (mil e quinhentos euros);
i) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 4 e 5 que resultem de um comportamento de culpa leve por parte da COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
4. Consideram-se infrações graves, sancionáveis com multa contratual de 1500€ (mil e quinhentos euros) a 5000€ (cinco mil euros)
m) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos n.ºs 3 e 5 que resultem de um comportamento de negligência grosseira por parte do COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos.
5. Consideram-se infrações muito graves, sancionáveis com multa contratual de 5000€ (cinco mil euros) a 10000€ (dez mil euros):
n) Todas as demais situações de incumprimento não tipificadas nas alíneas anteriores e nos nºs 3 e 4 que resultem de um comportamento doloso por parte do COCONTRATANTE, seu funcionário ou agente, salvo os factos objeto de avaliação de desempenho nos termos do Anexo IX ao Caderno de Encargos. (...)
Ou seja, independentemente de qualquer recurso a preceitos constitucionais, antes apenas pelo recurso aos preceitos do CCP, as alíneas aqui em causa não podiam ter a redação que tiveram por se impor uma determinação da tipificação que permita ao co contraente perceber, sem margem para dúvidas, todas as situações que constituem infrações leves, graves e muito graves.
Na verdade, não está preenchida a “condição de determinabilidade” da tipificação, não podendo a parte saber, ainda que indiretamente, se o incumprimento desta ou daquela exigência contratual é uma infração leve, grave ou muito grave.
E, assim, fica dependente do que concretamente e em cada momento, em sede de aplicação da norma se venha a entender ficando comprometida a impugnação de aplicação de um conceito que não é determinável.
Não existe, pois, qualquer critério donde resulte claro aferir quais as situações de incumprimento que são leves, graves ou muito graves, exigência de determinação da tipificação que resulta do art. 329º nº1 do CCP.
Em suma, no caso sub judice, e em sintonia com a decisão recorrida:
“(…) não se diga, como pretende a Apelante, que nas referidas disposições da cláusula 53.ª do CE as situações que se pretendem abranger se encontram «perfeitamente determinadas» porque «os tipos de infração em causa estão preenchidos por cada uma das obrigações previstas claramente no Caderno de Encargos», ou seja, na afirmação de que existe uma «remissão intersistemática da previsão do comportamento sancionado para as demais disposições do Caderno de Encargos». É que, como bem aduzem as apeladas, qualquer norma remissiva que se tente retirar daquelas disposições da cláusula 53.ª do CE falha, desde logo, nas exigidas “condições mínimas de determinabilidade dos comportamentos proibidos” e, sobretudo não permite a “determinabilidade objetiva, de forma clara e precisa” dos possíveis incumprimentos contratuais sancionáveis pelo Contraente Público.
Ponderando nas referidas disposições da cláusula 53.ª do CE é patente que nelas não se fornece qualquer indicação em termos de conteúdo que permita determinar qual ou quais os comportamentos que darão azo a aplicação de multas contratuais no universo das restantes disposições do CE.
E, o facto de, como alega a Apelante AMP, os destinatários do artigo 53.º do CE serem «sujeitos qualificados, operadores económicos experientes» e, como tal «se pode presumir que têm total e completa consciência das obrigações contratuais previstas no Caderno de Encargos, pelo que têm igualmente conhecimento de quais os comportamentos que poderão gerar a aplicação de sanção|| não é aceitável como argumento em abono da sua tese, uma vez que, por muito bem que conheçam as suas obrigações só no campo da futurologia poderiam determinar o universo das condutas, de entre as possíveis, que estariam abrangidas pela aplicação de multas contratuais, para além de, como a própria Apelante reconhece, estarem em causa um universo de obrigações contratuais cuja descrição se afigura – virtualmente impossível||.
Assim, a natureza da tipificação das multas contratuais é compatível com o disposto na alínea c), do n.º 2 do artigo 307.º do referido CCP que refere que as declarações do contraente público que se traduzem na aplicação de sanções previstas para a inexecução do contrato administrativo revestem a natureza de atos administrativos, estatuições autoritárias emanadas pelo contraente público e que gozam de força executiva própria.
Mas, e como vimos, não interfere com a natureza de cláusula penal sancionatória, semelhante à coima, que reveste a tipificação de uma multa contratual o facto de o CCP qualificar como atos administrativos, os atos de aplicação de sanções contratuais que, por isso, estão sujeitos ao regime comum que, para aquela categoria de atos jurídicos se encontra definido no CPA e no CPTA e nomeadamente o regime-regra de invalidade dos atos administrativos (cfr. arts 161.º e 163.º do CPA).
É, assim, de manter a decisão recorrida.
*
Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.
- fls. 3604 do processo 1973/20.2BEPRT.
59. O Acórdão referido no ponto anterior foi notificado às partes por oficio remetido em 5.5.2022. fls. 3704 e ss. do processo 1973/20.2BEPRT.
60. Em 31.5.2022 foi proferida sentença, já transitada em julgado, no processo 1125/21.4BEPRT da qual se extrai,
“[…]
IV. SEGMENTO FÁCTICO-JURÍDICO
Nos presentes autos, a questão decidenda acima enunciada traduz-se em saber se padece de ilegalidade a cláusula 26º n.2 e 3 a 8 do Caderno de Encargos.
Analisemos.
Da alegada invalidade da cláusula 26º n.2 e 3 a 8 do caderno de encargos
A A. invoca a ilegalidade do disposto nos n.s 2 e 3 a 8 da cláusula 26º em resultado da alteração legislativa, operada pela Lei n.º 18/2021, de 8 de Abril, ao regime constante do Código de Trabalho relativo à transmissão de empresas ou estabelecimentos. Declara que o estatuído no n.2 da cláusula 26º “(…) é (passou a ser) desconforme com a lei vigente. (…)”.
Defende a A. que “(…) tornou-se inequívoca a necessidade de plasmar em sede de CE a obrigatoriedade de transmissão dos contratos de trabalho, por força do disposto das normas do Código do Trabalho que regulam a transmissão de empresa ou estabelecimento ou unidade económica que, agora, foram retroativamente alteradas para abranger o sector dos transportes, em casos em que um novo operador adquire essa posição na decorrência de procedimento concurso público ou por meio de seleção público ou privado. (…)”, inexistindo, por isso, qualquer possibilidade de opção por parte do cocontratante quanto à assumpção, ou não, dos contratos existentes.
Clama que do exposto resulta que o regime previsto nos n.3 a 8 da identificada cláusula 26º “(…) deixou de ter enquadramento legal (…). É inequívoco que todos os contratos de trabalho têm de ser transmitidos de um (ex) operador para outro, (…)”, concluindo que esta “(…) cláusula contratual, e tudo o que dela decorre, é igualmente desconforme com a lei laboral vigente ao tempo da abertura deste procedimento, (…)”.
Em sede de contestação a R. AMP refuta a descrita ilegalidade, invocando que “(…) tal alteração legislativa não tem a leitura e o efeito pretendido pela Ré, nem é assim que tem sido entendida. (…)”.
Alega que no n.2 da citada cláusula “(…) a entidade adjudicante limita-se a fazer referência ao dever de o cocontratante cumprir as obrigações de fonte legal ou regulamentar que para si emerjam, não inovando, nem constituindo a fonte autónoma de qualquer obrigação contratual para o Cocontratante. (…)”, e salienta que os n.s 3 a 8 da mesma cláusula constituem uma obrigação “(…) que apenas tem lugar se, em razão dos instrumentos referidos no n.º 2, o adjudicatário/ cocontratante não estiver já vinculado a suceder nas relações laborais existentes relativamente aos trabalhadores que anteriormente vinham prestando o seu trabalho em benefício dos operadores que, à data da celebração do Contrato, prestam o serviço público correspondente ao objeto do Contrato. (…)”.
Afirma, por isso, que a obrigação resultante do estatuído no n.3 e n.4 – de fonte contratual – só se verifica no caso de o cocontratante ter necessidade de “(…) contratar recursos humanos para assegurar o cumprimento das obrigações emergentes do Contrato durante o Período de Transição e durante o primeiro ano contratual, (…)”, e que essa contratação realizar-se-á “(…) nos termos que o cocontratante entender propor ao trabalhador, desde que em estrita conformidade com o regime legal laboral aplicável, (…)”.
Pugna, ainda, que o novo n.10 do artigo 285º do Código de Trabalho, resultante da alteração introduzida pela Lei n.º 18/2021, de 8 abril tem um “(…) intuito meramente pedagógico/ clarificador em face do âmbito de aplicação do regime da transmissão de unidade económica recortado no n.1 do artigo 285.º do Código de Trabalho. (…)”. É que, sustenta, “(…) a amplitude que o legislador imprimiu ao regime laboral associado à transmissão de unidade económica, manifestada no alcance do segmento “por qualquer título” inserido no n.º 1, não deixa dúvidas de que o regime da transmissão de unidade económica já se aplicava, antes do aditamento do atual n.º 10, às transmissões de unidade económica que resultassem de concursos públicos. (…)”.
Mais acrescenta que “(…) assumiu, na preparação do concurso público em apreço, que o regime de transmissão de unidade económica poderia aplicar-se à prestação de serviços resultante do concurso público em causa, desde que verificados os requisitos associados à existência de uma transmissão de unidade económica…, pelo que a Ré sempre interpretou o n.1 do artigo 285º como potencialmente aplicável a contratos celebrados na sequência de procedimentos pré-contratuais de direito público, designadamente o concurso público em apreço. (…)”.
Termina pela improcedência da ilegalidade que a A. assaca à referida cláusula 26º do caderno de encargos.
Apreciemos.
Acerca da legalidade da cláusula 26º n.2 e n.s 3 a 8 do Caderno de Encargos, este Tribunal já se pronunciou no âmbito do Processo n.º 1973/20.2BEPRT, onde escreveu:
“(…)
Estipula a cláusula 26º do caderno de encargos, sob a epígrafe “Estrutura de recursos humanos”, que:
“1. O COCONTRATANTE obriga-se a estabelecer e a manter uma estrutura de recursos humanos que permita dar integral cumprimento às obrigações decorrentes do Contrato, devendo dispor, durante todo o Período de Funcionamento Normal, de um número suficiente de pessoal dotado de experiência e formação adequadas e qualificação ou licenciamento necessário (quando aplicável) para desenvolver, de forma contínua ou pontual, as atividades incluídas na Prestação de Serviços.
2. O COCONTRATANTE obriga-se a respeitar integralmente a obrigação de suceder na posição contratual de empregador nas relações laborais existentes com trabalhadores que prestam o seu trabalho aos operadores que à data da celebração do Contrato prestam o serviço público correspondente ao objeto do Contrato, no caso de essa obrigação ser imposta pelos instrumentos de contratação coletiva aplicáveis, pelo regime jurídico aplicável em caso de transmissão de unidade económica, previsto na Diretiva n.º 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de Março de 2001, e pelos artigos 285.º e seguintes do Código do Trabalho.
3. Fora do caso previsto no número anterior, o COCONTRATANTE, caso tenha necessidade de contratar recursos humanos para assegurar o cumprimento das obrigações emergentes do Contrato durante o Período de Transição e durante o primeiro Ano Contratual, obriga-se, nos termos dos n.ºs 4 a 9, seguintes, a contratar os trabalhadores que, à data da celebração do Contrato, exerçam funções correspondentes àquelas que o COCONTRATANTE pretenda contratar ao serviço dos operadores que, nessa data, prestem o serviço público correspondente ao objeto do Contrato (“Trabalhadores Antigos”) e manifestem interesse nessa contratação.
4. Sempre que, durante o Período de Transição e durante o primeiro Ano Contratual, tenha necessidade de contratar recursos humanos, o COCONTRATANTE comunica ao público, através da sua página de internet e de anúncios em, pelo menos, um jornal de âmbito regional ou nacional, a sua intenção de contratação, acompanhada das seguintes informações mínimas:
a) Número de vagas;
b) Funções e categoria profissional inerentes a cada um dos postos em recrutamento;
c) Local(ais) para a prestação do trabalho e o âmbito territorial do lote em causa;
d) Indicação de que beneficiam das regras preferenciais de recrutamento constantes do disposto no n.º 6 os Trabalhadores Antigos que:
i. Na data correspondente à da celebração do Contrato e que deve ser expressamente indicada, exerciam funções correspondentes às indicadas na alínea b); e
ii. Que juntem os elementos probatórios relevantes para verificação do preenchimento dos requisitos referidos na subalínea anterior;
e) Local onde esteja disponível, a título gratuito, cópia do correspondente modelo de contrato de trabalho, no qual se preveja as condições contratuais mínimas que o COCONTRATANTE está disposto a assumir na qualidade de empregador, em integral conformidade com o regime jurídico-laboral, incluindo o regime convencional coletivo aplicável, sem prejuízo de eventual negociação, na medida do legalmente admissível, de condições contratuais mais favoráveis com cada um dos trabalhadores;
f) Endereço eletrónico e prazo, o qual não pode ser inferior a 7 (sete) dias úteis a contar da data da comunicação da intenção de contratação, para manifestação do interesse na posição indicada no anúncio.
5. O COCONTRATANTE obriga-se a enviar ao CONTRAENTE PÚBLICO, no dia seguinte à respetiva publicitação, cópia do anúncio e cópia do modelo de contrato de trabalho a que se refere o número anterior e indicação dos meios de publicitação usados.
6. Se, em relação a uma mesma vaga, concorrerem um Trabalhador Antigo e candidato que não o seja, o COCONTRATANTE obriga-se a contratar o Trabalhador Antigo, exceto se demonstrar que este não reúne as qualificações, habilitações, experiência e certificações exigidas para a ocupação do correspondente posto de trabalho ou que tal trabalhador recusou as condições contratuais previstas no modelo de contrato disponibilizado pelo COCONTRATANTE nos termos e para o efeito da alínea e) do n.º 4.
7. Caso o número de Trabalhadores Antigos que tenham manifestado interesse na posição indicada no anúncio nos termos da alínea f) do n.º 4 seja superior ao número de vagas fixado nesse anúncio, o COCONTRATANTE pode escolher livremente, de entre esses e em conformidade com critérios legítimos e objetivos, de natureza gestionária, quais os trabalhadores a contratar.
8. O contrato de trabalho a celebrar com os Trabalhadores Antigos nos termos dos números anteriores deve respeitar, no mínimo, as condições contratuais previstas no modelo de contrato disponibilizado pelo COCONTRATANTE nos termos e para o efeito da alínea e) do n.º 4, sem prejuízo da integral conformidade com o regime jurídico-laboral, incluindo o regime convencional coletivo, aplicáveis à data da celebração do contrato de trabalho.
9. Nos casos em que o COCONTRATANTE seja uma sociedade constituída nos termos do artigo 19.º do Programa do Concurso, a obrigação prevista nos n.ºs 3 a 8 apenas lhe é aplicável quando contrate recursos humanos para efeitos do presente Contrato que não sejam trabalhadores que, à data da celebração do Contrato, estivessem ao serviço dos sócios fundadores do COCONTRATANTE.
10. Até 40 (quarenta) dias antes do termo do Período de Transição, o COCONTRATANTE deve apresentar, para aprovação do CONTRAENTE PÚBLICO, a lista da estrutura de recursos humanos a utilizar para a Prestação de Serviços no primeiro dia do Período de Funcionamento Normal, informando quais os recursos humanos que foram contratados ao abrigo da obrigação prevista nos n.ºs 3 a 8,a justificação para a não contratação daqueles que, nos termos dos n.ºs 3 a 8, nesta tenham demonstrado interesse, e, se for o caso, aqueles que estavam ao serviço dos sócios da SOCIEDADE COCONTRATANTE constituída nos termos e para o efeito do artigo 19.º do Programa do Concurso à data da sua constituição, incluindo ainda aqueles que pertencem a entidades subcontratadas, com indicação da função e categoria profissional e identificação completa de cada elemento integrante da equipa de recursos humanos.
11. O CONTRAENTE PÚBLICO deve pronunciar-se sobre a lista referida no número anterior no prazo de 20 (vinte) dias a contar da data da sua receção.
12. O COCONTRATANTE é responsável pelo atraso no início do Período de Funcionamento Normal que resulte da não aprovação dos recursos humanos nos termos dos números anteriores.
13. O COCONTRATANTE obriga-se a apresentar provas das qualificações, habilitações e experiência do seu pessoal ou do pessoal subcontratado, sempre que tal seja solicitado pelo CONTRAENTE PÚBLICO.
14. O COCONTRATANTE obriga-se a assegurar que todos os meios humanos utilizados no âmbito da Prestação de Serviços, incluindo o pessoal de entidades subcontratadas, empregam toda a sua competência e diligência na realização das tarefas que lhe forem cometidas.
15. Qualquer alteração à composição dos recursos humanos durante a execução do Contrato deve ser comunicada de imediato pelo COCONTRATANTE ao CONTRAENTE PÚBLICO, demonstrando o cumprimento do disposto nos números anteriores.
16. O COCONTRATANTE deve cumprir todas as disposições legais e regulamentares e o previsto em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho aplicáveis, sendo da sua responsabilidade os encargos que daí resultem.
17. O COCONTRATANTE, na qualidade de entidade empregadora e responsável pelo tratamento dos dados pessoais dos seus trabalhadores, obriga-se a dar cumprimento ao dever legal de informar os trabalhadores que utilizar na Prestação dos Serviços dos tratamentos que efetuar quanto aos seus dados pessoais, nos termos previstos na legislação aplicável, e, em particular, das finalidades e dos fundamentos jurídicos da comunicação desses dados pessoais, nos termos do Caderno de Encargos, ao CONTRAENTE PÚBLICO.”
No Código de Trabalho, com relevo para a apreciação da questão sub iudice, estipula-se o seguinte:
“(…)
Artigo 3.º (Relações entre fontes de regulação)
1 – As normas legais reguladoras de contrato de trabalho podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, salvo quando delas resultar o contrário.
2 – As normas legais reguladoras de contrato de trabalho não podem ser afastadas por portaria de condições de trabalho.
3 – As normas legais reguladoras de contrato de trabalho só podem ser afastadas por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que, sem oposição daquelas normas, disponha em sentido mais favorável aos trabalhadores quando respeitem às seguintes matérias:
(…)
m) Transmissão de empresa ou estabelecimento;
(…)
4 – As normas legais reguladoras de contrato de trabalho só podem ser afastadas por contrato individual que estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador, se delas não resultar o contrário.
5 – Sempre que uma norma legal reguladora de contrato de trabalho determine que a mesma pode ser afastada por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho entende-se que o não pode ser por contrato de trabalho.
(...)
SUBTÍTULO II
Instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho
CAPÍTULO I
Princípios gerais relativos a instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho
SECÇÃO I
Disposições gerais sobre instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho
Artigo 476.º (Princípio do tratamento mais favorável)
As disposições de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho só podem ser afastadas por contrato de trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador.
(…).”
Versando sobre a aplicação do artigo 476º, o Tribunal da Relação do Porto proferiu acórdão, no qual afirmou, entre o mais, que: “(…) IV – Estando nesse caso em causa a aplicação de cláusula estabelecida em CCT que vincula as partes, sendo aplicável o princípio estabelecido no artigo 476.º ao contrato de trabalho ao acordo das partes, esse princípio é a este aplicável, assim sobre exercício de funções e categoria associada, em particular, no que aqui importa, à transição, imposta pela citada cláusula, do trabalhador para a categoria correspondente às funções que exerceu durante o período em causa.
V – Estando nesse caso em causa a aplicação de princípio plasmado na lei, assim o disposto no artigo 476.º do CT, que impõe o primado de que as disposições de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho só podem ser afastadas quando se trate de estabelecer condições mais favoráveis para o trabalhador, impõe-se o nesse estabelecido, independentemente pois de qualquer eventual acordo anterior em contrário celebrado entre as partes, sem que se possa dizer que ocorre abuso de direito, na modalidade venire contra factum proprium.” – vd. «Sumário», do Acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 14891/15.7T8PRT.P1, em 10.09.2018.
Especificamente, sobre o regime da transmissão de empresa ou estabelecimento, o Código de Trabalho – na redação em vigor à data da aprovação das peças procedimentais em apreço – estipulava:
“Artigo 285.º (Efeitos de transmissão de empresa ou estabelecimento)
1 – Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
2 – O disposto no número anterior é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes tenha exercido a exploração.
3 – Com a transmissão constante dos n.os 1 ou 2, os trabalhadores transmitidos ao adquirente mantêm todos os direitos contratuais e adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos.
4 – O disposto nos números anteriores não é aplicável em caso de trabalhador que o transmitente, antes da transmissão, transfira para outro estabelecimento ou unidade económica, nos termos do disposto no artigo 194.º, mantendo-o ao seu serviço, excepto no que respeita à responsabilidade do adquirente pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
5 – Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados que constitua uma unidade produtiva dotada de autonomia técnico-organizativa e que mantenha identidade própria, com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória.
6 – O transmitente responde solidariamente pelos créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, bem como pelos encargos sociais correspondentes, vencidos até à data da transmissão, cessão ou reversão, durante os dois anos subsequentes a esta.
7 – A transmissão só pode ter lugar decorridos sete dias úteis após o termo do prazo para a designação da comissão representativa, referido no n.º 6 do artigo seguinte, se esta não tiver sido constituída, ou após o acordo ou o termo da consulta a que se refere o n.º 4 do mesmo artigo.
8 – O transmitente deve informar o serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral:
a) Do conteúdo do contrato entre transmitente e adquirente, sem prejuízo do disposto nos artigos 412.º e 413.º, com as necessárias adaptações;
b) Havendo transmissão de uma unidade económica, de todos os elementos que a constituam, nos termos do n.º 5.
9 – O disposto no número anterior aplica-se no caso de média ou grande empresa e, a pedido do serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral, no caso de micro ou pequena empresa.
10 – Constitui contraordenação muito grave:
a) A conduta do empregador com base em alegada transmissão da sua posição nos contratos de trabalho com fundamento em transmissão da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, ou em transmissão, cessão ou reversão da sua exploração, quando a mesma não tenha ocorrido;
b) A conduta do transmitente ou do adquirente que não reconheça ter havido transmissão da posição daquele nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores quando se verifique a transmissão da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, ou a transmissão, cessão ou reversão da sua exploração.
11 – A decisão condenatória pela prática de contraordenação referida na alínea a) ou na alínea b) do número anterior deve declarar, respetivamente, que a posição do empregador nos contratos de trabalho dos trabalhadores não se transmitiu, ou que a mesma se transmitiu.
12 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 7, 8 ou 9.
(…)”
Este regime, veio a ser alterado na pendência do procedimento concursal em apreço e da presente instância, pela Lei n.º 18/2021, de 8 abril, na qual se prevê:
“Artigo 1.º (Objeto)
A presente lei estende o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento às situações de transmissão por adjudicação de fornecimento de serviços que se concretize por concurso público, ajuste direto ou qualquer outro meio, alterando o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
(…)
Artigo 3.º (Disposição transitória)
As alterações introduzidas pela presente lei aplicam-se, igualmente, aos concursos públicos ou outros meios de seleção, no setor público e privado, em curso durante o ano de 2021, incluindo aqueles cujo ato de adjudicação se encontre concretizado.
(…)”
Diploma este que, igualmente, procedeu à alteração do normativo que regula a transmissão de empresa ou estabelecimento, que passou a ter a seguinte redacção:
“Artigo 285.º (Efeitos de transmissão de empresa ou estabelecimento)
1 – Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
2 – O disposto no número anterior é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes tenha exercido a exploração.
3 – Com a transmissão constante dos n.os 1 ou 2, os trabalhadores transmitidos ao adquirente mantêm todos os direitos contratuais e adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos.
4 – O disposto nos números anteriores não é aplicável em caso de trabalhador que o transmitente, antes da transmissão, transfira para outro estabelecimento ou unidade económica, nos termos do disposto no artigo 194.º, mantendo-o ao seu serviço, excepto no que respeita à responsabilidade do adquirente pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
5 – Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados que constitua uma unidade produtiva dotada de autonomia técnico-organizativa e que mantenha identidade própria, com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória.
6 – O transmitente responde solidariamente pelos créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, bem como pelos encargos sociais correspondentes, vencidos até à data da transmissão, cessão ou reversão, durante os dois anos subsequentes a esta.
7 – A transmissão só pode ter lugar decorridos sete dias úteis após o termo do prazo para a designação da comissão representativa, referido no n.º 6 do artigo seguinte, se esta não tiver sido constituída, ou após o acordo ou o termo da consulta a que se refere o n.º 4 do mesmo artigo.
8 – O transmitente deve informar o serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral:
a) Do conteúdo do contrato entre transmitente e adquirente, sem prejuízo do disposto nos artigos 412.º e 413.º, com as necessárias adaptações;
b) Havendo transmissão de uma unidade económica, de todos os elementos que a constituam, nos termos do n.º 5.
9 – O disposto no número anterior aplica-se no caso de média ou grande empresa e, a pedido do serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral, no caso de micro ou pequena empresa.
10 – O disposto no presente artigo é aplicável a todas as situações de transmissão de empresa ou estabelecimento por adjudicação de contratação de serviços que se concretize por concurso público ou por outro meio de seleção, no setor público e privado, nomeadamente à adjudicação de fornecimento de serviços de vigilância, alimentação, limpeza ou transportes, produzindo efeitos no momento da adjudicação.
11 – Constitui contraordenação muito grave:
a) A conduta do empregador com base em alegada transmissão da sua posição nos contratos de trabalho com fundamento em transmissão da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, ou em transmissão, cessão ou reversão da sua exploração, quando a mesma não tenha ocorrido;
b) A conduta do transmitente ou do adquirente que não reconheça ter havido transmissão da posição daquele nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores quando se verifique a transmissão da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, ou a transmissão, cessão ou reversão da sua exploração.
12 – A decisão condenatória pela prática de contraordenação referida na alínea a) ou na alínea b) do número anterior deve declarar, respetivamente, que a posição do empregador nos contratos de trabalho dos trabalhadores não se transmitiu, ou que a mesma se transmitiu.
13 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 7, 8 ou 9.
14 – Aos trabalhadores das empresas ou estabelecimentos transmitidos ao abrigo do presente artigo aplica-se o disposto na alínea m) do n.º 1 do artigo 3.º e no artigo 498.º
(…).”
Por sua vez, a Directiva 2001/23/CE do Conselho, 12 de Março 2001, “relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos”, preceitua que: “(…)
Artigo 1.º
1. a) A presente directiva é aplicável à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, quer essa transferência resulte de uma cessão convencional quer de uma fusão.
b) Sob reserva do disposto na alínea a) e das disposições seguintes do presente artigo, é considerada transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória.
c) A presente directiva é aplicável a todas as empresas, públicas ou privadas, que exercem uma actividade económica, com ou sem fins lucrativas. A reorganização administrativa de instituições oficiais ou a transferência de funções administrativas entre instituições oficiais não constituem uma transferência na acepção da presente directiva.
2. A presente directiva é aplicável se e na medida em que a empresa, o estabelecimento ou a parte de empresa ou de estabelecimento a transferir esteja abrangido pelo âmbito de aplicação territorial do Tratado.
3. A presente directiva não é aplicável aos navios.
(…)
Manutenção dos direitos dos trabalhadores
Artigo 3.º
1. Os direitos e obrigações do cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes à data da transferência são, por esse facto, transferidos para o cessionário.
Os Estados-Membros podem prever que, após a data da transferência, o cedente e o cessionário sejam solidariamente responsáveis pelas obrigações resultantes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes antes da data da transferência.
2. Os Estados-Membros podem adoptar as medidas adequadas para assegurar que o cedente notifique o cessionário de todos os direitos e obrigações transferidos para este último nos termos do presente artigo, na medida em que esses direitos e obrigações sejam, ou devessem ser, do conhecimento do cedente no momento da transferência. A não notificação pelo cedente ao cessionário de qualquer desses direitos ou obrigações não afectará a transferência desses mesmos direitos ou obrigações nem os direitos de quaisquer trabalhadores contra o cessionário e/ou cedente relativamente a esses direitos ou obrigações.
3. Após a transferência, o cessionário manterá as condições de trabalho acordadas por uma convenção colectiva, nos mesmos termos em que esta as previa para o cedente, até à data da rescisão ou do termo da convenção colectiva ou até à data de entrada em vigor ou de aplicação de outra convenção colectiva.
Os Estados-Membros podem limitar o período de manutenção das condições de trabalho desde que este não seja inferior a um ano.
4. a) Salvo determinação em contrário dos Estados-Membros, os n.os 1 e 3 não são aplicáveis aos direitos dos trabalhadores a prestações de velhice, invalidez ou sobrevivência concedidas por regimes complementares de previdência, profissionais ou interprofissionais, não compreendidos nos regimes legais de segurança social dos Estados-Membros.
b) Mesmo quando não prevejam, nos termos da alínea a), que o n.os 1 e 3 se aplicam aos direitos nela mencionados, os Estados-Membros adoptarão as medidas necessárias para proteger os interesses dos trabalhadores, bem como das pessoas que no momento da transferência já tenham deixado o estabelecimento do cedente, no que respeita aos direitos adquiridos ou em vias de aquisição a prestações de velhice, incluindo as prestações de sobrevivência, concedidos pelos regimes complementares referidos na alínea a) do presente número.
(…)”
Ora, as directivas enquanto fonte de direito da União Europeia vinculam os Estados-membros quanto ao resultado a obter, conferindo liberdade aos mesmos para definir a forma e os meios, carecendo, por isso, de transposição para o ordenamento jurídico nacional. Todavia, é jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia que, a título excepcional, os particulares podem invocar a directiva e esta produzir efeitos directos num Estado-membro, desde que “a) a transposição para o direito interno não tenha sido efetuada ou o tenha sido incorretamente; b) as disposições das diretivas sejam imperativas e suficientemente claras e precisas; as disposições das diretivas confiram direitos aos particulares. (…)”
Analisemos, pois.
Entre os institutos aqui descritos existe um ponto em comum: a imperatividade da sua aplicação à situação jurídica dos trabalhadores, caso se verifique uma transmissão de empresa ou estabelecimento, nos termos em que a mesma está definida nos institutos jurídicos ali referidos, independentemente da remissão que estes seja feita em sede de caderno de encargos.
Especificamente sobre o âmbito de aplicação do regime da transmissão de empresa ou estabelecimento e da interpretação dos conceitos que o integram pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça afirmando, entre o mais e no que ora releva, que: “(…)
Resulta da alínea a), do n.º 1, do artigo 1.º, da Directiva, que o regime estabelecido é aplicável «à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento», quer essa transferência resulte de uma cessão convencional ou de uma fusão.
Por força do disposto na alínea b), do n.º 1, deve entender-se como abrangida pela transferência ali disciplinada, e respeitado «o disposto na alínea a) e das disposições seguintes deste artigo», a «transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória».
Por conseguinte, a transferência de titularidade dos contratos de trabalho prevista na presente Directiva abrange não apenas a transferência de empresa ou de estabelecimento, mas também a parte de empresa ou de estabelecimento que se constitua como uma «entidade económica», entendida esta nos termos estabelecidos na norma citada, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica não restringida ao exercício da actividade principal.
Daqui decorre, da conjugação do regime legal previsto na Directiva nº 2001/23/CE – arts. 1.º, n.º 1, alínea a), e 2.º, n.º 1, alíneas a) e b) – com o art. 285º, nºs 1 e 3, do Código do Trabalho de 2009, que o conceito de transmissão, para efeitos laborais, é especialmente amplo.
(…)
Essencial é que tenha ocorrido, efectivamente, a transmissão de um negócio ou actividade, que constitua uma unidade económica autónoma na esfera do transmitente para a do transmissário, «mantendo a sua identidade» (art. 1.º, n.º 1, da Directiva), e que demonstre o animus translativo da operação pelo facto de o primeiro ter deixado de exercer a actividade correspondente a tal unidade e o segundo passar a exercê-la nos mesmos moldes.
3.3. O conceito nuclear inserido nesta Directiva, conforme resulta da sua análise, não é tanto o de transferência/transmissão de empresa, mas sim o de “transferência de uma entidade económica” – cf. a alínea b), do nº 1, do seu art. 1º.
Conceito que reencontramos explicitado no art. 285.º do Código do Trabalho, no seu n.º 5, com a noção aí consagrada de “unidade económica”, como o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória.
Reproduzindo na nossa ordem jurídica o citado art. 1.º, n.º 1, alínea b), da Directiva nº 2001/23/CE, de 12 de Março, em consonância com o entendimento da Jurisprudência do TJUE, segundo o qual é considerada como tal a transferência de uma unidade económica que mantém a sua identidade, entendida esta nos mesmos termos: “como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória”.
Asserção vertida claramente no atrás citado Acórdão do TJUE, de 09.09.2015, com a seguinte narrativa:
«Segundo jurisprudência constante, a Diretiva 2001/23 tem em vista assegurar a continuidade das relações de trabalho existentes no quadro de uma entidade económica, independentemente da mudança de proprietário. O critério decisivo para demonstrar a existência de uma transferência, na acepção dessa diretiva, consiste na circunstância de a entidade em questão preservar a sua identidade, o que resulta, designadamente, da prossecução efetiva da exploração ou da sua retoma».
Sendo considerado como elemento determinante dessa definição e reconhecimento de unidade económica, pela Jurisprudência Comunitária, a autonomia de parte da empresa ou do estabelecimento transmitidos.
Podendo ler-se, a este propósito, no Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, exarado no Proc. C-458/05 (Ac. Jouini), de 13/09/2007, que o Tribunal de Justiça acentuou a necessidade de a unidade económica manter a sua própria identidade no seio do transmissário, o que se revela pela prossecução de um objectivo próprio.[14]
Identidade a aferir pelo conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória – cf. nº 5, do art. 285º, do Código do Trabalho de 2009.
Importa, assim, avaliar se a unidade económica mantém a sua identidade, se se mostra dotada de autonomia técnico-organizativa própria, constituindo uma unidade produtiva autónoma, com organização específica.
(…)
3.4. Aquilatar da subsistência de uma unidade económica exige a ponderação de determinados elementos indiciários, sendo frequentemente enunciados pelo TJUE, como relevantes, os seguintes:
- Avaliar o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata;
- Apurar se houve a transferência ou não de bens corpóreos, tais como os edifícios e os bens móveis, bem como o valor dos elementos incorpóreos existentes no momento da transmissão;
- Verificar se se operou a reintegração, ou não, por parte do novo empresário, do essencial dos efectivos, v.g., no domínio dos recursos humanos;
- Confirmar se ocorreu a transmissão, entendida enquanto continuidade, da respectiva clientela;
- Comprovar o grau de similitude entre as actividades exercidas antes e depois da transmissão e a duração de uma eventual suspensão dessas actividades.
Elementos parciais indiciários a valorizar numa avaliação de conjunto, enquanto critérios orientadores e coadjuvantes da decisão a proferir, que dependerá da ponderação que se faça desses factores em função de cada caso concreto.
Conclusão corroborada, nesta parte, por Júlio Manuel Vieira Gomes[17] quando refere que:
«Decisiva para o Tribunal de Justiça é sempre a manutenção da entidade económica, e para se verificar se essa entidade continuou a ser a mesma, o tribunal destacou que há que recorrer a múltiplos elementos cuja importância pode, de resto, variar no caso concreto, segundo o tipo de empresa ou estabelecimento, a sua actividade, ou métodos de gestão, sendo que estes elementos devem ser objecto de uma apreciação global, não sendo em princípio decisivo nenhum deles».
E explicita:
«Podem ser relevantes elementos como a transmissão de bens do activo da entidade, designadamente, bens imóveis, ou equipamentos, mas também bens incorpóreos como a transmissão de know-how, a própria manutenção da maioria ou do essencial dos efectivos, a duração de uma eventual interrupção da actividade desenvolvida antes e a actividade desenvolvida depois da transferência».
(…)”. – cfr. Acórdão proferido em 06.12.2017, no âmbito do processo n.º 357/13.3TTPDL.L1.S1
Ressalta, pois, do enquadramento vertido no acórdão citado – que aqui se acolhe – que a verificação da existência, ou não, de uma transmissão de empresa ou estabelecimento decorre da aferição de múltiplos elementos, cuja relevância pode inclusive variar em cada caso.
E, sendo assim, mesmo com a sujeição ao regime da transmissão de empresa ou estabelecimento constante no artigo 285º n.10 do Código de Trabalho de “(…) todas as situações de transmissão de empresa ou estabelecimento por adjudicação de contratação de serviços que se concretize por concurso público ou por outro meio de seleção, no setor público e privado, nomeadamente à adjudicação de fornecimento de serviços de vigilância, alimentação, limpeza ou transportes, produzindo efeitos no momento da adjudicação. (…)” [na redação da Lei n.º 18/2021]; não se pode afirmar, peremptoriamente, que o n.2 da cláusula em apreço constitua para os concorrentes do presente procedimento uma obrigação de sucessão na posição contratual de empregador, em relação aos trabalhadores dos actuais operadores, porquanto do enunciado da mesma resulta, tão-só, a remissão para institutos jurídicos cuja aplicabilidade terá de ser objecto de apreciação in casu, em face dos critérios legais enunciados.
Assim, inexistindo a aludida obrigação/ exigência, não se aplica neste caso o disposto no artigo 4º n.5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, quando prevê que “5 – Sem prejuízo do direito nacional e comunitário, incluindo os acordos colectivos celebrados entre os parceiros sociais, as autoridades competentes podem exigir aos operadores seleccionados que proporcionem ao pessoal previamente contratado para a prestação dos serviços os direitos que teriam sido concedidos a esse pessoal caso tivesse sido efectuada uma transferência na acepção da Directiva 2001/23/CE. Sempre que as autoridades competentes exijam dos operadores de serviço público o cumprimento de determinados padrões sociais, os documentos relativos aos concursos e os contratos de serviço público devem incluir uma lista dos membros do pessoal em causa e fornecer informações transparentes relativas aos seus direitos contratuais e às condições nas quais os trabalhadores são considerados vinculados aos serviços. (…)”.
Relativamente à pretensa violação do princípio da transparência, julga o Tribunal que a remissão para os institutos jurídicos e respectivos regimes, constante da cláusula 26º n.2 torna acessível e evidente a qualquer interessada em participar no presente procedimento concursal as obrigações que sobre si impendem, se se verificarem os critérios de transmissão de empresa e estabelecimento. Acresce que, sem prejuízo de – como se decidiu – sobre a R. AMP não recair a obrigação de fornecer qualquer lista de pessoal, respectivos direitos contratuais e condições, atenta a mudança de paradigma na prestação dos serviços objecto do presente concurso, pelo facto de actualmente serviços serem prestados noutros moldes, por operadores económicos individualizados, sem coincidência de áreas com as ora determinadas nos lotes a concurso, é razoável e justificada a afirmação da R. AMP de que não dispõe dos aludidos documentos. Conclui-se, por isso, que a ausência de tal informação não constitui uma qualquer violação do princípio da transparência.
O mesmo se diga quanto à suscitada violação do princípio da igualdade e da concorrência pela circunstância de, com a remissão para os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalhos, poderem existir concorrentes que estejam obrigadas a observar determinada convenção colectiva, e outras não. A tal respeito, julga o Tribunal que, por um lado, a entidade adjudicante se limitou a remeter para institutos jurídicos de natureza imperativa e, por outro, que esta é alheia à circunstância de poderem existir diferentes instrumentos de regulamentação colectiva de trabalhos, com diferentes obrigações que se possam repercutir no teor das propostas a elaborar por cada um dos concorrentes, já que, a celebração de uma convenção colectiva de trabalho depende de um acto de vontade da parte que a subscreve, sem interferência da R. AMP na formação da mesma.
É que, se é certo que sobre a entidade adjudicante impende a obrigação de não criar factores perturbadores da concorrência; é, igualmente, verdadeiro que a esta são indiferentes as individuais e especificas circunstâncias de cada um dos concorrentes: se celebrou ou não qualquer instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, se tem trabalhadores antigos, se terá de contratar novos trabalhadores, se tem de adquirir um viaturas para a prestação do serviço, ou mesmo se tem de contratar recursos humanos para a elaboração da proposta a apresentar no procedimento; e se, a final, tudo isto se vai repercutir no preço/ teor da sua proposta. A consideração de tais factores diferenciadores, aquando da elaboração do programa de concurso e / ou do caderno de encargos cujas normas se pretendem de aplicação abstracta, essa sim, constituiria uma violação do princípio da igualdade e da concorrência.
Pelo exposto, improcede, por isso, a alegação relativa à violação do referido normativo, e dos princípios da transparência, igualdade e concorrência, quanto ao teor do n.2 da cláusula 26º do caderno de encargos.
No tocante à alegação de ilegalidade do n.3 da cláusula 26º, e bem assim da subsequente regulamentação constante dos n.s 4 a 9, com base nas mesmas invalidades – a violação do n.5 do artigo 4º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e dos princípios da transparência, igualdade e concorrência – atenta a sua redacção o Tribunal, adianta-se, julga que a mesma não se verifica.
Vejamos.
Preceitua o CCP:
“Artigo 42º (Caderno de Encargos)
1 – O caderno de encargos é a peça do procedimento que contém as cláusulas a incluir no contrato a celebrar.
2 – Nos casos de manifesta simplicidade das prestações que constituem o objeto do contrato a celebrar, as cláusulas do caderno de encargos podem consistir numa mera fixação de especificações técnicas e numa referência a outros aspetos essenciais da execução desse contrato, tais como o preço ou o prazo.
3 – As cláusulas do caderno de encargos relativas aos aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência podem fixar os respetivos parâmetros base a que as propostas estão vinculadas.
4 – Os parâmetros base referidos no número anterior podem dizer respeito a quaisquer aspetos da execução do contrato, tais como o preço a pagar ou a receber pela entidade adjudicante, a sua revisão, o prazo de execução das prestações objeto do contrato ou as suas características técnicas ou funcionais, bem como às condições da modificação do contrato, devendo ser definidos através de limites mínimos ou máximos, consoante os casos, sem prejuízo dos limites resultantes das vinculações legais ou regulamentares aplicáveis.
5 – O caderno de encargos pode também descrever aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência, nomeadamente mediante a fixação de limites mínimos ou máximos a que as propostas estão vinculadas.
6 – Os aspetos da execução do contrato, constantes das cláusulas do caderno de encargos, podem dizer respeito, desde que relacionados com tal execução, a condições de natureza social, ambiental, ou que se destinem a favorecer:
a) A aplicação de medidas de promoção da igualdade de género e da igualdade salarial no trabalho;
b) O aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho;
c) A conciliação da vida profissional com a vida familiar e pessoal dos trabalhadores afetos à execução do contrato;
d) A inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
7 – (Revogado.)
8 – (Revogado.)
9 – (Revogado.)
10 – (Revogado.)
11 – Para efeitos do disposto nos n.os 3 e 5, consideram-se aspetos submetidos à concorrência todos aqueles que são objeto de avaliação de acordo com o critério de adjudicação, e aspetos não submetidos à concorrência todos aqueles que, sendo apreciados, não são objeto de avaliação e classificação.”
Sobre esta matéria, o autor PEDRO COSTA GONÇALVES escreve “(…) O caderno de encargos define outros aspetos de execução do contrato, como, por ex., o preço, o prazo do contrato, o prazo de garantia, o local de entrega de um produto ou as condições de modificação do contrato.
No caderno de encargos são ainda definidos aspetos da execução do contrato que podem dizer respeito, desde que relacionadas com tal execução, a condições de natureza social ou ambiental: por ex., pode estabelecer-se que, na execução do serviço contratado, têm de ser utilizados veículos elétricos ou produtos de limpeza com um rótulo ecológico ou equivalente, que no fabrico de um produto não podem ser usados elementos tóxicos, que o cocontratante deve empregar pessoas desfavorecidas ou desempregados de longa duração. (…).
(…)
Conforme se estabelece no mesmo n.º6 do artigo 42.º, após a revisão de 2017, as cláusulas do caderno de encargos sobre aspetos da execução do contrato podem dizer respeito a outras condições que se destinem a favorecer: a) a aplicação de medidas de promoção da igualdade de género e da igualdade salarial no trabalho; b) o aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho; c) a conciliação da vida profissional com a vida familiar e pessoal dos trabalhadores afetos à execução do contrato; d) a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Trata-se, em geral, de aspetos da execução do contrato que especificam ou densificam condições de natureza social. (…)”. – in «Direito dos Contratos Públicos», 4ªed., Almedina, 2020, p. 633 e ss.
E, sobre o mesmo assunto escreve o autor PEDRO SÁNCHEZ, que “(…) É sabido que a progressiva evolução do direito dos contratos públicos levou à ampliação das hipóteses de instrumentalização do regime de contratação pública em beneficio de politicas sociais, laborais ou ambientais que sejam definidas como relevantes pela normação comunitária. Aceitou-se definitivamente o pressuposto de que, embora o regime de contratação pública se destine primariamente ao duplo objectivo de promoção da concorrência num mercado interno e de selecção de uma proposta que satisfaça as necessidades de interesse público subjacentes ao contrato, a escolha da proposta a adjudicar pode ser também orientada, colateralmente, para o incentivo do mercado ao cumprimento de políticas públicas em áreas de relevo para o interesse comunitário, onde justamente se enquadram os sectores sociais, laborais ou ambientais. (…)
(…)
Ora, não se discute que as exigências que a entidade adjudicante inscreve no caderno de encargos devem ser pautadas pela razoabilidade e pela proporcionalidade: é ilegítimo impor exigências que restringem o universo potencial de concorrentes se o seu cumprimento é inútil ou desnecessário para a satisfação das necessidades públicas em causa – não sendo então a restrição imposta ao princípio da concorrência compensada com qualquer mais-valia na prossecução do interesse público subjacente ao contrato. (…)
Todavia, as políticas horizontais agora em apreço impõem uma flexibilização desta premissa, atendendo a que o regime de contratação pública pode ser utilizado como instrumento privilegiado de satisfação de outros interesses públicos, concretamente através da fixação no caderno de encargos de requisitos mínimos relativos a condições sociais ou ambientais que as propostas devam respeitar sob pena de exclusão ou, ainda, através da integração de tais condições no critério de adjudicação. Ainda que tais condições não sejam estritamente indispensáveis para a satisfação directa da necessidade que justifica a celebração do contrato, a sua integração no caderno de encargos pode consistir num dos instrumentos mais eficazes para o envolvimento dos co-contratantes privados na prossecução de interesses públicos sociais ou ambientais. (…)” – in «Direito da Contratação Pública, Vol. I», AAFDL Editora, 2020, p.682 e ss.
Posto isto, o Tribunal julga que a disposição constante do n.3 – e subsequentes n.ºs 4 a 9 – ao estabelecer uma obrigação de preferência na contratação de trabalhadores dos prévios operadores do serviço, constitui o exercício da liberdade que está acometida à entidade adjudicante pelo disposto no artigo 42º do CCP, maxime no seu n.6., designadamente no que toca à integração de condições de cariz social.
Todavia, é de salientar que essa obrigação de preferência nos termos em que está regulada não obriga os futuros adjudicatários / empregadores a assumir qualquer compromisso relativo à manutenção das condições/ direitos de trabalho que os trabalhadores detinham junto dos antigos operadores económicos; e sendo assim, não a constitui, obviamente, na obrigação de entregar os elementos a que alude o n.5 do artigo 4º do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, por serem inócuos à nova relação de emprego a constituir.
Destarte, reiterando a fundamentação expendida quanto à ausência de violação dos princípios da transparência, igualdade e concorrência no n.2 da cláusula 26º, conclui-se, também aqui, pela inexistência dessa violação nos n.ºs 3 a 9 da mesma cláusula.
Em suma, improcede a alegação das AA. a este propósito.
(…)”.
Ora, o julgamento supra vertido veio a ser confirmado pelo Tribunal Central Administrativo do Norte que, relativamente a esta questão, afirmou, além do mais, o seguinte:
“(…) Considerando o conteúdo do n.º2 da Cláusula 26.ª do CE, o que se retira da mesma é que aí se prevê que o cocontratante deverá suceder na posição contratual de empregador no caso de essa obrigação: (i) ser imposta pelos instrumentos de contratação coletivas; (ii) ser imposta pelo regime jurídico aplicável em caso de transmissão de unidade económica, previsto na Diretiva n.º 2011/23/CE, do Conselho, de 12 de março de 2001; (iii) ou ser imposta pelos artigos 285.º e seguintes do Código de Trabalho.
Caso essa obrigação não resulte de nenhuma destas situações, o n.º 2 da Cláusula 26.ª do CE também a não impõe, sendo por outro lado evidente, que os instrumentos de contratação coletiva aplcáveis, a Diretiva n.º 2011/23/CE e os artigos 285.º e ss do Código do Trabalho sempre se aplicariam, mesmo na ausência da referida cláusula do CE, donde forçoso é concluir que a Cláusula 26.ª não impõe ex novo qualquer obrigação ou encargo ao cocontratante que não resultasse já das normas legais aplicáveis.
Na verdade, se o CE nada previsse a este respeito, os regimes legais/ regulamentares em vigor continuariam a ser aplicáveis.
Como bem nota a apelada AMP, o regime laboral da transmissão de unidade económica previsto no Código do Trabalho “opera ope legis, ficando o adquirente da unidade empresarial sub-rogado ex lege, obrigatoriamente, na posição contratual do anterior titular” (vide AC. do TRP, de 05/03/2018, proc. n.º 430/13.8TTPRT.P1). E o mesmo se diga de regimes relativos à transmissão de trabalhadores constantes de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, desde que verificados os respetivos pressupostos de aplicação.
Em conclusão, o n.º2 da Cláusula 26.ª do CE não é inovador e apenas teve como intuito clarificar a articulação do regime previsto no n.º3 dessa Cláusula com o regime legal e normativo aplicável, limitando-se a acolher uma obrigação legal, sem que por essa via tivesse criado qualquer obrigação com a qual as Apelantes não devessem contar.
Trata-se de uma norma de conteúdo neutro, que se limita a remeter para o regime legal aplicável, não criando novas obrigações , pelo que não tem aplicação o disposto no n.º 5 do artigo 4.º do Regulamento(CE) n.º 1370/2007, que dispõe que “ sempre que as autoridades competentes exijam dos operadores de serviço público o cumprimento de determinados padrões sociais, os documentos relativos aos concursos e os contratos de serviço público devem incluir uma lista dos membros do pessoal em causa e fornecer informações transparentes relativas aos seus direitos contratuais e às condições nas quais os trabalhadores são considerados vinculados aos serviços”.
Refira-se ainda que, como bem considerou o Tribunal a quo, a aplicação do n.º 10 do artigo 285.º do Cód. Trabalho não tem qualquer impacto no âmbito do concurso ora em apreço. Na verdade, já era entendimento da jurisprudência, tanto europeia como nacional, a sustentação de uma noção flexível de ato translativo de estabelecimento, prescindindo de qualquer ato direto/imediato entre transmitente e transmissário.
Note-se ainda que, diferentemente do que sustentam as Apelantes, o regime de transmissão de trabalhadores não é automática, não sabendo a AMP e, bem assim, as Apelantes se haverá ou não uma tal transmissão, ficando a aplicação efetiva do regime em causa dependente de ser ou não, em cada hipotese, identificável uma “unidade económica” suscetível de transmissão, o que implica atender a um conjunto de indícios, enunciados na jurisprudência europeia e nacional.
Por fim, também não se vislumbra que tenham sido violados, designadamente, os princípios da transparência e da concorrência, uma vez que, conforme decorre de tudo o que se expendeu, a AMP não impõe nenhuma obrigação ao cocontratante de assunção dos contratos de trabalho dos atuais operadores, quer porque a existir essa obrigação a mesma é decorrente da vigência do bloco legal aplicável. E sendo assim, o disposto na Cláusula 26.ª, n.º2 do CE não acarreta para a AMP nenhuma obrigação de informação acrescida, sendo do risco próprio do cocontratante avaliar se, caso lhe venha a ser adjudicada a prestação do serviço, do seu interesse em adquirir ativos significativos ao atual titular do contrato em recrutar a totalidade ou parte do seu pessoal ou se será obrigado a fazê-lo e se eventualmente se encontrará numa situação de transferência de empresa ( ver Ac. do TJUE, de 25/01/2001, Oy Liikenne, processo n.º C-172/99, ECLI:EU:2001:59).
Como tal, a referida cláusula não contém qualquer previsão que coloque em crise os referidos princípios.
Em face do exposto, conclui-se pela falta de fundamento da invalidade assacada à Cláusula 26.ª do CE e, consequentemente, pela improcedência do invocado fundamento de recurso.
(…)” – cfr. Acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 1973/20.2BEPRT, de 03.12.2021.
Destarte, acolhendo a fundamentação legal supra transcrita à qual expressamente se adere, o Tribunal, conclui, sem necessidade de outros considerandos, pela improcedência das invalidades que a A. imputou à cláusula 26º n.2 e n.s 3 a 8 do caderno de encargos.
*
Em suma, ante a argumentação fáctica e legal expendida, não padecendo a norma impugnada das invalidades imputadas improcede a presente acção.
V. DISPOSITIVO
Pelo exposto, julgo:
(i) improcedentes as excepções invocadas;
(ii) improcedente a presente acção, por não provada, e em consequência absolvo a R. AMP do pedido.”
- fls. 1624 e ss. do processo 1125/21.4BEPRT.
61.
III.2. Factos não provados
Com relevância para a apreciação das questões que ao tribunal cumpre solucionar, não se provaram os factos que não constam em III.1.»
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III.B.DE DIREITO
A presente apelação vem interposta da sentença proferida pela 1.ª Instância na ação que as AA, ora Apelantes, moverem contra a Associação de Municípios do Porto (AMP) tendo em vista a impugnação da decisão de adjudicação proferida pela última relativamente ao Lote 4 do concurso público internacional para a “Contratação de serviço de transporte rodoviário de passageiros na Área Metropolitana do Porto Descrição sucinta do objeto do contrato: Prestação de serviços de transporte rodoviário de passageiros em relação aos quais a Área Metropolitana do Porto exerce funções de autoridade de transportes”, em que pediram, a título principal, a anulação da adjudicação á Contrainteressada- alínea a) do pedido- e a condenação da AMP a praticar ato de não adjudicação, com a consequente anulação do procedimento pré-contratual.
Subsidiariamente, pediram a condenação da AMP a retroceder no procedimento com nova aprovação das peças do procedimento expurgadas de putativas invalidades e adaptadas a supostos novos pressupostos económico-financeiros.
Por fim, formularam, a título subsidiário, pedido de exclusão da proposta adjudicada, por ter sido apresentada com preço anormalmente baixo.
Em sede de contestação, foram deduzidas as exceções da falta de interesse em agir, do caso julgado e a impropriedade do meio processual, que a 1.ª Instância julgou verificadas, tendo, em consequência, absolvido a AMP e as contrainteressadas da instância relativamente a alguns dos pedidos, e quanto aos demais pedidos subsistentes, julgado a ação improcedente.
Assim, vem delimitado nas respetivas conclusões de recurso, que as Apelantes refutam a sentença recorrida, por considerarem que aquela enferma do vício de nulidade previsto na alínea c), n.º1 do artigo 615.º do CPC e de erros de julgamento em matéria de direito:
(i) ao julgar procedentes: (a)a exceção de falta de interesse em agir (quanto ao exposto entre os artigos 3.º a 78.º da petição inicial aperfeiçoada e nas alíneas b) e d) do petitório das AA.); (b) a exceção de caso julgado (quanto ao exposto entre os artigos 84.º a 91.º e 93.º da petição inicial aperfeiçoada); (c) a exceção dilatória inominada de inadequação do meio processual (quanto ao exposto entre os artigos 79.º a 83.º da petição inicial aperfeiçoada e no articulado superveniente das AA.).
(ii) ao julgar improcedentes as invalidades/ilegalidades assacadas pelas AA. ao ato de adjudicação que não chegou a conhecer, obstado pelas exceções dilatórias que julgou procedentes, a saber: (i) A verificação de causas de exclusão, previstas nas alíneas e), f) e g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, da proposta das contrainteressadas/ agrupamento concorrente/adjudicatário do lote 4, “TB..., Lda.” e “TF..., Lda.”; (ii) A violação do artigo 285.º n.º 10 do Código do Trabalho; (iii) A verificação de causas de não adjudicação, previstas no artigo 79.º, n.º 1, alíneas c) e d), do CCP, emergentes da alteração das circunstâncias, por força dos efeitos emergentes da situação de Pandemia Covid-19; (iv) A ilegalidade da Cláusula 53ª, n.º 3 alínea i), n.º 4 alínea m), e n.º 5 alínea n), do Caderno de Encargos do Concurso Público em crise, julgada (e transitada em julgado) pelo TAF do Porto, e confirmada pelos TCA Norte e STA, sob o processo n.º 1973/20.2BEPRT e apensos, impressa no Ato de Adjudicação.
(iii) ao julgar improcedentes as restantes invalidades/ilegalidades do Ato de adjudicação em crise, apreciadas mas julgadas improcedentes pelo Tribunal a quo, a saber: (i) A verificação de causas de não adjudicação, previstas no artigo 79.º, n.º 1, alíneas c) e d), do CCP, emergentes da profunda alteração das circunstâncias atinentes às bases económico-financeiras subjacentes à decisão de contratar e à definição da regulação da execução contratual estabelecida no Caderno de Encargos e, por conseguinte, das bases económico-financeiras de que partiram os concorrentes aquando da apresentação das propostas, adveniente da superveniente e imprevista crise energética pelo impacto da invasão da Ucrânia pela Rússia, concretizada sobretudo no aumento dos preços dos combustíveis.
(iv) e ainda ao julgar improcedentes as peticionadas consequências de tais invalidades / ilegalidades, a saber: a) A anulação do Ato de adjudicação no Lote 4 e a anulação do correspondente contrato (prevenindo a hipótese de ter sido, entretanto, celebrado); b) A condenação da Ré em substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede em relação ao Lote 4, ou, subsidiariamente a b); c) A condenação da Ré ao reinício do procedimento concursal em relação ao Lote 4, com nova aprovação das peças do procedimento – se expurgadas das normas ilegais e se adaptadas aos novos pressupostos económico-financeiros – e a fixação de um novo prazo para a apresentação de propostas, anulando-se, neste caso, todos os atos praticados na e a partir da fase de apresentação de propostas, e subsidiariamente, pretendem a (v) exclusão da proposta do agrupamento concorrente/adjudicatário do lote 4, “TB..., Lda.” e “TF..., Lda.”.
Vejamos se lhes assiste razão.
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b.1. da nulidade da sentença, no que toca ao concreto segmento decisório em que se julgou procedente a exceção da falta de interesse em agir das AA. sobre a alínea b) do pedido principal: alínea c), n.º1 do artigo 615.º do CPC.
As Apelantes começam por assacar à sentença recorrida vício de nulidade, nos termos da alínea c), n.º1 do artigo 615.º do CPC, relativamente ao segmento decisório em que julgou verificada a exceção da falta de interesse em agir das mesmas quanto ao pedido principal deduzido sob a alínea b) do petitório, alegando para tanto que se constata uma certa ambiguidade e incoerência da sentença que resultam numa oposição entre os fundamentos e o decidido. A seu ver, a sentença recorrida é parcialmente nula nesse segmento decisório, por se constatar uma clara contradição entre a decisão contida na sentença recorrida e a sua fundamentação, asseverando que o “ raciocínio da Mm.ª Juiz aponta num sentido e, no entanto, decide em sentido oposto”.
Nesse sentido, aduzem que pediram, a título principal e na sequência do primeiro pedido de anulação do ato de adjudicação (do Lote 4 a Concurso), a condenação da Ré a substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede em relação ao Lote 4 (que corresponde ao pedido formulado em b) da petição inicial aperfeiçoada). E afirmam que em relação a este pedido, o Tribunal a quo julgou pela falta de interesse em agir das AA., por considerar que:
“as AA., em primeira linha (quanto a b)), apenas pretendem a remoção da ordem jurídica, ou como sustentam a ED e as contrainteressadas, a destruição do procedimento concursal” […] “Isto é, pretendem que o efeito reconstitutivo da anulação do ato de adjudicação (e do contrato) se reconduza, apenas e só, à não adjudicação com a inerente eliminação do procedimento concursal e, só subsidiariamente, no caso de improcedência, é que pugnam pela abertura de um novo procedimento concursal, ao qual poderão apresentar nova proposta.”
“Considerando o exposto, não há que fazer assentar o interesse em agir das AA. quanto ao pedido formulado em b) num efeito que não foi por elas pretendido, qual seja o de haver lugar a um novo procedimento concursal (ou reinício do concurso em causa nos autos) ao qual poderão apresentar proposta.”
Na realidade a possibilidade de apresentar nova proposta num novo procedimento apenas existe relativamente à pretensão deduzida (subsidiariamente) em c) do petitório.”
Ou seja, na leitura que fazem da sentença recorrida, sustentam que o Tribunal a quo considerou que só haveria interesse em agir no pedido das AA., formulado a título subsidiário, de condenação ao reinício (ao invés da anulação) do procedimento concursal, porque apenas com o reinício não se pretende a destruição do concurso e, bem assim, a manutenção eterna do status das AA. de operadoras de parte daquele serviço da AMP ao abrigo de autorizações provisórias.
Acontece que, o Tribunal a quo também fundamenta e admite, em simultâneo, que: o procedimento concursal em causa nos autos tem como objetivo a legalização da exploração do serviço de transportes públicos assente num procedimento adjudicatório conforme aos princípios gerais de contratação pública e a conformação com as imposições que para o Estado Português emergem do ordenamento jurídico comunitário”, referindo ser inegável que, por um lado, considerando as obrigações que emergem do Regulamento (CE) 1370/2007, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, que impõe que a adjudicação de contratos de serviço público de transporte ferroviário e rodoviário deve dar cumprimento ao disposto no Regulamento a partir de 3 de dezembro de 2019 (…) e, por outro, que atualmente o mercado de transportes coletivos na Área Metropolitana do Porto não obedece a tais exigências legais, assentando em autorizações provisórias cujo limite é 3.12.2023, que a entidade adjudicante não perdeu o interesse em contratar subjacente à decisão de contratar tomada”.
Ora, partindo destes trechos da sentença recorrida, as Apelantes afirmam que estando o discurso fundamentador do Tribunal a quo expresso na sentença direcionado no sentido de que o resultado prático e necessário do peticionado em b) e em c) do petitório das AA. é igual, não pode reconhecer interesse em agir das AA. apenas quanto a um destes pedidos. Uma tal decisão, na perspetiva das Apelantes, tem como consequência a verificação de uma situação de ambiguidade, obscuridade e oposição entre os fundamentos explanados na sentença (págs. 189-196) e a decisão tomada a final acrescida da conclusão por abuso de direito das AA. (1.º ao 5.º parágrafo da pág. 197 da sentença recorrida).
As Apelantes sustentam ainda a nulidade da sentença num fundamento adicional relativo ao trecho em o Tribunal a quo suprime o direito das AA. a fazerem valer em juízo a pretensão deduzida em b) do petitório com base no abuso de direito.
As Apelantes preconizam que, se a pretensão de reinício do mesmo procedimento concursal (alínea c) do petitório) constitui exercício normal e legítimo do direito pelas AA., então a pretensão de não adjudicação com consequente anulação do presente procedimento concursal (alínea b) do petitório) nunca poderá constituir atuação anormal ou ilegítima das mesmas. Ademais, adiantam que, na medida em que ficou demonstrado que o objetivo com o qual foi (e é) peticionada a referida anulação do presente procedimento concursal não é o da manutenção ad eternum de um status quo que sabem só existe provisoriamente, mas antes o da possibilidade de apresentação de nova proposta (como em c), mas num novo concurso obrigatoriamente a lançar), o vício de nulidade da decsião é evidente.
Nessa conformidade, concluem que, quer no pedido que formulam a título subsidiário- alínea c) do petitório - quer no pedido que formulam a título principal- alínea do b) do petitório- se permite assentar o interesse em agir das Apelantes, porquanto a utilidade/vantagem a retirar é a mesma: a apresentação de nova proposta, seja no âmbito do novo concurso a lançar obrigatoriamente in casu de anulação/destruição deste, seja no âmbito do mesmo concurso reiniciado/retrocedido, resulta inequivocamente da fundamentação do Tribunal a quo.
Será assim?
Nos termos da alínea c), n.º 1 do artigo 615.º do CPC é nula sentença quando « Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível».
Salvo o devido respeito, afigura-se-nos que não ocorre a invocada nulidade parcial da sentença recorrida por ambiguidade, obscuridade e oposição.
No despacho de sustentação, a Senhora juiz a quo afirma resultar da senteça recorrida que o Tribnal a quo julgou verificada a falta de interesse em agir no que respeita, para o que ora interessa, em relação ao pedido de condenação da Ré a substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede em relação ao Lote 4 (pedido formulado em b) da p.i. aperfeiçoada, que as AA. ancoraram o seu interesse em agir numa pretensão – a possibilidade de puderem vir a participar num novo procedimento - que não formularam (ou melhor, que só formularam subsidiariamente, em caso, pois, de não procedência deste pedido).
Com efeito, porque as AA. a este respeito apenas peticionaram a não adjudicação e a anulação do procedimento concursal, sem daí fazer emergir que essa anulação conduziria necessariamente à abertura de novo procedimento concursal ao qual poderiam apresentar proposta, afirma que naturalmente não podia o Tribunal a quo considerar que a pretensão fora deduzida visando algo mais do que a não adjudicação e a mera anulação do procedimento concursal.
Em segundo lugar, sustenat que o Tribunal a quo considerou que as AA. não dispunham de interesse em agir assente na invocada a possibilidade de permanecerem incumbentes de parte do serviço público que é objeto do Concurso por não se tratar de um interesse atual e efetivo e legítimo.
Aduz, que a 1.ª Instância fundamentou o seu juízo: (i) na asserção que o interesse que as AA. alegam salvaguardar – o de se manterem na exploração do serviço público de transporte de passageiros - não emerge diretamente da anulação do ato de adjudicação e da destruição do procedimento concursal, mas sim do ato administrativo que determina a prorrogação das autorizações provisórias; (ii) à luz do Regime Jurídico do Serviço Público de Transporte de Passageiros o invocado interesse a manterem-se na exploração do serviço ao abrigo das autorizações provisórias não tem cobertura legal, mostrando-se como um meio enviesado de as AA. obstarem ao exercício pela Administração das suas incumbências legais de regulação e contratualização da exploração do serviço público de transporte de passageiros e se manterem num status quo que é meramente provisório; (iii) ainda que se aceitasse o direito a deduzirem em juízo a pretensão - que, repete-se, ao contrário do que as recorrentes na sede recursiva pretendem fazer crer, não foi no sentido de (por via da não adjudicação e da anulação do procedimento) determinar a abertura de um novo procedimento, mas apenas e só de não adjudicar e in limine anular o procedimento concursal -, as AA. agiriam em abuso de direito por tal se destinar apenas “a manter ad eternum um status quo que sabem só existe provisoriamente ao abrigo de uma prorrogação administrativa cujo limite temporal se encontra na execução do contrato objeto do presente Concurso ou, no máximo, em 3 de dezembro de 2023 e que não desconhecem que não se coaduna com as exigências legais que emergem da Lei 52/2015 e do ordenamento jurídico comunitário”.
Conclui que as Apelantes, para sustentar a nulidade ao decidido em relação à falta de interesse em agir em relação ao pedido referido em b), querem convencer que foram mais longe do que aquilo que efetivamente peticionaram, mas tal como se refere na sentença recorrida: “Note-se que foram as próprias AA. a deduzirem as pretensões referenciadas em b) e c) subsidiariamente. Assim sendo, tal significa que as AA., em primeira linha (quanto a b)), apenas pretendem a remoção da ordem jurídica, ou como sustentam a ED e as contrainteressadas, a destruição do procedimento concursal que tem por objeto a “Aquisição do serviço público de transporte rodoviário de passageiros na Área Metropolitana do Porto” relativamente ao Lote 4. Isto é, pretendem que o efeito reconstitutivo da anulação do ato de adjudicação (e do contrato) se reconduza, apenas e só, à não adjudicação com a inerente eliminação do procedimento concursal e, só subsidiariamente, no caso de improcedência, é que pugnam pela abertura de um novo procedimento concursal, ao qual poderão apresentar nova proposta.”
E, em síntese, adianta ser desta diferença – quanto às efetivas pretensões deduzidas pelas recorrentes - que emerge a decisão do Tribunal quanto à falta de interesse em agir no que concerne ao pedido de “substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede em relação ao Lote 4”, opostamente ao que sucede quanto ao pedido subsidiário de “Ser determinado o reinício do procedimento adjudicatório relativo ao Lote 4, com nova aprovação das peças do procedimento – se expurgadas das supra referidas normas ilegais e se adaptadas aos novos pressupostos económico- financeiros - e a fixação de um novo prazo para a apresentação de propostas, anulando-se, neste caso, todos os atos praticados na e a partir da fase de apresentação de propostas”.
Recorda a que nem tal exceção quanto ao pedido subsidiário da al. c) foi deduzida pela Entidade Demandada e contrainteressada, nem o Tribunal sequer apreciou o interesse em agir quanto a tal pedido.
E com razão.
Prima facie, é categórico que os pedidos formulados nas alíneas b) e c) do petitório são, efetivamente, distintos quanto aos seus efeitos, e não provêm da mesma causa de pedir, não se subsumindo um no outro. Aliás, se assim fosse, não vê qual a utilidade da formulação, a título subsidiário, do pedido contido na alínea c).
Para melhor compreensão da diversa natureza dos pedidos formulados sob aquelas alíneas não é despicienda a consideração do conteúdo normativo das alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 79.º do Código dos Contratos Públicos, como bem sinaliza a Apelada AMP, sabendo-se que o artigo 79.º, n.º 1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos está na base do pedido formulado na alínea b) do petitório da petição inicial. E embora o artigo 79.º, n.º 1, alínea c), do Código dos Contratos Públicos não esteja na base do pedido formulado na alínea c) do petitório, esta distinção afigura-se relevante.
A este respeito, porque doctiquamente estrururadas, transcrevemos as considerações que a este respeito a Apelada AMP adianta nas respetivas alegações e que, por isso, nos dispensamos de reescrever:
«Ambas as disposições do Código dos Contratos Públicos apresentam soluções totalmente distintas. A grande diferença que se regista entre o artigo 79.º, n.º 1, alíneas c) e d), do Código dos Contratos Públicos é a de que:
a) Enquanto na primeira (alínea c)) “a entidade adjudicante mantém o interesse em celebrar o contrato, embora identifique um aspeto fundamental que deve ser alterado nas peças do procedimento” (daí a consequência prevista no artigo 79.º, n.º 3, do Código dos Contratos Públicos),
b) Já ao abrigo do artigo 79.º, n.º 1, alínea d), “a entidade adjudicante não tem sequer interesse em celebrar o contrato, pelo que pretende interromper o procedimento sem o substituir por um novo”; “simplesmente não pretende mais celebrar o contrato”, “em razão de uma insusceptibilidade superveniente do negócio projetado para satisfação da necessidade coletiva que inicialmente justificou a decisão de contratar”, daí resultando apenas as consequências indemnizatórias que constam do artigo 79.º, n.º 4, do Código dos Contratos Públicos (cfr. PEDRO F. SÁNCHEZ, Direito da contratação pública, Vol. II, AAFDL, 2020, pp. 387, 388).
Dito de outro modo, a decisão de não adjudicação fundada no artigo 79.º, n.º 1, alínea c), “não é propriamente uma decisão de desinteresse no contrato, mas de interesse num contrato parecido com aquele”; quando fundada no n.º 1, alínea d), “o desinteresse pela celebração do contrato assume natureza definitiva, ou pelo menos, no momento em que a decisão é tomada, terá de ser essa a avaliação feita pela entidade adjudicante” (cfr. MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito dos contratos públicos, Vol. I, AAFDL, 2022, p. 531).
Lapidarmente: no quadro do artigo 79.º, n.º 1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos, “a lei autoriza o órgão adjudicante a abandonar o procedimento e desonera-o de lançar novo procedimento que substitua aquele. Está aqui presente um cenário de «desistência do contrato», de abdicação ou de desistência de uma aquisição que se idealizou efetuar” (cfr. PEDRO C. GONÇALVES, Direito dos contratos públicos, 5.ª Edição, Almedina, 2021, p. 940).
A argumentação escalpelizada pelas Apelantes com o objetivo de verem anulada a sentença recorrida, o que revela é que as mesmas não compreendem a apontada diferença de consequências, e, daí sustentarem que as alíneas b) e c) conduzem ao mesmo resultado.
Refuta-se o entendimento das Apelantes, expresso no artigo 14.º das suas alegações, segundo o qual a aplicação do artigo 79.º, n.º 1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos não determina “a condenação da entidade pública adjudicante ao expurgo de normas ilegais/vícios das peças concursais” e que não conduz “à nova fase de apresentação de propostas com base nas peças expurgadas”.»
Com efeito, por intermédio dessa disposição legal, uma vez decidida a não adjudicação e a anulação de todo o procedimento, a AMP, e os municípios que a compõem, no âmbito da sua discricionariedade, poderiam optar entre: (i) voltar a chamar a si- municípios- a competência para assegurar o transporte municipal, caso em que não volta a ser aberto um concurso como o vertente; (ii) a AMP proceder à gestão direta dos serviços em causa; (iii) em alternativa, concluir-se que no futuro seria mais adequado adotar um modelo distinto, v.g. a exploração através da atribuição a um operador interno (através da constituição de um novo operador interno, atribuindo-lhe a exploração do serviço) ou até adotar um modelo contratual distinto, que não o da prestação de serviços (a concessão).
Trata-se de soluções possíveis, no quadro do Regulamento (CE) 1370/2007, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro (cfr. e.g. artigos 2.º, alínea i), e 5.º, n.º 2), e da Lei n.º 52/2015, de 9 de junho (cfr. e.g. artigos 16.º, n.º 1, alíneas a) e b), subalínea i), 17.º, 19.º, e 20.º, n.º 1).
Ou seja, dito de modo mais atido, é incontornável que mesmo que fosse procedente o pedido formulado na alínea b) do petitório, a AMP nunca estaria vinculada e nunca poderia ser “condenada” a abrir um novo procedimento idêntico, expurgado de supostas invalidades, a que as Apelantes pudessem apresentar proposta. Ademais, as Apelantes não formularam tal pedido condenatório na alínea b) do petitório.
O Tribunal a quo, discorrendo, aliás, com elevada profundidade, compreendeu corretamente a difereça entre os pedidos formulados sob as alíneas b) e c) do petitório.
Ademais, sempre se dirá que se a primeira intenção das AA. era obterem a condenação da AMP a abrir um novo procedimento concursal, expurgado das supostas invalidades, então deviam (e estavam vinculadas) a formular essa pretensão, e a pedi-lo fora do quadro legal do artigo 79.º, n.º 1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos, que não o consente, por não produzir tais efeitos.
Acresce que, diversamente do que alegam no artigo 21.º das alegações de recurso, o efeito do artigo 79.º, n.º 1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos é a revogação da decisão de contratar (cfr. artigo 80.º, n.º 1). Pelo que, como bem nota a Apelada « se, eventualmente e por hipótese, no quadro das opções discricionárias acima elencadas, a AMP viesse a decidir abrir um novo procedimento de aquisição de serviços como o que está em causa nos presentes autos, ele seria isso mesmo: um novo procedimento, com nova decisão de abertura do procedimento, com nova autorização de despesa. E não o mero retrocesso no mesmo procedimento até ao momento da aprovação das peças do procedimento, através da aprovação de novas peças expurgadas das supostas invalidades (analisado o pedido formulado na alínea c) do petitório verifica-se que ele não se reconduz ao artigo 79.º, n.º 1, alínea c), do Código dos Contratos Públicos, porquanto esta disposição legal também implica a revogação da decisão de contratar e a abertura de um novo procedimento no prazo de 6 meses, i.e. a adoção de não decisão de contratar; ora, não é isso que as Recorrentes peticionaram na alínea c) do petitório: aí pediram, apenas, o retrocesso neste procedimento, com a nova aprovação de peças de procedimento, e não com a adoção de uma nova decisão de contratar)»
Quanto à referência que o Tribunal a quo faz aos objetivos a que se refere o Regulamento (CE) 1370/2007, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro, e a Lei n.º 52/2015, de 9 de junho, mais não pretendeu do que afirmar que o interesse expresso das Apelantes em continuar a beneficiar das autorizações provisórias é ilegítimo, podendo até configurar uma situação de abuso de direito, e bem assim, demonstrar que a AMP mantém interesse na adoção de uma decisão de adjudicação deste procedimento, não se tendo alterado os pressupostos da decisão de contratar.
Pelo que, sob a égide do entendimento sufragado na sentença recorrida, não há nenhuma contradição ou obscuridade da sentença.
Adicionalmente, as Apelantes impetram à sentença recorrida obscuridade com o argumento de que nunca afirmaram ter interesse processual por deterem autorizações provisórias, o que, não é rigoroso, conforme se colhe do que expressamente alegaram na sua réplica (vide artigos 7.º, 8.º e 9.º da réplica), que se transcreve:
“Em primeiro lugar, o interesse em agir se extrai da formulação de pretensões condenatórias pelas Autoras, além da pretensão impugnatória formulada no petitório,
Bem como do conteúdo e alcance das pretensões condenatórias formuladas, porquanto na procedência de qualquer destas [b), c) ou d) do petitório] as 3 Autoras terão a possibilidade de prestar/explorar o serviço público que é objeto do Concurso em crise:
Ora, assim é porque permanecerão incumbentes de parte do serviço público que é objeto do Concurso em crise (ao abrigo das autorizações provisórias vigentes) até poderem apresentar nova(s) proposta(s), ao Lote 4 (e/ou a outros Lotes1), no novo concurso lançado ou no concurso reiniciado, expurgado das ilegalidades que atualmente o ferem”.
Aspeto que reforçam nos artigos 65.º a 70.º da réplica:
Acresce, por fim, cf. preliminarmente também já se enunciou, que em caso de lançamento de novo concurso ou de reinício,
Ou seja, em caso de procedência das alíneas b) ou c) do petitório (das Autoras),
As aqui Autoras permanecerão incumbentes/operadoras de parte do serviço público objeto do Concurso, à luz das autorizações provisórias em vigor, prorrogadas pela AMP (em 15/11/2021),
Que se mantêm “válidas até à conclusão dos procedimentos contratuais para a seleção de operadores de serviço público de transporte de passageiros e não excedendo o prazo máximo de dois anos” (veja-se o Documento n.º ... que ora se junta).
Ou seja, as Autoras permanecerão incumbentes até à conclusão do procedimento em curso devidamente reiniciado ou do forçoso lançamento de um novo Concurso (a ter lugar até a data de 15/11/2023), que tem por objeto o mesmo serviço público, no qual – repete-se – poderão apresentar propostas,
Do que, por si só, se permite aferir de imediato a reflexa existência de uma lesão real, atual e efetiva (ou, pelo menos, iminente) de direitos e interesses legalmente protegidos das Autoras,
No sentido de evitar o ato de adjudicação (ilegal) do serviço público, que é prosseguido pelas Autoras”.
Por fim, verifica-se que mesmo no artigo 95.º das alegações, as Apelantes voltam a afirmar o mesmo (“Em todo o caso sempre se diga que, em bom rigor, as AA. sempre ficarão/permanecem “imediatamente” incumbentes do serviço ao abrigo das referidas autorizações provisórias de exploração...até ao lançamento de novo Concurso, ou até ao reinício do mesmo Concurso, ou até a reclassificação da sua proposta”).
Deste modo, é forçoso concluir que foram as Apelantes quem pretendeu estear o interesse em agir no interesse em manter as referidas autorizações, limitando-se o Tribunal a quo, e bem, a decidir não existir nenhuma ligação entre o interesse em manter ad æternum as autorizações e a procedência ou improcedência da ação, sendo certo que, as autorizações provisórias caducam no primeiro dos seguintes momentos: (i) quando o novo prestador de serviço iniciar a operação; (ii) em 03/12/2023 – vide ponto 42. do elenco dos factos provados).
Logo, também por este ângulo, não vislumbramos que exista qualquer obscuridade no decidido, sendo clara a razão pela qual, neste conspecto, o Tribunal a quo considera que as ora Apelantes não têm interesse em agir quanto ao pedido formulado na alínea b) do petitório da petição inicial
Sublinhe-se também que o facto de o Regulamento (CE) 1370/2007, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro, e a Lei n.º 52/2015, de 9 de junho, conferirem cobertura legal ao procedimento vertente, e a circunstância de o procedimento em apreço contribuir para alcançar o desiderato daqueles diplomas, não implica, como já se teve ensejo de expressar, que o procedimento concursal com vista à adjudicação de um contrato de prestação de serviços seja a única via de alcançar os objetivos daqueles diplomas. Existem outras soluções ao dispor da AMP, e dos municípios que a compõem, para assegurar a prestação de transporte rodoviário coletivo de passageiros, pelo que também por este prisma a sentença recorrida não merece qualquer reparo.
Ao contrário do invocado no artigo 32.º das alegações de recurso, o Tribunal a quo nunca afirmou ou, sequer, sugeriu que com a procedência do pedido de condenação da AMP na adoção de decisão de não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede (alínea b) do petitório da petição inicial) a AMP ficaria vinculada a lançar novo concurso.
O que bem se compreende que não tenha afirmado, uma vez que, não só essa questão não lhe foi colocada na p.i., como porque o Tribunal a quo não desconhece os limites decorrentes do princípio da separação de poderes, que não permite aos Tribunais substituirem-se às escolhas discricionárias da Administração Pública (cfr. o disposto no artigo 3.º, n.º 1, no artigo 71.º, n.º 2, e no artigo 91.º, n.º 5, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).
É que, a decisão sobre como prosseguir o interesse público, caso fosse procedente tal pedido, era uma escolha discricionária da AMP, conforme acima demonstrado, por aplicação do Regulamento (CE) 1370/2007, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro (cfr. e.g. artigos 2.º, alínea i), e 5.º, n.º 2), e da Lei n.º 52/2015, de 9 de junho (cfr. e.g. artigos 16.º, n.º 1, alíneas a) e b), subalínea i), 17.º, 19.º, e 20.º, n.º 1).
Ora, como já resulta de forma claramente escalpelizada, o Tribunal a quo decidiu pela falta de interesse em agir no pedido formulado na alínea b) do petitório e pela existência de um interesse em agir no pedido formulado na alínea c) do petitório, precisamente porque os pedidos são diferentes, pelo que, não se verifica qualquer ambiguidade, obscuridade ou oposição entre os fundamentos da sentença e a decisão ali tomada.
No que respeita à matéria do abuso de direito enunciado na sentença recorrida, partilhamos da posição manifestada pela Apelada AMP, no sentido de que «não se compreende que nulidade lhe é assacada pelas Apelantes. Tal abuso de direito – pretender a anulação do concurso como modo de alcançar a perpetuidade das autorizações provisórias – teria, efetivamente, lugar caso fosse de reconhecer às Apelantes o interesse em agir»
Improcedem, pois, todas as nulidades assacadas à sentença sob sindicância.
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DOS ERROS DE JULGAMENTO
b.2. da falta de interesse em agir quanto ao pedido formulado sob a alínea b) do petitório
Nas conclusões de recurso formuladas sob as alínea J. a J.12. as Apelantes impetram à sentença recorrida erro de julgamento no segmento em que deu por verificada a exceção da falta de interesse em agir das AA. relativamente ao pedido principal formulado sob a alínea b) do petitório.
Sustentam que o Tribunal a quo distorceu a utilidade prática que se permite retirar da alínea b) do petitório, e procedeu a uma interpretação errada dos factos aduzidos pelas AA. a propósito de tal utilidade/vantagem pretendida, aplicando mal o direito, na medida em que restringiu a amplitude e o alcance do pressuposto processual do interesse em agir previsto no CPTA e consolidado na jurisprudência nacional.
Propugnam que da própria jurisprudência do TJUE, se extrai a existência de interesse em agir quanto ao pedido formulado na alínea b) do seu petitório, porquanto “[o] Tribunal de Justiça da União Europeia vem adotando orientação no sentido do artigo 1.º, n.º 1, 3.º parágrafo, e n.º 3, da Diretiva 2007/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 11 de dezembro de 2007, deverem ser interpretados no sentido de se reconhecer interesse em agir a qualquer concorrente que tenha visto a sua proposta ser excluída, ainda que seja de manter tal decisão, na impugnação da decisão de adjudicação e pretensão de ver excluídas as demais propostas, desde que seja equacionável a possibilidade de abertura de um novo procedimento e de poder participar no mesmo, no qual poderá obter a adjudicação do contrato- Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 20/01/2022, proc. 1119/21.0BELRA.
Ou seja, na ótica das Apelantes, impõe-se reconhecer interesse em agir a qualquer concorrente mesmo quando a abertura de um novo procedimento e a participação no mesmo (no qual poderá obter a adjudicação do contrato) seja apenas uma possibilidade equacionável.
Nesta esteira, o interesse em agir só poderá ser afastado -sem desrespeitar a doutrina que decorre da jurisprudência do TJUE citada- quando o benefício esperado pelo impugnante/recorrente é impossível, pelo que só há margem para a discussão sobre afastamento/inexistência de interesse em agir quando a abertura de um novo concurso não seja obrigatória, citando em apoio desta tese, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 02/12/2021, proc. 484/21.3BELRA.
Sob esta égide, preconizam que se a existência de interesse em agir é ainda suscetível de ser concedida naqueles casos em que a utilidade/benefício/vantagem jurídica prática a retirar da ação é eventual mas é possível … não existe margem para se interpretar -como erradamente fez o Tribunal a quo- no sentido da falta de interesse em agir em casos, como o dos autos, em que a utilidade a retirar da pretensão é, além de possível, certa (uma vez que o lançamento de um novo procedimento é obrigatório em caso de anulação do presente, porque tal é imposto por lei).
Ademais, sustentam que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quando interpretou, erradamente, que a utilidade/vantagem pretendida pelas AA. na formulação da pretensão de anulação do presente procedimento concursal era a da manutenção ad eternum das autorizações provisórias sob as quais prestam atualmente aquele serviço na AMP,uma vez que é facto consabido, notório e incontornável que aquelas autorizações são somente provisórias, tendo por limite temporal fixado o dia 3 de dezembro de 2023 ou até à entrada em funcionamento do operador no novo contrato de serviço público celebrado com a Área Metropolitana do Porto, na sequência de procedimento concorrencial, consoante a data que ocorrer primeiro.
Neste sentido, observam que as próprias, sempre aduziram, ao longo do iter processual, no sentido do respeito pelo carácter transitório deste facto, bem como da consciência do necessário/obrigatório lançamento de um novo concurso, em caso de anulação deste (vejam-se os artigos 9.º, 12.º, 25.º, 65.º-69.º da réplica apresentada pelas AA. aos autos).
O que dizer?
Pretendem as Apelantes que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao considerar que não tinham interesse em agir quanto ao pedido formulado na alínea b) do petitório.
Nesta alínea, as AA., ora Apelantes, pediram, a título principal: “A condenação da Ré a substituir a decisão de adjudicação por outra que determine a não adjudicação, com a consequente anulação de todo o procedimento concursal que lhe precede em relação ao Lote 4”.
Este pedido, e o seu confronto com o pedido subsidiário formulado na alínea c) do petitório convoca, como supra tivemos ensejo de referir, aquando da apreciação do vício de nulidade da sentença, o artigo 79.º, n.º 1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos.
Ora, justapondo os termos em que o pedido principal da alínea b) do petitório se encontra formulado, com o teor do pedido deduzido subsidiariemente na alínea c), e com a disciplina normativa da alínea d) do n.º1 do artigo 79.º do Código dos Contratos Públicos, resulta que a pretensão formulada pelas AA. naquela alínea b), visa tão só a destruição do procedimento concursal em causa, não resultando desse pedido que pretendam a adjudicação do contrato concursado à sua proposta, ou que a AMP seja condenada abrir novo procedimento em que possam apresentar proposta. Apenas na alínea c) do petitório pretendem, subsidiariamente, que o procedimento seja retomado a partir da fase de aprovação das peças do procedimento e, então, obter uma nova oportunidade de apresentar proposta.
Em boa verdade, no pedido formulado na alínea b) do petitório, as Apelantes almejam apenas que o procedimento concursal seja extinto, e nada mais.
Como vimos, e se repete, enquanto na hipótese que consta do artigo 79.º, n.º 1, alínea c), “a entidade adjudicante mantém o interesse em celebrar o contrato, embora identifique um aspeto fundamental que deve ser alterado nas peças do procedimento”, e daí a consequência prevista no artigo 79.º, n.º 3, do Código dos Contratos Públicos, já ao abrigo do artigo 79.º, n.º 1, alínea d), “a entidade adjudicante não tem sequer interesse em celebrar o contrato, pelo que pretende interromper o procedimento sem o substituir por um novo”; “simplesmente não pretende mais celebrar o contrato”, “em razão de uma insusceptibilidade superveniente do negócio projetado para satisfação da necessidade coletiva que inicialmente justificou a decisão de contratar”, daí resultando apenas as consequências indemnizatórias que constam do artigo 79.º, n.º 4, do Código dos Contratos Públicos (cfr. PEDRO F. SÁNCHEZ, Direito da contratação pública, Vol. II, AAFDL, 2020, pp. 387, 388).
Neste sentido, veja-se MIGUEL ASSIS RAIMUNDO - in Direito dos contratos públicos, Vol. I, AAFDL, 2022, p. 531) - para quem a decisão de não adjudicação fundada no artigo 79.º, n.º 1, alínea c), “não é propriamente uma decisão de desinteresse no contrato, mas de interesse num contrato parecido com aquele”; quando fundada no n.º 1, alínea d), “o desinteresse pela celebração do contrato assume natureza definitiva, ou pelo menos, no momento em que a decisão é tomada, terá de ser essa a avaliação feita pela entidade adjudicante”.
Com interesse, também PEDRO C. GONÇALVES- in Direito dos contratos públicos, 5.ª Edição, Almedina, 2021, p. 940) – sustenta que âmbito do artigo 79.º, n.º 1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos, “a lei autoriza o órgão adjudicante a abandonar o procedimento e desonera-o de lançar novo procedimento que substitua aquele. Está aqui presente um cenário de «desistência do contrato», de abdicação ou de desistência de uma aquisição que se idealizou efetuar”.
Pelo que, sob a égide deste entendimento, que também perfilhamos, a conclusão que se retira é a que de que, em caso de procedência do pedido formulado na alínea b) do petitório, as Apelantes ficariam exatamente na situação jurídica em que hoje se encontram: (i) não foram adjudicatárias, não têm direito a celebrar e executar o contrato; (ii) sendo este pedido procedente, mantêm a situação de não ser adjudicatárias e de não ter direito a celebrar e executar o contrato. E com a procedência desse pedido também não ficam com a possibilidade de alguma vez virem a ser adjudicatárias dos serviços que a AMP pretende contratar.
É consabido que a existência de um interesse em agir afere-se por referência ao conteúdo da petição inicial, em função das vantagens e dos benefícios que o autor alega poderem advir-lhe da procedência dos pedidos, devendo os efeitos decorrentes dessa procedência repercutir-se, de forma direta e imediata, na sua esfera jurídica.
Em concreto, como bem elucida TEIXEIRA DE SOUSA - in As Partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa, Lex, 1995, p. 98-: “apenas comparando a situação em que a parte (activa ou passiva) se encontra antes da propositura da acção com aquela que existirá se a tutela for concedida, se pode saber se isso representa um benefício para o autor e uma desvantagem para o réu”. Ou como assinala CASTRO MENDES, TEIXEIRA DE SOUSA, in Manual de Processo Civil, Vol. I. AAFDL, 2022, p. 343- : “Esta avaliação pressupõe uma comparação das situações que existem antes e depois da concessão daquela tutela jurisdicional. Assim, o autor tem interesse em demandar quando, relativamente à situação em que se encontra antes do processo, aquela tutela lhe atribuir uma vantagem”.
Siginifica tal que o interesse em agir reclama um benefício direto do efeito jurídico pretendido, pelo que, conforme sustentam ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA, PIRES DE SOUSA - Código de Processo Civil anotado, Vol. I, Almedina, 2018, p. 59- será “irrelevante para o efeito um mero interesse indireto, reflexo ou mediato, ou ainda mais um interesse diletante ou de ordem moral ou académica”».
Precise-se que tratando-se da impugnação de atos administrativos, como sucede in casu, tem legitimidade “quem alegue ser titular de um interesse direto e pessoal, designadamente por ter sido lesado pelo ato nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos” (artigo 55.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos) (cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual de processo administrativo, 6.ª Edição, Almedina, 2022, p. 236). Ora, pese embora o interesse processual ou o interesse em agir não se confunda com a legitimidade, por exigir que, além da legitimidade, se apure a ocorrência de “uma efetiva necessidade de tutela judiciária” (cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual, cit., p. 238), o interesse em agir assume-se igualmente como um pressuposto processual.
No caso da impugnação de atos, a distinção entre legitimidade e interesse processual esbate-se, por o segundo parecer estar subsumido no primeiro.
Como refere a Apelada AMP, «é pressuposto da legitimidade ter “um interesse atual e efetivo em pedir a anulação ou a declaração de nulidade do ato que é impugnado”; “trata-se de saber se o impugnante se encontra numa situação efetiva de lesão que justifique a utilização do meio impugnatório”; “Em tese geral, o Supremo Tribunal Administrativo tem sufragado o entendimento de que o interesse direto deve ser apreciado, por referência ao conteúdo da petição inicial, em função das vantagens que o impugnante alega poderem advir-lhe da anulação do ato, sendo que «os efeitos decorrentes da anulação devem repercutir-se, de forma direta e imediata, na esfera jurídica do impugnante». Tem, assim, legitimidade para impugnar quem «espera obter da anulação do ato impugnado um certo benefício e se encontra em condições de o poder receber», sendo o interesse direto desde que «de repercussão imediata na esfera do interessado»” (cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual, cit., pp. 237-239, 234; cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 25 de novembro de 2015, processo n.º 01131/15; Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 29 de janeiro de 2015, processo n.º 06242/10, disponíveis em www.dgsi.pt).
Também VIEIRA DE ANDRADE é claro ao afirmar que o Código, “quando está em causa a impugnação de um ato administrativo (...) não exige aos particulares, quanto aos pedidos impugnatórios, a titularidade de uma posição jurídica subjetiva substantiva, bastando-se com a existência de um interesse direto e pessoal na invalidação do ato” (cfr. A justiça administrativa. Lições, 19.ª Edição, Almedina, 291). Mais indica o Autor que o interesse em agir “exige a verificação objetiva de um interesse real e atual, isto é, da utilidade na procedência do pedido” (p. 295).
Este entendimento, já antigo, mantém-se no presente: “O interesse em agir assume-se como uma relação entre necessidade e adequação: de necessidade dado que para a solução do conflito é imprescindível a actuação jurisdicional; de adequação porque o trilho a seguir deve corrigir a lesão perpetrada ao autor tal como ele a configura” (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21 de março de 2019, processo n.º 317/18.8BELSB-A, disponível em www.dgsi.pt; cfr., igualmente, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 14 de julho de 2015, processo n.º 0549/15, disponível em www.dgsi.pt).
Efetivamente, “O interesse em agir consiste, essencialmente, na necessidade de utilizar o processo para fazer valer uma pretensão, «exige-se, por força dele, uma necessidade justificada, razoável, fundada, de lançar mão do processo ou se fazer prosseguir a ação – mas não mais do que isso» (cfr. Varela, Antunes, Bezerra, J. Miguel e Nora, Sampaio e, “Manual de Processo Civil”, 2.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 1985, p. 181), [necessidade essa], que só existe quando o interessado puder retirar do processo uma vantagem imediata para si” (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 21/05/2021, processo n.º 00648/20.7BELRA, disponível em www.dgsi.pt).»
Em suma, em consonância com o exposto, pode seguramente afirmar-se que o interesse processual não se satisfaz com a mera defesa da legalidade objetiva ou com a reposição da legalidade supostamente violada. E também não se satisfaz com a hipótese meramente académica, remota e incerta de, após a anulação do concurso, a AMP vir a abrir um novo procedimento, a que as Apelantes pudessem eventualmente vir a concorrer.
Diversamente, para que se verifique o interesse em agir, é necessário que da procedência do pedido formulado resulte para o autor um benefício real, direto e atual, que não meramente hipotético, incerto ou eventual (cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, CARLOS FERNANDES CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 5.ª Edição, 2021, p. 397).
Ademais, mesmo a pretensa abertura que as Apelantes buscam na jurisprudência europeia do Tribunal de Justiça da União Europeia é hoje duvidosa e, nunca seria aplicável ao caso dos autos.
Como refere a Apelada AMP: «Note-se que no conhecido Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 5 de setembro de 2019 (Processo C-333/18 – Lombardi) reconheceu-se a legitimidade processual ativa de um sujeito que pretendia excluir de um procedimento em curso todos os operadores económicos que nele participaram (pedido de destruição do procedimento), perante a perspetiva de a entidade adjudicante repetir o procedimento no qual o impugnante pode voltar a participar. Esta questão foi, de resto, apreciada porquanto a Lombardi, no recurso que interpôs no Conselho de Estado italiano, afirmou que carecia da apreciação judicial da sua pretensão, “na medida em que tal decisão poderia ter conduzido a entidade adjudicante a anular o processo em causa no litígio principal e a dar início a um novo procedimento de contratação pública” (cfr. o Acórdão Lombardi, §12).
Este mesmo entendimento, de reconhecimento de interesse em agir a quem pretenda que a concorrência seja novamente suscitada, teve lugar nos Acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 5 de abril de 2016, processo C-698/13, PFE, §27, e de 11 de maio de 2017, processo C-131/16, Archus e Gama, §§52 e 55.
Porém, não é isso que as Recorrentes pretendem nos pedidos formulados nas alíneas a) e b) do petitório da petição inicial: pretendem apenas que o procedimento seja encerrado, e não que seja de novo aberto, repetido (a pretensão de obter nova oportunidade de apresentação de proposta apenas surge na alínea c) do petitório).
E certo é, como indicado, que a abertura de um novo procedimento é apenas uma de muitas hipóteses. E, em face do momento em que se está hoje (perante a proximidade galopante da data de 03/12/2022 – face às formalidades pós-adjudicatórias previstas no Programa do Concurso e o longo período de transição previsto no Caderno de Encargos), é cada vez mais longínqua a hipótese de, perante uma anulação do procedimento a AMP decidir abrir um novo procedimento concursal, análogo, com vista à aquisição de serviços de transporte rodoviário coletivo de passageiros.
Mas, além de a jurisprudência referenciada não ter aplicação ao caso dos autos, em face da pretensão expressa das Recorrentes de apenas destruir o procedimento, sem peticionar a abertura de um novo, a verdade é que mesmo essa tese tem vindo a ser abandonada, seja pelo próprio Tribunal de Justiça da União Europeia, seja pelo Supremo Tribunal Administrativo.
Como bem identifica a sentença recorrida (cfr. p. 193), no Processo n.º C­787/21, relativo a um reenvio prejudicial suscitado pelo Supremo Tribunal Administrativo, aquela instância europeia afirmou em 17/05/2022: “O artigo 1.º, n.º 3, da Diretiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos procedimentos de recurso em matéria de celebração dos contratos de direito público de fornecimentos e de obras, conforme alterada pela Diretiva 2007/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2007, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um proponente que tenha sido excluído de um procedimento de adjudicação de um contrato público por uma decisão da entidade adjudicante que se tornou definitiva possa impugnar a decisão de adjudicação desse contrato. A este respeito, é indiferente que o proponente excluído alegue que o contrato lhe poderá eventualmente ser adjudicado na hipótese de, em consequência de uma anulação daquela decisão, a entidade adjudicante decidir abrir um novo procedimento de adjudicação”.
No mesmo sentido, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 23/06/2022, processo n.º 0193/21.3BELRA (disponível em www.dgsi.pt):
I – Não tem interesse em agir o concorrente que já não pode obter a adjudicação do concurso cuja adjudicação impugna, e que com a propositura da respetiva ação visa, exclusivamente, salvaguardar a chance de vir a obter a adjudicação de um concurso futuro.
II – Não obsta a essa conclusão o facto de o concorrente questionar a legalidade das próprias normas que presidiram à realização do concurso, se o mesmo não lograr demonstrar que a sua classificação teria sido diferente se as regras fossem outras”.
Como aí se desenvolve, estava aí em causa a discussão sobre “se a mera possibilidade de o procedimento adjudicatório vir a ser renovado em consequência de uma eventual sentença anulatória, e de o concorrente excluído no procedimento anterior ter uma nova chance de obter o direito de celebrar o contrato público posto a concurso, configura um interesse direto, nos termos e para os efeitos da alínea a) do n.º 1 do artigo 55.º do CPTA.
Na verdade, embora não tenha sido excluída do procedimento, no caso dos autos a impugnante, ora Recorrente, também se conformou com a decisão que foi proferida relativamente à sua proposta, não questionando, nomeadamente, a avaliação da mesma, que determinou que ela ficasse classificada em segundo lugar e fosse preterida em benefício do agrupamento adjudicatário.
Isso significa que, tal como no Processo n.º 648/20.7BELRA, no caso dos autos a Recorrente já não pode obter a adjudicação do concurso cuja adjudicação impugna, assentando o seu interesse em agir, exclusivamente, na chance de vir a obter a adjudicação de um concurso futuro.
Ora, como se decidiu naquele processo, não pode o interesse em agir da A., ora Recorrente, assentar exclusivamente na chance de a mesma vir a obter a adjudicação de um futuro concurso que a entidade adjudicante venha a abrir em execução de uma eventual sentença anulatória, pelo que tem de se concluir que o seu interesse não é processualmente qualificado para agir em juízo”.
É certo que a Recorrente questiona a legalidade das normas que regem o concurso, e que, indiretamente, a ilegalidade dessas normas poderia conduzir à ilegalidade do ato impugnado.
Mas além de não o ter feito previamente à apresentação da sua proposta, com elas se tendo inteiramente conformado, a Recorrente também não logrou demonstrar perante as instâncias que a sua classificação teria sido diferente se as regras fossem outras, não demonstrando, assim, que tem interesse em agir contra elas. (...)
Ou seja, a própria chance de a Recorrente vir a obter a adjudicação de um futuro concurso que a entidade adjudicante venha a abrir em execução de uma eventual sentença anulatória não assenta na substituição das normas cuja ilegalidade agora alega, mas antes na substituição da sua proposta por outra com melhor qualidade, o que, manifestamente, não qualifica o seu interesse processual em agir contra aquelas normas.
Deste modo, conclui-se que, nos termos e para os efeitos da alínea a) do n.º 1 do artigo 55.º do CPTA, a Recorrente não tem interesse em agir judicialmente contra o ato de adjudicação do concurso com fundamento exclusivo na ilegalidade das normas que regem o concurso”.
Ou seja, ao contrário do que as Recorrentes afirmam no recurso interposto, não basta a mera hipótese, eventualidade, incerteza, de ser aberto um novo procedimento para que se reconheça o interesse em agir às Recorrentes. Tal como afirmado pelo Tribunal a quo, no que não merece qualquer reparo.».
Não sendo obrigatória a abertura de um novo concurso, as Apelantes não têm interesse em agir em relação ao pedido que formulam sob a alínea b) do petitório, no qual, insiste-se, as mesmas não pedem a condenação da AMP na abertura de um novo procedimento.
Ademais, sempre se dirá, como nota a Apelada AMT, que entre a presente data e o termo das autorizações provisórias- em 03/12/2023 –já não há tempo para tramitar um novo procedimento pré-contratual análogo àquele que está em causa nos presentes autos, o que poderá contribuir para afastar essa solução, de entre as várias legalmente possíveis.
Em suma, dir-se-á, que se era pretensão das Apelantes que a AMP fosse condenada a abrir um novo procedimento, era seu ónus alegar matéria de que resultasse esse dever e pedir que a AMP assim fosse condenada.
Ora, as Apelantes não obsrevaram esse ónus, não se podendo aceitar que esse efeito estaria de algum modo implícito no pedido que formularam.
E reitere-se que, ao contrário do que as Apelantes pretendem fazer crer, o Tribunal a quo nunca afirmou que a possibilidade de ser aberto um novo procedimento corresponde a uma certeza.
Logo, afigura-se-nos, tal como foi entendido pelo Tribunal a quo, que falta interesse em agir às Apelantes em relação ao pedido da alínea b), sendo que o único beneficio que resultaria da sua procedência, como consequência direta e imediata, seria o de continuarem a beneficiar das autorizações provisórias, o que não deixa de ser, como expressa a 1.ª Instância, um benefício ilegítimo, alcançado em abuso de direito.
As Apelantes contrapõem agora, nesta instância recursiva que o entendimento sufragado pela 1.ª Instância é ilegítimo, porque é impossível manter as autorizações provisórias para além de 03/12/2023.
Acontece que, foi essa a pretensão que expressaram, como resulta do teor do que alegaram nos artigos 7.º a 9.º e 65.º a 70.º da réplica, que se transcrevem:
a) que “permanecerão incumbentes de parte do serviço público que é objeto do Concurso em crise (ao abrigo das autorizações provisórias vigentes) até poderem apresentar nova(s) proposta(s), ao Lote 4 (e/ou a outros Lotes), no novo concurso lançado ou no concurso reiniciado, expurgado das ilegalidades que atualmente o ferem” (cfr. artigo 9.º da réplica);
b) “Ou seja, as Autoras permanecerão incumbentes até à conclusão do procedimento em curso devidamente reiniciado ou do forçoso lançamento de um novo Concurso (a ter lugar até a data de 15/11/2023), que tem por objeto o mesmo serviço público, no qual – repete-se – poderão apresentar propostas” (cfr. artigo 69.º da réplica).
O que se extrai do que alegaram na réplica, é que, na sua ótica, poderiam continuar, indefinidamente, a operar ao abrigo de autorizações provisórias.
Como é consabido, o Tribunal a quo apenas podia pronunciar-se sobre o que as Apelantes alegaram, e foi isso que fez, tendo considerado que uma tal consequência sempre constituiria um abuso de direito.
Ademais, em rigor, sempre se dirá, que mesmo nesta sede, as Apelantes não abandonaram integralmente a tese que perfilharam na réplica, uma vez que, como repara a Apelada AMP, no artigo 75.º das alegações, «teimam em afirmar que as autorizações provisórias são um indício de interesse».
É, pois, evidente que a procedência desse pedido formulado na alínea b) do petitório não confere às Autoras qualquer vantagem direta ou imediata.
Sendo assim, não se vislumbra qualquer erro de julgamento em que possa ter incorrido o Tribunal a quo, não merecendo a sentença recorrida as críticas que lhe são apontadas.
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b.3 da falta de interesse em agir relativamente ao pedido formulado sob a alínea d) do petitório.
Nas alíneas K. a K.18 das conclusões de recurso, as Apelantes impetram à sentença recorrida erro de julgamento em matéria de direito no segmento que deu por verificada a exceção dilatória da falta de interesse em agir das Autoras relativamente ao pedido formulado, a título subsidiário, sob a alínea d) do petitório.
O pedido formulado sob a referida alínea, corresponde à pretensão de exclusão da proposta do agrupamento concorrente “TB..., Lda.” e “TF..., Lda.”, adjudicatário do lote 4 do concurso em crise, com fundamento nas alíneas e), f) e g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, designadamente, por força do preço anormalmente baixo dessa proposta.
As Apelantes consideram que esse pedido também inclui o pedido de anulação do procedimento.
Acontece que, o Tribunal a quo concluiu que dali “nenhuma utilidade advém para as AA.”, e fê-lo, essencialmente, com base no facto de a proposta do agrupamento composto pelas AA., ora Apelantes, se encontrar ordenada/classificada em 3.º lugar no lote 4 a concurso, isto é, ao invés de se encontrar em lugar subsequentemente/imediatamente elegível à adjudicação neste lote e concomitantemente com base no facto de as Autoras não terem peticionado, em sequência, a adjudicação do contrato concursado à sua proposta.
Porém, as Apelantes consideram que o Tribunal a quo errou ao entender que se lhes impunha, em ordem ao preenchimento do pressuposto de interesse processual/interesse em agir, que tivessem peticionado expressamente a adjudicação da sua proposta ao lote 4, como (con)sequência da peticionada exclusão da proposta ordenada em 1.º lugar/adjudicada e, bem assim, que erra quando, aceitando que a pretensão formulada pelas AA. comporta o pedido de adjudicação à sua proposta, não reconhece o interesse em agir das ora Apelantes por entender que o mesmo só é reconhecido ao proponente classificado em 2.º lugar (quando não sejam invocados fundamentos de exclusão ou reclassificação das propostas que medeiam classificadas entre o 1.º lugar e o lugar das AA.).
Neste enquadramento, advogam que o Tribunal a quo impõe uma forte restrição da amplitude e do alcance do pressuposto processual do interesse em agir que não se encontra pressuposta, nem é exigida, pelo CPTA e nem pela jurisprudência nacional consolidada em sede de contencioso pré-contratual (error juris), e uma vez mais fundamenta o seu entendimento com base numa realidade factual por si distorcida (error facti).
A esse talhe, sustentam que a existência do interesse em agir não equivale, exclusivamente, à “hipótese de adjudicação imediata”, bastando-se ao seu preenchimento e reconhecimento que a adjudicação seja possível/equacionável, o que foi precisa e suficientemente demonstrado in casu por via dos factos que aduziram. Tal situação apenas se conceberia se a proposta das mesmas se afigurasse definitivamente excluída do procedimento concursal, o que não sucede, de todo, in casu.
Em prol da sua tese, invocam VERA EIRÓ- in A obrigação de indemnizar das entidades adjudicantes. Fundamentos e pressupostos, Almedina, 2013, págs. 496-498-, quando a propósito da delimitação do interesse em agir no contencioso pré-contratual, aquela autora afirma que “(…) resulta que as Directivas Recursos impõem, pelo menos, que (i) os concorrentes/candidatos que não tenham sido excluídos de um procedimento possam impugnar as decisões tomadas em procedimentos de formação de contratos públicos, quando aleguem um interesse de facto na decisão final do processo de impugnação – não carecendo de fornecer ao tribunal a prova deste interesse de facto; (…)”.
Concluem, em consonância, ser absolutamente desprovida de sentido jurídico a “tese” da exclusiva equivalência entre interesse em agir e “hipótese de adjudicação imediata”, antes sendo de acolher a tese de acordo com a qual o interesse em agir, in casu, não se afere pela “hipótese de adjudicação imediata”, mas pela hipótese, mesmo que seja mediata ou indireta, de tal suceder.
Por outro lado, sustentam que o Tribunal a quo decidiu pela falta de interesse em agir das Autoras com base numa clara distorção da realidade factual exposta ao interpretar, erradamente, que da mera exclusão da proposta das contrainteressadas/adjudicatárias, à míngua da dedução de pedido e invocação de fundamentos que conduzissem à exclusão ou à reclassificação das propostas dos 2.º e 3.º classificados (TS.... e agrupamento TO.../TX... S.A.), não emerge esse seu direito a ver a sua proposta posicionada num lugar apto a, por força da exclusão da proposta classificada em 1.º lugar, se tornarem adjudicatárias”.
Nesse sentido, sustentam que entre a proposta classificada em 1.º lugar/adjudicada e a proposta das AA. apenas medeia uma única proposta, a da concorrente TS...., classificada em 2.º lugar, pelo que, a proposta das AA. se encontra ordenada em 3.º lugar no lote 4. Por outro lado, sustentam que o interesse em agir não é, in casu, limitável dentro de cada lote, nem do direito aplicável se exige o petitório da exclusão de todas as propostas cimeiras para que se reconheça o interesse em agir, nem tampouco de facto, in casu, é necessária a exclusão de todas aquelas propostas para que se conduza à ascensão das AA. a adjudicatárias do lote 4, sendo bastante o facto de ser possível que a concorrente classificada em 2.º lugar no lote 4 (única que medeia entre as AA. e a adjudicatária cuja exclusão é peticionada) transite para adjudicatária de outro lote.
Mas sem razão.
Coligida a matéria de facto que consta do elenco dos factos provados, resulta do ponto 35 que a ordenação das propostas relativamente ao Lote n.º 4, foi a seguinte: 1.º - TB..., Lda., TF..., Lda.; 2.º - TS....; 3.º - TX..., S.A., TO...) 4.º - As Apelantes.
Mais resulta apurado que, nessa sequência, a adjudicação do Lote 4 recaiu sobre a proposta classificada em primeiro lugar – vide ponto 37 do elenco dos factos assentes.
Ora, a pretensão que as Apelantes formularam sob a alínea d) do pedido, recorde-se, foi a seguinte: Ainda subsidiariamente, ser determinada a exclusão da proposta do agrupamento concorrente «TB..., Lda.» e «TF..., Lda.».
Em termos sumários, como resulta dos fundamentos que acima se transcreverem, as Apelantes invocaram como justificação dessa pretensão, o preço alegamente anormalmente baixo desta proposta, a suposta violação pela proposta de vinculações legais ou regulamentares aplicáveis e a suposta violação de regras da concorrência-artigo 70.º, n.º 2, alíneas e) a g), do Código dos Contratos Públicos.
Acontece que, como bem enfatizou a 1.ª Instância, na procedência desse pedido, a adjudicação do contrato concursado não recairia sobre a proposta apresentada pelas Apelantes mas sobre a proposta classificada em 2.º lugar no Lote 4, apresentada pela TS....
Sendo assim, é incontornável que a procedência do referido pedido não teria nenhuma consequência jurídica atendível na esfera jurídica das Apelantes, que preservaiam o mesmo status de não adjudicatárias.
Logo, nesta situação, não se vislumbra que tenham interesse em agir.
Ademais, as AA. não pediram que a adjudicação do Lote 4 recaísse sobre a sua proposta.
A este respeito, consideramos útil transcrever a fundamentação que consta da sentença recorrida onde se escreveu que: “as AA. limitam-se a peticionar a anulação do ato de adjudicação e a exclusão da proposta das CI mas, em momento, algum pediram ao Tribunal a adjudicação à sua proposta, por via do seu posicionamento na tabela classificativa num lugar elegível à adjudicação.
Na realidade, só em sede de réplica vieram, por forma a tentar fundar o seu interesse em agir, a sustentar a tese deste seu alegado direito à adjudicação do lote 4, mas o que se esqueceram é que na petição inicial não formularam tal pedido, antes se limitaram a pedir que, na decorrência da anulação do ato de adjudicação, a proposta das CI fosse excluída. E, como é sabido, o interesse em agir deve ser aferido, objetivamente, à luz da causa de pedir e do pedido tal como emerge da petição inicial”.
Como já tivemos ensejo de referir, a decisão recorrida não merece qualquer critica, sendo certo como é, que o momento relevante para aferir o interesse em agir é “ o momento da dedução do respectivo pedido” - cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 16/12/2015, processo n.º 01351/15, disponível em www.dgsi.pt.
Por fim, dir-se-á ainda, como bem observa a Apelada AMP, que o Tribunal a quo procedeu a um exercício que não lhe era exigido, que foi o de demonstrar que, mesmo que, hipoteticamente, o pedido formulado comportasse a pretensão de adjudicação, tal pretensão seria improcedente, como se vê da seguinte fundamentação que consta da sentença recorrida, que se transcreve: “Acresce que ainda que se aceitasse que a pretensão deduzida pelas AA. a título subsidiário comporta o pedido de adjudicação à sua proposta, nem assim se poderia reconhecer o interesse em agir das AA. relativamente à invalidação do ato de adjudicação”.
As Apelantes vaticinam ainda que o interesse em agir não tem de ser direto, bastando que seja equacionável, como uma das hipóteses possíveis do devir posterior à sentença.
Já nos debruçamos sobre o que releva para aferir deste pressuposto processual, reafirmando-se que o interesse em agir tem de ser direto, ou por outras palavras «os efeitos decorrentes da anulação devem repercutir-se, de forma direta e imediata, na esfera jurídica do impugnante», excluindo interesses meramente eventuais ou hipotéticos-cfr., e.g., MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual, cit., p. 234, 236-239, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, CARLOS FERNANDES CADILHA, Comentário, cit., p. 397, VIEIRA DE ANDRADE, A justiça, cit., pp. 291, 295; cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 29/10/2009, processo n.º 01054/08, de 25/11/2015, processo n.º 01131/15, e de 14/07/2015, processo n.º 0549/15, e de 23/06/2022, processo n.º 0193/21.3BELRA; Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul, de 29/01/2015, processo n.º 06242/10, de 21/03/2019, processo n.º 317/18.8BELSB-A, de 04/08/2021, processo n.º 193/21.3BELRA; Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 21/05/2021, processo n.º 00648/20.7BELRA, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
No mesmo sentido, se pronunciam também ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA, obtemperando que para que se verifique o interesse processual “não bastará para o efeito a necessidade de satisfazer um mero capricho (de vindicta sobre o réu) ou o puro interesse subjetivo (moral, científico ou académico) de obter um pronunciamento judicial” - cfr. Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra, 1985, p. 181.
E a esta conclusão, não se opõe o entendimento de VERA EIRÓ, invocado pelas Apelantes, que, em bem da verdade, como afirma a Apelada «não nega o caráter direto do interesse, apenas admitindo que basta que esteja em causa um interesse de facto, como (nota a Autora, na mesma obra citada pelas Recorrentes – A obrigação de indemnizar das entidades adjudicantes. Fundamentos e pressupostos, Almedina, 2013 – na p. 504, n.r. 1272, por apego aos entendimentos de MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, CARLOS FERNANDES CADILHA e VIEIRA DE ANDRADE, que “uma parte será parte legítima quando alegue, fundamentadamente, ser titular de um interesse legítimo, direto e pessoal. O interesse é legítimo quando é protegido pela ordem jurídica, é direto se tiver repercussão imediata no interessado e é pessoal se a repercussão da anulação do ato se projeta na sua própria esfera jurídica.»
Neste sentido, veja-se o Acórdão do TCA Norte de 2010/06/17, proferido no proc. n.º 00122/09.2BEMDL, no qual se sumariou a seguintes jurisprudência: « I. Para se poder fazer um juízo positivo sobre a legitimidade activa, é suficiente que o autor da acção impugnatória alegue, de um modo fundamentado, ser titular de interesse legítimo, direto e pessoal na impugnação de determinado acto administrativo, mormente por ter sido lesado por esse acto nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, e que o autor da acção especial de condenação à prática de acto legalmente devido alegue, de modo fundamentado, ser titular de direito ou interesse legalmente protegido, dirigido à emissão desse acto; / II. O interesse será legítimo quando é protegido pela ordem jurídica, será direto quando tem repercussão imediata no interessado, e será pessoal se a repercussão da anulação do acto se projecta na sua própria esfera jurídica”.»»
No caso, para que não procedesse a exceção da falta de interesse em agir em relação ao pedido deduzido sob a alínea d) impunha-se às Apelantes que tivessem formulado o pedido de adjudicação à sua proposa e que tivessem alegado factos dos quais resultasse, uma vez demonstrados, que a adjudicação poderia recair sobre a sua proposta, já que esse efeito não resulta diretamente da exclusão da proposta adjudicada às Contrainteressadas.
Por outro prisma, as Apelantes invocaram a possibilidade de por via da procedência deste pedido, puderem vir a ser adjudicatárias nos outros lotes.
Contudo, trata-se de uma argumentação sem consistência, sendo de meridiana evidência que aquelas não têm qualquer interesse em agir em qualquer dos outros Lotes.
Como observa a Apelada AMP, quando um procedimento é dividido em lotes, «verdadeiramente há tantos procedimentos quantos os lotes, que se regem pelas mesmas peças do procedimento e que correm em paralelo uns aos outros, sendo que cada decisão relativa a cada lote corresponde a uma decisão autónoma relativamente aos demais. Vale o mesmo por referir que o conteúdo das peças do procedimento relativamente aos demais lotes e as decisões que aí sejam tomadas são absolutamente irrelevantes para a situação jurídica das Apelantes.
Quando os procedimentos pré-contratuais são organizados por lotes que têm objetos distintos, são produzidas adjudicações autónomas, dando lugar a uma pluralidade de vínculos contratuais autónomos – a uma pluralidade de contratos – que apenas por razões de economia procedimental são formalizados através do mesmo documento contratual.
Quando um procedimento pré-contratual prevê a adjudicação por lotes, a sua tramitação pode (e deve) ser desagregada sempre que assim se justifique. É isso que estabelece o artigo 73.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos quando indica que “quando seja feita a adjudicação por lotes nos termos do artigo 46.º-A, pode existir uma decisão de adjudicação para cada lote, podendo tais decisões ocorrer em momentos distintos”.
Trata-se de uma “previsão que, mais do que apontar à partição do próprio ato de adjudicação, implica, verdadeiramente, que seja o próprio procedimento que se desdobre e estruture, quanto ao seu objeto, ao vários «lotes», caso em que, através de um só trilho procedimental, ainda que objetivamente complexo, a atividade de contratação das entidades adjudicantes é realizada «por lotes» (n.º 2 do artigo 46.º-A) e em que haverá lugar, em regra, a uma decisão de adjudicação «por cada lote» (n.º 2 do artigo 73.º)”, em que “a cada lote corresponderá, em regra um contrato (e, portanto, um adjudicatário) diferente”; “encontrando-se desse modo internamente fracionado, um procedimento desdobrado por lotes culminará, em regra, com a prática de vários atos de adjudicação (tantos quantos os lotes) e dará origem, em regra, à celebração de vários contratos (tantos quantos os lotes ou, pelo menos, tantos quantos os adjudicatários, nas hipóteses em que se admita a atribuição de vários lotes a um só concorrente); e que, (iii) sendo esse o caso, cada um dos contratos terá por objeto um – ou vários – segmentos do quid (obra, bem ou serviço, para referir apenas os casos mais típicos) identificado e individualizado pela entidade adjudicante na decisão de contratar”; “sempre que a adjudicação se faça «por lotes», o esquema tradicional de um procedimento → uma adjudicação → um contrato será, em regra, substituído pelo esquema de um procedimento → várias adjudicações → vários contratos” (cfr. JOSÉ DUARTE COIMBRA, A adjudicação por lotes no CCP revisto, in Comentários à revisão do Código dos Contratos Públicos, AAFDL, 2018, pp. 288-292).
Dito de outro modo: “Estaremos perante uma adjudicação por lotes quando, no âmbito de um mesmo procedimento, a entidade adjudicante divide o quid submetido à concorrência, possibilitando que sobre cada uma das partes desse objeto incida uma adjudicação autónoma” (cfr. LUÍS VERDE DE SOUSA, Algumas notas sobre a adjudicação por lotes, in e-Pública, Vol. 4, n.º 2, novembro de 2017, p. 69, disponível em https://www.e-publica.pt/volumes/v4n2/pdf/Vol.4-Nº2-Art.04.pdf; https://www.e-publica.pt/volumes/v4n2a04.html).
Efetivamente, “Do regime da adjudicação por lotes em que “o bem objecto do procedimento é adjudicado na totalidade mas dividido em várias parcelas autónomas (e previamente autonomizadas nas peças do procedimento)”, resulta o fraccionamento do procedimento, como que escalonado em partes em razão do objecto, rectius, em razão de cadalote, dando origem a tantas adjudicações e contratos quantos os lotes a que o procedimento respeita (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 7 de dezembro de 2011, processo n.º 08163/11, disponível em www.dgsi.pt). “[A] adjudicação por lotes prevista no artigo 46.º-A (e no artigo 73.º/2), constitui uma forma de divisão do objeto dentro do mesmo procedimento, que pode dar origem a mais do que uma adjudicação e a mais do que um contrato” (cfr. MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito dos contratos públicos, Vol. I, AAFDL, 2022, p. 288).
Vale o mesmo por referir que todo o procedimento se divide em tantos lotes quantos os nele previstos, o que tem impacto global em todos os aspetos do procedimento. Apesar de se estar perante um único procedimento, após a avaliação eles ganham independência.
Nos procedimentos divididos em lotes, “«(...) o bem objecto do procedimento é adjudicado na totalidade mas dividido em várias parcelas autónomas (e previamente autonomizadas nas peças do procedimento) que podem ser atribuídas a concorrentes diversos (...) celebrar-se-ão então, correspondentemente, contratos com os concorrentes que apresentarem as melhores propostas para cada um dos tais lotes (...)».
Seguindo a doutrina que vimos citando, «(...) o procedimento é um só (não há tantos procedimentos quantos os lotes previstos) mas isso não significa, em nossa opinião, que as vicissitudes que ocorrem por causa de um lote e que determinem a sua demora ou suspensão se reflictam os outros lotes, impedindo o seu desenrolar normal. A regra, portanto, seria a de que os actos e decisões relativos a cada lote são independentes e não prejudicam a validade e eficácia das decisões sobre o outro lote ou a respectiva tramitação, sendo que a referida independência se estende à própria adjudicação e celebração dos contratos respeitantes a cada lote [Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos... Almedina/2011, págs. 1020/1024] (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 7 de dezembro de 2011, processo n.º 08163/11, disponível em www.dgsi.pt; no sentido de que cada um dos lotes deve ser tratado com independência dos demais, até para efeitos contenciosos, cfr. ainda o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 7 de abril de 2016, processo n.º 11880/15, confirmado pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 20 de outubro de 2016, processo n.º 0739/16, também disponíveis em www.dgsi.pt).
Na adjudicação parcelada ou por lotes (artº 46ºA CCP) em que se fracciona o objecto do contrato traduzido na obra, serviço ou bens a adquirir pelo ente público no âmbito do mesmo procedimento (artº 46º-A nº 1 CCP), o acto de adjudicação tem por objecto o lote na sua completude de dimensão e conteúdo autónomo nos exactos termos levados ao caderno de encargos e patenteados pela entidade adjudicante” (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19 de junho de 2019, processo n.º 320/18.8BESNT, disponível em www.dgsi.pt).
Neste sentido, da adjudicação por lotes consagrada nos artºs 73º nº 2 e 46º-A nº 1 CCP resulta o fraccionamento do procedimento, como que escalonado em partes em razão do objecto, rectius, em razão de cada lote, dando origem a tantas adjudicações e contratos quantos os lotes a que o procedimento respeita” (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19 de junho de 2019, processo n.º 320/18.8BESNT, disponível em www.dgsi.pt).
Dito de outro modo: o artigo 73.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos “permite que a entidade adjudicante promova o avanço do procedimento e a celebração e execução de contratos com independência das vicissitudes que possam sobrevir a alguns dos lotes” (cfr. PEDRO FERNÁNDEZ SÁNCHEZ, Direito da contratação pública, Vol. I, AAFDL, 2020, p. 555).
Ou seja, quando a entidade adjudicante prevê que num procedimento ocorra uma adjudicação por lotes, cada um desses lotes assume autonomia em relação aos demais: as vicissitudes ocorridas num lote não se comunicam aos demais lotes; cada concorrente apresenta proposta ao lote em que pretende celebrar o contrato, e não aos demais.
Efetivamente, “o que verdadeiramente parece caracterizar a adjudicação por lotes é o facto de, no âmbito de um mesmo procedimento, o quid submetido à concorrência se encontrar dividido, de molde a possibilitar que cada uma dessas partes (ou conjuntos de partes) seja objeto de uma adjudicação autónoma” (cfr. LUÍS VERDE DE SOUSA, Algumas notas sobre a adjudicação por lotes, cit., p. 69).»»
Como se entoa do exposto, tendo a concorrência sido convocada para cada Lote, é igualmente lote a lote que deve ser equacionada a matéria da (in)validade das decisões tomadas no procedimento.
Na situação em análise, tendo as Apelantes apresentado proposta apenas ao Lote 4, quando eram livres de apresentar proposta igualmente a qualquer dos outros lotes, manifestaram no procedimento pré-contratual a sua indiferença quanto ao sucesso dos demais lotes.
Logo, não têm interesse em agir relativamente aos mesmos.
Quanto à invocação pelas Apelantes, de que a única hipótese que poderiam ter de, eventualmente, vir a ser adjudicatárias era a de se verificar a seguinte combinação de fatores: (i)O adjudicatário do Lote 2, passar a ser adjudicatário do Lote 1, deixando de poder ser adjudicatário do Lote 2; (ii) A TS...., Lda. (classificada em 2.º lugar nos Lotes 2 e 4), passar a ser adjudicatária do Lote 2; e (iii) Deixando a TS...., Lda., de poder ser adjudicatária do Lote 4, assim abrindo caminho para as mesmas, apraz-nos referir que esse cenário traduz «um mero exercício, possível no plano das hipóteses, mas improvável no plano dos factos e irrelevante no contexto do concurso».
Na verdade, como decorre do que já se expendeu, não só as Apelantes não deduziram qualquer pretensão relativamente aos Lotes 1 e 2, como a hipótese que colocam não tem qualquer arrimo com a realidade, conquanto a adjudicatária do Lote 2 não passou a ser adjudicatária do Lote 1, pelo que não foi aberto caminho para a possibilidade de adjudicação do Lote 2 à TS...., Lda.
Em conclusão, o que de seguro se pode afirmar é que, caso fosse procedente o pedido formulado na alínea d) do petitório da petição inicial, a TS...., Lda., seria adjudicatária do Lote 4, pelo que, em nenhum cenário as Apelantes seriam adjudicatárias do Lote 4, a menos que tivessem pedido (e viesse a ser julgado procedente) a exclusão da proposta apresentada pela TS...., Lda. E, bem assim, do concorrente classificado em 3.º lugar, o que não fizeram.
Nestes termos, é evidente a falta de interesse em agir das Apelantes, relativamente ao pedido formulado na alínea d) do petitório da petição inicial, pelo que a sentença recorrida permanece invicta, impondo-se a sua integral confirmação.
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b.4. da exceção dilatória do caso julgado:(i) quanto à questão da informação sobre os trabalhadores; (ii) verificação de causa de não adjudicação prevista no artigo 79.º n.º 1 do CCP fundada na alteração de circunstâncias/efeitos emergentes dos efeitos da Pandemia Covid-19.
Nas conclusões formuladas sob as alíneas N. a N.15. as Apelantes assacam à decisão recorrida erro quanto ao julgamento efetuado pelo Tribunal a quo sobre a exceção do caso julgado, com fundamento no acórdão deste TCAN, proferido nos processos 1973/20.2BEPRT e apensos, quer em relação à questão da violação do n.º 10 do artigo 285.º do Código do Trabalho, quer quanto à verificação de causa de não adjudicação prevista no artigo 79.º n.º 1 do CCP fundada na alteração de circunstâncias/efeitos emergentes dos efeitos da Pandemia Covid-19.
Quanto à violação do disposto no n.º10 do artigo 285.º do Código do Trabalho, sustentam que não se verificam os pressupostos cumulativos necessários para dar como verificada a exceção do caso julgado, na medida em que entre os processos 1973/20.2BEPRT (e apensos) e o presente processo (481/22.1BEPRT) não existe identidade de pedidos nem tampouco identidade de causa de pedir. Alegam, para tanto, que no processo n.º 2019/20.6BEPRT, no qual foram autoras, apenso ao citado processo 1973/20.2BEPRT, invocaram-se, entre outros vícios do procedimento concursal em crise, “a ilegalidade da cláusula 26º n.2 do Caderno de Encargos, «decorrente da falta de divulgação no Caderno de Encargos de informação relativa aos trabalhadores», por violação dos princípios gerais da contratação pública e também do artigo 4º n. 5 do Regulamento (CE) n.º 1370/2007 e do artigo 21º n.1 da Lei n.º 52/2015” (cf. ponto 46 dos Factos Provados, págs. 125-126 da sentença recorrida). Acontece que, na data de instaração do referido processo - em 27/10/2020- não existia o novo n.º 10 do artigo 285.º do Código do Trabalho105, cuja violação foi aduzida, como uma das causas de pedir, pelas AA. e aqui Recorrentes na petição inicial dos presentes autos.
Afirmam que para a procedência da exceção de caso julgado sobre esta matéria, o Tribunal a quo entendeu que já estão discutidas e apreciadas, tendo sido julgadas improcedentes com trânsito em julgado, as questões da invalidade da Cláusula 26.ª do Caderno de Encargos e da falta de disponibilização de informação sobre trabalhadores (sob aquele processo n.º 1973/20.2BEPRT e apensos), concluindo que as AA. estão a invocar, tão só, o mesmo vício: “a falta de disponibilização de informações sobre o número e o regime dos trabalhadores afetos à atividade determinante da ilegalidade da Cláusula 26º do Caderno de Encargos”.
Alegam que o Tribunal a quo deu como verificada a identidade de sujeitos e a identidade de pedidos, entre o processo 1973/20.2BEPRT (e apensos) e o presente processo (481/22.1BEPRT), contudo, quanto ao terceiro requisito cumulativo apenas entendeu que “existe, ainda, que parcialmente, identidade na causa de pedir”, pelo que, falha um dos requisitos (cumulativos) da sua verificação: o da identidade da causa de pedir, uma vez que os factos e quadro jurídico que servem de fundamento às pretensões deduzidas constituem vias jurídicas absolutamente diversas.
Afirmam que no processo 2019/20.6BEPRT (apensado ao processo 1973/20.2BEPRT) estava em causa a violação do n.º 5 do artigo 4.º do Regulamento (CE) N.º 1370/2007, ao passo que nestes autos está em causa a violação do regime jurídico da transmissão da unidade económica decorrente da Lei n.º 18/2021 de 8 de abril de 2021 que altera o Código do Trabalho, introduzindo, sobretudo, o novo n.º 10 do artigo 285.º, tratando-se de questões cujo alcance, impacto e amplitude são distintos: não está apenas em causa na presente demanda a ilegalidade da Cláusula 26.ª do Caderno de Encargos e/ou falta de disponibilização da informação relativa aos recursos humanos, mas sim o impacto de uma alteração legislativa em matéria laboral especialmente aplicável em sede da contratação pública cujo efeito prático-jurídico não se resume à disponibilização da referida informação, mas na necessidade de adaptação das peças procedimentais à nova lei (laboral), que torna ilegal o ato de adjudicação e do conexo subsequente contrato – o que não se basta com uma alteração da Cláusula 26.ª do Caderno de Encargos.
A seu ver, a falta de uma tabela com indicação (anónima) dos trabalhadores afetos ao respetivo serviço público a concurso bem como com a informação dos encargos atinentes aos mesmos (os quais terão o direito de transmissão para o futuro operador), torna ilegal a execução do contrato a celebrar nos termos inicialmente fixados (no tempo da elaboração dos documentos conformadores deste procedimento concursal).
Pelo que, sendo assim, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, por violação do ditado no artigo 581.º do CPC, porquanto entre os processos 1973/20.2BEPRT (e apensos) e o presente processo (481/22.1BEPRT) não existe identidade de pedidos nem tampouco identidade de causa de pedir; o que impõe a revogação deste segmento decisório (cf. págs. 201 a 211 e em b.(i) da pág. 224 da sentença recorrida) pelo Tribunal de recurso.
Será assim?
Compulsada a p.i, constata-se que as Apelantes se referiram aí à questão dos trabalhadores, tendo alegado que os custos com pessoal são significativos, pelo que se revela indispensável conhecer o número e o regime dos trabalhadores afetos à atividade dos atuais operadores, para que se possa fazer uma proposta séria. Mais alegaram que a AMP se recusou a prestar essa informação, o que as levou a não concorrerem a outros Lotes.
Terminaram, invocando, que por essa razão, o ato de adjudicação é ilegal por violar o artigo 285.º, n.º 10, do Código do Trabalho.
Acontece que, as Apelantes são precisamente as atuais prestadoras do serviço a que se refere o Lote 4, pelo que, conforme as próprias sustentam, as mesmas conhecem a situação dos trabalhadores relativamente ao Lote 4, ao qual apresentaram a sua proposta. A informação que as Apelantes desconhecem é a informação relativamente aos demais Lotes, razão pela qual não apresentaram proposta a esses Lotes.
Ora, nos presentes autos apenas está em discussão a adjudicação do Lote 4, e daí que, que a procedência desse putativo vício relativamente aos demais Lotes, nenhuma relevância teria no âmbito do Lote 4.
Neste sentido, já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão de 07/04/2022, processo n.º 02048/20.0BELSB , em que deixou de apreciar um vício alegado por ele se apresentar irrelevante para a situação jurídica do autor, i.e., por se tratar de um interesse em agir “meramente objetivo, de legalidade”.
Como refere a Apelada AMP:««Colocando a questão em termos de improcedência do mérito da causa: “i) Para efeitos de aferição do pressuposto processual de interesse em agir ter-se-á de ter em conta a causa de pedir configurada pela autora. (...) iii) Porém, se as alegadas ilegalidades das normas procedimentais não se repercutiram no acto de adjudicação, ao contrário do que defende a Autora, então carece de legitimidade substancial ou substantiva que tem a ver com a efectiva relação material controvertida, interessando já ao mérito da causa. (...) v) Assim, as normas sobre as quais se regeu o presente procedimento concursal não afectaram os interesses da Autora, tendo a sua actuação e a sua proposta sido gizadas em conformidade com as mesmas. vi) Daí que a mesma careça de legitimidade substantiva para os pedidos formulados de anulação do acto de adjudicação ou de ilegalidade das normas concursais” (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 04/08/2021, processo n.º 193/21.3BELRA, disponível em www.dgsi.pt). ».
Na p.i do do processo n.º 2019/20.6BEPRT, que veio a ser apensado ao processo n.º 1973/20.2BEPRT, e que mereceu Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 03/12/2021 por nós relatado, as ora Apelantes sustentaram a invalidade da Cláusula 26.ª do Caderno de Encargos por não prestar informação sobre trabalhadores, advogando que essa circunstância não permite “que os concorrentes conheçam o conteúdo das obrigações que lhe são impostas, nem sequer a dimensão da onerosidade com que podem e devem contar no contexto da futura execução do contrato”, indicando que “a referida informação era absolutamente vital para efeitos de elaboração de uma proposta séria e razoável em termos de recursos humanos e não poderia deixar de ter que ser fornecida nas peças do procedimento”. Afirmavam que a obrigatoriedade de prestação dessa informação decorreria do artigo 4.º, n.º 5, do regulamento (CE) n.º 1370/2007 e do artigo 21.º, n.º 1, da Lei n.º 52/2015.
A questão que levantaram prendia-se com a falta de informação de trabalhadores. Essa questão tinha a ver com a questão do artigo 285.º, n.º 10, do Código do Trabalho, que foi suscitada nos autos, e a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto nesse processo não deixou de se lhe referir. E, em sede de recurso interposto nesse processo, as ora Apelantes mantiveram o que haviam alegado na petição inicial.
E sobre essa questão, que constituía objeto do recurso interposto para o TCAN, este tribunal, no acórdão que proferiu afirmou a propósito: “Refira-se ainda que, como bem considerou o Tribunal a quo, a aplicação do n.º 10 do artigo 285.º do Cód. Trabalho não tem qualquer impacto no âmbito do concurso ora em apreço. Na verdade, já era entendimento da jurisprudência, tanto europeia como nacional, a sustentação de uma noção flexível de ato translativo de estabelecimento, prescindindo de qualquer ato direto/imediato entre transmitente e transmissário” (cfr. p. 165 da sentença recorrida).
Como tal, é liquido que essa questão já foi julgada definitivamente, ou seja, a questão de saber se ocorria alguma invalidade nas peças do procedimento em razão de não ter sido disponibilizada a informação sobre trabalhadores dos operadores incumbentes, já foi decidida, com trânsito em julgado, tendo-se concluído que não havia qualquer invalidade a este título, mesmo tomando em linha de conta o regime do artigo 285.º, n.º 10, do Código do Trabalho.
Logo, não pode voltar a discutir-se, no âmbito deste procedimento concursal, se o artigo 285.º, n.º 10, do Código do Trabalho produz algum efeito sobre o concurso vertente.
Mas, em rigor, o que está em causa neste segmento é saber se as Apelantes poderiam fazer renascer a mesma questão que já haviam suscitado antes: a putativa invalidade decorrente de as peças do procedimento não facultarem informação sobre trabalhadores dos incumbentes, que, por sinal, são as próprias Apelantes.
E a esse respeito a resposta só pode ser negativa. É certo que as Apelantes, como vimos, alegam que no processo anterior estava em causa a violação do artigo 4.º, n.º 5, do Regulamento (CE) n.º 1370/2007, e que nestes autos está em causa a violação do artigo 285.º, n.º 10, do Código do Trabalho, pelo que a causa de pedir é distinta, porém, como já se disse, o conteúdo daquele normativo foi apreciado no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte tirado no processo n.º 1973/20.2BEPRT (e respetivos processos apensos) onde se concluiu que o Caderno de Encargos não viola o artigo 285.º, n.º 10, do Código do Trabalho.
Assim, bem se compreende que tenha sido invocada a exceção de caso julgado, e que a Senhora juiz a quo, tenha afirmado na sentença recorrida que quando não há coincidência entre o objeto de processos, mas o primeiro processo “constitui pressuposto ou condição da definição da relação ou situação jurídica que nesta [segunda ação] é necessário regular e definir”, o caso julgado impõe-se na sua vertente positiva, por via da sua autoridade.
Nesse sentido, existe sólida e abundante jursidpudência, de que é exemplo o Acórdão do STJ, de 26/02/2019, processo n.º 4043/10.8TBVLG.P1.S1), que o Tribunal a quo indica, onde se propugna que “«Na autoridade [de caso julgado], há uma conexão ou dependência entre o objecto da segunda acção e o objecto definido na primeira acção, sem que aquele se esgote neste. Aqui, impõe-se que essas questões comuns não sejam decididas de forma diferente, devendo a decisão da segunda acção acatar o que foi decidido na primeira, como pressuposto indiscutível» / Daí que se considere que, ao contrário do que acontece com a exceção de caso julgado (cujo funcionamento pressupõe a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir – cfr. artigo 580º, nº 1, do CPC), a invocação e o funcionamento da autoridade do caso julgado dispensam a identidade de pedido e de causa de pedir / (...) Aquilo que se impõe por força da autoridade do caso julgado é a definição – feita por decisão transitada em julgado – da concreta relação jurídica que aí foi delimitada pelos sujeitos, pelo pedido e pela causa de pedir. Mas a definição dessa concreta relação jurídica – assim delimitada – impõe-se e é vinculativa para os respetivos sujeitos no âmbito de qualquer outro litígio que entre eles venha a ocorrer e que tenha como pressuposto ou condição aquela relação e por isso se afirma que o funcionamento da autoridade do caso julgado não exige a identidade de pedido e causa de pedir; tal autoridade pode, de facto, impor-se no âmbito de ação posterior com pedido e causa de pedir diversas nas circunstâncias supra mencionadas, vinculando as partes e o Tribunal e evitando, dessa forma, que a relação ou situação jurídica já definida por decisão transitada em julgado seja novamente apreciada para o efeito de decidir o objeto da segunda ação”.
O que releva é que as Apelantes suscitaram a questão da invalidade decorrente da falta de prestação de informação sobre trabalhadores, e ademais, a questão da aplicação do artigo 285.º, n.º 10 do Código do Trabalho já foi apreciada no primeiro processo, como, aliás, se dá conta na sentença recorrida (“incluindo à luz das alterações a este normativo decorrentes da Lei n.º 18/2021, de 8 abril” .
Como tal, ressuma, evidente a identidade de sujeitos processuais entre os processos, assim como a coincidência de pedidos quanto aos efeitos pretendidos (a adoção de decisão de não adjudicação) e, também, a inegável coincidência de causa de pedir (a suposta invalidade da falta de disponibilização de informação sobre os trabalhadores).
Daí que, a sentença recorrida não mereça a censura que as Apelantes lhe devotam, quando nela se expende: “é patente que estas estão, novamente, a invocar exatamente o mesmo vício que já haviam aduzido no processo 2019/20.6BEPRT, isto é, a falta de disponibilização de informações sobre o número e o regime dos trabalhadores afetos à atividade determinante da ilegalidade da Cláusula 26º do Caderno de Encargos. / Note-se que esta conclusão é tão mais patente quanto na decisão proferida no processo 1973/20.2BEPRT e apensos foi apreciada a imputada invalidade à luz do regime do art. 285.º do Código do Trabalho, tendo-se aí concluído que este normativo nenhum impacto tem no concurso em causa nos autos, ou seja, que a circunstância de tal informação não ter sido fornecida não viola aquele normativo, nem é ilegal face ao normativos aplicáveis”.
È certo que, as Apelantes afirmam que não está apenas em causa a invalidade da cláusula 26.ª do Caderno de Encargos, mas também o impacto da alteração legislativa, a exigir a adaptação das peças do procedimento, mas não é isso que consta da petição inicial, conforme se deu conta acima. De qualquer forma, no processo n.º 1973/20.2BEPRT, já decidimos sobre o impacto da alteração legislativa em causa, tendo-se concluído negativamente.
Deste modo, não só não se vê qualquer fundamento no repisar desta questão, mais não sendo do que chover sobre o molhado, como é consabido estar vedado ao Tribunal voltar a pronunciar-se sobre uma questão já decidida definitivamente, por a tanto o impedir a previsão da exceção de caso julgado.
Termos em que, sem necessidade de mais considerações, improcede o aventado fundamento de recurso.
Quanto à exceção de caso julgado relativamente à invocação da emergência da pandemia provocada pela pandemia de SARS-COV2 e de COVID-19, também nenhuma crítica nos merece a sentença recorrida, verificando-se, efetivamente a exceção de caso julgado, na medida em que esse fundamento de invalidação do procedimento concursal foi já também decidido definitivamente. A questão do impacto da pandemia sobre o conteúdo do Caderno de Encargos foi matéria decidida no processo n.º 1973/20.2BEPRT, no qual se referiu que a aferição sobre se a pandemia produziria impacto sobre o conteúdo das peças do procedimento constitui competência discricionária da AMP, que a exerceu, sem que tenha sido apontado erro grosseiro que sustentasse a sua sindicância jurisdicional, quanto ao memorando de 20/06/2020.
E quanto às quebras de procura ocorridas durante os períodos mais críticos da pandemia, escreveu-se no referido Acórdão que “afigura-se-nos seguro concluir que Tribunal a quo teve em consideração as mencionadas consequências da pandemia, tanto assim que expressamente afirma na sentença recorrida quanto a esta matéria que a pandemia teve efeitos impactantes, designadamente, no setor do transporte público de passageiros. Ademais, essa realidade foi objeto do memorando a que supra aludimos, que o Tribunal a quo deu como provado e cujo teor ponderou. Logo, não temos nenhuma dúvida quanto ao conhecimento, pelo Tribunal a quo, dos factos notórios que as Apelantes reafirmam nesta sede recursiva a respeito das consequências trazidas pela pandemia. (...) Porém, pese embora a pandemia provocada pelo SARS-CoV-2 preencha, em abstrato, o conceito de circunstância superveniente com suscetibilidade de ter um forte impacto nos pressupostos da decisão de contratar, que pode permitir a prática de uma decisão de não adjudicação com consequente extinção do procedimento, importa saber se, no caso concreto, se pode dar como certo que as consequências decorrentes da mesma teve esse forte um impacto nos pressupostos da decisão de contratar de tal modo que impunha que a AMP tivesse proferido uma decisão de não adjudicação. Caso se conclua pela positiva, importa ainda saber se a decisão de não adjudicação tem uma natureza vinculada, isto é, se verificada a existência de uma causa de não adjudicação, a entidade adjudicante tem a obrigação jurídico-legal de praticar uma decisão de não adjudicação e, por consequência, extinguir o procedimento e revogar a decisão de contratar, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 80.º do CCP. (...)É neste quadro de referência, ou seja, tomando em consideração o “Memorando-Impacto da Pandemia no Concurso de Transporte Público da AMT” ( vide alínea AB do elenco dos factos provados), cujas conclusões acima tivemos o cuidado de transcrever em parte, que somos levados a concluir que nas circunstâncias concretas da situação em análise, designadamente, tendo em conta estar-se perante um contrato cujo início de execução se perspetivava para nunca antes de novembro de 2021 e cuja duração era de 7 anos, que a emergência da pandemia provocada pelo SARS-CoV-2, no caso, não impunha de forma inequívoca que fosse proferida uma decisão de não adjudicação sob pena de ilegalidade.
Tendo em conta que não é possível traçar um cenário seguro sobre a evolução da pandemia, designadamente, no sentido mais catastrofista de que a mesma não será controlada, e bem assim, tendo em consideração que seja qual for a evolução que esta doença venha a conhecer, a vida das pessoas e das empresas não se compadece com medidas como as que foram adotadas durante muito tempo, pelo que, forçosamente, a atividade económica terá de ser retomada, o cenário mais aceitável para a escolha dos prestadores do serviço público de passageiros em causa com este procedimento será o cenário conhecido antes da pandemia. É que, estando-se perante um concurso que visa a celebração de um contrato por um período de 7 anos, cujo início de execução apenas se previa, na melhor das hipóteses, para o mês de novembro de 2021, e por conseguinte, não sendo previsível à data, nem presentemente, afirmar que no início do Período de Funcionamento Normal do contrato e durante 7 anos da sua vigência iriam, ou irão permanecer, e com impactos significativos, no setor do transporte público, os fenómenos então desencadeados pela pandemia, não se verificam, a nosso, os pressupostos que justificariam uma decisão de não adjudicação do contrato.
Note-se que, no presente momento, embora se assista a um aumento relevante do número de casos de pessoas infetadas com o COVID 19, e até com uma nova variante, é também irrefutável que a vacinação contra esse vírus revelou ser instrumento poderoso no controlo da doença, impedindo designadamente as manifestações mais graves dessa doença, o que permitiu já uma retoma da economia. Ademais, é inequívoco o esforço gigantesco que as Nações se encontram a desenvolver para que todas as pessoas se vacinem, e para as que já se encontram vacinadas tomem a dose de reforço, numa férrea determinação em controlar a pandemia e em criar as condições necessárias para que a atividade económica e a vida das pessoas retome a normalidade, sendo quanto a nós de afastar cenários catastrofistas, dada os resultados muito positivos já obtidos no controlo desta doença.
No caso, também não é despiciendo ter presente, como bem observa a AMP, que à data da apresentação das propostas já a situação de pandemia existia, pelo que as propostas apresentadas tiveram de ser conformadas por essa realidade, pelo que, por este ângulo, não se poderá falar na ocorrência de uma alteração anormal e imprevisível das circunstâncias para os concorrentes. De resto, convém não esquecer que o risco tarifário corre por conta da AMP!
Em conclusão, não é seguro traçar-se um cenário de redução drástica permanente da procura ao nível do transporte público, como decorrência da pandemia provocada pelo SARS-CoV-2, aquando da execução do contrato em causa, que ainda nem sequer se iniciou, de modo que possa concluir-se que a única decisão que devia ser tomada pela AMP, fosse a de não adjudicação.
Assim, anuímos que no caso em análise, não estavam reunidos pressupostos inequívocos que autorizassem o Tribunal a quo a concluir pela imperatividade de uma decisão de não adjudicação do contrato em causa».
Como tal, a questão da pandemia não pode voltar a ser julgada nestes autos, considerando que nos presentes autos são idênticos os sujeitos, o pedido e a causa de pedir.
Alegam ainda as Apelantes que a questão da pandemia é duradoura, com efeitos em constante evolução e revelação e que, por isso, não poderia ter sido julgada a exceção de caso julgado.
Sucede que, analisada a petição inicial, as Apelantes nada alegam quanto a essa evolução, limitando-se a referir o que já haviam afirmado naquele primeiro processo: a redução da procura e o aumento de custos.
Questão distinta, nunca anteriormente suscitada, é a do conflito Rússsia-Ucrânia. E por não ter sido anteriormente suscitada no anterior processo foi autonomamente tratada pelo Tribunal a quo, que conheceu o mérito da pretensão, como não poderia deixar de ser.
Termos em que, sem necessidades de mais considerações, se impõe julgar improcedentes os invocados fundamentos de recurso.
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b.5. do erro de julgamento decorrente da procedência da exceção da inadequação do meio processual.
Nas conclusões P. a P.10., as Apelantes imputam erro de ulgamento à sentença recorrida no segmento em que julgou procedente a exceção inonimada da impropriedade do meio processual.
Alegam para o efeito, que apresentaram articulado superveniente em 01/06/2022, a fim de carrear aos autos o Acórdão do STA proferido no processo n.º 1973/20.2BEPRT, que veio confirmar, em sede de revista, a declaração da ilegalidade da cláusula Cláusula 53.ª (“Sanções contratuais pecuniárias”) n.º 3 alínea i), n.º 4 alínea m), e n.º 5 alínea n) do Caderno de Encargos do Concurso e a condenação da AMP ao expurgo das normas julgadas inválidas das peças procedimentais, com as “legais consequências”, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto e, até então, confirmada pelo Tribunal Central Tribunal Central Administrativo Norte.
Não se conformam que esse “Articulado Superveniente” tenha sido entendido pela 1.ª Instância como meio processual inadequado à formulação da pretensão de invalidação do ato de adjudicação (e do contrato) fundada na sua desconformidade com o julgado no processo n.º 1973/20.2BEPRT (e apensos) – sob o fundamento de que “as AA. utilizam a ação de contencioso pré-contratual para obter resultados/efeitos […] que só em sede de ação de execução poderiam obter”.
Na ótica das Apelantes, estas não peticionaram, por via do Articulado Superveniente, o cumprimento daquela condenação por via de um poder coercivo do Tribunal a quo, ou seja os resultados/efeitos visados com o Articulado Superveniente são o da decisão no processo n.º 1973/20.2BEPRT enquanto pressuposto material de parte da nova decisão, ficando, com aquele caso julgado, assente um elemento da causa de pedir (“efeito positivo do caso julgado”).
Na tese das Apelantes, o Articulado Superveniente das AA. serviu, ao invés da suposta “petição de execução de sentença”, para deduzir os relevantes factos constitutivos e modificativos supervenientes à petição inicial apresentada e advenientes do Acórdão proferido pelo STA (no processo n.º 1973/20.2BEPRT) já no decurso da ação (em 05/05/2022); cumprindo precisamente a sua função prevista no artigo 86.º do CPTA.
Como tal, concluem que o julgado proferido no mesmo processo 1973/20.2BEPRT (e apensos) não mereceu, na sua vertente positiva, nenhuma consideração de mérito pelo Tribunal a quo, como se lhe impunha, por força do efeito positivo/a função positiva do caso julgado, isto é, que vincula o Tribunal (a quo) e a Ré a acatar o que ali (no processo 1973/20.2BEPRT) ficou decidido no âmbito da decisão aqui a ser proferida.
Logo, impunha-se ao Tribunal a quo o reconhecimento e respeito pela autoridade de caso julgado no processo 1973/20.2BEPRT e apensos, nos termos do estabelecido no n.º 1 do artigo 619.º do CPC (ex vi artigo 1.º do CPTA), conquanto tal decisão tem força obrigatória dentro e fora do processo e impede, dessa forma, que a mesma relação material venha a ser definida em moldes diferentes pelo Tribunal ou qualquer outra autoridade.
Ao assim não proceder, concluem as Apelantes que o Tribunal a quo incorreu em claro erro ao julgar procedente a exceção dilatória inominada de inadequação do meio processual.
Desde já antecipamos que lhes falece razão.
Para aferir da bondade da sentença recorrida, importa ter presente que na ação com processo n.º 2019/20.6BEPRT, as AA. pedidram a anulação do procedimento com fundamento, também, na invalidade da cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos: “a presente acção deve ser julgada provada e procedente por verificação, (...) das ilegalidades (...) das peças do procedimento (...) e, em consequência, ser anulado e extinto o procedimento concursal”.
Contudo, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, na sentença que proferiu, não determinou a anulação ou a extinção do procedimento concursal, tendo-se limitado a declarar a ilegalidade, no que ora releva, da “cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos cujas referências deverão, em conformidade, ser expurgadas das respectivas peças procedimentais, com as legais consequências”.
E o Tribunal Central Administrativo Norte e o Supremo Tribunal Administrativo limitaram-se a julgar improcedentes os recursos da AMP quanto a este aspeto e a manter/confirmar a decisão recorrida.
Assim, como bem entendeu o Tribunal a quo, o dispositivo que se extrai do caso julgado não é a anulação do procedimento. Embora fosse essa a pretensão das ora Apelantes, não foi essa a decisão proferida por nenhuma das Instâncias, não se pondendo extrair do que foi decidido em relação a essa cláusula que o reconhecimento da sua ilegalidade tinha como consequência a anulação do procedimento concursal.
Quanto à questão de saber o que são as legais consequências a que se referiu o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, a AMP considera que as legais consequências serão o expurgo das referidas decisões do Caderno de Encargos e dos contratos a celebrar, mantendo-se o procedimento. As Apelantes, como vemos, consideram que as legais consequências são a anulação do procedimento.
Ora, o meio processual ao dispor das ora Apelantes para obter a execução do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo nos termos em que consideram correto ou para reagir contra uma atuação da AMP que, em seu entender, não se conformasse com o caso julgado, é, como foi decidido pelo Tribunal a quo, a ação de execução de sentença (artigo 176.º, n.os 1 e 5, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), e não o processo declarativo.
No caso, as Apelantes não intentaram qualquer ação de execução de sentença, antes lançaram mão da presente ação declarativa de impugnação de ato administrativo (ao abrigo do artigo 100.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), formulando uma pretensão que o Código de Processo nos Tribunais Administrativos reserva para o artigo 176.º, n.º 5 (em termos análogos ao que se prevê no artigo 164.º, n.º 3).
As Apelantes pretenderiam que fosse o Tribunal a quo, em processo declarativo, a aferir a validade de uma decisão no seu confronto com o caso julgado, ao arrepio do meio processual que o Código de Processo nos Tribunais Administrativos prevê para o efeito. Contudo, o Tribunal a quo não podia proferir uma tal decisão, uma vez que esse julgamento executivo corre por apenso aos autos principais de processo n.º 2019/20.6BEPRT e não por via de uma nova ação declarativa (cfr. artigo 176.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).
Deste modo, a sentença recorrida, ao decidir que a obtenção do efeito que as Apelantes pretendem só é alcançável por via da ação a que se refere o artigo 176.º, n.os 1 e 5, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos é correta, pelo que a subscrevemos, lendo-se nela que: “Ou seja, as AA. utilizam a ação de contencioso pré-contratual para obter resultados/efeitos – a invalidação de atos por desconformidade com sentença e a condenação da Administração à prestação de factos que emergem desse julgado e que entende consistirem na anulação do procedimento e na sua reabertura desprovido das ilegalidades – que só em sede de ação de execução poderiam obter”.
Nesta conformidade, impõe-se julgar como improcedentes os invocados fundamentos de recurso, e confirmar a sentença recorrida.
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b.6. Do conhecimento dos vícios do ato de adjudicação não conhecidos pelo Tribunal a quo
Nas concussões de recurso formuladas sob as alíneas Q. a Q3. as Apelantes, pediram, para o caso de procedência dos fundamentos de recurso que aventaram contra o julgamento da matéria de exceção, que este Tribunal ad quem conhecesse dos vícios do Ato de adjudicação não conhecidos pelo Tribunal a quo, porque ficou impedido de conhecer da maioria dos vícios/invalidades/ilegalidades invocados pelas AA. sobre o Ato de adjudicação impugnado, obstado por força da errada procedência das supra expostas exceções dilatórias.
A este respeito, dir-se-á apenas que tendo em consideração o julgamento desta Instância que julgou improcedentes os erros de julgamento assacados à sentença recorrida quanto à matéria de exceção, confirmando-se a sentença recorrida, não há que conhecer dos alegos vícios que não foram julgados, a tal não o impondo o disposto nos artigos 7.º e 149.º do CPTA.
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b.7. do erro de julgamento decorrente da prolação da decisão de adjudicação antes da prolação do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo.
As Apelantes refutam a bondade da sentença recorrida no segmento em que o Tribunal a quo decidiu que “nada obsta[va] a que, ainda na pendência dos processos 1973/20.2.BEPRT e apensos, fosse praticado o ato de adjudicação impugnado”, concluindo que a presente ação se mostra improcedente quanto a este fundamento aduzido pelas AA.
Advogam que se impunha outra decisão, dada a grave repercussão daquela declaração de ilegalidade da Cláusula 53.ª do CE, e tendo em conta que a AMP atuou em violação dos mais basilares princípios de atuação, como o da prossecução do interesse público e da boa administração (artigos 4.º e 5.º do CPA), numa acentuada violação dos princípios da economicidade e da eficiência, e contra a própria segurança jurídica.
Logo, a impossibilidade da prática do Ato de adjudicação, in casu, não resultaria “apenas”, como. referiu o Tribunal a quo, da adoção de medidas nos termos do artigo 103.º-B do CPTA, antes resultaria do respeito dos referidos princípios e do respeito do artigo 38.º do CPA, que foi erradamente interpretado e aplicado pelo Tribunal a quo com base numa interpretação distorcida da realidade, porquanto, contrariamente ao afirmado, a Cláusula 53.ª do CE constitui um pressuposto da decisão de adjudicação ao ponto de não ser possível decidir a adjudicação (legal) sem que tal questão estivesse decidida.
Acrescentam que também muito mal esteve o Tribunal a quo por não ter, no mínimo, sobrestado na decisão final dos presentes autos até que se aferisse se a AMP cumpriu a condenação ao expurgo das ilegalidades declaradas e as legais consequências, ditados pela decisão definitiva tomada no processo 1973/20.2.BEPRT, à luz do seu poder-dever de gestão processual (7.º-A CPTA), por via de eventual suspensão da presente instância -nos termos do disposto no artigo 15.º do CPTA. E isso, por se encontrar em causa, precisamente, questão prejudicial cujo conhecimento do objeto da presente ação depende em parte.
Vejamos.
Coligida a p.i. que as AA. apresentaram, verifica-se que as mesmas alegaram que estava pendente a prolação de decisão sobre a questão da invalidade da cláusula 53.ª, n.º 3, alínea i), n.º 4, alínea m), e n.º 5, alínea n), do Caderno de Encargos, afirmando concretamente que “a decisão de adjudicação foi claramente intempestiva, por prematura”, e que “a AMP não deveria ter procedido à adjudicação sem conhecer a decisão do STA” (cfr. artigos 82.º, 83.º da petição inicial).
Acontece que, conforme resulta dos factos provados, quando as ora Apelantes instauraram a ação com processo n.º 2019/20.6BEPRT, requereram a adoção de medidas provisórias, vulgo, “a suspensão imediata do procedimento concursal em curso até à decisão final sobre a (in)validade das peças do procedimento e dos demais atos conformadores do procedimento concursal”, mas por despacho de 22/01/2021, foi recusada a adoção da medida provisória de suspensão do procedimento – cfr. facto 49. do elenco dos factos provados.
Logo, a AMP não estava judicialmente impedida de continuar a tramitar o procedimento pré-contratual e de nele proferir as decisões de adjudicação relativamente a todos os Lotes, incluindo o Lote 4.
Porém, esse impedimento, como considerou o Tribunal a quo, poderia resultar da aplicação do artigo 38.º do CPA, caso se considerasse estar perante uma questão prejudicial.
Nos termos do artigo 38.º, n.º 1, do CPA, é prejudicial uma questão que tenha de constituir objeto de procedimento próprio ou que seja competência de outro órgão administrativo ou dos Tribunais.
Ora, a aferição da validade de disposições do Caderno de Encargos não é objeto de procedimento administrativo próprio ou específico, sendo suscitada e decidida no próprio procedimento.
Ademais, como se refere na sentença recorrida, a questão específica da validade das disposições em causa do Caderno de Encargos não constitui pressuposto da decisão de adjudicação, pelo que não constitui uma questão prejudicial.
Por outro lado, também se afigura incontroverso que a entidade adjudicante dispõe de autotutela declarativa quanto às matérias de validade da sua própria atuação. A invalidade de um ato ou de uma disposição das peças do procedimento pode bem ser suscitada no decurso do procedimento, sendo competente para a decidir o órgão competente para a decisão de contratar, a qual produz efeitos imediatos. Logo, se o interessado ou concorrente considerar que a decisão tomada é inválida, tem o ónus de a impugnar judicialmente. E se pretender paralisar os respetivos efeitos, ou requer a adoção de uma medida cautelar (no quadro dos procedimentos pré-contratuais, as medidas provisórias nos termos do artigo 103.º-B, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos) ou beneficia da suspensão automática decorrentes da impugnação nos casos delimitados do artigo 103.º-A, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
De resto, como nota a Apelada AMP, a prática do ato de adjudicação num procedimento pré-contratual apenas depende da tramitação procedimental prevista no Código dos Contratos Públicos e no regulamento do procedimento (Programa ou Convite) e da inexistência de impugnações administrativas pendentes de decisão (cfr. artigo 272.º, n.º 2, alínea c), do Código dos Contratos Públicos).
Ou seja, não existe uma questão prejudicial relativa à validade das peças do procedimento que seja competência exclusiva dos Tribunais.
Mesmo que existisse uma questão prejudicial (e não existe), a verdade é que a AMP sempre poderia ter prosseguido o procedimento, em razão do grave prejuízo decorrente da suspensão do procedimento para os interesses públicos em presença, como resulta do estatuído no artigo 38.º, n.º 2, alínea c), e n.º 3, do CPA.
E certo é que nos presentes autos, tendo sido reconhecido o efeito suspensivo automático decorrente do artigo 103.º-A, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, foi requerido o incidente de levantamento do efeito suspensivo e foi proferida sentença a determinar tal levantamento . Vale o mesmo por referir que, seja no processo n.º 2019/20.6BEPRT, seja nos presentes autos, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto decidiu que a paralisação do procedimento era prejudicial para o interesse público que à AMP cabe defender.
Pelo que é claro que, caso se verificasse a ocorrência de uma questão prejudicial – que, como visto, não ocorre – sempre poderia a AMP ter decidido, discricionariamente, dar continuidade ao procedimento e praticar o ato de adjudicação (cfr. artigo 38.º, n.º 3, do Código do Procedimento Administrativo).
Aqui chegados, impera concluir que inexiste qualquer questão prejudicial, pelo que não merece censura a sentença recorrida.
Termos em que improcedem os invocados fundamentos de recurso.
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b.8. do erro de julgamento decorrente da improcedência da causa de não de adjudicação prevista no n.º1 do artigo 79.º do CCP.
As Apelantes sustentam que o Tribunal a quo julgou erradamente pela improcedência do fundamento de invalidade/ilegalidade do Ato de adjudicação pela verificação da causa de não adjudicação prevista no art. 79.º, n.º 1 do CCP, por força das circunstâncias supervenientes (desde o lançamento do concurso, em 2020, até à data da decisão de adjudicação, em 2022) que constituem alteração das circunstâncias concretizada, sobretudo mas não só, no cenário de crise energética e custos com combustível agravados e inéditos por força da invasão da Ucrânia pela Rússia.
Alegam para tanto, que o Tribunal a quo considerou que “as referenciadas circunstâncias supervenientes são inócuas aos pressupostos da decisão de contratar, reiterando que “ainda que se admitisse que os efeitos da guerra na Ucrânia ao nível do aumento de custos dos combustíveis representassem a ocorrência de circunstâncias supervenientes, elas em nada se repercutem nos pressupostos da decisão de contratar. […] nenhuma interferência as vicissitudes sociais, económicas e financeiras seriam aptas a eliminar a necessidade de satisfação do interesse público subjacente à decisão de contratar”.
As Apelantes sustentam que nunca pugnaram que a (gravosa) alteração das circunstâncias económico-financeiras (desde o lançamento do concurso, em 2020, até à data da decisão de adjudicação, em 2022) torna desnecessária a contratação do serviço lançado a concurso, mas apenas que essa situação impacta negativamente, nos pressupostos e bases económico-financeiras dessa decisão. Assim, ao invés de ter desde logo decidido pela desnecessidade da produção de prova pericial, de ter desconsiderado totalmente o Parecer Jurídico do Professor Pedro Costa Gonçalves, de março de 2022, precisamente a respeito desta questão concreta e de ter também desconsiderado um parecer económico-financeiro de 22 de abril de 2022 da autoria do Professor Amílcar Arantes, o Tribunal a quo devia antes ter ter considerado e apreciado o Parecer Jurídico do Professor Pedro Costa Gonçalves, de março de 2022, bem como os factos notórios atinentes à atual situação de crise, diversamente oposta ao quadro económico-financeiro e energético nacional/europeu/mundial de 2019, que serviu de base à arquitetura e lançamento do concurso em crise.
Ao arrepio do que entendem que devia ter sucedido, o Tribunal a quo, erradamente, preferiu, a acrescer, crer superficialmente no «Estudo de Viabilidade Económica e Financeira (análise custo benefício para efeitos do art.º 36.º do CCP), Atualização (fevereiro de 2022)» enquanto comprovador da manutenção da validade dos pressupostos económico-financeiros inicialmente assumidos pela e demonstrador da viabilidade na concretização da operação… Quando, desde logo, uma mera leitura do mesmo permite que se afirme, sem reservas, que o mesmo não teve em consideração a eclosão da crise energética com particular gravidade em matéria de preços dos combustíveis,
Acrescentam, que ao contrário do que a AMP quer fazer crer, é facilmente demonstrável que, nas circunstâncias atuais, nenhum operador (sério e realista, bem entendido) pode propor um o valor de 1.71 euros/km a título de custo unitário.
Mais referem ser do senso comum e contrariamente ao que a AMP “espera” / “estima”, que tal alteração das circunstâncias perdurará, não podendo desconsiderar-se as notícias que correm no presente setembro sobre os graves níveis históricos de inflação no país (e no mundo) e mais, em concreto, o novo diploma do Governo português que fixa o congelamento de todas as atualizações dos preços dos passes dos transportes públicos em 2023, sendo factos notórios que podem e devem ser considerados pelo Tribunal (também de recurso), sempre nos termos do artigo 5.º n.º 2 al. c) CPC (ex vi artigo 1.º do CPTA.
Consequentemente, o Tribunal a quo andou mal na sua decisão, tendo baseado a sentença recorrida numa desatualizada/insuficiente, ausente e errada interpretação da realidade factual e errada interpretação e aplicação do direito aplicável, sobretudo dos termos do artigo 79.º do CCP.
Vejamos.
Em relação ao conflito Rússia- Ucrânia, e ao seu impacto no aumento dos custos de combustíveis, lê-se na sentença recorrida a seguinte fundamentação: “O que sucede é que a este respeito as AA. se limitaram a alegar os aumentos dos custos dos combustíveis advenientes do conflito armado entre a Rússia e a Ucrânia sem, em momento algum, evidenciar a repercussão dos mesmos nos termos da exploração do serviço de transportes coletivos públicos que ficou definida no Caderno de Encargos”.
Conforme resulta das conclusões de recurso, as Apelantes alegam que nunca pretenderam o enquadramento da sua pretensão no artigo 79.º, n.º 1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos. É certo que as Autoras, ora Apelantes, limitaram-se a enunciar a alteração das circunstâncias,sem indicarem que efeito pretendiam retirar dessa alegação.
Daí que o Tribunal a quo tenha apreciado a questão nas duas perspetivas teoricamente admissíveis: de a alegação contribuir para o pedido formulado na alínea b) do petitório e de a alegação contribuir para o pedido formulado subsidiariamente para a alínea c) do petitório, no que não merece qualquer reparo.
Quanto à discordância que as Apelantes assumem contra a decisão recorrida por o Tribunal a quo atender a informação noticiosa, essa alegação é contraditória com o apelo que fazem à notoriedade dos factos que dizem sustentar a alteração das circunstâncias provocada pelo conflito Rússia-Ucrânia. Ou seja, ao mesmo tempo que se refugiam na invocação de que estão em causa factos públicos e notórios, insurgem-se contra o Tribunal a quo por, tratando a matéria do aumento dos combustíveis como pública e notória, se ter socorrido da informação noticiosa corrente.
A este respeito dir-se-á, como sustenta a Apelada AMP « ou bem que o aumento do custo dos combustíveis constitui facto público e notório e o Tribunal pode socorrer-se da informação pública que exista, ou bem que não constitui facto público e notório e às Recorrentes não bastava enunciar conclusivamente esse aumento, tendo, ao menos, de alegar como factos o preço do combustível que iriam consumir que existia à data da apresentação da proposta e o preço que existe atualmente. O que as Recorrentes não podem é obter o melhor das duas hipóteses, porque elas são contraditórias».
Ademais, não tendo as Apelantes reagido contra a matéria de facto dada como porvada, à míngua de factos provados, não estava ao alcance do Tribunal a quo julgar ter ocorrido uma alteração das circunstâncias.
Para que assim sucedesse, seria necessário que se dessem como provados: (i) as circunstâncias que existiam à data da apresentação das propostas (não em 2019, como pretendem as Apelantes, mas à data da apresentação das propostas); (ii) as circunstâncias que existiam na data da decisão de adjudicação; (iii) tendo em consideração que o contrato a celebrar só iniciará a operação 6 meses após o respetivo início de produção de efeitos (cfr. cláusulas 6.ª a 8.ª do Caderno de Encargos – Facto Provado 10.), as circunstâncias que previsivelmente existirão nessa data, que se estima vir a ocorrer entre o início e o final do segundo semestre de 2023 (atendendo às formalidades pós-adjudicatórias que estão enunciadas no Programa do Concurso – Facto Provado 8.).
Não consta dos autos a necessária alegação (e prova) de matéria de facto que permitisse aferir se o maior ou menor aumento que se pode encontrar nos postos de abastecimento de combustível automóvel também ocorre nos combustíveis adquiridos pelas Apelantes, para a sua operação (e por qualquer outro operador de transportes rodoviários coletivos de passageiros) ou em que medida possa ocorrer. O preço pelo qual adquirem combustível para os seus autocarros não constitui um facto público nem notório, como não é público nem notório o impacto que o preço dos combustíveis produz sobre a execução do contrato a celebrar.
Trata-se de matéria que carecia de ser alegada e que não foi, como indicado pelo Tribunal a quo na sentença recorrida.
Em todo o caso, sempre se diga que, o aumento dos combustíveis já constitua uma realidade antes do conflito Rússia-Ucrânia, e daí que através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 153/2021, de 12 de novembro (na redação conferida pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 7/2022, de 26 de janeiro), foi criado um apoio extraordinário para apoio às empresas que operam no setor dos transportes públicos de passageiros. E foi também antes do início do conflito Rússia-Ucrânia que foi aprovada a Portaria n.º 111-A/2022, de 11 de março, que introduziu um mecanismo semanal de revisão dos valores das taxas unitárias do ISP aplicáveis, no continente, à gasolina sem chumbo e ao gasóleo rodoviário.
Tais medidas foram continuando a ser aplicadas e até reforçadas desde então, v.g., através das Portarias n.os 128-A/2022, de 25 de março, 135-B/2022, de 1 de abril, 138-A/2022, de 8 de abril, 140-A/2022, de 29 de abril, 152-A/2022, de 27 de maio, 155-A/2022, de 3 de junho, 164-A/2022, de 24 de junho, 167-D/2022, de 1 de julho, 217-B/2022, de 31 de agosto, e 249-C/2022, de 3 de outubro.
Ou seja, é verdade, como afirma o Tribunal a quo, que “têm sido tomadas medidas no sentido de minorar os efeitos dos aumentos dos preços nas atividades económicas antecipando cenários de recessão e, nesse sentido, não se podendo, sem mais, antever e considerar que aquando do início da exploração das linhas do lote 4 pelo adjudicatário não só se mantenha o conflito a potenciar o aumento do custo dos combustíveis, como os preços dos combustíveis estejam, então, em níveis elevados e tão superiores aos que foram considerando aquando da decisão de contratar que sejam de molde a afetar a exploração do serviço” (p. 223 da sentença recorrida).
Deste modo, quando foi feita a atualização do Estudo de Viabilidade Economico-Financeira, já era conhecido o fenómeno do aumento dos preços dos combustíveis.
Recorde-se que a decisão de não adjudicação não se afigura vinculada.
Como é sabido, o artigo 76.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos (na redação de 2017 aplicável ao caso dos autos), estabelece um verdadeiro dever de adjudicação: “a tramitação de um procedimento de formação de um contrato público, caso produza pelo menos uma proposta que possa ser adjudicada (isto é, que não deva ser excluída), deverá terminar com um ato de adjudicação” (cfr. MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito, I, cit., p. 528). Este dever de adjudicação corresponde a um direito subjetivo do concorrente classificado em primeiro lugar, exercível até judicialmente. O legislador previu, contudo, exceções a este dever (sobre esta natureza excecional, cfr., e.g., PEDRO F. SÁNCHEZ, Direito, II, cit., pp. 373 e ss.), permitindo que em determinadas situações possa ser adotada uma decisão de não adjudicação.
No que ora releva, nos termos do artigo 79.º, n.º 1, alíneas c) e d), do Código dos Contratos Públicos, para que tivesse lugar uma decisão de não adjudicação necessário seria que (i) ocorressem circunstâncias supervenientes (ii) que a AMP considerasse alterarem os pressupostos da decisão de contratar e (iii) justificar que não se produzisse decisão de adjudicação (seja por já não se pretender contratar, seja por ser necessário alterar as peças do procedimento em aspetos fundamentais – dado que se não forem fundamentais, não é necessário proferir decisão de não adjudicação).
Nestas disposições surpreende-se um primeiro momento, de natureza objetiva, e uns segundo (e terceiro) momentos que se reconduzem ao exercício de valorações próprias da Administração (v.g. discricionariedade e valoração de conceitos verdadeiramente indeterminados).
O primeiro momento é o relativo à alteração dos pressupostos a decisão de contratar: a decisão de abertura do procedimento assentou em determinados pressupostos de facto e de direito; é necessário que ocorra “uma alteração de elementos de facto e de direito (u uma descoberta de elementos antes ignorados) em que a entidade adjudicante se apoiou para decidir recorrer ao mercado e solicitar a colaboração dos particulares na prossecução do interesse público. É essa alteração objetiva (...) que pode permitir à entidade adjudicante interromper o procedimento” (cfr. PEDRO F. SÁNCHEZ, Direito, II, cit., pp. 388, 389).
Ora, analisada a petição inicial, as Apelantes (i) não identificam os pressupostos de facto e de direito em que assentou a decisão de abertura do procedimento; (ii) não identificam o modo como tais pressupostos se alteraram.
Tanto basta para que improcedesse a sua pretensão.
Mas, ainda que tivesse ocorrido a invocação e comprovação dos factos concretos de que pudesse resultar algum tipo de alteração dos pressupostos, ainda assim o legislador confere à entidade adjudicante a competência para proceder à sua apreciação no caso concreto.
O órgão competente para a decisão de contratar “pode” tomar decisão de não adjudicação se considerar que circunstâncias supervenientes o justificam (cfr. PEDRO C. GONÇALVES, Direito, cit., p. 940), sendo convocada a realizar um juízo verdadeiramente discricionário sobre os pressupostos de facto e de direito com que se depara no decurso do procedimento, comparando-os com aqueles que foram adotados aquando da decisão de contratar, para verificar se existe uma verdadeira alteração dos pressupostos em que assentou a sua decisão pretérita (cfr. PEDRO F. SÁNCHEZ, Direito, II, cit. p. 388) e para aferir qual o melhor modo de com ela lidar. Essa aferição constitui, evidentemente, um juízo discricionário, caracterizado (i) por uma necessária “ponderação de interesses conflituantes” que, depois, permitirá a escolha do concreto interesse a prosseguir na atuação administrativa e (ii) por um juízo de prognose, definido como o “juízo de previsão, mediante o qual se pretende visualizar, hoje, como elemento de ponderação da decisão administrativa, ocorrências futuras, sejam elas relações humanas, condicionalismos económicos, sociais, técnicos, etc.” (cfr. BERNARDO DINIZ DE AYALA, O (Défice), cit., p. 107; SÉRVULO CORREIA, Legalidade, cit., pp. 471, 472, 474, 475 e 480).
São elementos da discricionariedade, além da previsão normativa da competência, desempenhando as funções de fundamento, critério e limite, um critério de orientação fixado pelo titular da competência para a atuação, o juízo de prognose e a ponderação de interesses; da conjugação destes elementos resulta o conceito de discricionariedade: “espaço de livre decisão conferido pelo «bloco de legalidade», no âmbito do qual o titular do poder competente exerce, de acordo com as orientações e dentro dos limites da norma habilitadora, um poder administrativo de acordo com os critérios por ele livremente escolhidos, com base num juízo de prognose e com vista à composição de todos os interesses em jogo” (BERNARDO DE AYALA, O (défice de), cit., pp. 107 e 108); através deste poder, a Administração tem o papel de identificar e ponderar os vários interesses em presença no procedimento administrativo para, posteriormente, em conjunto com um juízo da evolução futura de cada hipotética decisão, procurar conformar os vários interesses, com o objetivo de emitir a melhor decisão, que não a única possível (cfr. BERNARDO DE AYALA, O (défice de), cit., p. 141).
Neste quadrante ganham relevo os pressupostos do ato a praticar que, contendo-se parcialmente na previsão normativa da competência, exigem o exame da situação real da vida em concreto para, preenchendo-se os vazios deixados pela textura aberta da previsão tal como enunciada na norma, encontrar um nexo racional de causalidade entre a situação fáctico-jurídica e um sentido de decisão, não subsuntivamente deduzido, mas querido através da ponderação de interesses e/ou da concretização de juízos valorativos (cfr. SÉRVULO CORREIA, Legalidade, cit., pp. 469 e ss., em particular p. 481-486).
Também neste sentido, GONÇALO GUERRA TAVARES é expresso em afirmar que existe “uma visão pro entidade adjudicante no que respeita ao preenchimento do critério de invocação de circunstâncias supervenientes, deixando na sua discricionariedade a invocação de razões de interesse público que justifiquem a não adjudicação e a posterior revogação da decisão de contratar” (cfr. Comentário ao Código dos Contratos Públicos, Almedina, 2019, p. 350).
No caso em apreço a norma apresenta uma dupla abertura, através da utilização de um conceito verdadeiramente indeterminado e pela previsão de elementos de discricionariedade, na medida em que, caso ocorra uma alteração aos pressupostos que fundamentaram o interesse público na abertura do procedimento (apurados, precisamente em função do que a AMP considerou e considera ser o interesse público), a AMP pode decidir não adjudicar, se considerar que essa é a decisão justificada, i.e. necessária, adequada e proporcional, bem como em conformidade com a boa fé.
Assim, o que sucede é que a AMP teria que preencher o conceito de interesse público, realizando o tal juízo de prognose, verificando, posteriormente, se a clarificação do conceito a que chegou, por referência aos elementos factuais e jurídicos apurados, permite a sua adequação aos efeitos pretendidos pela norma; preenchido o conceito, a AMP deveria ainda, discricionariamente, decidir sobre a decisão de não adjudicação, comparando e estratificando os vários interesses em presença para decidir por uma das alternativas de atuação que lhe for apresentada no caso concreto.
Ora, no caso dos autos, as Apelantes não alegaram qualquer erro sobre os pressupostos de facto, nem invocaram o erro manifesto de apreciação. Simplesmente, discordam do entendimento da AMP, mas essa discordância não basta para que o Tribunal invada a esfera dos juízos próprios da Administração.
Verificando-se que não existe razão para alteração das peças e que os adjudicatários mantêm interesse na contratação apesar de já não estarem vinculados às suas propostas, o lançamento de novo concurso apenas conduziria a propostas menos vantajosas para o interesse público.
Não é despicienda a circunstância de, nos termos do artigo 76.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos, os adjudicatários poderem recusar a adjudicação (há muito que foi ultrapassado o prazo de manutenção das propostas), caso considerem que a proposta que apresentaram se tornou inexequível.
Ora, nenhum dos adjudicatários suscitou essa questão ou afirmou recusar a adjudicação, o que bem demonstra que as circunstâncias conclusivamente suscitadas pelas Apelantes. De resto, nenhum concorrente, nem mesmo as Apelantes, retiraram a sua proposta, conforme lhe era permitido pelo disposto no artigo 65.º do Código dos Contratos Públicos (a contrario).
Se se pode admitir que existe alguma variação hoje das condições face àquelas que existiam aquando da apresentação das propostas é altamente improvável que as condições que existem hoje se venham a manter no futuro, i.e. no momento do início do Período de Funcionamento Normal (entre o princípio e o final do 2.º semestre de 2023), é quase certo que não se mantenham ao longo dos 7 anos subsequentes. Se se adotasse hoje uma decisão de não adjudicação e, se por hipótese académica, se abrisse novo procedimento análogo, correr-se-ia o sério risco (se não constituísse mesmo uma certeza) de os concorrentes apresentarem propostas de preço/km tendo por referência os custos de hoje, apesar de apenas executarem o contrato daqui a bastante tempo.
Noutro plano, importa atender a que, nos termos da cláusula 42.ª, n.º 2, do Caderno de Encargos (cfr. Facto Provado 10.; processo administrativo, fls. 2546): “O preço unitário por quilómetro indicado na Proposta referido na alínea a) do número anterior é objeto de atualização anual em função do valor máximo da TAT previsto na Portaria nº 298/2018, de 19 de novembro, ou, quando seja o caso, em função da atualização tarifária extraordinária que seja determinada pelo CONTRAENTE PÚBLICO nos termos do artigo 8.º da Portaria nº 298/2018, de 19 de novembro”.
Ou seja, está prevista a revisão ordinária de preços, o que se compreende em razão de se estar perante um contrato com a duração de 7 anos. Essa revisão ordinária de preços assim prevista contratualmente dará resposta aos aspetos conclusivamente suscitados pelas Autoras.
Dito isto, certo é que a decisão de não adjudicação, mesmo com vista à abertura de um novo procedimento, comporta uma decisão que se integra na margem de livre valoração da Administração. “E, seguindo a linha da sentença proferida no processo 1973/20.2BEPRT, atenta a discricionariedade subjacente ao juízo de definição dos moldes em que assentará a relação contratual, impunha-se que as AA. demonstrassem que o juízo acima referenciado padece de erro grosseiro, o que não fizeram.
Em conclusão, não é possível aceitar que se tenha verificado uma alteração das circunstâncias subjacentes à decisão de contratar e à definição da regulação da execução contratual estabelecida no Caderno de Encargos que imponha à AMP a decisão não adjudicação e consequente revogação da decisão de contratar, pugnando-se pela improcedência do presente fundamento da ação” (cfr. p. 223 da sentença recorrida).
Quanto aos factos que as Apelantes pretendem sejam considerados por este Tribunal ad quem, trata-se de factos novos, que não foram alegados e que não estão provados nos autos, sobre os quais este Tribunal ad quem não pode, naturalmente, emitir pronúncia.
Considerados a partir da finalidade da impugnação, os recursos ordinários podem ser configurados como um meio de apreciação e de julgamento da acção por um tribunal superior ou como meio de controlo da decisão recorrida. No primeiro caso, o objecto do recurso coincide com o objecto da instância recorrida, dado que o tribunal superior é chamado a apreciar e a julgar de novo a acção: o recurso pertence então à categoria do recurso de reexame; no segundo caso, o objecto do recurso é a decisão recorrida, dado que o tribunal ad quem só pode controlar se, em função dos elementos apurados na instância recorrida, essa acção foi correctamente decidida, ou seja é conforme com esses elementos: nesta hipótese, o recurso integra-se no modelo de recurso de reponderação.
No direito português, os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida, dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento do seu proferimento, o que significa que, em regra, o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não hajam sido formulados: os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais – e não meios de julgamento de questões novas.
Excluída está, portanto, a possibilidade de alegação de factos novos - ius novarum nova – na instância de recurso. Em qualquer das situações, salvaguarda-se, naturalmente, a possibilidade de apreciação, em qualquer grau de recurso, da matéria de conhecimento oficioso.
No caso, não se alegue que são factos públicos e notórios os referidos, porque o que é público e notório é o preço do combustível que qualquer sujeito adquire nos postos de abastecimento públicos. O que é não é conhecido (não é público nem notório), é o custo dos combustíveis que elas (e os demais operadores de transporte rodoviário coletivo de passageiros) adquirem para a sua operação. E é este custo de combustível que relevaria para efeitos de verificação de uma alteração dos pressupostos que determinaram a decisão de contratar.
Não merece, pois, qualquer censura a sentença recorrida.
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IV-DECISÃO
Nesta conformidade, acordam os Juízes Desembargadores deste Tribunal Central Administrativo do Norte em negar provimento ao recurso interposto e, em consequência, confirmam a sentença recorrida.
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Custas pelas apelantes (art.º 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.
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Porto, 13 de janeiro de 2023

Helena Ribeiro
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa