Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01891/12.8BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/06/2025
Tribunal:TAF de Braga
Relator:TIAGO MIRANDA
Descritores:RECURSO EM MATÉRIA DE FACTO;
EMPREITADA DE OBRA PÚBLICA;
SOBRECUSTOS;
Sumário:
I – Cumpre distinguir o erro na apreciação da prova de factos dos quais cumpra ao tribunal conhecer, esse sim, erro de julgamento de facto, por um lado, da omissão de selecção – como provados ou não provados – de tais factos, por outro, omissão que qualificamos como falta de especificação de fundamentos de facto da sentença, causadora de nulidade da sentença nos termos da alª b) do nº 1 do artigo 615º do CPC, suprível sempre que possível nos termos dos artigos 662º do CPC e ou 149º nº 1do CPTA (665º do CPC).

II - Antes de se julgar que determinado facto ficou provado ou não provado há que verificar se era devida a selecção deste facto (como provado ou não provado), isto é, se a Mª Juiz a qua devia tomar em consideração este facto conforme artigo 5º nºs 1 e 2 do CPC. Só no caso afirmativo terá sentido e será admissível aquela outra questão.

III - Verificando-se que não só tal facto não foi alegado como tão pouco se alega, nem o tribunal o cogita, o que estabeleça uma relação de instrumentalidade ou complementaridade entre aquele e qualquer facto alegado, muito menos decorrendo do registo da Audiência de Julgamento a intenção, do Recorrente, de se valer de tal facto e a possibilidade de a recorrida sobre isso se pronunciar, não só não era devida como não era admissível a consideração, na sentença, deste facto que o Réu Recorrente pretende ver aditado, pelo que não ocorre a apontada falta de especificação de um facto como provado.

IV – Tem sentido, em abstracto, a alegação de que no preço dos contratos adicionais estejam incluídos, tal como no contrato inicial, os encargos com a manutenção em obra e os encargos estruturais com o funcionamento quer da empresa quer do estaleiro da obra. Ponto é que em concreto se possa ao menos presumir judicialmente que essa era a vontade contratual das partes, o que não sucede in casu, desde logo porque, conforme alíneas S) e T) dos factos provados, ante o pedido, pela Autora, de compensação pelos sobrecustos suportados coma prorrogação do tempo de execução da obra por 21 dias, devido à realização das obras necessárias para suprimento de erros e omissões do projecto, o Réu aceitou a prorrogação de 15 dias e pagar um valor – inferior ao pretendido – de 31 027,98 €.

V - Além disso, não foi alegado em contestação, que os contratos adicionais tenham tido por objecto, não só os trabalhos complementares adicionais como também os custos causados pela paragem da obra, pelo período em que a execução esteve suspensa e, portanto, tão pouco os trabalhos adicionais foram executados.

VI - Não se pode deixar a prova do an e do quantum dos sobrecustos alegadamente suportados pelo empreiteiro por causa da permanência em obra por mais tempo de que o contratualizado, ao depoimento conclusivo e, portanto, insindicável de uma testemunha, empregado de empreiteiro: não só atenta esta especial relação da testemunha com a parte interessada, mas, sobretudo, porque se trata de factos aos quais se terá chegado ao cabo da selecção e do tratamento de muitos outros factos, – estes, sim, individuais e concretos – que não foram alegados e sobre os quais não se produziu prova, e de outras tantas operações de cálculo aritmético e estatístico, factos e operações, aliás, cujos conhecimento e selecção, e cuja efectuação, respectivamente, relevam de conhecimentos técnicos que o juiz, em regra, não tem. Enfim, os sobreditos sobrecustos, para poderem ser seleccionados, sem mais alegação, como factos relevantes e como factos provados careciam de uma exibição da contabilidade da autora e de uma perícia a esta sobre esta. Já os custos estruturais da mesma permanência, tal como vêm alegados, nem mesmo são factos, mas considerações teóricas, pelo que não podem, sequer, ser objecto de um juízo de prova.

VII- Mesmo que, porventura, partindo de uma necessária flexibilidade na concepção do que seja matéria de facto, se acolhesse tal natureza às alegações de encargos de estrutura, sempre obstaria à prova destes factos a falta de prova, em concreto, do nexo de causalidade entre os encargos estruturais da manutenção da empresa adjudicatária e esta obra concreta, pois trata-se por natureza, de encargos que aquela tem de assegurar em alguma medida permanentemente, independentemente das obras em curso e seu eventual prolongamento imprevisto.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - Relatório
MUNICÍPIO ..., Réu nos autos à margem identificados, interpôs recurso de apelação da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 28/11/2024, que julgou parcialmente procedente a acção administrativa comum contra si intentada por [SCom01...], S.A., com sede no Lugar ..., Freguesia ..., ... ..., pessoa colectiva n.º ...08, condenando-o a pagar à Autora a quantia de 107 533,27 € acrescida de juros de mora comerciais desde a citação como indemnização dos danos sofridos por ter tido de permanecer em obra 52 dias para além do prazo contratual.

Também a AUTORA apresentou recurso de apelação relativamente à parte em que decaiu.

O segmento final da Petição Inicial tem o seguinte teor:
«60. Em conformidade com todo o exposto, pelos factos supra descritos, a A. requer a condenação do R. no pagamento de indemnização no valor total de 247.039.90 € (duzentos e quarenta e sete mil, trinta e nove euros e noventa cêntimos), acrescidos de juros à taxa legal aplicável aos créditos de que são titulares as empresas comerciais, desde a citação até efectivo pagamento, sendo:
a) 152.401,52€, a título de custos com pessoal e equipamento derivado da suspensão da execução pelo período de 37 dias que, necessariamente, obrigou a uma prorrogação legal por esse mesmo período;
b) 61.784,40€, a título de custos com pessoal e equipamento derivado da a uma prorrogação legal do prazo por mais 15 dias para execução de trabalhos de suprimento de erros e omissões por motivos imputáveis ao R.;
c) 32.853,98€, a título de custos de estrutura pelo período de 52 dias (37 dias da suspensão + 15 dias da prorrogação).
61. Tudo num total de 247.039,90€ (duzentos e quarenta e sete mil, trinta e nove euros e noventa cêntimos), que se requer.
Nestes termos, e nos mais de direito que V. Exa. mui doutamente suprirá, deve a presente acção ser julgada procedente, por provada, e em consequência deve a R. ser condenada a pagar à A. a quantia de 247.039,90€ (duzentos e quarenta e sete mil, trinta e nove euros e noventa cêntimos), acrescidos de juros à taxa legal aplicável aos créditos de que são titulares as empresas comerciais, desde a citação até efectivo pagamento, e a pagar as custas do processo.»

O segmento final da fundamentação e o dispositivo da sentença recorrida têm o seguinte teor:
Todavia, o quantum a ter em conta para efeitos de condenação é o correspondente ao valor reclamado, a saber:
- pelos 37 dias de suspensão da obra: 77.650,00€;
- pelos 15 dias de prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões: €31.027,98, o qual inclui custos de estrutura da empresa;
Com efeito, foram apenas estes os custos que a Autora — oportunamente - imputou ao dono de obra pelas vicissitudes das quais advinha o direito à dilação temporal que reclamava ser indemnizada, e tal não pode deixar de significar (também) o reconhecimento do quantum que desequilibrou a equação financeira do contrato.
Assim, reconhecido pelo Réu o período de suspensão da obra como o direito do empreiteiro à dilação temporal da obra (prorrogação legal), nunca tendo em fase de resposta à reclamação colocado em causa os valores unitários convocados, limitando-se o Dono da Obra, antes, a afastar qualquer cenário de imputabilidade das vicissitudes que ele próprio reconheceu como sendo-lhe atribuíveis, forçoso será condenar o Município Demandado no exacto quantum reclamado, provados que foram em juízos factos demonstrativos da maior onerosidade da prestação do empreiteiro por mais 52 dias em obra.
Às quantias acrescem juros de mora, à taxa comercial, devidos desde a citação até efectivo e integral pagamento

As alegações do recurso Réu Município terminam com as seguintes conclusões:
«I. O Recorrido [SIC] não pode concordar com o entendimento vertido na sentença, desde logo, porque o Tribunal a quo não efectuou o devidamente o enquadramento jurídico dos factos e do direito em causa.
II. O que sucedeu, e que o douto Tribunal a quo fez, foi acolher sem questionar a tese da Autora/Recorrida, partindo do pressuposto que a suspensão da obra gera, automaticamente, prejuízos associados. Sucede que, nem sempre assim é, ou pelo menos não o é nos valores que se encontram aqui em discussão.
III. Foi julgado procedente e, consequentemente, o Recorrido condenado ao pagamento do valor peticionado a título de indemnização para reequilíbrio financeiro do contrato decorrente da suspensão por 37 dias e da prorrogação por 15 dias, decorrentes da execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, no valor global de € 107.533,27 (cento e sete mil, quinhentos e trinta e três euros e vinte e sete cêntimos).
IV. A douta sentença recorrida julgou a acção parcialmente procedente, uma vez que se entendeu que o Réu reconheceu o período de suspensão da obra como o direito do empreiteiro à dilação temporal da obra (prorrogação legal), nunca tendo em fase de resposta à reclamação colocado em causa os valores unitários convocados, limitando-se a afastar qualquer cenário de imputabilidade das vicissitudes que ele próprio reconheceu como sendo-lhe atribuíveis.
Relativamente à suspensão da obra por um período de 37 dias, ficou provado, entre outros, o seguinte:
K) Em 30 de Março de 2011, o Município Demandado determinou a suspensão da execução dos trabalhos, tendo a decisão de suspensão sido formalizada no Auto n.° 9, cujo teor em parte segue: “devido à necessidade de alteração das fundações dos edifícios após a realização de ensaios geotécnicos, e de execução do desvio do colector de águas pluviais que atravessa a área de implantação do edifício, não se torna possível prosseguir com os trabalhos da empreitada, pelo que os mesmos deverão ficar suspensos".
Q) Ao longo de 37 dias de suspensão de obra, a Autora suportou encargos relacionados com equipamentos e trabalhadores afectos à obra, designadamente com: Contentores Betoneiras
Vibradores de betão
Guarda corpos
Tábuas para guarda corpos
Máquinas
Ferramentas
Gruas
Cofragem
Escoramentos
Bomba
Andaime
Equipamento de segurança colectivo
Equipamento de topografia
Rectro-escavadora
Camião
Viaturas
Equipamentos de telecomunicações
Director de técnico da empreitada
Director de obra adjunto
Encarregado
Preparador
Apontador
Técnico de segurança
Técnico de Acompanhamento Ambiental
Técnico de Qualidade
Topografo Porta Miras Armadores de ferro Carpinteiros de cofragem)
Manobrador de máquinas Condutor de camião Gruista Serventes
VI. Ora, tendo em conta a prova produzida nos autos, tanto documental como testemunhal, não se compreende como pôde o douto Tribunal a quo decidir da forma que decidiu.
VII. Relativamente à suspensão da obra pelo período de 37 (trinta e sete) dias, em reunião de obra de 09/03/2011, e na sequência da observação conjunta das características do terreno pelos Engenheiros Projectistas, Fiscalização e Entidade Executante, foi decidido que seria necessária a realização de ensaios geotécnicos para confirmação das tensões do terreno. Na sequência desses estudos, foi entregue à Recorrida um projecto de alteração das fundações, para apresentação de preço para os novos trabalhos.
VIII. Nessa sequência, em 30/03/2011, foi assinado o auto de suspensão de trabalhos, que foi levantado em 06/05/2011, e não antes porque a Recorrida atrasou, injustificadamente, a apresentação de preços. Mas ainda assim, a verdade é que os trabalhos não estiverem parados.
IX. De facto, tal entendimento pode retirar-se do depoimento das testemunhas inquiridas em sede de julgamento, nomeadamente da testemunha «AA» (depoimento a minutos 37:40 da gravação) e da testemunha «BB» (depoimento a minutos 24:50 da gravação).
X. Ou seja, o que sucedeu foi que o Tribunal foi acatar a tese da Recorrida, sem valorar criticamente a questão concreta em causa.
XI. Na verdade, a suspensão de trabalhos, diversamente do que parece resultar da douta sentença recorrida, não determina necessária e automaticamente custos associados. 
XX. Até porque, no caso em apreço e conforme ficou provado pela prova produzida, a suspensão dos trabalhos não foi total, mas sim parcial, pelo que não pode o Tribunal a quo, sem mais, fazer tábua rasa desse circunstancialismo e simplesmente declarar que os trabalhos ficaram suspensos e que tal deu origem a um direito à Recorrida!!
XIII. Por tudo quanto foi dito, deverá a matéria de facto dada como provada ser alterada, passando o facto dado como provado K) a ter a seguinte redacção:
K) Em 30 de Março de 2011, o Município Demandado determinou a suspensão parcial da execução dos trabalhos, tendo a decisão de suspensão sido formalizada no Auto n.° 9, cujo teor em parte segue: “devido à necessidade de alteração das fundações dos edifícios após a realização de ensaios geotécnicos, e de execução do desvio do colector de águas pluviais que atravessa a área de implantação do edifício, não se torna possível prosseguir com os trabalhos da empreitada, pelo que os mesmos deverão ficar suspensos".
XIV. Deve, ainda, ser aditado um ponto K1), com a seguinte redacção:
K1) Na sequência da suspensão parcial referida no ponto anterior, a Autora continuou em obra a realizar outro tipo de trabalhos que não dependiam dos estudos geotécnicos solicitados pelo Réu.
XV. Por outro lado, deve ser eliminado o facto provado constante da alínea Q), porquanto não foi possível extrair da prova produzida, em concreto, se e quais foram os encargos para a Autora da suspensão parcial dos trabalhos.
XVI. O artigo 282.° do CCP dispões quanto à a “Reposição do equilíbrio financeiro do contrato" que “ — Há lugar à reposição do equilíbrio financeiro apenas nos casos especialmente previstos na lei ou, a título excepcional, no próprio contrato. 2 — Sem prejuízo do disposto no número anterior, o co-contratante só tem direito à reposição do equilíbrio financeiro quando, tendo em conta a repartição do risco entre as partes, o facto invocado como fundamento desse direito altere os pressupostos nos quais o co-contratante determinou o valor das prestações a que se obrigou, desde que o contraente público conhecesse ou não devesse ignorar esses pressupostos. 3 — A reposição do equilíbrio financeiro produz os seus efeitos desde a data da ocorrência do facto que alterou os pressupostos referidos no número anterior, sendo efectuada, na falta de estipulação contratual, designadamente, através da prorrogação do prazo de execução das prestações ou de vigência do contrato, da revisão de preços ou da assunção, por parte do contraente público, do dever de prestar à contraparte o valor correspondente ao decréscimo das receitas esperadas ou ao agravamento dos encargos previstos com a execução do contrato. 4 — A reposição do equilíbrio financeiro efectuada nos termos do presente artigo é, relativamente ao evento que lhe deu origem, única, completa e final para todo o período do contrato, sem prejuízo de tal reposição poder ser parcialmente diferida em relação a quaisquer efeitos específicos do evento em causa que, pela sua natureza, não sejam susceptíveis de uma razoável avaliação imediata ou sobre cuja existência, incidência ou quantificação não exista concordância entre as partes. 5 — Na falta de estipulação contratual, o valor da reposição do equilíbrio financeiro corresponde ao necessário para repor a proporção financeira em que assentou inicialmente o contrato e é calculado em função do valor das prestações a que as partes se obrigaram e dos efeitos resultantes do facto gerador do direito à reposição no valor dessas mesmas prestações. 6 — A reposição do equilíbrio financeiro não pode colocar qualquer das partes em situação mais favorável que a que resultava do equilíbrio financeiro inicialmente estabelecido, não podendo cobrir eventuais perdas que já decorriam desse equilíbrio ou eram inerentes ao risco próprio do contrato.”
XVII. Daqui se retira que o direito à reposição do equilíbrio financeiro do contrato, para que seja admissível, tem de, cumulativamente:
a) O facto causador do desequilíbrio não se inclua no risco normal do negócio que o co-contratante deva suportar;
b) Esse facto altere os pressupostos em que o co-contratante fixou o valor da prestação;
c) Esses pressupostos sejam conhecidos ou cognoscíveis do contraente público, como será designadamente o caso de constarem dos elementos patenteados nas peças do procedimento de adjudicação.
XXVIII. Sucede que, em primeiro lugar, não foi o co-contratante que fixou o valor da prestação, uma vez que a empresa que apresentou proposta e a quem foi adjudicado o contrato não foi, inicialmente a aqui Recorrida.
XIX. A Recorrida limitou-se a suceder à [SCom02...] na sua posição contratual, tendo de se resignar aos valores por aquela apresentados.
XX. E não se pode, de todo, excluir a hipótese de este pedido indemnizatório ter o intuito final de colmatar diferenças de valores entre o apresentado pela [SCom02...] e aquele que a Recorrida consideraria justo para a execução dos trabalhos.
XXI. Em segundo lugar, os pressupostos - no caso, a necessidade de estudos geológicos no local da obra - não eram conhecidos ou cognoscíveis do contraente público, aqui Recorrente.
XXII. Ora, deste raciocínio se retira que não se encontram preenchidos os pressupostos para que seja accionado o mecanismo da reposição do equilíbrio financeiro do contrato, inexistindo qualquer direito a indemnização.
DA PRORROGAÇÃO DO PRAZO DA OBRA POR 15 DIAS
XXIII. Já no que respeita à prorrogação do prazo da obra por 15 dias, para suprimento de erros e omissões, ficou dado como provado na douta sentença recorrida, entre outros, o seguinte:
U) Por força da prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, a Autora suportou encargos acrescidos com pessoal, designadamente, com director técnico da Empreitada, director de obra adjunto, encarregado geral, técnico de segurança, técnico de ambiente, técnico de qualidade, topógrafo (com equipamento), segurança da obra, bem como com equipamentos, nomeadamente, contentores, grua, WC, ferramentas, equipamentos de segurança, custos com infra-estruturas, e ainda os custos de estrutura da empresa.
XXIV. Sucede, no entanto, que conforme alegado na contestação apresentada, as alterações ocorridas em obra que motivaram esse suprimento de erros e omissões e consequente prorrogação do prazo de ora por 15 dias, para pagamento dos encargos daí decorrentes foram firmados dois adicionais ao contrato adicional, nos valores de € 103.650,05 (cento e três mil, seiscentos e cinquenta euros e cinco cêntimos) e € 19.764,17 (dezanove mil, setecentos e sessenta e quatro euros e dezassete cêntimos), valores estes que foram pagos.
XXV. Ora, se estes valores pagos tiveram como propósito proceder ao pagamento dos trabalhos respeitantes a erros e omissões, obviamente que os mesmos contemplam já o prazo contemplado para esses trabalhos.
XXVI. Condenar o Município a proceder, novamente, ao pagamento de qualquer valor que seja a título de indemnização pela prorrogação de prazo é condenar ao pagamento em duplicado.
XXVII. E, salvo o devido respeito, isso não configura reposição de equilíbrio financeiro do contrato, configura, isso sim, enriquecimento sem causa!!
XXVIII. Cumpre ainda referi que a Recorrida aceitou a modificação do contrato, pelo que não lhe é lícito, a posteriori, vir exigir um novo pagamento sobre os mesmos trabalhos, sob pena de "roçar" a má-fé!
XXIX. Ora, tendo em conta o exposto, a verdade é que deverá a matéria de facto dada como provada ser alterada, passando o facto dado como provado constante da U) a ter a seguinte redacção:
U) Por força da prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, a Autora foi já ressarcida com recurso aos contratos adicionais outorgados entre as partes, os quais já se encontram integralmente pagos, conforme consta do facto dado como provado AA).
XXX. Dando-se a alteração da matéria de facto dada como provada, e considerando que tal alteração se repercute no facto de que os pressupostos de que depende o pedido de reequilíbrio financeiro do contrato não se encontram preenchidos, deverá o Recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida.
Sem prescindir
O n.° 1 do artigo 354.° prevê que: “Se o dono da obra praticar ou der causa a facto donde resulte maior dificuldade na execução da obra, com agravamentos dos encargos respectivos, o empreiteiro tem direito à reposição do equilíbrio financeiro.”
A Reposição do equilíbrio financeiro do contrato tem carácter excepcional e residual, devendo o mesmo ser aplicável de forma parcimoniosa de modo a que seja apenas aplicado caso se verifique um patente desequilíbrio económico decorrente de factos ocorridos durante o desenvolvimento da empreitada contratualizada.
XXXIII. "Renova-se o entendimento de acordo com o qual a realização de uma obra em tempo superior ao inicialmente previsto não é necessariamente causa de um prejuízo, pois que importa saber qual a razão subjacente ao atraso em questão. Há pois e desde logo que verificar qual a causa do invocado atraso. Na realidade, considerar que a necessidade de realização de uma obra em tempo superior ao inicialmente previsto é a causa de um prejuízo, não é necessariamente exacto, pois que se trata antes de uma consequência de determinado circunstancialismo. Efectivamente, se a obra se atrasa, este é a consequência de algo que o provocou, não a causa, em face do que sempre se imporia a verificação da causa do facto da obra se ter prolongado por mais 190 dias do que os previstos no contrato inicial, que poderá corresponder até a acto ou omissão do empreiteiro. Por outro lado se o atraso da obras resulta da introdução, por exemplo, de trabalhos a mais, em bom rigor não chega a haver prejuízo para o empreiteiro, na medida em que será correspondentemente remunerado. Já se o atraso da obra se tiver ficado a dever a erros e omissões, relativamente às quais a lei prevê, naturalmente a correspondente remuneração acrescida, não chega a verificar-se qualquer perturbação no equilíbrio financeiro do contrato.”.
XXXIV. A douta decisão impugnada não pode manter-se, pois violou a normas legais
supracitadas.
TERMOS EM QUE, como certamente Vossas Excelências doutamente suprirão, deve ser com cedido provimento ao Recurso e revogar-se a douta decisão recorrida (…).


As alegações de recurso da Autora terminam com as seguintes conclusões:
«I. A posição da ora Recorrente é a de que a sentença recorrida padece de um erro notório de julgamento sobre a matéria de facto que julgou apenas procedente favoravelmente o quantum indemnizatório de € 107.533,27 (cento e sete mil, quinhentos e trinta e três euros e vinte sete cêntimos), acrescidos dos juros legal à taxa comercial desde a citação até efectivo e integral pagamento, pelos 37 dias de suspensão de obra, pela prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões e pelos custos de estrutura de empresa ao longo de 52 dias em obra.
II. A Recorrente considera como incorrectamente julgado o facto tido como assente no ponto Q) dos FACTOS PROVADOS, não pelo prazo de suspensão da obra, mas pelo facto de não terem sido dados como provados a totalidade dos meios humanos e equipamentos e o valor dos custos resultantes do artigo 28.° da petição inicial.
III. Acresce que a Recorrente também considera incorrectamente julgado o facto de não terem sido dados como provados os meios humanos, equipamentos e os custos a ele inerentes pela prorrogação do prazo legal de 15 dias para execução de trabalhos de erros e omissões - artigo 30.° da petição inicial - e ainda os custos de estrutura interna de empresa decorrentes dos 52 dias a mais em obra constantes do artigo 42.° da petição inicial, dando assim cumprimento à especificação da alínea a) do n.° 1 do artigo 640.° do Código Processo Civil ex vi artigo 140.°, n.° 3 do CPTA.
IV. O tribunal a quo deu como provado que: a) os trabalhos de empreitada estiveram suspensos por 37 dias; b) a empreitada foi objecto de prorrogação legal por um prazo de 15 dias; e que a [SCom01...], S.A. teve encargos com a estrutura por um prazo de 52 dias.
V. O Tribunal assentou a sua convicção, sustentado na prova testemunhal e documental da Recorrente, tecendo os seguintes comentários sobre:
a) «CC»Prestou na audiência final um depoimento calmo, sereno, sem contradições e sem hesitações, invocando sempre a razão de ciência. (...) Calculou, isso sim, os custos que foram sendo imputados a esta obra pelas Equipas da [SCom01...], razão de ciência que justifica o conhecimento sobre a obra, o que ficou bem evidenciado ao longo do seu depoimento. Distinguiu, com propriedade, os vários tipos de custo a considerar: custos de estaleiro/custos com equipamento/pessoal; custos directos e custos indirectos; custos de estrutura. Convenceu o Tribunal que qualquer suspensão de obra compreende sempre custos de estrutura, em virtude de trabalho financeiro/jurídico/secretariado/vigilância e acompanhamento, entre muitos outros, convencendo o Tribunal que esta obra, em concreto, não foi excepção. Explicou com clareza o uso de tabelas internas de imputação, através de reunião e tratamento de informação vertida em mapas, usando tabelas da arte, valores aos quais acrescem responsabilidades sociais, seguros, obrigações de natureza laboral. depoimento prestado em sintonia com a prova documental reunida nos autos e identificada em cada uma das alíneas do probatório.”;
b) «DD»As questões colocadas em audiência final compreenderam toda a matéria de facto que se mantinha controvertida, em especial, como foram identificados e calculados os custos, não se tendo detectado qualquer contradição entre os dados que resultam dos documentos, informação essa organizada em tabelas, devidamente contextualizada pelo depoimento alicerçado na memória humana. Esta Testemunha, na qualidade de Director Técnico de Obra, lembrava-se dos recursos humanos que se encontravam sob a sua direcção, bem como dos equipamentos colocados à disposição da obra, explicando com clareza que validava as quantidades constantes dos mapas preenchidos pelo Encarregado de Obra”;
c) «EE»Na qualidade de Gestor de Obra, procedia mensalmente à análise dos custos e dos valores recebidos. Explicou com clareza o funcionamento do programa utilizado pela Autora para associar, compilar e tratar a informação respeitante a cada obra. Convenceu o Tribunal que cada obra tinha um código associado e o programa compilava a informação vinda dos lançamentos feitos por cada Departamento, existindo folhas de afectação à obra e listas dos preços unitários a aplicar. O seu conhecimento advém da análise que fez aos lançamentos/recebimentos/autos de medição, sendo que a facturação resultava da concatenação desta informação por parte do Departamento Financeiro a quem cabia aplicar os preços estabelecidos. A sua razão de ciência também advinha da sua presença em obra, acompanhando reuniões sobre o balanço e andamento em obra. Assim, a convicção do Tribunal formou-se a partir da conjugação e ponderação de toda a prova produzida, merecendo credibilidade as Testemunhas da Autora que, demonstrando conhecimento aturado sobre como se apuram os custos em discussão nos presentes autos a partir dos mapas de afectação, que visam traduzir a realidade em obra.”;
d) «FF»prestou um depoimento muito rigoroso, coerente e esclarecedor quanto à forma como acompanhavam os encargos com o pessoal, ou seja, como eram elaborados os documentos contendo informação sobre: identificação da obra, nome do funcionário, categoria correspondente, bem como quem atestava a informação (Director de Obra) antes de ser remetida ao Departamento dos Recursos Humanos. Mais esclareceu o Tribunal que recaía sobre a Equipa de Recursos dos Recursos Humanos proceder aos cálculos dos custos (média dos custos do ordenado, seguro, subsídios, custos de formação, seguindo valores recomendados ..., entre outros), tendo chegado à informação à Equipa dos recursos humanos com as mais variadas valências em obra. A Testemunha foi confrontada com vários documentos, de entre os quais de fls. 212 e ss. 238, 240 e ss. do processo físico, reconhecendo com espontaneidade e sem hesitação os documentos exibidos, traduzindo a informação que dos mesmos se retira, mas acrescentando pormenores, merecendo, por conseguinte, elevada credibilidade.”;
e) Testemunhas do MUNICÍPIO ...Mais cumpre referir que as Testemunhas da Entidade Demandada nada disseram quanto ao preço unitário por cada tipo de encargo com o pessoal/equipamento ou diverso, informação utilizada para o cálculo do quantum indemnizatório, de harmonia, aliás, com o preço unitário utilizado nos cálculos que sustentaram várias reclamações dirigidas ao Dono da Obra.”. (sublinhado nosso)
VI. Face ao exposto, atendendo a que as testemunhas da Recorrente [SCom01...], S.A. explicaram os meios humanos e o equipamento afecto em obra, os custos tidos durante os 52 dias relativamente a esses meios e ainda aos custos de estrutura de empresa, sempre assentes em razão de ciência, respondendo de forma clara e explicando os documentos juntos aos autos, outra conclusão não resta que pugnar pela procedência total do quantum indemnizatório peticionado por si a final em sede de petição inicial.
VII. Vejam-se os seguintes concretos meios probatórios, concretamente as gravações em audiência de discussão de julgamento que impunham uma decisão diferente daquela que foi tomada pela Mma. Juiz a quo, mormente por ser inegável a confrontação das testemunhas com as tabelas dos artigos 28.°, 30.° e 42.° da petição inicial e a prova documental constante do processo:
a) Depoimento da testemunha «CC», indicando de forma especificada e com exactidão as passagens da gravação [00:08:10] a [00:08:35], [00:10:24] a [00:35:54], [00:37:11] a [00:40:01] e [00:40:17] a [00:46:17];
b) Depoimento da testemunha «DD», indicando de forma especificada e com exactidão as passagens da gravação [01:22:23] a [01:23:30),
[01:24:30] a [01:26:22], [01:26:31] a [01:36:31] e [01:49:38] a [01:53:44];
c) Depoimento da testemunha «EE», indicando de forma especificada e com exactidão as passagens da gravação [02:12:56] a [02:19:50], [02:23:11] a [02:24:31], [02:28:27] a [02:31:36] e [02:34:55] a [02:35:58];
d) Depoimento da testemunha «FF», indicando de forma especificada e com exactidão as passagens da gravação [02:52:30] a [03:05:13), [03:06:27] a [03:12:17], [03:17:38] a [03:18:30].
VIII. Mais acresce que da prova documental constante dos autos, v.g. requerimento da Autora no SITAF de 06.10.2016, Referência do Documento n.° ...61, fls. 253 a 312 do presente processo judicial e requerimento da Autora no SITAF de 09.01.2017, Referência do Documento n.° ...51, fls. 430 a 496 do presente processo judicial, é apresentado o Boletim n.° 47/2011 da AICCOPN - Doc. 1 —, cópias dos recibos deviamente assinados dos meios humanos afectados em obra — Doc. 2-A a Doc. 35-A — e ainda o regulamento/preçário interno — Doc.36 - que se encontra integrada na listagem Doc. 37, estando assim dado expresso cumprimento à alínea b) do n.° 1 do artigo 640.° do Código Processo Civil ex vi artigo 140.°, n.° 3 do CPTA.
IX. Toda esta informação está vertida nos artigos 28.°, 30.° e 42.° com as quais as testemunhas da Autora foram confrontadas e estão devidamente comprovadas nos autos pelos Requerimentos e documentos ali referidos.
X. Mas, para que não restem dúvidas, em sede de audiência de discussão de julgamento, foi o próprio advogado do MUNICÍPIO ..., a requerer a junção de elementos adicionais - v.g. ficheiro de exportação que provasse os meios humanos e o equipamento em obra - tendo a Mma. Juiz a quo deferido tal pedido para que a questão ficasse fechada. Atente-se:
“[02:29:33] Mandatário do Réu (Dr. «GG»): Senhora doutora, então, eu ia requerer, na sequência de o que a testemunha... porque tem interesse no fundo valida, porque estes documentos não têm. os que temos visto, não estão assinados, são documentos que parecem feitos. não sei se foram exportados do software ou não. E, se for possível, senhora doutora, eu requeria que a testemunha. “que a testemunha”, não, que a [SCom01...] fosse, na sequência do depoimento da testemunha, notificada para vir juntar aos Autos, no período correspondente à suspensão, a listagem da exportação. ou melhor, o ficheiro da exportação, resultante da exportação do software que usa de gestão dos equipamentos. Eu penso que é perceptível.
[02:30:17] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): Não. e, se calhar, até faz algum sentido juntar.
[02:30:21] Mandatário do Réu (Dr. «GG»): E, se possível, datado. portanto, com referência àquele período e com a certificação do software, que há de ser certificado, portanto, tem que ter a certificação do software informático. [02:30:32] Meritíssima Juiz: Sim, sim.
[02:30:33] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): Sim. Eu não sei, do ponto de vista informático, como é que a informação se pode obter, mas acredito que se possa obter. E facilmente, não é?
[02:30:44] Mandatário do Réu (Dr. «GG»): Sim.
[02:30:45] Meritíssima Juiz: Vamos redigir já e ficar a constar em acta. E já agora, também peço só o mesmo, mas relativamente aos trabalhadores.
[02:30:56] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): Certo.
[02:30:57] Meritíssima Juiz: .o nome.
[02:30:57] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): Mas, os trabalhadores, eu creio que tenho. 
[02:30:58] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): Ah, mas não tenho a exportação do PHC, não sei se o software funciona da mesma maneira, temos que ver. Para os trabalhadores é igual, «EE»?
[02:31:08] «EE»: Sim, o pessoal também está associado lá.
[02:31:10] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): Está tudo associado à obra?
[02:31:11] «EE»: Sim, sim.
[02:31:11] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): Pronto. Então, deve dar.
[02:31:12] Meritíssima Juiz: Deve dar, pronto. Mas, pelo menos, os senhores doutores já entenderam o que é que se pretende, se não for exactamente o cumprimento deste despacho, é o mais aproximado possível, atendendo à realidade do...
[02:31:25] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): Muito bem.
[02:31:26] Meritíssima Juiz: .do que é... do que se retira do software, não é? Também.
[02:31:29] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): É isso, senhora doutora.
[02:31:30] Meritíssima Juiz: Porque é que não. não sendo possível, paciência. Mas sim, ficava.
[02:31:36] Mandatário da Autora (Dr. «HH»): Fechado.
[02:31:36] Meritíssima Juiz: .fechado. É que a questão ficava fechada
XI. Na sequência, no dia 29.06.2021, a Recorrente [SCom01...], S.A. juntou o Requerimento com a referência SITAF ...64, fls. 693 a 703, onde consta a listagem onde justifica de forma clara os meios humanos e os equipamentos em obra constantes dos 52 dias.
XII. Assim sendo, face ao exposto, a [SCom01...], S.A. entende que deve ser proferida decisão onde a alínea Q) dos fatos dados como provados, seja substituída pelos factos constantes dos artigos 28.°, 30.° e 42.° da petição inicial, ou seja:
“Q) Ao longo de 37 dias de suspensão de obra, a Autora suportou encargos relacionados com equipamentos e trabalhadores afectos à obra no valor de € 152.401.52 (cento e cinquenta e dois mil, quatrocentos e um euros e cinquenta e dois cêntimos), sendo a este título € 50.281,52 [equipamentos] e € 102.120,00 [pessoal];
FF) Em virtude da prorrogação legal do prazo de empreitada por mais 15 dias, a Autora suportou encargos relacionados com equipamentos e trabalhadores afectos à obra no valor de € 61.784,40 (sessenta e um mil, setecentos e oitenta e quatro euros e quarenta cêntimos) sendo a este título € 20.384,40 [equipamentos] e € 41.400,00 [pessoal];
GG) Em virtude da suspensão de obra por 37 dias e da prorrogação legal de 15 dias, a Autora suportou custos com a estrutura central da empresa correspondentes a 7% do valor contratual por um prazo de 52 dias, num total de € 32.853,98 (trinta e dois mil, oitocentos e cinquenta e três euros e noventa e oito cêntimos)”.
XIII. Atendendo aos concretos meios probatórios especificados - depoimentos das testemunhas «CC», «DD», «EE», «FF» - testemunhas cujos depoimentos foram qualificados pelo Mmo. Juiz a quo como altamente credíveis, testemunhas que foram confrontadas com a prova documental constante dos autos, nomeadamente as tabelas constantes dos artigos 28.°, 30.° e 42.° da petição inicial e as explicaram de forma clara - e uma análise global e pormenorizada da prova documental constante de fls. dos autos 253 a 312, 430 a 496 e 693 a 703 - provam de forma cristalina e inequívoca que a decisão de fixação da matéria de facto quanto ao quantum indemnizatório tem de ser modificada para o valor peticionado in totum pela [SCom01...], S.A. 
XIV. Foi isso que foi provado e analisado em audiência de discussão e julgamento. Esta é a demonstração de que a matéria de facto dada como assente não se encontra bem delimitada pela Mma. Juiz a quo.
XV. A sentença não padece de nenhum erro de julgamento de direito, mas apenas e tão só quanto à fixação do quantum indemnizatório que deverá ser o valor global peticionado pela [SCom01...], S.A.
XVI. Face ao exposto, deve o R. MUNICÍPIO ... ser condenado ao pagamento da quantia de € 247.039,90 (duzentos e quarenta e sete mil, trinta e nove euros e noventa cêntimos), acrescidos de juros à taxa legal comercial desde a citação até integral pagamento.
PEDIDO:
Termos em que, e nos do douto suprimento de V. Exas, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, em consequência:
a) Deve o Tribunal Central Administrativo do Norte alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto constante da douta decisão recorrida quanto à alínea Q dos factos provados e julgar provados os factos constantes dos artigos 28.°, 30.° e 42.° da petição inicial, substituindo-a por nova decisão que condene o R. Município ao pagamento da quantia de € 247.039,90 (duzentos e quarenta e sete mil, trinta e nove euros e noventa cêntimos), acrescidos de juros à taxa legal comercial desde a citação até integral pagamento, a título de quantum indemnizatório, fazendo-se assim JUSTIÇA;»

A Autora não respondeu ao recurso do Réu.

O Réu respondeu ao recurso da Autora, terminando com as seguintes conclusões:
«I. Não pode o Recorrido deixar de acompanhar a decisão recorrida no que à sua absolvição se reporta, uma vez que a mesma se encontra devidamente fundamentada quer de facto, quer de Direito.
Alínea Q) da matéria dado como provada
II. A Recorrente entende que deveriam ter sido dados como provados os factos constantes dos artigos 28.°, 30.° e 42.° da petição inicial, assim como considera incorrectamente julgado o facto dado como provado sob a alínea Q).
III. Resulta da prova produzida, como consta no ponto Q), que foram suportados encargos com a obra, mas certo é que não foi produzida prova que permitisse dar como provado os valores que a Recorrente queria que ficassem provados!!!
IV. Pelas inquirições das testemunhas arroladas pela Apelante e cujos depoimentos esta - exaustivamente! - transcreveu, em nenhum deles se encontra concretizado qualquer valor a título de quantum indemnizatório - e, muito menos, o valor indicado pela Recorrente!!
V. Discorrendo os requerimentos - e respectivos documentos - descritos pela Recorrente nas suas alegações de recurso, verifica-se que os documentos juntos pela Recorrente com aqueles requerimentos se tratam (SIC) OU de recibos de vencimento OU de documentos elaborados internamente, não sendo possível retirar qualquer quantum indemnizatório concreto e, muito menos, os valores peticionados pela Recorrente, pois que:
a) Os depoimentos das testemunhas da [SCom01...], S.A., embora detalhados, não são suficientes para comprovar de forma inequívoca que os custos alegados foram efectivamente suportados durante o período de suspensão da obra.
b) As testemunhas basearam-se em tabelas internas e mapas de controlo de custos, mas não apresentaram provas concretas que os equipamentos e o pessoal estiveram efectivamente alocados à obra durante os 37 dias de suspensão.
c) A prova documental apresentada pela [SCom01...], S.A., nomeadamente os requerimentos supra-referidos e os boletins da AICCOPN, não demonstram de forma clara e objectiva que os custos alegados foram efectivamente suportados.
d) Os documentos apresentados são genéricos e não estabelecem uma ligação directa entre os custos alegados e o período de suspensão da obra.
e) A mera existência de tabelas internas e mapas de controlo de custos não é suficiente para comprovar a veracidade dos factos alegados.
ASSIM
VI. Relativamente à suspensão da obra pelo período de 37 (trinta e sete) dias: a suspensão de trabalhos não determina necessária e automaticamente custos associados, até porque, no caso em apreço e conforme ficou provado pela prova produzida, a suspensão dos trabalhos não foi total, mas sim parcial.
VII. Já no que respeita à prorrogação do prazo da obra por 15 dias, para suprimento de erros e omissões, ficou dado como provado na douta sentença recorrida, no ponto U) dos factos dados como provados, o seguinte - sendo que este facto não foi colocado em causa pela Recorrente:
U) Por força da prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, a Autora suportou encargos acrescidos com pessoal, designadamente, com director técnico da Empreitada, director de obra adjunto, encarregado geral, técnico de segurança, técnico de ambiente, técnico de qualidade, topógrafo (com equipamento), segurança da obra, bem como com custos com infra-estruturas, e ainda os custos de estrutura da empresa.
VIII. Para pagamento dos encargos decorrentes das alterações ocorridas em obra que motivaram esse suprimento de erros e omissões e consequente prorrogação do prazo da obra por 15 dias, foram firmados dois adicionais ao contrato adicional, nos valores de € 103.650,05 (cento e três mil, seiscentos e cinquenta euros e cinco cêntimos) e € 19.764,17 (dezanove mil, setecentos e sessenta e quatro euros e dezassete cêntimos), valores estes que foram pagos.
IX. Se estes valores pagos tiveram como propósito proceder ao pagamento dos trabalhos respeitantes a erros e omissões, obviamente que os mesmos contemplam já o prazo contemplado para esses trabalhos.
X. Acresce que a Recorrente aceitou a modificação do contrato, pelo que não lhe é lícito, a posteriori, vir exigir um novo pagamento sobre os mesmos trabalhos.
XI. Nessa conformidade, nunca poderia a matéria de facto dada como provada ser alterada da forma que a Recorrente pretende, uma vez que, da prova produzida nos autos, não se consegue retirar que, a existirem valores a ser pagos à Recorrente, os mesmos se computem nos valores por esta alegados.
XII. Conforme resulta do disposto no art.° 282.° do CCP o direito à reposição do equilíbrio financeiro do contrato, para que seja admissível, tem de, cumulativamente, preencher os seguintes requisitos:
a) O facto causador do desequilíbrio não se inclua no risco normal do negócio que o co-contratante deva suportar;
b) Esse facto altere os pressupostos em que o co-contratante fixou o valor da prestação;
c) Esses pressupostos sejam conhecidos ou cognoscíveis do contraente público, como será designadamente o caso de constarem dos elementos patenteados nas peças do procedimento de adjudicação.
XIII. Por sua vez, o artigo 314.° prevê que: “1 — O co-contratante tem direito à reposição do equilíbrio financeiro, segundo os critérios estabelecidos no presente Código, sempre que o fundamento para a modificação do contrato seja: A alteração anormal e imprevisível das circunstâncias imputável a decisão do contraente público, adoptada fora do exercício dos seus poderes de conformação da relação contratual, que se repercuta de modo específico na situação contratual do co-contratante; ou Razões de interesse público. 2 — Os demais casos de alteração anormal e imprevisível das circunstâncias conferem direito à modificação do contrato ou a uma compensação financeira, segundo critérios de equidade.”
XIV. Por último com interesse para os autos, o n.° 1 do artigo 354.° dispõe que: “Se o dono da obra praticar ou der causa a facto donde resulte maior dificuldade na execução da obra, com agravamentos dos encargos respectivos, o empreiteiro tem direito à reposição do equilíbrio financeiro.”
XV. Como bem se diz no Ac. do TCAS de 09/02/2023 “II - A Reposição do equilíbrio financeiro do contrato tem caracter excepcional e residual, devendo o mesmo ser aplicável de forma parcimoniosa de modo a que seja apenas aplicado caso se verifique um patente desequilíbrio económico decorrente de factos ocorridos durante o desenvolvimento da empreitada contratualizada.”
XVI. Neste mesmo aresto pode ainda ler-se, com relevância para os autos: “Renova-se o entendimento de acordo com o qual a realização de uma obra em tempo superior ao inicialmente previsto não é necessariamente causa de um prejuízo, pois que importa saber qual a razão subjacente ao atraso em questão. Há pois e desde logo que verificar qual a causa do invocado atraso. Na realidade, considerar que a necessidade de realização de uma obra em tempo superior ao inicialmente previsto é a causa de um prejuízo, não é necessariamente exacto, pois que se trata antes de uma consequência de determinado circunstancialismo. Efectivamente, se a obra se atrasa, este é a consequência de algo que o provocou, não a causa, em face do que sempre se imporia a verificação da causa do facto da obra se ter prolongado por mais 190 dias do que os previstos no contrato inicial, que poderá corresponder até a acto ou omissão do empreiteiro. Por outro lado, se o atraso da obra resulta da introdução, por exemplo, de trabalhos a mais, em bom rigor não chega a haver prejuízo para o empreiteiro, na medida em que será correspondentemente remunerado. Já se o atraso da obra se tiver ficado a dever a erros e omissões, relativamente às quais a lei prevê, naturalmente a correspondente remuneração acrescida, não chega a verificar-se qualquer perturbação no equilíbrio financeiro do contrato."
XVII. Ora, deste raciocínio se retira que, in casu, não se encontram preenchidos os pressupostos para que seja accionado o mecanismo da reposição do equilíbrio financeiro do contrato, inexistindo qualquer direito a indemnização.
XVIII. Como tal, terá de soçobrar a teoria da Recorrente e considerar-se a sentença recorrida, quanto a este ponto, suficientemente fundamentada, fazendo uma corretã aplicação do direito aos factos, devendo, por isso, manter-se.
TERMOS EM QUE,
Como certamente Vossas Excelências doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao Recurso apresentado pela Autora/Recorrente, e mantendo-se a douta decisão recorrida na parte por esta impugnada, fazendo, deste modo, V/ Exas. a tão acostumada
JUSTIÇA!»

O Digno Magistrado do Ministério Público neste Tribunal foi notificado apara os efeitos do artigo do artigo 146º CPTA.

Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir.

III- Âmbito do recursos e questões a decidir
Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações.
Assim:
As questões colocadas a este Tribunal são as seguintes:
A - NO RECURSO DO RÉU:
1ª Questão
A sentença recorrida padece de erro em matéria de facto no que respeita à alínea K) da enunciação dos factos provados, pois apenas se provou que o Réu determinou a suspensão parcial da execução dos trabalhos, além de que devia ter sido aditado a esta uma alª K1) dando como provado o facto descrito na conclusão XIV?

2ª Questão
A sentença recorrida padece de erro no julgamento de direito porque não se encontravam in casu reunidos os pressupostos cumulativos do direito ao reequilíbrio financeiro do contrato definidos no artigo 282º 2 do CCP, já que não só não foi a Autora a fixar o valor da prestação, pois limitou-se a suceder à “[SCom02...]” na sua posição contratual, tendo de se resignar aos valores por aquela apresentados, como a necessidade de estudos geológicos no local da obra não era conhecida ou cognoscível pelo contraente público, aqui Recorrente.

3ª Questão
A sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto ao dar como provado o teor da alínea U), relativa a encargos com a prorrogação do prazo da obra, pois tais custos estão incluídos nos preços de dois contratos adicionais nos valores de € 103.650,05 e € 19.764,17, pelo que o que deve ser dado como provado sob tal alínea é outrossim o que consta da conclusão XXIX do recurso?

4ª Questão
Das respostas afirmativas às 1ª e 3ª questões resulta um erro de julgamento de direito pois falecem quaisquer pressupostos para um reequilíbrio financeiro do contrato?

B - DO RECURSO DA AUTORA:
Única Questão
A sentença erra no julgamento em matéria de facto – e consequentemente no julgamento de direito – ao não dar como provada a totalidade dos custos dos meios humanos e equipamentos suportados pela Autora com a suspensão e a prorrogação do prazo de execução da obra, constantes dos artigos 28º, 30 e 42º da PI?

IV – Apreciação dos Recursos
A especificação dos factos provados e não provados tem, na sentença recorrida, o seguinte teor:
FACTOS PROVADOS
A) No dia 11 de Fevereiro de 2010 a empreitada «Centro Escolar ... em ...» veio a ser adjudicada à empresa [SCom02...], Lda., pelo montante global de € 1.895.421,83, pelo prazo de 210 dias (concretamente até ao dia 12/7/2011) — por acordo.

B) O contrato foi celebrado a 22 de Julho de 2010, do qual se extrai: “Em tudo o que não esteja integralmente previsto neste contrato aplica-se o disposto no caderno de encargos e no Código dos Contratos Públicos, e restante legislação e regulamentação aplicável (...). O prazo da execução da obra é de duzentos e dez dias, a contar da data da consignação (...).” — por acordo; cf. ainda doc. n.° 2 junto à petição inicial, e PA.

C) A respectiva consignação ocorreu em 9 de Agosto de 2010 — por acordo.

D) Não obstante, no dia 12 de Agosto de 2010 verificou-se a suspensão dos trabalhos devido à necessidade de correcção da cota de soleira do edifício bem como da implantação do arruamento de acesso ao Centro Escolar, por verificação, em obra, de dados desconformes com a realidade. — cf. Auto de Suspensão de Trabalhos/doc n.° 4 junto à petição inicial; PA.

E) Apenas no dia 13 de Dezembro de 2010 foi levantada a referida suspensão, tendo sido subscrito o Auto de Reinício dos Trabalhos — por acordo.

F) Em 10 de Janeiro de 2011, foi declarada a insolvência da sociedade [SCom02...], Lda. — por acordo.

G) No dia 9 de Fevereiro de 2011 foi enviado para o MUNICÍPIO ... uma proposta de cessão da posição contratual, em que figura como cessionária a Autora — por acordo.

H) Por deliberação da Câmara Municipal ..., datada de 14 de Fevereiro de 2011, foi aprovada a cessão da posição contratual, passando a aqui Signatária a assumir a posição de adjudicatária da empreitada — por acordo.
MAIS SE PROVOU
I) O projecto da empreitada encontrava-se a cargo do Dono da Obra — cf. documento de fls. 2 junto à petição inicial; PA.

J) Em reunião de obra, e na sequência da observação conjunta das características do terreno pelos Engenheiros Projectistas, Fiscalização e Entidade Executante, foi decidido efectuar-se ensaios geotécnicos para confirmação das tensões do terreno, tendo sido apresentado Relatório em 24/03/2011, do qual resultou necessidade de revisão do projecto de fundações, apresentada na reunião de obra de 29 desse mês. — cf. documento Of.° n.° S/579/DMOSU/2012; PA.

K) Em 30 de Março de 2011, o Município Demandado determinou a suspensão da execução dos trabalhos, tendo a decisão de suspensão sido formalizada no Auto n.° 9, cujo teor em parte segue: "devido à necessidade de alteração das fundações dos edifícios após a realização de ensaios geotécnicos, e de execução do desvio do colector de águas pluviais que atravessa a área de implantação do edifício, não se torna possível prosseguir com os trabalhos da empreitada, pelo que os mesmos deverão ficar suspensos" — cfr. doc. n.° 9 junto com a petição inicial, PA.

L) Apenas no dia 6 de Maio de 2011 é que reiniciaram os trabalhos, devidamente formalizado em Auto — por acordo.

M) Tendo nessa mesma data sido dada ordem pela Ré à Autora de execução de "suprimento de erros e omissões" (alteração das fundações decorrente dos resultados dos ensaios geotécnicos e da rede das águas pluviais existente), que originou "na totalidade, e face ao seu valor então previsto, uma prorrogação legal de 15 dias ao prazo contratual da empreitada" — por acordo; cf. documento n.° 1 junto à contestação, PA.

N) Na verdade, através do ofício com a referência ...11, de 3005-2011, o Dono da Obra comunicou à Autora que, por deliberação de 26-052011, foram aprovados os novos trabalhos de suprimento de erros e omissões referentes à obra supracitada - cfr. doc. n.° 12 junto com a petição inicial; correspondente ao Valor do 2.° contrato adicional; cf. doc. de fls. 141 dos autos; PA.

O) O que veio a ser formalizado por contrato outorgado em 27-10-2011, nos termos do qual ficou expressamente previsto: “Que relativamente à referida empreitada, verificou-se a necessidade de execução de trabalhos de suprimento de erros e omissões, da responsabilidade do dono da obra, de acordo com o previsto no n° 1 do artigo 376.° e nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 378.º, ambos do CCP”, que o prazo de execução dos trabalhos era de 12 dias, pelo valor de 103.650,85€ - cf. doc. n.° 13 junto com a petição inicial; cf. PA.

P) Tendo sofrido um acordo adicional, celebrado no dia 23-05-2011, nos termos do qual ficou expressamente previsto: “Que relativamente à referida empreitada, verificou-se a necessidade de execução de trabalhos de suprimento de erros e omissões, da responsabilidade do dono da obra, de acordo com o previsto no n.° 1 do artigo 376.° e nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 378.º, ambos do CCP”, que o prazo de execução dos trabalhos envolvidos é de 3 dias, pelo valor de €17.664,17 - cf. doc. n.° 14 junto com a petição inicial; corresponde ao Valor do 1.° contrato adicional; cf. doc. de fls. 141 dos autos; cf. PA.

Q) Ao longo de 37 dias de suspensão de obra, a Autora suportou encargos relacionados com equipamentos e trabalhadores afectos à obra, designadamente com:
Contentores
Betoneiras
Vibradores de betão
Guarda corpos
Tábuas para guarda corpos
Máquinas
Ferramentas
Gruas
Cofragem
Escoramentos
Bomba
Andaime
Equipamento de segurança colectivo
Equipamento de topografia
Rectro-escavadora
Camião
Viaturas
Equipamentos de telecomunicações
Director de técnico da empreitada
Director de obra adjunto
Encarregado
Preparador
Apontador
Técnico de segurança
Técnico de Acompanhamento Ambiental
Técnico de Qualidade
Topografo
Porta Miras
Armadores de ferro
Carpinteiros de cofragem)
Manobrador de máquinas
Condutor de camião
Gruista
Serventes
- cf. documentos de fls. 54, 60 a 71, 82, 83, 238 a 285/406 a 533 dos autos físicos, Pastas 6 e 7 do PA; cf. depoimento das Testemunhas «CC», «DD», «EE», «FF», «AA».

R) Por comunicação datada de 25/05/2011, a Autora dirigiu ao Município Demandado um pedido de indemnização pelos prejuízos sofridos ao longo dos 37 dias de suspensão da obra, no valor de 77.650,00€ + IVA, não incluindo custos de estrutura da empresa - cf. doc.s n.° 15, 16 junto à petição inicial.

S) E outro pedido de indemnização, o qual veio a ser recebido pela Ré em 27-05/2011, decorrente da prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões por mais 21 dias, no valor de €71.670,00 — cf. doc. n.° 16, 17, 18 junto à petição inicial; doc. 4 junto à contestação.

T) Apenas foram aceites 15 dias de prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, relativamente aos quais o valor do pedido de indemnização formulado foi recalculado em €31.027,98, o qual incluía custos de estrutura da empresa — cf. doc. n.° 17 junto à petição inicial.

U) Por força da prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, a Autora suportou encargos acrescidos com pessoal, designadamente, com director técnico da Empreitada, director de obra adjunto, encarregado geral, técnico de segurança, técnico de ambiente, técnico de qualidade, topógrafo (com equipamento), segurança da obra, bem como com equipamentos, nomeadamente, contentores, grua, WC, ferramentas, equipamentos de segurança, custos com infra-estruturas, e ainda os custos de estrutura da empresa - cfr. doc. n.° 17 junto à petição inicial; cf. depoimento das Testemunhas «CC», «DD», «EE», «FF», «AA».

V) No dia 16 de Maio de 2012, a Autora enviou ao Réu, que recebeu em 18—05-2012, o pedido de reequilíbrio financeiro decorrente da suspensão por 37 dias e da prorrogação por 15 dias (aceites pelo Réu) decorrentes da execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, no valor global de 107.533,27€ - por acordo; cf. documento 17 junto à petição inicial.

W) Na sequência de indeferimento pelo Réu, a Autora enviou àquele em 13-06-2012 a sua Reclamação, voltando a solicitar o pagamento do valor global de €107.533,27 — por acordo; cf. doc. de fls. 128 e ss., 142 e ss. dos autos.

X) A Ré não aceitou proceder ao pagamento — por acordo.

Y) Os factos vertidos nas alíneas J) a P) alteraram a sequência e o ritmo de execução dos trabalhos, implicando a mobilização de meios humanos e de equipamentos por um período adicional de 52 dias: 37 dias da suspensão + 15 dias pela execução de trabalhos decorrentes de suprimento de erros e omissões — cf. depoimento das Testemunhas.

Z) A Autora suporta custos com a estrutura central da empresa ao longo de todo o período de execução do contrato, custos que oscilam entre os 7% e 8% do valor contratual (1.895.421,83€) - cf. depoimento das Testemunhas «CC», «DD».
MAIS SE PROVOU
AA) O Município Demandado procedeu ao pagamento dos adicionais ao contrato inicial, nos montantes, respectivamente, de €103.650,05 e €19.764,17 — cf. PA (Pastas 6, 7 e 8).
BB) O Município Demandado aceitou a revisão do projecto de fundações — cf. documento 4 junto com a contestação; PA (Pastas 6, 7 e 8).

CC)Os trabalhos de empreitada do “Centro Escolar ... em ...” ficaram concluídos em 31/01/2012, tendo a recepção provisória sido efectuada em 10/04/2012 — cf. Ofício ...11, em conjugação com o Ofício n.° ...12; PA.

DD) Foi elaborada conta final, em 25/05/2012, com o Valor Total da Empreitada, no valor de €2.086.411,97 — cf. de fls. 141 dos autos físicos; PA.

EE) Conta final que não compreendeu o valor de €107.533,27 (€31.027,98, pela prorrogação legal do prazo de execução da empreitada, e de €76.505,29, pela suspensão do prazo da empreitada por 37 dias) reclamado — cf. de fls. 141 e ss. dos autos físicos; PA.
*
O Tribunal assentou factos por acordo.
Por sua vez, as respostas dadas pelo Tribunal aos factos que, em sede de audiência final, se mantinham controvertidos fundamentaram-se na convicção advinda da análise, global e pormenorizada, da prova produzida em juízo, a saber:
- documental: documentos para os quais remete o probatório, os quais se encontram juntos aos autos; processo administrativo, que compreende 8 pastas, melhor identificadas a fls. 390 dos autos- testemunhal: depoimento das testemunhas arroladas tanto pela Autora, Empreiteiro, como pelo Município Demandado, Dono da Obra.
Por sua vez, na formação da convicção ao longo do julgamento da matéria de facto, o Tribunal teve em conta a posição que as partes assumiram nos respectivos articulados e instrumentos procedimentais, bem como à força advinda da análise global e pormenorizada da prova documental produzida em juízo, compreendida tanto nos autos, como no processo administrativo, e concretamente identificada em cada alínea do probatório. A prova documental foi ainda conjugada com o depoimento das Testemunhas, que mereceram a seguinte apreciação:
«CC», Gestor de Empresas, trabalha para a Autora desde 2000, passando, em 2004, a assumir o cargo de Director Financeiro. Prestou na audiência final um depoimento calmo, sereno, sem contradições e sem hesitações, invocando sempre a razão de ciência. Não acompanhou a obra no terreno, também não procedeu à orçamentação. Calculou, isso sim, os custos que foram sendo imputados a esta obra pelas Equipas da [SCom01...], razão de ciência que justifica o conhecimento sobre a obra, o que ficou bem evidenciado ao longo do seu depoimento. Distinguiu, com propriedade, os vários tipos de custo a considerar: custos de estaleiro/custos com equipamentos/pessoal; custos directos e custos indirectos; custos de estrutura. Convenceu o Tribunal que qualquer suspensão de obra compreende sempre custos de estrutura, em virtude de trabalho financeiro/jurídico/secretariado/vigilância e acompanhamento, entre muitos outros, convencendo o Tribunal que esta obra, em concreto, não foi excepção.
Explicou com clareza o uso de tabelas internas de imputação, através da reunião e tratamento da informação vertida em mapas, usando tabelas da arte, valores aos quais acrescem responsabilidades sociais, seguros, obrigações de natureza laboral, depoimento prestado em sintonia com a prova documental reunida nos autos e identificada em cada uma das alíneas do probatório.
Não se recordava dos concretos funcionários afectos àquela obra, o que não abalou a credibilidade do depoimento considerando o tempo entretanto decorrido e à circunstância de não ter acompanhado a obra no terreno, bem como à circunstância de a empresa desenvolver e continuar a desenvolver a sua actividade em várias obras, implicando várias contratações laborais, mas não deixou de tentar colaborar com o Tribunal na descoberta da verdade material quando tentou objectivar o depoimento, alertando para a existência de mapas de registo do pessoal afecto a cada obra, elaborado com a participação de vários encarregados que atestam essa informação segundo o critério de afectação à obra, que pode ser traduzida numa percentagem. Acrescentou, convencendo o Tribunal, que o mesmo ocorre com o equipamento. E pormenorizou a chave de imputação, esclarecendo que as máquinas têm contadores de horas e que o custo/hora inclui custo de aquisição, consumos e manutenção, ou — se for o caso — o preço de aluguer diário/hora. Igualmente esclareceu o iter do cálculo do custo de estrutura: a rondar os 7%/8% do Valor da Empreitada, dividido por 365 dias, o que nos dá o valor diário desse tipo de custo.
«DD», Engenheiro Civil, trabalha para a Autora desde 2002, assumindo as funções de Director Técnico de Obra à data em que prestou depoimento.
A Testemunha começou por prestar o seu depoimento dando sinais de ansiedade, justificado, aos olhos do Tribunal, por se encontrar em juízo e com o propósito de prestar um testemunho rigoroso e esclarecedor dos factos relativamente aos quais tinha conhecimento.
Transmitiu ao Tribunal de forma clara e imediata que nada sabia sobre orçamentação, apenas recebeu a lista de preços unitários. Convenceu o Tribunal que a empreitada em causa veio desacompanhada de estudo geotécnico, o qual apenas veio a ser realizado em fase de execução das fundações. O resultado desse estudo obrigou à alteração do projecto de obra, que estava a cargo do Dono de Obra, aqui Réu. Convenceu o Tribunal que não era possível concretizar a obra referente às fundações, trabalho de betão armado sem o qual não era possível avançar com a obra. O depoimento foi tão circunstanciado que o Tribunal ficou esclarecido quanto à premência na conclusão da obra, uma vez que a infra-estrutura - escola - era indispensável à prossecução do interesse público. Identificou os períodos em que a obra ficou suspensa, durante os quais avançaram com os trabalhos possíveis, em prol da pronta conclusão dos trabalhos.
As questões colocadas em audiência final compreenderam toda a matéria de facto que se mantinha controvertida, em especial, como foram identificados e calculados os custos, não se tendo detectado qualquer contradição entre os dados que resultam dos documentos, informação essa organizada em tabelas, devidamente contextualizada pelo depoimento alicerçado na memória humana.
Esta Testemunha, na qualidade de Director Técnico de Obra, lembrava-se dos recursos humanos que se encontravam sob a sua direcção, bem como dos equipamentos colocados à disposição da obra, explicando com clareza que validava as quantidades constantes dos mapas preenchidos pelo Encarregado de Obra.
Concatenado o depoimento da Testemunha com os documentos juntos aos autos, constata-se a participação de «DD» nos vários actos praticados ao longo da empreitada — cf. docs. 9 e 10 juntos à petição inicial. Constata-se ainda que a posição assumida pelo Município nos Ofícios n.ºs ...11 e ...12 não pode merecer acolhimento por parte do Tribunal face à modificação que o Plano de Trabalhos necessariamente sofreu em virtude da paralisação dos trabalhos em obra e da obrigação de execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões. Aliás, o que é referido na parte final desse ofício entra em contradição, de resto, com o vertido no Ofício n.° ...11, quando “confirma(...) que a execução dos poços decorreu de 06.06.2011 (data do reinicio dos trabalhos após suspensão) até 19.05.2011, não sendo, assim, descabido o prazo suplementar de 15 dias concedido para a execução dos trabalhos de suprimento de Erros e Omissões” — cf. Ofício n.° ...11.
«EE», Gestor de Obras, trabalha para a Autora desde 2004. Esta Testemunha demonstrou ter conhecimento directo sobre os factos relativamente aos quais prestou depoimento. Na qualidade de Gestor de Obra, procedia mensalmente à análise dos custos e dos valores recebidos. Explicou com clareza o funcionamento do programa utilizado pela Autora para associar, compilar e tratar a informação respeitante a cada obra. Convenceu o Tribunal que cada obra tinha um código associado e o programa compilava a informação vinda dos lançamentos feitos por cada Departamento, existindo folhas de afectação à obra e listas dos preços unitários a aplicar. O seu conhecimento advém da análise que fez aos lançamentos/recebimentos/autos de medição, sendo que a facturação resultava da concatenação desta informação por parte do Departamento Financeiro a quem cabia aplicar os preços estabelecidos. A sua razão de ciência também advinha da sua presença em obra, acompanhando reuniões sobre o balanço e andamento da obra.
O Tribunal tem consciência que seria desrazoável, irrealista e desprovido de bom senso esperar que uma Testemunha, colocada anos após os acontecimentos, se lembrasse de um conjunto de informação cuja extensão e complexidade teria necessariamente de brotar de documentos que reunissem os meios humanos e materiais utilizados e os preços unitários a aplicar. Assim, a convicção do Tribunal formou-se a partir da conjugação e ponderação de toda a prova produzida, merecendo credibilidade as Testemunhas da Autora que, demonstrando conhecimento aturado sobre como se apuraram os custos em discussão nos presentes autos a partir dos mapas de afectação, que visam traduzir a realidade em obra.
«FF», trabalha para a Autora desde Maio de 2003, tendo sido integrada na Equipa dos Recursos Humanos.
Esta Testemunha prestou um depoimento muito rigoroso, coerente e esclarecedor quanto à forma como acompanhavam os encargos com o pessoal, ou seja, como eram elaborados os documentos contendo informação sobre: identificação da obra, nome do funcionário, categoria correspondente, bem como quem atestava a informação (Director da Obra) antes de ser remetida ao Departamento dos Recursos Humanos. Mais esclareceu o Tribunal que recaía sobre a Equipa dos Recursos Humanos proceder ao cálculo dos custos (média dos custos do ordenado, seguro, subsídios, custos de formação, seguindo valores recomendados ..., entre outros), tendo chegado a informação à Equipa dos recursos humanos com as mais variadas valência em obra.
A Testemunha foi confrontada com vários documentos, de entre os quais de fls. 212 e ss. 238, 240 e ss. do processo físico, reconhecendo com espontaneidade e sem hesitação os documentos exibidos, traduzindo a informação que dos mesmos se retira, mas acrescentando pormenores, merecendo, por conseguinte, elevada credibilidade.
«BB», Engenheiro, foi funcionário do Município até finais de Outubro de 2013, actualmente aposentado. À data dos factos em discussão nos presentes autos, era Chefe de Divisão de Fiscalização de Empreitadas. A Testemunha fez um enquadramento parco dos factos em discussão nos presentes autos, identificou a empreitada, as funções que exerceu na qualidade de Coordenador, recordando a alteração que o projecto sofreu, bem como o contrato celebrado, mas nada acrescentou à prova documental reunida nos autos e no processo administrativo, pelo que a convicção do Tribunal para julgamento dos factos verdadeiramente controvertidos não contou com o depoimento desta Testemunha.
«AA», funcionário do Município, Assistente Técnico na área de gestão de empreitadas. Esta Testemunha prestou um depoimento isento, honesto, rigoroso e com conhecimento directo dos factos, demonstrando que acompanhou a obra, fiscalizando os trabalhos. O Tribunal ficou convencido que obra iniciou-se sem estudo geotécnico por decisão unilateral da Câmara Municipal ..., tendo os trabalhos na zona de intervenção ficado suspensos enquanto os projectistas realizaram novos cálculos para as fundações. A Testemunha foi confrontada com o doc. 4 de fls. 111 dos autos físicos. O depoimento desta Testemunha encerrou a análise global da prova produzida nos autos, tendo o Tribunal ficado convencido que, durante o período de suspensão, os trabalhos da obra em geral não ficaram absolutamente parados ao ponto de ocorrer deslocalização de equipamentos e recursos humanos, mas o atraso na zona critica por necessidade de ajuste do projecto obstaculizou o andamento da obra. Com efeito, durante a espera pelos resultados do estudo efectuado, alterações de projecto, apresentação e aceitação da proposta de preços para a solução encontrada (construção de poços), a Autora geriu em obra os recursos afectos por forma a minimizar o prejuízo, mas o certo é que não existe auto de medição com referência ao período aqui em discussão, pelo que forçoso será concluir que os trabalhos realizados não alcançavam valores significativos, tendo a prova testemunhal infirmado o vertido no Ofício n.° ...011 — Doc. n.° 11 junto com a petição inicial. Mais esclareceu, convencendo o Tribunal, que a obra mereceu outro ajuste significativo decorrente de uma tubagem que atravessava o terreno para condução de águas pluviais, as quais tinham que ser encaminhadas para fora do terreno. Igualmente convenceu o Tribunal que, se tivesse possibilidade, a Autora tinha avançado com a obra, mas não tinha essa possibilidade, face à indispensabilidade dos elementos para execução da obra em matéria de fundações.
Mais cumpre referir que as Testemunhas da Entidade Demandada nada disseram quanto ao preço unitário por cada tipo de encargo com o pessoal/equipamento ou diverso, informação utilizada para o calculo do quantum indemnizatório, de harmonia, aliás, com o preço unitário utilizado nos cálculos que sustentaram várias reclamações dirigidas ao Dono da Obra.»

Apreciemos, enfim, as questões acima enunciadas e vejamos o que concluir dessa apreciação quanto ao mérito dos recursos e do objecto da acção.

A – DO RECURSO DO RÉU

1ª Questão
A sentença recorrida padece de erro em matéria de facto no que respeita à alínea K) da enunciação dos factos provados, pois apenas se provou que o Réu determinou a suspensão parcial da execução dos trabalhos, além de que devia ter sido aditado a esta uma alª K1) dando como provado o facto descrito na conclusão XIV?

Cumpre ter presente que o julgamento da matéria de facto pela segunda instância não pode ser entendido como uma avaliação ex novo da prova produzida, em que se possa fazer tábua rasa do julgamento do juiz da 1ª instância, mas antes e tão só como uma crítica ao julgamento feito por este, do ponto de vista da lógica e dos dados da experiência comum, a partir do pressuposto de que foi esse juiz quem presenciou imediatamente os depoimentos, suas circunstâncias e componentes não documentáveis na gravação sonora, de maneira que tal crítica deve ficar-se pela detecção de erros de julgamento revelados pelas “regras da experiência comum” ou logicamente demonstráveis.
Em coerência com este entendimento e para obviar à perplexidade de não haver um objecto concreto e definido para a crítica da decisão de facto, o artigo 640º nºs 1 e 2 do CPC, aqui aplicável ex vi artigo 2º do CPTA, faz impender sobre o recorrente em matéria de apreciação da prova o ónus de delimitar positivamente os factos indevidamente provados ou indevidamente não provados, a decisão que devia ter sido tomada e meios de prova determinantes, chegando ao ponto de lhe impor, no caso da prova verbal gravada, sob pena de “imediata rejeição (…) do recurso” na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (nº 2 alª a)).
Depois, ante os termos de qualificação jurídica em que a Recorrente coloca esta questão, cumpre ainda distinguir o erro na apreciação da prova de factos dos quais cumpra ao tribunal conhecer, esse sim, erro de julgamento de facto, por um lado, da omissão de selecção – como provados ou não provados – de tais factos, por outro; omissão que, redundando numa falta de especificação de fundamentos de facto da sentença, qualificamos como causa de nulidade da sentença nos termos da alª b) do nº 1 do artigo 615º do CPC - eventualmente suprível nos termos dos artigos 662º do CPC e ou 149º nº 1do CPTA (665º do CPC).
Comecemos pelo erro de julgamento de facto.
O recorrente indica claramente a decisão em matéria de facto que impugna e a que devia ter sido tomada em seu lugar.
Assim, em vez de se dar por provado que:
“K) Em 30 de Março de 2011, o Município Demandado determinou a suspensão da execução dos trabalhos, tendo a decisão de suspensão sido formalizada no Auto n.° 9, cujo teor em parte segue: "devido à necessidade de alteração das fundações dos edifícios após a realização de ensaios geotécnicos, e de execução do desvio do colector de águas pluviais que atravessa a área de implantação do edifício, não se torna possível prosseguir com os trabalhos da empreitada, pelo que os mesmos deverão ficar suspensos", devia ter sido dado como provado, apenas, que:
K) Em 30 de Março de 2011, o Município Demandado determinou a suspensão parcial da execução dos trabalhos, tendo a decisão de suspensão sido formalizada no Auto n.° 9, cujo teor em parte segue: “devido à necessidade de alteração das fundações dos edifícios após a realização de ensaios geotécnicos, e de execução do desvio do colector de águas pluviais que atravessa a área de implantação do edifício, não se torna possível prosseguir com os trabalhos da empreitada, pelo que os mesmos deverão ficar suspensos".
Deste modo, não só está satisfeito o ónus decorrente das alíneas a) e c) do nº 1º do citado artigo 640º, como fica claro que toda a diferença entre o julgado e o ora sustentado reside no adjectivo “parcial”.
Note-se, entretanto, que a adjectivo vem referido, não à suspensão de facto dos trabalhos, mas sim à determinação da suspensão dos trabalhos. Quer dizer, segundo a redacção pretendida pelo Recorrente, o Município teria determinado a suspensão apenas parcial dos trabalhos de execução da empreitada.
Em ordem a demonstrar que se fez prova desta diferença, o Recorrente indicou e localizou no registo áudio passagens dos depoimentos das testemunhas «BB» e «AA», segundo as quais a execução da obra não parou totalmente, pois prosseguiram outros trabalhos, a cuja continuação nada obstava. Desta feita, o Recorrente cumpre com o ónus da alª b) do nº 1 a) do nº 2 do artigo 640º do CPC.
Mas a impugnação deste aspecto da decisão em matéria de facto não pode proceder. Na verdade, o que os inquiridos atestam, nas invocadas passagens, é que na realidade houve trabalhos que prosseguiram, que a obra não parou completamente. Porém, o que se julgou provado na alª K) foi a determinação, pelo Réu, da suspensão da execução dos trabalhos, indiscriminadamente, conforme o auto respectivo (doc. 4 da PI).
Ora, desse facto faz incontestada prova o Auto, documento autêntico invocado pela Autora e pela Sentença recorrida.
Como assim, a resposta à presente questão, no que respeita a sua vertente de alegação de erro no julgamento de facto, é negativa.
Passemos à falta de especificação de um facto provado.
Segundo o Recorrente Réu, deveria ter-se aditado uma alínea K1) com o seguinte teor:
Na sequência da suspensão parcial referida no ponto anterior, a Autora continuou em obra a realizar outro tipo de trabalhos que não dependiam dos estudos geotécnicos solicitados pelo Réu.”
Considerando que não vinga a versão do Recorrente para a alª K), o que continua a importar e a ter sentido é tão só saber se devia ter sido especificado como provado que, apesar da determinação da suspensão pelo Réu, “a Autora continuou em obra a realizar outro tipo de trabalhos que não dependiam dos estudos geotécnicos solicitados pelo Réu”.
O Recorrente indica meios de prova desse facto, mas nada alude em fundamento de o facto dever ser seleccionado.
Na verdade, há antes de mais que verificar se era devida a selecção deste facto (como provado ou não provado), isto é, se a Mª Juiz a qua devia tomar em consideração este facto.
Que factos são esses, em tese, a que o Tribunal deve atender e, portanto, especificar, na sentença, como provados ou não provados?
Nos termos do artigo 94º nº 3 do CPTA – “Na fundamentação da sentença, a sentença deve discriminar os factos que julga provados e não provados (…)
A matéria de facto a declarar provada e não provada haverá de ser, logicamente e antes de mais, a alegada pelas partes e que releve para a discussão da causa em qualquer das soluções plausíveis do litígio, designadamente as soluções sustentadas pelas partes. Tal é o que decorre do artigo 5º nºs 1 e 2 do CPC. Da norma constituída por estes dois números resulta, também, que o juiz deve ter ainda em consideração e, portanto, discriminar como provados nos termos do citado artigo 94º nº 3 do CPTA, factos instrumentais e factos que sejam complemento ou concretização dos alegados, cuja prova tenha resultado da instrução da causa, desde que, quanto a estes últimos e sua prova, as partes tenham tido a oportunidade, expressamente advertida, de exercer o contraditório, conditio que decorre da alª b) do nº 2 do artigo 5º citado e do nº 3 do artigo 3º do CPC.
Não se diga que basta a menção dos factos provados suficientes para a decisão preconizada pelo tribunal. Na verdade, se o direito ao contraditório é um direito processual que se filia no direito liberdade e garantia consagrado no artigo 20º nº 1 da Constituição, é dever do juiz pronunciar-se fundamentadamente sobre a prova de todos os factos alegados e relevantes, ainda que só do ponto de vista – posto que plausível – de qualquer das partes, de modo a que estas possam exercer o contraditório e o recurso também quanto à solução jurídica por si preconizada para o litígio.
Esta afirmação carece, contudo, de uma advertência sobre o que seja e não seja silêncio da sentença em matéria de facto: assim, quando da prova de um facto, devidamente fundamentada, resulta logicamente a não prova ou, até, a prova de outro, também ele alegado, o que sucede, verdadeiramente, é haver pronúncia, tácita, mas clara, e até fundamentada, no sentido da não prova de um e da prova de outro, não sendo, assim, indispensável, para cumprir com o artigo 94º nº 3 do CPTA, uma expressa referência àqueles.
Já os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por integrarem a própria tramitação do processo, esses, não carecem de ser discriminados, dado que a sua prova é do conhecimento de qualquer das partes e não carece de contraditório.
Assim, para que o tribunal se deva pronunciar sobre a prova ou a não prova de quaisquer factos é necessário que os mesmos tenham sido alegados ou que, ao menos, sejam instrumentais, complementares ou concretização dos alegados, tendo a sua prova resultado da instrução da causa e, sendo complementares ou concretização, tenham, as partes, tido a possibilidade, expressamente advertida, de, quanto a eles e sua prova, se pronunciarem.
Vejamos, então, se o facto em questão era efectivamente de considerar:
Devassada, desde logo, a contestação, verificamos que não só este facto não é alegado, como a suspensão de facto de todos os trabalhos é um facto inequivocamente aceite pelo Réu, desde logo ao fundar a sua defesa nesse facto, entre outro admitidos.
Tão pouco na Petição ou na Réplica se alega o que quer que seja assimilável a uma suspensão apenas parcial dos trabalhos.
Apesar de não se tratar de um facto alegado, não vem desta feita alegado o que quer que seja, nem o tribunal o cogita, que estabeleça uma relação de instrumentalidade ou complementaridade entre este e qualquer facto alegado. Muito menos decorre do registo da Audiência Final que sobre a consideração deste facto e sua prova tivesse tido, a Autora, oportunidade de se pronunciar.
Enfim, provado ou não provado, não só não era devida como não era admissível a consideração, na sentença, deste facto que o Réu Recorrente pretende ver aditado, pelo que não ocorre a apontada falta de especificação de fundamentos de facto da sentença.
É negativa, portanto, a resposta a toda a primeira questão do recurso do Réu.

2ª Questão
Independentemente do julgamento quanto à primeira questão, a sentença recorrida padece de erro no julgamento de direito porque não se encontravam, in casu, reunidos os pressupostos cumulativos do direito ao reequilíbrio financeiro do contrato definidos no artigo 282º nº 2 do CCP, já que não só não fora a Autora a fixar o valor da prestação, pois limitou-se a suceder à “[SCom02...]” na sua posição contratual, tendo de se resignar aos valores por aquela apresentados, como a necessidade de estudos geológicos no local da obra não era conhecida ou cognoscível pelo contraente público, aqui Recorrente.

Vejamos o teor do nº 2 do artigo 282º do CCP, que é o que contém uma definição dos pressupostos cumulativos do direito do contratante particular à reposição do equilíbrio financeiro do contrato.
«Sem prejuízo do disposto no número anterior, o co-contratante só tem direito à reposição do equilíbrio financeiro quando, tendo em conta a repartição do risco entre as partes, o facto invocado como fundamento desse direito altere os pressupostos nos quais o co-contratante determinou o valor das prestações a que se obrigou, desde que o contraente público conhecesse ou não devesse ignorar esses pressupostos.»
Como bem analisa o Recorrente, deste normativo extrai-se a necessidade de concorrerem os seguintes pressupostos:
a) O facto causador do desequilíbrio não se inclua no risco normal do negócio que o co-contratante deva suportar;
b) Esse facto altere os pressupostos em que o co-contratante fixou o valor da prestação;
c) Esses pressupostos sejam conhecidos ou cognoscíveis do contraente público, como será designadamente o caso de constarem dos elementos patenteados nas peças do procedimento de adjudicação.
É, aliás, a estes pressupostos que o Réu recorrente se pretende referir quando suscita a questão ora em apreciação. Certo é que não explicita qual ou quais deles considera não preenchidos.
Presumimos que com a alegação de que não fora a Autora a fixar o valor da prestação contratual, pretenderá denunciar a falta do pressuposto b).
Trata-se de uma alegação deveras inconsistente. Na verdade, se a posição contratual foi cedida, tudo se passa, na execução do contrato, como se o empreiteiro actual (cessionário) fosse o inicial adjudicatário (cedente).
Com a alusão ao facto de que a necessidade de estudos geológicos no local da obra não era conhecida ou cognoscível do contraente público estará, o Reu Recorrente, a alegar que não ocorre in casu o pressuposto acima enunciado sob al. c). Porém, aqui labora, deliberadamente ou não, numa interpretação manifestamente falaciosa do nº 2 do artigo 282º do CCP. Evidentemente, nem um nem outro contratante sabiam que viria a ser necessário fazer estudes geológicos no local da obra, tanto assim que não haviam sido feitos antes tais estudos antes do procedimento nem estavam previstos no respectivo PP. Porém, é desse desconhecimento que decorre, como uma necessidade lógica ou pelo menos prática, a conclusão de que o dono da obra sabia ou devia saber que o preço proposto pela Autora, tal como por qualquer outro concorrente, foi proposto no pressuposto de que não seria necessário o sobredito estudo geológico e suas consequências.
Pelo exposto é negativa a resposta à presente questão.

3ª Questão
A sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto ao dar como provado o teor da alínea U), relativa a encargos com a prorrogação do prazo de execução da obra por 15 dias, pois tais custos estão incluídos nos preços de dois contratos adicionais nos valores de € 103.650,05 e € 19.764,17, pelo que o que deve ser dado como provado sob tal alínea é outrossim o que consta da conclusão XXIX?

O recorrente sustenta que em vez da alínea U) da especificação de factos provados, cujo teor é este:
U) Por força da prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, a Autora suportou encargos acrescidos com pessoal, designadamente, com director técnico da Empreitada, director de obra adjunto, encarregado geral, técnico de segurança, técnico de ambiente, técnico de qualidade, topógrafo (com equipamento), segurança da obra, bem como com equipamentos, nomeadamente, contentores, grua, WC, ferramentas, equipamentos de segurança, custos com infra-estruturas, e ainda os custos de estrutura da empresa.
Devia e deverá constar a seguinte:
U) Por força da prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, a Autora foi já ressarcida com recurso aos contratos adicionais outorgados entre as partes, os quais já se encontram integralmente pagos, conforme consta do facto dado como provado AA).
O Recorrente confunde aqui direito com facto e pretende substituir uma proposição reconduzível à categoria de proposição de facto por uma proposição de direito, como se uma e outra fossem de facto e, por isso, incompatíveis. Mas não são, precisamente porque uma é de facto e a outra é de direito.
A alínea U) “recorrida” pode sem qualquer dificuldade ser interpretada como uma proposição em matéria de facto, designadamente no sentido de que por via da prorrogação do prazo para execução dos trabalhos de suprimento de erros e omissões, a Autora suportou encargos não previstos na elaboração da proposta, isto é, “acrescidos” relativamente à proposta. Já a propugnada nova alínea U) não é mais do que uma conclusão jurídica sobre aquele outro facto, no sentido de que esses encargos não desequilibraram o contrato, porque o seu custo está incluído nos custos que formam o preço dos contratos adicionais, outorgados em consequência daquelas prorrogações.
Note-se que, quanto à alª U) enquanto decisão de facto, não vem arguido qualquer erro de julgamento. O Recorrente não se insurge contra os encargos, sustenta que não “acrescem” aos já remunerados porque foram incluídos no preço dos adicionais.
Uma vez que juris novit curia, nem por isso deixaremos de apreciar essa alegação, enquanto alegação de erro de direito.
Vejamos.
Julgou-se provado e relevante, que: AA) O Município Demandado procedeu ao pagamento dos adicionais ao contrato inicial, nos montantes, respectivamente, de €103.650,05 e €19.764,17 — cf. PA (Pastas 6, 7 e 8).
Tem sentido, em abstracto, a alegação de que no preço dos contratos adicionais estejam incluídos, tal como no contrato inicial, os encargos com a manutenção em obra e os encargos estruturais com o funcionamento quer da empresa quer do estaleiro da obra.
Mister é que, em concreto, se possa ao menos presumir judicialmente que essa era a vontade contratual das partes ao outorgarem os mesmos, especialmente ao convencionarem os preços respectivos.
Ora, in casu não se pode presumir tal vontade contratual, desde logo porque, conforme alíneas S) e T) dos factos provados, ante o pedido, pela Autora, de compensação pelos sobrecustos suportados com a prorrogação do tempo de execução da obra por 21 dias, devido à realização das obras necessárias para suprimento de erros e omissões do projecto, o Réu aceitou a prorrogação de 15 dias e pagar por isso um valor – inferior ao pretendido – de 31 027,98 €.
Além disso não se provou, nem, note-se, foi alegado em contestação, que esses contratos adicionais a que alude a sobredita alª AA) tenham tido por objecto, não só os trabalhos complementares adicionais cuja necessidade directamente os determinou, como também os custos – acrescidos aos considerados na proposta – causados pela paragem da obra, pelo período em que a execução esteve suspensa e, portanto, tão pouco os trabalhos adicionais foram executados.
Assim, não se pode sustentar, como faz o Recorrente, que, ao reclamar e reequilíbrio financeiro do contrato nos termos em que o faz, a Autora esteja a repetir o que já recebeu ou a pretender enriquecer sem causa.
Como assim, é negativa a resposta a esta questão.

4ª Questão
Das respostas afirmativas às 1ª e 3ª questões resulta um erro de julgamento de direito pois falecem quaisquer pressupostos para um reequilíbrio financeiro do contrato?

Esta questão, conforme decorre da sua própria enunciação, pressupunha respostas positivas às 1ª e 3ª. Portanto, está prejudicada.


Conclusão quanto ao Recurso da Ré:
Do que vai dito resulta o não provimento do recurso do Réu.


B – RECURSO DA AUTORA
Única Questão
A sentença erra no julgamento em matéria de facto – e consequentemente no julgamento de direito – ao não dar como provados a totalidade dos custos dos meios humanos e equipamentos, suportados pela Autora com a suspensão e a prorrogação do prazo de execução da obra, constantes dos artigos 28º, 30 e 42º da PI?

Em suma, a Recorrente alega que em vez de se ter dado como provado, apenas, que:
“Q) Ao longo de 37 dias de suspensão de obra, a Autora suportou encargos relacionados com equipamentos e trabalhadores afectos à obra, designadamente com contentores, betoneiras, vibradores de betão, guarda corpos, tábuas para guarda corpos, máquinas, ferramentas, gruas, cofragem, escoramentos, bomba, andaime, equipamento de segurança colectivo, equipamento de topografia, rectro-escavadora, camião , viaturas, equipamentos de telecomunicações, director técnico da empreitada, director de obra adjunto, encarregado, preparador, apontador, técnico de segurança, técnico de acompanhamento ambiental, técnico de Qualidade, topógrafo, porta miras, armadores de ferro, carpinteiros de cofragem, manobrador de máquinas, condutor de camião, gruista, serventes”, devia também ter sido dado como provado que:
Q’) Tais encargos, nos trinta e sete dias de suspensão, perfizeram € 152.401.52 (cento e cinquenta e dois mil, quatrocentos e um euros e cinquenta e dois cêntimos), sendo a este título € 50.281,52 [equipamentos] e € 102.120,00 [pessoal];
E ainda que:
FF) Em virtude da prorrogação legal do prazo de empreitada por mais 15 dias, a Autora suportou encargos relacionados com equipamentos e trabalhadores afectos à obra no valor de € 61.784,40 (sessenta e um mil, setecentos e oitenta e quatro euros e quarenta cêntimos) sendo a este título € 20.384,40 [equipamentos] e € 41.400,00 [pessoal];
E que:
GG) Em virtude da suspensão de obra por 37 dias e da prorrogação legal de 15 dias, a Autora suportou custos com a estrutura central da empresa correspondentes a 7% do valor contratual por um prazo de 52 dias, num total de € 32.853,98 (trinta e dois mil, oitocentos e cinquenta e três euros e noventa e oito cêntimos)”.
Tratava-se de factos alegados na Petição Inicial e relevantes para a pretensão da Autora, no aspecto quantitativo, pelo que deviam ter sido expressamente especificados como provados ou não provados, na fundamentação de facto da sentença, o que não foi feito.
A Recorrente não argúi essa omissão na decisão de facto – antes parece supor que estes factos foram tacitamente julgados não provados, partindo para a discussão desse erro de julgamento de facto.
A nulidade da sentença na parte correspondente (cf. supra e artigo 615º nº 1 alª b) do CPC), não foi arguida; e não cumpre ao tribunal declará-la ex officio (cf. artigos 615º nº 4 e 196º do CPC).
Tal não obsta a que se possa suprir, nesta instância, a omissão, julgando os factos em causa provados ou não provados, consoante o nosso julgamento sobre a prova produzida, toda ela disponível, e alterando a decisão em matéria de facto em conformidade, conforme artigo 662º do CPC.
A Recorrente Autora, lidando no pressuposto de que do que se trata é de um erro no julgamento de facto, no sentido de os factos alegados terem sido julgados não provados, cumpre, formalmente, com os ónus que para si decorrem do disposto no artigo 640º do CPC. Designadamente cita e situa, no registo áudio, excertos relevantes da prova verbal por si oferecida em ordem às quantificações pecuniárias em discussão, ditos que ou não envolvem, compreensivelmente, quantias exactas ou consistem na confirmação verbal de cálculos económicos por si mesma ou por sua conta realizados.
Importa, aqui, dar nota do seguinte:
A prova testemunhal e a prova por declarações de parte têm como objecto factos concretos, apreensíveis pelo conhecimento empírico sem recuso a conhecimentos técnicos ou científicos que o juiz não possua.
Ora, as proposições aqui em causa sobre os custos de uma suspensão e de uma prorrogação da permanência em obra, inclusive sobre os chamados encargos estruturais da empresa, não têm essa natureza, são abstracções, que, embora possam ser objecto de um juízo de verdadeiro ou falso, não são susceptíveis de serem conhecidas apenas sensorialmente, carecem de uma elaboração intelectual de natureza indutiva. Além disso, a sua apreciação demanda não só conhecimentos especializados como também o tratamento de dados, isto é, muitos factos concretos e individuais, dispersos no tempo e no espaço, que o tribunal desconhece – e não foram alegados.
Sintomaticamente, na realidade, a produção de prova testemunhal nestas matérias acaba por ter de se desenrolar em volta de opiniões e convicções da pessoa inquirida, o que é o oposto do que se pretende de todo e qualquer meio de prova, mormente da testemunhal.
Tal como dissemos no acórdão nº 280/09.6BEPNF deste Tribunal Central:
«Não se pode deixar a prova do an e do quantum dos sobrecustos alegadamente suportados pelo empreiteiro por causa da permanência em obra por mais tempo de que o contratualizado, ao depoimento conclusivo e, portanto, insindicável de uma testemunha, empregado de empreiteiro: não só atenta esta especial relação da testemunha com a parte interessada, mas, sobretudo, porque se trata de factos aos quais se terá chegado ao cabo da selecção e do tratamento de muitos outros factos, – estes, sim, individuais e concretos – que não foram alegados e sobre os quais não se produziu prova, e de outras tantas operações de cálculo aritmético e estatístico, factos e operações, aliás, cujos conhecimento e selecção, e cuja efectuação, respectivamente, relevam de conhecimentos técnicos que o juiz, em regra não tem. Enfim, os sobreditos sobrecustos, para poderem ser seleccionados, sem mais alegação, como factos relevantes e como factos provados careciam de uma exibição da contabilidade das autoras e de uma perícia a esta sobre esta. Já os custos estruturais da mesma permanência, tal como vêm alegados, nem mesmo são factos, mas considerações teóricas, pelo que não podem, sequer, ser objecto de um juízo de prova.
IV- Mesmo que, porventura, partindo de uma necessária flexibilidade na concepção do que [é] matéria de facto, se acolhesse tal natureza às alegações de encargos de estrutura, sempre obstaria à prova destes factos a falta de prova, em concreto, do nexo de causalidade entre os encargos estruturais da manutenção de cada empresa consorte e cada obra concreta, pois trata-se por natureza, de encargos que estas têm de assegurar em alguma medida permanentemente, independentemente das obras concretas em curso e seu eventual prolongamento imprevisto.»
Assim, julgamos que os meios de prova produzidos em audiência não são aptos para a prova dos sobreditos factos, pelo que cumpria julga-los não provados.
Do exposto resulta que, embora se impunha alterar a decisão em matéria de facto, no sentido de julgar expressamente não provados, com a presente fundamentação, os factos que a Recorrente pretendia serem aditados como provados, é negativa a resposta à presente questão.

Conclusão do recurso da Autora:
Da discussão e da reposta à questão em que assentava o recurso da Autora resulta o seguinte:
A - Este Tribunal, com a fundamentação que antecede, altera a decisão recorrida em matéria de facto, aditando-lhe a especificação dos seguintes factos relevantes para a decisão da causa e não provados:
1 - Os encargos suportados pela Autora por causa da suspensão da execução da empreitada, nos trinta e sete dias de suspensão, perfizeram € 152.401.52 (cento e cinquenta e dois mil, quatrocentos e um euros e cinquenta e dois cêntimos), sendo a este título € 50.281,52 [equipamentos] e € 102.120,00 [pessoal];
2 - Em virtude da prorrogação legal do prazo de empreitada por mais 15 dias, a Autora suportou encargos relacionados com equipamentos e trabalhadores afectos à obra no valor de € 61.784,40 (sessenta e um mil, setecentos e oitenta e quatro euros e quarenta cêntimos) sendo a este título € 20.384,40 [equipamentos] e € 41.400,00 [pessoal];
3 - Em virtude da suspensão de obra por 37 dias e da prorrogação legal de 15 dias, a Autora suportou custos com a estrutura central da empresa correspondentes a 7% do valor contratual por um prazo de 52 dias, num total de € 32.853,98 (trinta e dois mil, oitocentos e cinquenta e três euros e noventa e oito cêntimos)”.
B – Sem embargo, o recurso improcede.

IV – Custas
Vencidos nos respectivos recursos, os Recorrentes arcarão com as custas dos mesmos: artigo 527º d CPC.
Uma vez que improcedem ambos os recursos, a sentença recorrida mantém intacto o seu dispositivo, inclusive quanto a custas.

V- Dispositivo
Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central em negar provimento a ambos os recursos.
Custas conforme supra.

Porto, 6/6/2025

Tiago Afonso Lopes de Miranda
Celestina Caeiro Castanheira (em substituição)
Maria Clara Alves Ambrósio