Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00325/18.9BEPRT |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 09/20/2018 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Pedro Vergueiro |
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Descritores: | RECLAMAÇÃO. ART. 276º DO CPPT. ART. 244º DO C.A.C. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA. PREJUÍZO IRREPARÁVEL. PROVA. |
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Sumário: | I) Existe decisão anterior de acordo com a qual ficou estabelecido que ao pedido de dispensa da garantia devida pela suspensão da execução fiscal instaurada para cobrança de IVA nas importações se aplica o artigo 244.º do Código Aduaneiro Comunitário (C.A.C.), não por força do artigo 101.º da Reforma Aduaneira, mas por remissão do artigo 28.º, n.º 3 do CIVA. II) Quando se analisa o pedido apresentado pelo Recorrido com referência à suspensão da cobrança, o qual tinha um duplo fundamento, a saber, a existência de motivo fundamentado para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira e bem assim o receio manifesto de a execução da decisão causar prejuízo irreparável, em confronto com o despacho reclamado, resulta evidente que já em momento anterior, como agora, o núcleo essencial da apreciação centrou-se na questão da dispensa de prestação de garantia, olvidando a realidade relacionada com o disposto no 2º parágrafo do art. 244º do CAC, matéria de que depende a posterior discussão sobre a matéria da prestação de garantia. III) Em função do enquadramento da actividade do Recorrido, o desenvolvimento normal dos processos em causa (é sabido que existem outros processos de cobrança e que o mesmo tem responsabilidades assumidas perante o BBVA), o que se traduziria na penhora dos bens do Recorrido, nomeadamente os apontados na decisão reclamada, os quais revelam uma capacidade apenas mínima para dar resposta ao volume dos valores em dívida, seguindo-se apenas a situação relacionada com a actividade profissional do Recorrido que, face aos termos em que se desenrola, como facilmente se intui, seria susceptível de afectar a mesma de forma relevante, podendo mesmo originar “uma bola de neve” capaz de conduzir ao encerramento da actividade, pois que, uma situação como a presente tem a susceptibilidade de colocar em crise o funcionamento da tesouraria, o que se reflecte no processamento normal do negócio, dado que, diminui a capacidade de resposta às solicitações dos clientes, o que vai ter custos em termos do seu número e assim sucessivamente, podendo mesmo desembocar no encerramento da actividade, o que se reconduz à figura do prejuízo irreparável. IV) Quando o 3º parágrafo do art. 244º do CAC refere que essa garantia pode não ser exigida quando possa suscitar, por força da situação do devedor, graves dificuldades de natureza económica ou social estamos a falar de uma realidade que não se confunde com a existência de prejuízo irreparável, dado que deparamos com a alusão a graves dificuldades de natureza económica ou social, ou seja, o despacho reclamado passou ao lado da lei aplicável nesta sede, o que, só por si, tem de conduzir à sua anulação. V) De qualquer modo, lendo e relendo a decisão reclamada, a mesma nada diz sobre a existência de motivo fundamentado para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira e sendo o fundamento agora descrito capaz de, só por si, desencadear a aplicação do disposto no art. 244º do CAC, sempre seria de anular o despacho reclamado, porquanto, impunha-se a apreciação da realidade suscitada pelo ora Recorrido, na medida em que a mesma, em abstracto, tinha a virtualidade de conferir total viabilidade à sua pretensão. * *Sumário elaborado pelo relator |
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Recorrente: | FJSPC |
Recorrido 1: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 15-06-2018, que julgou procedente a pretensão deduzida por FJSPC no âmbito da presente RECLAMAÇÃO relacionada com o despacho do Director da Alfândega de S..., de 26-01-2018 proferido no PEF nº 3204201501221981 nos termos do qual foi desatendido o pedido de suspensão da execução e de dispensa de prestação de garantia. * Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 106-110), as seguintes conclusões que se reproduzem:“ (…) A. Face ao disposto nos artigos 28.º n.º 3 do CIVA e 52.º, n.º 4 da LGT, conclui-se que a suspensão da execução instaurada para cobrança coerciva da dívida correspondente ocorre nos casos previstos na legislação comunitária, no caso, o artigo 244.º do CAC. B. O referido preceito legal estipula que “A interposição de recurso não tem efeito suspensivo da execução da decisão contestada. Todavia, as autoridades aduaneiras suspenderão, total ou parcialmente, a execução dessa decisão sempre que tenham motivos fundamentados para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira ou que seja de recear um prejuízo irreparável para o interessado. (…)” (sublinhado nosso) C. No que concerne à irreparabilidade dos prejuízos, tem sido entendimento unânime da nossa doutrina e jurisprudência que só devem ser considerados irreparáveis os prejuízos ou danos cuja extensão não possa ser avaliada pecuniariamente, sendo certo que esses prejuízos terão de ser directos e consequência da execução do acto que se reclama, e ainda que a dificuldade de reparação dos danos se deve avaliar segundo um juízo de probabilidade, sempre no estrito respeito pelos limites da invocação do interessado. D. “No que respeita ao prejuízo irreparável, compete ao executado fazer prova da existência de uma situação de dano no desenvolvimento da sua actividade, como resultado dos encargos financeiros impostos pela prestação da garantia. Este dano deve ser especialmente grave, pondo geralmente em causa a continuidade da actividade económica do executado (…)” - cfr. José Maria Fernandes Pires e Outros, in “Lei Geral Tributária Comentada e Anotada”, 2015, Almedina. (sublinhado nosso) E. Assim, apenas haverá lugar à dispensa da prestação de garantia quando esta possa causar ao executado prejuízos que impeçam o retorno ao status quo ante. F. Ora, da leitura do n.º 4 do art.º 52º da LGT resulta que, só em circunstâncias muito excepcionais é que a suspensão da execução é conseguida sem prestação de garantia, em virtude de o executado dela poder ser isento. G. Assim, atentos os requisitos legais, bem se compreende que a prova de verificação dos pressupostos que permitam a dispensa de prestação de garantia se deva fazer, prima facie, com recurso à prova documental, por ser este tipo de prova aquele que melhor se coaduna com a demonstração imposta por lei. H. Para além disso, o nº 3 do art.º 170º do CPPT refere expressamente que o pedido de dispensa de garantia deve ser instruído com a prova documental necessária para a apreciação da pretensão. I. Veja-se, a propósito, o douto Acórdão do TCA Sul, processo 00348/04, 07.12.2004. J. Ora, in casu, pela consulta dos documentos n.ºs 7 a 11 da p.i. apresentados pelo ora reclamante, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, conclui-se que os mesmos não são susceptíveis (e, muito menos “sobejamente”) de demonstrar e provar o “prejuízo irreparável”, pressuposto essencial de que depende a decisão de suspensão da execução com dispensa de prestação de garantia, uma vez que, K. tais documentos - apresentados com suposta intenção de prova dos custos que importariam para o reclamante as comissões cobradas por diversas instituições bancárias - consistem em meros “prints” recolhidos dos sites dessas mesmas instituições bancárias, L. e, portanto, sem qualquer valor probatório para os presentes autos. M. Destarte, entende a Fazenda Pública que o acto reclamado, porque legal, deverá manter-se no ordenamento jurídico-tributário. N. Assim, decidindo da forma como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO E DE FACTO. Termos em que, Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional com as legais consequências.” * O Recorrido FJSPC apresentou contra-alegações, onde formula as seguintes conclusões:“(…) A) - O que está em causa no recurso da sentença que ordenou a suspensão da execução com dispensa de garantia, é um pedido de suspensão da cobrança coerciva de IVA liquidado pela Alfândega de S..., com dispensa de prestação de garantia, submetido pelo Recorrido junto desta autoridade aduaneira nos termos e com base nos fundamentos previstos no artigo 244.º do CAC e que, por ausência de decisão desta Alfândega, foi renovado junto o órgão de execução fiscal no âmbito da execução fiscal n.º 3204201501221981. B) - Depois de diversas peripécias, acabou por ser devolvida à Alfândega de S... a competência para se pronunciar sobre tal pedido, o que esta fez proferindo despacho de «Indefiro o pedido de dispensa de garantia (...).», que constitui a decisão reclamada nestes autos. C) - Sucede que o Recorrido invocou como fundamentos do pedido de suspensão as duas situações previstas no 2.º parágrafo do artigo 244.º do CAC, a saber: (i) existência de motivo fundamentado para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira - a prescrição da obrigação de pagamento por parte do Recorrido, em face do decurso do prazo de caducidade de três anos previsto no artigo 221.º, n.º 3 do CAC - e, (ii) receio manifesto de a execução da decisão causar prejuízo irreparável. D) - Concomitantemente, o Recorrido requereu nos termos do 3.º parágrafo do mesmo artigo 244.º do CAC fosse dispensado de constituir garantia por ser manifesta a carência de meios económicos para garantir o valor de € 887.401,88, impossibilidade essa revelada pela manifesta e absoluta insuficiência de bens penhoráveis. E) - O despacho reclamado do Diretor da Alfândega de S... não decidiu sobre a suspensão da cobrança - 2.º parágrafo do artigo 244.º do CAC - e ignorando em absoluto o disposto no 3.º parágrafo do artigo 244.º do CAC, indeferiu o pedido de dispensa de constituição de garantia, mas com fundamentação na doutrina do Ofício Circulado da AT n.º 60077 de 29-07-2010 e jurisprudência desenvolvidas internamente a propósito da interpretação do artigo 52.º n.º 4 da LGT. F) - É, pois, manifesto haver erro nos pressupostos de direito em que a decisão reclamada de indeferimento assentou, ao considerar que não estar demonstrado e provado o requisito de verificação de «prejuízo irreparável», uma vez que o 3.º parágrafo do artigo 244.º do CAC a ele não faz referência como requisito de dispensa da prestação de garantia. G) - No mesmo erro persiste a Recorrente, uma vez que é apenas a circunstância de a exigência da constituição de garantia poder suscitar «por forca da situação do devedor, graves dificuldades de natureza económica ou social» que releva para tal garantia dever ser dispensada, e já não qualquer ideia de irreparabilidade dos prejuízos que impeçam o retorno ao status quo ante. H) - Com efeito, apenas neste âmbito - «a situação do devedor, graves dificuldades de natureza económica ou social» - é que pode relevar o estatuído no artigo 52.º n.º 4 da LGT - «(...) manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido». I) - Na realidade, o Recorrido não é desprovido de meios; do que o Recorrido carece é dos meios económicos para garantir o valor de € 887.401,88, falta essa revelada pela manifesta e absoluta insuficiência de bens penhoráveis, e é apenas da prestação de tal garantia que ao abrigo da lei pretende ver-se dispensado. J) - Como resulta da supra transcrita jurisprudência do TJUE, «a condição relativa à existência de um prejuízo irreparável deve considerar-se preenchida», bastando que «o prejuízo dependa da ocorrência de um conjunto de fatores que seja previsível com um grau de probabilidade suficiente». K) – Igualmente, no entendimento do STA igualmente supra citado, a simples circunstância de ter sido invocada pelo Recorrido no seu pedido de suspensão de cobrança a prescrição da dívida - «considerando que o pagamento de uma dívida prescrita não pode fundamentar a devolução ou repetição do indevido (…) geraria uma situação de facto consumado quanto à satisfação de uma dívida que a ora recorrida tem por prescrita. (…) E a possível procedência da pretensão formulada no processo principal (anulação dos actos de execução da garantia em contrário da verificação da prescrição da dívida garantida) não permitiria reconstituir a situação que existiria na hipótese de a pretensão da ora recorrida dever ter sido objecto de deferimento (…).» legitima «o fundado receio de uma lesão irreparável». L) - Como decidido já pelo TJUE, embora seja à autoridade aduaneira que compete a decisão de suspender a execução do ato impugnado, tal não inibe o tribunal a quo de ordenar a suspensão da cobrança com dispensa de prestação de garantia nos termos e com os fundamentos do artigo 244.º do CAC, tal como requerido pelo ora Recorrido, pelo que nenhuma censura, quer quanto à matéria de facto, quer quanto ao direitos aplicado, merece a decisão recorrida. Termos em que deverá julgado improcedente o presente recurso e mantida integralmente sentença recorrida.” * O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 138-140 dos autos, no sentido da improcedência do recurso. * Sem vistos, por se tratar de processo classificado de urgente, vem o processo à Conferência para julgamento. Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a questão suscitada resume-se, em suma, em indagar da bondade da decisão recorrida quando concluiu pela demonstração e prova do “prejuízo irreparável”, enquanto pressuposto essencial de que depende a decisão de suspensão da execução com dispensa de prestação de garantia. 3.1 DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “… 1. Contra a ora Reclamante, foi instaurado, o processo de execução fiscal n.º 3204201501221981, que corre os seus termos no Serviço de Finanças V… 2, por dívidas relativas a IVA intracomunitário, respetivos juros compensatórios e impresso de liquidação referentes ao período de Outubro de 2011 a Janeiro de 2012, no montante de € 678.518,16 acrescidos de juros compensatórios, em que é executado o aqui Reclamante – PA apenso e fls 35 dos autos; 2. O aqui Reclamante foi citado para a execução fiscal referida em 1) em 15-04-2015, nela constando o valor da garantia para suspender a execução que seria no valor de € 887.401,88 – PA apenso e fls 35 dos autos; 3. Em 17-04-2015 o aqui Reclamante solicitou a suspensão da execução fiscal, requerendo a dispensa de prestação de garantia, - fls 12 do Pef apenso; 4. Em 26-01-2018 foi indeferido o pedido de isenção de prestação de garantia – fls 35 dos autos, que se transcreve na parte mais relevante; “(…) VII - DISPENSA DO PEDIDO DA PRESTAÇÃO DE GARANTIA Dito isto, passemos à análise dos requisitos para dispensa de prestação de garantia, relativamente ao operador económico FJSPC. Por sua vez, nos termos do n.° 1 do art. 74° da LGT e do artigo 342° do CC, o ónus da prova dos factos constitutivos de direitos recai sobre quem os invoque. De acordo com tais comandos jurídicos, a isenção da prestação de garantia pressupõe a causa de um prejuízo irreparável a manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da divida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado, competindo ao executado a alegação e a comprovação de tais pressupostos. Nesta matéria está a Administração, vinculada ao Oficio Circulado n° 60077 de 29.07.2010, no qual foi sancionado o seguinte entendimento: “Prejuízo irreparável - O carácter irreparável dos prejuízos deve traduzir-se numa situação de diminuição dos proveitos resultantes da actividade desenvolvida pelo executado. Este, em resultado dos encargos financeiros impostos pela prestação da garantia, deixa de poder fazer face aos compromissos económico-financeiros de que depende a manutenção e desenvolvimento da actividade económica por si levada a cabo, o que ocasiona um dano resultante do decréscimo ou interrupção dessa actividade. Manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis – Neste caso, a prestação de garantia gera a existência de uma situação de carência económica do executado, de tal modo que este deixa de ter à sua disposição os meios financeiros necessários á satisfação das necessidades básicas, ou seja, é posta em causa a própria subsistência do executado, quer este seja pessoa singular ou colectiva. A situação de insuficiência material de bens penhoráveis é indício revelador mais forte de uma possível falta de meios económicos, no entanto, a verificação da insuficiência destes bens, por si só, não determina necessariamente uma situação de manifesta falta de meios económicos, devendo ser possível estabelecer um nexo de causalidade adequada entre a situação de manifesta carência económica e a insuficiência de bens verificada.” O mesmo Ofício-Circulado esclareceu quando é que se considera ou não existir responsabilidade do executado pela situação de insuficiência/inexistência de bens. • Ora diz-nos o supra citado Ofício-Circulado que “... apenas se deve considerar verificado este pressuposto nos casos em que a insuficiência ou inexistência de património não possa resultar da atuação empresarial, ou seja, apenas quando a dissipação dos bens esteja na absoluta indisponibilidade da empresa ou da administração que a representava ou representa, como seja por exemplo, o caso de catástrofe natural ou humana imprevisível. Fora destes casos, existirá sempre uma responsabilidade da empresa pelo destino dado aos bens que fazem parte do património coletivo/empresarial, baseada na atuação gestionária dos seus administradores ou gerentes, pelo que, em tais situações, não se poderá considerar verificado este pressuposto de dispensa.”. Entendemos ainda que não se verifica o requisito de prejuízo irreparável pois tal “deve traduzir-se numa situação de diminuição dos proveitos resultantes da atividade desenvolvida pelo executado. Este, em resultado dos encargos financeiros impostos pela prestação da garantia, deixa de poder fazer face aos compromissos económico-financeiros de que depende a manutenção e desenvolvimento da atividade económica por si levada a cabo, o que ocasiona um dano resultante do decréscimo ou interrupção dessa atividade”. A este propósito veja-se ainda o Acórdão TCA – Norte, Proc. nº 0502/10.0BEVIS, de 29.03.2012: “A lei estabelece como pressuposto para a dispensa da prestação da garantia que esta cause à executada um prejuízo irreparável. Não releva para a lei o grau de dificuldade na obtenção da garantia desde que ela seja possível, nem que ela se mostre muito onerosa, ou excessivamente onerosa. Tem de causar um prejuízo irreparável, sem retorno ao status quo ante.” Por outro lado, de acordo com o Ofício Circulado supra citado, a falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, manifesta-se, conforme o ponto 1.2 do ofício, no caso em que a garantia gera a existência de uma situação de carência económica do executado, de tal modo que este deixe de ter à sua disposição os meios financeiros necessários á satisfação das necessidades básicas, ou seja, é posta em causa a própria subsistência do executado. Entendemos também que o facto de estarmos perante uma insuficiência de bens penhoráveis tal não acarreta só por si a dispensa de prestação de garantia porque, apesar da insuficiência material de bens penhoráveis ser revelador de uma possível falta de meios económicos, tem o executado que provar e demonstrar que existe um nexo de causalidade adequada entre a situação de manifesta carência económica e a insuficiência de bens verificada. “...Dever-se considerar provada a falta de culpa quando o executado demonstrar a existência de alguma causa de insuficiência ou inexistência de bens que não lhe seja imputável e não se fizer prova positiva da concorrência da sua atuação para a verificação daquele o resultado...” (Lopes de Sousa, in CPPT Anotado, III Vol., 6ª ed., p. 235) É que, conforme nos diz o Acórdão do TCA Sul, Proc. n° 0502/10.0BEVIS, de 29.03.2012, “Face ao disposto no art°342, do C. Civil, e no art°. 74, nº1, da L.G.Tributária, é de concluir que é sobre o executado, que pretende a dispensa de garantia, invocando explícita ou implicitamente o respetivo direito, que recai o ónus de provar que se verificam as condições de que tal dispensa depende, pois se tratam de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido. De resto, o texto do artº. 170, n°. 3, do C. P. P. Tributário, aponta no mesmo sentido, ao estabelecer que o pedido deve ser instruído com a prova documental necessária, o que pressupõe que toda a prova relativa a todos os factos que têm de estar comprovados para ser possível dispensar a prestação de garantia seja apresentada pelo executado, instruindo o seu pedido, pois a prova de todos esses elementos é necessária para o deferimento da sua pretensão.” • Ora, no caso em concreto, pela consulta dos documentos apresentados com o requerimento de dispensa de garantia, o operador económico não demonstra insuficiência de meios dado que, apesar da inexistência de bens penhoráveis, os rendimentos declarados nos últimos três anos em sede de IRS Categoria A apontam para uma média anual de cerca de €98.700,00, pagos pela empresa FJPC - DESPACHANTES OFICIAIS-SP, LDA, NIF 5…507, do qual o executado também é gerente. • Apresenta rendimentos da categoria B no montante € 6.000,00 anuais. • Verificou-se que tinha um seguro de capitalização de cerca de €27.200,00 e que era ainda possuidor de um PPR, cujo capital é de € 14.540,31. • Verificou-se em vários documentos disponíveis nesta Alfandega que o Operador económico FJPC - DESPACHANTES OFICIAIS-SP, LDA, tem um seguro-caução, que visa acautelar a caução global de desalfandegamento que teve o seu início em 2006-12-18, sendo que o montante da garantia é no valor de 6.223.000,00 €. > A caução de desalfandegamento simplifica o sistema de prestação de garantia e de pagamento dos direitos e demais imposições e reduz os prazos de entrega das mercadorias. > O sistema de caução global de desalfandegamento não se reconduz ao mandato sem representação, porque o despachante oficial, embora aja em nome próprio e por conta do importador, constitui-se solidariamente com este responsável pelo pagamento de todos os direitos e imposições devidos à alfândega. > Quando ocorre incumprimento do importador, tem a alfândega a garantia de recebimento os direitos do despachante oficial ou do segurador, situação em que estes terão direito de regresso contra o devedor dos direitos aduaneiros. > Logo, o montante da caução demonstra o volume de desalfandegamento e concludentemente as vezes em que o despachante oficial age em nome próprio e por conta de outrem, traduzindo o volume de operações e de clientes que se encontram a si vinculados. (...)” 5. Em 29-01-2018, através de carta registada com aviso de receção nº RH091726002PT, foi o Reclamante notificado do despacho referido em 4) – Pef apenso e fls 33 dos autos; 6. Dão-se por integralmente reproduzidos os Docº nº 7 a 11 juntos com a petição inicial – fls 59 e seguintes dos autos; 7. Corre termos no TAF de Almada o Processo de Impugnação nº 2353/15.7BEALM relativo a IVA de outubro de 2011 a janeiro de 2012 no montante de € 678.518,16 – fls 35 dos autos; 8. Em 08-02-2018 foi enviada pelo correio a presente Reclamação - fls 77 dos autos;”. Ao abrigo do disposto no art.662º do C. Proc. Civil, adita-se ao probatório o seguinte: 9. O ora Recorrido não dispõe de bens imóveis (fls. 236 do PAT apenso) 10. Em resposta ao pedido de prestação de Garantia Bancária (€ 887.401,88), com data de 21-05-2015, o NB, S.A. refere que “… após uma criteriosa análise com base em todos os elementos disponíveis e apresentados à data, o seu pedido foi indeferido” (fls. 238 do PAT apenso). 11. O ora recorrido, com referência ao extracto Nº 2015/04 emitido pela BBVA, apresenta um passivo (empréstimos) no valor de € 25.047,17) (fls. 244 do PAT apenso). 12. Em resposta ao pedido de prestação de Garantia Bancária (€ 700.000,00), com data de 21-05-2015, o NB, S.A. refere que “… após uma criteriosa análise com base em todos os elementos disponíveis e apresentados à data, o seu pedido foi indeferido” (fls. 331 do PAT apenso). 13. O ora Recorrido é um despachante oficial que emprega cerca de 30 funcionários - por acordo. 14. O ora Recorrido tem garantias prestadas no valor de cerca de € 270.000,00 em diversos processos de cobrança, entre outros, PCA 06/2013, PCA 40/2014, PCA 01-01/2017 - por acordo. Antes de mais, cumpre notar que, como se dá nota no despacho reclamado, a mesma emerge de uma decisão deste TCAN, onde se ponderou, além do mais, que: “… [a] A primeira questão que se coloca é a de saber se ao pedido de dispensa da garantia devida pela suspensão da execução fiscal instaurada para cobrança de IVA comunitário se aplica o artigo 244.º do Código Aduaneiro Comunitário (C.A.C.), aprovado pelo Regulamento (CEE) n.º 2913/92, do Conselho de 12 de outubro de 1992 [então ainda em vigor, face ao disposto no artigo 286.º, n.º 2, do Código Aduaneiro da União (C.A.U.), aprovado pelo Regulamento (EU) n.º 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 9 de outubro de 2013] a coberto do artigo 101.º da Reforma Aduaneira, na redação que lhe foi introduzida pelo artigo 66.º da Lei n.º 53-A/2006 de 29 de dezembro. Na sentença recorrida sancionou-se o entendimento de que o C.A.C. não é aplicável por não estar em causa um recurso próprio comunitário, como um direito aduaneiro ou um direito cobrado no âmbito da política agrícola comum. Valendo-se, notoriamente, do artigo 169.º, n.º 10, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que exclui do seu âmbito de aplicação as dívidas de recursos próprios comunitários. É seguro que o IVA não é um recurso próprio comunitário mas, como se refere na douta sentença recorrida (citando o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2006/09/20, proc. n.º 315/06) uma «imposição fiscal interna (…) harmonizada». Só que daí não resulta instantaneamente que às dívidas de IVA cobradas em execução fiscal deva ser aplicado o regime de suspensão da execução previsto na lei interna. Não será assim quando a própria legislação interna remeta para as disposições do C.A.C. É o que sucede no artigo 101.º da Reforma Aduaneira, que o Recorrente cita abundantemente. O que ali se dispõe é que quando forem devidos direitos de importação e outros impostos a cobrar pela alfândega em consequência do mesmo facto tributário se observa o disposto em regulamentação comunitária. Significa isto que, quando esteja em causa uma dívida proveniente de imposição fiscal interna cobrada pelas autoridades aduaneiras em consequência de facto tributário de que derivam, simultaneamente, direitos de importação, a impugnação da liquidação subjacente não suspende a execução dessa dívida, a não ser nos casos previstos na legislação comunitária, ou seja, naquele artigo 244.º. Como referem Nuno Aleixo, Pedro Rocha e Ricardo de Deus, «Código Aduaneiro Comunitário Anotado e Comentado», Rei dos Livros 2007, pág. 1034. «embora o artigo 101.º da Reforma Aduaneira não mencione, no âmbito de aplicabilidade do C.A.C., por via de referência à regulamentação comunitária, a matéria da tramitação e efeitos dos recursos, há que atender ao espírito tendencialmente enunciativo do mesmo, tendo em conta a expressão “designadamente” aí usada, para se concluir pela aplicabilidade do artigo 244.º do C.A.C. às situações em que as mercadorias estejam sujeitas a direitos de importação e a outros impostos a cobrar pelos serviços aduaneiros em consequência do mesmo facto tributário». Aqui chegados, importa referir que é possível afirmar que o facto tributário de que deriva a liquidação do IVA cobrado na execução fiscal de que a presente reclamação depende tenha originado também a liquidação de direitos de importação. Tal nunca foi alegado nem resulta minimamente dos factos provados e – acrescente-se, para que não restem dúvidas – também não resulta minimamente de algum documento junto aos autos. Sendo que não interessa para efeitos daquele artigo 101.º da Reforma Aduaneira questionar se esses direitos são devidos, mas apenas se eles foram efetivamente liquidados. Assim sendo, a aplicabilidade ao caso do artigo 244.º do C.A.C. não pode derivar daquele artigo 101.º. Mas há outras disposições que remetem para a legislação aduaneira. É o que sucede, com interesse para o caso, com o artigo 28.º, n.º 3, do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, segundo o qual «o pagamento do imposto devido pela importação de bens é efetuado junto dos serviços aduaneiros competentes, de acordo com as regras previstas na legislação comunitária aplicável aos direitos de importação, salvo nas situações em que, mediante a prestação de garantia, seja concedido o diferimento do pagamento». Embora o âmbito nuclear deste dispositivo seja o remeter para a regulamentação comunitária aplicável a direitos de importação a definição do regime do pagamento voluntário do IVA devido pela importação de bens, considera este tribunal que o legislador teve em vista a aplicação dessa regulamentação a todas as situações em que esse pagamento possa ser dispensado. E, por conseguinte, também àquelas em que possa ser dispensada a prestação de garantia a prestar com vista à suspensão da sua cobrança coerciva. Mal se compreenderia que o pagamento voluntário só pudesse ser dispensado nas situações previstas na legislação comunitária (com as especificidades resultantes das alíneas daquele n.º 3) e a cobrança coerciva pudesse ser sustada também noutras situações previstas na legislação interna. Não se compreenderia a existência de dois regimes distintos para arrecadar receita, só porque um é obtido voluntariamente e outro coercivamente. E, assim sendo, podemos concluir que ao pedido de dispensa da garantia devida pela suspensão da execução fiscal instaurada para cobrança de IVA nas importações se aplica o artigo 244.º do Código Aduaneiro Comunitário (C.A.C.), não por força do artigo 101.º da Reforma Aduaneira, mas por remissão daquele artigo 28.º, n.º 3. [b] Mas sendo esta a conclusão, coloca-se, então, a questão de saber se o IVA cobrado na execução fiscal de que a presente reclamação depende deriva da importação de mercadorias. A questão tem interesse porque o órgão de execução fiscal afirma e a sentença recorrida confirma que o processo de execução fiscal foi instaurado por dívida de IVA intracomunitário (cfr. ponto 2 da informação de fls. 3 e ponto 1 dos factos provados). Trata-se, porém, de uma afirmação que não é corroborada por nenhum elemento dos autos. Designadamente pelo conteúdo do procedimento de cobrança “a posteriori” de que consta cópia de fls. 37 a fls. 50 dos autos do qual resulta que a dívida respeita a IVA devido pela importação de mercadorias entradas em Portugal e com destino a Espanha. Com efeito, o que dali resulta é que as mercadorias beneficiaram de isenção de IVA na importação ao abrigo do artigo 16.º do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias, por ter sido aposto na casa 37 da declaração aduaneira o código de regime aduaneiro “42” (introdução no consumo com introdução em livre prática simultânea de mercadoria isenta de IVA para entrega noutro Estado-membro). Ou seja, as mercadorias não pagaram IVA na importação porque os bens eram destinados a outro Estado-membro e o IVA iria ser cobrado no Estado-membro do destino, a Espanha. Só que, quando se verifica “a posteriori” que o importador e o destinatário da mercadoria beneficiaram indevidamente do regime da isenção de IVA previsto no artigo 16.º citado, o imposto devido é o que seria devido na importação. Como se fosse destinado ao território nacional. E, neste sentido, não pode ser designado de IVA intracomunitário (designação que, de qualquer modo, não pode vincular o tribunal superior por envolver uma conclusão de direito). Por conseguinte, o IVA cobrado na execução fiscal de que a presente reclamação depende respeita à importação de mercadorias no momento em que deram entrada no território nacional e ali foram introduzidas em livre prática. E o regime de pagamento e cobrança desse imposto (ou da sua dispensa) é o que resulta da legislação comunitária, por força do citado artigo 28.º, n.º 3, do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado. Pelo que a suspensão da execução instaurada para cobrança coerciva da dívida correspondente só pode ocorrer nos casos previstos na legislação comunitária, no caso, o artigo 244.º do C.A.C. …”. Com este pano de fundo, deparamos com o despacho reclamado de 26-01-2018 com o seguinte teor: “Indefiro o pedido de prestação de garantia nos termos e fundamentos constantes na presente informação. Notifique-se o operador e seu mandatário. …”. Nesta sequência, o ora Recorrido apresentou Reclamação, sendo que o Tribunal a quo deu provimento à mesma, determinando a suspensão da execução com dispensa de garantia. Nas suas alegações, a Recorrente refere que face ao disposto nos artigos 28.º n.º 3 do CIVA e 52.º, n.º 4 da LGT, conclui-se que a suspensão da execução instaurada para cobrança coerciva da dívida correspondente ocorre nos casos previstos na legislação comunitária, no caso, o artigo 244.º do CAC, sendo que o referido preceito legal estipula que “A interposição de recurso não tem efeito suspensivo da execução da decisão contestada. Todavia, as autoridades aduaneiras suspenderão, total ou parcialmente, a execução dessa decisão sempre que tenham motivos fundamentados para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira ou que seja de recear um prejuízo irreparável para o interessado. (…)”, verificando-se que no que concerne à irreparabilidade dos prejuízos, tem sido entendimento unânime da nossa doutrina e jurisprudência que só devem ser considerados irreparáveis os prejuízos ou danos cuja extensão não possa ser avaliada pecuniariamente, sendo certo que esses prejuízos terão de ser directos e consequência da execução do acto que se reclama, e ainda que a dificuldade de reparação dos danos se deve avaliar segundo um juízo de probabilidade, sempre no estrito respeito pelos limites da invocação do interessado. Assim, apenas haverá lugar à dispensa da prestação de garantia quando esta possa causar ao executado prejuízos que impeçam o retorno ao status quo ante. Ora, da leitura do n.º 4 do art.º 52º da LGT resulta que, só em circunstâncias muito excepcionais é que a suspensão da execução é conseguida sem prestação de garantia, em virtude de o executado dela poder ser isento, ou seja, atentos os requisitos legais, bem se compreende que a prova de verificação dos pressupostos que permitam a dispensa de prestação de garantia se deva fazer, prima facie, com recurso à prova documental, por ser este tipo de prova aquele que melhor se coaduna com a demonstração imposta por lei e para além disso, o nº 3 do art.º 170º do CPPT refere expressamente que o pedido de dispensa de garantia deve ser instruído com a prova documental necessária para a apreciação da pretensão. Ora, in casu, pela consulta dos documentos n.ºs 7 a 11 da p.i. apresentados pelo ora reclamante, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, conclui-se que os mesmos não são susceptíveis (e, muito menos “sobejamente”) de demonstrar e provar o “prejuízo irreparável”, pressuposto essencial de que depende a decisão de suspensão da execução com dispensa de prestação de garantia, uma vez que, tais documentos - apresentados com suposta intenção de prova dos custos que importariam para o reclamante as comissões cobradas por diversas instituições bancárias - consistem em meros “prints” recolhidos dos sites dessas mesmas instituições bancárias, e, portanto, sem qualquer valor probatório para os presentes autos. Destarte, entende a Fazenda Pública que o acto reclamado, porque legal, deverá manter-se no ordenamento jurídico-tributário, de modo que, decidindo da forma como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO E DE FACTO. Que dizer? Pois bem, em termos essenciais, a decisão do Tribunal a quo deu acolhimento à pretensão do reclamante, considerando, além do mais que: “… Do que se extrai do despacho de indeferimento é que efetivamente o Reclamante (e até assumido pelo próprio em sede de petição inicial) não tem insuficiência de meios, no entanto a condição que se tem de analisar e preencher é o da existência de “prejuízo irreparável” e não a de insuficiência de meios. E para que esse requisito se verifique, como alega o Reclamante, apenas é necessário que seja previsível com um e com grau de probabilidade suficiente a existência do prejuízo irreparável. Ora se atendermos ao montante que é exigido em matéria de garantia, no valor de € 887.401,88, e aos rendimentos plasmados no despacho de indeferimento, consegue-se prever que tal irá redondar em prejuízo do Reclamante pois as comissões cobradas pelos bancos importam custos mensais muito elevados conforme sobejamente o Reclamante demonstrou através dos Docº nº 7 a 11 da p.i e que constam do probatório. Também se conclui que a caução global de desalfandegamento utilizada pelo despachante oficial, constitui uma garantia do pagamento dos direitos e demais imposições devidos pelas declarações apresentadas pelo despachante que permite tão só um processo de desalfandegamento mais célere e eficaz de modo a permitir o pagamento dos direitos e demais imposições e reduzir os prazos de entrega das mercadorias. No entanto, esta pertence à sociedade de despachantes em que se insere e cuja atividade e volume de desalfandegamentos é assegurado por mais 30 colaboradores, utilizando-a de acordo com a lei, estatutos societários e as deliberações da sociedade. Pelo exposto e sem necessidade de mais considerações ou análise de outras questões julga-se a reclamação procedente, suspendendo-se a execução com dispensa de prestação de garantia. …”. Ora, como já ficou dito, existe decisão anterior de acordo com a qual ficou estabelecido que ao pedido de dispensa da garantia devida pela suspensão da execução fiscal instaurada para cobrança de IVA nas importações se aplica o artigo 244.º do Código Aduaneiro Comunitário (C.A.C.), não por força do artigo 101.º da Reforma Aduaneira, mas por remissão do artigo 28.º, n.º 3 do CIVA. Quanto ao tal art. 244º do do Código Aduaneiro Comunitário (C.A.C.), o seu 2º parágrafo estabelece que “… as autoridades aduaneiras, suspenderão, total ou parcialmente, a execução dessa decisão sempre que tenham motivos fundamentados para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira ou seja de recear um prejuízo irreparável para o interessado”, referindo o 3º parágrafo da mesma norma que “Quando a decisão contestada der origem à aplicação de direitos de importação ou de direitos de exportação, a suspensão da execução dessa decisão fica sujeita à existência ou à constituição de uma garantia. Contudo, essa garantia pode não ser exigida quando possa suscitar, por força da situação do devedor, graves dificuldades de natureza económica ou social”. Neste ponto, cumpre precisar que o pedido apresentado pelo Recorrido com referência à suspensão da cobrança tinha um duplo fundamento, a saber, a existência de motivo fundamentado para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira e bem assim o receio manifesto de a execução da decisão causar prejuízo irreparável ao Recorrido. No mesmo articulado foi também formulado o pedido de dispensa de constituição de garantia por ser manifesta a carência de meios para garantir o valor de € 887.401,88. Ora, quando se analisa a pretensão formulada pelo ora Recorrido em confronto com o despacho reclamado, resulta evidente que já em momento anterior, como agora, o núcleo essencial da apreciação centrou-se na questão da dispensa de prestação de garantia, olvidando a realidade relacionada com o disposto no 2º parágrafo do art. 244º do CAC, matéria de que depende a posterior discussão sobre a matéria da prestação de garantia. Como quer que seja, e já voltaremos a este ponto, a decisão recorrida concedeu provimento à reclamação por considerar que existia uma situação de prejuízo irreparável, conceito que é apontado no despacho reclamado embora com associação imediata à questão da garantia, de modo que, vamos também nesta sede alinhar com o Tribunal a quo numa leitura bem generosa e abrangente do despacho reclamado. Aliás, em termos essenciais, a Recorrente discute que in casu, pela consulta dos documentos n.ºs 7 a 11 da p.i. apresentados pelo ora reclamante, se possa concluir que os mesmos são susceptíveis (e, muito menos “sobejamente”) de demonstrar e provar o “prejuízo irreparável”, pressuposto essencial de que depende a decisão de suspensão da execução com dispensa de prestação de garantia, uma vez que, tais documentos - apresentados com suposta intenção de prova dos custos que importariam para o reclamante as comissões cobradas por diversas instituições bancárias - consistem em meros “prints” recolhidos dos sites dessas mesmas instituições bancárias, e, portanto, sem qualquer valor probatório para os presentes autos. Neste domínio, e numa primeira leitura, o exposto pela Recorrente apresenta alguma pertinência, dado que, a análise do probatório não se revela propriamente exuberante, nomeadamente quando está em causa o preenchimento do conceito de prejuízo irreparável. Sobre este elemento, crê-se pertinente o contributo do Recorrido quando aporta a esta discussão o exposto no Acórdão do TJUE de 17-07-1997, proferido no processo C-130/95, do qual se retira que: “… 1. O artigo 244.°, segundo parágrafo, do Regulamento (CEE) n.° 2913/92 do Conselho, de 12 de Outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário, deve ser interpretado no sentido de que as autoridades aduaneiras suspendem, no todo ou em parte, a execução de uma decisão aduaneira contestada quando apenas uma das duas condições mencionadas nessa disposição estiver preenchida, devendo ser concedida a suspensão sempre que for de temer um dano irreparável para o interessado, sem que, no entanto, tenham de existir razões para duvidar da conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira. 2) O facto de o interessado poder sofrer um prejuízo irreparável no caso de execução imediata de uma decisão aduaneira contestada não impede, de modo algum, as autoridades aduaneiras de subordinar a suspensão da execução dessa decisão à constituição de uma garantia. Todavia, se a exigência de constituir uma garantia for susceptível, devido à situação do devedor, de suscitar graves dificuldades de ordem económica ou social, as autoridades aduaneiras dispõem da faculdade de não exigir a constituição dessa garantia. 3) O facto de subordinar a suspensão da execução de uma decisão aduaneira contestada à constituição de uma garantia pode suscitar graves dificuldades de natureza económica ou social a um devedor que não disponha de meios suficientes que lhe permitam constituir essa garantia. 4) No caso em que a suspensão da execução de uma decisão aduaneira contestada está sujeita, nos termos do artigo 244.°, terceiro parágrafo, do Regulamento n.° 2913/92, à constituição de uma garantia, o montante dessa garantia deve ser fixado no montante exacto da dívida ou, se esse montante não puder ser fixado de forma precisa, no montante mais elevado da dívida constituída ou susceptível de se constituir, excepto se a exigência de constituição de uma garantia for susceptível de causar ao devedor graves dificuldades de natureza económica ou social; se tal for o caso, o montante da garantia pode ser fixado, tendo em conta a situação financeira do devedor, num montante inferior ao montante total da dívida em causa. …”. Mais se refere no aresto ora apontado que: “… 36 A este respeito, segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a condição de «prejuízo irreparável» exige do juiz encarregado dos processos de medidas provisórias que examine se a eventual anulação da decisão litigiosa pelo juiz competente quanto ao mérito permitiria a inversão da situação que teria sido provocada pela sua execução imediata e, inversamente, se a suspensão da execução dessa decisão seria de natureza a impedir o seu pleno efeito, no caso de ser negado provimento ao recurso no processo principal (v., neste sentido, despacho Comissão/ /Atlantic Container Line e o., já referido, n.° 50). 37 O Tribunal de Justiça decidiu que um prejuízo de carácter financeiro só é, em princípio, considerado grave e irreparável se não for susceptível de ser inteiramente ressarcido caso a demandante obtenha ganho de causa no processo principal (v. despacho do Tribunal de Justiça de 26 de Setembro de 1988, Cargill e o./Comissão, 229/88 R, Colect., p. 5183, n.° 17). 38 Todavia, se a execução imediata de um acto contestado for susceptível de ocasionar a dissolução de uma sociedade ou impor a um particular a venda do seu apartamento, a condição relativa à existência de um prejuízo irreparável deve, nessas condições, considerar-se preenchida (v. despachos do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Junho de 1994, Société commerciale des potasses et de l'azote e Entreprise minière et chimique/Comissão, T-88/94 R, Colect., p. II-401, n.° 33; de 7 de Novembro de 1995, Eridania e o./Conselho, T-168/95R, Colect., p. II-2817, n.° 42; e despacho do Tribunal de Justiça de 3 de Julho de 1984, De Compte/ /Parlamento, 141/84 R, Colect., p. 2575, n.° 5). 39 A este respeito, não é necessário que a iminência do prejuízo alegado seja provada com certeza absoluta. E suficiente, especialmente quando a realização do prejuízo depende da ocorrência de um conjunto de factores, que seja previsível com um grau de probabilidade suficiente (v., neste sentido, despacho Comissão/Atlantic Container Line e o., já referido, n.° 38). 40 Por último, há que observar que, se, apesar da concessão da suspensão da execução nos termos do artigo 244.°, segundo parágrafo, do código, o prejuízo irreparável que justificou a concessão da suspensão se verificar por outras razões, as autoridades aduaneiras podem revogá-la nos termos do artigo 9.°, n.° 1, do código. 41 No caso em apreço, resulta do processo principal que o pretenso prejuízo que o demandante sofreria em caso de execução imediata da decisão contestada é a manutenção da sua situação de desempregado. Todavia, não resulta dos autos que, se obtiver ganho de causa no processo principal e mesmo que a entidade patronal o readmita, teria o direito de obter das autoridades aduaneiras o montante do seu salário perdido. Por outro lado, não se pode excluir que o demandante possa sofrer, no caso de execução imediata da decisão contestada, outros prejuízos eventualmente irreparáveis, tais como os que resultam de um processo que tem por objecto a penhora do seu património c a atribuição deste último aos seus credores. 42 Assim, compete ao órgão jurisdicional nacional apreciar, tendo cm conta todas as circunstâncias relevantes no caso em apreço no processo principal, se o demandante pode sofrer um dano irreparável, no sentido referido, caso a decisão contestada seja executada. 43 À luz do conjunto das considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 244.°, segundo parágrafo, do código deve ser interpretado no sentido de que as autoridades aduaneiras suspendem, no todo ou em parte, a execução de uma decisão aduaneira contestada quando apenas uma das duas condições mencionadas nessa disposição estiver preenchida, devendo ser concedida a suspensão sempre que for de temer um dano irreparável para o interessado, sem que, no entanto, tenham de existir razões para duvidar da conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira. …”. Com este contributo interpretativo, cremos que apesar de a Recorrente ser assertiva na crítica que dirige a um segmento da decisão recorrida pela seu carácter algo simplista e conclusivo, não pode deixar de notar-se que o processo contempla outros elementos que permitem sustentar a decisão, embora com outra fundamentação, sem olvidar que a decisão recorrida ponderou que “Também se conclui que a caução global de desalfandegamento utilizada pelo despachante oficial, constitui uma garantia do pagamento dos direitos e demais imposições devidos pelas declarações apresentadas pelo despachante que permite tão só um processo de desalfandegamento mais célere e eficaz de modo a permitir o pagamento dos direitos e demais imposições e reduzir os prazos de entrega das mercadorias. No entanto, esta pertence à sociedade de despachantes em que se insere e cuja actividade e volume de desalfandegamentos é assegurado por mais 30 colaboradores, utilizando-a de acordo com a lei, estatutos societários e as deliberações da sociedade.”, matéria que a Recorrente não coloca em crise, nem de facto, nem de direito. Considerando então os elementos que brotam dos autos, importa ter presente que em função do enquadramento da actividade do Recorrido, o desenvolvimento normal dos processos em causa (é sabido que existem outros processos de cobrança e que o Recorrido tem responsabilidades assumidas perante o BBVA), o que se traduziria na penhora dos bens do Recorrido, nomeadamente os apontados na decisão reclamada, os quais revelam uma capacidade apenas mínima para dar resposta ao volume dos valores em dívida, seguindo-se apenas a situação relacionada com a actividade profissional do Recorrido que, face aos termos em que se desenrola, como facilmente se intui, seria susceptível de afectar a mesma de forma relevante, podendo mesmo originar “uma bola de neve” capaz de conduzir ao encerramento da actividade. Na verdade, tendo presente a forma de desenvolvimento da actividade, uma situação como a presente tem a susceptibilidade de colocar em crise o funcionamento da tesouraria, o que se reflecte no processamento normal do negócio, dado que, diminui a capacidade de resposta às solicitações dos clientes, o que vai ter custos em termos do seu número e assim sucessivamente, podendo mesmo desembocar no encerramento da actividade. Neste contexto, e com esta fundamentação, é manifesto que tem de manter-se a decisão recorrida quando fala em prejuízo irreparável, o que cria condições para se avançar para a próxima questão relacionada então com a dispensa de prestação de garantia. Neste âmbito, como está bom de ver, o despacho reclamado olvidou o disposto no art. 244º do CAC, deslocando a sua atenção para a apreciação de tal pedido em função do exposto na legislação nacional. Deste modo, quando o 3º parágrafo do art. 244º do CAC refere que essa garantia pode não ser exigida quando possa suscitar, por força da situação do devedor, graves dificuldades de natureza económica ou social estamos a falar de uma realidade que não se confunde com a existência de prejuízo irreparável, dado que deparamos com a alusão a graves dificuldades de natureza económica ou social, ou seja, o despacho reclamado passou ao lado da lei aplicável nesta sede, o que, só por si, tem de conduzir à sua anulação. Aliás, como já foi assinalado, em termos essenciais, a Recorrente discute que in casu, pela consulta dos documentos n.ºs 7 a 11 da p.i. apresentados pelo ora reclamante, se possa concluir que os mesmos são susceptíveis (e, muito menos “sobejamente”) de demonstrar e provar o “prejuízo irreparável”, pressuposto essencial de que depende a decisão de suspensão da execução com dispensa de prestação de garantia, uma vez que, tais documentos - apresentados com suposta intenção de prova dos custos que importariam para o reclamante as comissões cobradas por diversas instituições bancárias - consistem em meros “prints” recolhidos dos sites dessas mesmas instituições bancárias, e, portanto, sem qualquer valor probatório para os presentes autos. Assim sendo, a alegação da Recorrente mostra-se deslocada, dado que, o conceito posto em crise não tem aplicação nesta sede, impondo-se a sua discussão em momento anterior, o que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne ao presente recurso. Em todo o caso, sempre se dirá que, face ao que ficou dito, é manifesto que a situação descrita é susceptível de afectar a actividade do Recorrido e naturalmente de quem com ele trabalha, o que significa que está verificada a hipótese prevista no 3º parágrafo do art. 244º do CAC. Mas mais. É sabido que o pedido apresentado pelo Recorrido com referência à suspensão da cobrança tinha um duplo fundamento, a saber, a existência de motivo fundamentado para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira e bem assim o receio manifesto de a execução da decisão causar prejuízo irreparável ao Recorrido. Lendo e relendo a decisão reclamada, a mesma nada diz sobre a existência de motivo fundamentado para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira. Deste modo, sendo o fundamento agora descrito capaz de, só por si, desencadear a aplicação do disposto no art. 244º do CAC, sempre seria de anular o despacho reclamado, porquanto, impunha-se a apreciação da realidade suscitada pelo ora Recorrido, na medida em que a mesma, em abstracto, tinha a virtualidade de conferir total viabilidade à sua pretensão. Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências. Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional. Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida, com a presente fundamentação. Custas pela Recorrente. Notifique-se. D.N.. Porto, 20 de Setembro de 2018 Ass. Pedro Vergueiro Ass. Ana Patrocínio Ass. Ana Paula Santos |