Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01009/07.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/16/2025
Tribunal:TAF do Porto
Relator:ISABEL CRISTINA RAMALHO DOS SANTOS
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA; JUSTO IMPEDIMENTO;
CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS ADVOGADOS E SOLICITADORES;
REGULAMENTO DA CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS ADVOGADOS E SOLICITADORES;
Sumário:
I- O justo impedimento apenas se verifica quando a pessoa que devia praticar o ato seja colocada na impossibilidade absoluta de o fazer de forma atempada, em virtude da ocorrência de evento independente da sua vontade, e que um cuidado e diligências normais não podiam fazer prever;

II- A parte que invoca o justo impedimento que deve alegar e provar a existência de uma situação passível de integrar aquele conceito, para que o tribunal ou a autoridade administrativa lhe possam facultar, com essa justificação, a prática de um ato fora de prazo.

III- Não existe qualquer violação do princípio da justiça, pois o recorrente poderia ter exercido o seu direito dentro do prazo estipulado para o efeito, sendo que a invocação do instituto de justo impedimento, não serve para colmatar o eventual esquecimento da sua obrigação ou inércia.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO

«AA» veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 18 de junho de 2016 que julgou improcedente a ação administrativa especial deduzida pelo Recorrente pedindo que seja anulada a deliberação da Direção da CPAS, de 23/01/2007, constante da Ata n.º ..3/2007, que indeferiu o pedido do Recorrente de transferência para o 5.º escalão contributivo a partir de 2007 e que, em consequência, lhe seja reconhecido o direito a transitar, como beneficiário ordinário, para o 5.º escalão contributivo, com efeitos retroativos desde 01/01/2007.

Nas suas alegações, o Recorrente concluiu nos seguintes termos:

CONCLUSÕES
A. O Tribunal a quo decidiu não estar "verificado o vício de violação de lei por ilegal desconsideração da existência de uma situação de justo impedimento".
B. Tal constitui um erro de julgamento uma vez que os factos trazidos ao pleito, demonstram, sem margem para dúvida, que o Recorrente se encontrou numa situação passível de ser enquadrada no instituto do justo impedimento, uma vez que o Recorrente:
(i) Foi submetido a uma dolorosa cirurgia;
(ii) Esteve acamado durante um longo período de tempo;
(iii) Sofreu de fortes dores e de um grande mal-estar (físico e psicológico);
(iv) Só teve alta médica passado mais de dois meses da primeira cirurgia;
(v) Ainda assim, logrou remeter resposta à CPAS antes de lhe ter sido dada alta médica, momento em que a sua saúde ainda se encontrava muito debilitada;
(vi) Remeteu resposta à CPAS no primeiro dia em que recebeu visitas e no qual teve acesso à documentação enviada para o seu domicílio profissional.
C. Factos que, como se vê, não podem ser imputados ao Recorrente, sendo que, segundo LEBRE DE FREITAS, "basta, para que estejamos perante o justo impedimento, que o facto obstaculizador da prática do ato não seja imputável à parte ou ao mandatário, por ter tido culpa na sua produção".
D. De facto, a decisão do tribunal a quo continua a fazer referência a uma situação de "total e absoluto" impedimento, o que já não encontra correspondência com a redação legislativa em vigor e que, por isso, espelha uma rigidez desumanizante e uma natureza obsoleta, algo a o legislador pôs fim com a Reforma de 1995/96 do Código de Processo Civil.
E. Acresce que, no caso em apreço, falamos de um (simples) procedimento administrativo, e não de um processo judicial, que apenas afeta o Recorrente, não se verificando qualquer tipo de consequências negativas nem para a CPAS nem para terceiros,

F. E, por isso mesmo, não é sensato, razoável ou equilibrado, impedir o Recorrente de exercer a sua opção de escalão contributivo para o ano de 2007.
G. Como se vê, não considerar esta situação como enquadrável na figura do justo impedimento, será negar, pura e simplesmente, o mais basilar princípio constitucional — o princípio da justiça —, uma vez que se está a negar ao Recorrente o direito de exercer um direito que é seu.
H. Não reconhecendo a existência de uma situação de justo impedimento, exigindo a demonstração de requisitos adicionais — para lá do que é a teologia e a letra do preceito, bem como da jurisprudência que, sobre ele, se tem formado a Sentença recorrida viola flagrantemente o disposto no artigo 140º do CPC.
I. Adicionalmente, ao decidir não retirar consequências invalidantes da violação do princípio da participação dos particulares (nas decisões que lhe dizem respeito) e da garantia material do direito à audiência prévia pelo ato impugnado, a decisão recorrida viola os ditos princípio e direito.
J. De facto, não foi dada a oportunidade de o Recorrente se pronunciar quanto à decisão de atribuição do respetivo escalão contributivo, uma vez que a CPAS desconsiderou a existência de justo impedimento, e
K. Tampouco foi concedido ao Recorrente um prazo para que pudesse exercer o direito de audiência prévia.
L. A decisão recorrida de não extrair consequências invalidantes dos vícios decorrentes da violação do princípio da participação e do direito de audiência prévia decorrem de um pressuposto anteriormente decidido (e com o qual, respeitosamente, discordamos o Tribunal a quo): a desconsideração de uma situação de justo impedimento.
M. Pelo que, verificando-se a existência de uma situação de justo impedimento, cai por terra o pressuposto que permitiria sustentar a não extração de consequências invalidantes destes vícios de lei, por aplicação do princípio do aproveitamento dos atos administrativos.

Termos em que, impetrando o douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser a Sentença recorrida revogada e substituída por decisão que declare nula ou anule a deliberação da Direção da CPAS, de 23 de janeiro de 2007, que indeferiu o pedido do Autor de transferência para o 5.º escalão contributivo, a partir de 2007.

*
Nas suas contra-alegações, a Recorrida concluiu nos seguintes termos:

CONCLUSÕES

1.ª A sentença recorrida, não merecendo qualquer censura, deve ser confirmada pelo Tribunal Central Administrativo Norte e, em consequência, a deliberação da Direcção da CPAS, constante da Acta nº ..3/2007, tomada na sessão de 23 de Janeiro de 2007, e impugnada na presente acção, deve ser mantida por não enfermar de qualquer vício.

2.ª Pois, como muito bem foi decidido na sentença recorrida, no caso “sub judice”, o A. não logrou provar que durante todo o tempo dos meses de Outubro e Novembro de 2006 esteve absolutamente impedido de comunicar à CPAS a sua opção de mudar para o 5.º escalão de remunerações convencional, previsto no art.º 72.º, n.º 2 do RCPAS, em vigor em 2006.

3.ª Com efeito, o único facto dado como provado pela sentença recorrida (ponto 10 dos factos provados), que podia sustentar o alegado “justo impedimento” é insuficiente para esse fim.

4.ª Por outro lado, os factos constantes da alínea B) das Conclusões das Alegações de recurso apresentado pelo A., ora Recorrente, não foram dados como provados,

5.ª E, por isso, não podem fundamentar a pretensão do Autor, ora Recorrente, de ver a sentença recorrida revogada e substituída por outra que julgue verificada a situação do justo impedimento.

6.ª Mas além dos factos invocados na sentença recorrida, para julgar como não provado o alegado “justo impedimento”, outros fundamentos existem para se concluir de igual forma.

7.ª Desde logo porque a CPAS não está obrigada, nos termos legais, a remeter aos beneficiários qualquer ofício para que aqueles declarem a sua opção em termos de escalão contributivo para o ano seguinte.

8.ª Pois, nos termos do artigo 72.º, n.º 2 do RCPAS, não é a CPAS que está obrigada a solicitar aos beneficiários a escolha do seu escalão contributivo,

9.ª Mas, antes, são os beneficiários que estão obrigados, nos termos do artigo 72.º, n.º 2 do RCPAS, a comunicar à CPAS a escolha do escalão contributivo para o ano seguinte.

10.ª Razões pelas quais os factos invocados pelo Autor, para justificar a extemporânea declaração de alteração de escalão, não podem consubstanciar uma situação de “justo impedimento”.

11.ª Não obstante a CPAS ter entendido que não tinha de conceder ao A. o direito à audiência prévia, previsto no art.º 100.º do CPA, pelo facto de, no seu entender, não ter havido procedimento administrativo, não teve tal entendimento acolhimento na sentença recorrida.

12.ª Todavia, o facto de a sentença recorrida não ter acolhido o entendimento da CPAS, nesta matéria, não teve qualquer efeito prático na medida em que, de acordo com o princípio do aproveitamento dos actos administrativos, a decisão da CPAS teria de ser mesma que foi tomada.

13.ª Pois a decisão da CPAS foi proferida no exercício de poderes vinculados, uma vez que a fixação do escalão contributivo, por parte da CPAS, nos termos regulamentares (art.º 72.º, n.º 2 e 3 do RCPAS), em caso de omissão de comunicação por parte dos beneficiários, é de aplicação automática.

14.ª E, por outro lado, porque de acordo com os juízo de prognose póstuma, se concluiu, com total segurança, que a decisão tomada era a única que poderia ser proferida.

15.ª E, por isso, a sentença recorrida não merece qualquer censura, devendo ser confirmada.

16.ª Assim, deve a deliberação da CPAS, tomada na sessão de 23 de Janeiro de 2007 (constante da Acta n.º 30/2007), ser mantida por não enfermar de qualquer vício.



Nestes termos e nos mais de direito deve:
a) o recurso ser julgado improcedente, por não provado e a sentença recorrida ser confirmada por não enfermar de qualquer vício;
b) ser a presente acção administrativa julgada totalmente improcedente, por não provada, com as pertinentes consequências legais, com o que se fará a acostumada

JUSTIÇA !

*
Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público (Fls 418 do sitaf).

*
Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. artigo 657.º n.º 4 do Código de Processo Civil, submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.


II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões (vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT) são as de saber se a sentença recorrida incorreu erro de julgamento da matéria de facto, quanto à apreciação e valoração da factualidade e erro de julgamento de direito;


III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

III – MATÉRIA DE FACTO
III.1 – Factos Provados
Com interesse para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos:
1) O A. encontra-se inscrito na Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS), ora R., desde Fevereiro de 1979, com o número de beneficiário 6562 (cfr. doc. de fls. 4 do processo administrativo apenso).

2) O A. tem domicílio profissional na Rua ..., Edifício ..., ... ..., e domicílio particular na Rua ...., ... ... (cfr. docs. de fls. 9 a 12 do suporte físico do processo e doc. de fls. 177 do processo administrativo apenso).


3) A R. enviou para o domicílio profissional do A. um formulário, com data de 14/10/2006, do qual consta o seguinte:
Vimos lembrar a V.Ex.ª que, nos termos do artigo 72.º, n.º 2 e n.º 4 do RCPAS, os beneficiários devem declarar à sua Caixa de Reforma Privativa, nos meses de Outubro e Novembro de 2006, qual o escalão de remuneração convencional, indexado à remuneração mínima mensal mais elevada garantida por lei, que pretendem escolher para base de incidência das suas contribuições a pagar no próximo ano de 2007, para formação da sua pensão.
Quer seja para se manter no mesmo escalão, quer seja para baixar de escalão, quer seja para subir de escalão, dentro dos limites regulamentares do artigo 72.º do RCPAS, (…) por favor declare sempre qual é a sua opção para o ano 2007, até 30 de Novembro de 2006.
Para maior comodidade de V.ª Ex.ª remetemos-lhe o presente modelo de declaração, com a grelha de opções dos vários escalões contributivos ao seu dispor, dentro dos limites do citado artigo 72.º, que V.ª Ex.ª poderá utilizar para comunicar a sua opção para o ano 2007.
(…)
Face ao disposto no artigo 72.º, a partir do dia 30 de Novembro de 2006, porque expirado o prazo regulamentar para o efeito, qualquer declaração de alteração do escalão para o ano de 2007 já não poderá ser aceite, nem produzirá qualquer efeito útil, sendo, portanto, indeferido qualquer pedido de alteração a partir daquela data ou qualquer posterior reclamação sobre o escalão contributivo fixado
(cfr. doc. de fls. 187 e 188 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

4) No dia 13/12/2006 o A. enviou à R. um requerimento, por esta recebido no dia 20/12/2006, com o seguinte teor:
Dado que só agora tive conhecimento do V. ofício de que junto cópia por mim subscrita, o que ficou a dever-se à minha ausência do escritório desde 9 de Outubro, por força de dois internamentos no Hospital ... em ..., ocorridos nos dias 10 e 11 de Outubro e 17 a 20 do mesmo mês, local onde fui submetido a intervenção cirúrgica, da qual até hoje, ininterrupta e continuadamente, me tenho vindo a restabelecer em ... – ..., local da minha convalescença, venho pela presente solicitar-lhes o especial favor de me deferirem a opção de desconto pelo 5.º escalão para o ano de 2007
(cfr. doc. de fls. 186 do processo administrativo apenso).

5) O A. instruiu o requerimento mencionado supra com o formulário referido no ponto 3), preenchido e assinado, no qual declarou optar pelo 5.º escalão contributivo para cálculo do valor das contribuições a pagar no ano de 2007, bem como com declarações de internamento emitidas pela [SCom01...], S.A. e relatório de alta médica (cfr. docs. de fls. 187 a 191 do processo administrativo apenso).

6) Em resposta ao requerimento indicado no ponto 4), a R. enviou ao A. um ofício, com data de 04/01/2007, do seguinte teor:
Acusamos recebido o prezado favor e gentileza da escolha de escalão de V. Ex.ª a vigorar para o ano de 2007, rececionada na Caixa em 20 de Dezembro de 2006, relativamente à qual cabe informar:
1. Nos termos do artigo 72.º n.º 2 do Regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (RCPAS), os Senhores Beneficiários devem declarar à Caixa, nos meses de Outubro e Novembro de cada ano, o escalão de remuneração convencional, por eles escolhido, para base de incidência das suas contribuições no ano seguinte.
2. Sendo que, como decorre expressamente do artigo 72.º n.º 4 do RCPAS, qualquer alteração do escalão de remuneração convencional anteriormente escolhido, só nessa declaração pode ser feita.
3. Pelo que a possibilidade de alteração do escalão contributivo para um dado ano esgota-se e preclude-se com o decurso do mês de Novembro do ano anterior.
4. Porque extemporânea a comunicação do escalão, V.ª Ex.ª foi colocada/o no 3.º escalão, tal como previsto no artigo 72.º n.º 3 alínea d) do RCPAS, para pagamento das suas contribuições no ano de 2007, não havendo qualquer mecanismo regulamentar que nos permita alterá-lo
(cfr. doc. de fls. 193 e 194 do processo administrativo apenso).

7) No dia 18/01/2007 o A. enviou à R. novo requerimento, por esta recebido no dia 19/01/2007, com o seguinte teor:
Pela presente e para efeitos contenciosos, o signatário, portador do BI n.º ...86 de 14-09-2005 do A. I. de Lisboa, advogado, portador da Cédula Profissional n.º ...29, vem requerer lhe seja notificado qual o autor do ato de indeferimento que lhe foi notificado em 09.01.2007, através do Ofício de que adiante junta cópia
(cfr. doc. de fls. 195 do processo administrativo apenso).

8) Em sessão de 23/01/2007 foi proferida deliberação pela Direção da R., constante da Ata n.º ..3/2007, nos seguintes termos:
Dr. «AA»
Assunto: Escalão para 2007
1. O Beneficiário em epígrafe veio, por carta rececionada a 20 de Dezembro de 2006, pretender fazer a sua opção pelo 5.º escalão para vigorar no ano de 2007.
2. Como fundamento para a sua pretensão alegou que havia estado internado nos dias 10 e 11 e 17 a 20 de Outubro para ser submetido a intervenção cirúrgica, tendo estado em convalescença no local da sua residência em ....

3. Por ofício da CPAS de 4 de Janeiro de 2007, o Beneficiário foi informado que para o ano de 2007 iria ser colocado no 3.º escalão em virtude de não ter feito a sua opção de escalão nos meses de Outubro e Novembro de 2006.
4. Em resposta a este ofício, o Beneficiário veio reclamar do mesmo.
5. Nos termos do artigo 72.º n.º 2 do RCPAS, os beneficiários devem declarar à Caixa, nos meses de Outubro e Novembro de cada ano, o escalão de remuneração convencional por eles escolhido para base de incidência das suas contribuições no ano seguinte.
(…)
10. Assim, a possibilidade de alteração do escalão contributivo para um dado ano esgota-se e preclude-se com o decurso do mês de Novembro do ano anterior.
(…)
12. Para comodidade dos beneficiários, a Caixa, embora não esteja a isso obrigada, remeteu uma circular em 11 de Outubro de 2006, com modelo de requerimento e grelha das opções de escalão.
13. Solicitando aos beneficiários o favor de, impreterivelmente, até 30 de Novembro de 2006, fazerem a sua escolha do escalão de remuneração convencional para base de incidência das suas contribuições para o ano seguinte.
14. A comunicação podia, até, ser feita por via fax.
15. O Beneficiário não logrou demonstrar que nos meses de Outubro e Novembro de 2006 esteve impossibilitado, total e absolutamente, de fazer a sua opção de escalão para vigorar em 2007.
16. E, não é pelo facto do excelentíssimo Beneficiário não ter recebido a referida circular, que estava dispensado de declarar à Caixa, até 30 de Novembro de 2006, qual a sua escolha de escalão para o ano de 2007.
17. Ao abrigo, nos termos e para os efeitos do artigo 72.º n.º 2, do RCPAS, não é a Caixa que está obrigada a solicitar aos beneficiários a escolha do seu escalão contributivo, pelo contrário, é sobre os beneficiários que recai a obrigação de o declarar.
18. Pelas razões de facto e de direito atrás aduzidas, porque extemporânea a comunicação da escolha de escalão, não pode a mesma ser aceite nem considerada, termos em que se indefere o pedido, e
19. Ao abrigo, nos termos e para os efeitos do artigo 72.º n.º 3, alínea d) do RCPAS tem-se por fixado o escalão contributivo do Exm.º Beneficiário em epígrafe no 3.º escalão para o ano de 2007
(cfr. doc. de fls. 200 a 202 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

9) O A. tomou conhecimento da deliberação referida no ponto anterior através do ofício da R. de 24/01/2007 (cfr. doc. de fls. 199 do processo administrativo apenso).

Mais se provou que:

10) O A. esteve internado na [SCom01...], S.A., no serviço de cirurgia, desde 10/10/2006 a 11/10/2006 e desde 17/10/2006 a 20/10/2006, tendo-lhe sido dada alta médica em 26/12/2006 (cfr. docs. de fls. 15 a 17 do suporte físico do processo).

III.2– Factos não provados
Não há factos que cumpra julgar não provados com interesse para a decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito.
III.3 – Fundamentação da matéria de facto
Os factos que foram considerados provados resultaram da análise das informações e do conjunto dos documentos supra identificados, nos termos expressamente referidos no final de cada facto.


IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

No caso em apreço, o Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a ação administrativa especial deduzida pela Recorrente onde pediu que fosse anulada a deliberação da Direção da CPAS, de 23/01/2007, constante da Ata n.º ..3/2007, que indeferiu o pedido do Recorrente de transferência para o 5.º escalão contributivo a partir de 2007 e que, em consequência, lhe seja reconhecido o direito a transitar, como beneficiário ordinário, para o 5.º escalão contributivo, com efeitos retroativos desde 01/01/2007.

Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando as alegações de recurso cumpre ao Tribunal aferir se o tribunal a quo incorreu em
- Erro de julgamento de facto por errada apreciação e valoração da prova.
- Erro de julgamento de direito;

Vejamos então.

Vejamos se existiu erro de julgamento de facto na apreciação e valoração da prova produzida.
Alega o recorrente que:
B. Tal constitui um erro de julgamento uma vez que os factos trazidos ao pleito, demonstram, sem margem para dúvida, que o Recorrente se encontrou numa situação passível de ser enquadrada no instituto do justo impedimento, uma vez que o Recorrente:
(i) Foi submetido a uma dolorosa cirurgia;
(ii) Esteve acamado durante um longo período de tempo;
(iii) Sofreu de fortes dores e de um grande mal-estar (físico e psicológico);
(iv) Só teve alta médica passado mais de dois meses da primeira cirurgia;
(v) Ainda assim, logrou remeter resposta à CPAS antes de lhe ter sido dada alta médica, momento em que a sua saúde ainda se encontrava muito debilitada;
(vi) Remeteu resposta à CPAS no primeiro dia em que recebeu visitas e no qual teve acesso à documentação enviada para o seu domicílio profissional.


O artigo 607.º, n.º 5 do CPC, ao consagrar o princípio da livre apreciação da prova estabelece como princípio orientador de que o julgador não se encontra sujeito às regras rígidas da prova.
No entanto, a atividade de valoração da prova não é arbitrária, estando vinculada à busca da verdade e limitada pelas regras da experiência comum e pelas restrições legais.
Com efeito, o princípio da livre apreciação da prova concede ao julgador uma margem de discricionariedade na formação do seu juízo de valoração da prova produzida que deverá encontrar justificação na fundamentação lógica e racional, na sentença permitindo seu escrutínio quer pelas partes quer pelo tribunal de recurso.
Segundo este princípio, e por força do n.º 5 do artigo 607.º, do CPC o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas.
Por força do referido princípio, as provas são apreciadas livremente, de acordo com a convicção que geram no julgador acerca da existência de cada facto, ficando afastadas as situações de prova legal que se verifiquem, por força do disposto nos artigos 350.º, nº 1, 358.º, 371.º e 376.º, todos do Código Civil, nomeadamente, da prova por confissão, por documentos autênticos, por certos documentos particulares quanto à materialidade das suas declarações e por presunções legais.
O erro deve ser demonstrado pelo Recorrente, delimitando o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera incorrer em erro e fundamentar as razões da sua discordância, especificando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes do processo que, no seu entender, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da adotada pela decisão recorrida.
No entanto, diga-se desde, já que ao contrário do que o Recorrente alega na conclusão B das suas Alegações, o único facto provado, relativamente à questão do seu estado de saúde, que pudesse fundamentar um eventual “justo impedimento”, foi que «o A. esteve internado na [SCom01...], SA, no serviço de cirurgia, desde 10/10/2006 a 11/10/2006 e desde 17/10/2006 a 20/10/2006, tendo-lhe sido dada alta médica em 26/12/2006.» - veja-se ponto 10) do probatório.
Pelo que a conclusão B) do recurso não se mostra vertida no probatório, nem o recorrente indica a prova que o demonstre.

Assim, não tendo demonstrado qual o erro de julgamento de facto e da sua alegação não se vislumbra qualquer erro de apreciação e valoração que o Recorrente entende que foi feita, improcede nesta parte o recurso.

Do erro de julgamento de direito.
Insurge-se o Recorrente contra a decisão do Tribunal a quo, alegando em síntese que, ao não decidir pela situação de justo impedimento, para além de já não encontrar correspondência com a legislação em vigor, viola o princípio da justiça, pois nega a possibilidade de exercer um direito que é seu.
Insurge-se também o Recorrente pelo facto de o tribunal a quo, ao decidir não retirar consequências invalidantes da violação do princípio da participação dos particulares (nas decisões que lhes dizem respeito) e da garantia material do direito à audiência prévia pelo ato impugnado, a decisão viola os ditos princípios e direito.

Apreciemos.
A Recorrida Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS), é uma instituição de segurança social que se rege pelo Regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (RCPAS), aprovado pela Portaria n.º 487/83, de 27 de abril (alterada pelas Portarias n.º 623/88, de 8 de setembro, e n.º 884/94, de 1 de outubro, e pelo Despacho n.º 22665/2007, de 7 de setembro), diploma em vigor à data dos factos.
Dispõe o art.º 72.º do RCPAS (na versão aprovada pela Portaria n.º 487/83, de 27 de abril) que “os beneficiários devem declarar, nos meses de outubro e novembro de cada ano, ou no prazo de 30 dias a contar da reinscrição ou mudança de situação, o escalão de remunerações convencional escolhido para base de incidência das contribuições que, fora os casos previstos expressamente na lei, deve ser igual ou superior ao 2.º escalão” (n.º 2 – sublinhado e negrito nosso).
Acresce que, quando o beneficiário não indica o escalão da remuneração convencional escolhido como base de incidência, é-lhe fixado o 3.º escalão, “salvo se já tiver vigorado escalão superior no ano anterior, caso em que continuará a ser este” [n.º 3, alínea d)].
Mais se estabelece naquele preceito que “os beneficiários, na declaração referida no n.º 2, podem alterar o escalão da remuneração convencional escolhido ou fixado oficiosamente, produzindo o novo valor efeitos a partir de 1 de janeiro do ano seguinte” (n.º 4).
Das disposições regulamentares enunciadas retira-se, pois, que o direito de opção do escalão contributivo só pode ser exercido pelos beneficiários da Recorrida durante os meses de outubro e novembro de cada ano, para que o escalão assim escolhido possa vigorar no ano seguinte, sob pena de, na falta de opção dentro do prazo regulamentar, ser fixado oficiosamente o 3.º escalão ou ser mantido o escalão superior que vinha sendo aplicado.
Retira-se também do dispositivo legal que são os próprios beneficiários que estão obrigados, nos termos do artigo 72.º, n.º 2 do RCPAS, a comunicar à CPAS a escolha do escalão contributivo para o ano seguinte, sendo que não existe norma legal que obrigue a CPAS, a remeter aos beneficiários qualquer ofício para que aqueles declarem tal opção e a “sanção” para o caso da sua inércia seria a colocação oficiosa do beneficiário no 3º escalão ou a manutenção deste no escalão que vinha sendo aplicado.
Pelo que, o alegado conhecimento do ofício da CPAS em 13 de dezembro de 2006, não pode desde logo fundamentar o justo impedimento pois como se disse anteriormente nenhuma obrigação impendia sobre a CPAS na remessa do referido ofício, pois trata-se de uma “obrigação “do aqui recorrente.
Mais, a alegação do recorrente de que esteve totalmente impedido durante os meses de outubro e novembro de 2006 para poder comunicar à CPAS a sua escolha do escalão contributivo, também não colhe, pois, tal obrigação terminava no dia 30 de novembro e o que resulta do probatório é que esteve ausente do escritório desde 09/10/2006, devido a dois internamentos hospitalares nos períodos de 10/10/2006 a 11/10/2006 e de 17/10/2006 a 20/10/2006, tendo-lhe apenas sido dada alta médica em 26/12/2006 (cfr. pontos 4, 5 e 10 dos factos provados).
Ora como resulta do probatório até 08-10-2006 não esteve internado, nem ausente do escritório e não seria despiciendo pensar ou considerar que, mesmo ausente poderia ter redigido uma carta à CPAS com a sua opção, solicitado a alguém próximo ou colega que lhe enviasse a carta.
Pois, essa comunicação à CPAS não tem qualquer formalidade especifica, podendo até, como consta da deliberação impugnada, ser remetida à CPAS por fax (em 2006 uma das formas de comunicar mais correntes).
Pelo que, como facilmente se pode constatar, não poderá considerar-se que o Recorrente esteve, durante os meses de outubro e novembro de 2006, completa e absolutamente impedido de comunicar à CPAS a sua opção em termos de escalão contributivo para vigorar em 2007.
Recorda-se que os beneficiários devem declarar, nos meses de outubro e novembro de cada ano, a escolha pela opção do escalão de remunerações convencional escolhido para base de incidência das contribuições.
Tal como em contra-alegações é referido pela recorrida:
7.ª Desde logo porque a CPAS não está obrigada, nos termos legais, a remeter aos beneficiários qualquer ofício para que aqueles declarem a sua opção em termos de escalão contributivo para o ano seguinte.
8.ª Pois, nos termos do artigo 72.º, n.º 2 do RCPAS, não é a CPAS que está obrigada a solicitar aos beneficiários a escolha do seu escalão contributivo,
9.ª Mas, antes, são os beneficiários que estão obrigados, nos termos do artigo 72.º, n.º 2 do RCPAS, a comunicar à CPAS a escolha do escalão contributivo para o ano seguinte.
10.ª Razões pelas quais os factos invocados pelo Autor, para justificar a extemporânea declaração de alteração de escalão, não podem consubstanciar uma situação de “justo impedimento”.
Atentas as considerações que tecemos, vejamos em que medida é válida a alegação do recorrente quando refere que a situação de justo impedimento, para além de já não encontrar correspondência com a legislação em vigor, viola o princípio da justiça, uma vez que nega a possibilidade de exercer um direito que é seu.
O instituto do justo impedimento vem expressamente previsto no art.º 146.º do CPC de 1961 (correspondente ao atual art.º 140.º do CPC de 2013), segundo o qual “considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do ato” (n.º 1), sendo que “a parte que alegar o justo impedimento oferecerá logo a respetiva prova” (n.º 2 ).
Tal como se refere na sentença sob recurso e com a qual concordamos:
“ o justo impedimento assenta em dois pressupostos essenciais: por um lado, que o evento que obsta à prática atempada do ato não seja imputável (em termos subjetivos) à parte, nem ao seu representante ou mandatário (no sentido de que a conduta impeditiva, para ser justificada, não pode ser censurável, isto é, não pode ser objeto de um juízo de falta de cuidado ou de diligência) e, por outro lado, que o evento não imputável à parte (ou ao seu representante ou mandatário) obste à prática atempada do ato de uma forma praticamente absoluta, ficando excluídas as simples dificuldades na sua realização.
Em suma, o justo impedimento apenas se verifica quando a pessoa que devia praticar o ato seja colocada “na impossibilidade absoluta de o fazer de forma atempada, em virtude da ocorrência de evento independente da sua vontade, e que um cuidado e diligências normais não podiam fazer prever” (cfr. o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 09/10/2009, proc. n.º 02511/07.8BEPRTB, publicado em www.dgsi.pt).
Importa, ainda, notar que é a parte que invoca o justo impedimento que deve alegar e provar a existência de uma situação passível de integrar aquele conceito, para que o tribunal ou a autoridade administrativa lhe possam facultar, com essa justificação, a prática de um ato fora de prazo.
Cabe-lhe, assim, “o ónus de alegar e provar a ocorrência de evento que obstou, de modo praticamente absoluto, à prática atempada do ato, e ainda que, atentas as circunstâncias especiais da vida em que ele surgiu, não lhe era exigível outra conduta”, incumbindo-lhe também oferecer, desde logo, a respetiva prova (cfr. o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 09/10/2009, acima citado).
Regressando ao caso concreto, coloca-se agora a questão de saber se a situação relatada pelo A., quer perante a R., quer perante o tribunal, configurará justo impedimento.
Julgamos que não.
O A. alegou que esteve ausente do seu escritório desde 09/10/2006 até final do mês de dezembro, em virtude de dois internamentos hospitalares seguidos de um “longo e difícil” período de convalescença pós-operatória, circunstâncias que o impediram de tomar conhecimento atempado do formulário que lhe fora enviado para efeitos de escolha do escalão contributivo a vigorar no ano de 2007.
Em consequência, refere que não lhe foi possível cumprir o prazo de resposta ao mesmo (30/11/2006), pois só em 13/12/2006 é que teve conhecimento daquele formulário. De facto, resultou provado que a R. enviou para o domicílio profissional do A. um formulário, com data de 14/10/2006, com o objetivo de este comunicar a escolha do escalão contributivo que pretendia que lhe fosse aplicável no ano seguinte.
Mais se provou que o A. esteve internado na [SCom01...], S.A., no serviço de cirurgia, desde 10/10/2006 a 11/10/2006 e desde 17/10/2006 a 20/10/2006, tendo-lhe sido dada alta médica em 26/12/2006 (cfr. pontos 3 e 10 dos factos provados).
É certo que as doenças são, em princípio, eventos que o doente não pode prever ou impedir que aconteçam. Nestes termos, e como alega o A., o comportamento que obstou à comunicação atempada da escolha do escalão não é, em princípio, passível de censura, ou seja, não lhe é imputável por falta de cuidado ou de diligência.
No entanto, julgamos que a alegada ausência do escritório devido a dois internamentos – que, aliás, ocorreram em períodos curtos no tempo, durante o mês de outubro –, ainda que seguidos de recuperação pós-operatória, não se mostra suficiente para colocar o A. numa situação de absoluto e total impedimento para cumprir atempadamente com as suas obrigações, pessoais e profissionais, em particular para ter declarado perante a R., até ao final do mês de novembro, qual o escalão contributivo pelo qual pretendia optar no ano seguinte.
O A. não logrou provar, quer no procedimento administrativo, quer em juízo, que os períodos de internamento e de convalescença o impediram efetivamente de tomar conhecimento, durante os meses de outubro e novembro de 2006, da correspondência recebida no seu escritório.
Tão pouco alegou e demonstrou que lhe foi impossível acautelar que qualquer outra pessoa (por exemplo, um seu colaborador ou um funcionário do escritório) pudesse receber as cartas ou até reexpedir a correspondência, por via postal, para o seu domicílio particular, durante o período da sua ausência (cfr., numa situação semelhante à dos autos, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 18/06/2015, proc. n.º 08100/14, publicado em www.dgsi.pt).
Os factos alegados e a prova efetuada não permitem saber se tal situação o impediu, na realidade, de diligenciar pela prática do ato (comunicação do escalão contributivo à R.) por outros meios, dentro do prazo fixado.
Nada disto foi alegado ou se mostra provado nos autos.
Acresce que o argumento do A. de que, atendendo ao “costume antigo da CPAS” de enviar aos seus beneficiários um formulário a lembrar a escolha dos escalões contributivos, o prazo para efetuar tal opção só deveria ser contado a partir do seu efetivo recebimento não tem qualquer relevância no caso concreto.
Veja-se que o que importa, nesta sede, demonstrar é que o A. esteve absolutamente impossibilitado de, nos meses de outubro e novembro de 2006, receber e tomar conhecimento do formulário enviado pela R. e de, em consequência, declarar perante esta qual o escalão contributivo escolhido para o ano de 2007, o que, como vimos, não veio a ocorrer.”
Concluiu assim a sentença, e bem, que o recorrente não alegou nem provou, como lhe competia, a impossibilidade absoluta da prática atempada do ato em causa, pelo que não ocorre uma situação de justo impedimento.
Pelo que, nenhuma censura há a apontar por não ter sido aceite a referida invocação de justo impedimento, que se extrai da sentença, escudando-se no artigo 140º do CPC em vigor á data dos factos, não se vislumbrando, nem tendo ficado demonstrado pelo recorrente o alegado nas suas conclusões: “(…) D. De facto, a decisão do tribunal a quo continua a fazer referência a uma situação de "total e absoluto" impedimento, o que já não encontra correspondência com a redação legislativa em vigor e que, por isso, espelha uma rigidez desumanizante e uma natureza obsoleta, algo a o legislador pôs fim com a Reforma de 1995/96 do Código de Processo Civil.(…)”

Mais se acrescenta que também não existe qualquer violação do princípio da justiça, uma vez que, sempre o recorrente poderia ter exercido o seu direito dentro do prazo estipulado para o efeito, sendo que o instituto de justo impedimento, não serve para colmatar o eventual esquecimento da sua obrigação ou inércia.
Pelo que não colhe esta argumentação.
Quanto à alegação do recorrente que refere que a sentença recorrida não retirou “consequências invalidantes da violação do princípio da participação dos particulares (nas decisões que lhe dizem respeito) e da garantia material do direito à audiência prévia pelo ato impugnado (…)”, e que, por isso, teria violado o princípio da participação dos particulares na formação das decisões que lhes dizem respeito e o direito à audiência prévia.
Sempre se dirá que, a sentença recorrida decidiu, e bem, quanto a esta matéria, que “não obstante os vícios decorrentes da violação do princípio da participação e da preterição do direito de audiência prévia do A., dos mesmos não são de extrair consequências invalidantes, atento o princípio do aproveitamento do ato administrativo.”
Ora, considerando-se na sentença sob recurso que o direito de audiência assume-se, pois, como uma dimensão qualificada do princípio da participação previsto no citado art.º 8.º do CPA, transpondo igualmente o comando constitucional inserto no art.º 267.º, n.os 1 e 5, da CRP, e que por essa razão, os artigos 100.º e seguintes do CPA são aplicáveis a todos os procedimentos administrativos de 1.º grau, incluindo, o procedimento administrativo em causa nos presentes autos, tal omissão poderia conduzir à conclusão que a deliberação de indeferimento em crise violou o disposto nos artigos 8.º e 100.º do CPA, sendo anulável nos termos gerais.
No entanto e à luz do referido princípio do aproveitamento do ato administrativo, outra solução foi apresentada, não vendo razões para dela nos afastarmos pelo que convocando a sentença sob recurso dela se extrai o seguinte:
“(…) Em primeiro lugar, atendendo ao disposto no n.º 2 e no n.º 3, alínea d), do art.º 72.º do RCPAS (que exigem a declaração dos beneficiários da R., nos meses de outubro e novembro de cada ano, quanto ao escalão de remunerações convencional escolhido para base de incidência das contribuições, sob pena de aplicação do 3.º escalão), constata-se que a atuação da R., nesta matéria, é estritamente vinculada, sem margem para uma atuação discricionária.
Ou seja, na falta de comunicação atempada daquela opção, cabe à R., em cumprimento do disposto no RCPAS, aplicar o escalão supletivamente fixado.
Tal implica, naturalmente, o indeferimento de uma declaração efetuada fora do prazo, salvo, claro está, a devida demonstração de uma situação de justo impedimento.
Acresce, em segundo lugar, que, considerando a factualidade provada e os contornos do caso concreto, o exercício da audiência prévia pelo A. não teria a virtualidade de alterar os pressupostos que estiveram na base da decisão de indeferimento, nomeadamente quanto à não ocorrência do alegado justo impedimento.
Pode, assim, dizer-se que há a certeza objetiva de que a reinstrução do procedimento, para efeitos de expurgação do vício da falta de audição prévia, imporá que a R. pratique um novo ato, mas de conteúdo igual ao do primeiro (cfr., neste sentido, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12/04/2012, proc. n.º 0896/11, publicado em www.dgsi.pt).
De facto, tendo em conta que o A. não logrou demonstrar, perante o tribunal, que esteve justamente impedido da prática atempada do ato aqui em causa, não se vê que outra alternativa juridicamente válida poderá existir no procedimento que não seja a manutenção da deliberação de indeferimento ora impugnada.
Consideramos, portanto, à luz de um juízo de prognose e tendo presente o que ficou exposto supra aquando da apreciação do primeiro vício, que o sentido decisório da deliberação da R. não poderia ser outro, mesmo que ao A. tivesse sido concedida a oportunidade de antes da mesma se pronunciar.
Pelo exposto, não obstante os vícios decorrentes da violação do princípio da participação e da preterição do direito de audiência prévia do A., dos mesmos não são de extrair consequências invalidantes, atento o princípio do aproveitamento do ato administrativo”.

Assim sendo, improcede na totalidade o presente recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

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Atenta a improcedência total do recurso, as custas ficarão a cargo do recorrente – artigo 527.º, nos. 1 e 2, e 529.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e art.º 7.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais.

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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:

I- O justo impedimento apenas se verifica quando a pessoa que devia praticar o ato seja colocada na impossibilidade absoluta de o fazer de forma atempada, em virtude da ocorrência de evento independente da sua vontade, e que um cuidado e diligências normais não podiam fazer prever;

II- A parte que invoca o justo impedimento que deve alegar e provar a existência de uma situação passível de integrar aquele conceito, para que o tribunal ou a autoridade administrativa lhe possam facultar, com essa justificação, a prática de um ato fora de prazo.

III- Não existe qualquer violação do princípio da justiça, pois o recorrente poderia ter exercido o seu direito dentro do prazo estipulado para o efeito, sendo que a invocação do instituto de justo impedimento, não serve para colmatar o eventual esquecimento da sua obrigação ou inércia.


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V. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

a) Negar provimento ao recurso;
b) Manter a sentença recorrida;
c) Custas pelo Recorrente;



Porto, 16 de janeiro de 2025


Isabel Ramalho dos Santos (Relatora)
Rui Esteves (1.º Adjunto)
Irene Isabel das Neves (2.ª Adjunta)