Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01962/24.8BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/15/2025
Tribunal:TAF de Braga
Relator:VITOR SALAZAR UNAS
Descritores:OPOSIÇÃO; LIMINAR;
SUBSÍDIO DESEMPREGO; ANULAÇÃO E PAGAMENTO DA DÍVIDA;
ILEGALIDADE CONCRETA;
Sumário:
I - O despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e razoavelmente indiscutível que torne dispensável assegurar o contraditório (art. 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior.

II – A anulação e/ou o pagamento da dívida enquanto fundamentos de oposição, conforme previsto na alínea f) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, estão, apenas, desenhados para as situações em que tenham ocorrido em momento anterior à execução fiscal.

III - A ilegalidade do ato que determinou a restituição do subsídio de desemprego auferido pelo opoente, por erro na aplicação da lei aos factos, e que deu origem à dívida exequenda, não integra o fundamento de oposição previsto na alínea h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte:


I – RELATÓRIO:


«AA», NIF ...34, m. id. nos autos, interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que rejeitou liminarmente, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 209.º do CPPT, a oposição por si deduzida contra a execução fiscal n.º ...79, a correr termos na Secção de Processo Executivo de ..., do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., por ter concluído pela inexistência da invocação de fundamentos de oposição.
O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
«(…).
1. Nos termos do artigo 48.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro), os beneficiários que se encontram em situação de desemprego não estão obrigados ao pagamento de contribuições durante o período em que se encontram sem atividade remunerada.
2. A Segurança Social, ao emitir a Nota de Cobrança, violou o princípio da legalidade administrativa consagrado no artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo e o princípio da proteção da confiança, conforme o disposto no artigo 6.º do CPA, ao exigir contribuições indevidas.
3. A oposição à execução enquanto forma de defesa onde o Recorrente contestou a legitimidade da execução, observou também a validade do título executivo e a existência da dívida. Embora seja um processo autônomo, está relacionado à execução principal.
4. O processo de oposição à execução fiscal discute a exigibilidade da dívida, pois funciona como contestação à pretensão do exequente e respeita aos fundamentos supervenientes que podem tornar ilegítima ou injusta a execução, devido à falta de correspondência com a situação material subjacente no momento em que se adotam as providências executivas, tendo por efeito paralisar a eficácia do ato tributário corporizado no processo executivo.
5. A questão dos autos reconduz-se, no essencial, à admissibilidade e possibilidade da efetivação da responsabilidade por dívidas de contribuições.
6. Acresce que, em se tratando de ato da própria execução fiscal, o meio próprio para reagir contra a sua legalidade não poderá deixar de ser um dos previstos no art. 151º do CPPT, de entre os quais surge como mais adequado a oposição à execução fiscal, vistos os fundamentos previstos no art. 204º, n. º1 do CPPT.
7. A ilegitimidade do impugnante, enquanto revertido na execução decorrente da responsabilidade subsidiária prevista no art. 8º do RGIT e a inexigibilidade da cobrança das quantias em causa, entenda-se inexigibilidade da dívida exequenda, são fundamentos a invocar e conhecer no processo de oposição, de acordo com o disposto no art. 204º, nº1 do CPPT.
8. Não olvidamos, que a jurisprudência dos nossos Tribunais tem entendido que a rejeição liminar da petição inicial só terá lugar quando for de todo impossível o seu aproveitamento, face à prevalência do princípio da pronúncia sobre o mérito, tendo vindo a considerar que o despacho de indeferimento liminar só deve ocorrer nas situações em que a improcedência do pedido for indiscutível e torne dispensável assegurar o contraditório.
9. A decisão de rejeição liminar causa um prejuízo significativo ao recorrente, conforme previsto no artigo 97º da Lei Geral Tributária, ao permitir que a execução fiscal prossiga sem a devida apreciação dos fundamentos da oposição. 10. O recorrente não se eximirá em apresentar provas adicionais, conforme permitido pelo artigo 98.º, n.º 4 do CPPT, para sustentar os argumentos apresentados na oposição.

III. PEDIDO
Diante do exposto, requer:
a) O provimento do presente recurso;
b) A reforma da decisão que rejeitou liminarmente a oposição à execução;
c) A admissão da oposição à execução fiscal n.º ...79, e, consequentemente, o prosseguimento dos autos para a extinção do processo de execução fiscal supra referido.»


O Recorrido não apresentou contra alegações.

O Digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer concluindo pela manutenção da sentença.
*

Com dispensa dos vistos legais [cfr. artigo 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil], cumpre apreciar e decidir o presente recurso.

*


II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR.
Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pelo Recorrente, cujo objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das respetivas alegações e que se centra em saber, em suma, se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito ao concluir pela rejeição liminar da oposição, nos termos do disposto no art. 209.º, n.º 1, alínea b), do CPPT, por inexistência de invocação de fundamentos válidos de oposição.

*
III – FUNDAMENTAÇÃO:
Na decisão em discussão não foi selecionada e autonomizada matéria de facto, pelo que se passa a transcrever todo o seu discurso fundamentador do qual se retira a matéria de facto subjacente à decisão tomada.
«II – DA APRECIAÇÃO LIMINAR
A questão que importa decidir, desde logo, nos termos do disposto no art. 590.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável “ex vi” art. 2.º, alínea e) do CPPT, é a viabilidade do prosseguimento dos presentes autos, tendo em conta a causa de pedir e o pedido formulados, sob pena de ser determinada a prática de atos inúteis, igualmente proibidos por lei, em situações como a presente em que dos autos constam todos os elementos necessários à apreciação liminar.
Cumpre, pois, apreciar se foi alegado algum dos fundamentos que legitimam o recurso ao presente meio processual de oposição à execução fiscal, constantes do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.
“a) Inexistência do imposto, taxa ou contribuição nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação ou, se for o caso, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respetiva liquidação;
b) Ilegitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título ou seu sucessor ou sendo o que nele figura, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram, ou por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida;
c) Falsidade do título executivo, quando possa influir nos termos da execução;
d) Prescrição da dívida exequenda;
e) Falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade;
f) O Pagamento ou anulação da dívida exequenda;
g) Duplicação de coleta;
h) Ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação;
i) Quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam a apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que houver extraído o título.”
Por sua vez, estabelece o art. 209.º, n.º 1 do CPPT que recebido o processo, o juiz rejeitará logo a oposição por um dos seguintes fundamentos:
“a) Ter sido deduzida fora do prazo;
b) Não ter sido alegado algum dos fundamentos admitidos no n.º 1 do artigo 204.º;
c) Ser manifesta a improcedência.”
Ora, “[em] qualquer caso, para haver lugar a indeferimento liminar é necessário que se trate de uma razão evidente, indiscutível, em termos de razoabilidade, que permita considerar dispensável a audição das partes, em sintonia com o preceituado no n.º 3 do art. 3.º do CPC” - cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. III, 6.ª edição, Áreas Editora, Lisboa, 2011, p. 554.
No presente caso, o Oponente limita-se a invocar a invalidade da decisão do Centro Distrital de ... do Instituto da Segurança Social, I.P. que determinou a restituição de prestações de desemprego consideradas indevidamente pagas, imputando-lhe erro sobre os respetivos pressupostos de facto e de direito, tendo por base a não verificação do fundamento que ditou a emissão da nota de reposição n.º ...47, já que “as mensalidades ali reclamadas mostravam-se devidas, por estar efetivamente o aqui Executado desempregado”.
Daqui se retira que, não obstante o Oponente enquadrar a sua pretensão na alínea f) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, na verdade basta-se a invocar a ilegalidade concreta da dívida dada à cobrança. Refira-se que a anulação que pode constituir fundamento de oposição à execução fiscal nos termos do apontado normativo reporta-se aos casos de anulação administrativa do ato subjacente à dívida exequenda (como seja a nota de reposição n.º ...47) após a instauração da execução fiscal e não a anulação que se pretende ver reconhecida por via da alegação esgrimida. Da mesma forma, o pagamento relevante para estes efeitos respeita ao pagamento da dívida exequenda, que não qualquer apreciação da conformidade das prestações de subsídio de desemprego cujo pagamento vem exigido em sede executiva.
Pelo exposto, cingindo-se a alegação do Oponente à ilegalidade da dívida exequenda, a mesma apenas se mostra suscetível de enquadramento na alínea h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, segundo a qual constitui fundamento de oposição a: “Ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação.” Sucede que, atenta a fórmula legal constante do assinalado preceito, a discussão da legalidade da dívida exequenda, em sede de oposição à execução fiscal, depende de se verificar um condicionalismo adicional: a lei não assegurar outro meio judicial de impugnação ou recurso contra o respetivo ato definidor.
O que significa que relativamente às dívidas criadas por atos administrativos e/ou tributários não existe a possibilidade de se discutir a sua legalidade em concreto em sede de oposição à execução fiscal, se ao interessado foi concedida a possibilidade de os impugnar contenciosamente - não se pode perder de vista que a norma ínsita no art. 204.º, n.º 1, alínea h) do CPPT pretende acautelar as situações em que o sujeito passivo não dispõe de meios de impugnação contenciosa do ato administrativo/tributário, como é o caso das contribuições para a segurança social, em que se permite a extração de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um ato administrativo ou tributário prévio, definidor da situação (neste sentido, vide JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., Vol. III, pp. 495-497).
Na situação vertente, o Oponente reconhece expressamente ter rececionado a nota de reposição n.º ...47 (que juntou como doc. n.º 2 da petição inicial), onde lhe eram indicados os meios de reação àquela decisão, designadamente a possibilidade de reclamar em 15 dias úteis e recorrer hierarquicamente ou impugnar contenciosamente (“recorrer para o tribunal”), no prazo de três meses. Mais evidenciam os autos que o Oponente optou por reclamar daquela nota, tendo a reclamação sido indeferida por despacho da Diretora do Núcleo de Prestações de Desemprego e Benefícios Diferidos, datado de 28 de março de 2024, o que foi levado ao seu conhecimento por ofício junto como doc. n.º 3 da petição inicial.
Como tal, mostra-se patente que foi assegurado ao Oponente meio judicial de impugnação da decisão que determinou a restituição das prestações sociais de desemprego em causa - a efetivar através da apresentação de ação administrativa, nos termos dos artigos 37.º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos -, assim como meio gracioso de reação, que usou.
E, assim sendo, não pode pretender, agora, através da oposição à execução, a apreciação da legalidade da dívida exequenda, não se mostrando, pois, preenchido o fundamento de oposição à execução fiscal constante da alínea h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.
Refira-se ainda que não existe qualquer possibilidade de convolação dos autos, não se estando perante uma situação de erro na forma do processo, já que o pedido se mostra consentâneo com a forma processual escolhida. De qualquer forma, uma possível convolação em ação administrativa seria sempre inviável, porque a isso sempre obstaria a incompetência material deste Tribunal Tributário para apreciar da legalidade da decisão que determinou a restituição de prestações de desemprego consideradas indevidamente pagas em causa nos autos (competência que pertence aos Tribunais Administrativos de Círculo nos termos do art. 44.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais).»

*
IV - DE DIREITO:
Cumpre, então, apreciar e conhecer a questão suscitada no presente recurso, conforme supra enunciada, sendo certo que o tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito [cfr. artigo 5.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi art.º 2.º, alínea e) do CPPT.].
*
ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO?.
Nos termos do disposto no art.º 209.º, n.º 1 do Código de Processo Tributário “Recebido o processo, o juiz rejeitará logo a oposição por um dos seguintes fundamentos:
a) Ter sido deduzida fora do prazo;
b) Não ter sido alegado algum dos fundamentos admitidos no n.º 1 do artigo 204.º;
c) Ser manifesta a improcedência”.
A jurisprudência do STA já, por várias vezes, expressou o entendimento de que o indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo em todo impossível o aproveitamento da petição inicial, isto tendo em atenção que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo.
Assim, o despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e razoavelmente indiscutível que torne dispensável assegurar o contraditório (art. 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior, isto é, «quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial» - cfr. neste sentido, vide, por todos, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 26.09.2012, proc. n.º 377/12 e de 16.05.2012, proc. n.º 212/12 e deste TCA Norte de 09.05.2024, proc. n.º 970/22.8BEPRT, disponíveis para consulta em www. dgsi.pt.
Vejamos, então, se no caso concreto errou o tribunal a quo ao ter rejeitado liminarmente a oposição, tendo em consideração os fundamentos invocados na petição inicial.
A quantia exequenda provém de dívidas à Segurança Social referente à restituição de prestações de subsídio de desemprego recebidos pelo executado, no valor de € 1.205,23.
Para fundamentar a oposição alega o oponente que no período em causa (agosto, setembro e outubro de 2022) encontrava-se efetivamente desempregado [arts. 1.º e 2.º da petição inicial].
A título meramente exemplificativo, mas, de todo modo, impressivo da tese do opoente, destacam-se as seguinte alegações: «Durante o referido período, o Recorrente recebeu uma Nota de Cobrança emitida pela Segurança Social, datada de 13/02/2024, no valor de € 1274,20 (um mil, duzentos e setenta e quatro euros e vinte cêntimos, exigindo o pagamento de contribuições referentes ao período em que se encontrava sem atividade laboral.» [art. 2.º]; «O Requerente apresentou uma reclamação graciosa contra a cobrança indevida junto da Segurança Social em 26/03/2024, a qual foi indeferida por decisão comunicada em 28/03/2024, mantendo-se a cobrança indevida.» [art 3.º]; «O Requerente apresentou uma ação de impugnação judicial de (ir)regularidade e (i)licitude de despedimento em 03/11/2022. A qual correu no Tribunal Judicial de Braga no Juízo do Trabalho de ..., Juiz ..., com o número de processo ...9/2...T8BRG, a sentença deu ganho de causa ao autor em 24/11/2024, (…).» [art. 4.º]; «A sentença declara ilícito o despedimento de «AA» em 21/07/2022 pelo ....» [art. 5.º]; «Acresce ainda que, a exposição dos factos que fundamentam o pedido não correspondem à realidade vivenciada pelo Executado, pois o subsídio foi pago nos meses de agosto, setembro e outubro, quando de facto, o Executado não estava a trabalhar, segundo notificação de despedimento feito a 06/10/2022 e Declaração de Situação de Desemprego emitida pela Autoridade para as Condições de Trabalho - ACT em 04/08/2022.» [art. 6.º].
Assevera, ainda, o opoente que a Segurança Social ao emitir «a Nota de Cobrança, violou o princípio da legalidade administrativa consagrado no artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo e o princípio da proteção da confiança, conforme o disposto no artigo 6.º do CPA, ao exigir contribuições indevidas» « Sucede que, tendo o executado atentado melhor e com maior rigor sobre o alcance da citaçäo para os termos da referida execução, concluiu que não existe motivo para este processo, na medida em que, contrariamente ao que dele resultava, na data da sua instauração. as mensalidades au reclamadas mostravam-se devidas por estar efetivamente o aqui Executado desempregado — conforme todos os documentos já juntos.» [artigo 2.º do capítulo destinado ao direito]; «Havendo, por isso, fundamento para extinguir a presente execução fiscal n° ...79 e apensos (cfr. artigo 204°, n° 1, O do CPPT). E que, nos termos do artigo 176°, n° 1 a) e b), do CPPT, o processo de execução fiscal deve ser extinto quando ocorra pagamento da quantia exequenda ou anulação da mesma divida.» [artigo 3.º do capítulo destinado ao direito]. Concluindo, no capítulo designado por impugnação «Atendendo ao acima exposto, é falso o constante no requerimento executivo apresentado a juízo pelo Exequente, na parte que refere que o Executado deve ao Exequente a quantia total de € 1205,23 (um mil, duzentos e cinco euros e vinte e três cêntimos), pelo que expressamente se impugna.» [art. 2.º].
Do exposto, conclui-se que o opoente fundamentou a sua pretensão na ilegalidade da decisão de restituição das prestações por si auferidas a título de subsídio de desemprego, enquadrando a causa de pedir no fundamento de oposição elencado na alínea f) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT [“pagamento e anulação da dívida exequenda”].
Ora, a anulação e/ou o pagamento da dívida enquanto fundamentos de oposição, conforme previsto na alínea f) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, estão, apenas, desenhados para as situações em que tenham ocorrido em momento anterior à execução fiscal.
Como clarifica o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa in «CPPT anotado e comentando, 2011», III vol. 6.ª edição 2011, Áreas Editora, pág. 493, «Ocorrendo o pagamento ou anulação posteriores à instauração da execução, o meio adequado para o executado obter a sua extinção, se ela não for declarada oficiosamente pela administração tributária, é requerer tal extinção no processo de execução fiscal, com possibilidade de reclamação para o tribunal tributário, nos termos do art. 276.º do CPPT, no caso de indeferimento.
Assim, o pagamento e anulação que se têm em vista neste art. 204.º como fundamentos de oposição à execução serão, assim, os que tiverem ocorrido antes da instauração do processo de execução fiscal.»
Retomando o caso concreto, conclui-se que nenhuma das situações previstas na alínea f) foi invocada e que nenhuma delas se verifica.
Quanto à concreta fundamentação da sentença verifica-se que o Recorrente não a ataca diretamente apenas conclui que inexiste fundamento para rejeição liminar, repristinando os fundamentos da oposição, e que a rejeição em sede liminar causa um “prejuízo significativo ao recorrente, conforme previsto no artigo 97º da Lei Geral Tributária, ao permitir que a execução fiscal prossiga sem a devida apreciação dos fundamentos da oposição”.
No que se refere à impossibilidade de discutir a (i)legalidade concreta da quantia exequenda em sede de oposição à execução, como pretende o opoente sob a capa da inexigibilidade, não obstante a mesma ter-se consolidado na ordem jurídica por falta de impugnação [art. 628.º do CPC], não deixamos de dizer que dela emerge uma irrepreensível compreensão dos fundamentos alegados e aplicação do quadro legal e jurisprudência pertinentes a propósito das matérias apreciadas [inexistência de fundamentos de oposição, impossibilidade de convolação e causa de rejeição liminar].
Na verdade, o oponente para fundamentar a ilegalidade da execução fiscal e para concluir que a certidão de dívida não reflete qualquer dívida da sua parte, pugna pela ilegalidade do ato que ordenou a restituição dos valores por si auferido, por falta de pressupostos de facto e de direito.
Nos termos da alínea h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT é fundamento de oposição à execução fiscal a «ilegalidade da liquidação da dívida exequenda», mas logo aí se ressalva que a discussão da legalidade da liquidação só é possível quando «a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação».
Donde, sustentando a alegada ilegalidade do ato que determinou a restituição da prestação de subsídio de desemprego e, consequentemente, dos valores recebidos, na falta de pressupostos de facto e de direito, é manifesto que não se mostra preenchida, pela realidade material convocada na petição inicial a alínea h), do n.º 1 do artigo 204.º, do CPPT. - a única em que a lei permite que se discuta em processo de Oposição judicial a legalidade da dívida exequenda-, pois, no caso concreto a lei faculta o uso de meios graciosos bem como da impugnação da decisão final [art. 37.º do CPTA], conforme notificação efetuada ao oponente, sendo certo que lançou mão, pelo menos, de um meio gracioso, tudo como bem assinala a sentença.
Conforme se afirma no acórdão do STA, de 16.01.2019, proc. n.º 011/16, disponível para consulta em www.dgsi.pt,, «[é] jurisprudência uniforme dos tribunais tributários, designadamente do Supremo Tribunal Administrativo, que não é possível discutir em sede de oposição à execução fiscal a legalidade da liquidação que deu origem ao tributo, nem a legalidade do ato administrativo que esteja na origem da dívida exequenda, uma vez que a lei assegura meio judicial de impugnação desses atos. Salienta ainda a jurisprudência que não se equipara à ausência de meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato aquela em que o executado não foi oportunamente notificado para exercer o direito de impugnar; nesta situação, a falta de notificação apenas determinará a não abertura do prazo para exercer o direito de impugnação e já não a possibilidade de transferir a discussão da legalidade da liquidação do meio próprio para a oposição à execução fiscal.» - sublinhado nosso [neste sentido, vide, por todos, os acórdãos do STA de 28.10.2020, proc. n.º 0539/13.8BEBRG e de 26.10.2022, proc. n.º 0446/18.8BELRA, e deste TCA Norte de 11.01.2024, proc. n.º 737/19.0BECBR, e de 30.04.2025, proc. n.º 198/23.0Bevis, relatados, o primeiro, pelo mesmo relator e, o segundo, pela 1:ª adjunta desta formação].
Do mesmo modo, no que se refere à impossibilidade de convolação, em sintonia com o julgamento realizado pelo tribunal a quo, dizemos (i) que aferindo-se a adequação do meio processual unicamente pelo pedido formulado a final na petição inicial, ter-se-á de concluir pela inexistência de erro na forma de processo uma vez que a extinção da execução fiscal é consentâneo com o meio processual escolhido; e (ii) que por a ação adequada para apreciar a legalidade do ato de restituição das prestações de desemprego ser da competência dos Tribunais Administrativos de Círculo, a correr termos como ação administrativa da competência do “juízo administrativo social” [arts. 44.º, 44.º-A, n.º 1, alínea b) e 49.º, a contrario, do ETAF], sempre obstaria à convolação a incompetência absoluta do Tribunal Tributário por violação de regras de competência especializada em razão da matéria.
O Recorrente alega, ainda, que a rejeição liminar causa-lhe um prejuízo significativo. Tal alegação, por si só, é completamente inidónea para alterar o sentido da decisão do tribunal a quo. No entanto, quanto ao assim alegado, de forma breve diremos que foram-lhe garantidos o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, conforme propugnado no arts. 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos. Desde logo, através do recurso à via judicial pela oposição judicial. Por outro lado, no caso concreto, a falta de invocação de fundamentos de oposição, originadora da rejeição liminar, só ao ora Recorrente é imputável. Sendo certo que, com a decisão de reposição, foram-lhe notificados os meios de reação graciosos (que usou) e judicial para impugnar esta decisão.
Nesta confluência, foram salvaguardados os seus direitos de defesa e à tutela jurisdicional efetiva, tendo o Recorrente procedido da forma que lhe aprouve.
Finalmente, sem prejudicar a conclusão extraída da qual resulta a improcedência do recurso, dizemos somente para pacificar as partes, sobretudo o Recorrente, que na sentença proferida pelo tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo do Trabalho de Braga – Juiz ... – a 24.11.2022, na sequência da declaração de ilicitude do seu despedimento, foi condenada a sua entidade patronal a pagar-lhe, para além do mais:
«b, as retribuições que deixou de auferir desde 21.07.2022 ate ao trânsito em julgado da presente decisão, e que se fixam agora em 4.049,70 Eur (…- 705,00 Eur.+104,94 Eur. x 5 meses).» [cfr. cópia da sentença junta com a PI].
Daqui decorre que o Recorrente, por força da decisão do Juízo do Trabalho, passou a ter direito a receber o seu vencimento desde 21.07.2022 até ao trânsito em julgado da decisão proferida a 24.11.2022.
Destarte, nunca seria legítimo ao Recorrente pretender acumular relativamente ao mesmo período (agosto, setembro e outubro de 2022) a prestação do subsídio de desemprego, exigível na execução fiscal, com o recebimento do salário, posteriormente, determinado por aquele tribunal.
Pelo que não se vislumbra como poderia a sua pretensão, de todo o modo, proceder.
Em suma e de harmonia com a sentença, concluímos, uma vez que não foram alegados fundamentos nenhum dos fundamentos taxativos elencados no art. 204.º, n.º 1 do CPPT, no caso, existem razões para a rejeição da oposição, nos termos da alínea b), do n.º 1, do art. 209.º do CPPT.
*
Nestes termos, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso e, nessa sequência, manter a sentença no ordenamento jurídico.
*
Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC., formula-se o seguinte SUMÁRIO:
I - O despacho de indeferimento liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e razoavelmente indiscutível que torne dispensável assegurar o contraditório (art. 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior.
II – A anulação e/ou o pagamento da dívida enquanto fundamentos de oposição, conforme previsto na alínea f) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, estão, apenas, desenhados para as situações em que tenham ocorrido em momento anterior à execução fiscal.
III - A ilegalidade do ato que determinou a restituição do subsídio de desemprego auferido pelo opoente, por erro na aplicação da lei aos factos, e que deu origem à dívida exequenda, não integra o fundamento de oposição previsto na alínea h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.
*
V – DECISÃO:
Em face do exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso e, nessa sequência, manter a sentença no ordenamento jurídico.


Custas a cargo do Recorrente.

Porto, 15 de maio de 2025


Vítor Salazar Unas
Ana Patrocínio
Ana Paula Santos