Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 02517/19.4BEPRT |
![]() | ![]() |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 09/12/2024 |
![]() | ![]() |
Tribunal: | TAF do Porto |
![]() | ![]() |
Relator: | ANA PATROCÍNIO |
![]() | ![]() |
Descritores: | PRINCÍPIO DA APLICAÇÃO RETROACTIVA DA LEI NOVA MAIS FAVORÁVEL; DISPENSA, REDUÇÃO E ATENUAÇÃO ESPECIAL DAS COIMAS; LEI N.º 7/2021, DE 26 DE FEVEREIRO, LEI N.º 27/2023, DE 04/07; |
![]() | ![]() |
Sumário: | Concluindo-se que as alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, no Regime Geral das Infracções Tributárias, em sede de dispensa, redução e atenuação especial das coimas, se repercutem na decisão de aplicação e na medida da coima questionada nos autos – por imposição constitucional e legal do princípio da aplicação retroactiva da lei nova mais favorável - haverá que, oficiosamente, determinar a remessa do processo à autoridade administrativa para que esta reveja ou renove tal decisão em conformidade com essas alterações em vigor, introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro (bem como pela Lei n.º 27/2023, de 04/07).* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Votação: | Unanimidade |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório [SCom01...], Lda., pessoa colectiva n.º ...91, com sede na Rua ..., no ..., interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 24/05/2021, que julgou improcedente o recurso das decisões de aplicação de coima, no âmbito de vários processos de contra-ordenação que identifica na petição inicial, pela falta de pagamento de taxas de portagem. A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “A. A arguida [SCom01...], lda não concordar com a decisão proferida que julgou totalmente improcedente o recurso apresentado, uma vez que, considera a decisão injusta, desadequada e desproporcional. B. A decisão em crise não teve em conta o facto gerador da lide, ou seja, a incorreta informação prestada pela concessionária sobre o motivo pelo qual não foram efetuados os débitos das passagens. C. E, foi essa incorreta informação que condiciona toda a decisão proferida, seja a nível factual, seja na aplicação do Direito. D. O tribunal “a quo” errou ao dar como provado que “O legal representante da arguida foi à loja da via verde para saber porque tinha dívidas com a mesma, tendo-lhe sido informado que eram problemas com o cartão bancário”. E. Da prova produzida, nomeadamente pelo depoimento do legal representante da recorrente quando relatou ao Tribunal que quando se deslocou à loja da via verde foi informado que o motivo das passagens não terem sido debitadas se prendia com o facto de a conta bancária apresentar saldo insuficiente. – Conforme depoimento do Legal Representante da empresa sessão única – minuto 09:05. F. Algo substancialmente diferente daquilo que foi erradamente dado como provado. G. Só na segunda vez que voltou à loja da Via Verde da Avenida Fernão Magalhães, e ter mostrado os extratos bancários da arguida e comprovado que a conta esteve sempre aprovisionada é que lhe foi referido que o motivo era a caducidade do cartão bancário associado aquela viatura. H. No entanto, quando foi prestada essa informação já a concessionária cobrava os custos administrativos associados o que a recorrente não aceitou. I. A [SCom01...], Lda procurou por diversas vezes pagar as taxas de portagens, o que nunca lhe foi permitido pela própria Via Verde Portugal. J. Pois, além da errada informação que prestou, sempre dificultou a resolução da questão, como que se tivesse “interesse” em cobrar os custos administrativos. K. O Tribunal errou ao dar como facto provado que “O legal representante da arguida foi à loja da via verde para saber porque tinha dívidas com a mesma, tendo-lhe sido informado que eram problemas com o cartão bancário;”. L. Na realidade deveria ter dado como provado que “O legal representante da arguida foi à loja da via verde para saber porque tinha dívidas com a mesma, tendo-lhe sido informado que tal se prendia com insuficiência de fundos na conta bancária.” M. A sentença recorrida deu como assente, ponto 10 dos factos provados, que a recorrente tentou pagar as taxas de portagens sem os custos administrativos exigidos. N. Contudo, não deu como provado, como deveria que a concessionária nunca permitiu que esse pagamento fosse efetuado, e é inegável que esse facto resulta da prova, nomeadamente da impugnação da decisão que aplicou a coima, como também das declarações do legal representante. O. O Tribunal “a quo” nunca questionou a legalidade da decisão da concessionária de não aceitar o pagamento das taxas de portagem e à posteriori proceder à cobrança coerciva das taxas de portagem. P. O que se traduz num claro abuso de posição dominante e contribuiu para que as taxas de portagem não se encontrasse liquidada, isto porque, a concessionária sabia que o facto protegido pela norma legal do artigo 5.º n.º 1 b) da Lei 25/06 é a falta de pagamento de portagens e não a falta de pagamento dos custos administrativos. Q. O Tribunal “a quo” afasta a aplicabilidade do instituto previsto no artigo 32.º n.º 1 RGIT, em virtude do pagamento das taxas de portagem e dos custos administrativos só ter sido efetuado após a data de cessação do contrato entre a Via Verde e a [SCom01...], Lda. R. O motivo invocado na sentença para afastar a aplicação do instituto da dispensa a coima não pode ser acolhido, isto porque, se a recorrente tivesse efetuado o pagamento das taxas e custos administrativos dentro do período de validade do contrato este não teria cessado. S. Nem teria sido instaurado o presente processo de contraordenação. T. Quando o n.º 1 do artigo 32.º do RGIT estatui como requisito de aplicabilidade, entre outros, a falta cometida estar regularizada, obviamente esta regularização terá de se ter verificado ao longo do processo. U. A decisão em crise deu como provado que as taxas de portagem e custos administrativos estavam integralmente liquidados. – conforme ponto 13 dos factos provados V. Tal como estabelece o n.º 2 do artigo 32.º do RGIT para a atenuação especial da coima onde está previsto que a situação tributária deverá estar regularizada até à decisão do processo. W. Pelo que é facilmente percetível que o Tribunal errou ao não aplicar o instituto da atenuação especial da pena. X. Relativamente à não aplicação do instituto da atenuação especial da coima, o fundamento utilizado foi o da falta de assunção de responsabilidade da recorrente. Y. A recorrente sempre assumiu a responsabilidade pelo pagamento das taxas de portagem. Z. Só assim se explica que, por diversas vezes, tenha solicitado à concessionária e esta nunca permitiu que a recorrente efetuasse o pagamento das taxas de portagem. AA. Não nos podemos esquecer que o facto gerador do processo de contraordenação é o não pagamento das taxas de portagem, por violação dos artigos 5.º n.º 1 b) e 7.º da Lei 25/06 de 30/06 e não o não pagamento das taxas administrativas. BB. E quanto a essas a recorrente sempre se considerou devedora, ou seja, sempre se considerou responsável pelo seu pagamento, tentando por diversas formas efetuar o seu pagamento sem que tal lhe fosse permitido. CC. Sem esquecer que, ao efetuar o pagamento das taxas de portagem e dos custos administrativos antes do final do processo a recorrente está a assumir a sua responsabilidade no crédito da concessionária. DD. Não restando assim dúvidas que o Tribunal “a quo”, mais uma vez, errou ao não aplicar o instituto da atenuação especial da pena, ou em alternativa a admoestação. EE. Ao contrário do que alegou o Tribunal na decisão que se recorre a via Verde Portugal tem, ao abrigo da boa fé contratual, o dever de informar porque motivo o pagamento foi recusado, informação que lhe é transmitida pela instituição bancária. Nestes termos e nos mais de Direito, que V.ªs Ex.ªs mui doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente Recurso e; a) Ser revogado o Acordão por erro notório na apreciação da prova, b) Subsidiariamente, e caso não seja o entendimento perfilado, deverá ser aplicado a recorrente dispensada da coima, nos termos do artigo 32.º n.º 1 do RGIT. c) Ou em alternativa deverá a coima aplicada ser especialmente atenuada, nos termos do artigo 32.º n.º 2 do RGIT. Decidindo deste modo, V.ªs. Exªs. farão, como sempre, JUSTIÇA.” **** A Recorrida e o Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto não responderam. **** Tendo os autos sido remetidos ao Ministério Público, nos termos das disposições conjugadas da alínea b) do artigo 3.º, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), do artigo 74.º, n.º 4 do Regime Geral das Infracções de Mera Ordenação Social (RGIMOS) e do n.º 1 do artigo 416.º do Código de Processo Penal (CPP), o digníssimo Magistrado junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso. **** Tendo em vista ponderação de questão de conhecimento oficioso, consubstanciada na eventual aplicabilidade de regime concretamente mais favorável, foram notificados todos os intervenientes processuais para se pronunciarem acerca da possível aplicabilidade a estes procedimentos de contra-ordenação da Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, que entrou em vigor em 01/01/2022, dando nova redacção, nomeadamente, aos artigos 29.º, 30.º, 31.º, 32.º do Regime Geral das Infracções Tributárias e aditando o artigo 28º-A ao mesmo diploma. Não foi emitida qualquer pronúncia. **** Dispensam-se os vistos nos termos das disposições conjugadas dos artigos 418.º, 419.º e 4.º do Código de Processo Penal e, supletivamente, do artigo 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil ex vi alínea b) do artigo 3.º do Regime Geral das Infracções Tributárias e n.º 4 do artigo 74.º do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social, sendo o processo submetido à conferência para julgamento. **** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR O presente recurso segue a tramitação do recurso em processo penal, tendo em conta as especialidades que resultam do Regime Geral das Infracções de Mera Ordenação Social (RGIMOS); pelo que o objecto do recurso é delimitado pelas respectivas conclusões [cfr. artigo 412.°, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP) ex vi artigo 74.°, n.º 4 do RGIMOS], excepto quanto aos vícios de conhecimento oficioso. Assim, será ponderada a aplicabilidade a estes procedimentos de contra-ordenação da Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, que entrou em vigor em 01/01/2022, dando nova redacção, nomeadamente, aos artigos 29.º, 30.º, 31.º, 32.º do Regime Geral das Infracções Tributárias e aditando o artigo 28º-A ao mesmo diploma, dado que, além do mais, está em análise no recurso a verificação dos pressupostos da dispensa das coimas, da atenuação especial das mesmas e da sua substituição por admoestação. III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Com interesse para a decisão da causa, consideram-se provados os factos seguintes: 1. No serviço de finanças do ... foram instaurados os Processos de contraordenação n.s: ...48, ...21, ...13, ...98, ...80, ...75, ...20, ...55, ...12, ...56, ...78, ...11, ...99, ...65, ...46, ...90, ...38, ...20, ...11, ...03, ...81, ...73, ...21, ...30, ...48, ...56, ...64, ...31, ...23, ...40, ...15, ...07, ...19, ...35, ...43, ...51, ...99, ...10, ...25, ...33, ...41, ...80, ...99, ...02 e ...10 - confrontar autos de notícia nos autos; 2. Pela falta de pagamento das taxas de portagem nas passagens efetuadas pela viatura com a matrícula ..-TL-.., no período entre setembro de 2017 e janeiro 2018 - confrontar autos de notícia nos autos; 3. Nas datas e locais constantes dos autos de notícia que integram estes autos e que aqui se dão por integralmente reproduzidas; 4. A arguida apresentou defesa representada por defensor, juntando procuração - fls. 35 e ss., de 24, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 5. Em resposta a Via Verde comunicou à AT, além do mais, o seguinte: “Após análise, informamos que em 05-10-2017 verificou-se que o cartão bancário associado ao Identificador n.º ...36 se encontrava inválido para débito, por caducidade/renovação/anulação ou outro motivo, pelo que não era possível efetuar o débito das passagens realizadas. Face a esta situação, a Via Verde Portugal solicitou por diversas vezes a regularização desta situação, através do envio de e-mail para o endereço ..........@..... em 16-10-2017 e 021 1-2017, e por escrito a 20-1 1- 2017. Ao não existir qualquer manifestação positiva para que a situação fosse regularizada, foi despoletada a rescisão do contrato em 05-01-2018 para o Identificador n.º ...36, tendo o mesmo sido rescindido a 27- 02-2018 - cfr. fls. 48, de 96; 6. Em cada processo de contraordenação aqui apensados foi prestada informação sobre a defesa apresentada pela arguida - cfr. informações nos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 7. Em cada processo de contraordenação aqui apensados foi proferida decisão de fixação da coima - confrontar decisões de fixação da coima nos autos; 8. Cuja notificação foi enviada diretamente à arguida - cfr. notificações das decisões nos autos e informação prestada pela entidade administrativa; 9. O legal representante da arguida foi à loja da via verde para saber porque tinha dívidas com a mesma, tendo-lhe sido informado que eram problemas com o cartão bancário; 10. A arguida procurou pagar as taxas de portagem sem os custos administrativos exigidos - cfr. fls. 44, de 24; 11. Em 30.09.2017 a arguida possuía na Conta à Ordem n.º ...63, do Banco 1... o montante de €9.548,92 - cfr. fls. 48 e ss., de 24; 12. A falta de cobrança das portagens deveu-se a caducidade do cartão bancário associado ao identificador em causa - declarações do arguido; 13. A arguida pagou as portagens e os custos administrativos exigidos após a cessação do contrato referido - declarações do arguido; 14. Em 29.05.2019 foi apresentado o presente recurso - carimbo na petição de recurso; 15. Por ofício de 20.09.2019 a AT repetiu a notificação da fixação da coima desta vez dirigida ao mandatário da arguida - cfr. fls. 73, de 2061; 16. A arguida não agiu com o cuidado que podia e devia ao não associar o novo cartão bancário ao identificador em causa. * Factos não provados: com interesse para a decisão da causa não foram apurados. Motivação. A matéria de facto foi considerada provada com base na análise crítica e conjugada dos documentos e informações oficiais juntas aos presentes autos, não impugnados para os quais se remete em cada facto, nomeadamente, autos de notícia, defesa da arguida, informação sobre a defesa, despacho de concordância, decisões de fixação da coima. Foram ainda valoradas as declarações do gerente da arguida, da forma seguinte: O tribunal ficou convencido que o gerente da arguida falou a verdade em audiência. Pelo mesmo foi dito, em síntese, que se deslocou várias vezes à loja da via verde para tentar perceber o que se estava a passar, ao receber um correio eletrónico que lhe dava conta da existência de dívidas àquela entidade. O gerente da arguida disse que ali foram capazes de esclarecer o que se passava, pois sabia que a conta estava provisionada. Disse ainda que teve conhecimento que a falta de cobrança das passagens se devia ao facto de o cartão bancário associado ao identificador em causa ter caducado e não ter associado o novo cartão, porque não se apercebeu e ainda pelo facto de ter outros identificadores associados à mesma conta, apesar de a outros cartões bancários que continuavam a fazer os pagamentos das taxas de portagem respetivas. Disse também que não sente responsável pelas dívidas, nomeadamente os custos administrativos porque não foi por culpa sua que os pagamentos não foram efetuados no momento das passagens. Portanto, o cartão bancário associado ao identificador em casa caducou e a arguida não fez a atualização do novo cartão bancário associando-o ao identificador, razão pela qual as entidades competentes não conseguiam proceder à cobrança das taxas de portagem. Das declarações do arguido resulta que o mesmo não se sente responsável pela falta de pagamento e pelos custos administrativos inerentes porque nunca lhe foi dito concretamente qual era o problema, isto é, porque razão não conseguiam proceder à cobrança das taxas de portagem atempadamente. Não está em causa a prática dos factos que a arguida assume, mas sim a responsabilidade pela não cobrança das portagens no momento devido.” 2. O Direito No âmbito do presente recurso jurisdicional, foram todos os intervenientes processuais notificados para se pronunciarem acerca da possível aplicabilidade a estes procedimentos de contra-ordenação da Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, que entrou em vigor em 01/01/2022, dando nova redacção, nomeadamente, aos artigos 29.º, 30.º, 31.º, 32.º do Regime Geral das Infracções Tributárias e aditando o artigo 28º-A ao mesmo diploma. Trata-se de lei nova, em matéria contra-ordenacional, estabelecendo um novo regime sancionatório, com alterações relevantes no que toca à dispensa, redução e atenuação das coimas aplicáveis. Para melhor ponderação desta questão de conhecimento oficioso, foram os intervenientes processuais alertados que, na determinação da coima aplicável, em caso de alteração do regime legal, há que verificar qual o regime concretamente mais favorável, considerando o disposto no n.º 4, parte final, do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa, no n.º 4 do artigo 2.º do Código Penal e no n.º 2 do artigo 3.º do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social. Contudo, nenhum emitiu qualquer pronúncia. Vejamos. Em 27 de Fevereiro entrou em vigor a Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, que veio reforçar “as garantias dos contribuintes e a simplificação processual, alterando a Lei Geral Tributária, o Código de Procedimento e de Processo Tributário, o Regime Geral das Infracções Tributárias e outros actos legislativos”. Estando em causa nos presentes autos decisão de aplicação de coima por infracção ao disposto nos artigos 5.º, n.º 1, alínea b) e 7.º da Lei n.º 25/2006, de 30/06, por falta de pagamento de taxa de portagem, com respeito pelos limites previstos no artigo 26.º e tendo sido fixada a medida concreta da coima nos termos do disposto no artigo 27.º, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), mostra-se relevante o RGIT ter sido objecto de recente alteração e aditamento pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, que, em concreto, procedeu à alteração dos artigos 29.º, 30.º, 31.º, 32.º, 40.º, 41.º, 58.º, 70.º, 75.º, 79.º, 80.º, 83.º, 84.º, 92.º, 96.º, 97.º, 108.º e 128.º e aditamento dos artigos 28.º -A, 32.º -A e 112.º -A. Cumpre atentar às alterações impostas ao RGIT, em sede do regime de dispensa, redução e atenuação das coimas, cuja entrada em vigor ocorreu a 01 de Janeiro de 2022 (vide artigo 17.º da Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro). De entre as alterações ao RGIT, há precisamente a destacar as que directamente têm a ver com medida e aplicação da coima e sanções acessórias, entre as quais a dispensa, redução e atenuação das coimas. Estabelece-se a dispensa de coima (artigo 29.º do RGIT) quando, nos cinco anos anteriores, o agente não tenha sido condenado por decisão transitada em julgado, em processo de contra-ordenação ou de crime por infracções tributárias, ou beneficiado de dispensa ou de pagamento de coima com redução. A dispensa de coima aplica-se ainda às situações em que (i) não esteja em causa a falta de entrega da prestação tributária e (ii) o agente tenha cumprido as obrigações tributárias que deram origem à infracção. Deixa de ser expressamente exigido, nesta sede, um diminuto grau de culpa. Fica estipulada a redução do valor da coima para 12,5% ou 50% do montante mínimo legal, respectivamente, nas situações em que as coimas tenham sido pagas, a pedido do agente, e o pagamento for apresentado (i) sem que tenha sido levantado auto de notícia, recebida participação ou denúncia ou iniciado procedimento de inspecção tributária, ou (ii) até ao termo do prazo para apresentação de audição prévia no âmbito de procedimento de inspecção tributária (artigo 30.º do RGIT). Sublinhe-se que, adquirido o conhecimento da prática de infracção, se prevê a notificação do infractor informando-o de que pode, em 30 dias, regularizar a situação tributária e exercer o direito à redução de coima (artigo 28.º-A do RGIT). Com relevo, surgem ainda as alterações em sede de atenuação especial das coimas. A reformulação do regime de atenuação especial das coimas (artigo 32.º do RGIT) esclarece o momento em que o infractor – que reconhece a sua responsabilidade e regulariza a situação tributária - pode pedir a atenuação da coima: no decurso dos 30 dias concedido para a defesa e, ainda que, nas situações em que haja lugar à atenuação especial da coima, os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos para metade, não podendo resultar um valor inferior ao que resultaria da aplicação do artigo 30.º, nem ser inferior a 25€. A entidade competente pode limitar-se a proferir uma admoestação quando a reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente o justifique. É manifesto, desde logo, de entre as alterações, a regra de notificação para regularização e para exercício do direito à redução, que consta do artigo 28.º-A, que não existia no regime anterior. Depois, temos o artigo 29.º que passa a prever a chamada dispensa das coimas (que anteriormente estava prevista no n.º 4 do mesmo artigo e no 32.º, n.º 1 do RGIT) quando o regime anterior só permitia tal possibilidade para pessoas singulares, não abrangendo as pessoas colectivas e, mesmo em caso de reincidência o n.º 2 não afasta agora a possibilidade de mesmo assim ser aplicada a dispensa de coima, a requerer em 30 dias, desde que se verifiquem cumulativamente as seguintes circunstâncias: “a) A prática da infracção não ocasione prejuízo efectivo à receita tributária; b) Estar regularizada a falta cometida”. Mais, estarmos perante um regime mais favorável advém ainda do regime quanto à redução de coimas, pois tal como resulta do artigo 30.º, em que a redução que então no anterior regime oscilava entre 12,5%, 30% e 75% (artigo 29.º, n.º 1 da lei anterior), apresenta agora valores inferiores e, bem assim, do regime da atenuação especial das coimas agora previsto. As principais alterações, referidas, prendem-se com a objectividade que as mesmas transmitem aos regimes de dispensa, redução e atenuação de coima, exemplos disso são: (i) passar, desde logo, a estar definido que não pode ser aplicada coima quando o agente, nos cinco anos anteriores, não tenha: a) Sido condenado por decisão transitada em julgado, em processo de contra-ordenação ou de crime por infracções tributárias; b) beneficiar de dispensa ou de pagamento de coima com redução nos termos do RGIT; (ii) ser eliminado o requisito do “diminuto grau de culpa” e definido o conceito de “prejuízo efectivo”; (iii) o alargamento aos sujeitos passivos colectivos da possibilidade de dispensa de coima nas situações em que o agente, nos cinco anos anteriores, não tenha sido condenado por decisão transitada em julgado em processo de contra-ordenação ou de crime por infracções tributárias e beneficiado de dispensa ou de pagamento de coima com redução. Posto isto, não podemos olvidar que, em matéria penal, como em matéria contra-ordenacional, vigora por imperativo constitucional e legal a regra da aplicação retroactiva da lei mais favorável – cfr. artigos 29.º, n.º 4 da CRP, 2.º, n.º 4 do Código Penal e 3.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, aplicável ex vi artigo 3.º, alínea b) do RGIT aplicável “ex vi” artigo 18.º da Lei n.º 26/2006, de 30 de Junho – daí que o facto de em causa nos autos estarem contra-ordenações praticadas em data anterior à da entrada em vigor da Lei nova não constitui obstáculo a essa aplicação se esta lei se revelar mais favorável, enquanto não ocorrer decisão com trânsito em julgado (cfr. neste sentido os acórdãos do STA de 21.10.2015 proferidos nos recursos n.ºs 719/15, 808/15, 833/15, 983/15, 1043/15 e 1059/15 e de 04.11.2015, nos recursos n.ºs 1042/15 e 1062/15 e vastíssima jurisprudência emanada pelos Tribunais Superiores em matéria penal). E é precisamente isso que sucede in casu. Com as alterações introduzidas ao RGIT, pela Lei n.º 7/2021, ao dar nova redacção aos artigos do RGIT em matéria de dispensa, atenuação e redução da coima, o legislador introduziu, como já referimos, um conjunto de mudanças em sede das consequências jurídicas da infracção, no sentido de concretizar e tornar mais objectiva a aplicação daqueles regimes, ao alargar a sua aplicação às pessoas colectivas (e, estamos in casu, perante uma sociedade), ao introduzir ex novo determinados condicionalismos para funcionar o regime de redução (artigo 28º - A), aumentando os valores percentuais de redução da coima, e a possibilidade de substituição da coima por admoestação. Qualquer destas hipóteses, não previstas no regime contra-ordenacional em vigor na altura da aplicação das coimas à Recorrente, a se justificar no caso em apreço, é mais favorável àquela. Perante o exposto, impõe-se, necessariamente, nova graduação das coimas aplicadas, que tenha agora em conta as disposições do RGIT que entraram em vigor no dia 01 de Janeiro de 2022, o que necessariamente implica uma nova decisão administrativa de aplicação da coima, nomeadamente com cumprimento da imposição do artigo 28.º - A e verificação de determinados condicionalismos, havendo que apurar da regularização da situação tributária, o seu momento temporal, ocorrência ou não de situações anteriores de aplicação de coimas para aferir da reincidência e, perante tais elementos, proceder à atenuação/redução das coimas ou mesmo dispensa, a verificarem-se os pressupostos legais da sua aplicação, o que implica uma reapreciação para aplicação do novo regime – cfr., neste sentido, Acórdão deste TCA Norte, de 06/10/2022, proferido no âmbito do processo n.º 361/16.0BEAVR. Pelas razões expostas, as decisões administrativas de aplicação das coimas sindicadas nos presentes autos, referentes a infracções praticadas em diversas datas no período entre Setembro de 2017 e Janeiro de 2018, não se podem manter, desde logo, porque haverá que graduar as coimas aplicadas, atendendo aos novos regimes de redução, dispensa e atenuação da pena e, eventualmente, retirar as legais consequências dos mesmos, o que apenas poderá ser feito de modo adequado e eficiente pelos próprios serviços da autoridade administrativa, que não por este tribunal ad quem, a quem não cabe substituir-se à Administração nas decisões de aplicação de coimas, antes escrutinar se tais decisões são conformes à Lei e ao Direito. Neste ensejo, deverão também os serviços da autoridade administrativa levar em linha de conta as alterações introduzidas pela Lei n.º 27/2023, de 04/07, na Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho, que igualmente se repercutem nas decisões de aplicação e na determinação das coimas questionadas nos autos, dado que a lei referida contém uma norma transitória (cfr. artigo 3.º), que estabelece que aos processos de contra-ordenação pendentes a 1 de Julho de 2024 se aplica o regime que, nos termos da lei geral, for mais favorável ao arguido. Trata-se de lei nova, em matéria contra-ordenacional, que altera o valor das coimas aplicáveis às contra-ordenações ocorridas em matéria de infra-estruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagens, devendo, além do mais, atender às alterações introduzidas pela Lei n.º 27/2023, de 04/07, ao artigo 7.º da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho. As decisões de aplicação de coimas que estão na origem dos presentes autos foram tomadas em momento anterior ao da entrada em vigor das novas Leis (01/01/2022 e 01/07/2024), mas estas repercutem-se inelutavelmente nelas, como supra demonstrado, impedindo que possam subsistir nos termos em que foram proferidas. Impõe-se, em consequência, a baixa dos autos à Autoridade Administrativa para que esta tenha a oportunidade de as rever ou renovar, em conformidade com o novo quadro legal, o que se determina. Conclusão/Sumário Concluindo-se que as alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro, no Regime Geral das Infracções Tributárias, em sede de dispensa, redução e atenuação especial das coimas, se repercutem na decisão de aplicação e na medida da coima questionada nos autos – por imposição constitucional e legal do princípio da aplicação retroactiva da lei nova mais favorável - haverá que, oficiosamente, determinar a remessa do processo à autoridade administrativa para que esta reveja ou renove tal decisão em conformidade com essas alterações em vigor, introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro (bem como pela Lei n.º 27/2023, de 04/07). IV. Decisão Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e determinar a remessa dos procedimentos contra-ordenacionais à autoridade administrativa, para que reveja ou renove as decisões de aplicação de coima, em conformidade com as alterações em vigor introduzidas pela Lei n.º 7/2021, de 26 de Fevereiro (bem como pela Lei n.º 27/2023, de 04/07). Sem custas, por delas estar isento o Ministério Público [cfr. artigo 4.º, n.º 1, alínea a) do Regulamento das Custas Processuais]. Porto, 12 de Setembro de 2024 [Ana Patrocínio] [Vítor Salazar Unas] [Maria do Rosário Pais] |