Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00037/03.8BTPRT |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 12/03/2020 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Margarida Reis |
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Descritores: | IMPUGNAÇÃO JUDICIAL; IRS; LAPSO NOS REGISTOS CONTABILÍSTICOS; DECLARAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO; PREFERÊNCIA ABSOLUTA DO MEIO JUDICIAL DE IMPUGNAÇÃO SOBRE OS MEIOS ADMINISTRATIVOS; PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO; VERDADE MATERIAL; PROVA; ART. 100.º DO CPPT |
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Sumário: | Não pode a Administração fiscal recusar a correção de um eventual lapso nos registos contabilísticos do Impugnante, que aliás os assume e, precisamente, pretendia ver corrigidos e negar a adequada investigação sobre a materialidade das operações subjacentes, com fundamento na divergência entre a declaração retificada com a que se pretende corrigir. Tendo o Impugnante feito o esforço probatório possível e exigível nas circunstâncias concretas do caso, o mesmo deve ser valorado a seu favor.* * Sumário elaborado pela relatora |
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Recorrente: | M. |
Recorrido 1: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer no sentido da procedência do recurso. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório M., inconformado com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 2019-07-30, que julgou improcedente a impugnação judicial em que é Impugnante, assim mantendo o despacho que indeferiu a reclamação graciosa n.º 3387/400087.0 e a consequente liquidação adicional de Imposto sobre as Pessoas Singulares (IRS), referente ao exercício de 1997 no montante de EUR 43.007,32, vem dela interpor o presente recurso. O Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “CONCLUSÕES: 1ª - O tribunal a quo não conheceu da questão relacionada com a desconsideração da AT no cálculo da mais valia em relação ao custo de aquisição de dois reclamos luminosos adquiridos pelo recorrente pelo preço de 3.990,38 euros (800.000$00). 2ª - Tendo tal questão sido suscitada pelo recorrente na sua impugnação, e tendo sido objeto de discussão pelas partes e sujeita ao contraditório em sede de audiência de julgamento, não podia o tribunal recorrido deixar de proceder à sua apreciação em obediência ao prescrito pelos artigos 125.º, 1 do CPPT e do artigo 615.º, 1 al. d) do CPC. 3ª- Tal omissão de pronúncia geral a nulidade da sentença recorrida nessa parte. 3ª - Sem prescindir, face aos documentos juntos aos autos, conjugados com o depoimento da testemunha A., o tribunal a quo devia ter dado como provado que o impugnante adquiriu os 2 reclamos luminosos a que respeitam o documento de fls 87 dos autos pelo preço de € 3.990,38 (800.000$00) e que esse valor devidamente atualizado de acordo com os coeficientes de atualização da moeda não foi considerado pela AT no apuramento da mais valia, podendo o tribunal de recurso alterar este ponto concreto da matéria de facto nos termos do n.º 1 do artigo 640.º do CPC, obviando à arguida nulidade. 4ª - Face à prova testemunhal produzida conjugada com os documentos constantes dos autos e com as regras da experiência comum, o tribunal não podia dar como não provado que “Em 1984, o impugnante adquiriu por trespasse o estabelecimento, pelo preço de 4.600.000$00” e que “O preço de 4.600.000$00 foi pago”. 5ª - Ao invés, o tribunal devia ter dado como provado que a transmissão do estabelecimento comercial dos autos, se operou por acordo entre o impugnante e o então proprietário e senhorio do espaço físico onde se encontrava instalado, tudo na sequência da “Promessa de trespasse” de 02/03/1984 e devia ter dado como provado que essa transmissão foi feita pelo preço de 4600 contos que o impugnante pagou. 6ª - Do confronto do documento de fls. 8 e 9 com o documento de fls. 10 a 12 dos autos, não podia o tribunal recorrido deixar de concluir que o impugnante adquiriu efetivamente o estabelecimento comercial em questão, pois de outro modo não poderia proceder à transmissão desse mesmo estabelecimento decorridos 13 anos após a celebração do contrato promessa celebrado em 02/03/1984. 7ª - Tal é até contrário às regras da lógica e da experiencia comum, sendo que quanto ao pagamento do valor inicial de 2.000 contos essa prova resulta até do próprio contrato promessa (fls. 8 e 9), que consubstancia nessa parte uma declaração de quitação por parte do credor ao devedor (impugnante), documento que o tribunal não valorou devidamente como se impunha. 8ª O tribunal não valorizou devidamente o depoimento da testemunha C., e o fundamento invocado pelo tribunal recorrido para o desvalorizar o seu depoimento não se apresenta correto face ao teor do mesmo. 9ª - Trata-se de uma testemunha crucial no que a este negócio respeita, concentrava em si à data da promessa de trespasse a propriedade do espaço onde o estabelecimento se encontrava instalado e, simultaneamente, a propriedade do próprio estabelecimento. 10ª - A motivação adiantada por esta testemunha para a não realização da escritura de trespasse é perfeitamente aceitável e credível e não é a circunstância de ter referido que já estavam na fase final de liquidação do preço do trespasse e por isso é que acordaram fazer um arrendamento em vez da escritura de trespasse que retira credibilidade a este depoimento. 11ª - Se é certo que à data da celebração desse contrato de arrendamento (19.04.1985 – documento de fls. 89 a 92 dos autos) como bem referiu a senhora juiz a quo, ainda faltariam 2.000 contos para pagamento do preço do trespasse (do valor de 4.600 contos, 2.000 contos foram pagos em 02.03.1984; 600 contos foram pagos em 31 de Março de 1985 e depois 14 prestações de 140 contos e uma de 40m contos com inicio as de 140 contos em 30.04.85) também é certo que a testemunha referiu « ..foi feito um contrato de arrendamento porque já estávamos na final de liquidação do senhor B. chegamos a um acordo de um contrato de arrendamento... ele entregou-me as letras e pronto fizemos o contrato de arrendamento».- Sic com destaque nosso a itálico e a negrito. 12ª - A testemunha justificou a celebração do arrendamento em substituição da escritura de trespasse, não só pelo facto de já ter recebido mais de metade do valor, (2600 contos dos 4600 acordados) mas também pelo facto de ter acordado com o impugnante a entrega das letras que titulavam as prestações ainda vincendas aludidas no contrato promessa, o que não tem nada de estranho, bem pelo contrário, tal versão encontra suporte no texto do próprio contrato promessa, pois tendo sido acordado que a escritura de trespasse seria celebrada no prazo de 90 dias (clausula 4ª do contrato promessa) e, nada tendo sido declarado em sentido contrário, seria nessa data da outorga da escritura que as letras/cheques que titulariam as prestações mensais teriam de ser entregues, como de resto é até usual acontecer. 13ª - Ora, não tendo aquela escritura sido celebrada, as letras também não tinham de ser entregues, e daí ter toda a lógica o depoimento da testemunha ao dizer que acordaram o arrendamento e que as letras foram entregues nessa data pelo recorrente. 14ª - Não podia, pois, este depoimento ser desconsiderado pelo tribunal a quo, tanto mais que as letras de câmbio enquanto títulos de crédito são livremente transmissíveis e possibilitam até ao portador, por via do endosso, salvo cláusula não à ordem, antecipar o pagamento dos montantes que titulam, e do depoimento da testemunha pode legitimamente deduzir-se que considerou a entrega das letras de câmbio como pagamento ou garantia suficiente do pagamento do valor em divida e daí o acordo da substituição da escritura de trespasse pela escritura de arrendamento. 15ª - A justificação avançada por esta testemunha para além de credível é completamente consentânea com as práticas ou usos comerciais em matéria de trespasses, quase sempre efetuados com pagamento de pelo menos metade do valor do preço na data da celebração do contrato promessa/escritura e o remanescente ficar titulado/garantido por letras de câmbio ou cheques. 16ª- O tribunal também não valorou devidamente o depoimento da testemunha E., responsável pela escrita do impugnante durante 13 anos, desde 1984 até finais de 1996. 17ª - Esta testemunha prestou um depoimento sério e credível tendo referido «comecei a ser contabilista dele logo na altura (referenciando-se à data da celebração da promessa de trespasse)....nunca vi o contrato... mas ele dizia-me que eu ia lá sempre no inicio do mês para receber...ele começou a meter pessoal na segurança social e eu ia lá a receber as faturas a receber o dinheiro para a segurança social e ele dizia-me, meta-me o cheque só a partir do dia 10 porque eu tenho de pagar a letra ao antigo senhorio do trespasse, na altura andava à volta de cento e tal contos...» e à pergunta: estas despesas não eram tratadas contabilisticamente, não havia registo disto...? Respondeu: «Ele na altura tinha uma contabilidade muito simples, eram só as compras e as vendas, não era obrigatório proceder ao registo dessas despesas porque era um contribuinte da classe C». Quando inquirido: Estes 4600 contos do trespasse o senhor sabe se foram pagos...? Respondeu: «...ai isso foi que ele estava a pagá-los e disse-me na altura quando acabou de pagar, andou um ano e tal quase dois anos para isso...». 18ª - Esta testemunha declarou não saber a razão de não ter sido celebrada a escritura de trespasse mas referiu «eu presumo que foi pelo facto de ele (referindo-se ao promitente trespassante) ser o proprietário, para além de ser dono do estabelecimento ser o proprietário, o que torna as coisas mais simples...». 19ª - E não valorou também devidamente o depoimento da testemunha A., que assumiu as funções de TOC do recorrente desde Janeiro de 1997 até à data das duas declarações de IRS que deram origem à liquidação impugnada, resulta reforçada a aquisição do estabelecimento em causa por parte do impugnante bem como o pagamento do respetivo preço de 4600 contos. 20ª - Esta testemunha para além de assumir expressamente os erros cometidos no preenchimento da 1ª declaração de IRS apresentada pelo recorrente no respeitante ao exercício de 1997, explicou ainda as razões que o levaram a elaborar a declaração de substituição, reconhecendo ter omitido na 1ª o custo de aquisição do estabelecimento e o mapa de reintegrações e amortizações de onde se afere a existência dos reclames luminosos e o custo de aquisição por 800 contos. 21ª - E no que respeita ao pagamento efetivo dos 4600 contos do trespasse referiu e à razão da não outorga da escritura definitiva, referiu «...é uma situação que eu não averiguei porque é que ela não foi feita, a única preocupação incidiu em ver se o contrato promessa de trespasse obedecia aos parâmetros normais de uma transação comercial desta natureza e obedecia, eu também soube porque confirmei com o contabilista anterior que tinha sido pago e entretanto mais tarde também vi que numa daquelas contas correntes que normalmente utilizamos ao lado do livro de cheques, o senhor Manuel Moura apontava lá pagamento de letras do trespasse». À pergunta da representante da Fazenda Pública: o senhor viu as letras...? Respondeu: «não vi porque elas já tinham sido todas pagas, agora o que digo, que também me falou nisso o senhor G. que fazia anteriormente a contabilidade que também me confirmou que inclusive havia documentação que só lhe era entregue após o dia dez por causa do pagamento dessa letra».- Sic destaque nosso a negrito e a itálico. 22ª - Ante o depoimento destas três testemunhas, entendemos que o tribunal podia e devia ter concluído de forma diversa e ter dado como provado que a transmissão do estabelecimento comercial dos autos, se operou por acordo entre o impugnante e o então proprietário e senhorio do espaço físico onde se encontrava instalado, tudo na sequência da “Promessa de trespasse” de 02/03/1984 e devia ter dado como provado que essa transmissão foi feita pelo preço de 4600 contos que o impugnante pagou. 23ª - Tal prova resulta da conjugação dos aludidos depoimentos testemunhais, que não obstante terem sido produzidos a uma distância de 22 anos sobre a data dos factos (testemunhas ouvidas a 16.11 e 05.12 de 2006 e os factos ocorreram em 1984), revelaram-se credíveis no seu todo, sendo despicienda a circunstância de a testemunha C. não ter sabido esclarecer “a existência ou inexistência de recibos” alusivos aos pagamentos (facto invocado pelo tribunal recorrido para retirar credibilidade ao depoimento desta testemunha) o que nem sequer é de censurar ou estranhar atenta a distância temporal da ocorrência dos factos relativamente à data em que a testemunha foi ouvida (22 anos). 24ª -Por outo lado, o tribunal não atendeu à circunstância de à data dos factos o recorrente estar inserido num regime de contabilidade da letra C, hoje designada por contabilidade não organizada, e nessa altura não estar sujeito à obrigação de registo das diversas operações contabilísticas e, nessa ótica é perfeitamente justificável que o registo contabilístico do preço de aquisição do estabelecimento e a elaboração dos mapas de reintegrações e amortizações só tenha sido tratado a partir do momento em que passou a integrar obrigatoriamente o regime de contabilidade organizada (na altura designada por letra A) e tal só ocorreu a partir de 01 de Janeiro de 1997, e daí ser perfeitamente compreensível a falta de registo na sua escrita da operação do custo de aquisição do estabelecimento e os diversos pagamentos efetuados para pagamento dessa aquisição. 25ª - Exigir ao recorrente uma prova documental inequívoca do pagamento do preço de aquisição do estabelecimento decorrido todo este tempo é uma autêntica probatio diabólica. 26ª - O recorrente demonstrou ao tribunal ser-lhe impossível obter cópia de documentos bancários alusivos ao pagamento das prestações tituladas por letras, porquanto após ter sido notificado pelo tribunal para esse efeito (02/06/2004), veio no 02 de Julho de 2004 (fls. 62 dos autos) juntar requerimento a informar ter-lhe sido negado pelo banco Totta & Açores e pelo Banco Comercial Português cópia de todos os saques de C. ocorridos no período de 01 de Abril de 1985 a 30 de Junho de 1986 e requereu ao tribunal para «...oficiar as referidas entidades bancárias no sentido destas vierem juntar aos autos comprovativos dos saques acima referidos, como cópia dos extratos referentes ao aludido período» - Sic com destaque nosso a negrito. 27ª - Por mero lapso certamente, o tribunal nada ordenou na sequência do dito requerimento, podendo e devendo o tribunal pelo menos ter concluído que o recorrente fez tudo o que estava ao seu alcance para lograr obter prova documental desses pagamentos e se tal não ocorreu não foi por culpa sua nem por falta de iniciativa da sua parte, pois quem requereu o meio probatório nos termos que o recorrente o fez é porque para além de estar de boa fé e de querer colaborar com a realização da justiça material, está também seguro da verdade, ou seja, de que fez esses pagamentos mas está impossibilitado de juntar melhor prova documental. 28ª - Por outro lado ao depoimento prestado pela testemunha C. deve ser atribuído o melhor valor probatório, por ter sido interveniente no negócio de trespasse, e não é a circunstância de não o contrato promessa de trespasse não ter sido convertido em escritura definitiva, que obsta a que se considere que o estabelecimento foi transmitido para o recorrente. 29ª - Nem obsta a que o custo de aquisição tenha de ser tido em conta no apuramento da mais valia resultante da segunda transmissão. 30ª - Para consideração desse custo no cálculo da mais valia basta que o recorrente tenha efetivamente suportado o custo que pretende ver considerado independentemente da validade formal do negócio. 31ª - Entendimento diverso, seria contrário aos princípios da tributação do rendimento real e da capacidade contributiva. 32ª - Porque o recorrente indicou os concretos pontos da matéria de facto incorretamente julgados e os concretos meios probatórios constantes do processo e da gravação de prova nele existentes que impõem decisão diversa da decisão recorrida sobre aqueles pontos da matéria de facto impugnados, e tendo sido dado cumprimento ao disposto na al. a) a c) do n.º 1 e al. a) do n.º 2 do Art. 640.º do CPC está o tribunal de recurso habilitado a proceder à alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos do disposto no artigo 662.º, 1 do CPC, dando como provado que a transmissão do estabelecimento comercial dos autos, se operou por acordo entre o impugnante e o então proprietário e senhorio do espaço físico onde se encontrava instalado, tudo na sequência da “Promessa de trespasse” de 02/03/1984 e devia ter dado como provado que essa transmissão foi feita pelo preço de 4.600 contos que o impugnante pagou. 33ª - Os documentos juntos com as presentes alegações para além de reforçarem o depoimento das testemunhas referenciadas nas presentes alegações, apontam no sentido de o impugnante ter adquirido efetivamente o estabelecimento comercial dos autos bem como o pagamento do preço acordado, e contribuem indubitavelmente para alteração da decisão da 1ª instância sobre os dois pontos da matéria de facto sindicados, dando-se como provado a factualidade diversa conforme aludido no ponto anterior. 34ª - Ao decidir como decidiu, o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento e violou também o disposto nos artigos 615.º, 1, al. a) do CPC, e arts. 342.º, 351.º do Código Civil.” Termina pedindo: “Nestes termos e, nos mais de direito, aplicáveis, que serão objeto de douto suprimento por parte deste tribunal de recurso, V.ªs Ex.ªs, senhores Juízes Desembargadores, revogando a decisão recorrida e, substituindo-a por outra, que julgue procedente a impugnação judicial deduzida pelo recorrente com anulação da liquidação de IRS do exercício de 1997, farão como sempre sã e acostumada JUSTIÇA!” *** A Recorrida não contra-alegou.*** A Digna Magistrada do M.º Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, por entender, em síntese, que se deve considerar “justificada a junção dos documentos e o seu teor na análise dos factos, dando credibilidade às declarações das testemunhas”.*** Os vistos foram dispensados, com a prévia anuência dos Juízes-Adjuntos.*** Questões a decidir no recursoCumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações de recurso. Assim sendo, importa apreciar se a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia ou se se encontra ferida por erro de julgamento. II. Fundamentação II.1. Fundamentação de facto Na sentença prolatada em primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz: “Factos provados A. Em 02/03/1984 foi celebrada “Promessa de trespasse” com o seguinte teor: [imagem que aqui se dá por reproduzida] Fls 8 e 9. B) O Impugnante adoptou o regime de contabilidade organizada a partir de 01/01/1997 e antes dessa data encontrava-se em regime de contabilidade não organizada. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Depoimentos prestados por A. e por E.. C) Em 08/08/1997 foi celebrado “Trespasse” com o seguinte teor: [imagem que aqui se dá por reproduzida] (…)___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 10 a 12. D) Em 09/04/1999, o Impugnante entregou a declaração modelo 3 de I.R.S. do ano de 1997, da qual constam os seguintes valores no Anexo C: - campo 212 do quadro 09 “proveitos e ganhos extraordinários”: 29.661.590$00 - campo 317 do quadro 14 “Mais-valias fiscais…”: 0$00 - campo 329 do quadro 14 “Mais- valias contabilísticas”: 0$00 - campo 4.2. do quadro 22 “Alienação de imobilizações corpóreas”: 29.661.590$00 - campo 4.3. do quadro 22 “Alienação de imobilizações incorpóreas”: 0$00 _________________________________________________________________ Fls 13 a 27. E) Em 19/08/1999, o Impugnante entregou a declaração modelo 3 de I.R.S. de substituição do ano de 1997, da qual constam os seguintes valores no Anexo C: - campo 212 do quadro 09 “proveitos e ganhos extraordinários”: 25.061.590$00 - campo 317 do quadro 14 “Mais-valias fiscais…”: 15.818.859$00 - campo 329 do quadro 14 “Mais- valias contabilísticas”: 25.061.590$00 - campo 4.2. do quadro 22 “Alienação de imobilizações corpóreas”: 11.661.590$00 - campo 4.3. do quadro 22 “Alienação de imobilizações incorpóreas”: 13.400.000$00 ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 28 a 35. F) Junto com as declarações referidas nas alíneas anteriores, foram apresentados os “Mapas de reintegrações e amortizações” do exercício de 1997. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 34 e 35 dos autos e 50 e 51 do P.R.G. G) Foi elaborado “Mapa das mais-valias e menos-valias fiscais” do exercício de 1997. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 47 do P.R.G.. H) A declaração referida na alínea D) deu lugar à liquidação n.º 5132197660, no montante de 8.622.193$00 (€ 43.000,72). ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 5 do P.R.G. I) Em 30/10/1999, foi emitida a Certidão de dívida no valor de 8.622.193$00 e instaurado o P.E.F. n.º 3387991031139 na Repartição de Finanças do Porto - 7.º Bairro fiscal. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 6 do P.R.G. J) Em 02/05/2000, o Impugnante apresentou requerimento dirigido ao Director Distrital de Finanças do Porto, pedindo a convolação da declaração de substituição referida na alínea E) em reclamação graciosa. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 1 a 4 do P.R.G. K) Em 09/10/2001 foi proferida “Informação” pelo Chefe de Finanças-Adjunto do Serviço de Finanças do Porto 7, com o seguinte teor: [imagem que aqui se dá por reproduzida] Fls 59 e 60 do P.R.G. L) Em 04/07/2003 foi proferida “Informação” por Inspector Tributário da Direcção de Finanças do Porto, com o seguinte teor: [imagem que aqui se dá por reproduzida] Fls. 64 a 67 do P.R.G.. M) Sobre a “Informação” referida na alínea anterior foi proferido: - “Parecer: Confirmo o teor do presente relatório de inspecção, onde se propõe o indeferimento da presente reclamação. Remeta-se ao 7.º Serviço de Finanças do Porto.” - “Despacho”: Concordo”. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 63 do P.R.G. N) Em 01/08/2003 foi proferida “Informação” pelo Chefe de Finanças-Adjunto do Serviço de Finanças do Porto 7, com o seguinte teor: [imagem que aqui se dá por reproduzida] Fls 81 e 82 do P.R.G. O) Em 01/08/2003, foi proferido “Despacho” pelo Chefe do Serviço de Finanças com o seguinte teor: “Concordo com a presente proposta de decisão e indefiro a petição”. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 63 do P.R.G. P) Em 19/04/1985 foi celebrado “Arrendamento” com o seguinte teor: “(…) Primeiros - C., … Segundo - M.,… E pelos primeiros outorgantes foi dito: - Que, pela presente escritura dão de arrendamento ao segundo outorgante a fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente a um estabelecimento comercial no rés-do-chão com entrada pela Rua (…), números trezentos e sessenta e um e quatrocentos e nove, com o número onze, constituída por instalações para estabelecimento comercial … Que este arrendamento é feito nos termos e sob as cláusulas e condições constantes dos artigos seguintes: Primeiro – O prazo da sua duração é de um ano, com inicio em um de Março do corrente ano e a terminar em vinte e oito de Fevereiro de mil novecentos e oitenta e seis, podendo prorrogar-se e presumindo-se renovado, nos termos da lei. Segundo – A renda anual é de quatrocentos e oitenta mil escudos, que o arrendatário deverá pagar em duodécimos… Terceiro – O local arrendado destina-se a estabelecimento comercial de mercearia fina, charcutaria, confeitaria e mini mercado, …” ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fls 88 a 92. Factos não provados 1. Em 1984, o Impugnante adquiriu por trespasse o estabelecimento, pelo preço de 4.600.000$00. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Artigos 2.º da P.I.. 2. O preço de 4.600.000$00 foi pago. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Artigos 25.º da P.I.. Motivação da decisão da matéria de facto O acervo de factos provados baseou-se no exame do teor dos documentos constantes dos autos, do P.A. e do P.R.G., que não foram impugnados, conforme referido, em concreto, em cada uma das alíneas do probatório. Os depoimentos prestados pelas testemunhas serviram apenas para prova do facto descrito na alínea B) dos factos provados, conforme decorre da valoração feita pelo Tribunal e que se apresenta em seguida. Foram prestados depoimentos por quatro testemunhas arroladas pelo Impugnante: A., E., A. e C.. A., prestou serviços de T.O.C. ao Impugnante, entre Janeiro de 1997 até ao trespasse do estabelecimento, tendo explicado as circunstâncias em que procedeu à entrega da declaração modelo 3 de I.R.S. e à entrega da declaração de substituição, afirmando que esta foi apresentada devido a erro por si praticado na primeira declaração, por não ter considerado a aquisição do trespasse. Mais afirmou que elaborou as declarações e os mapas de amortizações e de mais valias e que antes de 1997 o Impugnante estava num regime de contabilidade não organizada, tendo, a partir de Janeiro de 1997, passado para o regime de contabilidade organizada, o que motivou a mudança de contabilista e a sua contratação. Relativamente ao alegado trespasse ocorrido em 1984, referiu apenas que teve acesso ao contrato promessa e que o anterior contabilista disse-lhe que o valor da aquisição do trespasse foi pago por letras. Prestou um depoimento sério e credível, mas que apenas relevou para prova do facto alegado no artigo 19.º da P.I. (facto provado sob a alínea B)), uma vez que os outros factos que descreveu já resultam provados por documentos (a existência do contrato promessa de trespasse, a submissão das declarações de I.R.S. e a existência dos mapas de amortizações e de mais valias) e relativamente à alegada aquisição do trespasse não demonstrou possuir um conhecimento directo. E., afirmou realizar os registos (de compras e vendas) nos livros da actividade do estabelecimento do Impugnante desde 1984 até finais de 1996, altura em que o impetrante viu-se obrigado a possuir contabilidade organizada e a mudar de contabilista pois já tinha de ser um T.O.C. a tratar da contabilidade. Afirmou que o Impugnante lhe disse que C. lhe tinha trespassado o estabelecimento por cerca de 5.000 contos e que pagava o valor através de letras durante quase dois anos, mas nunca viu o contrato promessa, nem recibos, nem meios de pagamento. Mais disse que nunca viu nem conhece C. e desconhece o motivo pelo qual não foi feita a escritura de trespasse. Prestou um depoimento sério e credível, mas que apenas relevou para prova do facto alegado no artigo 19.º da P.I. (facto provado sob a alínea B)), uma vez que não revelou qualquer conhecimento directo da alegada aquisição do trespasse. A., comerciante, afirmou ter sido fornecedor do Impugnante e que explorava o estabelecimento desde 1984, supondo que o fazia com base num trespasse por ser essa a operação usual quando se toma conta de um estabelecimento, tendo ouvido o Impugnante e os seus irmãos falarem de um valor de cerca de 5.000 contos. Afirmou que não presenciou o negócio e desconhece os seus termos. O seu depoimento mostrou-se irrelevante para a prova dos factos alegados. C., afirmou ser proprietário do imóvel e ter trespassado o estabelecimento ao Impugnante em 1984, por 4.600 contos e que este valor foi pago com uma entrada de 2.000 contos e o resto por letras. Mais disse que celebraram promessa de trespasse e que não foi realizada a escritura do trespasse porque o pagamento do valor dos 4.600 contos já estava na fase final e em vez de fazerem a escritura do trespasse que já estava praticamente pago, optaram por fazer um contrato de arrendamento. Ora, a motivação avançada pela testemunha não colhe, uma vez que na data de celebração do contrato de arrendamento – 19/04/1985 – ainda faltariam pagar 2.000 contos, pois, tal como decorre do contrato promessa de trespasse, quatorze prestações de 140 contos cada e uma prestação de 40 contos seriam pagas por cheques ou letras com datas de vencimento posteriores àquela data. Esta constatação abalou inelutavelmente a credibilidade desta testemunha. Por outro lado, revelou desconhecer elementos importantes do alegado negócio, tal como a existência ou inexistência de recibos. Face ao exposto, o depoimento prestado por esta testemunha não foi considerado pelo Tribunal. Os factos dados como não provados resultaram da ausência de produção de prova pelo Impugnante, a quem incumbia o ónus da prova. De facto, o documento apto a comprovar a existência do trespasse seria a escritura (dispunha o n.º 3 do artigo 1118.º, na versão do C.C. em vigor à data dos factos, que “O trespasse só é válido se for celebrado por escritura pública.”), que ao que se apurou, nunca chegou a ser feita apesar de no contrato promessa vir referido que a escritura de trespasse seria efectuada no prazo máximo de 90 dias a contar de 02/03/1984. Por outro lado, nem o contrato promessa de trespasse, nem o contrato de arrendamento têm a virtualidade de provar a aquisição do estabelecimento por trespasse. Ademais, não foram apresentados quaisquer documentos concernentes ao alegado pagamento do valor de aquisição (letras, recibos, extractos bancários, etc) e nem dos depoimentos prestados pelas testemunhas decorre provada a existência do trespasse ou o pagamento.” *** Entende este Tribunal que no caso em apreço deve fazer uso do disposto no n.º 1 do art. 662.º do CPC, aplicável ex vi art. 281.º do CPPT, nos termos do qual o Tribunal de segunda instância “… deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.Entende-se ainda ser deferir a junção dos dois documentos apresentados com as alegações de recurso, requerida pelo Recorrente, argumentando para o efeito só agora os ter conseguido descobrir nos seus arquivos pessoais e que a necessidade da sua junção se tornou mais evidente em face do julgamento proferido em 1.ª instância. Assim sendo, a respetiva junção é de admitir nos termos do disposto nos arts. 651.º, n.º 1 e 425.º do CPC, aplicáveis ex vi art. 281.º do CPPT, disposições nos termos das quais depois do encerramento da discussão são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento. Atende-se aqui à circunstância particular de na data de celebração do negócio a que dizem respeito os documentos agora juntos, o Impugnante não dispor de contabilidade organizada, tornando mais difícil a localização e preparação da documentação que ao mesmo diz respeito. Assim, aos factos dados como provados pelo Tribunal a quo são aditados os seguintes: Q) Em 1984, o Impugnante adquiriu o estabelecimento objeto da “Promessa de trespasse” referida no ponto A por força da sua cedência onerosa por C., na sequência de um acordo verbal entre ambos (depoimento da testemunha C.). R) O Impugnante explorou o estabelecimento comercial entre 1984 e 1997-08-08 (depoimento da testemunha A.). S) O Impugnante registou no canhoto do seu livro de cheques três pagamentos efetuados/titulados por letras, com as menções, respetivamente, “4/7/85 letra da confeitaria 140.000$00”, “5/8/85 letra paga em cheque 140.000$00” e “7/9/85 desconto de letra 140.000$00” (cf. cópia do canhoto, a fls. 230 dos autos). T) Em 25 de julho de 1997, o Impugnante adquiriu dois “reclamos luminosos NEON” por PTE 800.000,00 (EUR 3.990,38) que foram afetos ao estabelecimento comercial sito na Rua (…), n.º 409 loja (cf. documento titulando “venda a dinheiro”, a fls. 87 dos autos, e depoimento das testemunhas A. e E.). U) Do alvará n.º 8541 emitido pelo Município do Porto para exploração do estabelecimento de “confeitaria” sito na Rua (…), n.º 409 loja, consta um averbamento a favor do Impugnante, em 4 de julho de 1985, e um segundo averbamento, a favor de O., Lda., em 30 de janeiro de 1997 (cf. cópia do alvará, a fls. 231 a 232 dos autos). Quanto aos factos dados como não provados pelo Tribunal a quo, são substituídos pelo seguinte facto, não provado nos presentes autos: 1. Que tenha sido celebrada a escritura pública de trespasse objeto da “Promessa de trespasse” referida no ponto A. *** No que diz respeito à motivação da presente alteração e aditamento à decisão sobre a matéria de facto do Tribunal a quo, a mesma funda-se nos documentos que são especificados, e no depoimento das testemunhas referenciadas.Este Tribunal reaprecia assim o depoimento prestado por C., que no que diz respeito à transferência onerosa do estabelecimento comercial em causa, objeto da “Promessa de trespasse” celebrada em 1984-03-02 (cf. ponto A, da fundamentação de facto), foi corroborado pelos depoimentos prestados pelas restantes testemunhas, e em particular, por A., fornecedor do Impugnante, que atestou a circunstância de o Impugnante ter explorado o estabelecimento em causa desde essa data e até ao seu subsequente trespasse – ocorrido em 1997-08-08 (cf. ponto R, da fundamentação de facto). De facto, tem razão o Recorrente quando afirma que este depoimento não devia ter sido desvalorizado pelos motivos adiantados na sentença recorrida, a saber, porque “na data de celebração do contrato de arrendamento – 19/04/1985 – ainda faltariam pagar 2.000 contos, pois, tal como decorre do contrato promessa de trespasse, quatorze prestações de 140 contos cada e uma prestação de 40 contos seriam pagas por cheques ou letras com datas de vencimento posteriores àquela data” e porque a testemunha “… revelou desconhecer elementos importantes do alegado negócio, tal como a existência ou inexistência de recibos.”. Com efeito, o facto de na data da celebração do contrato de arrendamento ainda faltarem pagar 2.000 contos é perfeitamente consentâneo e coerente com o conjunto do depoimento prestado, uma vez que o que esta testemunha afirmou foi, precisamente, que foi celebrado o contrato de arrendamento porque encontrando-se na fase final a liquidação dos pagamentos, foi acordado entre si e o Impugnante a celebração de um contrato de arrendamento (cuja celebração em 1985-04-19 resulta provada no ponto P, da fundamentação de facto), tendo-lhe então o Impugnante entregue as letras referentes aos pagamentos em falta. Por outro lado, o facto de ter afirmado perante o Tribunal já não se recordar, a uma distância de mais de vinte anos, exatamente como foi feita a quitação dos montantes que recebeu pelo negócio, é plausível, não justificando a desvalorização do seu depoimento – recorde-se que as testemunhas foram ouvidas em 16 de novembro de 2006, tendo o negócio sobre o qual depuseram ocorrido em 1984/85. Sublinhe-se que tendo sido diretamente interrogado pela Juíza que presidiu à inquirição de testemunhas sobre se o pagamento teria sido efetuado apenas parcialmente (relativamente a três prestações) ou totalmente através de letras, foi perentório em afirmar que recebeu a totalidade do montante acordado de PTE 4.600.000 (EUR 22.944,68), constante do contrato de promessa de trespasse, através de letras. Esta afirmação é também coerente com o depoimento das testemunhas A. e E., em particular, deste último, que explicou que tinha instruções do Impugnante para apenas dar andamento aos fluxos financeiros da firma depois do dia 10 de cada mês, de modo a não prejudicar o pagamento das prestações devidas por este negócio. É também consentânea com o facto de o Impugnante ter registado no canhoto do seu livro de cheques vários pagamentos feitos através do desconto de letras, ou através de cheque titulado por letra (cf. ponto R, da fundamentação de facto). II.2. Fundamentação de Direito Importa apreciar se a sentença recorrida padece da nulidade por omissão de pronúncia e do erro de julgamento que lhe são imputados pelo Recorrente. Antes de mais, importa assentar em que, ainda que a presente ação tenha sido interposta em 2003-08-22, data em que a PI foi entregue na Repartição de Finanças do então 7.º Bairro Fiscal do Porto (tal como resulta do carimbo aposto a fls. 2 dos autos pelos respetivos serviços), atendendo a que a sentença recorrida foi proferida em 2019-07-30 (após a data de entrada em vigor da Lei n.º 41/2013, que ocorreu em 2013-09-01, tal como resulta do respetivo art. 8.º), é de aplicar supletivamente e por força da remissão constante no art. 281.º do CPPT, o regime aplicável aos recursos constante no CPC posterior às alterações introduzidas pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, tal como resulta do disposto nos arts. 5.º, n.º 1 e 7.º, n.º 1 da referida Lei (cf. neste sentido, GEMAS, Laurinda – Introdução. A aplicação da lei no tempo. In O Novo Processo Civil. Contributos da Doutrina para a Compreensão do Novo Código de Processo Civil Caderno I. 2.ª edição. Lisboa: Centro de Estudos Judiciários, 2013. Disponível na internet: http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/Caderno_I_Novo%20_Processo_Civil_2edicao.pdf>, pág. 40). Ora, desde já se antecipa que é de dar razão ao Recorrente. Vejamos. Começa o Recorrente por imputar à sentença recorrida uma nulidade, por omissão de pronúncia, argumentando que a impugnação judicial teve por fundamento não apenas a desconsideração para o cálculo da mais valia do valor de aquisição do estabelecimento comercial, mas também a circunstância de a AT não ter tido em conta no respetivo computo o custo de aquisição de outros elementos do imobilizado corpóreo corrigido igualmente de acordo com os coeficientes de desvalorização da moeda, concretamente do valor de € 3.990,38 (800.000$00) referente ao custo de aquisição de um reclame luminoso, tendo o Impugnante junto documentos e apresentado testemunhas que depuseram sobre esta matéria. Mais refere, nas suas alegações de recurso, que esse fundamento decorre dos artigos 10.º, 11.º e 26.º da respetiva PI. No despacho proferido pelo Tribunal a quo nos termos do disposto no n.º 1 do art. 617.º do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT, é referido que “perscrutado o teor da petição inicial … verifica-se que tal questão não foi suscitada na mesma, pelo que não existiu qualquer omissão de pronúncia …”. De facto, tal alegação não resulta da PI, na qual não é feita qualquer menção ao custo de aquisição de outros elementos do imobilizado corpóreo, concretamente do valor de € 3.990,38 (PTE 800.000) correspondente ao custo de aquisição de um reclame luminoso, como pretende o Recorrente. Nos artigos da PI que menciona é apenas feita referência, em termos genéricos, ao valor resultante da aplicação do coeficiente de desvalorização da moeda “sobre os restantes bens do imobilizado corpóreo”, em momento algum ali mencionando o custo de aquisição destes bens, e muito menos se individualizando o custo do referido reclame luminoso. No entanto, resulta claro que a questão que pretende ver apreciada foi expressamente suscitada na reclamação graciosa n.º 3387-00/400087.0, apensa aos presentes autos, e que resulta da convolação da declaração de substituição da declaração modelo 3 de IRS referente ao exercício de 1997 que apresentou em 1999-08-19, e cujo ato de indeferimento é objeto imediato da impugnação judicial aqui em causa. Ora, nos termos do disposto nos n.ºs 2 e 3 do art. 111.º do CPPT (e antes, nos n.ºs 5 a 7 do art. 130.º do Código e Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 154/91, de 23 de abril), as reclamações graciosas referentes ao ato objeto da impugnação judicial, sejam elas apresentadas antes ou depois da interposição da impugnação judicial, serão apensas a esta e nela consideradas, para todos os efeitos. A lei expressa deste modo a preferência absoluta do meio judicial de impugnação sobre os meios administrativos, pelo que “será o tribunal e não a administração tributária que fará a apreciação das questões suscitadas na reclamação graciosa ou no recurso hierárquico, no âmbito do processo de impugnação judicial” (cf. SOUSA, Jorge Lopes de - Código de procedimento e de processo tributário anotado e comentado, Volume II. Lisboa: Áreas Editora, 2011, pág. 241), independentemente de os fundamentos de uma e outra serem ou não os mesmos. Donde, ao não apreciar esta questão, que foi suscitada na reclamação graciosa em causa, o Tribunal a quo incorreu não no vício de nulidade, mas antes no de erro de julgamento, por fazer uma errada interpretação do disposto nas supracitadas normas do CPPT. Estando todos os elementos necessários para a resolução desta questão disponíveis nos autos, a mesma será conhecida por este Tribunal, em substituição, tal como determinado no art. 615.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi art. 281.º do CPPT, sem necessidade de mais, uma vez que a Fazenda Pública já se pronunciou sobre a matéria nos arts. 9.º e 10.º da respetiva Contestação, aliás, aderindo à argumentação do Relatório de Inspeção que sustentou o ato de indeferimento da reclamação graciosa em causa. Com efeito, no balancete que acompanhou a declaração de substituição que esteve na origem da Reclamação em apreço, o Recorrente fez constar uma alteração na conta “42”, ali tendo considerado como imobilizado corpóreo o(s) reclame(s) luminoso(s) em questão, no montante de PTE 800.000 (EUR 3990,38), e que anteriormente tinham sido considerados na conta “43”. Procedeu assim, e como é referido no relatório de inspeção, a uma transferência do saldo neste montante da conta “43” (imobilizações incorpóreas), para a conta “42” (“imobilizações corpóreas”). A Administração fiscal entendeu não ser de aceitar esta retificação, fundamentada no facto de as obrigações contabilísticas do Recorrente não terem sido corretamente cumpridas, em tempo. No Relatório de Inspeção que fundamentou o ato de indeferimento da reclamação é referido, a propósito que “Tendo em consideração que a contabilidade é uma ciência balizada pelo facto de as contas anuais darem uma imagem verdadeira e apropriada da posição financeira e dos resultados das operações das empresas, sendo alicerçada, nomeadamente, nas obrigações contabilísticas já referidas, é incompreensível que, para além da situação evidenciada no ponto anterior, após o encerramento das contas do ano de 1997, o Balancete do Razão imprimido em 08/04/1999, apresente valores, em contas como “Imobilizações Corpóreas”, “Imobilizações Incorpóreas”, “Capital”, etc., totalmente divergentes do Balancete do Razão emitido em 18/08/1999, o que retira toda e qualquer credibilidade aos elementos “contabilísticos” apresentados pelo sujeito passivo.”. O Recorrente, no âmbito da reclamação graciosa, e na impugnação judicial, assume que houve lapsos na contabilidade referente ao exercício de 1997, que pretende corrigir, e prova a materialidade subjacente ao registo contabilístico que pretende ver corrigido. A Administração fiscal indefere a sua pretensão de ver corrigida a declaração modelo 3 de IRS em consequência de correção dos seus registos contabilísticos, com fundamento em que “os registos contabilísticos do reclamante não são fiáveis quanto à demonstração do alegado” (tal como resulta da informação datada de 2003-08-01, cf. ponto N da fundamentação de facto). No Relatório de Inspeção Tributária em que se sustenta esta informação, e logo, o ato de indeferimento, é referido a propósito que “Não é aceitável que, estando abrangido pelo regime de contabilidade organizada, a que se referia o artigo 109.º do Código do IRS (ao tempo), sendo-lhe, como tal, aplicáveis as obrigações contabilísticas, no que concerne à execução, suporte e registo, de acordo com a lei comercial e fiscal, nomeadamente, o disposto no artigo 98.º e tendo em conta o n.º 3 do artigo 17.º, ambos do Código do IRC (ao tempo), o sujeito passivo somente registe uma operação de trespasse após o dia 08/04/1999 (data da emissão do Balancete do Razão que acompanhou a primeira declaração de rendimentos apresentada relativamente ao ano de 1997) que deveria estar titulada por escritura e outros documentos relativos ao pagamento, através de um contrato de promessa datado de 02/03/1984 (cerca de 15 anos antes). (…) Tendo em consideração que a contabilidade é uma ciência balizada pelo facto de as contas anuais darem uma imagem verdadeira e apropriada da posição financeira e dos resultados das operações das empresas, sendo alicerçada, nomeadamente, nas obrigações contabilísticas já referidas, é incompreensível que, para além da situação evidenciada no ponto anterior, após o encerramento das contas do ano de 1997, o Balancete do Razão imprimido em 08/04/1999, apresente valores, em contas como “Imobilizações Corpóreas”, “Imobilizações Incorpóreas”, “Capital”, etc., totalmente divergentes do Balancete do Razão emitido em 18/08/1999, o que retira toda e qualquer credibilidade aos elementos “contabilísticos” apresentados pelo sujeito passivo” (cf. ponto L, da fundamentação de facto). Ora, o IRS é um imposto, que enquanto tal, não incorpora qualquer caráter sancionatório (cf., a este propósito, NABAIS, José Casalta - Direito fiscal. 11.ª edição. Coimbra: Almedina, 2019, pág. 34 e segs.), pelo que se a Administração fiscal concluir pela existência de uma qualquer eventual irregularidade ou imprecisão declarativa e/ou contabilística e pretender sancioná-la, deverá espoletar a correspondente previsão contraordenacional, se for caso disso, e não recusar a respetiva retificação, com o consequente impacto fiscal. Por outro lado, a Administração fiscal na sua atividade procedimental deve respeito, entre outros, ao princípio do inquisitório e da verdade material, tal como decorre do disposto no art. 58.º da LGT, sendo que a busca da verdade não se limita às situações em que a mesma beneficie a Administração. Com efeito, “porque a efetivação do princípio da investigação é um direito dos contribuintes, são anuláveis os atos tributários e outros, conclusivos de procedimentos, em que se mostre que a administração não cumpriu, dentro dos limites do razoável, com as obrigações que para ela decorre de tal princípio.” (cf. MORAIS, Rui Duarte - Manual de procedimento e processo tributário. Reimpressão da edição de 2012. Coimbra: Almedina, 2016, pág. 66). Ou seja, um eventual lapso nos registos contabilísticos do Impugnante, que aliás os assume e, precisamente, pretendia ver corrigidos através da Reclamação em apreço, não pode ser sancionado através da não aceitação da correção, e da adequada investigação sobre a materialidade das operações subjacentes, como pareceu pretender a Administração fiscal no ato impugnado. Pelo que, e em vez de recusar as alterações com fundamento na existência uma divergência entre a declaração de substituição e a declaração substituída, deveria antes ter averiguado adequadamente se o Impugnante estava em condições de produzir prova da materialidade das alterações pretendidas. De facto, levada esta argumentação às últimas consequências, nunca um contribuinte poderia ver qualquer imprecisão ou falha corrigida, pois, pela natureza das coisas, a correção sempre divergirá do que se pretende ver corrigido. Em face do exposto, e provado que está que os reclames luminosos foram adquiridos em 25 de julho de 1997, pelo montante de PTE 800.000,00 (EUR 3.990,38) e afetos ao estabelecimento comercial do Impugnante (cf. ponto S, da fundamentação de facto), deve ser anulado o ato de indeferimento da Reclamação que negou a correspondente correção contabilística e as suas repercussões fiscais, por assim ter feito uma errada interpretação da lei. Quanto à demais argumentação do Recorrente, assenta no facto de não se conformar com a desconsideração pelo Tribunal a quo da prova que fez da operação subjacente à aquisição do estabelecimento comercial e dos respetivos custos, que não foram levados em conta no cálculo da mais valia referente ao trespasse do estabelecimento que efetuou em 1997-08-08 (cf. ponto C, da fundamentação de facto). Entende o Recorrente que face à prova testemunhal produzida conjugada com os documentos constantes dos autos e com as regras da experiência comum, o Tribunal a quo não podia dar como não provado que “Em 1984, o impugnante adquiriu por trespasse o estabelecimento, pelo preço de 4.600.000$00” e que “O preço de 4.600.000$00 foi pago”. Quanto a esta matéria, já se tomou posição supra, através do aditamento e alteração da fundamentação de facto da decisão recorrida. De facto, não pode aqui deixar de se dar razão ao Recorrente. O que resulta do depoimento das testemunhas, conjugado com os documentos que o Recorrente logrou juntar aos autos, permite que se dê como provado que a transmissão do estabelecimento comercial ocorreu a título oneroso, e concretizou-se não através da celebração da escritura de trespasse prometida, mas na sequência de acordo entre o Recorrente e C., então detentor do estabelecimento e proprietário do espaço físico onde o mesmo se encontrava instalado, na sequência da “Promessa de trespasse” celebrada em 1984-03-02 (cf. ponto A, da fundamentação de facto), que se concretizou através do arrendamento do espaço onde se encontrava localizado em 1985-04-19 (cf. ponto P, da fundamentação de facto) no momento em que se chegava à fase final a liquidação dos pagamentos, contra a entrega de letras que titulavam o pagamento do remanescente do valor acordado na promessa de trespasse, de PTE 4.600.000. Nesse sentido converge toda a prova produzida pelo Recorrente, afigurando-se, de resto, totalmente verosímil que assim tenha sucedido. Inverosímil seria que o estabelecimento não tivesse sido transmitido a título oneroso, pois de outro modo não haveria explicação para que durante todo o período que decorreu até 1997-08-08 o Recorrente o tenha explorado (cf. ponto R, da fundamentação de facto), tendo-o nessa data trespassado aos sócios da O., Lda. (cf. ponto C, da fundamentação de facto). O facto de não ter chegado a ser celebrada a escritura pública do trespasse prometido não invalida que a cedência onerosa do estabelecimento comercial tenha ocorrido de outro modo, correspondendo substancialmente a um verdadeiro trespasse (veja-se nesse sentido o Acórdão proferido pelo STJ em 29/01/2003, no proc. 02B4362, disponível para consulta em www.dgsi.pt/jstj), sendo a versão dos acontecimentos narrada ao Tribunal a quo pela testemunha C., cedente do estabelecimento e proprietário do imóvel, verosímil e revelando-se em harmonia com os costumes correntes do comércio. Aqui chegados, importa apreciar a questão referente ao pagamento do montante acordado de PTE 4.600.000 (EUR 22.944,68) para o “trepasse” do estabelecimento comercial, e sua prova. De facto, o Recorrente não logrou produzir prova definitiva de que o pagamento foi efetuado. No entanto, não pode deixar de se concluir que fez o esforço probatório possível e exigível nas circunstâncias do caso, não podendo deixar de se valorarem a seu favor as dúvidas que sobre esta matéria permanecem, nos termos do disposto no art. 121.º do CPT a que veio a suceder o n.º 1 do art. 100.º do CPPT. Senão vejamos. Tal como resulta provado nos autos, o Impugnante, ora Recorrente, apenas adotou o regime de contabilidade organizada a partir de 1997-01-01 (cf. ponto B, da fundamentação de facto), encontrando-se antes dessa data em regime de contabilidade não organizada, tendo sido explicado pela testemunha E. que só nesta data atingiu o volume de negócios que o obrigava a tanto. Ora, não pode deixar de se considerar, porque decorre das regras de experiência comum, constituindo presunção judicial (cf. artigos 349.º e 351.º do Código Civil (CC)), que esta circunstância dificultou a documentação de um negócio que decorreu em 1984/1985. O trespasse que originou a mais valia decorreu em meados do ano em que o Recorrente passou para o regime de contabilidade organizada, motivo pelo qual, e como foi explicado pelas testemunhas A. e E., teve de substituir os serviços de contabilidade, pois o “guarda livros” E., que o acompanhara durante 12 anos de atividade, não estava habilitado a apoiá-lo no regime de contabilidade organizada. Fruto desta circunstância, aliada a um lapso do (novo) contabilista, não foram corretamente declarados perante a Administração fiscal os custos arcados com o trespasse. A tentativa de correção do lapso, de que o Recorrente se terá apercebido, como explicou a testemunha A., quando recebeu a nota de liquidação de IRS do exercício de 1997, através da declaração de substituição, que veio a ser convertida na reclamação graciosa, foi recebida pela Administração fiscal coma argumentação a que já aqui se aludiu supra, ancorando-se na existência de lapsos nos registos contabilísticos para indeferir a pretendida correção, sem que tenha sido promovida qualquer diligência instrutória. De referir ainda que o facto de o pagamento sido feito/titulado por letras, dificultou também o esforço probatório do Recorrente, pois, como refere nas suas alegações de recurso, “as letras de câmbio enquanto títulos de crédito são livremente transmissíveis e possibilitam até ao portador, por via do endosso, salvo cláusula não à ordem, antecipar o pagamento dos montantes que titulam…”. Ainda assim, e como também refere, veio em requerimento entrado nos autos em 2004-07-02, a fls. 63, informar o Tribunal que “após ter solicitado junto do Banco Totta & Açores, S.A., Balcão (…), no qual é titular da conta (…), e junto do Banco Comercial Português, S.A. – Balcão (…), no qual é titular da conta (…), que estes lhe facultassem cópias de todos os saques de “C.”, ocorridos no período de 1 de Abril de 1985 a 20 de Junho de 1986, teve como resposta (verbal) “que não poderia ser obtido”, visto aquelas entidades bancárias somente terem em arquivo os documentos relativos aos dez últimos anos”, e requerer ao Tribunal que se dignasse “oficiar as referidas entidades bancárias no sentido de estas virem juntar aos autos os comprovativos dos saques acima referidos, como cópia dos extractos bancários referentes ao aludido período”, requerimento para o qual nunca obteve qualquer resposta do Tribunal a quo. Entende-se por isso que o Recorrente produziu a prova que lhe foi possível produzir, oferecendo o depoimento das testemunhas pertinentes, maxime C., com quem negociou e a quem pagou a transmissão do estabelecimento, e que confirmou a sua versão dos factos perante o Tribunal, e designadamente, ter recebido a totalidade do pagamento do valor acordado para a mesma, no montante de PTE 4.600.000 (EUR 22.944,68). Pelo que a impossibilidade em que se encontra de produzir prova absoluta e definitiva sobre a concretização do referido pagamento não podia, como foi já referido, ser valorada em seu desfavor, devendo o ato impugnado ter sido anulado. Em face do exposto, não resta senão concluir que a sentença a quo padece de erro de direito e de facto no julgamento, por não ter logrado interpretar adequadamente o regime jurídico aplicável ao caso concreto, e por não ter efetuado uma apreciação correta das provas apresentadas, devendo por isso ser o presente recurso julgado procedente. *** No que diz respeito à responsabilidade por custas, em face da decisão de procedência do presente recurso, a Fazenda Pública decai, aqui e na 1.ª instância, pelo que é sua a responsabilidade pelas custas.No entanto, a impugnação judicial aqui em causa foi interposta em 2003-08-22, data em que se encontrava em vigor Regulamento das Custas dos Processos Tributários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 29/98, de 11 de fevereiro, e entrado em vigor no dia 1998-02-12 (art. 10.º do DL 29/98), em cuja alínea a) do n.º 1 do art. 3.º foi consagrada a isenção subjetiva de custas do “Estado, incluindo os seus serviços e organismos, ainda que personalizados”. Esta isenção deixou de ter consagração legal com a alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de dezembro no art. 2.º do Código das Custas Judiciais. No entanto, aquele DL 324/2003 continha uma disposição transitória no seu art. 14.º, n.º 1, por força do qual as alterações ao Código das Custas Judiciais que introduziu apenas se aplicavam aos processos instaurados após a sua entrada em vigor, que ocorreu em 2004-01-01, nos termos do disposto no n.º 1, do seu art. 16.º. Por sua vez, nos termos do disposto no art. 27.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 34/2008 de 26 de fevereiro, que aprovou o Regulamento das Custas Processuais (RCP), quanto à respetiva aplicação no tempo, a Fazenda Pública continuou a beneficiar da referida isenção, o mesmo se verificando atualmente, após a entrada em vigor das alterações introduzidas ao RCP pela Lei n.º 7/2012 de 13 de fevereiro, a qual, no n.º 4 do respetivo art. 8.º, prevê que: “Nos processos em que as partes se encontravam isentas de custas, (...), e a isenção aplicada não encontre correspondência na redação que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei, mantém-se em vigor no respetivo processo, a isenção de custas.” Assim sendo, e embora responsável pelas custas, em face do seu total decaimento, a Fazenda Pública encontra-se isenta do respetivo pagamento, na 1.ª instância, e no presente recurso. *** Conclusão:Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva: Não pode a Administração fiscal recusar a correção de um eventual lapso nos registos contabilísticos do Impugnante, que aliás os assume e, precisamente, pretendia ver corrigidos e negar a adequada investigação sobre a materialidade das operações subjacentes, com fundamento na divergência entre a declaração retificada com a que se pretende corrigir. Tendo o Impugnante feito o esforço probatório possível e exigível nas circunstâncias concretas do caso, o mesmo deve ser valorado a seu favor. III. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao presente recurso, e em consequência revogar a sentença recorrida e, julgando procedente a impugnação judicial, anular a liquidação impugnada. * Custas pela Fazenda Pública, em ambas as instâncias, sem prejuízo da isenção subjetiva de que beneficia.* Porto, 3 de dezembro de 2020Margarida Reis (relatora) - Cláudia Almeida – Paulo Moura. |