Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01097/10.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/15/2025
Tribunal:TAF de Braga
Relator:PAULA MOURA TEIXEIRA
Descritores:NULIDADE DE SENTENÇA;
DIREITO AUDIÇÃO;
PRINCÍPIO DO APROVEITAMENTO DO ATO;
Sumário:
I. A nulidade da sentença, por excesso de pronúncia pressupõe que a decisão do julgador vá além do que lhe foi pedido pelas partes, ou seja, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do decidido (causa judicandi) não se identifique com a causa de pedir ou com o pedido (causa petendi).

II. Nos termos do n.º 4 do artigo 83.º do CPTA a não consideração como facto provado de factos não especificamente impugnados na contestação, não tem, necessariamente, como conclusão a verificação de erro na apreciação da matéria de facto.

III- Como é sabido e por força do art.º 17.º do CIRC o lucro tributável das pessoas coletivas é constituída pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificados no mesmo período e não refletidas naquele resultado determinados com base na contabilidade eventualmente corrigidos nos termos do código do IRC.

IV - Por sua vez, e por força art.º 18.º do CIRC os proveitos e os custos, assim como outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito de acordo com o princípio da especialização dos exercícios.

V. No entanto, se porventura parte desses proveitos não foram recebidos dos clientes a quem foram prestados, existiam mecanismos ao dispor do sujeito passivo, que lhe permitem constituir provisões para créditos considerados de cobrança duvidosa ou, se fosse o caso, considerá-los incobráveis, nos termos do art.º 39.º do CIRC.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente [SCom01...], UNIPESSOAL, LDª, NIPC. ...70, melhor identificada nos autos, veio interpor recurso jurisdicional de ação administrativa especial do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de impugnação do despacho do Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças ..., de 19.02.2010, que indeferiu o pedido de realização de inspeção à sua contabilidade.

A Recorrente não se conformando com a decisão interpôs recurso com as seguintes conclusões: “(…)
O facto provado 1 tem uma incorrecção, quando refere que a inspecção tributária deu origem a liquidações de IRS, pois o que se verificou foram liquidações de IRS respeitantes a retenções na fonte não efectuadas, pelo que ao abrigo do disposto no artigo 662° do CPC deve promover-se a sua modificação.

A Recorrente considera que ficaram provados, por falta de impugnação e prova documental, os factos constantes dos artigos 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 26, 27, 29, 34 e 37 da p.i., devendo promover-se o seu aditamento ao elenco dos factos provados ao abrigo do artigo 662° do CPC, já que os mesmos são essenciais para a boa decisão da causa.

O Recorrido indeferiu o pedido da Recorrente com o argumento expresso no acto impugnado e transcrito no facto provado 4: "Tendo a matéria contestada no requerimento em apreciação sido determinada em procedimento e inspecção tributária, não pode ser acolhido o pedido para realização de novo procedimento, uma vez que a entidade inspeccionada já teve ao seu dispor os meios de defesa previstos na lei".

O Recorrido não fundamentou a sua decisão alegando que a Recorrente não demonstrou possuir interesse legítimo na pretensão deduzida.

A invocação na sentença recorrida da falta de interesse legítimo por parte da Recorrente constitui um argumento novo, criado pela sentença recorrida, que, além de ilegal, implicou que a Recorrente nunca tivesse tido a oportunidade de se defender.

Os poderes do julgador administrativo consistem em analisar a fundamentação do acto impugnado e verificar se se adequa à lei ou não: não se pode por via de sentença aditar novos argumentos na fundamentação do acto impugnado, quer porque a Recorrente nunca se defendeu dos mesmos, quer porque tal fundamento não correspondeu à vontade da entidade administrativa decisora.

A posição ora veiculada na sentença recorrida viola o disposto no artigo 95°/n° 1 do CPTA, na medida em que o Tribunal "a quo" conhece de questões não suscitadas pelas partes e que não são de carácter oficioso.

Subsidiariamente, ainda assim pode concluir-se que a Recorrente invocou a possibilidade de obtenção de uma vantagem patrimonial muita significativa (não ter de pagar impostos sobre o montante de 1.496.416,70, que afirmou não ter recebido) e explicou com algum detalhe as razões do ocorrido, informando a Administração Fiscal das concretas razões que levaram a que tais proveitos facturados não tivessem sido recebidos.

O interesse legítimo da Recorrente traduziu-se num pedido à Administração Fiscal para que analisasse a sua contabilidade, agora na óptica dos proveitos, por forma a que com rigor se apure o que realmente tem a pagar, pois a inspecção efectuada apenas se debruçou sobre os custos, partindo do princípio que os proveitos declarados eram aqueles e tinham sido recebidos.

10ª A alegação de que nas reclamações graciosas que versam sobre as liquidações esta matéria poderia ser discutida não é viável e colide ainda com a análise contabilística, além de um "pormenor" formal: quando a Recorrente reclamou graciosamente das liquidações esta questão ainda não se havia manifestado, e por isso não pôde utilizar este argumento.

11ª Esta fundamentação da sentença recorrida coloca ainda problemas de ordem prática, não ponderados: perante a explicação da Recorrente, a Administração Fiscal terá de confirmar se os proveitos foram recebidos; para tal, terá de analisar contas bancárias (da Recorrente e seus clientes), terá de contactar os clientes da Recorrente; a Administração Fiscal terá ainda de confirmar junto do IAPMEI o cancelamento dos projectos; ora, a execução destas diligências não se afigura viável num processo judicial.

12ª A alegação na sentença recorrida que a Recorrente se pode defender nos processos em que se analisam as liquidações constitui a própria negação ao exercício do seu direito.

13ª A Recorrente não podia, processualmente, defender-se com a invocação de que os proveitos não foram recebidos, pois tratar-se-ia de facto novo, não analisado pela Administração Fiscal na inspecção tributária efectuada nem nas reclamações graciosas e que esta desconhecia e que, por isso, não faz parte da fundamentação das liquidações.

14ª A fundamentação da sentença encerra uma contradição: se, por um lado, alega que a Recorrente não tem interesse legítimo na nova inspecção, por outro lado conclui que a Recorrente deve fazer a defesa dos seus direitos nos processos em que se discutem as liquidações; ora, tal significa que a Recorrente tem um direito a exercer, logo, teria interesse legítimo na pretensão de realização de uma nova inspecção.

15ª Ao não decidir neste sentido, indeferindo a acção, violou a sentença recorrida o disposto no artigo 2° do D.L. no 6/99, de 08.01.

16ª No que respeita ao segundo vício apontado ao acto impugnado, caso o Recorrido tivesse cumprido a lei, a Recorrente poderia, em sede de audição prévia, ter apresentado a documentação que juntou nestes autos (cfr. requerimento junto em 23.01.2011), concretamente um balancete e uma listagem do IAPMEI com a identificação dos projectos cancelado, além de outra que se justificasse.

17ª No exercício deste seu direito a Recorrente poderia, ainda, ter detalhado mais o seu pedido e contra-argumentado às razões invocadas para o indeferimento.

18ª Entende a Recorrente que a omissão desta formalidade foi muito gravosa para a defesa dos seus direitos, pois se o sentido da decisão lhe fosse comunicado teria tido a hipótese de explicar porque não podia juntar muita documentação (pertencente a terceiros) e, por outro lado, que documentação podia juntar (sua, claro) para que o seu pedido fosse melhor apreciado.

19ª O argumento invocado na sentença recorrida para suprir este vício não pode proceder, sendo que a doutrina ali invocada sobreleva o vício apenas quando os contribuintes se defendem noutras sedes, o que não sucede in casu com a Recorrente.

20ª Considera a Recorrente que na situação dos autos o cumprimento da formalidade preterida teria tido influência no acto final a praticar, pelo que ao decidir no sentido em que o fez incorreu a sentença recorrida na violação do disposto no artigo 60°/n° 1 b) da LGT.

21ª A sentença recorrida interpretou de forma incorrecta os normativos supra indicados (artigo 2° do D.L. n° 6/99, de 08.01 e artigo 60°/n° 1 b) da LGT) e violou o artigo 95°/n° 1 do CPTA.

TERMOS EM QUE deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente, revogando-se a douta sentença recorrida e substituindo-a por outra que, conhecendo do mérito da causa (o que é permitido em face do artigo 149' do CPTA), anule o acto impugnado, assim se fazendo JUSTIÇA..(…)”

A Recorrida, Autoridade Tributária Aduaneira apresentou contra-alegações, não tendo formulado conclusões, pugnando que a sentença recorrida deve ser mantida porquanto fez correta apreciação da prova trazida aos autos bem como fez correta interpretação e aplicação da lei aplicável aos factos, designadamente, do art.º 2°, do DL n° 6 Decreto-Lei n° 6/99, de 8 de janeiro, bem como do art.º 60°, n°1, al. b) da Lei Geral Tributária (LGT).

Dada vista ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no qual consta que a sentença recorrida fez uma correta valoração da prova e acertada interpretação dos factos e aplicação do direito com apoio da doutrina e da jurisprudência, não violando qualquer norma legal, razão pela qual deverá ser mantida na ordem jurídica.

Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos nos termos do n. º4 do art.º 657º, do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões do recurso, nos termos do artigo 608.º n.º 2, artigo 635.º, n.º 4 e 639.º n.º 1, todos do Código de Processo Civil, salvo questões de conhecimento oficioso.
As questões suscitadas resumem-se, em saber se a sentença recorrida incorreu em: (i) nulidade por excesso de pronúncia (ii) erro de julgamento da matéria de facto, e, (iii) erro de julgamento de direito por incorreta interpretou dos artigo 2° do D.L. n° 6/99, de 08.01 e violação da alínea b) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT.

3. DO JULGAMENTO DE FACTO
3.1 Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“(…) 1. A Autora foi alvo de inspeção tributária durante o ano de 2008, a qual incidiu sobre os exercícios de 2004 a 2007, dando origem a liquidações adicionais de I.V.A., I.R.C., Imposto do selo e I.R.S.;
2. A Autora apresentou reclamações graciosas quanto às liquidações referidas no ponto anterior;
3. Em 02.02.2010, a Autora deu entrada na Direção de Finanças ... de requerimento, que terminou do seguinte modo – cfr. doc. 1 junto a fls. 15 e 16 dos autos em suporte físico:
“Resta, por conseguinte, à Requerente solicitar, ao abrigo do disposto no artigo 2° do D.L. n.° 6/99. De 08.01, que seja efectuada nova inspecção à sua contabilidade, aos exercícios de 2004, 2005, 2006 e 2007, relativamente aos impostos abrangidos pela anterior inspecção.
Subsidiariamente, caso seja indeferido o pedido de realização de nova inspecção, requer-se a V. Exa., ao abrigo do disposto no artigo 78° da LGT, a revisão do acto tributário, dado que estão preenchidos os respectivos requisitos legais (os impostos ainda não foram pagos, não decorreu o prazo de 3 anos sobre a prática dos actos tributários de liquidação e verifica-se injustiça notória e ostensiva da qual resulta tributação totalmente desproporcionada com a realidade.”;
4. Pelo ofício ...57, datado de 02.02.2010, foi a Autora notificada do despacho de indeferimento do seu pedido de nova inspeção e de deferimento do pedido de revisão do ato tributário – cfr. doc. 2 junto a fls. 17 a 21 dos autos em suporte físico:
“A – Do pedido de inspecção à sua contabilidade, ao abrigo do Decreto-lei n.º 6/99, de 8 de janeiro
1. Tendo a matéria contestada no requerimento em apreciação sido determinada em procedimento e inspecção tributária, não pode ser acolhido o pedido para realização de novo procedimento, uma vez que a entidade inspecionada já teve ao seu dispor os meios de defesa previstos na lei.
2. Por isso, e no uso das competências que me estão atribuídas, indefiro o pedido de realização de nova inspecção à sua contabilidade, formulado nos termos do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de janeiro.
B – Do pedido de revisão do acto tributário, ao abrigo do artigo 78.º da Lei Geral Tributária
[...]
13. Mas cabendo a competência para apreciação do referido pedido de revisão do acto tributário ao abrigo do artigo 78.º da Lei Geral Tributária, com fundamento em injustiça grave ou notória ao Sr. Director-Geral dos Impostos, deverá proceder-se à instauração do competente processo de revisão oficiosa, remetendo-o à Direcção de Serviços de IRC, para apreciação e decisão.
C – Conclusões
1. Em face do exposto, indefiro o pedido de realização de nova inspecção à sua contabilidade, formulado nos termos do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 6/99 de 8 de Janeiro, e determino a instauração do competente processo de revisão oficiosa, remetendo-o à Direcção de Serviços de IRC, para apreciação e decisão.
2. Notifique-se a requerente do teor do presente despacho”;
5. A presente ação administrativa especial foi remetida a este Tribunal, por correio, em 04.06.2010 – cfr. fls. 22 dos autos em suporte físico.
~
Com interesse e relevância para a decisão a proferir, nada mais se julgou provado ou não provado.(…)”

4.2. DO JULGAMENTO DE DIREITO
4.2.1. Da Nulidade da sentença
Alega a Recorrente que a Administração Tributária não fundamentou a sua decisão alegando que a Recorrente não demonstrou possuir interesse legítimo na pretensão deduzida.
A invocação na sentença recorrida da falta de interesse legítimo por parte da Recorrente constitui um argumento novo, criado pela sentença recorrida, que, além de ilegal, implicou que a Recorrente nunca tivesse tido a oportunidade de se defender.
E que os poderes do julgador administrativo consistem em analisar a fundamentação do ato impugnado e verificar se se adequa à lei ou não. Entende que não se pode por via de sentença aditar novos argumentos na fundamentação do ato impugnado, quer porque a Recorrente nunca se defendeu dos mesmos, quer porque tal fundamento não correspondeu à vontade da entidade administrativa decisora.
E que a posição veiculada na sentença recorrida viola o disposto no n.º 1 do artigo 95.º do CPTA, na medida em que o Tribunal "a quo" conhece de questões não suscitadas pelas partes e que não são de carácter oficioso.
Apreciemos:
Dispõem o n.º 1 do artigo 95.º do CPTA que “A sentença deve decidir todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras.”
Quer a omissão quer o excesso de pronúncia estão relacionados com o dever que é imposto ao juiz, pelo n.º 2 do artigo 660.º (atual 608. º) do CPC, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, ressalvando aquelas que forem prejudicadas pela solução dada a outra não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
A nulidade da sentença, por excesso de pronúncia pressupõe que a decisão do julgador vá além do que lhe foi pedido pelas partes, ou seja, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do decidido (causa judicandi) não se identifique com a causa de pedir ou com o pedido (causa petendi).
E nesta conformidade, será nula, por vício de “ultra petita”, a sentença em que o juiz invoque, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido).
Como se consignou no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 20.15.2015, no processo 0116/14, “(…) importa recordar Alberto dos Reis, sobre o que deve entender-se pelo vocábulo «questões» inserto no art. 660º/agora 608º do CPC, “O juiz, para se orientar sobre os limites da sua actividade de conhecimento, deve tomar em consideração, antes de mais nada, as conclusões expressas nos articulados”, pois a função específica dos articulados consiste exactamente em fornecer ao juiz a delimitação nítida da controvérsia e é pelos articulados que o juiz há-de aperceber-se dos termos precisos do litígio e da «questão ou questões, substanciais ou processuais, que as partes apresentam ao juiz para que ele as resolva», sendo que para «caracterizar e delimitar, com todo o rigor, as questões postas pelas partes, não são suficientes as conclusões que elas tenham formulado nos articulados; é necessário atender também aos fundamentos em que elas assentam. Por outras palavras: além dos pedidos, propriamente ditos, há que ter em conta a causa de pedir», não bastando «que haja coincidência ou identidade entre o pedido e o julgado: é necessário, além disso … que haja identidade entre a causa de pedir (causa petendi,) e a causa de julgar (causa judicandi)» devendo «anular-se, por vício de ultra petita, a sentença em que o juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que as partes, por via de acção ou de excepção, puseram na base das suas conclusões».
E, continua o ilustre mestre a «palavra “questões”, que se lê no art. 660º e no nº 4º do art. 668º ... designa não só o pedido, propriamente dito, mas também a causa de pedir. Desta maneira, quando o juiz julga procedente a acção com fundamento em causa de pedir diversa da alegada pelo autor, conhece de questão que o autor não submeteu à sua apreciação, isto é, de questão de que não devia tomar conhecimento, atento o disposto no art. 660º; a sentença, incorre, portanto, na nulidade prevista na 2ª parte do nº 4º do art. 668º. (...) Desde que a questão se caracteriza pelo pedido e pela causa de pedir, é claro que uma questão fundada em causa de pedir diversa da invocada pela parte … é questão diferente da que a parte submeteu ao conhecimento do tribunal...».(() Cfr. A. Reis, CPC Anotado, Vol. V, anotações ao art. 661º, pp. 53 e ss.) (…)“(destacado nosso).
No caso em análise, a Recorrente/Autora visa a anulação do despacho do Diretor de Finanças ..., datado de 19.02.2010, que indeferiu o pedido de nova inspeção por si apresentado.
Como consta da matéria de facto provada no ponto n.º 4 o despacho, objeto de recurso, indeferiu o pedido com a seguinte fundamentação:
A – Do pedido de inspecção à sua contabilidade, ao abrigo do Decreto-lei n.º 6/99, de 8 de janeiro
1. Tendo a matéria contestada no requerimento em apreciação sido determinada em procedimento e inspecção tributária, não pode ser acolhido o pedido para realização de novo procedimento, uma vez que a entidade inspecionada já teve ao seu dispor os meios de defesa previstos na lei.
2. Por isso, e no uso das competências que me estão atribuídas, indefiro o pedido de realização de nova inspecção à sua contabilidade, formulado nos termos do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de janeiro.(…)”
A sentença recorrida parte da interpretação do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de janeiro dela retirando que do referido normativo resulta que, num pedido de realização de inspeção tributária, devem ser tidos em conta os seguintes elementos: o requerente há de definir o âmbito pretendido, determinando os tributos e os períodos temporais, e há de invocar e provar o interesse legítimo na realização daquela inspeção. E que por força do n.º 6 do artigo aludido, o interesse legítimo consiste em qualquer vantagem que o contribuinte possa obter com o conhecimento exato da sua situação tributária.
A sentença concluiu que no seu requerimento a Autora indicou como âmbito da inspeção os impostos resultantes da inspeção anterior relativos aos anos de 2004 a 2007 – dando por preenchido este pressuposto – mas quanto ao interesse legítimo nada aduziu em concreto. E apreciando se argumentação da Autora/Recorrente era suficiente para preencher o pressuposto do interesse legítimo de que depende o deferimento do requerido. Concluindo que a resposta teria de ser negativa.
Com efeito, entendemos que a sentença recorrida excedeu a sua pronúncia, pois a questão que vinha configurada pelas partes era a de apreciar a legalidade do despacho proferido pelo Diretor Adjunto de Finanças ... que indeferiu o pedido da Autora quanto à realização de nova inspeção à sua contabilidade, nos termos do mesmo.
Tendo a Autora invocado que, após a realização da inspeção tributária aos anos de 2004 a 2007, ocorreram situações que contendem com os resultados entretantos obtidos, imperando a realização de nova inspeção. E que a não ser deferido o requerido será obrigada a pagar impostos injustamente, o que é contrário aos princípios vigentes no nosso ordenamento jurídico.
A Ré/Recorrida contrapôs alegando que a Autora não juntou elementos comprovativos da situação que alega para sustentar a realização de nova inspeção, tendo inclusivamente proibido o acesso às suas contas bancárias, não podendo a Administração Tributária aferir da bondade e validade dos argumentos apresentados nos presentes autos.
Acrescentou, ainda, que, seguindo a contabilidade da Autora - contabilidade organizada-, sempre poderia ter constituído provisões para créditos de cobrança duvidosa.
A sentença recorrida afastou-se da apreciação do ato administrativo em matéria tributário e ainda da versão das partes, tendo como que efetuado uma fundamentação do ato à posterior.
Nesta conformidade teremos de concluir que a sentença recorrida incorreu em excesso pronúncia, a qual tem por consequência a nulidade parcial da sentença nessa parte.
Face ao disposto no art.º 715.º (atual 665º) do CPC, ainda que declare nula a decisão, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação, isto é, cabe a este Tribunal conhecer do mérito dessa parte, em substituição, se os autos fornecerem os necessários elementos.
Nesta conformidade, dispondo este tribunal dos elementos necessários para decidir em substituição, dela tomará conhecimento após apreciação do erro de julgamento de facto.

4.2.1- Do Erro de julgamento de facto
A Recorrente nas conclusões (1. a 2.) pretende que seja corrigido o ponto n.ºs 1 da matéria dada como provada e aditados factos constantes dos artigos 4 a 11, 26, 27, 29, 34 e 37 da petição inicial, na medida em que deviam ter sido considerados provados, por não terem sido impugnados ou contraditados pelo recorrido e serem relevantes para a boa decisão da causa.
No que concerne ao n.º 1, mostra-se irrelevante a correção pois não tem qualquer interferência com a decisão da causa.
Relativamente a dar como provados aos artigos 4 a 11, 26, 27, 29, 34 e 37 da petição inicial por não terem sido impugnados ou contraditados importa trazer à colação o disposto artigo 83.º, n.º 4 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) no qual consta que: “Sem prejuízo do disposto no n.º 6 do artigo 84.º, a falta de impugnação especificada nas ações relativas a atos administrativos e normas não importa confissão dos factos articulados pelo autor, mas o tribunal aprecia livremente essa conduta para efeitos probatórios.”
Nesta conformidade, nos termos do n.º 4 do artigo 83.º do CPTA a não consideração como facto provado de factos não especificamente impugnados na contestação, não tem, necessariamente, como conclusão a verificação de erro na apreciação da matéria de facto.
Aliás, diga-se que para considerar alguns dos factos como provados, teria que ter ocorrido, necessariamente, prova documental.
Acresce ainda referir quer a alteração da matéria de facto ou errada apreciação e valoração da prova, pressupõe o erro do julgamento de facto, o qual ocorre quando, da confrontação dos meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o julgamento efetuado é desconforme com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto.
O erro deve ser demonstrado pelo Recorrente, delimitando o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera incorrer em erro e fundamentar as razões da sua discordância, especificando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes do processo que, no seu entender, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da adotada pela decisão recorrida.
Por força do artigo 685- B.º, nºs 1 e 2 (atual 640,º) do CPC, para que o TCA possa proceder alteração da matéria de facto, devem ser indicados os pontos de facto considerados incorretamente julgados, indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de gravação realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
Se atentarmos nesses artigos 4 a 11, 26, 27, 29, 34 e 37 da petição inicial, constata-se
que são argumentos/asserções, conclusões, para sustentar a sua narrativa relativa à justificação do pedido de nova inspeção, não sustentada em qualquer meio de prova.
Entendemos assim, que o recurso que remete genericamente para os artigos da petição inicial, sem cuidar de precisar o que pretende que seja dado efetivamente como provado não cumpre o ónus a que está sujeito.
Nesta conformidade, improcede o alegado erro de julgamento de facto.

4.1.3. Nos termos do art.º 712 do CPC, por conhecimento ex officis e por resultar dos e do SITAF procede-se ao aditamento oficioso dos seguintes factos, atribuindo-lhe a numeração 3-A, 3-B, 6 e 7:
3-A- Em 15.02.2010 o Serviço de Inspeção Tributária proferiu informação na qual se pronuncia sobre o pedido efetuado pela Autora ao abrigo do art.º 2 do Decreto-Lei 6/99 de 08.01, no qual consta o seguinte:
(…) - Quanto ao pedido de realização de uma nova inspeção aos anos referidos, não se vislumbra que era sua utilidade, que era sua necessidade, porquanto, como o próprio S.P…. o afirma, foram apresentadas reclamações graciosas das liquidações, sede adequada para dirimir o que ora parece pretender. Mas há mais, se parece evidente a contradição entre reclamações que visam a (re)consideração de custos que foram desconsiderados na Inspeção e no novo pedido de Inspeção para desconsiderar proveitos cujos custos noutra sede se tentam (re)considerar, não se percebe também muito bem como não aceitou o S.P. o acesso às contas bancárias que poderia eventualmente ter permitido tudo esclarecendo devido tempo.
- acresce que o S.P. tem à sua disposição recursos que lhe permitem a regularização que por meios tão rebuscados parece pretender, e esse são: em sede de IVA, aqueles que o artigo 78º do respectivo código longamente arrola, desde que obviamente prove aquilo que só a ele compete provar, a saber, que as operações que considerou terem existido, não tiveram de facto existência, e que, portanto, falseou o valor quer dos custos quer dos inerentes proveitos; em sede de IRC, os que constam nos artigos 34º, 35º e 39º.
(…)
- Por último, o lançamento de um simples número, acompanhado de um vago “De acordo com os cálculos do Requerente” (os quais, de que clientes, que prova se juntam?) de rendimentos que nunca terá auferido, constituiu quase uma “mascarada” em que se conhece o número de mascarados mas não as suas verdadeiras faces, deixando-se deste modo a possibilidade de eles até não poderem ter faces. (…)” (Cfr fls. 3/5 do processo administrativo em suporte físico) apenso aos autos
3-B-Em 19.02.2010, na informação referida em 3-A, por «AA» Diretor de Finanças Adjunto, foi oposto o seguinte: “ O despacho foi exarado em documento em separado”, (Cfr fls.3/5 do processo administrativo em suporte físico) apenso aos autos.
6- A Autora após a ter sido notificada das liquidações de IRC e IVA, instaurou os seguintes processos:
- Reclamação graciosa das liquidações de IRC e juros dos anos de 2004 a 2007;
- Reclamação graciosa das liquidações de IVA e juros dos anos de 2004 a 2007;
- Impugnação Judicial de IRC e juros dos anos de 2004 a 2007, a qual a qual foi atribuído o n.º 2122/10.0BEBRG, encontrando-se suspensa aguardando a decisão dos presentes autos;
-Impugnação Judicial de IVA e juros dos anos de 2004 a 2007, a qual foi atribuído o n.º 441/12.oBEBRG, já decidida por acórdão deste TCAN em 15.09.2022, já transitado em julgado.
- Ação administrativa especial n.º 181/11.8BEBRG, pretendendo a anulação do despacho da Diretora de Serviços de IRC datado de 10 de agosto de 2010, que indeferiu o pedido de revisão do ato tributário que havia sido apresentado pela Recorrente, a qual já foi decidida, por acórdão deste TCAN em 15.05.2023, transitado em julgado, e na qual foi negado provimento.
7. A ação administrativa especial n.º 181/11, relativamente ao procedimento de revisão oficiosa tinha subjacente o mesmo despacho em causa nestes autos.

4.1.4. Estabilizada a matéria de facto provada, e em regime de substituição procede este Tribunal, nos termos do art.º 715.º do CPC, ao conhecimento da questão equacionada na petição inicial.
A questão fundamental, que cumpre apreciar e decidir é a saber se o despacho do Diretor de Finanças Adjunto, da Direção de Finanças ..., de 19.02.2010, que indeferiu o pedido de realização de nova inspeção à contabilidade do Impugnante/Recorrente é ilegal por incorreta interpretou do artigo 2.º n.ºs 1 e 2 do Dec-lei n.º 6/ 99 de 08.01 e violadora dos princípios justiça material, (n.º 2 do art.º 5.º da LGT), da proporcionalidade (art.º 55.º da LGT) do inquisitório (art.º 58.º da LGT).
Vejamos:
O Dec-lei n.º 6/ 99 de 08.01 regula o sistema de inspeção tributária por iniciativa do sujeito passivo ou de terceiro, estabelecendo o seu âmbito, condições de acesso e efeitos.
Dispõe o art.º 2 do citado diploma que: “1 - A inspecção tributária pode ser requerida ao director-geral dos Impostos pelo sujeito passivo ou, com autorização expressa deste, por terceiro.
2 - O requerente da inspecção tributária deve definir o seu âmbito e extensão, incluindo os tributos e os períodos temporais pretendidos.
3 - Podem ser objecto de pedido autónomo de inspecção os sectores de actividades do sujeito passivo abrangidos por regime tributário especial.
4 - O deferimento do requerimento, que será apreciado obrigatoriamente no prazo de 30 dias, depende da invocação e prova do interesse legítimo do requerente na realização da inspecção.
5 - O terceiro que requeira a inspecção deve também esclarecer as relações negociais ou de outra natureza mantidas ou a manter com o sujeito passivo que justifiquem o pedido apresentado.
6 - O interesse legítimo referido no presente artigo consiste em qualquer vantagem resultante do conhecimento da exacta situação tributária do sujeito passivo, proveniente, nomeadamente, de actos de reestruturação empresarial, de operações de recuperação económica ou do acesso a regimes legais a que o requerente pretenda ter direito.(…)”
Nesta conformidade, e nos termos do n.º 2 do art.º 2 do Dec-lei n.º 6/ 99 de 08.01 pode ser requerida inspeção tributária pelo contribuinte devendo este definir o seu âmbito e extensão, incluindo os tributos e os períodos temporais pretendidos.
Como decorre do requerimento efetuado pela Requerente/Autora, em 02.02.2010, foi requerida nova inspeção alegando que prestava serviços na área de formação profissional, sendo que nos anos em causa o principal programa lançado pelo Estado (IAPMEI) designava-se por “Prime”. E para que as empresas candidatas aos financiamentos pudessem obter o benefício máximo, tornou-se necessário que os serviços prestados pela Requerente/Autora fossem faturados e, em muitos casos emitidos os respetivos recibos sem que os pagamentos tivessem sido efetuados.
E que a Requerente/Autora celebrou acordo verbal com a grande maioria dos seus clientes no sentido de apenas receber pelos seus serviços quando as empresas recebessem o financiamento.
Sucede, porém, que a maioria das empresas acabaram por ver os seus financiamentos anulados e, por esse motivo não pagaram os serviços.
De acordo com os seus cálculos ficou por receber a quantia € 1 496 416, 70.
Alega que se nenhuma medida for tomada a Requerente/Autora será obrigada a pagar impostos sobre rendimentos que não chegou a receber, violando se desta forma o princípio da tributação pelo lucro real bem como a justiça material.
Acaba a Requerente/Autora a pedir a realização de nova inspeção à sua contabilidade aos exercícios de 2004 a 2007 e subsidiariamente, caso seja indeferido, requereu ao abrigo do disposto no art.º 78.º da LGT a revisão do ato tributário.
Na sequência deste pedido e como consta do pontos n.ºs 3-A e 3-B (aditados nesta acórdão) e 4 da matéria de facto provada foi efetuada informação, em 15.02.2010, pelo Serviço de Inspeção Tributária a qual se pronuncia sobre o pedido efetuado pela Autora ao abrigo do art.º 2 do Decreto-Lei 6/99 de 08.01, referindo no essencial que não se vislumbra quer a sua utilidade, quer a sua necessidade, porquanto, como o próprio S.P, o afirma, foram apresentadas reclamações graciosas das liquidações, em sede adequada para dirimir o que ora parece pretender. E que não se percebe também muito bem como não aceitou o S.P. o acesso às contas bancárias que poderia eventualmente ter permitido esclarecer tudo em devido tempo. E que o S.P. tinha à sua disposição recursos que lhe permitem a regularização das operações que considerou terem existido, não tiveram de facto existência, e que, portanto, falseou o valor quer dos custos quer dos inerentes proveitos em sede de IRC, os que constam nos artigos 34º, 35º e 39º do CIRC.
Decorre dos pontos 3-A e 3-B e 4, que 19.02.2010, com base na informação o despacho foi exarado em documento em separado pelo Diretor de Finanças Adjunto, pelo qual foi indeferido nos termos do n.º 2 do art.º 2 do Dec-lei n.º 6/ 99 de 08.01 a realização de nova inspeção à sua contabilidade e determinado a instauração do competente processo de revisão oficiosa o qual foi remetido à Direção de Serviços do IRC para apreciação e decisão.
Relativamente a este ato, a Recorrente insurge unicamente contra o indeferimento da realização de nova inspeção à sua contabilidade.
Consta da fundamentação do ato que “ (…) A – Do pedido de inspecção à sua contabilidade, ao abrigo do Decreto-lei n.º 6/99, de 8 de janeiro
1. Tendo a matéria contestada no requerimento em apreciação sido determinada em procedimento e inspecção tributária, não pode ser acolhido o pedido para realização de novo procedimento, uma vez que a entidade inspecionada já teve ao seu dispor os meios de defesa previstos na lei.
2. Por isso, e no uso das competências que me estão atribuídas, indefiro o pedido de realização de nova inspecção à sua contabilidade, formulado nos termos do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de janeiro.(…)”
Na presente ação administrativa de anulação de ato administrativo alega que após a conclusão da inspeção tributária, foi confrontado com uma nova situação que se prendia com os proveitos declarados.
E que a inspeção tributária incidiu principalmente nos custos e que quantos aos proveitos, a situação ainda não se tinha despoletado.
Resulta dos autos um extensíssimo Relatório de Inspeção efetuada à Autora, com base na contabilidade, onde foi analisado a sua concreta situação e efetuadas várias correções aritméticas e tributação autónomas.
Resulta da matéria de facto provada, neste acórdão aditada, que a Recorrente após a ter sido notificada das liquidações de IRC e IVA, instaurou os seguintes processos:
- Reclamação graciosa das liquidações de IRC e juros dos anos de 2004 a 2007;
- Reclamação graciosa das liquidações de IVA e juros dos anos de 2004 a 2007;
- Impugnação Judicial de IRC e juros dos anos de 2004 a 2007, a qual a qual foi atribuído o n.º 2122/10.0BEBRG, encontrando-se suspensa aguardando a decisão dos presentes autos;
-Impugnação Judicial de IVA e juros dos anos de 2004 a 2007, a qual foi atribuído o n.º 441/12.oBEBRG, já decidida por acórdão deste TCAN em 15.09.2022, já transitado em julgado.
- Ação administrativa especial n.º 181/11.8BEBRG, pretendendo a anulação do despacho da Diretora de Serviços de IRC datado de 10 de agosto de 2010, que indeferiu o pedido de revisão do ato tributário que havia sido apresentado pela Recorrente, a qual já foi decidida, por acórdão deste TCAN em 15.05.2023, transitada em julgado, e na qual foi negado provimento.
E que a ação administrativa especial n.º 181/11, relativamente ao procedimento de revisão oficiosa tinha subjacente o mesmo despacho em causa nestes autos.
Com efeito a Autora usou todos os meios ao seu dispor para impugnar ao ato tributário cuja razão de ser deve-se ao comportamento da mesma por não ter lançado mão do meio próprio para corrigir a situação descrita, o qual seria a constituição de provisões, nos termos dos artigos 34.º e 35.º do CIRC (na redação anterior à dada pelo Dec-lei n.º 159/2009 de 13 de julho).
Como é sabido e por força do art.º 17.º do CIRC o lucro tributável das pessoas coletivas é constituída pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificados no mesmo período e não refletidas naquele resultado determinados com base na contabilidade eventualmente corrigidos nos termos do código do IRC.
Por sua vez, e por força art.º 18.º do CIRC os proveitos e os custos, assim como outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito de acordo com o princípio da especialização dos exercícios.
No entanto, se porventura parte desses proveitos não foram recebidos dos clientes a quem foram prestados, existiam mecanismos ao dispor do sujeito passivo, que lhe permitiam constituir provisões para créditos considerados de cobrança duvidosa ou, se fosse o caso, considera-los incobráveis, nos termos do art.º 39.º do CIRC.
Não tendo a Autora contabilizados quaisquer provisões, nem considerado créditos incobráveis, não pode a sua pretensão ser deferida por não ter acolhimento legal.
A Autora alega ainda que o despacho proferido é violador dos princípios justiça material, (n.º 2 do art.º 5.º da LGT), da proporcionalidade (art.º 55.º da LGT) do inquisitório (art.º 58.º da LGT), porém sem razão.
A Autora não se pode arrogar à anulação de ato tributário o qual resultou da sua atuação não conforme com a lei, não podendo dela retirar dividendos.
As perdas que a Autora pretendia que fossem consideradas para efeitos de determinação do lucro tributário não foram levadas em conta, por a própria Autora não as ter refletido, oportunamente, na sua contabilidade, sendo forçoso concluir pela existência de uma conduta negligente da qual não pode tirar proveitos.
Nesta conformidade o ato praticado não incorreu na alegada violação dos princípios da justiça material, da proporcionalidade e do inquisitório, violação que a Recorrente também não concretiza e, que não ocorre, atenta a circunstância de que
o acesso a nova inspeção à sua contabilidade lhe é vedado por facto a si mesma imputável.
Nesta conformidade improcede a pretensão da Autora.

4.1.4. Nas conclusões 16.ª a 21.ª considera a Recorrente que na situação dos autos o cumprimento da formalidade preterida teria tido influência no ato final a praticar, pelo que ao decidir no sentido em que o fez incorreu a sentença recorrida na violação do disposto na alínea b) do n. º1 do artigo 60.º da LGT.
Vejamos:
A sentença recorrida fez enquadramento legal e doutrinal concluindo com efeito que a Recorrente não foi ouvida antes da decisão de indeferimento do pedido de nova inspeção à sua contabilidade, no entanto, e citando Diogo Leite Campos, Benjamin Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (in Lei Geral Tributária anotada, pag. 517) entendendo que por força do princípio do aproveitamento do ato poderá considerar-se convalidado o ato primário que enferme de vício de violação de direito de audição se o interessado veio utilizar os meios de impugnação administrativa (reclamação graciosa e recuso hierárquico) e neles acabou por ter oportunidade para se pronunciar sobre questões sobre as quais foi indevidamente omitido audiência procedimento de primeiro grau.
Em sede de recurso a Recorrente/Autora alega que na situação dos autos o cumprimento da formalidade preterida teria tido influência no ato final a praticar uma vez, que poderia vir explicar detalhadamente que por impedimento legal não podia juntar documentos contabilísticos dos seus clientes e do IAPMEI.
Face ao supra decidido, e tendo-se concluído que os proveitos que a Autora pretendia que fossem consideradas para efeitos de determinação do lucro tributário não foram levadas em conta por a própria Autora, não as ter refletido, oportunamente, na sua contabilidade, forçoso, é concluir também, que a preterição da sua audição não iria de modo algum alterar a decisão de indeferimento da realização de nova inspeção à sua contabilidade.
Resta-nos, pois, concluir que as alegações e conclusões são inoperantes, para pôr em questão o julgado, neste segmento, pelo que se julga improcedente o recurso.


4.2. E assim, formulando as seguintes conclusões:
I. A nulidade da sentença, por excesso de pronúncia pressupõe que a decisão do julgador vá além do que lhe foi pedido pelas partes, ou seja, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do decidido (causa judicandi) não se identifique com a causa de pedir ou com o pedido (causa petendi).
II. Nos termos do n.º 4 do artigo 83.º do CPTA a não consideração como facto provado de factos não especificamente impugnados na contestação, não tem, necessariamente, como conclusão a verificação de erro na apreciação da matéria de facto.
III- Como é sabido e por força do art.º 17.º do CIRC o lucro tributável das pessoas coletivas é constituída pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificados no mesmo período e não refletidas naquele resultado determinados com base na contabilidade eventualmente corrigidos nos termos do código do IRC.
IV - Por sua vez, e por força art.º 18.º do CIRC os proveitos e os custos, assim como outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito de acordo com o princípio da especialização dos exercícios.
V. No entanto, se porventura parte desses proveitos não foram recebidos dos clientes a quem foram prestados, existiam mecanismos ao dispor do sujeito passivo, que lhe permitem constituir provisões para créditos considerados de cobrança duvidosa ou, se fosse o caso, considerá-los incobráveis, nos termos do art.º 39.º do CIRC.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em:
a) julgar parcialmente procedente o recurso anular a sentença recorrida por nulidade; e em substituição julgar ação administrativa improcedente;
b) No demais julgar improcedente e manter a sentença recorrida na ordem jurídica nesse segmento.

Notifique-se o presente acórdão ao processo 2122/10.0BEBRG a correr termos no Tribunal Administrativo de Braga.

Custas pela Recorrente, nos termos do art.º 527.º do CPC.

Porto, 15 de maio de 2025

Paula Maria Dias de Moura Teixeira (Relatora)
Isabel Cristina Ramalho dos Santos (1.ª Adjunta)
Paulo Moura (2.º Adjunto)