Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00012/11.9BEPRT |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 04/10/2025 |
| Tribunal: | TAF do Porto |
| Relator: | CARLOS DE CASTRO FERNANDES |
| Descritores: | IRC; ISENÇÃO; PESSOA COLETIVA DE UTILIDADE PÚBLICA; ATIVIDADE ACESSÓRIA; |
| Sumário: | I- No artigo 5.º do novo CPC reconhece-se ao Juiz, para além da atendibilidade dos factos que não carecem de alegação e de prova a possibilidade de considerar, mesmo oficiosamente, os factos instrumentais, bem como os essenciais à procedência da pretensão formulada, que sejam complemento ou concretização de outros que a parte haja oportunamente alegado e de os utilizar quando resultem da instrução e da discussão da causa e desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório. II – No entanto, só serão atendíveis os factos essenciais não alegados nos articulados e os instrumentais, desde que tenham sido previamente submetidos ao regime do contraditório e de prova durante a discussão da causa. III - Se atividade comercial e/ou empresarial for prosseguida por uma pessoa coletiva de utilidade pública, que prossigam algum dos fins previstos na parte final da alínea c) do n.º 1 do art.º 10.º do CIRC, sendo aquela atividade exercida a título acessório, a isenção mantém-se caso se enquadre no âmbito dos seus fins estatutários, preenchidos que estejam os pressupostos das alíneas a), b) e c) do n. º3 do artigo 10º do CIRC. Fora deste espaço, a isenção não opera e o rendimento global obtido fica sujeito a tributação.* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Maioria |
| Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I – A Representação da Fazenda Pública - RFP (Recorrente) veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual se concedeu provimento à impugnação intentada pela Associação ... (Recorrida), direcionada contra as liquidações adicionais de IRC, relativas aos exercícios dos anos de 2005, 2006 e 2007. No presente recurso, a Apelante (RFP) formula as seguintes conclusões: a) A RFP recorre da sentença proferida, nos presentes autos, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal ..., que julgou a presente impugnação totalmente procedente e, em consequência, anulou as liquidações adicionais de IRC, relativas aos exercícios de 2005, 2006 e 2007, no valor total de € 45.929,74. b) No entanto existe, com todo o respeito pela douta sentença a quo, erro quanto à decisão de facto e, em virtude deste, erro na decisão de direito, como já acima proficuamente demonstramos e que, agora, sintetizamos nas seguintes conclusões. I - Do erro da Decisão de Facto c) A RFP, quanto à matéria de facto fixada na sentença proferida, nos presentes autos, questiona a mesma, desde logo, por não ter convocado a matéria de facto pertinente para a decisão, nos termos que passa a demonstrar. d) Ou seja, a RFP alega, desde já, erro de julgamento da matéria de facto, pois errou na seleção da matéria de facto, não levando, ao probatório, factos que importavam à boa decisão da causa e, como tal, não foram devidamente valorados, como passamos a demonstrar. e) A RFP considera que a sentença não se serviu de factos que foram testemunhal e documentalmente provados. f) Por outro lado, no caso sub judice, a Senhora Juíza a quo limitou-se, como já se disse, a uma declaração negativa dos factos provados, o que não cumpre, parece-nos, as exigências processuais. g) Donde, sendo patente que a indicação dos factos não provados é, de um ponto de vista processual, inexistente, pelo que importa reconfigurar o probatório ao abrigo do disposto no artigo 662.º, do CPC. h) Não sendo, no entanto, de operar uma reconstrução total do mesmo visto que apesar das deficiências apontadas à matéria de facto fixada na sentença, ainda assim é possível aproveitar os factos provados, alicerçados na documentação dos autos e no Processo Instrutor, em relação aos quais nenhuma dúvida probatória e motivacional se suscita. i) Face ao exposto, considerando os vícios em matéria probatória de que padece a sentença, esta deve ser revogada. j) Na sequência lógica dessa revogação, para a decisão da impugnação parece-nos se de considerar provados os seguintes factos, A - Os considerados como tal no probatório da sentença, que aqui se dá como reproduzido nessa parte, tendo como suporte probatório quer a documentação dos autos e do Processo Instrutor. B – Aditar-se os seguintes factos, conforme resulta da prova constante da documentação dos autos e do Procedimento Inspetivo, k) Em 2009-11-26, mereceu o despacho favorável do Subdiretor-Geral, a Informação n.º ..78/2009, elaborada pela Direção de Serviços de IRC (Divisão de Concepção), relativamente à aqui Impugnante, que de seguida se reproduz para todos os devidos e legais efeitos, e que se encontram junta aos presentes autos 56, 56 Este documento encontra-se junto aos presentes autos como doc. 6, anexo ao doc. n.º 1, junto com a PI (vd. o documento registado no SITAF com o n.º 005188426 – fls. 55 a 60), a esta documento fazem referência os artigos 37 a 40, da PI; e o artigo 12.º, da Contestação, junta aos presentes autos l) Em 2010-03-26, como já acima foi referido, a Impugnante apresentou uma reclamação graciosa, relativamente às liquidações referidas na matéria de facto provada, que deu origem ao procedimento de reclamação graciosa, com o n.º ...89, tendo dado origem à seguinte Informação, bem como o despacho que o suporta, que de seguida se reproduz para todos os devidos e legais efeitos, e que se encontram junta aos presentes autos 57, 57 Vd. o documento junto aos presentes autos a fls. 45, 46, 47, 48, 49, e 51, dos autos do procedimento de reclamação graciosa, junto ao Processo Instrutor (vd. o documento registado no SITAF com o n.º 005338315). m) Em 2011-01-24, na sequência da apresentação da reclamação graciosa, apresentada pela aqui Impugnante, a Divisão da Justiça Administrativa e Contenciosa, da Direção de Finanças ..., solicitou junto da Direção de Serviço de IRC (Divisão de Concepção), o enquadramento fiscal da situação apresentada pela aqui Impugnante em sede de procedimento de reclamação graciosa. n) A solicitação, referida no ponto anterior, deu origem à Informação n.º ..19/11, cujo despacho da Senhora Subdiretora-Geral, de 04-04-2011, concretizou-se em “solicitar parecer com caráter urgente à DSIRS” 58, pelo que de seguida se reproduz a referida Informação n.º ..19/11, bem como o despacho que o suporta, que de seguida se reproduz para todos os devidos e legais efeitos, e que se encontram junta aos presentes autos59, 58 Vd. o documento junto aos presentes autos a fls. 88, dos autos do procedimento administrativo, vulgo PA, junto ao Processo Instrutor (vd. o documento registado no SITAF com o n.º 005338315). 59 Vd. o documento junto aos presentes autos a fls. 87 a 98, dos autos do procedimento administrativo, vulgo PA, junto ao Processo Instrutor (vd. o documento registado no SITAF com o n.º 005338315). o) Em 2011-04-19, em resposta ao solicitado, na Informação n.º ..19/11, tendo, ainda, em conta o despacho que o suporta, a DSIRS elaborou a Informação n.º 1.../11, que suportou o despacho proferido pela Subdirectora-Geral, que de seguida se reproduz para todos os devidos e legais efeitos, e que se encontram junta aos presentes autos60, 60 Vd. o documento junto aos presentes autos a fls. 82 a 86, dos autos do procedimento administrativo, vulgo PA, junto ao Processo Instrutor (vd. o documento registado no SITAF com o n.º 005338315). p) Em 2011-05-05, mereceu o despacho favorável do Subdiretor-Geral a informação n.º ..47/11, elaborada pela Direção de Serviços de IRC (Divisão de Concepção), relativamente à aqui Impugnante, que de seguida se reproduz para todos os devidos e legais efeitos, e que se encontram junta aos presentes autos61, 61 Vd. o documento junto aos presentes autos a fls. 71 a 81, dos autos do procedimento administrativo, vulgo PA, junto ao Processo Instrutor (vd. o documento registado no SITAF com o n.º 005338315). q) Mais o Parecer, elaborado pela Divisão da Representação da Fazenda Pública, que suporta o Despacho de 30-05-2011, proferido pela Chefe de Divisão em regime de delegação de competências, pela Diretora de Finanças ..., e que faz parte integrante da contestação, apresenta-nos o encadeamento fenomenológico de todas as Informações, elaboradas pelos serviços da AT, despidamente pela DSIRC e pela DSIRS, desde a elaboração da Informação n.º2578/2208, da DSIRC, até à elaboração da Informação n.º ..47/11, dos mesmos serviços62. 62 Vd. o documento junto aos presentes autos a fls. 99 a 103, dos autos do procedimento administrativo, vulgo PA, junto ao Processo Instrutor (vd. o documento registado no SITAF com o n.º 005338315), bem como a referência a que este Parecer é feita no artigo 9.º, da Contestação, junta aos autos. r) Quanto à inquirição de testemunhas, deve ser aditado à matéria de facto provada os seguintes factos, extraídos da gravação junta aos autos, referente à fase de inquirição de testemunhas, s) Entre as receitas da Impugnante temos as que resultam da cedência de espaços a terceiros, vem como as que resultam da cessão de exploração do “bar”, um espaço ... em que existe uma cessão de exploração mensal (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 00.28.39 a 00.28.57). t) O centro de congressos é constituído por uma equipa, coordenada pela primeira testemunha (o “«AA»”), cuja atividade passa pela angariação de clientes, para alugar os espaços/salas (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 00.42.52 a 00.43.18). u) A Impugnante fatura a “cedência de espaços” do seguinte modo: caso o cliente precise de serviços de catering, audiovisuais e tradução, as empresas que prestam esses serviços faturavam à Impugnante e esta “refaturava” ao cliente, porque se o cliente não pagasse a Impugnante tinha de suportar esse custo, e essa “refaturação” era pelo mesmo preço ao cliente final (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 00.48.40 a 00.49.50). v) A “cedência dos espaços” tinha de estar paga até à véspera do evento, mas o catering e os audiovisuais eram faturados após o evento, porque variava de acordo com o número de pessoas (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 00.50.17 a 00.50.30). w) A Impugnante recebia os orçamentos das empresas com as quais trabalhavam, até por uma questão de segurança da Impugnante, caso de intoxicações alimentares, de forma a defender a marca, o serviço da Impugnante, esta trabalha com empresas certificadas nos setores, oferecendo ao cliente três ou quatro dessas empresas até este escolher (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 00.52.58 a 00.53.17). x) Após a escolha do cliente, a Impugnante comunica à empresa escolhida (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 00.53.18 a 00.53.25). y) Em 16 de janeiro de 2009, a Impugnante fez um pedido de esclarecimentos, dirigido ao diretor geral dos impostos, em Lisboa (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 01.03.10 a 01.04.04). z) Os proveitos suplementares evidenciam a faturação dos serviços prestados, pelas empresas prestadoras dos serviços de catering e audiovisuais, à Impugnante, e esta, por sua vez, faturava ao cliente, e o preço que era debitado à Impugnante era o preço que esta debitava ao cliente (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 01.17.07 a 01.07.26). aa) A mesma rubrica referente aos proveitos suplementares, evidencia também as comissões que a aqui Impugnante faturava às empresas de catering e audiovisuais (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 01.17.40 a 01.17.56). bb) As comissões, que a aqui Impugnante faturava às empresas de catering e audiovisuais, constituíam receita da Impugnante (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 01.18.16 a 01.18.33). cc) O valor da conta 73, referente às prestações suplementares, diz respeito ao valor das comissões, que a aqui Impugnante faturava às empresas de catering e audiovisuais (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 01.19.18 a 01.19.30). dd) Em 2007, houve um aumento substancial, ou seja, o aumento dos proveitos suplementares duplicou, em virtude ter terem existido mais eventos, e em virtude disso, à partida, a Impugnante teve um maior valor de comissões, embora não seja linear (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 01.20.07 a 01.20.28). ee) O aumento de cedência de espaços, em 2007, implicou que as próprias comissões, que a aqui Impugnante faturava às empresas de catering e audiovisuais, também aumentassem (de acordo com a gravação registada em sistema de gravação, desde o minuto 01.21.20 a 01.21.26). ff) Feito o aditamento à matéria de facto provada pela sentença proferida nos presentes autos, temos que não há factos não provados com interesse para a decisão da causa que importe discriminar. II - Do erro da Decisão de Direito gg) A RFP alega, ainda, erro de julgamento de direito, em virtude do erro de julgamento da matéria de facto, nos termos acima demonstrados, ter levado a uma errónea subsunção e aplicação dos factos ao direito, como passamos a demonstrar. hh) Uma vez feito o aditamento à matéria de facto provada pela sentença recorrida, partimos, agora, para o enquadramento jurídico da renovada realidade fenoménica, nos termos acabados de expor. ii) Desde já, estamos em condições de circunscrever as questões de direito, quer aos proveitos obtidos com a cedência de espaços - do “Centro de Congressos e Exposições, bem como aos proveitos obtidos com a cedência de espaços - da cessão de exploração do estabelecimento de cafetaria e bar, sito na sala 37 da sua sede social, no Edifício .... jj) E foram sobre estas questões de direito que a sentença se pronunciou, nos termos em que o fez, e que determinou a procedência da presente impugnação. II.1 - Dos proveitos obtidos com a cedência de espaços - do “Centro de Congressos e Exposições” kk) Quanto aos proveitos obtidos com a cedência de espaços - do “Centro de Congressos e Exposições”, uma vez ponderada a matéria de facto provada e agora aditada, parece-nos que da mesma resulta a existência de um denominado “Centro de Congressos”, que desenvolve uma atividade comercial, pois que, de acordo com o RIT, o (…) autodenominado ‘Centro de Congressos e Exposições’, trata-se de “um equipamento adequado para a realização de eventos de natureza variada (eventos empresariais, científicos, culturais e comerciais), dispondo de um amplo conjunto de auditórios, salas e espaços no Edifício ... (sede do sujeito passivo), com sistemas sofisticados de apoio à realização de cimeiras, congressos, conferências, colóquios, apresentação de produtos, acções de formação, workshops, cocktails, recepções de gala e outros eventos63, o que exige de per si um trabalho de preparação, bem como de acompanhamento e de finalização, dos referidos tipos de eventos, conforme também decorre das declarações prestadas pelas testemunhas64. 63 Vd. as pgs. 3 e 4/10, do referido RIT. 64 Cf. artigos 119, 120, 121, 122 e 123, desta peça, onde constam os factos agora aqui referidos. ll) Note-se que este denominado “Centro de Congressos”, de acordo com o depoimento da segunda testemunha, conta, não só com uma equipa de funcionários, mas também com um conjunto de “parceiros”, recebendo destes, em certas situações, “comissões”, sendo esse centro de congressos dirigido pela primeira testemunha, conforme também decorre das declarações prestadas pelas testemunhas65. 65 Cf. artigos 119, 120, 121, 122, 123, 15, 126, 127, 128, 129 e 130, desta peça, onde constam os factos agora aqui referidos. mm) E, como tal, temos de encarar este denominado “Centro de Congressos” como um verdadeiro ente comercial com essa característica bem definida e caracterizadora de toda a atividade comercial denominada de aviamento66. 66 Para a doutrina predominante, o aviamento não seria um elemento mas uma qualidade do estabelecimento comercial, designando a sua suscetibilidade de produzir lucros. nn) É que o denominado “Centro de Congressos”, de acordo com o que vem sido referido, quer de acordo com o teor dos documentos, juntos aos presentes autos, que não foram impugnados, quer pelo depoimento das testemunhas, em fase de inquirição de testemunhas, não é uma mera estrutura, mediante a qual a aqui Impugnante se limitar a gerir os referidos espaços como se de um património se tratasse, ou seja, como se de um proprietário se tratasse67. 67 Se fosse esta a realidade concreta do denominado Centro de Congressos e Exposições, os serviços da AT, in casu, a DSIRC, não teriam a necessidade de elaborar a segunda informação n.º 971/11 oo) Antes pelo contrário, a aqui Impugnante, através do denominado “Centro de Congressos”, dedica-se reiteradamente à cedência desses espaços, de forma organizada, competitiva, estando no “mercado”68, nos termos que resulta da matéria de facto provada e agora aditada, visando, com isso, angariar clientela69. 68 Sobre esta temática Jorge Patrício Paul, Revista da Ordem Advogados, 2005, Ano 65, Vol. I, junho de 2005, disponível em www.oa.pt., Estudo e Revista cit., refere: “O ato de concorrência é aquele que é idóneo a atribuir, em termos de clientela, posições vantajosas no mercado (…). A concorrência não é suscetível de ser definida em abstrato e só pode ser apreciada em concreto, pois o que interessa saber é se a atividade de um agente económico atinge ou não a atividade de outro, através da disputa da mesma clientela (…) O conceito de concorrência é, pois, um conceito relativo, que não pode ser aprioristicamente definido mas apenas casuisticamente apreciado, tendo em conta a atuação concreta dos diversos agentes económicos e a realidade da vida económica atual (...). 69 Cf. artigos 119, 120, 121, 122, 123, 15, 126, 127, 128, 129 e 130, desta peça, onde constam os factos agora aqui referidos pp) E, para tal, conta com um corpo de funcionários próprio, onde se inclui um coordenador, que visa atrair clientela, mediante uma política de marketing bem delineada, concorrendo no mercado com outros prestadores do mesmo género de serviços, como resulta da matéria de facto provada e agora aditada70. 70 Cf. artigos 119, 120, 121, 122, 123, 15, 126, 127, 128, 129 e 130, desta peça, onde constam os factos agora aqui referidos qq) Face às razões expostas, temos de concluir que a atividade exercida pelo denominado ‘Centro de Congressos’ corresponde ao exercício de uma atividade comercial. IV.2.3 - Dos proveitos obtidos com a cedência de espaços - da cessão de exploração do estabelecimento de cafetaria e bar rr) Como resulta do RIT, os rendimentos relativos à cessão de exploração do estabelecimento de cafetaria e bar resultam de um contrato mediante o qual a Impugnante cede temporária e onerosamente um estabelecimento comercial71. 71 Vd. as pgs. 4/10, do referido RIT. ss) Pelo que, temos de concluir que, face à matéria de facto provada e agora aditada, estamos em condições de afirmar que tal realidade não pode comparar-se com um mero “acordo de cedência de espaços e aluguer do respectivo mobiliário”. Posto isto. tt) Importa, agora, proceder à subsunção jurídica da matéria de facto provada e também agora aditada, em ordem a aferir da assertividade da decisão de direito plasmada na sentença proferida nos presentes autos. uu) Desde já, também não nos suscita quaisquer dúvidas que a Impugnante é uma associação constituída por escritura pública em 21.01.1992, sem fins lucrativos, com estatuto de utilidade pública declarado por despacho de 26.03.1993, publicado no Diário da República, II Série, nº 84, de 10 de abril de 1993. vv) Ora, recordamos, também aqui, para todos os devidos e legais, o artigo 3.º, dos estatutos da Impugnante, quer na sua redação inicial, quer mesmo após as alterações dos estatutos em 1998 e 1999, segundo o qual a associação sempre teve apenas como fins: a) a criação e manutenção de um museu ..., composto por colecções ou peças próprias; b) a preservação de infra-estruturas de reconhecido interesse histórico relacionadas com os transportes e com as comunicações; c) a criação e manutenção de um centro de documentação sobre transportes e sobre comunicações; d) o desenvolvimento por todas as formas do interesse do público quanto à problemática dos transportes e das comunicações. ww) Em 1996-03-01, foi proferido despacho pelo Subdiretor-Geral da Direção-Geral de Contribuições e Impostos, nos termos do qual foi reconhecida à aqui Impugnante isenção de IRC quanto às seguintes categorias de rendimento aí plasmadas. xx) À data deste último despacho, estava em vigor o artigo 9, do Código do IRC, na redação conferida pela Lei nº 39-B/94, de 27 de dezembro. yy) Em 1999-10-18, através do “Auto de Cessão”, celebrado entre a Impugnante e o Estado Português, aquela passou a ser detentora, a título precário e gratuito, do imóvel denominado «Edifício ...», para ser utilizado na prossecução dos seus objetivos, designadamente, para aí ser instalado o Museu .... zz) Ainda nos termos desse acordo, a Impugnante responsabilizou-se pela recuperação, conservação e manutenção do imóvel que lhe foi afeto, tendo, no entanto, sido reconhecido à mesma o direito, entre outros, de “a ceder a terceiros, temporária e precariamente, através dos processos e instrumentos jurídicos que entender mais adequados, gratuita ou onerosamente – recebendo neste caso as respetivas contrapartidas, que são aplicadas a fins de interesse público – a utilização de partes determinadas do bem cedido, para a realização de congressos, seminários, exposições ou outros eventos de carácter científico, cultural, artístico ou social.” aaa) Também aqui temos presente, como decorre da sentença proferida nos presentes autos, o artigo 25.º, dos Estatutos da Impugnante, segundo o qual constituem receitas da mesma, entre outros, as receitas da exploração, designadamente por cedência a terceiros de vários espaços do edifício ocupado pela Associação, para congressos, seminários ou outras reuniões ou eventos de carácter científico, cultural, artístico ou social;”. bbb) Mais, recordemos, ainda, a legislação em vigor à data dos factos, posto que de acordo com a sentença proferida, nos presentes autos, “à data da verificação do pressuposto da isenção reconhecida à Impugnante relativas aos exercícios aqui em causa, concretamente dos anos de 2005, 2006 e 2017, aplica-se o disposto no artigo 10º, do Código do IRC, na versão resultante da Lei nº 60-A/2005, de 30 de dezembro. ccc) Ora, resulta da leitura do n.º 3, do artigo 10.º, do CIRC, acima plasmado, que a “isenção prevista no n.º 1 não abrange os rendimentos empresariais derivados do exercício das actividades comerciais ou industriais desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatutários”. ddd) Como já acima foi demonstrado, a atividade desenvolvida pelo denominado ‘Centro de Congressos’ é uma atividade comercial72. 72 Vd. o teor dos artigos 142 a 148, deste articulado. eee) E quanto à cessão da exploração da cafeteria/bar, também já concluímos que, face à matéria de facto provada e agora aditada, estamos em condições de afirmar que tal realidade não pode comparar-se com um acordo de mera “cedência de espaços e aluguer do respetivo mobiliário”. fff) Ora, uma vez efetuada a leitura do artigo 3.º, dos Estatutos da Impugnante, temos de concluir que do mesmo não é possível extrair uma interpretação, no sentido do aí consagrado, abranger o exercício de uma atividade comercial ou industrial – concretize-se esta na atividade desenvolvida pelo “Centro de Congressos”, quer pela atividade desenvolvida pelo Bar/Cafetaria. ggg) Aliás, nem a sentença proferida nos presentes autos, parece-nos, se pronuncia sobre esse facto, em momento algum, quando deveria tê-lo feito. hhh) Assim sendo, a sentença proferida, nos presentes autos, não obstante o devido respeito constitucional por este Tribunal enquanto órgão de soberania, peca, assim, por deficiência, mediocridade ou erro de fundamentação, afetando, a final, o valor doutrinal da decisão que, por isso, deverá ser revogada ou alterada73 73 Vd., neste sentido, os artigos 613º, n.º3, e 615º, n.º1, al. c), do Código de Processo Civil de 2013; Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão), p.140; acórdão do Supremo 17/11/2019 Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/ba1a414881dd72f2802583fd002d720b?OpenDocument 8/11 Tribunal Administrativo, de 11.9.2007, recurso 059/07). iii) A douta sentença, proferida nos presentes autos, optou por fundamentar a decisão de direito como base em outros factos, a saber, -» o das suas receitas estarem “(…) afetas à prossecução dos fins estatutários, na medida em que as receitas são utilizadas na criação e manutenção do Museu e na conservação e reparação do “Edifício ..., bem como em encargos decorrentes do funcionamento da instituição e financiamento de atividades promovidas na prossecução dos seus objetivos, visto que não recebe qualquer subsídio estadual”; -» uma vez “(..) que as receitas resultantes da atividade do museu e das quotas pagas pelos associados, são reduzidas, compreende-se que a manutenção do referido edifício apenas é possível com as receitas resultantes da cedência dos espaços”, -» no que “respeita aos rendimentos provenientes da exploração do designado por “Centro de Congressos” e de um estabelecimento de cafetaria e bar, essa receita está expressamente prevista no “Auto de Cessão” como meio de custear as despesas provenientes da prossecução dos interesses públicos por si desenvolvidos e previstos nesse acordo”. jjj) Concluindo que “(…) estas receitas, além de se inserirem na prossecução dos fins de interesse público previstos nos seus Estatutos, são efetivamente aplicadas àqueles fins, uma vez que sem as mesmas, não seria possível dar-lhes seguimento. Ou seja, sem essas receitas não seria possível a instalação, manutenção e funcionamento do museu ... e a manutenção e conservação do edifício, no seu todo, sendo ele próprio um bem cultural”. kkk) Ou seja, para a Meritíssima Juíza a quo, com todo o devido o respeito constitucional que, desde já, salvaguardamos, bastam os referidos factos, referenciados nos pontos anteriores, para que as receitas advindas, quer das atividades desenvolvidas pelo denominado “Centro de Congressos”, quer da cessão de exploração da cafeteria/bar, fiquem abrangidas pela referida isenção de IRC. lll) Ora, a RFP não pode aceitar esta visão parcial dos factos, e a consequente qualificação dos mesmos à luz dos considerandos legais plasmados na sentença proferida nos presentes autos, e por isso a impugna, nos seguintes termos e fundamentos. mmm) É que o importante não é apenas perceber para onde vão as receitas, designadamente de acordo com o referido no “auto de cessão”; é perceber, isso sim, de onde e como derivam essas receitas. nnn) Por essas mesmas razões, também não perfilhamos o destacado, na sentença proferida nos presentes autos, do Parecer elaborado, pelo Professor Casalta Nabais, com o salvaguardado e devido respeito por tão brilhante jurisconsulto, que sobre esta questão emitiu o referido parecer, que está junto aos autos74. 74 Mais, como resulta da jurisprudência dos nossos tribunais superiores, “(…) os pareceres técnicos pronunciados por via extrajudicial representam apenas e em todo o caso uma simples opinião sobre a solução a dar a determinado problema, qual, consequentemente, não vincula o tribunal (…)” - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 20-02-2020, proferido no âmbito do Processo n.º 1279/13.3TVLSB-D.L1-1. ooo) Ou seja, a isenção de IRC não se justifica pelo simples facto das receitas da Impugnante, aqui analisadas, serem aplicadas aos fins estatutários desta, mas essencial e fundamentalmente com o facto destas não derivarem “do exercício das atividades comerciais e industriais desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatutários”, tal e qual preconiza o n.º 3, do artigo 10.º, do CIRC. ppp) Ora, as referidas receitas da Impugnante, como resulta da matéria de facto provada e agora aditada, derivam do exercício de atividades comerciais, que não estão abrangidas pelos fins estatutários da Impugnante, e como tal não são subsumíveis às hipóteses legais consagrados nos termos do artigo 10.º, do CIRC. qqq) Assim, faz todo o sentido defender, como alegamos, que as atividades geradoras de proveitos decorrentes da cedência de espaços, quer através do ‘Centro de Congressos e Exposições’, quer através da cessão de exploração do estabelecimento de cafetaria e bar, não se encontram previstas nos fins estatutários do sujeito passivo A.M.T.C., pelo que não poderão aproveitar a isenção de IRC referida, embora o despacho de isenção, de 01-03-1996, continue atual relativamente aos restantes proveitos. rrr) Além disso, temos de reconhecer que, mesmo a referida alteração do estatuto da aqui Impugnante, já acima melhor referenciada, apenas circunscreveu-se quanto à forma de obtenção de receitas, e não quanto aos fins estatutários, que se mantiveram inalterados, pelo que, estas novas formas de obtenção de receitas constituem antes um meio para atingir um fim, e não o próprio fim. sss) Pelo que, quanto à cedência de espaços, esta configura uma atividade comercial, exercida fora do âmbito dos fins estatutários da Impugnante, constituindo rendimentos empresariais enquadráveis na categoria B, conforme alínea a), do n.º 1, do artigo 3.º, do CIRS. ttt) No que concerne aos rendimentos relativos à cessão de exploração do estabelecimento de cafetaria e bar, estes constituem rendimentos empresariais enquadráveis na categoria B, conforme alínea e), do n.º 2, do artigo 3.º, do CIRS. uuu) Mais acresce a referida sentença do Tribunal a quo, que, in casu, “a isenção conferida pelo referido despacho do Subdiretor-Geral dos Impostos abrange os rendimentos da Categoria F, enquadrando-se a cedência de espaços no conceito de “cedência do uso do prédio ou de parte dele e aos serviços relacionados com aquela cedência” (cf. alínea a), do nº 2, do artigo 8º, do Código do IRS)” vvv) Permita-nos também divergir aqui, no que concerne a este segmento, da sentença proferida nos presentes autos. www) Recordamos, desde já, que a DSIRC elaborou uma Informação, com o n.º 947/2011, agora aditada à matéria de facto provada, mediante a qual a DSIRC manifestou-se concordante com a posição assumida pelos SIT, da Direção de Finanças ..., a qual contrasta com a posição inicialmente assumida pela mesma DSIRC, na Informação n.º ..78/2009. xxx) Note-se que esta Informação n.º ..78/2009, da DSIRC, contempla, na sua elaboração, a referência ao despacho, de 01-03-1996, do Subdiretor-Geral, por subdelegação, o qual isenta a aqui Impugnante, nos termos já acima melhor explicitados75. 75 Vd. o documento junto aos presentes autos a fls. 57 e 63, dos autos do procedimento administrativo, vulgo PA, junto ao Processo Instrutor, designadamente os pontos 1 a 5 plasmados nas referidas fls. (vd. o documento registado no SITAF com o n.º 005338315). yyy) A Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA), não obstante a existência do despacho proferido, pelo Subdiretor-Geral da Direção-Geral de Contribuições e Impostos, em 01-03-1996, bem como a Informação n.º ..78/2009, elaborada, em 26-11-2009, pela DSIRC, manteve, na Informação n.º ..47/11, elaborada, em 09-05-2009, pela DSIRC, a sua posição sobre esta matéria. zzz) Não manteve, no entanto, nos termos em que a mesma foi inicialmente requerida pela Impugnante, pois que a Impugnante, nesse seu pedido inicial, não deu conhecimento, aos serviços da ATA, das restantes situações que, hoje, consubstanciam as questões de direito suscitadas nos presentes autos. aaaa) É que, a ATA, ao ter conhecimento, nos termos plasmados no RIT, não só das atividades exercidas pelo denominado “Centro de Congressos”, como também do contrato de cedência de exploração do referido café/bar, considerou que a referida “(…) isenção não se aplicava ao exercício de actividades comerciais desenvolvidas fora do âmbito dos seus fins estatutários”, nos termos plasmados no RIT, junto aos presentes autos. bbbb) Ora, sobre isto a sentença proferida nos presentes autos disse apenas que “(…) não podemos concordar com este último entendimento, porquanto, e como acima se expôs, as receitas geradas pela cedência de espaços, incluindo o estabelecimento de bar/cafetaria, são afetas aos encargos de funcionamento do edifício ..., no seu todo, ou seja, são aplicadas na prossecução dos interesses públicos assumidos aquando da criação da Associação e da cedência do Edifício ...”. cccc) Com o devido respeito, mas não podemos concordar, mais uma vez o dizemos, com este segmento da sentença. dddd) Há que recordar que a referida isenção de IRC tem por fundamento o facto da aqui Impugnante “(…) tratar-se de uma pessoa colectiva de utilidade pública, e de harmonia com o disposto no n.º 2 do art.º 9º do CIRC (redacção dada pela Lei n.º 39-B/94, de 27 de Dezembro), por despacho de 1996-03-01, e conforme declaração publicada no Diário da República, 3ª Série, n.º 140, de 1996-06-19, foi reconhecido ao sujeito passivo A.M.T.C. a isenção de IRC nos termos do então n.º 2 do artigo 9º do CIRC (actual artigo 10º) nas seguintes categorias de rendimento aí plasmadas. eeee) Ora, como decorre da matéria de facto, os Serviços da Inspeção Tributária, da Direção de Finanças ..., conforme se encontra plasmado, no RIT, concluíram que as receitas derivadas, quer de Centro de Congressos, quer do contrato de cessão de exploração da cafeteria/bar, resultam do exercício, pela Impugnante, de atividades desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatuários, e sobre isto a sentença proferida nos presentes autos, parece-nos, nada disse. ffff) Deste modo, a sentença proferida nos presentes autos faz tabula rasa do legalmente previsto no artigo 3.º, dos Estatutos da Impugnante, das Informações elaboradas pela DSIRC e pela DSIRS, violando, assim, de forma direta e evidente o plasmado no artigo 10.º, do CIRC, com a redação vigente à altura dos factos, e, consequentemente, a alínea a), do n.º 1, do artigo 3.º, do CIRS, e a alínea e), do n.º 2, do artigo 3.º, do CIRS; bem como a alínea b), do n.º 1, do artigo 3.º, do CIRC, e os artigos 53º e 54º e n.º 5, do artigo 87.º, todos do CIRC (anteriores artigos 48º, 49º e n.º 5 do artigo 80º, na redacção em vigor previamente à produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13/7). 76 Ou seja, a Informação n.º ..78/2009, da Direção de Serviços de IRC (Divisão de Concepção), com despacho favorável do Senhor Subdiretor-Geral, de 26-11-2009; bem como a informação n.º ..47/11, da Direção de Serviços de IRC (Divisão de Concepção), que mereceu o despacho favorável do Subdiretor-Geral, de 09-05-2011. gggg) Concluímos, assim, que o enquadramento das receitas aqui em causa tem suporte legal, dado que as receitas derivadas, quer do autodenominado “Centro de Congressos”, quer do contrato de cessão de exploração da cafeteria/bar, resultam do exercício, pela Impugnante, de atividades desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatuários, pelo que também não se encontram abrangidas, pela isenção de IRC, concedida por despacho do Subdiretor-Geral dos Impostos, de 01-03-1996. hhhh) Ao concluir em sentido diverso do exposto, a sentença padece de incontornável vício de erro de julgamento da matéria de Direito a cargo do Tribunal a quo 77. 77 Trata-se de erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou erro na interpretação desta (…) porque então o que existe é erro de julgamento (…) – cfr. Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum, 2000, pg. 29 iiii) Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com todas as consequências legais. A Recorrida apresentou contra-alegações, nestas concluindo que: I. Contrariamente ao alegado pela Fazenda Pública, a sentença recorrida não merece qualquer censura ou reparo; II. Não padece de erro de julgamento da matéria de facto, por eventual omissão ao probatório de factos com interesse à decisão, porquanto foram fixados todos os factos relevantes para a decisão da questão de saber "se os rendimentos da Impugnante provenientes da cedência a terceiros de vários espaços e respetivo mobiliário do "Edifício ...", no ..., que ocupa em resultado de "Auto de Cessão" celebrado com o Estado Português, para congressos, seminários, ou outras reuniões ou evento de carácter científico, cultural, artístico ou sociais, bem como de serviços conexos e de cessão de exploração de um bar estão, ou não, abrangidos pela isenção em sede de IRC', que o Tribunal fixou como "thema decidendum" e que a Fazenda Pública não contestou; III. A insuficiência para a decisão da matéria de facto provado só se verifica quando esta se mostra exígua para fundamentar a solução de direito encontrada, i.e., quando da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro sobre as questões a decidir; IV. Ora, o que a Fazenda Pública classifica como insuficiência da decisão de facto para a decisão de direito mais não é do que a expressão de uma divergência, que se reconduz afinal à discordância em relação à qualificação jurídica que mereceram os factos provados, o que configura não uma discordância em relação à fixação da matéria de facto provada, mas sim perante a matéria de direito; V. Na verdade, os factos que a Fazenda Pública entende dever ser adicionados ao probatório não têm qualquer relevância para a decisão das questões submetidas ao Tribunal; VI. São meros pormenores relativos aos factos assentes, não resultando qualquer benefício ou influência na sua fixação, tendo em conta a motivação da decisão final e motivação da decisão sobre a matéria de facto provada e a correcta subsunção dos factos ao direito; VII. A sentença recorrida é totalmente esclarecedora quanto à motivação da decisão sobre a matéria de facto, com expressa remissão para os documentos e para o teor dos depoimentos que, em concreto, a determinaram, explicitando o processo de formação da convicção do julgador e dos meios de prova que relevaram nesse iter decisório, revelando exame crítico da prova que serviu para formar a sua convicção, dando a conhecer de modo preciso e claro o percurso lógico e racional que conduziu à fixação da matéria de facto; VIII. Pelo que, a decisão final e a motivação que lhe está subjacente jamais resultaria alterada, ou prejudicada, por via da matéria de facto que a Fazenda Pública entende estar em falta, contrariamente ao que pretende fazer crer nas suas alegações de recurso; IX. Deste modo, não se verifica qualquer erro na decisão sobre a matéria de facto, nem, consequentemente, existe erro no julgamento, na medida em que a sentença procede a uma adequada e correcta subsunção dos factos ao direito; X. Com efeito, a Impugnante é uma associação sem fins lucrativos, com o estatuto de utilidade pública e que prossegue predominantemente fins de natureza cultural, de acordo com os respectivos Estatutos, conforme despacho de 26.03.1993 publicado no Diário da República, II Série, n.º 84, de 10 de abril de 1993; XI. Em 01.03.1996, foi proferido despacho pelo Subdiretor-Geral da Direcção-Geral de Contribuições e Impostos, nos termos do qual foi reconhecida à aqui Impugnante isenção de IRC quanto às categorias C — Rendimentos comerciais e industriais directamente derivados do exercício das actividades desenvolvidas no âmbito dos seus fins estatutários, Categoria E — Rendimentos de capitais, com excepção dos de quaisquer títulos ao portador, não registados nem depositados, nos termos da legislação em vigor, Categoria F - Rendimentos prediais e Categoria G — Ganhos de mais-valias; XII. Em 18.10.1999, através do "Auto de Cessão" do Edifício ..., celebrado entre a Impugnante e o Estado Português, aquela passou a ser detentora, a título precário e gratuito, do referido imóvel para ser utilizado na prossecução dos seus objectivos, designadamente, para aí ser instalado o Museu ...; XIII. Nos termos desse acordo, a Impugnante ficou responsabilizada pela recuperação, conservação e manutenção do "Edifício ...", bem como ficou responsável pela gestão daquele espaço de forma a gerar receitas suficientes para cobrir os encargos; XIV. Nos termos do artigo 25.º dos Estatutos da Impugnante, constituem receitas da mesma, entre outras, as receitas de exploração, designadamente por cedência a terceiros de vários espaços do edifício ocupado pela Impugnante, para congressos, seminários ou outras reuniões ou eventos de carácter científico, cultural, artístico ou social; XV. Todas essas receitas são afectas à prossecução dos seus fins estatutários, isto é, são utilizadas na criação e manutenção do Museu e na conservação e reparação do "Edifício ...", bem como em encargos decorrentes do funcionamento da instituição e financiamento de actividades promovidas na prossecução dos seus objectivos, visto que não recebe qualquer subsídio estadual; XVI. No que respeita, em concreto, aos rendimentos provenientes da exploração do designado por "Centro de Congressos" e de um estabelecimento de cafetaria e bar, essa receita está expressamente prevista no "Auto de Cessão" celebrado ente a Impugnante e o Estado Português como meio de custear as despesas provenientes da prossecução dos interesses públicos por si desenvolvidos e previstos nesse acordo; XVII. E, considerando que as receitas resultantes da actividade do museu e das quotas pagas pelos associados, são reduzidas, e que os custos com a recuperação, manutenção e conservação do edifício em causa são elevados, facilmente se compreende que a sua manutenção apenas é possível com as receitas resultantes da cedência dos espaços; XVIII. Pelo que, estas receitas, além de se inserirem na prossecução dos fins de interesse público previstos nos Estatutos da Impugnante, são efectivamente aplicadas àqueles fins, uma vez que sem as mesmas não seria possível dar-lhes seguimento; XIX. Assim sendo, face à reconhecida natureza jurídica da Impugnante, aos seus fins estatutários, ao teor do "Auto de Cessão" celebrado com o Estado Português, à afectação exclusiva das suas receitas à prossecução dos seus objectivos estatutários, ao reconhecimento da isenção de IRC por despacho do Subdiretor-Geral dos Impostos aos rendimentos da Categoria "F", é manifesto que os referidos rendimentos relativos quer à cedência de partes do imóvel para congressos, seminários e outras iniciativas, quer relativos à cedência do respectivo mobiliário, se enquadram, respectivamente, nas alíneas a) e b), do nº 2, do artigo 8.º do Código do IRS, ou seja, são rendimentos prediais, abrangidos pela reconhecida isenção de IRC; XX. Nesse sentido, destaca o Professor Doutor Casalta Nabais no parecer que sobre esta questão emitiu e que está junto aos autos "a obtenção de receitas do tipo das quais aqui em consideração, não significa abrir um ramo de atividade diverso daquele a que as receitas se destinam, sendo estas apenas um meio de fazer face às despesas incorridas na exigente atividade de realização dos fins estatutários da AMTC, sejam estas despesas correntes, que se reportam ao exercício em que ocorrem, sejam despesas de investimento que se prolongam por diversos anos em função do plano de investimento programado. O que, pelo facto de se prolongarem por diversos anos em função do plano de investimentos programados. O que, pelo facto de se prolongarem por diversos anos não alteram a sua natureza de receitas estritamente vinculadas à realização das despesas com os objetivos estatutários"; XXI. Pelo que, o enquadramento efectuado pela Autoridade Tributária e Aduaneira das receitas aqui em causa e a consequente tributação em sede de IRC que está subjacente ao mesmo e à emissão das liquidações objecto de impugnação judicial, não tem suporte legal, porquanto todas as receitas auferidas pela impugnante na prossecução dos seus fins se encontram abrangidas pela isenção de IRC, concedida por despacho do Subdiretor-Geral dos Impostos de 01.03.1996; XXII. Pelo exposto, a sentença recorrida não cometeu erro de julgamento da matéria de facto ou de direito, nem violou qualquer disposição legal ao caso aplicável, devendo ser integralmente mantida. * Os autos foram com vista ao digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, que apresentou parecer defendendo a improcedência da presente apelação (cf. fls. 447 e segs. dos autos – paginação do SITAF). * Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento. -/- II – Matéria de facto provada indicada em 1.ª instância: 1. A Impugnante foi constituída por escritura pública em 21.01.1992 - facto admitido por acordo; 2. Nos artigos 3º e 25º dos Estatutos da aqui Impugnante consta o seguinte “Art. 3º A Associação tem como fim: a) a criação e manutenção de um Museu ..., composto por colecções ou peças próprias e colecções ou peças que lhe sejam confiadas em depósito. b) a preservação de infraestruturas de reconhecido interesse histórico, relacionadas com os transportes e com as comunicações. c) a criação e manutenção de um centro de documentação sobre transportes e sobre comunicações. d) o desenvolvimento por todas as formas do interesse público quanto à problemática dos transportes e das comunicações. (…) Art. 25º Constituem receitas da Associação: a) as quotas e contribuições dos Associados. b) os subsídios ou subvenções que lhe sejam concedidos. c) os rendimentos de bens próprios ou de participações sociais. d) o produto resultante de publicações, de trabalhos e de serviços realizados pela Associação. e) as receitas de exploração, designadamente por cedência a terceiros dos vários espaços do edifício ocupado pela Associação para congressos, seminários outras reuniões ou eventos de carácter científico, cultural, artístico ou social. f) quaisquer outras receitas, tais como donativos, doações, legados ou outros proventos aceites pela Associação.” - cfr. relatório de inspeção tributária a fls. 35 e ss. do processo físico, sendo ainda facto admitido por acordo; 3. A Impugnante foi declarada organismo de utilidade pública, conforme despacho de 26.03.1993, publicado no Diário da República, II Série, n.º 84, de 10 de abril de 1993 - facto admitido por acordo; 4. Em 01.03.1996 foi proferido despacho pelo Subdiretor-Geral da Direção-Geral de Contribuições e Impostos, nos termos do qual foi reconhecida à aqui Impugnante isenção de IRC quanto às seguintes categorias: “CATEGORIA C – Rendimentos comerciais e industriais directamente derivados do exercício das actividades desenvolvidas no âmbito dos seus fins estatutários caso se enquadrem no nº 3 do artº 9º do CIRC, na redacção dada pela Lei nº 30-B/94 de 27/12. CATEGORIA E – Rendimentos de capitais, com excepção dos de quaisquer títulos ao portador, não registados nem depositados, nos termos da legislação em vigor; CATEGORIA F – Rendimentos prediais; e CATEGORIA G – Ganhos de mais-valias.” - cfr. Diário da República, II Série, nº 84, de 10 de abril de 1993 e relatório de inspeção tributária; 5. Com data de 18.10.1999, foi celebrado documento por parte do Ministério das Finanças, designado por “Auto de Cessão”, a título precário e gratuito do imóvel denominado Edifício..., com todas as suas dependências pelo prazo de 25 nos e renováveis por sucessivos e iguais períodos de 10 anos para que a impugnante a utilize na prossecução dos seus objetivos e nomeadamente para que ali seja instalado o Museu ... - cfr. Relatório de Inspeção Tributária, a fls. 35 e ss., do p.f.; 6. A Impugnante foi alvo de inspeção tributaria, em sede de IRC, dos exercícios de 2005, 2006 e 2007, no âmbito da qual, em 30.11.2009, foi elaborado “Relatório de Inspeção Tributária” (RIT), a fls. 35 a 46, do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, do qual consta além do mais, o seguinte: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…) (…) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] 7. Sobre o relatório que antecede recaiu despacho de concordância datado de 02.12.2009 – cfr. fls. 35 do p.f.; 8. Relativamente ao exercício de 2005 foi emitida a liquidação n.º ...20, em 14.12.2009 - cfr. fls. 51, do processo físico; 9. Relativamente ao exercício de 2006 foi emitida a liquidação n.º ...68, em 14.12.2009 - cfr. fls. 52, do processo físico; 10. Em 14.12.2009 foi emitida a liquidação adicional de IRC n.º ...07, do exercício de 2007, com data limite de pagamento de 27.01.2010, no valor de €45.929,74 - cfr. fls. 53, do processo físico; 11. Foi emitida a liquidações de juros compensatórios n.º ...57, no valor de €2.602,03 - cfr. fls. 54, do processo físico; 12. Os custos de manutenção e gestão do edifico e museu são suportados pelas receitas do Centro de Congressos ... - prova testemunhal; 13. A Impugnante tem de gerir as receitas porque não recebe qualquer ajuda da tutela - prova testemunhal; 14. Com as receitas resultantes da cedência dos espaços a Impugnante assegura a recuperação, manutenção e conservação do Edifício ... - prova testemunhal; 15. As receitas ligadas estritamente ao Museu são muito reduzidas - prova testemunhal; 16. A Impugnante apoia a realização dos eventos que são desenvolvidos no edifício por terceiros no âmbito das cedências dos espaços disponíveis - prova testemunhal; 17. Os serviços de catering, decoração, vigilância, limpeza, etc., a quem pretenda realizar um evento num dos espaços do edifício, são prestados por empresas externas à Impugnante - prova testemunhal; 18. Estes serviços são na maioria das vezes contratados diretamente pelos clientes a empresas especializadas de cada um dos seus ramos, que faturam diretamente os seus serviços - prova testemunhal; 19. Há casos em que o cliente escolhe adquirir esses serviços a empresas que são indicadas pela Impugnante, pelo que esta receberá uma comissão desse fornecedor de serviços por tê-lo indicado - prova testemunhal; 20. A organização do evento cabe ao respetivo promotor - prova testemunhal; 21. O bar que se encontra a funcionar nas instalações da Impugnante serve de apoio às realizações que acontecem naquele edifício, seja da iniciativa da própria Impugnante, seja dos eventos criados pelos seus clientes - prova testemunhal; 22. A Impugnante realizou várias ações de preservação do edifício ..., de que se destaca o saneamento que fazia descarga direta para o rio - prova testemunhal. * Na sentença recorrida considerou-se ainda que: «Não se provaram quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.» * A título de motivação factual, exarou-se na sentença apelada que: «A decisão da matéria de facto efetuou-se tendo em consideração as posições assumidas pelas partes e sobretudo com base no exame dos documentos juntos aos autos e dos elementos que se encontram integrados no processo administrativo, cuja veracidade não foi colocada em causa e na prova testemunhal, tudo conforme se indicou ao longo dos factos provados. Com efeito, a prova testemunhal foi valorada da forma seguinte: As testemunhas demonstraram ter perfeito e direto conhecimento do funcionamento dos eventos realizados no “Edifício ...”, das receitas decorrentes dos mesmos e a sua utilização para os fins estatutários da Impugnante. As testemunhas «AA», diretor comercial e de marketing, a exercer funções na Impugnante desde 2003, e «BB», Técnica Oficial de Contas, responsável do departamento financeiro da Impugnante desde 2002, destacaram a insuficiência das receitas provenientes da atividade do Museu para suportar os custos que a mesma envolve e que a integral cobertura desses prejuízos é efetuada através das receitas geradas a partir da cedência a terceiros das diversas salas que integram o Edifício ..., que inclui, além do Museu, o denominado “Centro de Congressos”, para a realização de eventos. As testemunhas também declararam que a Impugnante, a partir da celebração do “Auto de Cessão” do edifício ..., ficou responsável pela gestão daquele espaço de forma a gerar receitas suficientes para cobrir os encargos decorrentes da recuperação, manutenção e preservação do edifício e que a gestão do edifício é uma atribuição da associação e tem sido esta gestão que tem permitido preservar o edifício e relançá-lo no panorama nacional e internacional como um edifício de referência para a realização de eventos culturais, científicos, artísticos e outros. Estas testemunhas, bem como a testemunha «CC», gestora de eventos que trabalha com a Impugnante desde 2000, disseram que se trata de um edifício com uma área útil muito significativa e para além das salas onde decorrem as exposições permanentes e temporárias afetas à atividade do museu, existem outras, com diferentes características e áreas, vocacionadas para exposições, conferências, congressos, seminários e outros eventos. As testemunhas disseram que a Impugnante não é a organizadora dos eventos que decorrem nestes espaços, mas apenas a gestora do espaço que cede a terceiros, a maior parte das vezes empresas promotoras de eventos, e que não dispõe de mobiliário, audiovisuais, nem de cozinha para prestar serviços de catering, sendo estes serviços prestados por empresas da especialidade contratadas diretamente pelos clientes, assim como a vigilância e limpeza durante o evento, a decoração, etc., sendo que em caso de alguma ser indicada pela impugnante esta recebe uma comissão. A nível financeiro, foi mencionado pelas testemunhas «BB» e «AA», que todas as receitas auferidas pela cedência de espaços são reinvestidas na recuperação e preservação do edifício ... e na cobertura dos prejuízos da atividade museológica, que é sistematicamente deficitária. As testemunhas revelaram depoimentos muito precisos e coerentes, convencendo o Tribunal da sua veracidade. Foi ainda valorado de forma assertiva o parecer do Professor Doutor Casalta Nabais, junto aos autos.» -/- III – Questões a decidir. No presente recurso, cabe analisar e decidir as questões suscitadas, nomeadamente quanto aos erros de julgamento de facto e de direito apontados à sentença recorrida. Assim, quanto a estes últimos, cabe aferir da alegada infração ao disposto no artigo 10.º, do CIRC, na redação coeva, ao estatuído na alínea a), do n.º 1, do artigo 3.º, do CIRS, e na alínea e), do n.º 2, do artigo 3.º, do CIRS, bem como na alínea b), do n.º 1, do artigo 3.º, do CIRC, e nos artigos 53º e 54º e n.º 5, do artigo 87.º, todos do CIRC (anteriores artigos 48º, 49º e n.º 5 do artigo 80º, na redação em então em vigor). -/- IV – Da apreciação do presente recurso. Constitui objeto do presente recurso a sentença proferida nestes autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto pela qual se concedeu provimento à impugnação intentada pela ora Recorrida, direcionada contra as liquidações de IRC aqui referenciadas relativas aos exercícios de 2005, 2006 e 2007. Na presente situação, as liquidações aqui em causa têm como base fundamentadora, o relatório de inspeção tributária a que aqui se faz menção no qual se concluiu, em síntese, que a ora Apelada, entidade de reconhecida utilidade pública, havia recebido rendimentos tributáveis decorrentes da cedência de espaços, através do «Centro de Congresso e Exposições», quer através da cessão e exploração do bar, uma vez que os mesmos não se enquadrariam nos seus fins estatutários e, como tal, estavam sujeitos a IRC. Cumpre, agora, apreciar e decidir. IV.1 – Do erro de julgamento da matéria de facto. Na presente apelação, a Recorrente invoca que a sentença recorrida errou na parte relativa à fixação da matéria de facto. Para o efeito, a Apelante invoca que há que aditar um conjunto de factos aos já dados por provados na sentença recorrida, enunciando-os e dando nota do respetivo suporte probatório expresso em documentos juntos aos autos que identifica, assim como indicando as partes dos depoimentos aqui tomados pelas testemunhas que identifica. Acresce que a Apelante, indica especificamente a versão factual que pretende que nesta instância seja considerada como tal. Posto isto, do ponto de vista formal, a Apelante cumpre os requisitos do art.º 640.º do novo CPC, aplicável por força da remissão contida no art.º 281.º do CPPT. Ora, quanto aos factos indicados nas conclusões «k» a «q» do presente recurso, podemos constatar que alguma da matéria delas constante tem natureza estritamente conclusiva, sendo que esta não pode aqui vir a ser considerada como verdadeira matéria de facto e, como tal, ser nesta instância aditada. No entanto, para além deste constrangimento, a matéria factual que ali vai alegada, a espaços, ultrapassa a alegação feita pela Apelante em sede de contestação. Por isso, considerando-se o disposto no art.º 99.º da LGT e art.º 5.º do CPC ex vi art.º 2.º do CPPT, os factos a aditar terão de estar balizados dentro da respetiva alegação feita no apontado articulado. Assim, tendo em conta esta delimitação, entendemos ser de aditar à matéria de facto o seguinte: 5A - Na sequência de um pedido de esclarecimento formulado pela impugnante (Recorrida), foi proferido despacho da Direção de Serviços do IRC em 26/11/2009, com a informação n.º ..78/2009 – cf doc. a fls. 56 a 63 dos autos (paginação do processo em suporte físico). 11A - Quanto ao solicitado pela impugnante à Direção de Serviços do IRS foi prestada a informação n.º ..9/11 em 24-01-2011, pela Divisão de conceção da DSIRC n.º 4093/2010, sobre a qual recaiu Despacho superior – cf. doc. a fls. 88 a 98 do PA. 11B - Através da informação n.º 1.../11, a DSIRS pronunciou-se, vindo a DIRC em 26-04-2011 prestar a informação n.º ..47/11, sobre a qual recaíram despachos concordantes da Diretora de Serviços, proferido em 04-05-2011 e da Subdiretora Geral, proferido em 09-05-2011, no sentido de os rendimentos derivados do exercício das atividades comerciais desenvolvidas fora do âmbito dos seus fins estatutários não se encontrarem abrangidos pela isenção reconhecida à impugnante (Recorrida) – cf. docs. a fls. 82 a 86 e 71 a 81 do PA. No que concerne aos factos que a Apelante pretende ver aditados e constantes das conclusões «s» a «ee» da presente apelação, constatamos que os mesmos não constam da sua alegação, nem da alegação da Recorrida (Impugnante) expressa nos respetivos articulados. Tão pouco resulta dos autos, que tais factos tenham sido sujeitos a prévio contraditório, tendo-se dado a possibilidade de às partes sobre os mesmos se poderem previamente pronunciar, antes da sua eventual consideração e inclusão na factualidade provada ou não provada. Com efeito, como se sintetiza no sumário do acórdão do STJ, datado de 23.02.2016, proferido no processo n.º 2316/12.4TBPBL.C1 (in www.dgsi.pt): “1.- Os factos complementares ou concretizadores são aqueles que especificam e densificam os elementos da previsão normativa em que se funda a pretensão do autor - a causa de pedir - ou do reconvinte ou a excepção deduzida pelo réu como fundamento da sua defesa, e, nessa qualidade, são decisivos para a viabilidade ou procedência da acção/reconvenção/defesa por excepção. 2.- Se não forem oportunamente alegados e se nem as partes nem o tribunal, ao longo da instrução da causa, os introduzirem nos autos, garantindo o contraditório, a decisão final de mérito será desfavorável àquele a quem tais factos (omitidos) beneficiavam. 3. Sem prejuízo de às partes caber a formação da matéria de facto, mediante a alegação, nos articulados, dos factos principais que integram a causa de pedir, a reforma do processo civil atribuiu ao Tribunal a assunção de uma posição muito mais activa, por forma a aproximar-se da verdade material e alcançar uma posição mais justa do processo. 4. Reconhecendo-se agora ao Juiz, para além da atendibilidade dos factos que não carecem de alegação e de prova a possibilidade de considerar, mesmo oficiosamente, os factos instrumentais, bem como os essenciais à procedência da pretensão formulada, que sejam complemento ou concretização de outros que a parte haja oportunamente alegado e de os utilizar quando resultem da instrução e da discussão da causa e desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório. 5. Os factos essenciais, a que se refere o art.5º nCPC, têm necessariamente de ser complementares ou concretizantes de outros factos essenciais oportunamente alegados em fundamento do pedido ou da excepção. 6. Essa complementaridade ou concretização tem de ser aferida pela factualidade alegada na petição inicial, isto é, pela causa de pedir invocada pelo autor, ou pela factualidade que fundamenta a excepção invocada na contestação. 7. Só são atendíveis os factos essenciais não alegados nos articulados e os instrumentais, desde que tenham sido submetidos ao regime de contraditório e de prova durante a discussão da causa.” Assim sendo, por não respeitarem os requisitos acima enunciados, os factos que a Recorrente pretende ver aditados, resultantes da prova testemunhal que indicou, não podem aqui ser aditados. No entanto, quanto a este último subitem recursivo, ainda que não se perfilhasse o entendimento acima vertido, a verdade é que o vai alegado na correspetiva matéria de facto, se traduz quer em meras explicações que nada interessam para o cerne da decisão, ou em meros juízos conclusivos e de valor que não relevam, uma vez que dos autos já consta a factualidade necessária para a decisão a proferir, esta assente nos documentos indicados e apreciados, na qual assentará a interpretação e aplicação do direito a seguir. Posto isto, no que tange ao recurso da matéria de facto, o presente recurso apenas poderá proceder parcialmente, com o aditamento factual acima enunciado. IV.2 – Do erro de julgamento da matéria de direito. A Apelante invoca que na sentença recorrida se fez uma errónea interpretação e aplicação do disposto no artigo 10.º, do CIRC, no estatuído na alínea a), do n.º 1, do artigo 3.º, do CIRS, na alínea e), do n.º 2, do artigo 3.º, do CIRS, bem como na alínea b), do n.º 1, do artigo 3.º, do CIRC e nos artigos 48º, 49º e n.º 5 do artigo 80º, todos nas respetivas redações em vigor à data dos factos. Assim, está aqui essencialmente em causa, o vertido na sentença recorrida quando nesta se considerou que: “[…] De volta ao caso em apreço, temos por certo que a Impugnante é uma associação constituída por escritura pública em 21.01.1992, sem fins lucrativos, com estatuto de utilidade pública declarado por despacho de 26.03.1993, publicado no Diário da República, II Série, n.º 84, de 10 de abril de 1993, e que prossegue predominantemente fins de natureza cultural, cujo artigo 3, dos respetivos Estatutos prevê que são objetivos daquela, nomeadamente: “a) a criação e manutenção de um Museu ..., composto por coleções ou peças próprias e as que lhe sejam confiadas em depósito; b) a preservação de infraestruturas de reconhecido interesse histórico, relacionadas com os transportes e comunicações; c) a criação e manutenção de um centro de documentação sobre transportes e sobre comunicações; d) o desenvolvimento por todas as formas do interesse público quanto à problemática dos transportes e comunicações.” Resulta do probatório que em 01.03.1996 foi proferido despacho pelo SubdiretorGeral da Direção-Geral de Contribuições e Impostos, nos termos do qual foi reconhecida à aqui Impugnante isenção de IRC quanto às seguintes categorias: “CATEGORIA C – Rendimentos comerciais e industriais diretamente derivados do exercício das atividades desenvolvidas no âmbito dos seus fins estatutários; CATEGORIA E – Rendimentos de capitais, com exceção dos de quaisquer títulos ao portador, não registados nem depositados, nos termos da legislação em vigor; CATEGORIA F – Rendimentos prediais; e CATEGORIA G – Ganhos de mais-valias.” À data deste último despacho, estava em vigor o artigo 9, do Código do IRC, na redação conferida pela Lei nº 39-B/94, de 27 de dezembro, o qual previa o seguinte: “1 - Estão isentas de IRC: (…) b) As pessoas coletivas de mera utilidade pública que prossigam predominantemente fins científicos, ou culturais, de caridade, assistência ou beneficência. 2 - As isenções previstas na alínea b) do número anterior são reconhecidas pelo Ministro das Finanças, a requerimento dos interessados, mediante despacho publicado no Diário da República, que definirá a amplitude da respetiva isenção, de harmonia com os objetivos prosseguidos pelas entidades em causa e as informações dos serviços competentes da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos e outras julgadas necessárias. 3 - A isenção prevista no n.º 1 só se aplica, no tocante aos rendimentos da atividade comercial, industrial ou agrícola, nos seguintes casos: a) Quando as correspondentes transmissões de bens e prestações de serviços estejam isentas de IVA, nos termos previstos no artigo 9º do respetivo Código, com exceção das estabelecidas nos nºs 28 e 29 do mesmo; b) Quando provenham da edição ou comercialização de livros ou outras publicações, partituras musicais, discos, bandas magnéticas e quaisquer outros suportes científicos ou culturais; c) Quando provenham da realização de espetáculos e manifestações culturais; d) Quando, não estando abrangidos nas alíneas anteriores, o total dos correspondentes proveitos ou ganhos não seja superior, no período em referência, a 60.000 contos.” Por sua vez, à data da verificação do pressuposto da isenção reconhecida à Impugnante relativas aos exercícios aqui em causa, concretamente dos anos de 2005, 2006 e 2007, aplica-se o disposto no artigo 10, do Código do IRC, na versão resultante da Lei nº 60-A/2005, de 30 de dezembro, cuja redação era a seguinte: “1 - Estão isentas de IRC: (…) c) As pessoas coletivas de mera utilidade pública que prossigam, exclusiva ou predominantemente, fins científicos ou culturais, de caridade, assistência, beneficência, solidariedade social ou defesa do meio ambiente. 2 - A isenção prevista na alínea c) do número anterior carece de reconhecimento pelo Ministro de Estado e das Finanças, a requerimento dos interessados, mediante despacho publicado no Diário da República, que define a respetiva amplitude, de harmonia com os fins prosseguidos e as atividades desenvolvidas para a sua realização, pelas entidades em causa e as informações dos serviços competentes da Direcção-Geral dos Impostos e outras julgadas necessárias. 3 - A isenção prevista no n.º 1 não abrange os rendimentos empresariais derivados do exercício das atividades comerciais ou industriais desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatutários, bem como os rendimentos de títulos ao portador, não registados nem depositados, nos termos da legislação em vigor, e é condicionada à observância continuada dos seguintes requisitos: a) Exercício efetivo, a título exclusivo ou predominante, de atividades dirigidas à prossecução dos fins que justificaram o respetivo reconhecimento da qualidade de utilidade pública ou dos fins que justificaram a isenção, consoante se trate, respetivamente, de entidades previstas nas alíneas a) e b) ou na alínea c) do n.º 1; b) Afetação aos fins referidos na alínea anterior de, pelo menos, 50% do rendimento global líquido que seria sujeito a tributação nos termos gerais, até ao fim do 4º exercício posterior àquele em que tenha sido obtido, salvo em caso de justo impedimento no cumprimento do prazo de afetação, notificado ao diretor-geral dos Impostos, acompanhado da respetiva fundamentação escrita, até ao último dia útil do 1º mês subsequente ao termo do referido prazo; c) Inexistência de qualquer interesse direto ou indireto dos membros dos órgãos estatutários, por si mesmos ou por interposta pessoa, nos resultados da exploração das atividades económicas por elas prosseguidas.” Resulta igualmente do probatório que, em 18.10.1999, através do “Auto de Cessão” celebrado entre a Impugnante e o Estado Português, aquela passou a ser detentora, a título precário e gratuito, do imóvel denominado «Edifício ...» para ser utilizado na prossecução dos seus objetivos, designadamente, para aí ser instalado o Museu .... Ainda nos termos desse acordo a Impugnante responsabilizou-se pela recuperação, conservação e manutenção do imóvel que lhe foi afeto, tendo, no entanto, sido reconhecido à mesma o direito: “a) a praticar todos os atos, exercer todas as atividades e prestar todos os serviços próprios e habituais na manutenção e funcionamento de museus; b) a ceder a terceiros, temporária e precariamente, através dos processos e instrumentos jurídicos que entender mais adequados, gratuita ou onerosamente – recebendo neste caso as respetivas contrapartidas, que são aplicadas a fins de interesse público – a utilização de partes determinadas do bem cedido, para a realização de congressos, seminários, exposições ou outros eventos de carácter científico, cultural, artístico ou social.” Por sua vez, e tendo presente o artigo 25 dos Estatutos da Impugnante, constituem receitas da mesma, entre outras as receitas da exploração, designadamente por cedência a terceiros de vários espaços do edifício ocupado pela Associação, para congressos, seminários ou outras reuniões ou eventos de carácter científico, cultural, artístico ou social. A isenção em causa, de natureza subjetiva e permanente, atende às atividades desenvolvidas pela Impugnante para realização dos fins para os quais foi criada, e tem como limites ou condicionantes, atendendo ao citado n.º 3, do artigo 10, do Código do IRC: - A afetação aos fins estatutários do rendimento global líquido gerado, pelo menos em 50%; - A inexistência de interesse, direto ou indireto, dos membros dos órgãos estatutários nos resultados de exploração; - A prossecução dos fins estatutários. Ora, conforme resulta do probatório a Impugnante cumpre esses requisitos, uma vez que as suas receitas são afetas à prossecução dos fins estatutários, na medida em que as receitas são utilizadas na criação e manutenção do Museu e na conservação e reparação do “Edifício ..., bem como em encargos decorrentes do funcionamento da instituição e financiamento de atividades promovidas na prossecução dos seus objetivos, visto que não recebe qualquer subsídio estadual. Ora, considerando que as receitas resultantes da atividade do museu e das quotas pagas pelos associados, são reduzidos, compreende-se que a manutenção do referido edifício apenas é possível com as receitas resultantes da cedência dos espaços. No que respeita aos rendimentos provenientes da exploração do designado por “Centro de Congressos” e de um estabelecimento de cafetaria e bar, essa receita está expressamente prevista no “Auto de Cessão” como meio de custear as despesas provenientes da prossecução dos interesses públicos por si desenvolvidos e previstos nesse acordo. Portanto, estas receitas, além de se inserirem na prossecução dos fins de interesse público previstos nos seus Estatutos, são efetivamente aplicadas àqueles fins, uma vez que sem as mesmas, não seria possível dar-lhes seguimento. Ou seja, sem essas receitas não seria possível a instalação, manutenção e funcionamento do museu ... e a manutenção e conservação do edifício, no seu todo, sendo ele próprio um bem cultural. Acresce, que como acima se referiu, foi reconhecida à Impugnante isenção no Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, nomeadamente, quanto à categoria F, de Rendimentos prediais. Ora, prevê o n.º 1, do artigo 8, do Código do IRS, na redação em vigor à data dos factos, sob a epígrafe “Rendimentos da categoria F”, que “consideram-se rendimentos prediais as rendas dos prédios rústicos, urbanos e mistos pagas ou colocadas à disposição dos respetivos titulares”, estipulando o n.º 2 do mesmo preceito legal que são havidas como rendas: “a) As importâncias relativas à cedência do uso do prédio ou de parte dele e aos serviços relacionados com aquela cedência (…)”. No caso em apreço, a isenção conferida pelo referido despacho do SubdiretorGeral dos Impostos abrange os rendimentos da Categoria F, enquadrando-se a cedência de espaços no conceito de “cedência do uso do prédio ou de parte dele e aos serviços relacionados com aquela cedência” - cfr. alínea a), do n.º 2, do artigo 8, do Código do IRS). Em suma, não podemos concordar com o entendimento da Administração Tributária, porquanto, e como acima se expôs, as receitas geradas pela cedência de espaços, incluindo o bar, são aplicadas nos encargos de funcionamento do Edifício..., no seu todo, ou seja, são usadas na prossecução dos interesses públicos assumidos aquando da criação da Associação e da cedência do Edifício .... Assim sendo, face à reconhecida natureza jurídica da Impugnante, aos seus fins estatutários, ao teor do “Auto de Cessão” celebrado com o Estado Português, à afetação exclusiva das referidas receitas à prossecução dos seus objetivos estatutários, ao reconhecimento da isenção de IRC por despacho do Subdiretor-Geral dos Impostos aos rendimentos da Categoria “F”, é manifesto que os referidos rendimentos relativos quer à cedência de partes do imóvel para congressos, seminários e outras iniciativas, quer relativos à cedência do respetivo mobiliário, enquadram-se, respetivamente, nas alíneas a) e b), do n.º 2, do artigo 8, do Código do IRS, ou seja, são rendimentos prediais, abrangidos pela reconhecida isenção de IRC. Neste mesmo sentido, destaca o Professor Doutor Casalta Nabais no parecer que sobre esta questão emitiu e que está junto aos autos “a obtenção de receitas do tipo das aqui em consideração, não significa abrir um ramo de atividade diverso daquele a que as receitas se destinam, sendo estas apenas um meio de fazer face às despesas incorridas na exigente atividade de realização dos fins estatutários da ATMC, sejam estas despesas correntes, que se reportam ao exercício em que ocorrem, sejam despesas de investimento que se prolongam por diversos anos em função do plano de investimentos programado. O que, pelo facto de se prolongarem por diversos anos não alteram a sua natureza de receitas estritamente vinculadas à realização das despesas com os objetivos estatutários” (cfr. página 24). Salientando o mesmo Professor que “se outros argumentos fossem necessários, sempre seria de recorrer ao contrato celebrado com a ATMC e o Estado, concretizado no Auto de Cessão em que realisticamente se reconheceu à AMTC o direito de ceder a terceiros, mormente onerosamente - recebendo as respetivas contrapartidas aplicadas a fins do interesse público - a utilização de partes determinadas do bem cedido, para a realização de congressos, seminários, exposições ou outros eventos de carácter científico, cultural, artístico ou social. E se é verdade que um tal contrato não pode servir de parâmetro à definição da amplitude da isenção em causa, ao que se opõe o princípio da legalidade fiscal que abrange na reserva de lei fiscal os benefícios fiscais, de que a isenção constitui a manifestação mais paradigmática, não é menos certo que esse contrato sempre pode ser tido como elemento importante para determinar seja a atividade desenvolvida pela Associação, sejam os rendimentos obtidos como contrapartida da cedência onerosa de partes do «Edifício ...». Pelo que não vemos qualquer base que possa suportar a interpretação que a Administração Fiscal deu aos preceitos legais em causa” (cfr. págs. 26 e 27). Mas mesmo que aquelas receitas se enquadrassem na Categoria “B” (relativa aos rendimentos comerciais), ainda assim estavam abrangidas pela isenção de IRC concedida à Impugnante, dado que, além de se inserirem na prossecução dos fins de interesse público previstos nos seus estatutos, são efetivamente aplicadas àqueles fins. Como refere o Professor Doutor Casalta Nabais, “mesmo que, por mera hipótese académica, os rendimentos em causa fossem de considerar como rendimentos empresariais, ainda assim a conclusão não poderia, a nosso ver, ser outra. É que esses rendimentos, que resultam, como vimos, da cedência de espaços e de alguns serviços ligados à utilização funcionalmente cultural dos mesmos, sempre foram obtidos no estrito respeito pelos fins estatutários da AMTC. De resto, a lei não impõe que se trate de uma cedência pura e simples de espaços, permitindo, antes, que essa cedência possa ser rodeada da prestação de serviços que potencie essa cedência. Ou seja, por outras palavras, não exige, nem pode exigir, uma gestão menos eficiente da prossecução dos objetivos de interesse público estatutários da Associação” (cfr. págs. 28 e 29 do parecer junto aos autos). Deste modo, o enquadramento das receitas aqui em causa e a tributação em sede de IRC que está subjacente à emissão das liquidações objeto de impugnação judicial não tem suporte legal, dado que todas as receitas auferidas pela impugnante na prossecução dos seus fins se encontram abrangidas pela isenção de IRC concedida por despacho do Subdiretor-Geral dos Impostos de 01.03.1996. Termos em que procede a presente impugnação, com a consequente anulação das liquidações adicionais de IRC relativas aos exercícios de 2005, 2006 e 2007. […]” (fim de citação). Na situação presente, a Recorrente não colocando em questão que os rendimentos provenientes do Centro de Congressos, quer os oriundos do contrato de cessão de exploração da cafeteria/bar foram aplicadas aos fins estatutários, coloca antes o assento a jusante, ou seja, se as ditas receitas proveem do exercício de atividades comerciais e industriais desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatutários, sendo este o fundamento das liquidações. No CIRC, as normas previstas nos artigos 10º e 11º consubstanciam benefícios fiscais. Distintas das exclusões tributárias, incorporam um interesse extrafiscal (a promoção das atividades desenvolvidas por um conjunto de entidades, que justifica que o Estado renuncie à receita fiscal, gerando, portanto, despesa fiscal). Segundo o Grupo de Trabalho para o Estudo dos Benefícios Fiscais (Os Benefícios Fiscais em Portugal. Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 217, 2019, p.176), a isenção prevista no artigo 10º do CIRC, que está em vigor desde 1989, tem como objetivo extrafiscal “aumentar o papel solidário e subsidiário das pessoas coletivas de utilidade pública através da promoção de fins de interesse geral com cooperação com administração central ou local em áreas de relevo social tais como: a promoção da cidadania e dos direitos humanos, a educação, a cultura a ciência, o desporto, o associativismo jovem, a proteção de crianças, jovens, pessoas idosas, pessoas desfavorecidas, bem como de cidadãos com necessidades especiais, a proteção do consumidor, a proteção do meio ambiente e do património natural, o combate à discriminação baseada no género, raça, etnia, religião ou em qualquer outra forma legalmente proibida, a erradicação da pobreza, a promoção da saúde ou do bem-estar físico, o empreendedorismo, a inovação e o desenvolvimento económico, a preservação do património cultural”. As isenções previstas nos artigos 10º e 11º têm uma amplitude distinta. O artigo 10º consagra uma isenção aplicável aos rendimentos provenientes de qualquer atividade, desde que exercida no âmbito dos fins estatutários, obtidos por Instituições Particulares de Solidariedade Social e pessoas coletivas legalmente equiparadas (n.º 1, alínea b)) e por pessoas coletivas que disponham do estatuto de utilidade pública que prossigam, exclusiva ou predominantemente, fins científicos ou culturais, de caridade, assistência, beneficência, solidariedade social, defesa do meio ambiente e interprofissionalismo agroalimentar (alínea c)). A proeminência da natureza jurídica do sujeito passivo no funcionamento desta isenção atribui-lhe um caráter subjetivo. Quanto às pessoas coletivas de mera utilidade pública que prossigam os fins previstos na alínea c) do artigo 10.º, a isenção de IRC carece de reconhecimento prévio, que define a amplitude da isenção (que, por via de regra, não é plena), nos termos do n.º 2 do artigo 10.º do CIRC. Assente está nos autos, o carácter subjetivo da isenção conferido a aqui Recorrida, pois que estamos perante uma associação constituída por escritura pública em 21.01.1992, sem fins lucrativos, com estatuto de utilidade pública declarado por despacho de 26.03.1993, publicado no Diário da República, II Série, nº 84, de 10 de abril de 1993. O diferendo coloca-se ao nível da amplitude, atenta a limitação imposta do n.º 3 do artigo 10º que a isenção não abrange os rendimentos provenientes das atividades, necessariamente acessórias ao seu fim principal, de natureza comercial ou industrial desenvolvidas fora do âmbito dos seus fins estatutários, assim como “os rendimentos de títulos ao portador, não registados nem depositados, nos termos da legislação em vigor”. Assim, a isenção do artigo 10.º não se aplica aos rendimentos decorrentes do exercício de atividades empresariais que sejam estranhos aos estatutos daquelas entidades e está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 3. A parte final deste artigo - n.ºs 4 e 5 - dita as consequências do desrespeito pelos pressupostos consagrados. Os requisitos adicionais, previstos no n. º 3, al. a), b) e c), estão relacionados com a atividade principal exercida, com a afetação dos resultados gerados e com a conduta dos membros dos órgãos estatutários. Em concreto, exige-se que as atividades efetivamente exercidas se dirijam à prossecução dos fins que estiveram na base da isenção (alínea a)), que pelo menos metade do rendimento global líquido que seria sujeito a tributação seja canalizado para aqueles fins (alínea b)) e que os membros dos órgãos estatutários não extraiam vantagens económicas dos resultados de exploração das atividades económicas exercidas (alínea c)). Temos então, pela negativa que os rendimentos empresariais resultantes do “exercício das atividades comerciais ou industriais desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatutários” não subsumem à regra da isenção (n.º 3 do artigo 10.º). Para Gomes Santos (Santos, J.C.G., 2008, “IRC e Discriminação Fiscal Positiva de Entidades Sem Fins Lucrativos. O Caso das IPSS”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano I, n.º 3, 2008 pp.77-90), “o alcance da norma é, também, o de abranger com a isenção do imposto sobre o rendimento (IRC) as atividades que sirvam como forma de angariação de meios financeiros de suporte às finalidades estatutárias e atividades principais desenvolvidas”. Em suma, sufragamos que a ideia subjacente ao n.º 3 do artigo 10º do CIRC, é que as “atividades secundárias, ou acessórias”, apenas beneficiam de isenção se estiverem adstritas à prossecução da atividade principal e preencherem os requisitos enumerados nas várias alíneas do n.º 3 deste artigo, só esta leitura vai de encontro ao normativo em apreço, pois se estivermos no âmbito da atividade principal ela está intrinsecamente e umbilicalmente ligado ao seu fim estatutário e alcance conferido pelo reconhecimento a que alude o n.º2 do artigo 10º, com foco in casu, a questão só se coloca na sua amplitude no que tange às atividades acessórias. Ou seja, se atividade comercial e/ou empresarial for exercida a título acessório, a isenção mantém-se caso se enquadrem no âmbito dos seus fins estatutários, preenchidos que estejam os pressupostos das supramencionadas alíneas a), b) e c) do n. º3 do artigo 10º do CIRC. Fora deste espaço, a isenção não opera e o rendimento global obtido fica sujeito a tributação. In casu, não está colocado em causa pela AT e dos autos resulta em abundância a verificação dos pressupostos contidos nas alíneas a), b) e c) do n.º 3 do artigo 10º do CIRC, a questão passa tão só por aferir se os rendimentos em análise (Centro de Congressos e contrato de cessão de exploração da cafeteria/bar) provém de uma atividade desenvolvida no âmbito dos fins estatutários. Ora, é manifesto que uma Associação como a aqui em questão, no âmbito do seu fim estatutário, acolhe atividades que se espraiam por diversos domínios, podendo facilmente assumir uma natureza comercial e/ou empresarial, cumpre em primeira mão atentar a sua demarcação administrativa e, num segundo plano, avaliar se estão relacionadas com os fins aí previstos, o qual só é possível de aferir, por via do seu caráter instrumental ou acessório dessa mesma atividade económica de natureza empresarial e que a conexa com atividade principal, pelo destino dado aos resultados por elas gerados. Fora do espaço de isenção, ficam as atividades que são exercidas de forma autónoma, em que os seus excedentes não cumprem qualquer critério de afetação em relação ao fim solidário, e as que são estranhas aos setores de atividade que não constam dos estatutos (neste sentido cf. Daniel Taborda, António Martins, As isenções em IRC das atividades exercidas pelas entidades do setor não lucrativo, in Revista Jurídica Portucalense, UPT, n.º 33, ano 2023). Assim sendo, carece de razão a recorrente na interpretação restritiva que assume do n.º 3 do artigo 10º do CIRC, inexistindo os erros de julgamento apontados, pelo que terá de improceder o presente recurso, sendo de manter a sentença recorrida, a que acresce a presente fundamentação. * Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, apresenta-se o seguinte sumário: I- No artigo 5.º do novo CPC reconhece-se ao Juiz, para além da atendibilidade dos factos que não carecem de alegação e de prova a possibilidade de considerar, mesmo oficiosamente, os factos instrumentais, bem como os essenciais à procedência da pretensão formulada, que sejam complemento ou concretização de outros que a parte haja oportunamente alegado e de os utilizar quando resultem da instrução e da discussão da causa e desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório. II – No entanto, só serão atendíveis os factos essenciais não alegados nos articulados e os instrumentais, desde que tenham sido previamente submetidos ao regime do contraditório e de prova durante a discussão da causa. III - Se atividade comercial e/ou empresarial for prosseguida por uma pessoa coletiva de utilidade pública, que prossigam algum dos fins previstos na parte final da alínea c) do n.º 1 do art.º 10.º do CIRC, sendo aquela atividade exercida a título acessório, a isenção mantém-se caso se enquadre no âmbito dos seus fins estatutários, preenchidos que estejam os pressupostos das alíneas a), b) e c) do n. º3 do artigo 10º do CIRC. Fora deste espaço, a isenção não opera e o rendimento global obtido fica sujeito a tributação. -/- V – Dispositivo Nestes termos, acordam em conferência os juízes desta Subsecção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao presente recurso, mantendo-se a sentença recorrida. Custas pela Recorrente (por vencida). Porto, 10 de abril de 2025 Carlos A. M. de Castro Fernandes Serafim José da Silva Fernandes Carneiro (com voto de vencido em anexo) Celeste Oliveira Voto de vencido: No meu entender o recurso merece provimento porque a isenção prevista no art. 10.º, n.ºs 1, alínea c), 2 e 3, do CIRC, exclui expressamente todos e quaisquer “rendimentos empresariais derivados do exercício das atividades comerciais ou industriais desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatutários”. O direito à isenção é determinado pela origem dos proveitos e não pelo destino que lhe é dado. Os rendimentos das atividades do “Centro de Congressos” e da “Cessão e exploração do bar” são derivados de atividades comerciais desenvolvidas fora do âmbito dos fins estatutários da Associação, mesmo que os respetivos proventos se destinem a aplicar no edifício .... Por isso, o direito à isenção também estaria dependente de novo reconhecimento ao abrigo do n.º 2, que não foi requerido, porque o concedido à Associação só abrangia a isenção de rendimentos da categoria C (atual categoria B) que fossem “diretamente derivadas do exercício das atividades desenvolvidas no âmbito dos seus fins estatutários”. Acresce que esses rendimentos não são rendimentos prediais – categoria F – porque no caso do “Centro de Congressos” além da cedência do espaço, a Associação também prestava outros serviços relacionados com a organização de eventos que fazem com que os rendimentos dessa atividade sejam qualificados como categoria B, previstos no art. 3.º, n.º 2, alínea a), do CIRS, e no caso da cessão de exploração do bar os rendimentos são da categoria B, por força do art. 3.º, n.º 2, alínea e), do CIRS. |