Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00261/17.6BEMDL
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/07/2025
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:MARIA FERNANDA ANTUNES APARÍCIO DUARTE BRANDÃO
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA;
EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES DE VOGAL DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO CENTRO HOSPITALAR (...), S.A.;
INDEMNIZAÇÃO; PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte -Subsecção Social-:

RELATÓRIO
«AA», NIF ...24, residente na Avenida ..., ... r, ..., instaurou acção administrativa contra o CENTRO HOSPITALAR ... E.P.E., NIPC ...96, com sede na Avenida ..., ..., ..., formulando o seguinte pedido:
“Termos em que deve a presente acção vir a ser julgada como provada e procedente, condenando-se a ré ao pagamento ao Autor da quantia global de € 17.355,19 (dezassete mil trezentos e cinquenta e cinco euros e dezanove cêntimos), acrescida de juros legais moratórios vincendos à taxa legal de 4% sobre o valor do capital em dívida, com custas e demais despesas a cargo da Ré.”.
Por decisão proferida pelo TAF de Mirandela foi julgada improcedente a acção.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões:
I. O Tribunal a quo proferiu sentença no dia 31 de janeiro de 2022 que foi desfavorável ao aqui Recorrente, uma vez que considerou não haver lugar ao pagamento de qualquer tipo de indemnização ao Autor, ora Recorrente.
II. Para o triénio de 2002/2005, foi nomeado o Dr. «BB» para exercer as funções de Vogal do Conselho de Administração do Centro Hospitalar 1, S.A.
III. No entanto, este veio a renunciar às funções, pelo que foi o Recorrente nomeado para o substituir a 23 de julho de 2004.
Sucede que,
IV. As funções do Recorrente vieram a cessar por despacho conjunto datado de 20 de junho de 2005.
V. Não obstante o fim do triénio 2002/2005 apenas vir a ocorrer em dezembro de 2005, uma vez que a Assembleia Geral do Centro Hospitalar 1, S.A. veio a realizar-se a 16 de dezembro de 2002.
VI. Assim, nos termos do disposto no artigo 15.° da Lei n.° 71/2007, de 27 de março e no artigo 10.°, n.° 4 dos Estatutos do Hospital, publicados em anexo ao Decreto-Lei n.° 273/2002, de 9 de dezembro, o mandato dos administradores tem uma duração que nunca pode vir a ser inferior a três anos.
VII. O que configura uma cessação antecipada das funções do Recorrente, visto que este apenas deveria cessar as suas funções em dezembro de 2005.
VIII. A sentença recorrida vem alegar que a duração do mandato dos administradores é de três anos e portanto sendo a primeira designação feita em dezembro de 2002, o seu término ocorreria em dezembro de 2004, fundamentando-se no art. 10.°, n.° 4 dos Estatutos do Centro.
IX. Tal interpretação não pode prevalecer uma vez que a designação feita para o triénio 2002/2005, tal como consta do Documento 1 juntos aos autos com a Petição Inicial.
X. Pelo que, no âmbito da substituição feita por força da renúncia ao exercício das funções do anterior Vogal, esse mesmo período de mandato deve ser cumprido.
XI. Assim, estando o vogal inicialmente nomeado eleito para cumprir as suas funções durante o triénio 2002/2005, o vogal que o venha substituir, o aqui Recorrente, cumprirá as suas funções pelo mesmo período de mandato.
XII. Termos em que o tribunal a quo interpretou de forma errónea a questão aqui controvertida, pois fundamentou a sua convicção no Documento 4 junto com a Petição Inicial e concluiu que o termo do mandato ocorreria em 2004.
Conclui-se ainda que,
XIII. Não se aplica igualmente o art. 6.° do Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.° 273/2002, uma vez que a Recorrida não forneceu qualquer justificação para a interrupção da comissão de serviço do Recorrente.
XIV. Porquanto não houve exoneração fundamentada no decurso do prazo, motivo justificado ou dissolução do órgão de gestão pois nenhuma destas situações ocorre no caso em concreto.
XV. Não procede igualmente a fundamentação apoiada nos n.°s 4 e 5 do artigo 391.° do Código das Sociedades Comerciais visto que o Recorrente apenas foi nomeado por força de uma renúncia do Vogal anteriormente eleito e por isso não exercer funções durante todo o mandato e as suas funções cessaram meses antes do termo do seu mandato, por força de uma nova nomeação.
XVI. Pelo que, a fundamentação com base neste normativo não padece de qualquer nexo e escapa à questão fundamental do presente caso, que originou a presente ação.
Assim,
XVII. É do nosso entendimento que a cessação das funções do Recorrente no mês de junho de 2005, face ao verdadeiro termino do triénio em dezembro desse ano, origina o direito a ser indemnizado por força da exclusão a que foi sujeito.
XVIII. O Recorrente não poderia deixar de auferir a indemnização a que tem direito, nos termos do art. 6.° do Decreto-Lei n.° 464/82, de 9 de dezembro e da jurisprudência supra referenciada.
Termos em que,
XIX. Atendendo ao facto de que o Recorrente auferia a remuneração de 4.834,80 € a partir de julho de 2004, sendo 3,719,08 € referentes à remuneração base e 1.115,72 € despesas de representação, conforme os Documentos 6, 7 e 8 juntos aos autos com a Petição Inicial.
XX. E que após a cessação das suas funções o Recorrente passou a auferir 3.047,46 €, dendo 2.759,93 € referentes a remuneração base e 288,53 € referentes a despesas de representação, conforme os Documentos 9, 10, 11, 12 e 13 juntos aos autos com a Petição Inicial.
XXI. Estamos perante uma diferença de 959,16 € no que concerne à remuneração base e 829,19 € relativos a despesas de representação.
Pelo que,
XXII. A soma destes valores diferenciais, multiplicados pelos seis meses decorridos desde o termo antecipado do mandato do Recorrente até ao momento em que o mesmo deveria ter-se concluído resulta no valor diferencial de 11.689,26 € (incluindo o subsídio de Natal).
XXIII. Por força do exposto, a decisão do tribunal a quo viola o disposto no artigo 15.° da Lei n.° 71/2007, de 27 de março e do artigo 10.°, n.° 4 dos Estatutos do Hospital, publicados em anexo ao Decreto-Lei n.° 273/2002, de 9 de dezembro, assim como o artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 464/82, de 9 de dezembro, uma vez que a recorrida não decidiu em conformidade com os critérios estabelecidos para a duração do mandato do Conselho de Administração, julgando improcedente a ação e negando o direito do Recorrente à indemnização pela cessação antecipada do mandato.
Por tudo quanto foi exposto, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser a Recorrida condenada no pagamento da indemnização no valor de 17.355,19 (dezassete mil trezentos e cinquenta e cinco euros e dezanove cêntimos) ao Recorrente, acrescida de juros legais moratórios vincendos à taxa legal de 4% sobre o valor do capital em dívida.
O Réu juntou contra-alegações, concluindo:
A) O aqui Recorrido “CENTRO HOSPITALAR ..., E.P.E” doravante CENTRO HOSPITALAR ..., concorda, como só pode concordar, com a douta Sentença recorrida, proferida em 31 de janeiro de 2022, a qual decidiu “julgar a presente ação administrativa totalmente improcedente e, em consequência absolver a entidade demandada do pedido”.

B) Pois, salvo o devido respeito, a argumentação do recurso interposto pelo, aqui Recorrente, além de não ter fundamento legal, para tanto, não é alicerçado em fundamentação fáctica.

C) Acontece que, no essencial, o aqui Recorrente «AA» aduz que o Tribunal a quo ao julgar a ação totalmente improcedente, interpretou, alegadamente, de forma errónea a questão controvertida.

D) Porém, desde já, salvo, sempre o devido respeito por opinião contrária, o Tribunal “a quo” fez uma correta interpretação e aplicação das normas contidas no Decreto-Lei n.º 273/2002, de 9 de dezembro; no decreto-lei n.º 50-A/2007 de 28 de fevereiro; os estatutos do Centro aprovado pelo DL n.º 273/2002 o qual por sua vez remete para o código das sociedades comerciais (sociedades anónimas – artigo 391º), atenta a remissão nos termos do artigo 4º; o disposto no artigo 2º do DL n.º 464/82, de 9 de dezembro, à situação fáctica dos presentes autos.

E) A questão a apreciar e decidir nos presentes autos “é a de saber se o autor tem direito a obter da entidade demandada o pagamento de uma indemnização pela cessação de funções como vogal do Conselho de Administração do Centro Hospitalar 1, SA, e em caso afirmativo saber se ocorreu a prescrição de tal crédito.”.

F) Salvo opinião contrária, o Tribunal “a quo” explanou e dissertou o enquadramento jurídico aplicável à factualidade dada como provada e não impugnada, nos presentes autos.

G) Na sequência as alegações e conclusões apresentadas, não são mais do que afloreados e meras conclusões de direito, que não atacam os fundamentos de facto com base nas quais a sentença ora recorrida decidiu.

H) A questão decidenda, é de simples apreciação, a de saber se o direito indemnizatório invocado pelo Recorrente existe, face aos factos dados como provados e, que não foram objeto de impugnação em sede recursal pelo recorrente.

I) Assim, no âmbito da factualidade – factos concretos - dada como assente nos presentes autos para a apreciação do conceito jurídico “contagem de prazo de duração de mandato” resulta dos mesmos que:
“Por despacho conjunto do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças e do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças de 23/07/2004 foi decidido “Propor e votar favoravelmente a eleição do Dr. «AA» para o cargo de vogal do Conselho de Administração, a partir da presente data e até final do mandato em curso 2002/2004, em substituição do Dr. «BB», que apresentou a sua renúncia aquele cargo” (cfr. documento nº 3 junto com a petição inicial; facto não controvertido);
(...)
Por ofício datado de 05/08/2004, remetido pelo Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar 1, S.A., «CC», foi comunicado ao Presidente do Conselho de Administração do Hospital Distrital de ..., S.A. que: “O Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar 1, S.A., informa V. Exa. que o Sr. Dr. «AA», Administrador Hospitalar, pertencente ao quadro desse Hospital, foi eleito Vogal Executivo deste Centro Hospitalar por eleição da Assembleia Geral, reunida dia 26 de Julho de 2004, com efeitos à data da reunião e pelo período até final do mandato (Dezembro de 2004).” (cfr. documento nº 1 junto com a contestação);
4. Por deliberação de 20/06/2005, da Assembleia Geral da sociedade Centro Hospitalar 1, S.A. foram eleitos os membros do Conselho de Administração para o triénio 2005/2007, «DD» (presidente), «EE» (vogal executivo) e «FF» (vogal executivo) (cfr. documento nº 5 junto com a petição inicial; facto não controvertido);
5. Desde 23/07/2004 até 20/06/2005 o autor desempenhou as funções de vogal do Conselho de Administração do Centro Hospitalar 1, S.A. (facto não controvertido);
6. Em Junho de 2005 o autor regressou ao seu cargo de origem como Administrador Hospitalar de 2ª classe, no Hospital ... (facto não controvertido);

J) Deste modo, resulta da factualidade acima descrita e dada como provada, não impugnada, que o Recorrente foi eleito para o período de 2002/2004.

K) Consequentemente, se o autor se manteve em funções até junho de 2005, data de nomeação dos novos membros dos órgãos sociais, para o triénio (2005/2007), tal decorreu do cumprimento do estatuído no artigo 10º, n.º 4 dos Estatutos o qual determina que os administradores se mantêm em efetividade de funções até à posse dos membros que venham substituir.

L) Portanto, não se verificam os pressupostos fixados pelo artigo 6º, n.º 2, do DL 464/82, que possam consubstanciar a atribuição e pagamento de indemnização.

M) Pois encontra-se demonstrado documentalmente que a cessação de funções do autor/recorrente do cargo de vogal do conselho de administração ocorreu por decurso do prazo do mandato para o qual foi eleito.

N) Nessa medida, de acordo com os factos dados como provados e, que não foram objecto de impugnação em sede recursal pelo recorrente, a apreciação de mérito da sentença, em causa nos presentes autos, não merece qualquer censura, sendo a mesma ininpugnável.

O) Nesses moldes, a douta sentença sob censura, no nosso humilde entendimento, expõe um raciocínio lógico, claro e conciso, na sua fundamentação de direito.

P) Que, tal raciocínio lógico, apenas, poderia conduzir como conduziu à improcedência da ação instaurada pelo Recorrente, nos precisos termos em que foi exarado, não se vislumbrando, a não ser na opinião do aqui Recorrente, qualquer erro de julgamento.

Q) Contrariamente, ao que o Recorrente invoca, é inequívoco, o sentido da decisão e dos seus fundamentos, pois lendo os seus fundamentos, estes são de fácil compreensão, face à factualidade dada como assente e não impugnada.

R) Pelo que, neste contexto, não poderia ser outra a decisão a proferir pelo Douto Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela.

S) Pelo que, a Sentença, ora em recurso, pelos fundamentos nela aduzidos, para as quais remetemos, não merece qualquer censura, devendo ser mantida.
Termos em que, nos melhores de direito, com o suprimento, deve o presente recurso interposto pelo recorrente «AA» ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se integralmente a douta Sentença recorrida.

Assim se fará justiça.

A Senhora Procuradora Geral Adjunta notificada, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, emitiu parecer, finalizando assim:

Tudo exposto, somos do parecer que o presente recurso deve merecer provimento, por entendermos que a sentença recorrida padece de erro na interpretação e aplicação do direito, pelo que deve ser revogada e substituída por outra que condene o R. no pagamento de indemnização, sendo que o montante da mesma corresponde aos diferenciais do ordenado base auferido pelo A. como gestor, e o ordenado base auferido pelo A., no seu serviço de origem entre junho e dezembro de 2005, incluindo o diferencial do subsidio de natal, devendo contudo ser excluído da citada indemnização os montantes auferidos a título de despesas de representação.

A este responderam o Autor e o Réu nos termos que aqui se dão por reproduzidos.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1. Por deliberação de 16/12/2002, da Assembleia Geral da sociedade Centro Hospitalar 1, S.A. foram eleitos os membros do Conselho de Administração para o triénio 2002/2005, «CC» (presidente), «GG» (vogal) e «HH» (vogal) (cfr. documento nº 2 junto com a petição inicial; facto não controvertido);
2. Por despacho conjunto do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças e do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças de 23/07/2004 foi decidido “Propor e votar favoravelmente a eleição do Dr. «AA» para o cargo de vogal do Conselho de Administração, a partir da presente data e até final do mandato em curso 2002/2004, em substituição do Dr. «BB», que apresentou a sua renúncia aquele cargo” (cfr. documento nº 3 junto com a petição inicial; facto não controvertido);
3. Por ofício datado de 05/08/2004, remetido pelo Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar 1, S.A., «CC», foi comunicado ao Presidente do Conselho de Administração do Hospital Distrital de ..., S.A. que: “O Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar 1, S.A., informa V. Exa. que o Sr. Dr. «AA», Administrador Hospitalar, pertencente ao quadro desse Hospital, foi eleito Vogal Executivo deste Centro Hospitalar por eleição da Assembleia Geral, reunida dia 26 de Julho de 2004, com efeitos à data da reunião e pelo período até final do mandato (Dezembro de 2004).” (cfr. documento nº 1 junto com a contestação);
4. Por deliberação de 20/06/2005, da Assembleia Geral da sociedade Centro Hospitalar 1, S.A. foram eleitos os membros do Conselho de Administração para o triénio 2005/2007, «DD» (presidente), «EE» (vogal executivo) e «FF» (vogal executivo) (cfr. documento nº 5 junto com a petição inicial; facto não controvertido);
5. Desde 23/07/2004 até 20/06/2005 o autor desempenhou as funções de vogal do Conselho de Administração do Centro Hospitalar 1, S.A. (facto não controvertido);
6. Em Junho de 2005 o autor regressou ao seu cargo de origem como Administrador Hospitalar de 2ª classe, no Hospital ... (facto não controvertido);
7. Nos meses de Abril a Junho de 2005, o autor auferiu, no grupo profissional “Conselhos de Administração” as quantias de: 2.700,52 €, a título de remuneração base; 1.018,56 €, a título de remuneração base suplementar; e, 1.115,72 €, a título de despesas de representação (cfr. documentos nº 6, 7 e 8 juntos com a petição inicial; facto não controvertido);
8. A partir de Junho de 2005 o autor auferiu, no grupo profissional “Pessoa Dirigente” as quantias de: 2.759,93 €, a título de remuneração base; e, 288,53 €, a título de despesas de representação (cfr. documentos nº 9 a 13 juntos com a petição inicial; facto não controvertido).

DE DIREITO
Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Sem embargo, por força do artigo 149.º do CPTA, o Tribunal, no âmbito do recurso de apelação, não se quedará por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decidirá “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
Assim,
A questão que se suscita no presente recurso prende-se com a determinação do termo inicial da contagem do prazo de duração de três anos, do mandato do Conselho de administração nomeado em dezembro de 2002. Ou seja, tendo por deliberação de 16/12/2002, da Assembleia Geral da sociedade Centro Hospitalar 1, S.A. sido eleitos os membros do Conselho de Administração para o triénio 2002/2005, «CC» (presidente), «GG» (vogal) e «HH» (vogal) (cfr. documento n° 2 junto com a petição inicial; facto não controvertido); E, tendo em conta que por despacho conjunto do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças e do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças de 23/07/2004, foi proposto: “Propor e votar favoravelmente a eleição do Dr. «AA» para o cargo de vogal do Conselho de Administração, a partir da presente data e até final do mandato em curso 2002/2004, em substituição do Dr. «BB», que apresentou a sua renúncia àquele cargo”, o termo inicial da contagem do período de três anos, a fim de determinar o términus do triénio, do mandato Conselho de Administração para 2002/2005, inicia-se com a primeira designação feita em dezembro de 2002, e, portanto, terminaria em dezembro de 2005, tal como defende o Recorrente, ou, pelo contrário, o termo inicial da contagem do período de três anos, a fim de determinar o términus do triénio do mandato Conselho de Administração para 2002/2005, inicia-se, por falta de regulamentação própria quanto à designação, nos termos do disposto do artº 391° do Código das Sociedades Comerciais (CSC), atenta a remissão prevista no artigo 4° do DL 273/2002, que remete para a lei reguladora das sociedades anónimas, tal como entendido na sentença?
A questão que se suscita é a de saber se existe alguma lacuna por falta de regulamentação própria, que terá que ser preenchida através da remissão, feita pelo artº 4° do Dec-Lei n° 723/2002, para o art. 391° do CSC.
Ora, estatui o artº 2° do estatuto do gestor público, então regulado pelo Decreto-lei n° 464/82, de 9 de dezembro, e aplicável à data dos factos, o seguinte:
“1 - A nomeação do gestor público envolve a atribuição de um mandato para o exercício das funções pelo prazo constante dos estatutos da empresa.
2 - O gestor público é nomeado e exonerado por despacho conjunto do Primeiro-Ministro, do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano e do ministro da tutela. Os gestores que façam parte de comissões executivas serão nomeados e exonerados por proposta do presidente.
3 - No silêncio da lei orgânica e dos estatutos, o mandato dos gestores públicos tem a duração de 3 anos contados a partir da data da nomeação e cessa na data em que tomarem posse os gestores designados após o decurso do triénio; pode, porém, o despacho da nomeação fixar ao mandato do gestor público prazo mais curto do que o prazo resultante da lei ou estatutos.
4 - Não é fixado qualquer limite máximo genérico para a duração do mandato do gestor nem para o número de mandatos sucessivos na mesma empresa.” “1 - A nomeação do gestor público envolve a atribuição de um mandato para o exercício das funções pelo prazo constante dos estatutos da empresa.”
Da leitura do n° 3 do citado preceito legal resulta, assim que o termo inicial da contagem é o da data de nomeação, isto é, no caso concreto, a contagem inicia-se em dezembro de 2002, pelo que a duração do mandato do Conselho de Administração só terminava em dezembro de 2005, não sendo necessário, por isso, recorrer ao disposto no artº 391° do CSC, por existir regulamentação própria.
E, tendo o Autor, sido nomeado em substituição de vogal «II», o seu mandato só terminaria em dezembro de 2005, data em que cessava o mandato do Conselho de Administração, que aquele veio integrar.
Tendo o Conselho de Administração seguinte sido nomeado por deliberação de 20.06.2005, para o triénio 2005/2007, antes de ter sido atingido o términus do mandato anterior, por ainda não ter decorrido o período dos três anos e não tendo sido invocado qualquer dos circunstancialismos previstos no artº 6° do Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.° 273/2002 que justificasse a dissolução do órgão de gestão, o Autor/Recorrente tinha direito ao pagamento da indemnização prevista no artº 10.° n° 6 do Decreto-Lei n.° 464/82, de 9 de dezembro, caso o seu direito não tivesse prescrito.
E, afigura-se-nos que, para o caso, não é relevante o despacho conjunto do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças e do Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças datado de 23/07/2004 onde se decidiu “Propor e votar favoravelmente a eleição do Dr. «AA» para o cargo de vogal do Conselho de Administração, a partir da presente data e até final do mandato em curso 2002/2004, em substituição do Dr. «BB», que apresentou a sua renúncia aquele cargo”, nem o ofício referido no ponto 3 da matéria de facto, por entendermos que os mesmos padecem de lapso, na mesma linha do que entendeu o parecer dos serviços jurídicos da entidade demandada referido na sentença, no qual se pode ler o seguinte: “ Seguramente por lapso foi referido que o mandato do Dr. «BB» era de 2002/2004 quando o correto era 2002/2005, em sintonia não só com a sua eleição a 16 de dezembro de 2002, conforme ata da assembleia geral dessa data, mas também com o número 4 do artigo 10º dos estatutos daquele Centro Hospitalar, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 273/2002, de 9 de dezembro, que instituía a duração de 3 anos para os mandatos dos administradores.”
Tem, pois, razão nesta parte o Recorrente.
E o que dizer das despesas de representação?
Questão diversa, é a de saber se as despesas de representação se inserem ou não no salário base.
Quanto a este aspeto, como bem observa a Senhora PGA, temos que as despesas de representação só serão devidas durante o efetivo exercício do cargo, não se integrando, por isso, na retribuição base.
Da invocada prescrição -
Não tendo o Tribunal a quo, emitido pronuncia sobre a invocada exceção perentória de prescrição suscitada pelo Recorrido na contestação, por ter entendido que ficava prejudicado o seu conhecimento, uma vez que não existia qualquer crédito ao qual possa ser oposta tal exceção, e face ao estatuído no artº 149° n° 2 do CPTA, cabe referir o seguinte:
O Recorrido, invoca na sua contestação que:
O A., ora recorrente, consubstancia a causa de pedir no facto de, em 20/06/2005, ter sido exonerado/destituído do cargo de Vogal Executivo do Conselho de Administração do Centro Hospitalar 1, S.A., sem justa causa (art.° 10.°, n.° 6 do Dec.-Lei n.° 273/2002, de 9.12).
O direito à indemnização, peticionado pelo A. na presente ação, prescreveu em 20 de junho de 2008, uma vez que, tratando-se de responsabilidade civil por facto ilícito, é aplicável o disposto no n.° 1, do art.° 498.°, do Código Civil - “O direito à indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete...” - ex vi do art.° 5.° da Lei n.° 67/2007, de 31.12.
Replicou o Autor, nos seguintes termos:
É seguro afirmar-se que, entre Autor e Ré, vigorava um contrato típico de mandato, expressamente consagrado no artigo 1157.° e seguintes do Código Civil. Pelo que, como será consabido, face à relação contratual subjacente, o peticionado pelo Autor enquadra-se na modalidade de responsabilidade civil contratual, conforme aliás expressamente configurado por este desde início.
Concluindo-se que o prazo prescricional é de vinte anos, aventando-se a título meramente exemplificativo o Acórdão de 23 de fevereiro de 2015 proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, que afirma: “I - O art° 498° C. Civ., que prevê um prazo curto de prescrição da responsabilidade civil, de apenas três anos, é apenas aplicável à responsabilidade civil aquiliana e não à responsabilidade civil contratual. II - O prazo ordinário de prescrição para a responsabilidade civil contratual é de vinte anos - art° 309° C. Civ.”
Também quanto a este aspeto, assiste, razão ao A., ora recorrente.
Com efeito, dispõe o artº 3.° do Decreto-Lei n.° 464/82 de 9 de Dezembro:
1 - A aceitação do mandato conferido resulta da simples tomada de posse pelo gestor das funções para que foi nomeado.
2 - Pode, porém, a aceitação do mandato processar-se através da celebração de um contrato formal de mandato para o exercício das funções de gestão, ou acordo de gestão, a celebrar entre o Estado e o gestor público, sendo o Estado representado, para o efeito, pelo ministro da tutela e pelo Ministro de Estado e das Finanças e do Plano.
3 - Em tudo o que não for ressalvado expressamente no presente diploma aplicam-se, ao regime do mandato, as disposições constantes da lei civil para o contrato de mandato.
4 - A empresa suportará todos os encargos e despesas resultantes do mandato, salvo se regime diverso for estabelecido.
Efetivamente, a relação existente entre o A., ora recorrente e o Réu, aqui recorrido, resulta da celebração de um contrato de mandato, e como tal estamos perante responsabilidade civil, contratual, cujo prazo de prescrição é de vinte anos, nos termos do estatuído no artº 309° do C.C.
Como tal, não operou a falada prescrição.
Tal equivale a dizer que o Autor/Recorrente tem direito ao pagamento da indemnização prevista no artº 10.°/6 do DL 464/82, de 9 de dezembro.
Em suma,
Tem o Autor/Recorrente direito ao pagamento de indemnização correspondente aos diferenciais do ordenado base auferido como gestor, e o ordenado base auferido pelo mesmo, no seu serviço de origem entre junho e dezembro de 2005, incluindo o diferencial do subsídio de natal, excluindo-se da citada indemnização os montantes auferidos a título de despesas de representação.
Atendem-se, em parte, as Conclusões das alegações.
DECISÃO
Termos em que se concede parcial provimento ao recurso, revoga-se a sentença recorrida e julga-se a acção parcialmente procedente, condenando-se o Réu/Recorrido no pagamento de indemnização correspondente aos diferenciais do ordenado base auferido pelo Autor como gestor e o ordenado base auferido pelo mesmo, no seu serviço de origem entre junho e dezembro de 2005, incluindo o diferencial do subsídio de natal, excluindo-se tão somente da citada indemnização os montantes auferidos a título de despesas de representação.
Custas pelo Recorrente e pelo Recorrido, na proporção do decaimento.
Notifique e DN.

Porto, 07/3/2025

Fernanda Brandão
Isabel Jovita
Rogério Martins