Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00731/24.0BEBRG |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 02/21/2025 |
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Tribunal: | TAF de Braga |
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Relator: | LUÍS MIGUEIS GARCIA |
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Descritores: | SUSPENSÃO DE EFICÁCIA; FUMUS; CONFORMIDADE AMBIENTAL COM A DIA; REDE ELÉCTRICA; |
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Sumário: | I) - «O n.º 1 do art.° 120.° do CPTA, obriga para o decretamento da providência que exista um juízo positivo relativamente à probabilidade de procedência da pretensão, que em concreto aqui inexiste, pois que se mostraria necessário que fosse “provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente”» (Ac. do STA, de 23-01-2025, proc. n.º 047/24.1BALSB-A).* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Município 1... (Largo ..., ... ...); Município 2... (Praça ..., ... ...); Município 3... (Praça ..., ..., ... ...); Município 4... (Praça ..., ... ...); e Município 5... (Largo ..., ... ...)… … indicando como requeridos: Agência Portuguesa do Ambiente, I. P. (Rua ..., ..., ..., Ap. 7585, 2611 – 865 ...); e Ministério do Ambiente e Energia (Rua ..., ... ...)… …. e como contrainteressados: [SCom01...], S. A. (Av.ª ..., ..., ... ...); [SCom02...], S. A. (Avenida ..., ..., ..., ... ...); e [SCom03...], S. A. (Travessa ..., ..., ... ...)…instauraram o presente processo cautelar, previamente à instauração da ação administrativa de impugnação de ato administrativo, visando a decisão proferida em “7 de Julho de 2023, que aprovou a conformidade ambiental do projeto de execução favorável em anexo ao Título Único Ambiental para o projeto de construção da linha de alta tensão denominada Linha Dupla ... – ..., Troço Português, a 400 kV”. Pediram a adoção das seguintes providências: a) A suspensão da eficácia da declaração de conformidade ambiental do projeto de execução da linha de alta tensão denominada Linha Dupla ... - ..., Troço Português, a 400kV; b) A intimação das entidades requeridas para se absterem de, por qualquer forma, proceder em à execução da referida linha e de autorizarem que os contra-interessados iniciem ou prossigam os trabalhos de execução da mesma ao abrigo dos contratos de empreitada celebrados. O TAF de Braga acabou por julgar «o presente processo cautelar totalmente improcedente e, em consequência, não decreto as providências cautelares requeridas». Inconformados, recorrem os requerentes. Concluem: 1ª O presente recurso vem interposto contra a sentença de 27 de Setembro de 2024, que julgou totalmente improcedente o procedimento cautelar pelo qual os ora recorrentes pretendiam suspender a eficácia da declaração de conformidade ambiental do projecto de execução da linha de alta tensão denominada Linha Dupla de ... – ... e ver intimadas as entidades requeridas a absterem-se de procederem, por qualquer forma, à execução da referida linha. 2ª O recurso jurisdicional é limitado ao segmento da sentença que não decretou a tutela cautelar por não verificação do fumus boni iuris, uma vez que a acção principal seria extemporânea e não se verificariam as ilegalidades apontadas para justificar a aparência do bom direito. 3ª Salvo o devido respeito, o aresto em recurso incorreu em notório erro de julgamento ao considerar não verificado o fumus boni iuris com o argumento de que tudo apontava para a extemporaneidade da acção principal, uma vez que não só a declaração de conformidade ambiental enfermava de nulidade – não estando, como tal, a sua impugnação sujeita a qualquer prazo -, como, mesmo que por mera hipótese fosse meramente anulável, sempre a acção principal seria tempestiva por a referida declaração de conformidade ambiental não ter sido publicada no balcão único electrónico – mas apenas no sítio da APA (v. ponto 18 da factologia assente) – e, portanto, o prazo de três meses para a sua impugnação só ter começado a correr em 1 de Abril de 2024 – data do conhecimento da execução de tal acto por parte dos ora recorrentes -, razão pela qual sempre a acção proposta em 6 de Maio de 2024 seria tempestiva. 4ª Aliás, e em bom rigor, tendo em sede de acção principal sido peticionada a declaração de nulidade do acto que aprovara a declaração de conformidade ambiental do projecto de execução e de todos os demais actos deles subsequentes ou dele dependentes, muito naturalmente que a circunstância de se considerar que já haviam decorrido três meses sobre a publicitação do acto impugnado não é suficiente para dar por não verificado o fumus boni iuris, antes se exigindo que o aresto em recurso tivesse analisado e apreciado se a peticionada nulidade se verificava ou não. Para além disso, 5ª O aresto em recurso atentou claramente contra a natureza perfunctória, provisória e instrumental da tutela cautelar ao julgar não verificado o fumus boni iuris com o argumento da improcedência das ilegalidades imputadas, podendo-se dizer que o Senhor Juiz a quo não se restringiu aos limites da justiça cautelar, antecipou o que só deveria ser decidido em sede de acção principal e até vinculou o juiz da acção principal a não decidir em sentido contrário, sob pena de no mesmo processo haver duas verdades antagónicas. 6ª Neste sentido, veja-se que o senhor juiz cautelar começa logo por decidir que a acção de impugnação se funda apenas em causas de mera anulabilidade, para em seguida até se pronunciar sobre a declaração de impacte ambiental e deixar bem claro que dela não resulta sequer uma obrigação de respeitar os corredores que constavam do estudo prévio e foram objecto da Declaração de impacte ambiental, terminando deixando bem claro que as alterações que o projecto de execução apresentava relativamente ao estudo prévio que merecera a Declaração de Impacte ambiental favorável eram “…apenas alterações pontuais…”, o que significa que decidiu o que competia ao juiz da acção principal decidir e reduziu drasticamente a margem decisória deste último. Por fim, 7ª O aresto em recurso incorreu em erro de julgamento ao considerar não preenchido o fumus boni iuris por não se verificarem os vícios imputados pelos recorrentes, uma vez que a factologia dada por provada pelo Tribunal a quo era claramente suficiente para se considerar a elevada probabilidade de procedência de, pelo menos, dois dos vícios invocados pelos requerentes para fundamentarem o fumus boni iuris 8ª Na verdade, destinando-se a declaração de conformidade ambiental do projecto de execução a atestar a conformidade do projecto de execução com a declaração de impacte ambiental (v, neste sentido, a alínea f) do artº 2º e do artº 22º do DL nº 151- B/2013) e estando provado documentalmente que o projecto de execução apresentado e era diferente do estudo prévio que fora objecto da DIA favorável e que só na generalidade cumpria as disposições da DIA (v. fls 5 do doc. nº 1 junto com a p.i. e nº 17 da factologia assente), é manifesto que não poderia o Tribunal a quo deixar de considerar que havia uma elevada probabilidade de a declaração de conformidade ambiental ser nula por violação do disposto nos artºs 2º/f)/u), 20º/1 e 21º do DL nº 151-B/2013 e por se ter certificado a conformidade de um projecto que (por ser diferente do estudo prévio) em determinados aspectos – aqueles em que divergia do estudo prévio – não havia sido objecto de avaliação de impacte ambiental e que, ainda por cima, só na generalidade respeitava tal declaração de impacte ambiental. 9ª Contra o exposto, não se argumente que as alterações do projecto de execução eram alterações meramente pontuais, pois não só não se podem considerar como pontuais as alterações que consistem num aumento/alargamento dos corredores e apoios aprovados ou na substituição dos apoios DL e EL por apoios QL (v. no sentido de tais alterações o ponto nº 17 da factologia dada por assente), como, em qualquer dos casos, não é ao juiz cautelar que compete pronunciar-se sobre a natureza pontual ou não pontual das alterações introduzidas em sede de projecto de execução, antes tendo apenas de apreciar se, uma vez reconhecida a existência de alterações, um juízo de prognose apontava ou não no sentido o projecto de execução não estar em conformidade com a declaração de impacte ambiental e, portanto, haver uma elevada probabilidade de a acção principal ser julgada procedente por esse motivo. 10ª De igual modo, o aresto em recurso também incorreu em erro de julgamento ao sustentar que não se verificaria o vício de violação do nº 7 do artº 20º do DL nº 151-B/2013, uma vez que não tendo dado por provado se e quando é que o relatório da consulta pública fora disponibilizado no balcão único electrónico, muito naturalmente não poderia deixar de considerar procedente o vício invocado, uma vez que a decisão sobre a conformidade do projecto de execução só pode ser tomada depois de serem publicitados no balcão único electrónico os resultados e o relatório da consulta pública (v. nº 4 do artº 29º e a alínea g) do nº 1 do artº 30º do DL nº 151-B/2013). Contra-alegou a Agência Portuguesa do Ambiente, I. P., rematando que “deverá ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se a decisão recorrida”. Também o Ministério do Ambiente e Energia contra-alegou, sustentando que “não deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional”. Bem assim a [SCom01...], S. A., que também ampliou. Ampliação a que responderam os requerentes. * A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta foi notificada nos termos do art.º 146º, nº 1, do CPTA, não emitindo parecer. * Há legal dispensa de vistos. * Cumpre decidir. * Admite-se a junção de cópia de Ac. que vem com a resposta à ampliação, eventualmente pertinente ao que é ao litígio e que temos como não vedada pelo princípio-regra de junção de documentos em recurso, disciplina relativa a meios de prova, não sendo esse o préstimo da junção; seguramente não o é para esta instância decisória. * Factos, que o tribunal “a quo” fixou como indiciariamente provados: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] * A apelação. Rege o art.º 120º do CPTA. Cfr. Ac. do STA, de 26-09-2024, proc. n.º 01049/23.0BEPRT: «40.As providências cautelares só podem ser decretadas se, efetuada uma apreciação meramente perfunctória, o tribunal concluir por um juízo de probabilidade de procedência da pretensão formulada ou a formular na ação principal- i) fumus boni iuris-, mas a verificação desse pressuposto, só por si, não basta para que a providência cautelar possa ser concedida. 41. O legislador exige ainda a verificação de outros dois pressupostos, a saber: (ii) que haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora); e iii) que da ponderação dos interesses públicos e privados em presença se conclua que os danos resultantes da concessão da providência não se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa ou que, sendo superiores, possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências (juízo de ponderação de interesses destinado a aferir a proporcionalidade e a adequação da providência)- artigo 120.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA.». O tribunal “a quo”, apesar de acolher um “periculum in mora”, conclui pela improcedência, pois afastou cumulativo “fumus boni iuris”. ► Observando logo em primeiro passo, e a propósito de excepcionada caducidade do direito a instaurar a ação principal: «Sobre esta alegação, os Requerentes vieram dizer que a exceção invocada é completamente desprovida de qualquer fundamento, não fazendo a APA, I.P., prova do que veio alegar. Nomeadamente, porque não resulta que algum dos Requerentes haja efetuado qualquer acesso ao ato em questão, o que a própria APA reconhece; e só tomaram conhecimento quando foram confrontados com o ofício da DGEG em 01/04/2024, procurando inteirar-se subsequentemente da situação. Dizem, ainda, que os atos constitutivos de direitos apenas produzem efeitos perante os destinatários após a sua notificação (…) e o próprio processo da DECAPE exige que essa notificação seja efetuada aos participantes”. Apreciemos. No contexto de um processo cautelar, a provável verificação de uma exceção dilatória que afete o processo principal a instaurar tem relevo para efeitos de apreciação deste requisito, na medida em que, caso a mesma se verifique, o Tribunal ficará impedido de apreciar o mérito da pretensão; e, como tal, deixa de existir probabilidade de sucesso – precisamente porque o fundo da questão nem chegará a ser apreciado. Ora, no caso concreto os Requerentes afirmam que o presente processo cautelar vem instaurado previamente à ação principal destinada à impugnação da DECAPE – ou seja, estamos perante um processo cautelar prévio a ação administrativa de impugnação de ato administrativo. E, como é sabido, a impugnação de um ato administrativo pode estar ou não sujeita a prazo, dependendo do concreto desvalor jurídico associado à causa de invalidade que se invoca. Desta forma, se a causa de invalidade se reconduzir à nulidade, a instauração da ação não fica sujeita a prazo; pelo contrário, se o pedido se funda apenas em causas de mera anulabilidade, então há um prazo a observar pelo interessado com legitimidade para promover a impugnação. Isso mesmo é o que decorre do art.º 58.º, n.º 1, do CPTA. Sendo certo que, quanto ao modo de contagem do prazo, o n.º 2 do mesmo artigo preceitua que “sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior constam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil, transferindo-se o seu termo, quando os prazos terminarem em férias judiciais ou em dia em que os tribunais estiverem encerrados, para o 1º dia útil seguinte.” O termo inicial do prazo depende da concreta situação que se verifica, tal como se pode concluir da análise do art.º 59.º do CPTA; sumariamente, daí pode concluir-se o seguinte: (i) quanto aos atos que devam ser notificados, o prazo só corre a partir da respetiva notificação; (ii) quanto aos demais interessados em relação aos quais a notificação não seja obrigatória, o prazo inicia-se com a publicação (quanto aos atos que tenham de ser publicados), ou, então, da notificação, da publicação ou do conhecimento do ato, consoante o que ocorra em primeiro lugar (sempre que a publicação não seja obrigatória) Como se pode concluir dos factos indiciariamente provados, o ato aqui em causa não foi notificado aos Requerentes, sendo certo que, no entender da APA, nem tinha de o ser. E, nisto, tem razão. Com efeito, o teor do art.º 21.º, n.º 1, do RJAIA é assertivo ao estabelecer: “A decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução é emitida pela autoridade de AIA, tendo em conta os pareceres técnicos emitidos e o relatório de consulta pública, a qual é notificada à entidade licenciadora ou competente para a autorização e ao proponente.” Não sendo os aqui Requerentes entidade licenciadora ou competente para a autorização, tão-pouco proponentes, não havia lugar a qualquer notificação. Nem sendo de aplicar o art.º 114.º do CPA, seja pela existência daquela norma específica seja, ainda, porque os Requerentes não são destinatários do ato. Uma vez que o ato em causa não estava sujeito a notificação aos aqui Requerentes, será de aplicar a previsão do n.º 3 do art.º 59.º do CPTA, o qual se divide em duas hipóteses, como visto: atos sujeitos a publicação obrigatória, por um lado; e atos não sujeitos a publicação obrigatória, por outro. Neste sentido, importa então dizer que daquele art.º 21.º do RJAIA não resulta a publicação obrigatória da DECAPE. Mas tal resulta, no entanto, da al. l) do n.º 1 do art.º 30.º do RJAIA. Pelo que se aplicará o regime previsto na al. a) do art.º 59.º, n.º 3, do CPTA. De resto, pronunciou-se nesse sentido o acórdão do TCA Sul de 23/05/2019, proferido no processo n.º 812/18.9BEALM: “A divulgação obrigatória da Declaração de Impacte Ambiental no balcão único eletrónico, prevista no artigo 30.º, n.º 1, al. i), do Regime Jurídico de Avaliação de Impacte Ambiental (RJAIA), tem o mesmo sentido da publicação prevista no artigo 59.º, n.º 3, do CPTA, qual seja, o de tornar público o ato em causa.” Sendo certo que tal acórdão foi objeto de revista pelo colendo STA, mediante acórdão de 05/12/2019, mas que não afetou aquele entendimento. Estando indiciariamente provado que a DECAPE foi objeto da respetiva publicação pelo menos em 08/07/2023 [cf. facto indiciariamente provado 18], os interessados dispunham do prazo de três meses contado dessa data para instaurar a respetiva ação impugnatória fundada em causas de mera anulabilidade (e todas as causas de invalidade se resumem a esse desvalor jurídico), nos termos conjugados dos artigos 58.º, n.º 1, al. b), e 59.º, n.º 3, al. a), do CPTA. O que significa que o prazo terminou em 09/10/2023 [o dia do evento – publicação – não se conta; daí que o termo do prazo corresponda ao dia mencionado]. Diga-se que o mesmo resultado seria alcançado ainda que fosse de aplicar a al. b) do n.º 3 do art.º 59.º do CPTA, já que, não tendo ocorrido notificação, e não havendo notícia de que os Requerentes tenham tomado conhecimento do ato antes daquela publicação (o que era difícil, dado que ocorreu na mesma altura em que o ato foi praticado), seria sempre da publicação que se contaria o início do prazo. Atendendo a que a petição inicial que deu origem aos presentes autos foi apresentada em 09/04/2024 [facto indiciário 33], e que nessa data ainda não existia assim principal (dado que o processo cautelar é prévio a essa ação), é de concluir que se verificará a exceção em causa. Nesta medida, tudo indica que, quanto ao pedido impugnatório a formular na ação principal, ocorre a exceção dilatória de intempestividade da prática do ato processual, prevista na alínea k) do n.º 4 do art.º 89.º do CPTA, o que impedirá a apreciação do mérito daquele pedido, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo. Dessa forma permitindo afirmar o prejuízo para o preenchimento do requisito fumus boni iuris.». Os recorrentes esgrimem em contrário, sob conclusões 1ª a 4ª do recurso. Têm razão. O tribunal “a quo” teve de bom pressuposto a publicação no “balcão único eletrónico”. Todavia, do que antes se serviu para marco foi o “site” da entidade [18. Em 04/07/2023, e sobre esta informação, foi aposto o seguinte despacho pelo Sr. Presidente do conselho diretivo da APA: “Visto. Emita-se a decisão nos termos propostos.”; tendo a mesma sido publicada na plataforma destinada ao efeito no sítio da APA, pelo menos desde 08/07/2023], realidades diferentes, perfeitamente distinguíveis no próprio Regime de Avaliação de Impacte Ambiental (DL n.º 151-B/2013, de 31/10, nas sucessivas redacções aplicáveis). Não bastando, para os efeitos que agora interessam, essa publicação no “sítio da internet”, quando desse próprio regime ganha todo o esclarecimento que é a publicação no “balcão único eletrónico” que cumpre a forma, inclusive para o mero “público interessado” (cfr. artºs. 30º, n.º 1, l). e 47, n.º 1); e aqui sem aquisição de qualquer desvio justificativo. Donde, neste ponto, mesmo seguindo pelo mesmo trilho normativo exposto na decisão recorrida, e advindo imune à controvérsia a forma de invalidade - anulabilidade/nulidade -, nada opondo à data de 1 de Abril de 2024 como data do conhecimento da execução do acto por parte dos ora recorrentes, surte erro de julgamento. Posto isto. O tribunal “a quo” acrescentou também o seguinte: «Não obstante a conclusão a que se chegou, importará dizer que, ainda que assim não fosse (isto é, não fosse previsível ocorrer a mencionada exceção dilatória), sempre as causas de invalidade apontadas não parecem ter condições de proceder, em juízo de probabilidade. A este respeito, dizem os Requerentes ser notório que a decisão de aprovação da conformidade ambiental do projeto de execução e o próprio contrato de empreitada para a execução da empreitada de linhas de muito alta tensão são claramente ilegais; e de modo a sustentar esta afirmação invocam, em síntese, o seguinte: - Violação dos direitos à saúde e ao ambiente e qualidade de vida, associado aos princípios da prevenção e da precaução, prevendo a Lei, por isso, a necessidade de aferir e comprovar a conformidade ambiental do projeto de execução apresentado pelo proponente, não podendo este projeto ir além ou ser diferente do estudo prévio que fundamentou a DIA nem pode contrariar essa mesma DIA; porém, é isso que sucede no caso concreto, na medida em que é o próprio ato que aprovou a declaração de conformidade ambiental do projeto de execução a reconhecer que apenas na generalidade são cumpridas as disposições da DIA sendo inegável que aquilo que vai ser executado é muito diferente do que foi sujeito a DIA; - Violação dos artigos 20.º, n.º 6, e 21.º, n.º 1, do RJAIA, por a decisão ter sido proferida sem ser considerado o resultado da consulta pública; - Violação do art.º 31.º, n.º 2, al. d), do RJAIA, porquanto o RECAPE não foi divulgado nas câmaras municipais da área de localização do projeto; - Violação do direito de participação, previsto no art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 83/95, de 31/08; - Violação do art.º 20.º, n.º 7, do RJAIA. Apreciando. * Quanto à execução de um projeto em violação da DIA (e do estudo prévio que a sustentou), com a decorrente violação dos princípios da prevenção e da precaução e, por inerência, dos direitos à saúde e ao ambiente e qualidade de vida. Neste âmbito, a tese essencial apresentada pelos Requerentes é a de que o projeto que efetivamente será executado (e que foi objeto da decisão de conformidade ambiental) será muito diferente do estudo prévio que esteve subjacente à DIA. Não obstante, não enumeram em concreto qualquer diferença entre o estudo prévio e o projeto de execução, limitando-se a remeter para os termos do próprio ato impugnado. No entender da APA, tal vício não se verifica. Afirma que foram a prevenção e a precaução que conduziram a que a linha em causa tivesse sido sujeita a complexos e demorados procedimentos de estudo e avaliação ambiental, estando “garantido que a instalação e o funcionamento da LMAT se processarão nas melhores técnicas exigíveis e se contém nos limites de risco que são aceitáveis ou toleráveis, quer para o meio ambiente, quer para a saúde pública.” O MAE aponta para o carácter controvertido da questão. Quanto à REN, considera que tais princípios estão sujeitos a outros, como o da proporcionalidade, e que o ato em causa foi praticado na sequência de um procedimento escrupuloso e complexo, participado de forma ampla, procurando harmonizar os interesses em presença, avaliando os riscos para os vários fatores em causa. O projeto observa as melhores técnicas exigíveis dentro e no respeito pelas condicionantes da declaração de impacte ambiental, sendo certo que não é possível garantir que um projeto desta envergadura não cause qualquer impacto. Apreciando. Ainda que, como referido, os Requerentes não se preocupem em invocar quais as alterações concretamente existentes ao nível do projeto de execução, em face da DIA emitida (favorável condicionada), os termos do procedimento – que por isso mesmo se transcreveram no elenco dos factos indiciariamente provados – permitem aferir das mesmas. Na realidade, as alterações encontram-se, desde logo, mencionadas no parecer da comissão de avaliação – facto indiciariamente provado 13 -, sem prejuízo de se encontrarem referidas nas várias apreciações sectoriais que precederam esse mesmo parecer, e que também constam do probatório. Então, as alterações em causa consistem no seguinte: - Alargamento do apoio P1, devido à nova localização da subestação de ..., onde a nova linha ligará; - Alargamento do corredor nos vãos entre os apoios P15 – P18, por forma a permitir o acompanhamento da linha elétrica existente ... – ...; - Alargamento no apoio P20, localizado sobre o limite Sul do corredor aprovado, de forma a acompanhar a linha elétrica existente ... – ...; - Alargamento no vão entre os apoios P38 e o apoio P41, sendo que apenas parte do apoio P40 se encontra fora do corredor aprovado (<1 metro), colocando o traçado e a faixa de proteção da linha fora do corredor, em cerca de 1,90 metros; - Alargamento no apoio P60, desviado 1,80 metros para Norte do limite do corredor aprovado, devido à necessidade de criação de ângulo para minimização da afetação de um habitat sensível; - Alargamento no apoio P133, passando a localizar-se sobre o limite Sul do corredor aprovado, devido à existência e um parque eólico na respetiva secção do corredor. Vejamos. Segundo o disposto no art.º 3.º, al. c), da Lei n.º 19/2014, de 14/04, que define as bases da política de ambiente, a atuação pública em matéria de ambiente encontra-se sujeita aos princípios “da prevenção e da precaução, que obrigam à adoção de medidas antecipatórias com o objetivo de obviar ou minorar, prioritariamente na fonte, os impactes adversos no ambiente, com origem natural ou humana, tanto em face de perigos imediatos e concretos como em face de riscos futuros e incertos, da mesma maneira como podem estabelecer, em caso de incerteza científica, que o ónus da prova recaia sobre a parte que alegue a ausência de perigos ou riscos.” Portanto, estamos hoje em presença de princípios legalmente positivados, o que torna obrigatória a sua observância por parte das entidades públicas responsáveis pela proteção do bem jurídico meio ambiente – e dos demais com ele associado. Naturalmente, o procedimento de avaliação de impacte ambiental, em todas as suas fases, não deixa de representar uma manifestação desses princípios, na medida em que é o local próprio, desde logo, para aferir da possibilidade de execução de certo projeto em face dos potenciais danos ambientais, e, depois, para a imposição de todo o conjunto de medidas que visem obviar ou minorar os impactes no ambiente. Daí que esse procedimento se divida em várias fases (embora dependendo da situação concreta), contemplando uma fase de avaliação, de verificação e de pós-avaliação, entre outras. Tudo isso resulta da simples leitura dos artigos 12.º e ss. do RJAIA. Além disso, a observância daqueles princípios (diretamente ou através do respeito pelas imposições do RJAIA) visa, também, salvaguardar direitos e interesses tutelados constitucionalmente, nomeadamente aqueles que os Requerentes invocam, v.g., o direito à saúde (previsto no art.º 64.º da CRP) e o direito ao ambiente e qualidade de vida (consagrado no art.º 66.º da CRP). Pois bem, no caso em apreço interessa-nos o conjunto de normas do RJAIA relativo ao procedimento de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução, ou seja, os seus artigos 20.º e 21.º. Segundo o n.º 1 deste art.º 20.º, o projeto de execução está sujeito à verificação de conformidade ambiental com a DIA sempre que o procedimento de AIA ocorra em fase de estudo prévio ou de anteprojeto.” Foi o que sucedeu no caso concreto, tendo a contrainteressada REN apresentado requerimento nesse sentido, dando assim início a esta fase de verificação. Nessa medida, o proponente deve apresentar o projeto de execução e o respetivo relatório de conformidade ambiental do projeto (RECAPE). Veja-se, além disso, que a al. f) do art.º 2.º do RJAIA define a decisão de verificação de conformidade ambiental de projeto de execução como a “decisão, expressa ou tácita, sobre a conformidade ambiental do projeto de execução com a declaração de impacte ambiental emitida, em fase de anteprojeto ou estudo prévio.” Cumpridos os trâmites de procedimento previstos, a final do mesmo será proferida uma decisão, que pode ser de conformidade ou não conformidade ambiental do projeto de execução. Segundo o n.º 1 do art.º 22.º do RJAIA, “a decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução é emitida pela autoridade de AIA, tendo em conta os pareceres técnicos emitidos e o relatório de consulta pública, a qual é notificada à entidade licenciadora ou competente para a autorização e ao proponente.” Havendo decisão de conformidade ambiental, importa salientar que a mesma não tem natureza meramente declarativa, já que, segundo o n.º 5 do mesmo artigo, tal decisão “deve definir as condições ambientais de aprovação do mesmo a adotar nas fases de construção, exploração e desativação do projeto, sendo-lhe aplicável com as necessárias adaptações o disposto no artigo 18.º.” Logo aqui se poderá dizer que o fim visado é verificar se o projeto de execução apresentado é conforme à declaração de impacte ambiental, e não ao estudo prévio ou anteprojeto. Isso resulta muito claramente da definição contida na al. f) do art.º 2.º do RJAIA, bem como do n.º 1 do art.º 20.º do mesmo diploma, ambos já transcritos. Daí que não se afigure rigorosa a alegação dos Requerentes quando invocam a ilegalidade com base no projeto de execução ser diferente em relação ao estudo prévio em que se baseou a concessão da DIA. Um estudo prévio não é um projeto de execução. Interessa sim, nos termos legais, aferir se esse projeto de execução, elaborado e apresentado após a declaração de impacte ambiental e conhecidas as suas condicionantes, é ou não conforme a esta última. Assim, questionar-se-á: quais os termos da declaração de impacte ambiental? Segundo o facto indiciariamente provado 3, foi imposto ao proponente [portanto, à contrainteressada REN] o desenvolvimento de um projeto de execução “de acordo com a alternativa resultante da conjugação dos Troços T1+T2+T4+T5+T13+T15+T16 do estudo prévio.” Mas também lhe foi imposto mais do que isso: entre outros, deveria assegurar a compatibilização do traçado (por si mesmo, inserto, já que resulta da conjugação de vários troços) com as pedreiras existentes no território e com a rede de pontos de água de combate a incêndios, entre outros. Ao nível das medidas de minimização impostas em fase de execução do projeto e do RECAPE, era também imposta a maximização “tanto quanto possível, no interior do corredor preferencial” do afastamento da linha a zonas habitacionais, a espaços sociais, a espaços turísticos ou de lazer, nomeadamente nos troços T1, T4 ou T5; assegurar a justaposição possível de forma a acompanhar espaços-canal existentes de infraestruturas; no caso do troço T1, admite a DIA expressamente a necessidade de implantar o projeto fora da área do corredor; respeitar distâncias mínimas aos recetores sensíveis; evitar zonas de vale ou a sobreposição de massas de água; evitar zonas de maior altitude ou de maior exposição visual; enfim, todo o conjunto de medidas que consta da DIA. E, note-se, são impostas 35 medidas de minimização (algumas com subpontos) apenas para esta fase da elaboração do projeto. Perante isto, e tendo em conta as “alterações” que são mencionadas no próprio procedimento, forçoso será concluir que não parece assistir razão alguma aos Requerentes. Desde logo, porque não decorre da declaração de impacte ambiental a absoluta necessidade de respeitar os corredores constantes do estudo prévio. Pelo contrário, decorre até de medidas insertas na própria declaração a eventual necessidade de não respeitar esse corredor. O incumprimento ocorreria, sim, se a REN tivesse apresentado um projeto fora do conjunto de troços aprovados – e tal não sucede, como se conclui da leitura dos factos indiciariamente provados. Naturalmente que os corredores têm de ser respeitados, e não podem ser desvirtuados na execução do projeto, como efetivamente não o foram, existindo apenas alterações pontuais e cuja necessidade é justificada – desde logo, pelo cumprimento das medidas da própria declaração de impacte ambiental, ou mesmo para diminuir os impactes que seriam causados sem a alteração. Depois, a interpretação que os Requerentes apresentam serviria para esgotar a fase de verificação de conformidade ambiental do projeto, tornando-a inútil. Uma vez que o projeto ainda será elaborado segundo as disposições da declaração de impacte ambiental, é às condições impostas por esta que o proponente deve atender, e não somente ao estudo prévio. Por outro lado, aquilo que se pretende com a verificação é salvaguardar os riscos ambientais, de forma acrescida em relação à fase de avaliação. Ora, o proponente deve respeitar as disposições da declaração de impacte ambiental precisamente no sentido de minorar os riscos ambientais. Lendo as apreciações sectoriais efetuadas quanto ao projeto de execução – que, por isso mesmo, se fizeram constar do elenco dos factos indiciariamente provados, como decorre dos pontos 5 a 11 – constata-se que as “alterações” em causa, nomeadamente a necessidade de relocalizar apoios fora dos corredores do estudo prévio, foram devidamente analisadas, de modo intenso e alargado, não existindo qualquer sinal de agravamento do risco ambiental. Muito pelo contrário, as alterações propostas visam dar resposta a imposições da declaração de impacte ambiental, tendo em conta que se pretende evitar a sobreposição com outra linha de alta tensão (... – ...), criação de ângulo para minimização da afetação de um habitatsensível, afastamento a um parque eólico, necessidade de ligação à subestação de ..., etc… Ou seja, alterações pontuais que não desvirtuam em nada o estudo prévio ou os corredores que dele constavam. De resto, sublinhe-se que, como afirmado, a decisão sobre a conformidade ambiental do projeto não é meramente declarativa, já que decorre do n.º 5 do art.º 21.º do RJAIA que essa decisão “deve definir as condições ambientais de aprovação do mesmo a adotar nas fases de construção, exploração e desativação do projeto”, remetendo para a aplicação do art.º 18.º do mesmo diploma, ou seja, para o conteúdo da própria declaração de impacte ambiental. Como dito, a interpretação que os Requerentes propõem tornaria inútil esta fase de verificação, obrigando a iniciar, perante qualquer alteração ao estudo prévio, um novo procedimento de avaliação de impacte ambiental. Tornaria o procedimento em verificação da conformidade com o estudo prévio ou o anteprojeto, em vez de ter como referencial a declaração de impacte ambiental (que pode impor condições que justifiquem a necessidade de rever certos pontos do estudo prévio). Não é isso, julgamos, que se pretende, mesmo à luz dos princípios da prevenção e da precaução. Pretende-se, sim, aferir da adequação do projeto ao cumprimento da declaração de impacte ambiental, designadamente quanto aos riscos ambientais. E aquelas alterações não incumprem, por si, a declaração de impacte ambiental, antes visando o cumprimento das medidas de minimização que nela se preconizam. Nem é verdade que o que vai ser executado é muito distinto do que constava do estudo prévio (como sucederia se o projeto não contemplasse um dos troços indicados, por exemplo) – são, sim, as alterações necessárias ao cumprimento das imposições da própria declaração de impacte ambiental. Acrescente-se, de resto, que a ser tida como boa a interpretação dos Requerentes, então teria de tomar-se como pressuposto que o proponente, quando elabora o estudo prévio, já sabe quais as condições que serão apostas à declaração de impacte ambiental, pois que não poderia alterar o que propôs naquele estudo. O que, naturalmente, se revela ilógico e impossível – não há como impor a alguém o cumprimento de condições que desconhece naquele momento. Finalmente, importa assinalar que da informação elaborada pelos serviços da APA, e da qual se apoderou a decisão final – factos indiciários 17 e 18 – consta de forma expressa que estão reunidas as condições para salvaguardar o cumprimento das restantes disposições nas fases subsequentes de desenvolvimento e implementação do projeto. De facto, o procedimento é dinâmico e acompanha todas as fases da infraestrutura, incluindo a de execução dos trabalhos. É por isso que, mesmo depois da DCAPE, continuam a existir informações sectoriais que visam, precisamente, acompanhar o respeito por todas as condições impostas – e que por isso se fizeram constar dos factos indiciários 19 a 32. Assim sendo, não se vislumbra que o apontado vício venha a ser julgado procedente, mesmo num cenário em que se conclua pela não verificação da intempestividade da prática do ato processual. * Da desconsideração do resultado da consulta pública Seguidamente, os Requerentes invocam que a decisão em causa é ilegal por violação do disposto nos artigos 20.º, n.º 6, e 21.º, n.º 1, do RJAIA, ou seja, por ter sido proferida sem ter sido em conta o resultado da consulta pública. O que todos os Demandados negam, apontando para um procedimento participado, em que foi realizada consulta pública, devidamente apreciada, desde logo, no parecer da comissão de avaliação. Não assiste razão aos Requerentes – diremos mesmo, para lá do mero juízo perfunctório que caracteriza o contencioso cautelar. Conforme decorre dos factos indiciariamente provados, os resultados da consulta pública foram tidos em conta, desde logo, no parecer da própria comissão de avaliação – facto indiciário 13. Depois, e porque os termos do parecer dela constam, esse resultado foi também referido na informação elaborada em 19/06/2023 pelos serviços da APA – facto indiciário 14 -, que serviu de base ao projeto de decisão que veio a ser comunicado ao proponente. A decisão vem a ser proferida apenas em 04/07/2023, com base em nova informação elaborada pelos serviços da APA – factos indiciários 17 e 18. Assim sendo, não se afigura verdadeira a alegação dos Requerentes, denunciando os factos indiciários que foi efetivamente considerada a consulta pública realizada. * Violação do art.º 31.º, n.º 2, al. d), do RJAIA Para lá das causas de invalidade acima referidas, os Requerentes entendem ter sido violado o disposto na al. d) do n.º 2 do art.º 31.º do RJAIA, na medida em que o RECAPE não foi divulgado nas câmaras municipais da área de localização do projeto, considerando, dessa forma, ser “manifesta não só a violação do disposto nos artºs 21º/1, 29, 30 e 31º do DL nº 151 - B/2013 mas também do direito de participação pública no procedimento de verificação da conformidade ambiental do projecto de execução”. Sobre o assunto, a Requerida APA veio dizer que remeteu aos Municípios ofícios para aquele efeito, solicitando a respetiva divulgação, e com indicação do local onde os elementos podiam ser obtidos. Em perspetiva, tal vício não se verifica. Como resulta dos factos indiciariamente provados, foram remetidos às câmaras municipais dos Município aqui Requerentes (e não só) ofícios em que se pedia de forma expressa “o maior empenho na divulgação deste processo, nomeadamente por meio da afixação do anúncio em locais de maior afluência”. Mais se indicando que a documentação destinada a garantir a consulta estava disponível no Portal Participa – cf. facto indiciário 6. A ser verdade o que os Requerentes alegam, o que se poderá concluir é a sua própria violação do dever de colaboração e de divulgação, tendo em conta que a APA deu cumprimento ao que lhe era imposto, indicando o local onde a documentação podia ser obtida para consulta. E de tal forma assim foi que, como está indiciariamente provado, houve participação dos Requerentes em sede de consulta pública, para além de outras entidades – facto indiciário 12. Se os Requerentes, solicitados para o efeito, não procederam em conformidade com a Lei, disponibilizando o relatório para consulta, é um comportamento grave. De todo o modo, certo é que a APA promoveu a divulgação dos elementos em causa, incluindo junto das câmaras municipais, com indicação do modo de obtenção de todos os documentos para o efeito. Portanto, qualquer munícipe se poderia dirigir aos serviços municipais para solicitar a consulta do RECAPE. Em face do que, como adiantado, não se perspetiva a apontada violação de qualquer das normas mencionadas. * Violação do direito de participação Depois, os Requerentes dizem que a decisão é ilegal por violação do direito de participação, previsto no art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 83/95, de 31/08, porquanto as alterações introduzidas em sede de projeto de execução não foram sujeitas à participação dos cidadãos interessados. Com o que os Demandados discordam, apontando para o cumprimento de todas as formalidades do procedimento que, aliás, é complexo e foi efetivamente participado de forma ampla. Em apreciação, dir-se-á que também não se antecipa sucesso nesta alegação Em apreciação, dir-se-á que também não se antecipa sucesso nesta alegação. Com efeito, o art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 83/95, de 31/08, estabelece o seguinte: “a adopção de planos de desenvolvimento das actividades da Administração Pública, de planos de urbanismo, de planos directores e de ordenamento do território e a decisão sobre a localização e a realização de obras públicas ou de outros investimentos públicos com impacte relevante no ambiente ou nas condições económicas e sociais e da vida em geral das populações ou agregados populacionais de certa área do território nacional devem ser precedidos, na fase de instrução dos respectivos procedimentos, da audição dos cidadãos interessados e das entidades defensoras dos interesses que possam vir a ser afectados por aqueles planos ou decisões.” Ora, os Requerentes parecem olvidar que foi promovida uma fase de consulta pública no âmbito da fase de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução, na qual, aliás, alguns deles participaram. Isso resulta dos factos indiciários 12 e 13. Ou seja, a consulta pública não se quedou apenas pela fase de avaliação de impacte ambiental, como sugerem, mas também nesta fase de aferição da conformidade ambiental do projeto de execução. É até uma alegação temerária, quando os próprios confessam a sua participação [cf. artigos 8.º e 9.º do RI], aí confirmando que a consulta pública ocorreu “na sequência da apresentação do projeto de execução”. Em face disso, e como adiantado, esta é uma alegação destinada a improceder. * Por último, a violação do art.º 20.º, n.º 7, do RJAIA Finalmente, também vem invocado pelos Requerentes ter sido violado o disposto no art.º 20.º, n.º 7, do RJAIA, ainda que o façam fora do capítulo em que abordam o preenchimento do fumus boni iuris. Nomeadamente porquanto não foram notificados do relatório de consulta pública. Também aqui, não se prefigura que venham a ter sucesso. Vejamos. Aquilo que o n.º 7 do art.º 20.º do RJAIA estabelece é o seguinte: “no prazo de sete dias após o termo do período da consulta pública, a autoridade de AIA elabora e disponibiliza o relatório da consulta pública.”. Em nenhum momento a Lei fala da notificação do relatório aos participantes. Também nada se diz a esse respeito no art.º 29.º do RJAIA; e o art.º 30.º, n.º 1, al. g) do mesmo diploma refere apenas a divulgação do relatório, e não a sua notificação a cada participante. Não existe, por isso, qualquer violação do n.º 7 do art.º 20.º do RJAIA pelo facto de o relatório da consulta pública não ter sido pessoalmente notificado aos Requerentes. * Mediante o exposto até este momento, conclui-se pela não verificação do requisito fumus boni iuris. Na medida em que os pressupostos inerentes à concessão de tutela cautelar são de natureza cumulativa, o não preenchimento de um deles, como é o caso, é suficiente para determinar a improcedência dos pedidos formulados, com prejuízo para o conhecimento do restante pressuposto.». / «Como, então, se decide.». ► A desenvoltura/comprometimento/vinculação do assim julgado, repugna aos recorrentes, como expressam sob conclusões 5ª e 6ª da sua peça recursiva. Mas não vemos que desemboque em erro de julgamento; a questão, aliás, só indirectamente aí conduzirá; é antes em primeira linha atinente aos limites de cognição, no comprometimento que advenha de uma fundamentação mais pujante. Frequentemente se assinala que no âmbito do artigo 120º n.º 1 do CPTA a atribuição das providências cautelares depende de um juízo perfunctório sobre a probabilidade de a acção principal poder vir a ser procedente; avaliação que não deve ultrapassar os limites próprios da tutela cautelar sob pena de passarmos a antecipar a decisão de fundo sobre o mérito da questão que apenas caberá tomar quando da análise do processo principal. O inciso nesse limite cognitivo foi com mais acuidade feito notar a propósito de anterior solução de lei para as situações de evidente procedência da pretensão material do requerente, em que a intensidade do fumus boni iuris fazia com que este valesse por si só; “Foi pertinentemente suscitada na doutrina a questão de saber se, a ser assim, não se estará a exorbitar dos limites próprios da tutela cautelar” (M. Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2010, pág. 483). Não deixa de ter sentido - e tem -, que ainda agora sob tais limites se mova a tutela, mesmo que a questão se coloque com menos acuidade, já que numa cognição sumária apenas assente num juízo de probabilidade. Mas também não foi isso que o tribunal “a quo” deixou de respeitar. Logo introdutoriamente lembrou quanto ao “fumus” que “a concessão de providências cautelares depende, ainda, da verificação do requisito do fumus boni iuris, também designado por aparência do direito, exigindo o legislador, como se retira do n.º 1 do art.º 120.º do CPTA já transcrito, que seja provável que a pretensão formulada ou a formular pelo requerente no processo principal venha a ser procedente. Note-se que, no atual regime do CPTA (portanto, após a revisão operada pelo Decreto-Lei n.º 214- G/2015, de 02.10) o núcleo essencial da análise do preenchimento do requisito reside precisamente na probabilidade de procedência da pretensão do requerente. Trata-se, assim, de um juízo positivo, mas ainda perfunctório (como o impõe a própria natureza da tutela cautelar) sobre o bem fundado da alegação do requerente – neste sentido, cf. Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, 2.ª Edição, Almedina, 2016, pág. 451. E ainda sobre o alcance deste requisito, escreve Vieira de Andrade que a “referência ao “fumus”, ou seja, à “aparência” do direito visa justamente exprimir que a convicção prima facie do fundamento substancial da pretensão é bastante e é adequada à decisão cautelar, ao contrário do que se exige na decisão dos processos principais” – cf. A Justiça Administrativa – Lições, 15.ª Edição, Almedina, 2016, pág. 321.”. Foi a esta luz que fez o seu julgamento. Naturalmente, tal como acaba por espelhar o seu discurso fundamentador, com mais empenho de análise naquilo que também mais controvérsia teve arrimo das partes. E, afigura-se-nos, em boa medida de merecimento, sem chegar a confundir-se «com aquilo que é o juízo a realizar na ação administrativa principal, com uma análise definitiva, aturada e aprofundada dos fundamentos de ilegalidade e questões suscitadas, «tentação» e «exagero» com que amiúde nos vamos deparando e confrontando na prática forense.» (Ac. do STA, de 04-07-2019, proc. n.º 02012/18.9BALSB; Ac. deste TCAN, de 28-07-2020, proc. n.º 477/20.8BEPRT). «Os limites entre o conhecimento perfunctório e o conhecimento de fundo da ação em sede cautelar não podem ser aferidos em abstracto, mas apenas casuisticamente face às concretas ilegalidades invocados e seu tratamento jurídico assente ou não a nível de doutrina e/ou jurisprudência.» - Ac. do STA, de 28-02-2028, proc. n.º 01305/17. Também simultaneamente não deixando se ser uma cognição sumária, “prima facie”, fundada em juízo de probabilidade, portanto mutável por natureza. Vinculando no/até onde pode, nessa relatividade se podendo afirmar que «As decisões cautelares não são definitivas, pelo que sobre elas não se forma caso julgado.» - Ac. do STA, de 13-07-2023, proc. n.º 021/22.2BEPRT-B. ► Os recorrentes mostram-se também inconformados quanto ao juízo que o tribunal “a quo” teve “Quanto à execução de um projeto em violação da DIA (e do estudo prévio que a sustentou) (…)” - conclusões 7ª, 8ª, 9ª. Mas, retomando o que antes tiveram de tese, não oferecem, a nosso ver, análise crítica que faça descobrir erro de julgamento. O tribunal identificou quais “alterações” se deparavam. Distintamente ao que os recorrentes parecem querer transmitir, não simplesmente as “desvalorizou” (a expressão é nossa), a modos de ver um cumprimento geral do projecto de execução de aceitável conformidade, por garantia de se tratarem meras alterações “pontuais”, assim projectando surpresa aos requerentes o projecto de execução poder ser diferente do estudo prévio, tornando inútil a fase da verificação da conformidade ambiental. Antes teve em razão, em síntese, que a medida de conformidade tinha de ter “como referencial a declaração de impacte ambiental” (não o estudo prévio), e viu, em serventia à verificação da conformidade, tratarem-se de “alterações necessárias ao cumprimento das imposições da própria declaração de impacte ambiental”. Julgamento que em nada sai fragilizado. ► Os recorrentes mostram-se também inconformados quanto ao juízo que o tribunal “a quo” teve sobre “a violação do art.º 20.º, n.º 7, do RJAIA” - conclusão 10ª. Mas sem atingir o que foi aí razão tratada, “da notificação do relatório aos participantes”. Não da sua publicidade no balcão único electrónico. Agora questão nova, estranha à ratio decidendi, que não há que versar nesta sede. ► Concluindo. «O n.º 1 do art.° 120.° do CPTA, obriga para o decretamento da providência que exista um juízo positivo relativamente à probabilidade de procedência da pretensão, que em concreto aqui inexiste, pois que se mostraria necessário que fosse “provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente”» (Ac. do STA, de 23-01-2025, proc. n.º 047/24.1BALSB-A). Fica prejudicada a ampliação. * Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso. Custas: pelos recorrentes. Porto, 21 de Fevereiro de 2025. Luís Migueis Garcia Alexandra Alendouro Catarina Vasconcelos |