Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 01006/13.5BEAVR |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 05/27/2021 |
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Tribunal: | TAF de Aveiro |
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Relator: | Ana Patrocínio |
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Descritores: | IMPOSTO SOBRE VEÍCULOS, ISENÇÃO, INTRODUÇÃO NO CONSUMO, TRANSFERÊNCIA DE RESIDÊNCIA |
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Sumário: | I - O Imposto sobre Veículos é um imposto especial de consumo, que tem como facto gerador o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal. Ou seja, pelo menos do ponto de vista formal, o Imposto sobre Veículos não é um imposto de matrícula e é exigível no momento da introdução no consumo do veículo. II - Considera-se verificada a introdução no consumo no momento da constatação da permanência de veículo no território nacional em violação das obrigações previstas no Código do Imposto sobre Veículos (CISV) – cfr. artigos 5.º, n.º 2, alínea d) e 6.º, n.º 2 do CISV. III - É condição para o deferimento do pedido de isenção do Imposto sobre Veículos que o veículo seja destinado a ser introduzido no consumo por ocasião da transferência de residência normal do interessado para território nacional – cfr. artigo 60.º, n.º 1, alínea a) do CISV.* * Sumário elaborado pela relatora |
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Recorrente: | N. |
Recorrido 1: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Não emitiu parecer. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório M., contribuinte n.º (…), melhor identificada nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 31/12/2020, que julgou improcedente a acção administrativa especial que visa a anulação do acto de indeferimento do pedido de isenção do Imposto sobre Veículos (ISV), referente ao veículo de matrícula XX-XX-XX, proferido pela Directora Adjunta da Alfândega de Aveiro, no âmbito do procedimento administrativo n.º BFC 91/2013. A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “I – Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou improcedente a acção proposta pela Autora, tendente à anulação do acto de indeferimento do seu pedido de isenção do imposto de introdução no consumo do seu veículo; II – Entendeu o Tribunal a quo que a introdução daquele em território nacional teria ocorrido em 19.07.2012 e a transferência da residência da recorrente em 11.05.2013, e que, por isso, não se encontravam preenchidos todos os requisitos (cumulativos), previstos nos arts. 58.º a 60.º do CISV, daquela isenção; II – Foi junta certidão da sentença proferida na acção n.º 1005/13.7BEAVR, proposta pelo marido da recorrente, com objecto e fundamentos idênticos, que anulou o acto de indeferimento de semelhante pedido de isenção, por considerar preenchidos todos os requisitos necessários àquela isenção (Fls. 164 e segs. do SITAF); III – Resulta demonstrado que a transferência de residência da ora Recorrente para o território nacional é contemporânea do seu pedido de introdução no consumo do veículo da recorrente, em Maio de 2013; IV – O ponto A (matéria não provada) deve ser carreado para o elenco dos factos provados, por tal factualidade resultar dos depoimentos (escritos) das testemunhas S. (fls. 130, in fine, do SITAF), M. (fls. 126, do SITAF), A. (fls. 136 do SITAF) e M. (fls. 153 do SITAF); V – Não se descortinando que prova documental poderia (e deveria) a recorrente apresentar em juízo para demonstração desse facto; VI – Como decorre, dos depoimentos das testemunhas S. (fls. 130, in fine, do SITAF), A. (fls. 136 do SITAF) e M. (fls. 153 do SITAF), o veículo em causa só foi introduzido no consumo no território nacional, por ocasião da transferência da sua residência para Portugal, circulando de forma legal até ao limite dos seis meses de admissão temporária (art. 30.º CISV) e ficado imobilizado, sem circular, na garagem da Autora, pelo menos desde Dezembro de 2012 até ao seu regresso definitivo a Portugal, em Maio de 2013; VII – Na sentença em crise confunde-se, salvo o devido respeito, o conceito de introdução do veículo “em território nacional” com o de introdução “no consumo”, que não se verificaram, in casu, em momentos coincidentes; VIII – Da alegação da Ré, na sua contestação, de que o veículo da recorrente teria sido introduzido no consumo “em Janeiro de 2013” resulta claro que a própria entidade demandada distingue, inequivocamente, os conceitos de introdução de um veículo no território nacional e a sua efectiva introdução no consumo. IX – O disposto no n.º 3 do art. 18.º e dos n.ºs 2 e 3 do art. 30.º, ambos do CISV, pressupõem a efectiva condução (circulação) dos veículos com matrícula estrangeira em território nacional; X – Tendo o veículo da recorrente estado imobilizado, na garagem da sua habitação em Portugal, desde pelo menos Dezembro de 2012 (até indiciado pela reduzida quilometragem de 775 km), não pode concluir-se, sem mais, pela violação do art. 30.º, n.º 1 do CISV, não se verificando, pois, o facto gerador do imposto, nem se encontrando, por isso, afastado o direito da recorrente à isenção do mesmo; XI – O tribunal a quo, ao decidir como decidiu, violou, designadamente, o disposto nos arts. 30.º, 45.º e 58.º a 61.º, todos do Código do Imposto sobre Veículos (CISV). XII – Termos em que, julgando-se procedente o presente recurso, deve ser revogada a sentença em crise, determinando-se a anulação do acto administrativo impugnado ou, caso assim não se entenda, revogada aquela e ordenada a baixa dos autos ao Tribunal a quo para que se pronuncie sobre o preenchimento do requisito cujo conhecimento ficou prejudicado, tudo com as demais consequências legais. JUSTIÇA” **** A Recorrida não apresentou contra-alegações. **** O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1 do CPTA, não se pronunciou sobre o mérito do recurso. **** Com dispensa dos vistos legais, nos termos do artigo 92.º, n.º 1 do CPTA; submete-se o processo à Conferência para julgamento. **** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa analisar se a sentença recorrida errou no julgamento de facto e de direito que efectuou quando decidiu manter na ordem jurídica o acto de indeferimento do pedido de isenção de ISV, por violação do requisito cumulativo previsto no artigo 60.º, n.º 1, alínea a) do Código do Imposto sobre Veículos (CISV), ou seja, o veículo destinar-se a ser introduzido no consumo por ocasião da transferência de residência do interessado. III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Com relevância para a decisão da causa, julgam-se provados os seguintes factos: 1. Durante cerca de 40 anos, a Autora residiu em França, país no qual trabalhou e obteve a sua reforma; 2. Durante o ano 2010, a Autora adquiriu em França um veículo usado, registado nesse país com a matrícula XX-XXX-XX; 3. Entre julho de 2010 e 11.05.2013, a Autora viveu em casa de seu filho, A., em Estrasburgo, em virtude de se ter visto obrigada a abandonar a residência na qual exerceu a profissão de governanta durante cerca de 38 anos; 4. Durante o período em que viveu em casa de seu filho, a Autora não pagou qualquer renda ou recebeu, em seu nome, faturas de água, eletricidade ou outras; 5. Após a sua reforma, em 2011, a Autora deslocou-se a Portugal com maior frequência, sempre por períodos inferiores a seis meses, a fim de organizar o seu regresso definitivo a este país; 6. Após a sua reforma, a Autora realizou o pagamento das suas despesas por via eletrónica, a partir da sua conta bancária sedeada em França, na qual eram depositadas as importâncias que recebia a título de reforma; 7. Em 19.07.2012, a Autora submeteu o veículo identificado no ponto 2 a inspeção periódica em território nacional, data em que o mesmo apresentava 63.693 como valor de quilometragem – cfr. documento a fls. 21 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 8. Entre a data mencionada no ponto anterior e 18.04.2013, o veículo circulou 775 quilómetros; 9. Durante o período mencionado no ponto anterior, o veículo permaneceu em Portugal, não regressando a França; 10. A Autora estabeleceu a sua residência em Portugal em 11.05.2013; 11. Em 13.05.2013, a Alfândega de Aveiro emitiu a Declaração Aduaneira de Veículo destinada à introdução no consumo do veículo mencionado no ponto 2 – cfr. documento a fls. 21 do sitaf do processo n.º 817/13.6BEAVR; 12. Em 13.05.2013, a Autora requereu à Alfândega de Aveiro o reconhecimento do direito à isenção do Imposto sobre Veículos relativo ao veículo referido no ponto 2, com fundamento na transferência de residência de país da União Europeia para Portugal – cfr. documento a fls. 1 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 13. Para instruir o pedido de isenção referido no ponto anterior, a Autora apresentou os seguintes documentos: a. Título de registo de propriedade do veículo; b. Certificado emitido por entidade administrativa francesa em 02.05.2013, na qual se certifica que a Autora, residente em 4 Rue de (…) desde julho de 2010, declarou abandonar o seu domicílio a partir de 11.05.2013 para residir na Rua (…); c. Cartão de cidadão; d. Carta de condução; e. Declaração a conceder autorização à Autoridade Tributária e Aduaneira para efetuar consulta da situação tributária; f. Cópias de prescrição de receitas médicas de 27.02.2012, 28.02.2012, 03.05.2013 e 07.05.2013, emitidas em França; g. Cópia de documento emitido por entidade administrativa francesa, mencionando que a Autora é beneficiária de seguro de saúde, válido de 29.05.2013 a 28.11.2013; h. Documento relativo a pensão de reforma dos meses de abril e maio de 2011; i. Declaração de responsabilidade; – cfr. documentos de fls. 2 a 16 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 14. Mediante ofício remetido por correio registado com aviso de receção, que foi assinado pela própria em 13.08.2013, foi comunicada à Autora a proposta de indeferimento do pedido de isenção – cfr. documentos de fls. 23 a 26 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 15. Mediante exposição remetida por correio registado em 26.08.2013, a Autora pronunciou-se sobre a proposta de indeferimento mencionada no ponto anterior – cfr. documentos de fls. 27 a 31 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 16. Em 10.09.2013, os serviços da Alfândega de Aveiro elaboraram informação com o seguinte teor: “1 - No âmbito do exercício do direito de participação na decisão consagrado pelo artigo 60º da Lei Geral Tributária, M. apresentou exposição em que contesta a fundamentação que suporta o projecto de decisão de indeferir o pedido de reconhecimento do direito à isenção do montante de imposto sobre veículos devido pela introdução no consumo do veículo da marca Mercedes, proveniente da França, portador da matrícula XX-XXX-XX. 2 - Recordando, transcreve-se o teor do projecto de decisão de indeferimento: “M. […] apresentou um pedido de reconhecimento do direito à isenção do imposto devido pela introdução no consumo do veículo da marca Mercedes, proveniente de França, com a matrícula XX-XXX-XX, com fundamento no disposto nos artigos 58.º e seguintes do Código do Imposto Sobre Veículos (CISV) […] – veículo introduzido no consumo por ocasião da transferência de residência do proprietário -,registado com o nº BFC 91/2013 e a que corresponde a Declaração Aduaneira de Veículo n.º 35092, de 13.05.2013. Da análise inicial do pedido, concluiu-se que o requerente não juntou ao pedido documentos de apresentação obrigatória para efeitos de comprovação do cumprimento dos requisitos legais aplicáveis, concretamente: Documentos de vida quotidiana que atestem a residência no país de proveniência, designadamente recibos de renda de casa, consumo de água, electricidade, recibos de vencimento ou provas de desconto para efeitos de saúde e reforma, de acordo com o disposto no artigo 61.º, nº 1, alínea e) do CISV, nem quaisquer outros que sirvam o mesmo propósito. Para este efeito, a requerente juntou ao pedido aquando da sua apresentação: - Cinco prescrições de medicamentos com datas de 27.02.2012, 28.02.2012, 03.05.2013 e 07.05.2013 […]; Em 16.07.2013, a requerente juntou: - Documento relativo a seguro de saúde, no qual é feita referência ao período entre 29.05.2013 e 28.11.2013, posterior à data declarada de transferência de residência, 11.05.2013 […]; - Documento relativo a pensão de reforma, referente ao período compreendido entre Abril e Maio de 2011 […]. Analisada a documentação junta ao pedido, sou de opinião que os documentos referidos não devem ser considerados como válidos para efeitos do cumprimento do disposto no artigo 61º, nº 1, alínea e) do CISV, uma vez que, pela sua natureza, não atestam a efectiva residência quotidiana no país de proveniência, condição necessária para que o direito que invoca possa ser reconhecido. De acordo com os elementos recolhidos, verifica-se ainda o incumprimento da condição constante do artigo 60º nº 1, alínea a) do CISV, designadamente, o veículo destinar-se a ser introduzido no consumo por ocasião da transferência de residência do interessado, ocorrida, neste caso, em 11.05.2013. Tendo em conta a ausência das vinhetas indicativas da realização de inspecções periódicas no país de proveniência na documentação do veículo, foi solicitada ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P. informação relativa à eventual submissão do veículo a inspecções técnicas periódicas realizadas em Portugal, tendo aquele instituto remetido cópia do registo informático em que constam […]: -Inspecção periódica realizada em 19.07.2012, na qual o veículo registava a 63693 quilómetros; - Inspecção para atribuição de matrícula nacional realizada em 18.04.2013 […], na qual o veículo registava 64468 quilómetros. Estes elementos são indicadores da permanência do veículo em território nacional ininterruptamente desde, pelo menos, 19.07.2012, tendo em conta que no período de 9 meses decorrido entre a realização das inspecções técnicas apenas foram percorridos 775 quilómetros. Assim, considerando que a legislação consagra no artigo 30º, nº 1 do CISV o prazo máximo de permanência em território nacional de seis meses seguidos ou interpolados, em cada período de doze meses para veículos matriculados noutro Estado membro da União Europeia. Considerando ainda que a permanência do veículo para além do referido prazo configura a sua introdução no consumo, por força da conjugação do disposto nos artigos 6º, nº 2 e 5º, nº 2, alínea d) do CISV. Conclui-se que a introdução no consumo do veículo ocorreu o mais tardar em Janeiro de 2013, momento anterior ao da transferência de residência da requerente, ocorrido em Maio deste ano. Pelo exposto, sou de parecer que o pedido apresentado por M. não cumpre os requisitos legais aplicáveis, porquanto: - Não foram juntos os documentos da vida quotidiana que atestem a efectiva residência no país de proveniência, de carácter obrigatório por força do disposto no artigo 61º, nº 1, alínea e) do CISV - nem os que a norma refere expressamente nem quaisquer outros que permitam concluir pela efectiva residência no país de proveniência; - O veículo não foi introduzido no consumo por ocasião da transferência de residência da requerente, não estando cumprido o requisito constante no artigo 60º, nº 1, alínea a) do CISV.‟ 3 - A requerente contesta os fundamentos do projecto de decisão […], argumentando, designadamente e naquilo que se mostra relevante: - Que o direito ao benefício fiscal em causa não pode ceder perante meros formalismos ou eventuais lapsos […]; - Que não poderá ser prejudicada em caso de dúvida e / ou erro de interpretação / actuação quanto ao preenchimento formal dos pressupostos legais […]; - Que preencheu o circunstancialismo legal juntando ao processo demonstração da sua residência em França, nomeadamente reforma e descontos para a Segurança Social, Seguro de Saúde e descontos para a Caixa Complementar […]; - Que depois de Julho de 2011 residiu em casa do filho onde, obviamente, nada pagou […]; - Que após a sua reforma (Julho de 2011) veio várias vezes a Portugal, onde já estava a organizar a sua vinda […] - Que os montantes necessários para a sua vida corrente foram retirados, via internet, da sua conta em França […]; - Que é um facto que o veículo foi deixado em Portugal durante vários meses antes da data da alegada transferência de residência […]; - Que o Estado nada perde ou em nada é prejudicado por ter sido eventualmente ultrapassado o prazo de seis meses […]. A requerente não juntou qualquer documento à sua exposição, nomeadamente quanto ao que poderia revelar-se útil para a decisão, comprovativos das despesas quotidianas suportadas […]. 4 - Em resumo e atendendo ao teor da exposição a requerente argumenta que: - O incumprimento dos requisitos, condicionalismos e formalismos legais não a afasta do direito ao benefício fiscal; - Que a obtenção da isenção nestas circunstâncias não constitui qualquer prejuízo para o Estado; - Que cumpre a obrigação imposto pelo artigo 61.º, nº 1, alínea e) do Código do Imposto Sobre Veículos - apresentação de documentos que atestem a vida quotidiana no país de proveniência - com a junção dos documentos a que se refere no ponto 12.º da sua exposição; 5 - Face aos argumentos apresentados, entendo ser de referir: - A requerente reconhece o incumprimento do disposto no artigo 60.º, nº 1, alínea a) do Código do Imposto Sobre Veículos, porquanto o veículo foi introduzido no consumo - de forma irregular - meses antes da alegada transferência de residência. - Este facto por si só impede o reconhecimento do direito invocado, por incumprimento de requisito legal necessário, não se tratando de erro de interpretação ou questão de preenchimento formal da norma. - Que se mantém a opinião de que não se encontra cumprida a obrigação legal de junção de documentos que atestem a vida quotidiana no país de proveniência, não podendo ser considerados como tal as prescrições de medicamentos, a notificação do valor da pensão de reforma dos meses de Abril e Maio de 2011 nem, por maioria de razão, o certificado para efeitos de seguro de saúde para o período compreendido entre 29/05/2013 e 28/11/2013, posterior à data da alegada transferência de residência, nenhum dos quais está expressamente previsto na norma nem se reveste do mesmo carácter daqueles. 6 - Desta forma, sou de parecer que o pedido de reconhecimento do direito à isenção do montante de imposto sobre veículos devido pela introdução no consumo do veículo da marca Mercedes, proveniente de França, portador da matrícula XX-XXX-XX, apresentado pela sua proprietária M., deverá ser indeferido por incumprimento do disposto nos artigos 60.º, nº 1, alínea a) e 61.º, nº 1, alínea e) do Código do Imposto Sobre Veículos. […]” – cfr. documento de fls. 32 a 34 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 17. Em 11.09.2013, sobre a informação mencionada no ponto anterior, a Diretora Adjunta da Alfândega de Aveiro proferiu despacho de indeferimento do pedido de isenção do Imposto sobre Veículos formulado pela Autora – cfr. documento a fls. 32 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 18. Mediante ofício remetido por correio registado com aviso de receção, que foi assinado por terceira pessoa em 12.09.2013, a Alfândega de Aveiro comunicou à Autora a decisão de indeferimento mencionada no ponto anterior – cfr. documentos a fls. 35 e 36 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 19. Em 23.09.2013, a entidade administrativa francesa Caisse Primaire d‟ Assurance Maladie du Bas-Rhin emitiu atestado confirmando a inscrição da Autora, a título pessoal e obrigatório, no período compreendido entre 01.04.2012 e 30.04.2013, por força da sua condição de aposentada – cfr. documento a fls. 42 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 20. Em 04.10.2013, a Autor interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento referida nos pontos 16 e 17 – cfr. documento de fls. 37 a 41 do processo administrativo apenso aos autos físicos; 21. Em 02.12.2013, foi proferida decisão do recurso hierárquico, mantendo o sentido e os fundamentos da decisão de indeferimento do pedido de isenção – cfr. teor do documento de fls. 45 a 51 do processo administrativo apenso aos autos físicos. * Com relevância para a decisão da causa, considera-se não provados os seguintes factos: A. Durante o período mencionado no ponto 9 dos factos provados, o veículo permaneceu na garagem da casa da Autora, sem qualquer utilização, por ter sofrido avaria grave que a impossibilitou de circular. * Não se deram como provados ou não provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.Os factos constantes dos pontos 1 a 6 foram dados como provados com base nos depoimentos escritos das testemunhas S. – a fls. 130 do sitaf –, M. – a fls. 125/126 do sitaf –, A. – de fls. 134 a 136 do sitaf – e M. – a fls. 152/153 do sitaf. Com efeito, apesar das relações familiares entre a Autora e as testemunhas e da circunstância de os depoimentos terem sido prestados por escrito, considera-se que os mesmos são consistentes, revelando detalhes circunstanciais de tempo, modo e lugar que indiciam credibilidade. Todavia os mesmos depoimentos não se revelaram adequados para dar como provados os factos constantes do ponto A, na medida em que a sua demonstração poderia e deveria ter sido realizada mediante prova documental. Os factos mencionados no ponto 2 foram dados como provados, para além da mencionada prova testemunhal, também com referência aos documentos a fls. 1 do processo administrativo apenso aos autos físicos e a fls. 21 do sitaf do processo n.º 817/13.6BEAVR, apenso aos presentes autos. O facto expresso no ponto 8 foi dado como provado por confissão e por referência ao teor do documento a fls. 21 do processo administrativo apenso aos autos físicos. O facto constante do ponto 9 foi igualmente dado como provado por confissão. O facto mencionado no ponto 10 foi dado como provado por acordo, atenta a posição coincidente assumida pelas partes na presente causa. Os restantes factos foram dados como provados com base na análise crítica dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.” 2. O Direito A Recorrente afirma que, na sentença em crise, se confunde o conceito de introdução do veículo “em território nacional” com o de introdução “no consumo”, que não se verificaram, in casu, em momentos coincidentes. Insurge-se por não se poder concluir, sem mais, pela violação do artigo 30.º, n.º 1 do CISV, não se verificando, pois, o facto gerador do imposto, nem se encontrando, por isso, afastado o direito da Recorrente à isenção do mesmo. Tendo o acto impugnado fundado a decisão de indeferimento do pedido de isenção de ISV em dois fundamentos, defende a Recorrente que o requisito cumulativo, apreciado na sentença recorrida, se verifica, dado que a mudança de residência da impugnante para Portugal foi contemporânea da introdução do veículo no consumo, estando preenchido o disposto no artigo 60.º, n.º 1, alínea a) do Código do ISV. Logo, na sua óptica, restará apreciar que também o pressuposto indicado no acto impugnado – artigo 61.º, n.º 1, alínea e) do mesmo Código – está presente na situação em análise, ao contrário do decidido pela AT. Vejamos o julgamento realizado em primeira instância para manter o acto de indeferimento impugnado na ordem jurídica: “(…) Na presente ação, a Autora coloca em crise a legalidade do ato praticado pela Alfândega de Aveiro, mediante o qual viu indeferido o pedido de reconhecimento da isenção de Imposto sobre Veículos relativo ao veículo com a matrícula XX-XXX-XX, no qual invocou a transferência de residência de país da União Europeia para Portugal. Tal decisão de indeferimento explicitou dois fundamentos essenciais: a) a Autora não fez prova bastante da sua residência efetiva em França durante, pelo menos, os 12 meses que antecederam a data da transferência da residência para Portugal; e b) o veículo permaneceu em território nacional muito para além do prazo legalmente permitido pelo regime de admissão temporária. A Autora contrapõe que no procedimento administrativo, fez prova dos requisitos do direito à isenção do Imposto sobre Veículos, como sejam a residência em França por um período superior a 12 meses e cumprimento do prazo de seis meses para requerer a isenção após a sua introdução no consumo. Está, portanto, em causa a verificação dos pressupostos de atribuição da isenção de Imposto sobre Veículos, com fundamento na transferência de residência para território nacional, cujo regime está concretamente consagrado nos artigos 45.º e 58.º a 63.º do Código do Imposto sobre Veículos, na redação em vigor durante o ano de 2013, os quais, na parte que releva para o caso, têm o seguinte teor: “Artigo 45.º Pedido de reconhecimento 1 - As isenções previstas no presente capítulo dependem de reconhecimento da Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, mediante pedido do interessado em que se faça prova documental da verificação dos respetivos pressupostos. 2 - O pedido de reconhecimento deve ser apresentado nos prazos seguintes: a) No prazo de seis meses a contar da data da transferência de residência ou da cessação de funções, nos casos a que se referem os artigos 58.º, 62.º e 63.º; […].” “Artigo 58.º Transferência de residência 1 - Estão isentos de imposto os veículos da propriedade de pessoas, maiores de 18 anos, habilitadas a conduzir durante o período mínimo de residência, que transfiram a sua residência de um Estado membro da União Europeia ou de país terceiro para território nacional, desde que estejam reunidas as condições estabelecidas nos artigos 59.º e 60.º […]. Artigo 59.º Condições relativas à transferência de residência 1 - O reconhecimento da isenção prevista no artigo anterior depende de pedido dirigido à Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, acompanhado de: a) Comprovativo da residência noutro Estado membro da União Europeia ou em país terceiro por período de 12 meses, seguidos ou interpolados se nesse país vigorarem restrições de estada, e a respetiva transferência para Portugal, na situação prevista no n.º 1 do artigo anterior; […]. 2 - Para efeitos do disposto da alínea a) do número anterior e no caso de a legislação do país de proveniência estabelecer restrições de estada, tendo a residência sido fixa por períodos não consecutivos, conta-se o tempo total de permanência no país com base em certificado emitido pela entidade consular competente, não podendo cada período ser inferior a 183 dias por ano civil. 3 - Não se consideram residentes noutro Estado membro ou em país terceiro, as pessoas que se encontrem no estrangeiro para efeitos de estudos, estágios ou execução de funções de duração determinada até dois anos. […]. Artigo 60.º Condições relativas ao veículo 1 - A isenção de imposto referida no artigo 58.º só é concedida quando se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições relativas ao veículo: a) Destinar-se a ser introduzido no consumo por ocasião da transferência de residência normal do interessado para território nacional; b) Ter sido adquirido no país de proveniência, ou em país onde anteriormente tenha igualmente residido o proprietário, em condições gerais de tributação e não ter beneficiado na expedição ou exportação de qualquer desagravamento fiscal, presumindo-se tal facto quando o veículo se encontre munido de uma placa de matrícula de série normal, com exclusão de toda e qualquer placa temporária; c) Ter sido propriedade do interessado no país de proveniência, durante pelo menos 12 meses antes da transferência de residência, contados desde a data da emissão do documento que titula a propriedade ou da data em que celebrou o contrato de locação financeira, se for o caso. […]. Artigo 61.º Pedido de isenção 1 - Para efeitos do reconhecimento da isenção por transferência de residência, o requerente deve apresentar, juntamente com o pedido, os seguintes documentos: a) Declaração aduaneira de veículo; b) Certificado de matrícula e título de registo de propriedade, se for o caso, comprovativo da propriedade do veículo; c) Carta de condução válida há pelo menos 12 meses antes da transferência da residência; d) Certificado de residência oficial, emitido pela entidade administrativa com competência para o controlo de habitantes ou, caso não exista, certificado consular, onde conste a data do início e cessação da residência; e) Documento da vida quotidiana que ateste a residência no país de proveniência, designadamente, recibos de renda de casa, consumo de água, eletricidade, recibos de vencimento ou provas de desconto para efeitos de saúde e reforma. 2 - A Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo pode exigir a tradução oficial de documentos estrangeiros. […].” Da conjugação destes preceitos decorre que a isenção de imposto, com fundamento na transferência de residência para território nacional do respetivo proprietário, carece de reconhecimento por parte da Administração Tributária e depende no preenchimento cumulativo de um conjunto de requisitos, entre os quais se destacam, com relevância para a decisão da causa: i) a “residência noutro Estado membro da União Europeia ou em país terceiro por período de 12 meses”; ii) que o pedido de reconhecimento seja apresentado “[n]o prazo de seis meses a contar da data da transferência de residência”; iii) que o veículo se destine a “ser introduzido no consumo por ocasião da transferência de residência normal do interessado para território nacional”. No que respeita ao requisito de residência noutro país por período de 12 meses, cabe ao interessado fazer prova, além do mais, de que tinha a sua base de vida – ou seja, a sua existência quotidiana – efetivamente localizada no país de transferência, mediante, designadamente, recibos de renda de casa, consumo de água, eletricidade, recibos de vencimento ou provas de desconto para efeitos de saúde e reforma. Da utilização do advérbio designadamente, retira-se que os documentos da vida quotidiana podem ser os mencionados na alínea e) do n.º 1 do artigo 61.º ou quaisquer outros que se revelem idóneos a fazer prova de que o interessado teve o seu centro de vida, durante um período de 12 meses, no país de transferência. Quantos aos outros dois requisitos enunciados, os mesmos devem ser entendidos de modo articulado, na medida em que ambos têm por referência o momento da transferência de residência normal do interessado para território nacional, o qual, por um lado, deve ser contemporâneo à introdução no consumo do veículo em causa e, por outro, define o termo inicial do prazo de seis meses para apresentação do pedido de reconhecimento da isenção de imposto. No caso dos autos, decorre da matéria de facto dada como provada que a Autora foi emigrante em França durante cerca de quatro décadas e que, nos últimos anos, preparou o seu regresso definitivo a Portugal, tendo, desde 2011, dividido as suas estadias entre Portugal e França, e, em maio de 2013, procedido à transferência definitiva do seu domicílio para território nacional. As partes assumem posição concordante quanto ao facto de a Autora ter mudado a sua residência para território nacional em 11.05.2013. Por outro lado, a Autora confessa que o veículo foi introduzido em território nacional, pelo menos, em 19.07.2012 e que aí permaneceu ininterruptamente até à mencionada data de transferência da residência. A primeira questão que se suscita consiste, pois, em saber se a mudança de residência da Autora se efetivou contemporaneamente à introdução no consumo do veículo, pois que, nos termos do disposto no citado artigo 60.º n.º 1 alínea a) do Código do Imposto sobre Veículos, esta é uma condição de cujo preenchimento depende a atribuição do benefício fiscal em causa. Ora, é manifesto que o veículo em causa nos autos não foi introduzido no consumo contemporaneamente à transferência de residência da Autora, porquanto esta se concretizou em 11.05.2013, enquanto aquele foi introduzido em território nacional, pelo menos, em 19.07.2012. Note-se, a este propósito, que “[o] regime de admissão temporária faculta a permanência de veículos tributáveis matriculados noutro Estado membro da União Europeia no território nacional com suspensão de imposto pelo prazo máximo de seis meses” (cfr. artigo 30.º n.º 1 do Código do Imposto sobre Veículos), sendo que, como decorre da interpretação conjugada dos preceitos contidos nos artigos 5.º n.º 2 alínea d) e 6.º n.º 2 do Código do Imposto sobre Veículos, a violação do mencionado prazo de seis meses configura facto gerador do imposto. Assim, porque a introdução do veículo em território nacional não ocorreu contemporaneamente à transferência de residência da Autora, conclui-se que não está preenchido pelo menos este requisito da concessão da isenção do Imposto sobre Veículos. Atendendo à natureza cumulativa dos requisitos de concessão de tal isenção, fica prejudicada o conhecimento da verificação do outro requisito, em relação ao qual as partes assumem posição divergente, devendo, em consequência, julgar-se a presente ação improcedente. (…)” Em face deste julgamento, é notório que a sentença recorrida deverá ser confirmada. A Lei n.º 22-A/2007, de 29/06, procedeu à reforma global da tributação automóvel, aprovando o CISV e o CIUC e abolindo, em simultâneo, o imposto automóvel, o imposto municipal sobre veículos, o imposto de circulação e o imposto de camionagem. O artigo 3.º, n.º 1, do CISV estabelece o seguinte: «São sujeitos passivos do imposto os operadores registados, os operadores reconhecidos e os particulares, tal como definidos pelo presente código, que procedam à introdução no consumo dos veículos tributáveis, considerando-se como tais as pessoas em nome de quem seja emitida a declaração aduaneira de veículos ou a declaração complementar de veículos». O artigo 5.º do CISV determina: «1- Constitui facto gerador do imposto o fabrico, montagem, admissão ou importação de veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal. 2- Constitui ainda facto gerador do imposto: a) A atribuição de matrícula definitiva nova após o cancelamento voluntário da matrícula nacional feito com reembolso de imposto ou qualquer outra vantagem fiscal; (...) d) A permanência do veículo no território nacional em violação das obrigações previstas no presente código. 3- Para efeitos do presente código entende-se por: a) ‘Admissão’, a entrada de um veículo originário ou em livre prática noutro Estado-Membro da União Europeia em território nacional; b) ‘Importação’, a entrada de um veículo originário de país terceiro em território nacional. 4 - Sem prejuízo das obrigações declarativas previstas nos artigos 18.º e 19.º, quando, à entrada em território nacional, os veículos tributáveis forem colocados em regime de suspensão de imposto, considera-se gerado o imposto no momento em que se produza a sua saída desse regime.» Nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do CISV, o imposto torna-se exigível no momento da introdução no consumo, considerando-se esta verificada: «a) No momento da apresentação do pedido de introdução no consumo pelos operadores registados e reconhecidos; b) No momento da apresentação da declaração aduaneira de veículos ou declaração complementar de veículos pelos particulares. 2 - Nos casos mencionados no n.º 2 do artigo anterior considera-se verificada a introdução no consumo no momento da ocorrência do facto gerador do imposto ou, sendo este indeterminável, no momento da respectiva constatação. (…)» O capítulo V do CISV trata dos regimes suspensivos, designadamente, da admissão e importação temporária, definindo o artigo 30.º o seguinte: «1 - O regime de admissão temporária faculta a permanência de veículos tributáveis matriculados noutro Estado membro da União Europeia no território nacional com suspensão de imposto pelo prazo máximo de seis meses, seguidos ou interpolados, em cada período de 12 meses, verificadas as seguintes condições cumulativas: a) Serem os veículos portadores de matrícula definitiva de outro Estado membro e estarem matriculados em nome de pessoa sem residência normal em Portugal; b) Serem os veículos introduzidos em território nacional pelos proprietários ou legítimos detentores para seu uso privado. (…)» De salientar que o regime de admissão ou importação temporária cessa em virtude da introdução no consumo, segundo o disposto no artigo 32.º, n.º 1, alínea a) do CISV. Em face destes normativos e da factualidade não impugnada, resulta claro que, pelo menos, em Janeiro de 2013 o ISV já seria exigível quanto ao veículo em apreço de matrícula XX-XXX-XX, porque o veículo permanecia no território nacional em violação do disposto no artigo 30.º do CISV (na admissão temporária, o veículo pode permanecer em território nacional com suspensão de ISV pelo prazo máximo de seis meses). De facto, o veículo foi colocado em regime de suspensão de imposto, pelo prazo máximo de seis meses, considerando-se gerado o imposto no momento em que se produza a sua saída desse regime – cfr. artigo 5.º, n.º 4 do CISV. Lembramos que se considera verificada a introdução no consumo no momento da ocorrência do facto gerador do imposto ou, sendo este indeterminável, no momento da respectiva constatação, in casu, no momento em que se constata a permanência do veículo no território nacional em violação das obrigações previstas no CISV – cfr. artigo 5.º, n.º 2, alínea d) e 6.º, n.º 2 do CISV. Note-se que nos casos mencionados no n.º 2 do artigo 5.º do CISV, nomeadamente a permanência do veículo no território nacional em violação das obrigações previstas no CISV, o legislador fez equivaler tais situações à introdução no consumo. Assim, é notório que o veículo em apreço foi introduzido no consumo antes de a Recorrente ter estabelecido a sua residência em Portugal em 11/05/2013 – cfr. ponto 10 do probatório. Dado que o veículo já permanecia em território nacional, pelo menos desde 19/07/2012, e que não regressou a França, é forçoso concluir que foi excedido o limite de admissão temporária de seis meses previsto legalmente e que, nestas situações de permanência em violação do CISV, o legislador fez corresponder à introdução no consumo, sendo, portanto, exigível o imposto antes do regresso definitivo da Recorrente a Portugal – cfr. pontos 7 e 9 da decisão da matéria de facto. A Recorrente parece defender que a exigibilidade do imposto pressupõe a efectiva condução, a circulação, dos veículos com matrícula estrangeira em território nacional. Como o veículo da Recorrente terá estado imobilizado, na garagem da sua habitação em Portugal, desde pelo menos Dezembro de 2012, só terá sido introduzido no consumo contemporaneamente ao regresso definitivo da Recorrente a Portugal em 11/05/2013. A tese da Recorrente poderá ter na sua base a corrente doutrinária de que o ISV tem a natureza jurídica de imposto de matrícula. Poder-se-á defender que as normas de incidência do ISV não têm apenas em conta as características físicas dos veículos, mas também a finalidade conferida ao respectivo uso, isto é, para que um veículo de passageiros esteja sujeito a ISV não basta que seja introduzido no consumo, é ainda necessário que se verifique uma condição subjectiva adicional: que o interessado pretenda matricular, porque pretende circular na via pública. Ora, o ISV é um imposto especial de consumo, que tem como facto gerador o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal. Ou seja, não há qualquer dúvida que, pelo menos do ponto de vista formal, o ISV não é um imposto de matrícula. Com efeito, nesta matéria, a doutrina maioritária continua a defender que o ISV é um imposto interno de consumo, que tem como facto gerador do imposto a 'introdução no consumo' – cfr. AFONSO, António Brigas, 'Notas sobre o Código dos Impostos Especiais do Consumo', in Ciência e Técnica Fiscal, n.º 402, Abril-Junho 2001, DGCI/CEAPT, pp. 147 a 183, em especial p. 151, BASTO, José Xavier, "A Tributação do Consumo e a sua Coordenação Internacional', in Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 164, DGCI/CEF, Lisboa, 1991, p. 24 , e VASQUES, Sérgio, 'A Reforma da Tributação Automóvel: Problemas e Perspectivas', in Fiscalidade, n.º 10, Abril 2002, pp. 59 a 94, em especial pp. 60/61. Efectivamente, a introdução em território nacional, ou seja, a admissão, que é a entrada de um veículo originário ou em livre prática noutro Estado-Membro da União Europeia em território nacional – cfr. artigo 5.º, n.º 3, alínea a) do CISV, é diferente da introdução no consumo. Relembramos que a admissão, sendo temporária, faculta a permanência de veículos tributáveis matriculados noutro Estado membro da União Europeia no território nacional com suspensão de imposto pelo prazo máximo de seis meses, seguidos ou interpolados, em cada período de 12 meses, nas condições prevista no artigo 30.º do CISV. Assim, embora a admissão de veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal, constitua um facto gerador do imposto, se a permanência dos mesmos se efectivar pelo prazo máximo de seis meses, há lugar à suspensão do ISV. Reiteramos que esta suspensão cessa com a ultrapassagem desse prazo, considerando-se gerado o imposto no momento em que se produza a sua saída desse regime de suspensão – cfr. artigo 5.º, n.º 4 do CISV. Nesta conformidade, verificamos, por concatenação do disposto no artigo 5.º, n.º 2, alínea d) com o artigo 6.º, n.º 2, que o legislador quis fazer equivaler a permanência do veículo no território nacional em violação das obrigações previstas no CISV à introdução no consumo, logo, pelo menos em Janeiro de 2013 o veículo em análise tem de considerar-se introduzido no consumo, mostrando-se irrelevante que estivesse estacionado em garagem no território nacional, por motivo de avaria. Salientamos que, in casu, o ISV não é exigível pela circulação do veículo, mas pela sua introdução no consumo que, na presente situação, decorre da lei, mais precisamente dos normativos mencionados – cfr. artigo 5.º, n.º 2, alínea d) e 6.º, n.º 2 do CISV. Por este motivo, é irrelevante que o veículo estivesse avariado e estacionado em garagem desde Dezembro de 2012. Nestes termos, pela sua falta de pertinência para a resolução do caso concreto, abster-nos-emos de apreciar a matéria de facto não provada vertida no ponto A e que se mostra impugnada no presente recurso, ficando prejudicado o seu conhecimento nesta sede. Resultando da análise efectuada neste tribunal que se deve considerar a introdução no consumo do veículo de matrícula XX-XXX-XX a partir da constatação da permanência ilegal do mesmo em território nacional, isto é, pelo menos a partir de 19 de Janeiro de 2013 (desde 19/07/2012 permaneceu em Portugal, como vimos), quando é emitida, em 13/05/2013, pela Alfândega de Aveiro, a Declaração Aduaneira de Veículo destinada à introdução no consumo do veículo mencionado – cfr. ponto 11 do probatório, já o mesmo se encontrava introduzido no consumo. Pelo exposto, não se mostra cumprida uma condição relativa ao veículo, para que possa ser deferido o pedido de isenção do imposto: que o veículo seja destinado a ser introduzido no consumo por ocasião da transferência de residência normal do interessado para território nacional, pois, como ficou claro, tal transferência verificou-se posteriormente em 11/05/2013, enquanto a introdução no consumo deve ser considerada efectivada, por força da lei, pelo menos em 20/01/2013 – cfr. artigo 60.º, n.º 1, alínea a) do CISV. O facto de estas duas circunstâncias não serem coevas é suficiente para negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida na ordem jurídica. Conclusões/Sumário I - O Imposto sobre Veículos é um imposto especial de consumo, que tem como facto gerador o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal. Ou seja, pelo menos do ponto de vista formal, o Imposto sobre Veículos não é um imposto de matrícula e é exigível no momento da introdução no consumo do veículo. II - Considera-se verificada a introdução no consumo no momento da constatação da permanência de veículo no território nacional em violação das obrigações previstas no Código do Imposto sobre Veículos (CISV) – cfr. artigos 5.º, n.º 2, alínea d) e 6.º, n.º 2 do CISV. III - É condição para o deferimento do pedido de isenção do Imposto sobre Veículos que o veículo seja destinado a ser introduzido no consumo por ocasião da transferência de residência normal do interessado para território nacional – cfr. artigo 60.º, n.º 1, alínea a) do CISV. IV. Decisão Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso. * Custas a cargo da Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.* Porto, 27 de Maio de 2021Ana Patrocínio Cristina Travassos Bento Celeste Oliveira |