Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00485/19.1BEPNF-S
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/09/2025
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:PAULO FERREIRA DE MAGALHÃES
Descritores:EXTENSÃO DOS EFEITOS DA SENTENÇA;
LEI N.º 60/2005, DE 29 DE DEZEMBRO;
DIREITO DE INSCRIÇÃO NA CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES;
Sumário:
1 – Para efeitos de pedido formulado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 161.º do CPC, é pressuposto que estejam em causa situações que tenham na sua base actos administrativos com idêntico conteúdo ou em que o demandante esteja colocado numa situação jurídica idêntica, e que não exista já sentença transitada em julgado quanto a ele, e bem assim, que tenham sido proferidas 5 sentenças pelos Tribunais Superiores transitadas em julgado no mesmo sentido, e outro tanto, que não tenha sido proferido número superior de sentenças, transitadas em julgado, em sentido contrário, e mais ainda, que tendo sido apresentado requerimento dirigido à mesma entidade administrativa que havia sido demandada no processo judicial em referência, o mesmo haja sido indeferido ou sobre ele não tenha incidido qualquer resposta.

2 – Como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.

3 - O cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que vem a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo 22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO



CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, IP [devidamente identificada nos autos], Co-Ré na acção que contra si foi intentada por «AA» [também devidamente identificado nos autos], pela qual requereu, ao abrigo do artigo 161.º do CPTA, a extensão dos efeitos e execução em seu favor, da sentença proferida no âmbito do Processo principal [que deu provimento à ação administrativa e que condenou as entidades demandadas a aceitarem a reinscrição da ali autora como subscritora da CGA, com efeitos à data em que foi ilegalmente inscrita na Segurança Social], inconformada com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, pela qual foi julgado procedente a peticionada extensão de efeitos da sentença proferida no processo em referência, e condenadas as partes a reconhecer o direito da Requerente a manter a subscrição na CGA com efeitos desde 12-09-2007, bem como a concretizar e praticar os actos materiais necessários a repor essa inscrição, veio interpor recurso de Apelação.


*

No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

“[…]
CONCLUSÕES:
I – OS PRESSUPOSTOS DE QUE DEPENDE O REGIME DE EXTENSÃO DE EFEITOS DE SENTENÇAS
1.ª No art.º 161.º do CPTA, o legislador exige uma clara comprovação de que se tratam de casos perfeitamente idênticos, sendo que, no caso concreto, não foi feito qualquer esforço para demonstrar que a situação da Recorrida é idêntica – ou melhor, perfeitamente idêntica, como se determina na Lei – às subjacentes às decisões que invoca.
2.ª A Recorrida não apresentou factos essenciais, concretos, objetivos e individualizados que fundamentassem a sua pretensão (que no que respeita ao seu caso quer no que respeita ao analisado na decisão cuja extensão de efeitos pretende), reconduzindo-se o seu articulado praticamente a matéria de direito e a referências genéricas de conteúdo meramente conclusivo.
3.ª Não foram alegados factos referentes à data a que se reporta, num e noutro caso, o início de funções, qual o respetivo vínculo laboral e a que entidades empregadoras. Também não foram concretizados factos referentes ao momento em que, num e noutro caso, ocorreu a respetiva alteração de regime de proteção social nem a demonstração que, num e noutro caso, não existiu descontinuidade temporal de vínculos laborais públicos.
4.ª O articulado da Recorrida limita-se a referências conclusivas a que os pressupostos do pedido extensão de efeitos são em tudo idênticos aos referentes ao processo n.º 485/19.2BEPNF, nada concretizando, no entanto, em sede factual.
5.ª No momento em que o particular se apresenta a requerer a extenso de efeitos de uma sentença, peticionando que se produzam na sua esfera jurídica os mesmos efeitos daquela, este tem, evidentemente, que fazer, nesta fase, o esforço probatório exigido pelo art.º 161.º do CPTA.
6.ª Não basta que o tribunal tenha julgado procedente uma pretensão remotamente idêntica ou semelhante àquela que o interessado acionou contra a entidade administrativa. Como decorre expressamente da letra da lei, o legislador foi mais longe ao exigir a clara comprovação de que se tratam de casos perfeitamente idênticos.
7.ª Sobre a integração da expressão “casos perfeitamente idênticos” incluído no n.º 2 do art.º 161.º do CPTA, acompanha-se o que sobre esta matéria foi decidido no supra referido Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 17-05-2007, tirado no Proc.
n.º 048087ª, em que foi Relator o Juiz Conselheiro Cândido de Pinho, supra transcrito em Alegações e publicamente disponível na base de dados do IGFEJ em www.dgsi.pt.
8.ª Sendo que, para haver a nele referida “…identidade absoluta entre o caso do recorrente e o dos interessados na extensão dos efeitos, ou seja uma coincidência substancial entre os factos dos seus casos e o daquele que foi objecto da sentença do recurso de cujo benefício os interessados
pretendem aproveitar-se.” é indispensável a enunciação de factos essenciais, concretos, objetivos e individualizados que fundamentem a aplicação da extensão de efeitos.
9.ª Ónus que tem de recair sobre a Requerente, ora Recorrida, por força do estabelecido no art.º 552.º do CPC e n.º 4 do art.º 581.º do mesmo Código.
10.ª Perante a ausência de factos concretizadores suscetíveis da demonstração da identidade absoluta entre o caso da Recorrida e o caso tratado na decisão cuja extensão de efeitos este requer, parece-nos que, nessa perspetiva, o Tribunal a quo não procedeu a uma adequada análise deste processo.
11.ª Por outro lado, a CGA considera, ainda, que, em bom rigor – nunca poderia ser aplicável ao caso do Recorrido a jurisprudência vertida no processo nº 485/19.1BEPNF – que remete a interpretação acolhida no Acórdão do STA de 201403-06, no âmbito do proc.º n.º 0889/13, onde se convoca o princípio de continuidade temporal entre vínculos públicos – uma vez que, no caso concreto, resultam claramente do Registo Biográfico, junto pela Recorrida à P.I., várias situações de descontinuidade temporal, razão pela qual pensamos que não será de admitir a extensão de efeitos peticionada, por não estar demonstrada a perfeita identidade de facto e de direito entre o(s) caso(s) julgado(s) e a “…mesma situação jurídica…” (cfr. n.º 1 do artº 161.º do CPTA).
II – A PUBLICAÇÃO DA LEI N.º 45/2024, DE 27 DE DEZEMBRO
12.ª No decurso deste autos foi publicada a Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, que procede à interpretação autêntica do n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro – norma que está na génese do presente litígio – sendo, portanto, este um diploma que também importa ser equacionado nestes processos.
13.ª Aplicando o citado regime jurídico ao caso da ora Recorrida, para além da análise à questão da descontinuidade temporal entre vínculos, de que trata o número 2 do referido art.º 2.º, haverá ainda que ter em consideração o que se encontra estabelecido no n.º 3 do mesmo artigo, onde se esclarece que “Os períodos contributivos para o regime geral de segurança social dos trabalhadores abrangidos pelos números anteriores relevam para efeitos da aplicação do Regime Jurídico da Pensão Unificada, previsto no Decreto-Lei n.º 361/98, de 18 de novembro.”
14.ª Isto é, ainda que se concluísse que a Recorrida poderia ser enquadrada no regime legal previsto na alínea b) do n.º 2 do art.º 2.º da Lei n.º 45/2024 – o que se afigura não poder ser dilucidado no âmbito de um processo de extensão de efeitos de sentença – nunca a decisão poderia ser semelhante à tomada pela decisão recorrida, que decidiu “…reconhecer o direito da Requerente a manter a subscrição na CGA com efeitos desde 12-09-2007….”, já que esta não observa a regra jurídica estabelecida no n.º 3 do art.º 2.º da Lei n.º 45/2024.
15.ª Sendo que, como decorre do n.º 2 do art.º 4.º da Lei n.º 45/2024, este regime é aplicável a todos os casos, apenas com exceção daqueles “…cuja manutenção da inscrição no regime de proteção social convergente tenha sido determinada em execução de decisão judicial transitada em julgado em data anterior à entrada em vigor da presente lei.”
Termos em que considera a CGA que a Sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgue improcedente o pedido de extensão de efeitos de sentença nos termos do disposto no art.º 161.º do CPTA.
[...]“

**

A Recorrida apresentou Contra alegações, das quais para aqui se extraem as respectivas conclusões, como segue:

“[…]
CONCLUSÕES
1. As razões apresentadas pela recorrente para a interposição do presente recurso são a alegada falta de pressupostos de que depende o regime de extensão de efeitos de sentenças e a publicação da Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro. Salvo o devido respeito, que é muito elevado, a sua posição carece de sustento. Em boa verdade, a douta sentença recorrida não merece censura.
2. Quanto à alegada falta de pressupostos para a aplicação do regime de extensão de efeitos, é pacífica, abundante e uniforme a jurisprudência que rejeita a posição assumida pela recorrente no presente recurso. A título meramente exemplificativo indicam-se os Acórdãos do TCA Norte prolatados em 24 de janeiro de 2025, nos processos n.º 1183/23.BEPRT, n.º 243/24.1BEBRG e n.º 307/19.3BEBRG-BN. Encontrando-se este último transcrito supra, na parte com interesse para a presente lide.
3. Quanto à Lei n.º 45/2024. Trata-se de uma diploma legal que visa proceder «à interpretação autêntica do n.º 2 do artigo 2.º da Lei 60/2005, de 29 de Dezembro, que estabelece mecanismos de convergência do regime de protecção social da função pública com o regime geral da segurança social, no que respeita às condições de aposentação e cálculo das pensões.», com efeitos a partir da entrada em vigor da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, restringindo este caracter retroativo nos caso em que exista uma decisão transitada em julgado em data anterior à data sua entrada em vigor.
4. Contudo, esta ambição interpretativa com alcance retroativo contraria a jurisprudência vertida no Acórdão n.º 395/2017 do Tribunal Constitucional, que se encontra transcrito supra na parte com interesse. Não existe dúvida de que o n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 45/2004 veio introduzir requisitos novos, que a jurisprudência não previa, e que não se podem retirar da letra da norma interpretada. Assim, estamos perante um preceito inovador, falsamente interpretativo, com aplicação retroativa (cfr. n.º 1 do artigo 4.º). Como todos sabemos, não existia qualquer controvérsia jurisprudencial e a solução adotada na Lei n.º 45/2004 não reflete a posição unanime da jurisprudência.
5. Pelo que se aplica inteiramente a solução deste aresto do Tribunal Constitucional à luz do princípio da proteção da confiança, conforme se encontra analisado no, também, supra citado Acórdão n.º 310/2021 deste Tribunal. Que defende que “O princípio da protecção da confiança remeter-nos-á assim para a tutela da

estabilidade dos actos da Justiça, como condição indispensável à segurança dos cidadãos e à permanência e estabilidade da ordem jurídica. O legislador viola a confiança legítima dos particulares e, consequentemente, o princípio da proteção da confiança, quando decide introduzir, em 2024, inovações na Lei n.º 60/2005, i) sem qualquer consideração pelos efeitos já constituídos, ii) sem qualquer consideração pela jurisprudência que, de forma reiterada e constante, vinha atribuindo aos professores o direito à inscrição na Caixa Geral de Aposentações a quem antes de 1 de janeiro de 2006, estivesse inscrito nesse regime de providência.
6. Em bom rigor, nada permitiria a qualquer particular nas presentes circunstâncias antever como minimamente possível que deveria provar não existir «qualquer descontinuidade temporal»; ou existindo descontinuidade temporal, se comprove que: i) esta seja de natureza involuntária, limitada no tempo e justificada pelas especificidades próprias da carreira em que o funcionário ou agente está inserido; e ii) funcionário não tenha exercido atividade remunerada durante o período em que interrompeu o vínculo público. Pelo que, não restam dúvidas de que o n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 45/2024 padece do vício de inconstitucionalidade, por violação do princípio da confiança ínsito ao artigo 2.º da CRP.
Termos em que deve ser rejeitado o presente recurso, mantendo-se a douta sentença recorrida, por não merecer censura.
[…]”
*

O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso interposto, fixando os seus efeitos.

**

O Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, em suma, no sentido do seu não provimento e da confirmação da Sentença recorrida, quanto ao que a Recorrente veio a exercer o direito ao contraditório, pugnando a final e em suma, pelo provimento da sua pretensão recursiva.

***

Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.


***

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], e que passam por saber se o Tribunal a quo errou no julgamento por si prosseguido em matéria de interpretação aplicação do direito.

**

III - FUNDAMENTOS IIIi - DE FACTO

Para efeitos da prolação da Sentença recorrida, apreciou e decidiu o Tribunal a quo, nos termos que, por facilidade, para aqui se extraem como segue:

“[…]
Com interesse para a decisão da presente lide, julga-se provados os seguintes factos:
A. Em 01-09-1997, a R. foi admitida como subscritor da CGA, IP (fls. 1 do PA junto aos autos);
B. A R. exerceu funções como professor em várias escolas desde 01-09-1997, tendo iniciado e cessado contratos da forma que infra se reproduz (fls. 6 do PA junto aos autos):
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

Com interesse para a decisão da lide, não há factos que cumpra julgar como não provados.
A convicção do Tribunal formou-se com recurso aos meios de prova indicados junto de cada facto dado como provado (documentos juntos aos autos e não impugnados pelas partes – cf. 362.º e ss. do CC).
O demais alegado não foi nem julgado provado nem não provado por ser conclusivo, matéria de direito, ou não relevar para a decisão da causa. […]”

**

IIIii - DE DIREITO

Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que com referência ao pedido formulado a final da Petição inicial, deduzido contra o Ministério da Educação e a Caixa Geral de Aposentações, no sentido, em suma, da extensão dos efeitos da identificada sentença e a respetiva execução a favor da Autora, consubstanciando-se essa execução no reconhecimento e determinação da manutenção da sua inscrição e do vínculo na CGA, e da qualidade de subscritora na CGA, com efeitos desde 12 de setembro de 2007, assim como, na condenação dos Requeridos à prática dos actos materiais conducentes à reposição da situação legalmente devida, nomeadamente à sua manutenção/reinscrição na CGA, com efeitos retroativos desde 12 de setembro de 2007, integrando-a no regime de proteção social convergente, bem como à transferência das contribuições entregues desde essa data, à Segurança Social para a CGA, IP, veio a julgar pela procedência da acção e a condenar as entidades demandadas no pedido formulado, mais concretamente, de que se encontram verificados os pressupostos necessários para a extensão de efeitos da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, no Processo n.º 485/19.2BEPNF [leia-se 485/19.1BEPNF], e nesse sentido, que as entidades demandadas devem reconhecer o direito da Requerente a manter a subscrição na CGA com efeitos desde 12-09-2007, bem como a concretizar e praticar os actos materiais necessários a repor essa inscrição.

Com o assim julgado não se conforma a Recorrente CGA, que no âmbito das conclusões das suas Alegações de recurso sustentou, em suma, que errou o Tribunal a quo no julgamento por si prosseguido, por não estarem verificados os pressupostos de que depende o regime de extensão dos efeitos de sentenças, e por outro lado, que em face da publicação da Lei n.º 45/2024, de 27 de setembro, que sendo este regime legal convocável na situação em apreço nos autos, que a Sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgue improcedente o pedido de extensão de efeitos de sentença nos termos do disposto no artigo 161.º do CPTA.

Por seu turno, no âmbito das conclusões das Contra alegações apresentadas pela Recorrida, a mesma pugnou pela negação de provimento ao recurso jurisdicional apresentado, e assim, a final, pela confirmação da Sentença recorrida.

Neste patamar.

Por julgarmos com interesse para a decisão a proferir, para aqui extraímos parte da essencialidade da fundamentação aportada pelo Tribunal a quo na Sentença recorrida, como segue:

Início da transcrição
“[…]
A R. alega que se verifica a identidade de situações a que se refere o art. 161.º/2 do CPTA, e ainda que a sentença do processo n.º 485/19.2BEPNF teve acórdãos no mesmo sentido, em casos perfeitamente idênticos, nomeadamente o Ac. do STA de 06-03-2014, proc. 889/13; o Ac. do TCAN de 14-02-2020, proc. 1771/17.0BEPRT; o Ac. do TCAN de 28-01-2022, proc. 1100/20.6BEBRG; Ac. do TCAN de 24-03-2023, proc. 1868/21.2BEPRT; Ac. do TCAN de 19-06-2023, proc. 850/20.1BEPRT, Ac. do TCAN de 04-10-2023, proc. 496/20.4BEPNF.
Acrescenta ainda que requereu a extensão dos efeitos da sentença ao R., não tendo obtido resposta em tempo útil.
A CGA, por seu turno, alega que a situação em causa não é idêntica à do processo n.º 485/19.1BEPNF porque neste caso houve descontinuidade temporal.
[…]
A lei permite a extensão de efeitos de uma decisão judicial a terceiros que não foram parte do processo judicial inicial, sendo uma das situações em que a sentença produz efeitos extra-processuais.
Todavia, para proceder a essa atribuição de efeitos, o legislador estabeleceu alguns requisitos:
i) A sentença deve ser de impugnação de acto ou reconhecimento de direitos; ii) O Requerente não pode ter, para o seu caso, decisão judicial transitada em julgado;
iii) Os casos devem ser perfeitamente idênticos;
iv) Haja pelo menos cinco decisões (o art. designa-a de sentenças proferidas por tribunais superiores) proferidas por tribunais superiores no mesmo sentido da decisão cuja extensão se pretende ou; haja pelo menos três processos de massa com decisão transitada em julgado no mesmo sentido;
v) As referidas decisões não contrariem jurisprudência uniformizada do STA; vi) As referidas decisões não serem em menor número ao das decisões proferidas por tribunais superiores em sentido inverso.
A dúvida que a CGA levanta prende-se com a identidade dos casos.
Quid iuris?
A identidade a que se refere o art. 161.º/1 e 2 do CPTA deve ser uma identidade dedutivo-hermenêutica - isto é, os factos num e noutro casos devem permitir a aplicação da mesma subsunção jurídica.
Se se puder substituir os factos da sentença cuja extensão se pretende pelos factos da situação a R. sem que isso levasse a uma alteração do raciocínio jurídico vertido na referida sentença e nos acórdãos confirmantes, então estamos perante uma identidade de factos para os efeitos do art. 161.º/1 e 2 do CPTA.
Tal compreende-se face à teleologia e às indicações da própria norma, que se refere a situações de emprego público e em matéria de concursos – aqui o que interessa não é tanto que os candidatos ou funcionários tenham a mesmíssima idade, os mesmíssimos anos de serviço, ou que tenham desempenhado funções exactamente no mesmo local, mas que, na lógica da fundamentação das sentenças, seja idêntico constar aquele concreto funcionário/Autor ou constar este funcionário/Requerente da extensão dos efeitos da sentença.
Analisemos a fundamentação jurídica da sentença proferida no processo n.º 485/19.1BEPNF:
A Lei n.º 60/2005, de 29/12 estabelece mecanismos de convergência do regime de protecção social da função pública com o regime geral da segurança social no que respeita às condições de aposentação e cálculo das pensões – cfr. artigo 1.º. O artigo 2.º do citado diploma, sob a epígrafe “Inscrição”, dispõe o seguinte: “1 - A Caixa Geral de Aposentações deixa, a partir de 1 de Janeiro de 2006, de proceder à inscrição de subscritores. 2 - O pessoal que inicie funções a partir de 1 de Janeiro de 2006 ao qual, nos termos da legislação vigente, fosse aplicável o regime de protecção social da função pública em matéria de aposentação, em razão da natureza da instituição a que venha a estar vinculado, do tipo de relação jurídica de emprego de que venha a ser titular ou de norma especial que lhe conferisse esse direito, é obrigatoriamente inscrito no regime geral da segurança social”. Por outro lado, nos termos do artigo 22.º, n.º 1 do DecretoLei n.º 498/72, de 09 de Dezembro (diploma que aprovou o Estatuto da Aposentação), “*será eliminado o subscritor que, a título definitivo, cesse o exercício do seu cargo, salvo se for investido noutro a que corresponda igualmente direito a inscrição.” Por sua vez, estabelece o artigo 53.º da Lei de Bases da Segurança Social aprovada pela Lei n.º 4/2007, de 16/01 que “O sistema previdencial abrange o regime geral de segurança social aplicável à generalidade dos trabalhadores por conta de outrem e aos trabalhadores independentes, os regimes especiais, bem como os regimes de inscrição facultativa abrangidos pelo n.º 2 do artigo 51.º”, definindo, por seu turno o artigo 55.º da mencionada lei que “são condições gerais de acesso à protecção social garantida pelos regimes do sistema previdencial a inscrição e o cumprimento da obrigação contributiva dos trabalhadores e, quando for caso disso, das respectivas entidades empregadoras”
Em cumprimento do antedito quadro legal, e conforme estabelecido no artigo 29.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16/09 e artigo 3.º do Estatuto da Aposentação, as entidades empregadoras são responsáveis pela comunicação para efeitos de inscrição dos trabalhadores no respetivo sistema previdencial.
Os n.ºs 1 e 2 do citado artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29/12 preconizam a inadmissibilidade de novas inscrições na Caixa Geral de Aposentações e, bem assim, a obrigatoriedade de inscrição no regime geral de segurança social de todo o pessoal que “inicie funções” a partir de 1 de janeiro de 2006.
A questão que se coloca é a de saber qual o sentido e alcance com que deve valer o inciso “inicie funções.” E a este respeito o Supremo Tribunal Administrativo, em acórdão proferido a 06/03/2014, no processo n.º 0889/13, disponível em www.dgsi.pt, fixou o seguinte entendimento, que sufragamos e passamos a transcrever:
“Retira-se imediatamente da letra dos nºs 1 e 2 do preceito que o legislador pretende que a CGA deixe de proceder à inscrição de subscritores, a partir de 1 de janeiro de 2006, o que significa que aos funcionários e agentes que “iniciem” funções, a partir daquela data, passa a aplicar-se o regime da segurança social. Neste sentido, a utilização do inciso “inicie” funções, afigura-se inequívoco no sentido de abranger os trabalhadores que ingressem pela primeira vez (ex novo) na função pública. O objectivo a alcançar é o de não aumentar o número de inscrições através do cancelamento da entrada de novos subscritores e, nessa medida, caminhar para a convergência ao mesmo tempo que se limita o crescimento da despesa pública nesta área. No mesmo sentido, na exposição de motivos constante da Proposta de Lei nº 38/X pode ler-se, entre o mais, que “A concretização da convergência não deve, porém, fazer-se nem à custa do sacrifício das expectativas daqueles que, no quadro do regime actualmente em vigor, já reúnem condições para se aposentarem. Nem de rupturas fracturantes, optando-se antes por um modelo de transição gradual que aplica aos funcionários, agentes da Administração Pública e demais servidores do Estado o regime de pensões do Estatuto da Aposentação, o regime de segurança social ou ambos simultaneamente.”
Assim sendo, considerando a letra do preceito e a sua razão de ser, afigura-se claro poder retirar-se do preceito que o mesmo deve ser interpretado no sentido de a CGA estar impedida de inscrever como subscritor aquele funcionário/agente que pela primeira vez venha a ser titular de relação jurídica pública.”
Observa-se ainda neste acórdão, que o artigo 22.º do EA (Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 09/12), cuja epígrafe é “Eliminação do subscritor”, “prevê as situações em que há lugar ao cancelamento da inscrição dos subscritores, dispondo do seguinte modo:
“1- Será eliminado o subscritor que, a título definitivo, cesse o exercício do seu cargo, salvo se for investido noutro a que corresponda igualmente direito de inscrição”. Por sua vez, o nº 2 do mesmo preceito permite em qualquer caso nova inscrição se o antigo subscritor vier a ser readmitido em quaisquer funções públicas contempladas no art. 1º do mesmo Estatuto.
Da leitura conjugada das referidas normas retira-se que, para o legislador, só haverá cancelamento da inscrição do subscritor que cesse definitivamente o exercício do seu cargo, assistindo-lhe, porém, o direito a ser de novo inscrito, se voltar a ingressar em funções públicas.
No entanto, note-se que, à luz do EA, só há lugar ao cancelamento da inscrição do subscritor, com a consequente eliminação, quando aquele cesse, a título definitivo, o seu cargo, porquanto o legislador teve o cuidado de ressalvar desse cancelamento a situação do trabalhador (funcionário ou agente) que for “investido noutro a que corresponda igualmente direito de inscrição”, isto é, que se limite a transitar, dentro da Administração Pública, de uma entidade pública para outra.
Assim sendo, considerando a letra dos referidos preceitos (artigos. 2º da Lei nº 60/2005 e 22º, nº1, do EA), não se pode dizer que o subscritor ao transitar no âmbito da Administração Pública de uma entidade para outra esteja a iniciar funções, nos termos e para os efeitos do disposto naquele primeiro preceito. Acresce que também quanto ao fim visado pelo art. 2º da Lei nº 60/2005 se afigura não existir incompatibilidade entre os dois preceitos, uma vez que, como vimos, o que se pretende é alcançar a convergência progressiva através da proibição da entrada de novos subscritores, ou seja, o objetivo é cancelar novas entradas e não propriamente eliminar os que permanecem no sistema.”
Atentas as considerações acima expostas, dúvidas não restam de que o disposto no artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29/12 visa apenas abranger o pessoal que inicie efetiva e absolutamente funções públicas no início do ano de 2006. Se outra fosse a vontade do legislador ter-se-ia, naturalmente, expressado de outra forma, se outra tivesse sido a sua intenção, pois é de presumir que “soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” (n.º 3 do art.º 9.º do C.C.), sendo certo que o intérprete “não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada” (n.º 1 do artigo 9.º do C.C.).
Voltando ao caso dos autos, resultou provado que a Autora esteve inscrita na Caixa Geral de Aposentações desde 07/05/2003 até 31/08/2010, tendo, em 01/09/2010 celebrado novo contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo para lecionar no Agrupamento de Escolas ...; mais resultou provado que já no ano letivo anterior, mais concretamente de 01/09/2009 a 31/08/2010, a Autora tinha lecionado nesse mesmo Agrupamento ao abrigo de um outro contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo; resultou ainda provado que foi enquadrada no regime da segurança social a partir de 01/09/2010.
(…)
Atento ao explanado e tendo em conta a matéria fáctica dada como provada nos autos, resulta evidente que a Autora tem direito a manter a sua inscrição/reinscrição na Caixa Geral de Aposentações. Com efeito, não se pode dizer que a Autora, ao transitar no âmbito da Administração Pública de uma entidade para outra (existindo a cessão de um vínculo laboral seguido da celebração de um novo), esteja a iniciar funções, nos termos e para os efeitos do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005 – cfr. ainda o Acórdão do TCA Norte de 14/02/2020, processo n.º 01771/17.0BEPRT, disponível em www.dgsi.pt. O raciocínio jurídico subjacente é simples: quando um sujeito cesse o vínculo laboral e celebre um novo, tal não se considera como sendo “iniciar funções” nos termos e para os efeitos do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005
A identidade da situação jurídica cumpre-se na medida em que a argumentação jurídica aqui vertida se aplique aos factos deste caso.
E aplica-se.
A R. estava inscrita na CGA antes da entrada em vigor da Lei n.º 60/2005 de 29-12, logo, a partir do momento em que volte a constituir uma relação jurídica que, anteriormente a 31-12-2006, lhe conferisse o direito à inscrição na CGA, terá direito a ser re-inscrita.
A jurisprudência não exige qualquer outro requisito, nem a sentença do processo n.º 485/19.1BEPNF faz qualquer exigência da inexistência de hiato temporal.
Diga-se que se verifica a identidade da situação pelo menos em relação a cinco decisões de tribunais superiores, com ou sem hiato temporal. Veja-se os seguintes acórdãos nos quais está em causa a mesma situação, com hiato temporal:
- Ac. do TCAN de 30-09-2022, proc. 00708/20.4BRPT, onde há um hiato temporal entre o fim do exercício das primitivas funções e a celebração de novo contrato;
- o Ac. do TCAN de 11-02-2022, proc. 00099/21.1BEBRG (cujo recurso de revista foi rejeitado pelo STA em decisão de 09-06-2022, onde se entendeu que embora “a «questão» ainda litigada - saber se a celebração de novo contrato pela aqui autora, que tinha vínculo público e era subscritora da CGA, após interregno deste vínculo, deve ser considerada, para efeitos da norma legal em causa, como «início de funções» ou como mero «retomar de funções» - é susceptível de se repetir noutros casos similares, todavia, mostrando-se decidida, no acórdão recorrido, de forma aceitável, e em sintonia com a jurisprudência já produzida sobre a mesma”);
- o Ac. do TCAN de 08-04-2022, proc. 00307/19.3BEBRG (v. ponto 3 da factualidade provada que se reproduz no referido aresto);
- o Ac. do TCAN de 10-03-2022, proc. 1974/20.0BEBRG [v. pontos f) a j) do probatório do Ac., de onde resulta que houve vários hiatos temporais, de durações diferentes];
-o Ac. do TCAN de 10-03-2022, proc. 877/21.6BEBRG.
Desconhece-se jurisprudência maioritária em sentido inverso, nem tal foi alegado pela Caixa Geral de Aposentações.
Veja-se em especial o Ac. do TCAN de 10-03-2022, proc. 877/21.6BEBRG: Ora, pese embora tenham existido os alguns hiatos temporais entre os vários contratos de trabalho que o autor celebrou com o ME e não tenha obtido colocação no ano lectivo de 2005/2006, pelo que não celebrou nesse ano qualquer contrato de trabalho (cfr. ponto 5 do probatório), o certo é que não ocorreu uma cessação do exercício do seu cargo nos termos previstos no n.º 1 do artigo 22º do EA, o que só sucederia caso o autor não tivesse sido investido noutro cargo a que antes de 01.01.2006 não correspondesse o direito de inscrição. Mas não é isso que se verifica. O que sucede é que antes de 1/01/2006 o autor estava inscrito na CGA e posteriormente a essa data foi investido, através da celebração de sucessivos contratos com o ME, em cargo a que antes daquela data correspondia esse direito de inscrição. Em sentido idêntico pronunciou-se já este TCA Norte nos acórdãos de 28/01/2022, proc. n.º 496/20.4BEPNF e proc. n.º 1100/20.6BEBRG e de 11/02/2022, proc. n.º 99/21.6BEBRG. Cumpre, por fim, referir que, de facto a sentença recorrida não se pronunciou sobre “o caminho a seguir para a reposição integral que considera devida” (cfr. conclusão Z) das alegações de recurso do ME).
Logo verificam-se os requisitos de que depende a extensão de efeitos da sentença proferida no processo principal.
[…]”
Fim da transcrição

Como assim deflui da Sentença recorrida, para efeitos de apreciação da questão decidenda por si identificada [no sentido de saber, em suma, se a situação da Autora em relação à CGA é idêntica àquela que deu origem à decisão proferida no âmbito do Processo principal - n.º 485/19.1BEPNF], o Tribunal a quo fixou a factualidade que entendeu por relevante [por provada, e não provada, e que o foi, essencialmente, a partir do acervo documental constante dos autos e do Processo Administrativo], tendo depois prosseguido pela sua submissão ao direito que julgou ser convocável, e que passava por saber, essencialmente, se a Autora podia requerer que efeitos jurídicos produzidos por uma sentença em cujo processo não era parte, também se pudessem aplicar na relação jurídica material em que é parte, ou seja, se a mesma podia aproveitar os efeitos jurídicos produzidos por uma sentença em cujo processo não foi interveniente, e para esse efeito, saber se se verificavam os pressupostos determinantes da extensão a seu favor dos efeitos apreciados e decididos a que se reporta a Sentença proferida no Processo n.º 485/19.1BEPNF, ao abrigo do disposto no artigo 161.º do CPTA, quanto ao que o Tribunal a quo julgou pela procedência da pretensão da Autora, com amparo em jurisprudência de Tribunais Superiores desta jurisdição administrativa, e por ter julgado verificados todos os requisitos de tanto determinantes.

O assim julgado pelo Tribunal a quo não é merecedor da censura jurídica que lhe vem apontada pela Recorrente, pois que não padece a Sentença recorrida dos sustentados erros de julgamento, a qual vai assim ser confirmada.

Neste conspecto, salientamos que no recente Acórdão deste TCA, datado de 24 de abril de 2025, proferido no Processo n.º 485/19.1BEPNF-P, em que o ora Relator interveio na sua formação em julgamento, como 1.º Adjunto, foi apreciada e decidida questão de fundo em tudo idêntica à que ora está sob recurso, cuja fundamentação aqui damos por enunciada [com as adaptações que se mostrem devidas, designadamente em torno da matéria de facto], a fim ser prosseguida e obtida, em consonância com o disposto no artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil, uma interpretação e aplicação uniformes do direito, como segue:

Início da transcrição
“[…]
É objecto de recurso a sentença que julgou procedente a peticionada extensão de efeitos da sentença proferida no processo n.º 485/19.2BEPNF [leia-se 485/19.1BEPNF] e condenou as Entidades Requeridas a proceder à inscrição da Requerente na CGA desde CGA 01-09-2009.
[…]
Na decisão judicial proferida nos autos à margem referidos, o Tribunal tinha julgado uma situação perfeitamente idêntica àquela que a interessada podia acionar: a sua reinscrição na CGA.
Como se refere na sentença recorrida: A identidade a que se refere o art. 161.º/1 e 2 do CPTA deve ser uma identidade dedutivo-hermenêutica - isto é, os factos num e noutro casos devem permitir a aplicação da mesma subsunção jurídica.
Se se puder substituir os factos da sentença cuja extensão se pretende pelos factos da situação a R. sem que isso levasse a uma alteração do raciocínio jurídico vertido na referida sentença e nos acórdãos confirmantes, então estamos perante uma identidade de factos para os efeitos do art. 161.º/1 e 2 do CPTA.
E continuou: A identidade da situação jurídica cumpre-se na medida em que a argumentação jurídica aqui vertida se aplique aos factos deste caso.
E aplica-se.
(…).
Efectivamente, na sentença proferida nos autos à margem referenciados concluiu-se que o artigo 2º da Lei º 60/2005 de 29/12 visa apenas abranger o pessoal que iniciou efetiva e absolutamente funções após o início do ano de 2006. Daqui resulta que, quando o indivíduo cessa o vínculo laboral e celebra um novo, independentemente do hiato temporal que ocorra entre as duas situações, tal não se considera como “iniciar funções”, nos termos e para os efeitos do artigo 2º da Lei nº 60/2005.
Tal é exatamente o caso da aqui recorrida que estava inscrita na CGA, antes da entrada em vigor da Lei n.º 60/2005.
Este é o requisito que permite dizer que há identidade de situações entre a situação da sentença estendida e a situação da ora recorrida.
Identidade esta que é partilhada nas restantes decisões judiciais que foram convocadas para perfazer o requisito das 05 sentenças transitadas em julgado, conforme bem analisado na sentença sob recurso.
Assim, como bem sintetiza a Recorrida, o esforço argumentativo da CGA carece de acolhimento logo no próprio texto do artigo 161º do CPTA.
Quanto à Lei nº 45/2024, de 27.12, não pode ser convocada nos presentes autos, atendendo a que já foi proferida sentença de 1ª instância não sendo possível, nesta fase processual, conhecer de factos novos, nomeadamente avaliar se ocorreu, ou não, descontinuidade temporal de vínculo que seja relevante para os efeitos do artigo 2º daquele diploma. Com efeito, haveria que analisar se estão, ou não, reunidas as condições das alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 2º, não sendo esta a sede própria.
Os recursos jurisdicionais visam a reapreciação de decisões de tribunais de grau hierárquico inferior, tendo em vista a sua alteração ou anulação por erro de facto ou de direito das mesmas, não sendo admissível no recurso o conhecimento de questões que não foram colocadas nem apreciadas na decisão recorrida e que não são de conhecimento oficioso - Acórdão do STA, de 26/09/2012, proc. 0708/12.
Os recursos são específicos meios de impugnação de decisões judiciais, que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova. Por isso, e em princípio, não se pode neles tratar de questões que não tenham sido apreciadas pela decisão impugnada, salvo questões novas de conhecimento oficioso e não decididas com trânsito em julgado - Acórdão do STA, de 13/11/2013, proc.
01460/13.
Em suma,
O objectivo do recurso jurisdicional é a modificação da decisão impugnada, pelo que, não tendo esta conhecido de determinada questão por não ter sido oportunamente suscitada, não pode a Recorrente vir agora invocá-la perante este tribunal ad quem, porque o objecto do recurso são os vícios da decisão recorrida. Dito de outro modo, em sede de recurso jurisdicional, não pode ser conhecida questão nova, que o recorrente não tenha oportunamente alegado nos seus articulados, designadamente a invocação de um novo vício do ato impugnado, por essa matéria integrar matéria extemporaneamente invocada sobre a qual a sentença impugnada não se pronunciou, nem podia pronunciar-se.
[…]”
Fim da transcrição

Revemo-nos na jurisprudência assim fixada [acessível em www.itij.pt], fundamentação que aqui damos por enunciada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 663.º, n.º 5 do CPC, o que pela desnecessidade de apresentação de fundamentação adicional, julgamos ser bastante para efeitos de dar como improcedente a pretensão recursiva deduzida pela Recorrente CGA, tendo assim, forçosamente, de ser confirmada a Sentença recorrida.

*

E assim, formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Extensão dos efeitos da sentença; Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro; Direito de inscrição na Caixa Geral de Aposentações.

1 – Para efeitos de pedido formulado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 161.º do CPC, é pressuposto que estejam em causa situações que tenham na sua base actos administrativos com idêntico conteúdo ou em que o demandante esteja colocado numa situação jurídica idêntica, e que não exista já sentença transitada em julgado quanto a ele, e bem assim, que tenham sido proferidas 5 sentenças pelos Tribunais Superiores transitadas em julgado no mesmo sentido, e outro tanto, que não tenha sido proferido número superior de sentenças, transitadas em julgado, em sentido contrário, e mais ainda, que tendo sido apresentado requerimento dirigido à mesma entidade administrativa que havia sido demandada no processo judicial em referência, o mesmo haja sido indeferido ou sobre ele não tenha incidido qualquer resposta.
2 – Como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.
3 - O cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que vem a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo 22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].

***

IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Subsecção Administrativa Social da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pela Recorrente Caixa Geral de Aposentações, IP, confirmando assim a Sentença recorrida.

*

Custas a cargo da Recorrente CGA, IP – Cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

**

Notifique.

*

Porto, 09 de maio de 2025.


Paulo Ferreira de Magalhães, relator
Isabel Costa
Rogério Martins