Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 01008/20.5BEPRT |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 06/30/2023 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Ricardo de Oliveira e Sousa |
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Descritores: | COMISSÃO DE VERIFICAÇÃO DO SISTEMA DE INCAPACIDADES; DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO; DISCRICIONARIEDADE TÉCNICA; ERRO GROSSEIRO; |
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Sumário: | I- Não se mostra devidamente fundamentado o ato administrativo que indefere o pedido de reconhecimento de uma situação de invalidez quando o mesmo se baseia em parecer da Comissão de Verificação do Sistema de Incapacidades que não atende ou rebate a diversa documentação clínica junta pela Autora tendente a demonstrar a realidade contrária plasmada no apontado parecer, ou seja, a sua incapacidade para o serviço. II- A invocação e/ou a verificação da existência de uma situação de erro grosseiro está dependente do entendimento da motivação que presidiu à emissão do parecer negativo da Comissão de Verificação do Sistema de Incapacidades. III- Não sendo possível conhecer do iter avaliativo realizado, do motivo ou motivos por que se decidiu assim, naturalmente, não se pode concluir pela existência [ou não] de erro grosseiro que justifique a intervenção judicial.* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Acção Administrativa Comum |
Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: * * I – RELATÓRIO 1. «AA», Autora nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA em que é Réu o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, I.P., vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que julgou improcedente a presente ação. 2. Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) I. Vem o presente Recurso interposto do Saneador-Sentença proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, o qual julgou improcedente a pretensão da ora Recorrente, fundamentando, para o efeito, que as comissões de verificação gozavam de discricionariedade técnica, olvidando que a Recorrente cuidou proceder à junção de diversos elementos de médicos reputados nas respetivas áreas de atuação. II. O mesmo é dizer que não cuidou o Tribunal recorrido de analisar, com o rigor que lhe impunha, os pareceres técnicos constantes das deliberações suprarreferidas, pois que se o tivesse feito, sempre concluiria que os mesmos padecem de erro grosseiro e patente, constituindo a deliberação sub judice um juízo arbitrário — que, ao não respeitar as normas técnicas e as lege artis aplicáveis, extravasou manifestamente os limites da discricionariedade técnica —, bem como vício de violação da lei, por incorreta do regime de proteção na invalidez, assente no DL n.° 187/2007, de 10/05, confluindo na manifesta ilegalidade do ato impugnado, razão pela qual não pode a Recorrente conformar-se com a decisão recorrida, conquanto a mesma, para além de incorrer em manifesta nulidade, padece de flagrante erro de julgamento de facto e de Direito, razão pela qual deverá ser removida da ordem jurídica e substituída por outra que acautele os direitos fundamentais da Recorrente. III. Entende a Recorrente, antes de mais, que a sentença recorrida é nula, porquanto o Tribunal incorreu em contradição no sentenciado, na medida em que considerou como provado que, quer em 20.06.2017, quer em 28.01.2020, a Recorrente poderia recuperar a capacidade de auferir, no desempenho da sua profissão, mais de 50% da retribuição correspondente, dentro dos próximos 3 anos” (cfr. factos provados 4 e 15), concluindo que a comissão de verificação se insere na discricionariedade técnica e que apenas poderá sindicada em caso de erro grosseiro, assumindo que não “ (...) vislumbramos a existência de erro grosseiro ou manifesto” (destaque nosso). IV. O mesmo é dizer que a argumentação que reiteradamente tem vindo a ser veiculada desde 2017 de que a Recorrente pode recuperar nos próximos três anos, não configura, no entendimento do Tribunal recorrido, qualquer erro grosseiro, mesmo que já tenham decorrido mais de cinco anos (!) V. É flagrante a contradição em que incorre o Tribunal recorrido ao admitir que a comissão de verificação de incapacidades goza de discricionariedade técnica e ao não reconhecer que se assiste a um erro grosseiro nos pareceres emitidos, quando dos factos provados resulta clarividente que a capacidade de a Recorrente recuperar dentro de três anos é manifestamente impossível. VI. Neste desiderato, dúvidas não restam de que a sentença é nula nos termos do disposto na alínea c) do n.° 1 do artigo 615.° do CPC, aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, uma vez que os factos considerados provados (a incapacidade de a Recorrente recuperar em três anos) sempre imporiam uma decisão distinta. VII. Significa isto que os fundamentos existentes na decisão recorrida são manifestamente contrários ao sentido decisório que veio a ser vertido na sentença, circunstância geradora de nulidade que, para todos os legais efeitos, expressamente se invoca. VIII. Acresce que, entende a Recorrente que a sentença recorrida é ainda nula, porquanto incorre em omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 615.° do Código de Processo Civil. IX. A Recorrente imputou, ao ato impugnando, o vício de falta de fundamentação, pelo que se impunha ao Tribunal averiguar se o ato, de facto, padecia daquele vício, sendo certo que tal questão não se confunde com a putativa discricionariedade técnica que possa assistir aos técnicos que elaboram as deliberações das Comissões de Verificação. X. Porém, certo é que não logrou o Tribunal pronunciar-se sobre o vício de falta de fundamentação que foi imputado ao ato impugnado... XI. Aliás, sempre se diria que, caso o Tribunal recorrido se tivesse debruçado sobre esta questão, a decisão alcançada seria — como bem se demonstrará infra — diametralmente distinta, uma vez que do ato apenas consta que “Fundamenta esta situação: Com elementos clínicos que justifiquem decisão”, pelo que assoma à evidência que o ato impugnado padece de manifesta falta de fundamentação. XII. Aqui chegados, resulta por demais evidente que se deve concluir que, ao não se pronunciar sobre tal vício, incorreu o Tribunal a quo em omissão de pronúncia, à luz da já citada alínea d) do n.° 1 do artigo 615.° do Código de Processo Civil, tal circunstância configura uma nulidade - a qual se invoca para todos os devidos e legais efeitos. B) DO RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO XIII. A sentença recorrida padece de clamoroso erro na apreciação da matéria de facto porquanto, tendo em conta a prova produzida, nunca o Tribunal a quo poderia ter considerado inexistirem factos não provados com relevância para a decisão da causa. XIV. Segundo o que dispõe o n.° 1 do artigo 640.° do CPC aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, impende sobre o Recorrente da matéria de facto invocar, em concreto, quais os concretos factos que deveriam ser considerados como provados e, bem assim, a prova que sustenta tal aditamento. XV. Em cumprimento das alíneas a) (por omissão), b) e c) do referido artigo 640.° do CPC aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, atendendo à vasta prova documental constante nos autos deveria ter sido considerado provado que: 1. Em 17.04.2017, a Dra. «BB», médica de família, atestou que a Autora “(...) encontra-se incapacitada para a sua actividade laboral, para a realização de tarefas domésticas (como por exemplo, descascar batatas, cebolas, alhos, fazer a cama, etc.) e neste momento para a condução, embora, poderá voltar a conduzir, daqui algum tempo, em curtas distâncias” - cfr. Documento n.° ...8 junto com a Petição Inicial; 2. Em 24.04.2017, a Dra. «CC», médica especialista de psiquiatria, atestou que “A doente [a Autora] apresenta, associada a esta situação de doença muito penosa, no que se refere a dores intensas, uma marcada baixa da sua autoestima, uma crença na sua incapacidade de melhorar, o que se constitui numa sintomatologia Depressiva Major, sendo que tem incapacidades para manter tarefas, alterações do sono, e uma inabalável falta de crença na possibilidade de melhoria. Antecipa com, grande sofrimento a possibilidade de voltar a ser a pessoa ágil e trabalhadora que sempre foi, sendo que esta incapacidade é sentida pela doente de forma catastrófica. É meu parecer que a doente não reúne condições de estabilidade ou de melhoria clínica que lhe permita continuar a trabalhar, e creio-a severamente incapacitada” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 5 junto com a Petição Inicial; 3. Em 26.04.2017, o Dr. «DD» emitiu um Atestado Médico de Incapacidade Multiuso, no qual confirmou que “(...) o utente é portador de deficiência que, nesta data e conforme o quadro seguinte, lhe confere uma incapacidade permanente global de 60%” — cfr. Documento n.° ...9 junto com a Petição Inicial; 4. Em 18.05.2017, o Dr. «EE», de Clínica ..., atestou que a Autora “Tem realizado tratamento de MFR por cervico-dorsalgias incapacitantes que não tem melhorado com respetivo tratamento, mantendo acentuada incapacidade funcional com diminuição de força muscular dos membros superiores (+ a drta) que a incapacitam da realização de algumas tarefas da vida diária, nomeadamente condução automóvel que a tornam incapaz para o desempenho da sua profissão” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 6 junto com a Petição Inicial; 5. Em 28.06.2017, o Professor Dr. «FF», Diretor do Serviço de Neurocirurgia do Centro Hospitalar ..., emitiu parecer no sentido que “De acordo com a solicitação efetuada confirmo o Relatório Clínico de 02.04.2017 e esclareço que a incapacidade para a actividade laboral da Exma. Sr.ª Dª. «AA» é definitiva” — cfr. Documento n.° ...8, pág. 8 junto com a Petição Inicial; 6. Em 11.10.2017, a Autora foi submetida a uma intervenção cirúrgica para remoção de lesão intradural extramedular D2-D3 com monitorização neurofisiológica com PEM e PESS -estudo anatomo-patológico definitivo de Meningioma meningotelial (OMS, grau I) - cfr. Documento n.° ... junto com a Petição Inicial; 7. Por informação clínica datada de 12.10.2017, atestou que “Mais de 1 ano após duas cirurgias e dada a persistência dos sintomas dolorosos e incapacitantes, e pela profissão da doente que implica viagens prolongadas, em minha opinião esta doente deve ser considerada incapaz para a profissão habitual” — cfr. Documento n.° ...8, pág. 9 junto com a Petição Inicial; 8. Em 15.11.2017, o Dr. «GG», médico de medicina física e de reabilitação do Centro Hospitalar ..., atestou que “Da última observação, em novembro de 2017, sem noção de melhoria evidente da mobilidade dos ombros, mantendo parestesias de ambas as mãos e dor de características neuropáticas a nível da região dorsal sobre a cicatriz e com irradiação à região especular direita”- cfr. Documento n.° ...8, pág. 10 junto com a Petição Inicial; 9. Em 23.11.2017, foi decido pela equipa médica que a acompanhava a Autora a reintervenção cirúrgica - cfr. Documento n.° ... junto com a Petição Inicial; 10. Em 15.01.2018, a Professora Dra. «HH», médica especialista em Medina Legal, asseverou que “Atendendo aos aspetos atrás descritos, podemos concluir que relativamente ao caso de «AA», é de considerar o seguinte: a) Incapacidade Parcial Permanente fixável em 89.837%, com deficiência motora; b) Total e definitivamente incapaz para o exercício da sua atividade profissional; c) Dependências permanentes: dependente de medicação e acompanhamento médico e terapêutico (incluindo acompanhamento psiquiátrico e tratamento de fisioterapia regulares”- cfr. Documento n.° ...8, pág. 17 junto com a Petição Inicial; 11. Em 11.02.2018, a Dra. «CC», médica especialista de psiquiatria, “É meu parecer que a doente não reúne condições de melhoria clínica que lhe permita continuar a trabalhar, pois creio-a severamente incapacitada para o trabalho, sendo que não é de excluir uma situação de Stress pós Traumático associado a esta doença física. Segundo a Tabela Nacional de Incapacidades, esta situação coloca-se num valor provável de 0,60” — cfr. Documento n.° ...8, pág. 18 junto com a Petição Inicial; 12. O parecer da Comissão de Recurso do Sistema de Verificação de Incapacidade Permanente, de 14.02.2018, continha uma observação da Dra. «II», a qual afirmava que “Pela médica representante da examinada é dito que as alterações da sensibilidade disestésicas, as limitações funcionais globais referidas pela utente impossibilitam a retoma do posto de trabalho as mesmas associadas à patologia psiquiátrica evidente fazem perdurar e perpetuar toda a sua incapacidade. Não acredito ser de se esperar melhoria do quadro clínico referido neste exame sendo assim não se admitindo capacidade de retomar a capacidade de ganho (50% do seu ordenado) nos próximos 3 anos considerando como tal a Examinada incapaz permanente para a sua atividade profissional habitual” — cfr. Documento n.° ... junto com a Petição Inicial; 13. Em 09.05.2018, o Dr. «DD» elaborou um Atestado Médico de Incapacidade Multiuso, no qual atestou que “(...) o utente [a Autora] é portador de deficiência que, nesta data e conforme o quadro seguinte, lhe confere uma incapacidade permanente global de: 83%” - cfr. Documento n.° ...0 junto com a Petição Inicial; 14. Em 29.05.2018, o Dr. «DD» elaborou o documento denominado “Atestado Médico”, do Ministério da Saúde, Direção-Geral da Saúde, no qual atestou que a Autora “Está apto para a condução de veículos da seguinte categoria do Grupo 1: B. Com as seguintes restrições e/ou adaptações: 137 Avaliação médica antecipada (29/05/2023); 42.05 Dispositivo de visualização para o ângulo morte; 62 Limitada a deslocações num raio de ... km a contar da residência do titular ou apenas na cidade ou região da sua residência (50); 64 Limitada a deslocações a velocidade inferior a ...Km/h (100)” - cfr. Documento n.° ...1 junto com a Petição Inicial; 15. Em 22.10.2018, a Dra. «JJ» e de Reabilitação do Centro Hospitalar ..., asseverou que a Autora apresenta “dores cervicodorsais de predomínio direito que aliviam parcialmente com palexia, VAS atual 7; vas max 8. A dor não alivia com repouso é em ardência e por vezes em facada, sem território definido [sic]. Incapacidade funcional nas AV instrumentais, não conduz. Portanto: dores miofasciais da cintura escapular bilateral, pior à direita e incapacidade funcional para condução (por ser uma atividade multitarefas” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 20 junto com a Petição Inicial; 16. Em 28.11.2018, o Dr. «KK», Médico do Centro Hospitalar ..., perante o agravamento do quadro clínico da Autora requereu, ao Réu, a avaliação do agravamento da incapacidade desta, sustentada no seu relatório e nos relatórios de outros médicos do Hospital, Prof. Doutor «FF» e Dra. «LL» - cfr. Documento n.° ...3 junto com a Petição Inicial; 17. Em 09.01.2019, o Professor Dr. «FF», Diretor do Serviço de Neurocirurgia do Centro Hospitalar ..., atestou que “Neste contexto fico pois convencido da boa correlação clínico-imagiológica ou seja que as alterações evidenciadas em RMN são capazes de provocar a pioria clínica referida” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 26 junto com a Petição Inicial; 18. Em 23.01.2019, a Dra. «MM», médica da especialidade de dor crónica do Centro Hospitalar ..., atestou que “Por agravamento das queixas álgicas tem sido efetuados ajustes terapêuticos, encontrando-se neste momento medicada com Palexia 150 mg de 12-12 e lyrica 75 mg de 12-12h e Ivarez rapid em SOS de 6-6h” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 23 junto com a Petição Inicial; 19. Por comunicação eletrónica datada de 14.03.2019, a Companhia de Seguros [SCom01...], S.A. comunicou à Autora que “Submetida a mesma a reanálise dos nossos Serviços Clínicos, informamos que a posição da [SCom01...] foi revista e o sinistro foi aceite. Assim, e tal como estabelece o artigo 2.4 das condições contratuais, consideramos a data de reconhecimento da invalidez como sendo 01.02.2019, pelo que solicitámos ao Banco 1... informação do capital em dívida a essa data”, reconhecendo, deste modo, que a Autora tinha uma incapacidade de 77% permanente e definitiva - cfr. Documento n.° ...2 junto com a Petição Inicial; 20. A Autora foi convocada para comparecer no dia 27.03.2019, pelas 14:30 horas no Centro Distrital ... - cfr. Documento n.° ...4 junto com a Petição Inicial; 21. Em 03.05.2019, a Comissão de Verificação dos Sistema de Verificação de Incapacidade Permanente entendeu que “Para completar o nosso parecer, somos da opinião que a doente deverá ter parecer de Neurologia” - cfr. Documento n.° ...6 junto com a Petição Inicial; 22. Em 24.05.209, a Médica Neurologista, Dra. «NN», sem ter analisado a Autora, concluiu que “Tratando-se de uma profissão de Delegada de Informação Médica em que apesar das queixas álgicas não são objetivamente limitações funcionais de relevo durante os procedimento de Peritagem quer nos relatório Clínicos disponibilizados, penso que apenas haverá limitação para o exercício da sua profissão se a utente não puder conduzir ou se só o puder fazer por curtas distâncias (devendo haver essa evidência na respetiva carta de condução com as restrições aplicáveis) ou, se não houver estabilidade psiquiátrica ou cognitivas para o exercício da sua profissão” - cfr. Documento n.° ...7 junto com a Petição Inicial; 23. Em 26.07.2019, a Autora requereu exame da Comissão de Recurso, tendo indicado como seu representante o Dr. «OO» - cfr. Documento n.° ...0 junto com a Petição Inicial; 24. Por deliberação de 23.08.2019, a Comissão de Recurso considerou a Autora como não incapaz, tendo o Dr. «OO» manuscrito uma observação, na qual se opunha a tal deliberação, na medida em que atestava que a Autora tinha uma incapacidade definitiva e irreversível - cfr. Documento n.° ...8 junto com a Petição Inicial; 25. Em 28.10.2019, o Dr. «PP», Médico de Medicina de Trabalho elaborou o documento denominado '“Relatório Medico - Agravamento de Situação Médica”, no qual afirma que “Convém no plano médico do trabalho começar por equacionar o perfil de funções enquanto delegada de informação médica. Do ponto de vista cognitivo, carece de estudo e atualização técnica e científica continuadas, de forma a cumprir exigência da entidade patronal e dar resposta aos médicos com que trabalha, mantendo índices de atenção, concentração e observação permanentemente elevados. Há ainda que manter participação em eventos externos, locais, regionais e nacionais, bem como em reuniões internas da empresa, sob clima de elevada competitividade e agressividade comercial e comportamental. Há necessidade operacional de condução automóvel diariamente, em função das áreas geográficas atribuídas, com montantes mensais de quilometragens muito elevadas e ergonómica e posturalmente incómodas e lesivas musculo-esqueleticamente. Por fim, sob a perspectiva de avaliação e progressão profissional os modelos utilizados pelas empresas são fortemente impactante na vertente psicológica e psicossocial, implicando uma condição emocional muito boa”, acrescentando que “Do contexto clínico elencado resultou, em termos civis, a atribuição de atestado multiuso, o qual por consequência implicou a restrição por deficiência cumulativa para a condução automóvel de veículos ligeiros, assim fortemente condicionante da sua profissão. Finalmente, julgamos que a avaliação em causa não pode deixar de tomar em consideração, desde logo, o Parecer de Neurocirurgia, central e estrutural no processo de incapacidade para a sua profissão (...) Assim e em conformidade com a expressão da interessada, solicitamos que seja considerada a situação de agravamento clínico que será ainda consubstanciado em outros relatórios a entregar até 5 dias antes da Junta que lhe vier a ser marcada” — cfr. Documento n.° ...8, pág. 28 junto com a Petição Inicial; 26. Em 12.11.2019, o Dr. «PP», Médico de Medicina de Trabalho, perante o agravamento do quadro clínico da Autora requereu, ao Réu, a avaliação do agravamento da incapacidade desta, sustentada no seu relatório e nos relatórios de outros médicos do Hospital - cfr. Documento n.° ...4 junto com a Petição Inicial; XVI. Os factos vindos de referir foram devidamente invocados na Petição Inicial, designadamente, nos seus artigos 13.°, 14.°, 16.°, 24.°, 27.°, 39.°, 49.°, 52.°, 55.°, 56.°., 82.° a 85.°, 91.° e 98.° a 100.°. XVII. Acresce que, como é bom de ver, todos os factos invocados (e que, por motivos que se desconhece, foram ignorados) resultam evidentes da prova documental junta aos autos, pelo que, sendo patente o clamoroso erro de julgamento da matéria de facto em que incorreu o Tribunal a quo apenas se poderá concluir que aquele não cuidou (pelo menos, com a exatidão e rigor que se lhe impunha) analisar toda a prova junta aos autos. XVIII. Tais factos sempre se revelavam indispensáveis para a boa decisão da causa, na medida em que se é certo que as deliberações da Comissões de Verificação de Incapacidade Permanente gozam de uma certa margem discricionária, não menos certo é que os seus pareceres são judicialmente sindicáveis quando se verifique um erro grosseiro. XIX. Os pareceres que a Recorrente juntou com a sua Petição Inicial foram elaborados por médicos de renome nas respetivas especialidades e imparciais, que acompanharam o agravamento clínico daquela! XX. Ao invés, conforme se avançou no artigo 27.° da Petição Inicial, a Dra. «QQ» '“médica perita ao serviço do Réu” — como invoca o Tribunal recorrido no facto provado 4 - é especialista em Estomatologia, especialidade médica que cura de problemas relacionados com a boca, pelo que, a putativa discricionariedade técnica que pudesse existir, in casu, sempre teria de ser comparada com os pareceres técnicos que foram emitidos. XXI. Ao não o fazer, o Tribunal recorrido mais não fez do que passar um atestado de incompetência a todos aqueles médicos, no qual se insere (pasme-se!) o atual Ministro da Saúde, Dr. «OO», fazendo, inclusivamente, tábua rasa dos atestados médicos de incapacidade multiusos, os quais, como bem se sabe, têm o cunho do Ministério da Saúde. XXII. Neste sentido, assoma à evidência que tais factos, além de devidamente comprovados pela prova documental junta aos autos - e não impugnada pelo Recorrido —, eram fundamentais para a boa decisão da causa, sendo certo que se o Tribunal não tivesse convicto sobre o estado clínico da Recorrente, sempre deveria ter procedido à produção de prova testemunhal. XXIII. Ao invés, concluiu que “Considerando que os factos que relevam para a decisão da causa assentam no processo administrativo junto aos autos, indefere-se, por desnecessidade, a produção da prova testemunhal contudo, estranhamente, como o próprio Tribunal recorrido afirma, este apenas atendeu ao processo administrativo, o qual nem sequer contém todas as deliberações das Comissões de Verificação de Incapacidade Permanentes realizados... XXIV. Tendo em conta tudo quanto se expôs, e verificados que estão os pressupostos do n.° 1 do artigo 640.° do CPC aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, outra não poderá ser a conclusão senão a que, tendo em conta a prova produzida, o Tribunal a quo deveria ter julgado provados os factos supra identificados. C) DO ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO XXV. Conforme se avançou, o Tribunal recorrido julgou improcedente a ação por entender que os presentes pareceres se inserem na discricionariedade técnica da Administração e, nessa medida, apenas poderão ser sindicáveis em caso de erro grosseiro ou manifesto. XXVI. Com o fito de sustentar os sucessivos indeferimentos dos pedidos de pensão de invalidez da Recorrente, invocaram os supostos técnicos especializados que aquela “pode recuperar a capacidade de auferir, no desempenho da sua profissão, mais de 50% da retribuição correspondente, dentro dos próximos 3 anos” e, note-se, que tal “fundamento” constava já do exame de verificação de incapacidade de 20.06.2017, pelo que, volvidos mais de cinco anos desde o primeiro exame realizado à Recorrente, continua a Recorrida a assumir que aquela irá recuperar no prazo de três anos. XXVII. O erro grosseiro em que incorre o ato impugnado - e que o Tribunal a quo não atingiu - prende-se precisamente com a circunstância de já ter decorrido o prazo estabelecido no primeiro exame realizado! XXVIII. Aliás, no tempo decorrido desde o primeiro exame realizado, não só a Recorrente não apresentou qualquer melhoria do seu quadro clínico, como são abundantes os relatórios médicos especializados na matéria que atestam exatamente o oposto e, assim, é flagrante o erro em que incorre o ato impugnado - e, bem assim, o Tribunal a quo - em admitir, ao arrepio dos pareceres técnicos dos médicos que acompanham a Recorrente, que aquela poderá melhorar no prazo de três anos, XXIX. Era precisamente esta a análise que se impunha ao Tribunal recorrido, o qual, socorrendo-se da conhecida discricionariedade técnica, optou por não analisar, com o rigor e exatidão que se lhe impunha, a legalidade do ato administrativo em confronto com todos os elementos carreados para o processo, e ao fazê-lo, o Tribunal incorreu em manifesto erro de julgamento de Direito, na medida em que não cuidou de analisar o ato impugnado e, bem assim, constatar o notório e flagrante erro grosseiro em que o mesmo incorre. XXX. Mais invoca o Tribunal recorrido que os relatórios médicos apresentados apenas podem servir como “auxilio” da comissão de verificação, com a presente conclusão, o Tribunal a quo denota o manifesto erro de julgamento em que incorre, uma vez que se é certo que a análise dos pareceres médicos especialistas não tem de ser reproduzida nas deliberações das comissões de verificação da incapacidade, não menos certo é que aqueles não podem ser ignorados in totum, uma vez que representam pronúncias de técnicos especializados nas respetivas áreas e que acompanham a Recorrente e, nessa medida, são melhores conhecedores do seu estado clínico e das suas incapacidades. XXXI. Olvida, no mesmo sentido, o Tribunal recorrido de atender a que própria Comissão de Verificação do Sistema de Verificação de Incapacidade Permanente da Recorrente sentiu a necessidade, em 03.05.2019, de solicitar um parecer de neurologia, o qual atestou (sem ter visto a Recorrente) que se aquela não pudesse conduzir ou tivesse limitações, deveria ser reconhecida a incapacidade, sendo certo que a Recorrente possui um atestado médico que atesta estas limitações, as quais se encontram devidamente sinalizadas na sua Carta de Condução. XXXII. O mesmo é dizer que, também por esta via, é notório o erro grosseiro em que incorre o ato impugnado, o qual é mantido pela decisão recorrida. XXXIII. Aliás, sempre será de destacar que os sucessivos erros em que incorrem os “peritos” do Recorrido chegam ao ponto de afirmar que a Recorrente apresentou uma demissão, quando, na realidade dos factos, a Recorrente não teve o seu contrato de trabalho a termo certo renovado, em virtude da incapacidade de que padecia (e continua a padecer, apesar do Recorrido não aceitar), uma vez que, enquanto Delegada de Informação Médica, não reunia as condições físicas e psíquicas necessárias ao exercício da sua profissão. XXXIV. Como sabe o Recorrido, a Recorrente aufere uma pensão de inclusão social, a qual adveio do reconhecimento, através do Atestado Médico de Incapacidade Multiuso de 83%, da incapacidade daquela. XXXV. Neste desiderato, o Recorrido ao atribuir a pensão de inclusão social à Recorrente atestou que aquela padecia de uma incapacidade igual ou superior a 60%, pelo que, não se concebe que, posteriormente, recuse a atribuição da pensão por invalidez. XXXVI. Assim, como é bom de ver, também por esta via, é manifesto o erro de julgamento de Direito em que incorre a decisão recorrida, a qual não cuidou de verificar se, de facto, existia um erro grosseiro no ato impugnado, o que significa que, in casu e em bom rigor, o Tribunal a quo mais não fez do que se demitir do seu poder-dever de julgar, violando, dessa forma, o direito constitucionalmente consagrado à tutela jurisdicional efetiva da Recorrente, razão pela qual deverá a decisão recorrida ser removida da ordem jurídica e substituída por outra que acautele os direitos da Recorrente. XXXVII. Assume o Tribunal recorrido que as Deliberações da Comissão de Verificação estão cobertos pela discricionariedade técnica e, nessa medida, só são sindicados judicialmente em caso de erro grosseiro. XXXVIII. Todavia, entende a jurisprudência que a insindicabilidade dos pareceres técnicos apenas se verifica quanto ao concreto teor técnico constante naqueles, sem que tal justifique a impossibilidade de sindicar tais pareceres com fundamentos na sua ilegalidade, em concreto, não se impõe aos julgadores que se substituam aos técnicos na sua tarefa - inclusive por desconhecimento técnico para o efeito -, antes exige-se que analise a legalidade dos atos por aqueles emitidos. XXXIX. Na situação em apreço, deliberaram os médicos ao serviço do Recorrido que a Recorrente poderia recuperar, com fundamento em “elementos clínicos que justifiquem decisão”, o que bem denota a falta de fundamentação de que padece o ato impugnado. XL. Ora, do citado trecho resulta notório a flagrante falta de fundamentação em que incorreu o ato impugnado, uma vez que a Recorrente (nem nenhum cidadão comum) consegue descortinar quais os elementos clínicos que fundamentam aquela decisão - isto porque, em boa verdade, parecem não existir... XLI. Aliás, os elementos clínicos que a Recorrente sempre cuidou juntar nos pedidos de pensão de invalidez - e, inclusive, nos presentes autos - indicam precisamente o contrário, ou seja de que a situação clínica da Recorrente não é passível de melhor, mas tão-só de piorar e, desde modo, não consegue a Recorrente descortinar, em concreto, quais as razões que sustentam a presente decisão. XLII. E, note-se, que tal frustração - por não conseguir perceber o porquê de não ter direito a pensão por invalidez - perdura desde 2017 (há mais de cinco anos). XLIII. isto porque todas as deliberações da Comissão indicam que existem “elementos” que justificam a decisão, que “há critérios clínicos que justificam o parecer/deliberação” ou que “não estão esgotados os recursos terapêuticos”, contudo, em cinco anos, nenhum técnico do Recorrido cuidou de esclarecer, em concreto, quais os elementos que constam do processo que permitem concluir que a Recorrente pode recuperar em três anos (!) ou quais os recursos terapêuticos a que pode recorrer, pois que nenhum outro médico que acompanha (ou acompanhou) a Recorrente “descobriu” os “recursos terapêuticos” ou concluiu que a mesma poderia recuperar, ao invés, todos os médicos que acompanham a Recorrente indicam (e já o atestaram expressamente) que não existe possibilidade de aquela recuperar, sendo provável a degradação do seu estado clínico... XLIV. Atente-se que o dever de fundamentação se impunha com especial rigor na situação sub judice, na medida em que, reiteradamente, optaram os “peritos” do Recorrido por negligenciar os pareceres médicos de especialistas de renome constates no processo e, bem assim, os Atestados Médicos de Incapacidade Multiuso que atestavam que a Recorrente padecia, inicialmente, de uma incapacidade de 60% e, posteriormente, de 83%... XLV. Mas grave não fosse a falta de fundamentação em que incorre o ato impugnado, é a Recorrente confrontada com uma decisão que nem sequer cuida de analisar tal questão! XLVI. Limitando-se a remeter, sem mais, para famosa discricionariedade técnica, sem, contudo, cuidar de analisar os vícios que, em concreto, foram imputados ao ato administrativo, assim, dúvidas não restam de que o Tribunal recorrido incorreu em manifesto erro de julgamento de Direito ao não considerar verificado o vício de falta de fundamentação do ato impugnado. XLVII .Aqui chegados, e face a tudo quanto se expôs, assoma à evidência de que mal andou o Tribunal a quo a julgar improcedente a presente ação, devendo, como tal, o presente recurso ser julgado procedente (…)”. * 3. Notificado que foi para o efeito, o Recorrido Instituto de Segurança Social, não contra-alegou. * 4. O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida, tendo ainda sustentando a inexistência de qualquer nulidade de sentença. * 5. O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior silenciou quanto ao propósito a que se alude no nº.1 do artigo 146º do C.P.T.A. * 6. Com dispensa de vistos prévios, cumpre apreciar e decidir. * * * II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR 7. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA. 8. Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir são as seguintes: (i) nulidade de sentença, por (i.1) omissão de pronúncia e (i.2) oposição entre os fundamentos e a decisão; (ii) erro de julgamento de facto e (iii) erro de julgamento de direito. 9. É na resolução de tais questões que se consubstancia a matéria que a este Tribunal Superior cumpre solucionar. * * III- DO MÉRITO DA INSTÂNCIA DE RECURSO * 10. As questões decidendas, como se colhe inequivocamente do ponto II) do presente aresto, traduzem-se em saber se saber se a sentença recorrida enferma de (i) nulidade[s] da sentença, por (i.1) omissão de pronúncia e (i.2) oposição entre os fundamentos e a decisão; (ii) de erro[s] de julgamento de facto; (iii) e ainda de erro de julgamento de direito. 11. Vejamos estas questões especificadamente. 12. Assim, e quanto ao primeiro grupo de razões, refira-se que a nulidade de sentença, por omissão de pronúncia [art. 615º nº 1 d) do CPC], é um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronuncia sobre questões com relevância para a decisão de mérito, e não todos e cada um dos argumentos/fundamentos apresentados pelas partes, e excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. 13. Do conspecto da petição inicial, extrai-se que a Autora, aqui Recorrente, por intermédio da presente ação, visa (i) a anulação do ato administrativo que lhe indeferiu a atribuição de pensão de invalidez; (ii) a condenação do Réu a proferir o ato administrativo que reconheça a sua situação de invalidez, e ainda (iii) a condenação do mesmo no pagamento de danos em valor nunca inferior a 25.000€. 14. Funda tais pretensões jurisdicionais na (i) invocação de que o ato impugnado enferma de diversas causas de invalidade, que elencou [(i.1) falta de fundamentação; (i.2) violação do art. 17º nº 1 do D.L. nº. 187/2007, e (i.3) ofensa dos princípios da legalidade e da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos] e ainda no (ii) direito de indemnização emergente da prática de ato ilícito por parte da Administração, traduzido na violação dos artigos 63°e nº 3 e 64º, ambos da Constituição da República Portuguesa, nos quais está previsto, respectivamente, o direito à protecção dos cidadãos na invalidez e o direito à saúde, bem como o artigo 26º da CRP, que prevê o direito ao bom nome e reputação; à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção contra quaisquer formas de discriminação. 15. Atendendo ao objeto da lide, definido pela causa de pedir e pelos pedidos formulados, estamos em presença de uma ação administrativa especial de condenação à prática de acto devido no âmbito da qual a Autora cumulou um pedido de declaração de ilegalidade de acto administrativo e um pedido indemnizatório. 16. Neste tipo de ações, o objeto do processo não é o acto de indeferimento, mas a pretensão material que o Autor pretende fazer valer na ação, sendo, por isso, irrelevantes os vícios imputados ao acto de indeferimento, pelo que ao Tribunal não compete apreciá-los com vista a eventual anulação ou declaração de nulidade do acto, sendo que a eliminação desses atos da ordem jurídica decorre da pronúncia condenatória de prática do acto devido. 17. Assim, na ação administrativa especial de condenação à prática de acto devido, o Tribunal deve pronunciar-se sobre a pretensão material formulada pelo Autor, rejeitando-se, neste tipo de ações, a prolação de sentenças de anulação ou declaração de nulidade de atos administrativos. 18. De facto, o acto administrativo de indeferimento não é o móbil dos presentes autos, mas antes o reconhecimento da situação de invalidez da Autora e a indemnização emergente da prática de ato ilícito por parte da Administração. 19. Este também foi o entendimento do Tribunal a quo, pois que, a propósito da caraterização do objecto do litigio, decidiu que “(…) está em causa a cumulação de uma pretensão anulatória, com uma pretensão condenatória, devendo dar-se primazia ao pedido condenatório, ou seja, à pretensão material da Autora, de harmonia com o preceituado no artigo 66.°, n.° 2, do CPTA. Assim, a questão a decidir nos presentes autos consiste em saber se o Réu deve ser condenado a praticar ato administrativo que defira a pretensão da Autora, atribuindo-lhe pensão de invalidez. Após tal análise, deverá verificar-se se a A. tem direito ao pagamento dos danos que peticiona (…)”. 20. Esta tomada de posição permite concluir que o Tribunal a quo emanou juízo decisório no sentido da irrelevância das causas de invalidade assacadas ao ato impugnado, tendo concluído pela sua irrelevância ante a pretensão material da Autora. 21. Ora, a pronúncia em questão, nos termos em que se mostra supra expressada nos parágrafos antecedentes, revela-nos que o Tribunal a quo, efetivamente, tomou posição sobre a questão visada, tendo emitido um juízo de não apreciação dos vícios assacados ao ato administrativo. 22. Assim, na exata medida em que o Tribunal se debruçou e decidiu sobre as questões que se mostram suscitadas pelo Recorrente no presente recurso, imediatamente se conclui que Tribunal não omitiu o conhecimento de questão que deva conhecer. 23. Poder-se-á equacionar da certeza ou [do erro] do julgamento assim efetuado. 24. Mas tal interrogação não se insere no vício de nulidade sentença, por omissão de pronúncia, antes se incluindo no âmbito de eventual erro de julgamento. 25. De facto, saber se o Tribunal a quo decidiu com acerto, ou se pelo contrário fez incorreta interpretação e/ou aplicação da lei, são questões que já não contendem com a nulidade da sentença, mas sim com o erro de julgamento - este, traduzindo uma apreciação da questão em desconformidade com a lei [Vd. Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, ob. cit., p. 686, sublinham que não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário]. 26. Por conseguinte, a sentença recorrida não padece da assacada nulidade por omissão de pronúncia, a qual improcede. 27. Idêntica asserção é atingível no tocante à invocada oposição entre fundamentos e decisão. 28. De facto, esta nulidade de sentença só poderá ser atendida “(…) quando há um vício real na lógico-jurídica que presidiu à sua construção, de tal modo que os fundamentos invocados apontam logicamente num determinado sentido, e a decisão tomada vai noutro sentido, oposto, ou pelo menos diverso (…)” [vide o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 30.10.2014, proferido no processo n.º ...3]. 29. Pois bem, analisada a estrutura global da decisão judicial censurada, facilmente se apreende que a respetiva conclusão decisória está logicamente encadeada com a respetiva motivação fáctica. 30. De facto, o Tribunal a quo considerou que o tecido fáctico coligido nos autos, em particular, o vertidos nos pontos 4) e 15), não era em molde em evidenciar a existência de um grave desajustamento da decisão administrativa perante a situação concreta, em termos de merecer do ordenamento jurídico uma censura particular mesmo em áreas de atuação não vinculadas. 31. E a decisão seguiu esse mesmo sentido. 32. Nesta esteira, é de manifesta evidência que não pode apontar-se à decisão judicial recorrida a qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão determinante da nulidade da sentença recorrida, que assim improcede. 33. O que nos transporta para a segunda questão suscitada, e que se prende com o eventual erro de julgamento de facto da sentença recorrida. 34. A razão determinante da inclusão de um facto na matéria assente prende-se com a sua relevância para a decisão a proferir segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, e não com a circunstância de terem sido alegados e não terem sido impugnados. 35. Ora, a alegação convocada pela Recorrente no domínio em análise integra factualidade relevante para a boa decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis de direito da questão de direito, pelo que, à míngua de qualquer infirmação da mesma pelos meios processualmente admissíveis, deve concluir-se no sentido da sua verificação, e, qua tale, pela atendibilidade da alteração pretendida. 36. Por conseguinte, em consonância com a lógica que se vem supra de expor, vinga nos termos e com o alcance que se vem de explicitar o segundo fundamento do recurso em análise. 37. Ponderado o acabado de julgar e o que demais se mostra fixado na decisão judicial recorrida temos, então, como assente o seguinte quadro factual: “(…) 1. A Autora exerceu a profissão de delegada de informação médica durante cerca de 24 anos. 2. Em 2016 a A. foi diagnosticada com meningioma dorsal. 3. Em 22/05/2017 a A. requereu, nos serviços do Réu, o direito à pensão de invalidez. 4. Em 20/06/2017, em sede de exame para efeitos de verificação de incapacidade, a médica perita ao serviço do Réu considerou que a Autora “pode recuperar a capacidade de auferir no desempenho da sua profissão mais de 50% da retribuição correspondente, dentro dos próximos 3 anos” – cf. documento n.º ... junto com a petição inicial. 5. Em 27/06/2017 a Comissão de verificação de Incapacidades concluiu que a A. se encontrava com capacidade para o trabalho podendo auferir na sua profissão mais de um terço da remuneração correspondente ao seu exercício normal – cf. documentos n.º ... e ... junto com a petição inicial. 6. Em 14/02/2018, a Comissão de Recurso entendeu não se dever considerar a situação de invalidez por a A. poder recuperar a capacidade de auferir no desempenho da sua profissão mais de 50% da retribuição correspondente, dentro dos próximos 3 anos – cf. documento n.º ... junto com a petição inicial. 7. Em 19/02/2018 a A. apresentou novo requerimento de pensão de invalidez. 8. Em 11/4/2018, a Comissão de Verificação não considerou a situação de invalidez, concluindo que a A. pode recuperar a capacidade de auferir no desempenho da sua profissão mais de 50% da retribuição correspondente, dentro dos próximos três anos, fundamentando esta situação “nos elementos clínico-periciais observados” – cf. documentos n.ºs ...1 e ...2 juntos com a petição inicial. 9. Em 10/01/2019 a A. apresentou novo requerimento de pensão de invalidez – cf. fls. 38 do processo administrativo. 10. A CVIP realizada em 21/06/2019 conclui não se encontrar a A. nas condições previstas nos artigos 2.º, 14.º e 15.º do Dec. Lei n.º 187/2007 de 10 de maio por não estar incapaz por invalidez relativa/absoluta – cf. fls. 31 do processo administrativo. 11. A A. requereu exame da Comissão de Recurso em 31/07/2019, ao qual foi submetida em 23/08/2019, que a considerou não incapaz, propondo-se o indeferimento da prestação – cf. fls. 25 do processo administrativo. 12. A A. apresentou reclamação da decisão da Comissão de Recurso em 27/09/2019, a qual foi indeferida em 22/04/2020 com os fundamentos da CVIP de recurso – cf. fls. 13 a 15 do processo administrativo. 13. Em 13/11/2019 a A. apresentou novo requerimento de pensão de invalidez – cf. fls. 4 a 6 do processo administrativo. 14. Em 18/12/2019 foi emitida relativamente à Autora a seguinte declaração médica por profissional de saúde da Unidade de Saúde ...: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] 15. A Comissão de Verificação do Sistema de Verificação de Incapacidade Permanente emitiu o seguinte parecer/deliberação em 28/01/2020 - cf. documento n.º ...7 junto com a petição inicial e fls. 7 do processo administrativo: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] 16. A CVIP referida no n.º anterior concluiu não se encontrar a A. nas condições previstas nos artigos 2.º, 14.º e 15.º do Dec. Lei n.º 187/2007 de 10 de maio por não estar incapaz por invalidez relativa – cf. fls. 3 do processo administrativo. 17. Por ofício de 03/03/2020 do Instituto da Segurança Social, a A. tomou conhecimento de que a Comissão de Verificação de Incapacidades Permanentes considerou que a mesma não reunia as condições de incapacidade permanente determinantes da atribuição de pensão de invalidez relativa, exigidas no artigo 14.º do D.L. 187/2007, de 10/05 e que na falta de resposta a tal ofício o seu requerimento de pensão de invalidez seria indeferido – cf. documento n.º ... junto com a petição inicial e fls. 2 do processo administrativo. 18. A A. requereu exame por Comissão de Recurso – fls. 1 do processo administrativo. 19. A Comissão de Recurso deliberou em 31/07/2020 o seguinte – cf. fls. 336 e seguintes do SITAF. [Imagem que aqui se dá por reproduzida] 20. A deliberação da Comissão de Recurso referida no n.° anterior fundamentou-se no seguinte parecer - cf. fls. 336 e seguintes do SITAF. [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] 21. Em 17.04.2017, a Dra. «BB», médica de família, atestou que a Autora “(...) encontra-se incapacitada para a sua actividade laboral, para a realização de tarefas domésticas (como por exemplo, descascar batatas, cebolas, alhos, fazer a cama, etc.) e neste momento para a condução, embora, poderá voltar a conduzir, daqui algum tempo, em curtas distâncias” - cfr. Documento n.° ...8 junto com a Petição Inicial; 22. Em 24.04.2017, a Dra. «CC», médica especialista de psiquiatria, atestou que “A doente [a Autora] apresenta, associada a esta situação de doença muito penosa, no que se refere a dores intensas, uma marcada baixa da sua autoestima, uma crença na sua incapacidade de melhorar, o que se constitui numa sintomatologia Depressiva Major, sendo que tem incapacidades para manter tarefas, alterações do sono, e uma inabalável falta de crença na possibilidade de melhoria. Antecipa com, grande sofrimento a possibilidade de voltar a ser a pessoa ágil e trabalhadora que sempre foi, sendo que esta incapacidade é sentida pela doente de forma catastrófica. É meu parecer que a doente não reúne condições de estabilidade ou de melhoria clínica que lhe permita continuar a trabalhar, e creio-a severamente incapacitada” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 5 junto com a Petição Inicial; 23. Em 26.04.2017, o Dr. «DD» emitiu um Atestado Médico de Incapacidade Multiuso, no qual confirmou que “(...) o utente é portador de deficiência que, nesta data e conforme o quadro seguinte, lhe confere uma incapacidade permanente global de 60%” - cfr. Documento n.° ...9 junto com a Petição Inicial; 24. Em 18.05.2017, o Dr. «EE», de Clínica ..., atestou que a Autora “Tem realizado tratamento de MFR por cervico-dorsalgias incapacitantes que não tem melhorado com respetivo tratamento, mantendo acentuada incapacidade funcional com diminuição de força muscular dos membros superiores (+ a drta) que a incapacitam da realização de algumas tarefas da vida diária, nomeadamente condução automóvel que a tornam incapaz para o desempenho da sua profissão” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 6 junto com a Petição Inicial; 25. Em 28.06.2017, o Professor Dr. «FF», Diretor do Serviço de Neurocirurgia do Centro Hospitalar ..., emitiu parecer no sentido que “De acordo com a solicitação efetuada confirmo o Relatório Clínico de 02.04.2017 e esclareço que a incapacidade para a actividade laboral da Exma. Sr.ª D.ª «AA» é definitiva” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 8 junto com a Petição Inicial; 26. Em 11.10.2017, a Autora foi submetida a uma intervenção cirúrgica para remoção de lesão intradural extramedular D2-D3 com monitorização neurofisiológica com PEM e PESS - estudo anatomo-patológico definitivo de Meningioma meningotelial (OMS, grau I) - cfr. Documento n.° ... junto com a Petição Inicial; 27. Por informação clínica datada de 12.10.2017, atestou que “Mais de 1 ano após duas cirurgias e dada a persistência dos sintomas dolorosos e incapacitantes, e pela profissão da doente que implica viagens prolongadas, em minha opinião esta doente deve ser considerada incapaz para a profissão habitual” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 9 junto com a Petição Inicial; 28. Em 15.11.2017, o Dr. «GG», médico de medicina física e de reabilitação do Centro Hospitalar ..., atestou que “Da última observação, em novembro de 2017, sem noção de melhoria evidente da mobilidade dos ombros, mantendo parestesias de ambas as mãos e dor de características neuropáticas a nível da região dorsal sobre a cicatriz e com irradiação à região especular direita”- cfr. Documento n.° ...8, pág. 10 junto com a Petição Inicial; 29. Em 23.11.2017, foi decidido pela equipa médica que a acompanhava a Autora a reintervenção cirúrgica - cfr. Documento n.° ... junto com a Petição Inicial; 30. Em 15.01.2018, a Professora Dra. «HH», médica especialista em Medina Legal, asseverou que “Atendendo aos aspetos atrás descritos, podemos concluir que relativamente ao caso de «AA», é de considerar o seguinte: a) Incapacidade Parcial Permanente fixável em 89.837%, com deficiência motora; b) Total e definitivamente incapaz para o exercício da sua atividade profissional; c) Dependências permanentes: dependente de medicação e acompanhamento médico e terapêutico (incluindo acompanhamento psiquiátrico e tratamento de fisioterapia regulares”- cfr. Documento n.° ...8, pág. 17 junto com a Petição Inicial; 31. Em 11.02.2018, a Dra. «CC», médica especialista de psiquiatria, “É meu parecer que a doente não reúne condições de melhoria clínica que lhe permita continuar a trabalhar, pois creio-a severamente incapacitada para o trabalho, sendo que não é de excluir uma situação de Stress pós Traumático associado a esta doença física. Segundo a Tabela Nacional de Incapacidades, esta situação coloca-se num valor provável de 0,60” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 18 junto com a Petição Inicial; 32. O parecer da Comissão de Recurso do Sistema de Verificação de Incapacidade Permanente, de 14.02.2018, continha uma observação da Dra. «II», a qual afirmava que “Pela médica representante da examinada é dito que as alterações da sensibilidade disestésicas, as limitações funcionais globais referidas pela utente impossibilitam a retoma do posto de trabalho as mesmas associadas à patologia psiquiátrica evidente fazem perdurar e perpetuar toda a sua incapacidade. Não acredito ser de se esperar melhoria do quadro clínico referido neste exame sendo assim não se admitindo capacidade de retomar a capacidade de ganho (50% do seu ordenado) nos próximos 3 anos considerando como tal a Examinada incapaz permanente para a sua atividade profissional habitual” - cfr. Documento n.° ... junto com a Petição Inicial; 33. Em 09.05.2018, o Dr. «DD» elaborou um Atestado Médico de Incapacidade Multiuso, no qual atestou que “(...) o utente [a Autora] é portador de deficiência que, nesta data e conforme o quadro seguinte, lhe confere uma incapacidade permanente global de: 83%” - cfr. Documento n.° ...0 junto com a Petição Inicial; 34. Em 29.05.2018, o Dr. «DD» elaborou o documento denominado “Atestado Médico”, do Ministério da Saúde, Direção-Geral da Saúde, no qual atestou que a Autora “Está apto para a condução de veículos da seguinte categoria do Grupo 1: B. Com as seguintes restrições e/ou adaptações: 137 Avaliação médica antecipada (29/05/2023); 42.05 Dispositivo de visualização para o ângulo morte; 62 Limitada a deslocações num raio residência (50); 64 Limitada a deslocações a velocidade inferior a ...Km/h (100)” - cfr. Documento n.° ...1 junto com a Petição Inicial; 35. Em 22.10.2018, a Dra. «JJ» e de Reabilitação do Centro Hospitalar ..., asseverou que a Autora apresenta “dores cervicodorsais de predomínio direito que aliviam parcialmente com palexia, VAS atual 7; vas max 8. A dor não alivia com repouso é em ardência e por vezes em facada, sem território definido [sic]. Incapacidade funcional nas AV instrumentais, não conduz. Portanto: dores miofasciais da cintura escapular bilateral, pior à direita e incapacidade funcional para condução (por ser uma atividade multitarefas” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 20 junto com a Petição Inicial; 36. Em 28.11.2018, o Dr. «KK», Médico do Centro Hospitalar ..., perante o agravamento do quadro clínico da Autora requereu, ao Réu, a avaliação do agravamento da incapacidade desta, sustentada no seu relatório e nos relatórios de outros médicos do Hospital, Prof. Doutor «FF» e Dra. «LL» - cfr. Documento n.° ...3 junto com a Petição Inicial; 37. Em 09.01.2019, o Professor Dr. «FF», Diretor do Serviço de Neurocirurgia do Centro Hospitalar ..., atestou que “Neste contexto fico pois convencido da boa correlação clínico-imagiológica ou seja que as alterações evidenciadas em RMN são capazes de provocar a pioria clínica referida” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 26 junto com a Petição Inicial; 38. Em 23.01.2019, a Dra. «MM», médica da especialidade de dor crónica do Centro Hospitalar ..., atestou que “Por agravamento das queixas álgicas tem sido efetuados ajustes terapêuticos, encontrando-se neste momento medicada com Palexia 150 mg de 12-12 e lyrica 75 mg de 12-12h e Ivarez rapid em SOS de 6-6h” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 23 junto com a Petição Inicial; 39. Por comunicação eletrónica datada de 14.03.2019, a Companhia de Seguros [SCom01...], S.A. comunicou à Autora que “Submetida a mesma a reanálise dos nossos Serviços Clínicos, informamos que a posição da [SCom01...] foi revista e o sinistro foi aceite. Assim, e tal como estabelece o artigo 2.4 das condições contratuais, consideramos a data de reconhecimento da invalidez como sendo 01.02.2019, pelo que solicitámos ao Banco 1... informação do capital em dívida a essa data”, reconhecendo, deste modo, que a Autora tinha uma incapacidade de 77% permanente e definitiva - cfr. Documento n.° ...2 junto com a Petição Inicial; 40. A Autora foi convocada para comparecer no dia 27.03.2019, pelas 14:30 horas no Centro Distrital ... - cfr. Documento n.° ...4 junto com a Petição Inicial; 41. Em 03.05.2019, a Comissão de Verificação dos Sistema de Verificação de Incapacidade Permanente entendeu que “Para completar o nosso parecer, somos da opinião que a doente deverá ter parecer de Neurologia” - cfr. Documento n.° ...6 junto com a Petição Inicial; 42. Em 24.05.209, a Médica Neurologista, Dra. «NN», sem ter analisado a Autora, concluiu que “Tratando-se de uma profissão de Delegada de Informação Médica em que apesar das queixas álgicas não são objetivamente limitações funcionais de relevo durante os procedimento de Peritagem quer nos relatório Clínicos disponibilizados, penso que apenas haverá limitação para o exercício da sua profissão se a utente não puder conduzir ou se só o puder fazer por curtas distâncias (devendo haver essa evidência na respetiva carta de condução com as restrições aplicáveis) ou, se não houver estabilidade psiquiátrica ou cognitivas para o exercício da sua profissão” - cfr. Documento n.° ...7 junto com a Petição Inicial; 43. Em 26.07.2019, a Autora requereu exame da Comissão de Recurso, tendo indicado como seu representante o Dr. «OO» - cfr. Documento n.° ...0 junto com a Petição Inicial; 44. Por deliberação de 23.08.2019, a Comissão de Recurso considerou a Autora como não incapaz, tendo o Dr. «OO» manuscrito uma observação, na qual se opunha a tal deliberação, na medida em que atestava que a Autora tinha uma incapacidade definitiva e irreversível - cfr. Documento n.° ...8 junto com a Petição Inicial; 45. Em 28.10.2019, o Dr. «PP», Médico de Medicina de Trabalho elaborou o documento denominado "Relatório Medico - Agravamento de Situação Médica”, no qual afirma que “Convém no plano médico do trabalho começar por equacionar o perfil de funções enquanto delegada de informação médica. Do ponto de vista cognitivo, carece de estudo e atualização técnica e científica continuadas, de forma a cumprir exigência da entidade patronal e dar resposta aos médicos com que trabalha, mantendo índices de atenção, concentração e observação permanentemente elevados. Há ainda que manter participação em eventos externos, locais, regionais e nacionais, bem como em reuniões internas da empresa, sob clima de elevada competitividade e agressividade comercial e comportamental. Há necessidade operacional de condução automóvel diariamente, em função das áreas geográficas atribuídas, com montantes mensais de quilometragens muito elevadas e ergonómica e posturalmente incómodas e lesivas musculo-esqueleticamentee. Por fim, sob a perspectiva de avaliação e progressão profissional os modelos utilizados pelas empresas são fortemente impactante na vertente psicológica e psicossocial, implicando uma condição emocional muito boa”, acrescentando que “Do contexto clínico elencado resultou, em termos civis, a atribuição de atestado multiuso, o qual por consequência implicou a restrição por deficiência cumulativa para a condução automóvel de veículos ligeiros, assim fortemente condicionante da sua profissão. Finalmente, julgamos que a avaliação em causa não pode deixar de tomar em consideração, desde logo, o Parecer de Neurocirurgia, central e estrutural no processo de incapacidade para a sua profissão (...) Assim e em conformidade com a expressão da interessada, solicitamos que seja considerada a situação de agravamento clínico que será ainda consubstanciado em outros relatórios a entregar até 5 dias antes da Junta que lhe vier a ser marcada” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 28 junto com a Petição Inicial; 46. Em 12.11.2019, o Dr. «PP», Médico de Medicina de Trabalho, perante o agravamento do quadro clínico da Autora requereu, ao Réu, a avaliação do agravamento da incapacidade desta, sustentada no seu relatório e nos relatórios de outros médicos do Hospital - cfr. Documento n.° ...4 junto com a Petição Inicial; 40. Assente a realidade que antecede, vejamos agora se assiste razão à Recorrente quanto ao invocado erro de julgamento de direito. 41. Já aqui vimos que a Autora peticionou o provimento do presente meio processual por forma a ser (i) anulado o ato administrativo que lhe indeferiu a atribuição de pensão de invalidez, e ser o Réu (ii) condenado (ii.1) a proferir o ato administrativo que reconheça a sua situação de invalidez, e (ii.2) no pagamento de danos em valor nunca inferior a 25.000€. 42. O T.A.F do Porto, porém, não acolheu estas pretensões jurisdicionais. 43. Escrutinada a constelação argumentativa espraiada na fundamentação de direito da sentença recorrida, é para nós absolutamente cristalino que, no mais essencial, o juízo de improcedência da presente ação mostra-se estribado na falta de reunião de um dos legais pressupostos que depende o reconhecimento da situação de invalidez da Autora - concretamente, a falta de certificação da sua situação de invalidez por parte do sistema de verificação de incapacidades, e relativamente ao qual o Tribunal não vislumbrou a existência de qualquer erro grosseiro ou manifesto. 44. Ora, é precisamente contra o juízo decisório firmado no tocante à inexistência de qualquer erro grosseiro em matéria de reconhecimento da sua situação de invalidez que se insurge a Recorrente. 45. Realmente, a Recorrente clama que “(…) no tempo decorrido desde o primeiro exame realizado, não só a Recorrente não apresentou qualquer melhoria do seu quadro clínico, como são abundantes os relatórios médicos especializados na matéria que atestam exatamente o oposto e, assim, é flagrante o erro em que incorre o ato impugnado – e, bem assim, o Tribunal a quo – em admitir, ao arrepio dos pareceres técnicos dos médicos que acompanham a Recorrente, que aquela poderá melhorar no prazo de três anos (…) Era precisamente esta a análise que se impunha ao Tribunal recorrido, o qual, socorrendo-se da conhecida discricionariedade técnica, optou por não analisar, com o rigor e exatidão que se lhe impunha, a legalidade do ato administrativo em confronto com todos os elementos carreados para o processo, e ao fazê-lo, o Tribunal incorreu em manifesto erro de julgamento de Direito, na medida em que não cuidou de analisar o ato impugnado e, bem assim, constatar o notório e flagrante erro grosseiro em que o mesmo incorre (…)” 46. Apregoa ainda que “(…) resulta notório a flagrante falta de fundamentação em que incorreu o ato impugnado, uma vez que a Recorrente (nem nenhum cidadão comum) consegue descortinar quais os elementos clínicos que fundamentam aquela decisão – isto porque, em boa verdade, parecem não existir…(…)”, sendo que, in casu, impunha-se um dever especial de fundamentação, na medida em que “(…) optaram os “peritos” do Recorrido por negligenciar os pareceres médicos de especialistas de renome constates no processo e, bem assim, os Atestados Médicos de Incapacidade Multiuso que atestavam que a Recorrente padecia, inicialmente, de uma incapacidade de 60% e, posteriormente, de 83% (…)”. 47. Vejamos, sublinhando, desde já, que dois esteios argumentativos que se vêm de elencar invocados, não obstante de natureza diversa, conexionam-se, pelo que serão objeto de análise conjunta. 48. Assim, e entrando no conhecimento de tal constelação argumentativa, importa que se comece por sublinhar que se mostra provado que a Autora apresentou um novo requerimento de pensão de invalidez em 2019, que fez instruir com relatórios médicos a atestar o agravamento da sua situação clínica. 49. Cabe ainda notar que se mostra processualmente adquirido que a Comissão de Verificação do Sistema de Incapacidades emitiu parecer no sentido de não considerar a situação de invalidez com fundamento de que “(…) O examinado pode recuperar a capacidade de auferir, no desempenho da sua profissão de mais de 50% da retribuição correspondente, dentro dos próximos três anos (…)”. 50. Ora, do circunstancialismo fáctico supra evidenciado, ademais e especialmente, da fundamentação do parecer supra transcrita, destaca-se a “certeza férrea” que, em momento algum, a Comissão de Verificação do Sistema de Incapacidades atendeu ou rebateu a diversa documentação clínica junta pela Autora tendente a demonstrar a realidade contrária, ou seja, a sua incapacidade permanente para o serviço. 51. Mas, por se tratar de matéria técnica especializada que reclama um dever reforçado de fundamentação, devê-lo-ia ter feito. 52. De facto, a questão em torno do dever de fundamentação dos atos administrativos baseados em pareceres emitidos no âmbito de entidades médicas competentes para o reconhecimento das situações de incapacidade encontra-se bem abordada e desenvolvida no aresto deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 21.06.2007, tirado no processo nº. ...4..., que, muito tenha sido editada à luz de enquadramento legal diverso, apresenta-se como perfeitamente atual e enquadrável em termos que subscrevemos na íntegra. 53. No desenvolvimento deste acórdão sustenta-se: “(…) É certo que estamos em presença dum juízo pericial complexo, expresso numa linguagem ultra sintética e técnica, como é próprio das histórias clínicas, envolvendo um diagnóstico e prognóstico sustentados em elementos objetivos observados, intervindo, na conclusão, certamente alguns elementos subjetivos. Daí que sendo a fundamentação variável em função de cada tipo de ato praticado, estando-se em face de um ato determinado por observação médica, em cujo parecer/conclusão se alicerça, teremos que julgar suficiente a fundamentação que, em tais pareceres se baseie, se os mesmos tiverem um caráter, o mais objetivamente possível, de acordo com as regras científicas aceites no caso em análise e respetivas conclusões puderem ser conferidos por especialista na matéria. Ora na situação vertente as Juntas Médicas realizadas no âmbito da CGA limitaram-se a diagnosticar ao aqui recorrido uma “neurose ansiosa”, afirmando que a mesma “… não é uma doença adquirida em serviço e em consequência do seu desempenho …” (Junta realizada em 28/01/2003) ou “… não ser a neurose ansiosa doença que pela sua motivação constitucional seja adquirida ao serviço, em consequência do seu desempenho, e também pela sua história natural evolutiva não agravada pelo serviço em campanha …” (Junta Médica realizada em 25/09/2003). Mais resulta dos autos (factualidade apurada e PA apenso) que no âmbito do procedimento administrativo em presença o aqui recorrido foi submetido a variadas Juntas Médicas, inspeções e exames médicos [cfr. n.ºs III), IV), VI), VII), VIII), XI), XII), XIII), XIV), XVI) dos factos apurados] e o mesmo, já no âmbito do procedimento junto da CGA, juntou relatório médico subscrito por médico especialista dos HUC [cfr. n.º XXIII) dos factos apurados e fls. 165/166 do PA apenso] onde se concluiu, após exposição e explicitação aturada, em sentido diametralmente oposto àquele que foi o entendimento das Juntas Médicas nos quais se estribou o ato administrativo recorrido [destaque nosso]. Este confronto de análises/pareceres médicos impõe “in casu” acrescidas exigências de fundamentação por parte da decisão da CGA na medida em que a mesma vem a concluir no sentido do indeferimento da pretensão do aqui recorrido [destaque nosso]. Como bem se referiu na decisão judicial em apreciação referindo-se aos pareceres das Juntas Médicas “… os mesmos traduzem uma simples conclusão, sem qualquer referência explicativa da mesma. E tal referência explicativa surge ainda como imperiosa (ainda mais) quando comparados estes pareceres com os diversos relatórios médicos constantes do processo administrativo (todos coincidentes na relação causal entre a doença e a prestação de SMO), e a que a junta médica teve acesso, principalmente os relatórios médicos elaborados na sequência das JHI, reveladores de uma análise aturada e crítica da situação clínica do recorrente [destaque nosso]. Refira-se que o facto de se estar num domínio onde o conhecimento técnico-científico é aplicado não dispensa o oferecimento dos arrimos lógicos que suportam as conclusões científicas (…). (…) afirmar que a neurose ansiosa não é uma doença adquirida em serviço e em consequência do seu desempenho, ou que, pela sua motivação constitucional não seja adquirida ao serviço, em consequência do seu desempenho, e também pela sua história natural evolutiva não agravada pelo serviço em campanha, não basta para satisfazer o nível mínimo da exigência fundamentadora …”. Não merece, pois, qualquer reparo a sentença que assim concluiu já que o ato administrativo objeto de impugnação padece efetivamente do vício de forma por falta de fundamentação (cfr. arts. 124.º e 125.º ambos do CPA), sendo que tal entendimento em nada contende com o regime legal decorrente do n.º 2 do art. 96.º do EA visto não ser pelo facto de os pareceres das Juntas Médicas no âmbito da CGA serem independentes dos exames oficiais a que o interessado tenha sido sujeito, ou das informações ou dos pareceres complementares julgados necessários e/ou dos demais elementos constantes do processo, que aqueles estão isentos ou dispensados da necessária, adequada e suficiente fundamentação [destaque nosso]. Aliás, aos mesmos e na medida em que concluem em sentido inverso a tudo quanto no procedimento foi sendo adquirido, considerado e consensualizado, acrescem exigências de fundamentação e de explicitação da sua motivação de molde a tornar-se compreensível o itinerário cognoscitivo e valorativo desenvolvido pela Administração que justifique o porquê de se decidir num sentido e não noutro e, assim, se assegurar a adequada “transparência administrativa” e sindicabilidade jurisdicional [destaque nosso] (…)”. 52. Pelo exposto, dando este entendimento como sufragado na íntegra, atenta a bondade da solução adotada, é para nós absolutamente insofismável que a fundamentação aposta no parecer da Comissão de Verificação do Sistema de Incapacidades, e que serve de lastro ao ato impugnado, não permite que os seus destinatários possam fazer a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pelo seu autor, que constitui o objetivo último do dever de fundamentação imposto à Administração. 53. E este julgamento tem direta repercussão nos demais vetores sustentadores do recurso interposto pela Recorrente. 54. Na verdade, a invocação e/ou verificação da existência de uma situação de erro grosseiro está dependente do entendimento da motivação que presidiu à emissão do parecer negativo da Comissão de Verificação do Sistema de Incapacidades que serviu de lastro ao ato de indeferimento posto em crise nos autos. 55. O juízo que se vem de efetuar surge ainda particularmente potenciado pelo facto da Medicina não ser uma ciência exata, funcionando através de um sistema de conjeturas que podem, naturalmente, ser refutadas, não existindo, por isso, verdades absolutas no domínio médico-científico. 56. Pois bem, não sendo possível conhecer do iter avaliativo realizado, do motivo ou motivos por que se decidiu assim, naturalmente, não se pode concluir pela existência [ou não] de erro grosseiro que justifique a intervenção judicial. 57. Assim, deve entender-se que a decisão judicial recorrida, na parte que concluiu pela inexistência de qualquer erro grosseiro, radica numa apreciação destituída de elementos objetivos e seguros, “pecando”, assim, “por defeito” em matéria de poder-dever de julgar. 58. O que serve para atingir que mal andou o Tribunal a quo, que ao decidir como decidiu, interpretou mal e violou o disposto o bloco legal aplicável. 59. Concludentemente, procede o erro de julgamento de direito imputado à sentença recorrida no domínio em análise, sendo as consequências processuais a extrair apenas reportadas à violação do dever reforçado de fundamentação que se impunha, mas já não quanto ao demais invocado, desde logo, por resultar prejudicada a sua apreciação. 60. Mercê de tudo o quanto ficou exposto, deverá ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional, e, em conformidade, revogada a sentença recorrida e julgada parcialmente procedente a presente ação, condenando-se o Recorrido a reapreciar o pedido da Autora à luz da verificada violação do dever reforçado de fundamentação. 61. Assim se decidirá. * * IV – DISPOSITIVO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em CONCEDER PROVIMENTO ao recurso, revogar a sentença recorrida, e julgar parcialmente procedente a presente ação, condenando-se o Recorrido a reapreciar o pedido da Autora à luz da verificada violação do dever reforçado de fundamentação. Custas pelo Recorrido. Registe e Notifique-se. * * Porto, 30 de junho de 2023, Ricardo de Oliveira e Sousa Rogério Martins Luís Migueis Garcia |