Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02439/21.9BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/24/2025
Tribunal:TAF de Braga
Relator:PAULO FERREIRA DE MAGALHÃES
Descritores:LEI N.º 60/2005, DE 29 DE DEZEMBRO;
DIREITO DE INSCRIÇÃO NA CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES;
LEI N.º 45/2004, DE 27 DE DEZEMBRO; QUESTÃO NOVA;
Sumário:
1 – Como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.

2 - O cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que vem a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo 22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].

3 - No que é atinente à entrada em vigor da Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, estando em apreço neste Tribunal Superior um recurso jurisdicional que visa impugnar a Sentença recorrida que aplicou o direito pré-vigente, e por outro lado, que aquele recente diploma legal, já publicado após a prolação da Sentença recorrida [datada de 06 de novembro de 2024], convoca no seu articulado a apreciação de diferentes termos e pressupostos para efeitos da aplicação do regime jurídico nele vertido, de que ressaltamos os elencados sob a alínea b) do n.º 2 do seu artigo 2.º, julgamos que estamos perante a invocação de questão nova por parte da Recorrente, pois que quanto à mesma não foi suscitado o seu julgamento por parte do Tribunal a quo, dada a evidência lógica e temporal da invocada matéria.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, IP [devidamente identificada nos autos], Co-Ré na acção que contra si foi intentada pela Autora «AA» [também devidamente identificada nos autos, representada pelo Sindicato de Todos os Professores - STOP], inconformada com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual, em suma, tendo julgado procedente o pedido de condenação por esta formulado a final da Petição inicial, condenou as entidades demandadas a reconhecer o direito da Autora como subscritora da CGA desde setembro de 2009 e à concretização e prática dos actos materiais a repor essa inscrição, veio interpor recurso de Apelação.

*

No âmbito das Alegações apresentadas pela Caixa Geral de Aposentações, foram elencadas a final as conclusões que ora se reproduzem:

“[…]
CONCLUSÕES:
1.ª O direito à inscrição na Caixa Geral de Aposentações após a entrada em vigor do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, depende, não só de ter existido um vínculo à função pública, que conferiu esse direito, antes de 31 de Dezembro de 2005, mas também da continuidade do vínculo à Administração
Pública.
2.ª Neste sentido, veja-se o acórdão do STA proferido no âmbito do processo nº 889/13, onde se considerou que “(…) tendo em conta a letra do preceito e visando o mesmo cancelar novas entradas no sistema e não eliminar os subscritores que permanecem no mesmo, temos de concluir não haver quebra do estatuto de subscritor quando o funcionário ou agente se limita a transitar de uma entidade administrativa para outra sem qualquer descontinuidade temporal, nos termos do estatuído no art. 22º, nº1, do Estatuto da Aposentação, devendo apenas o inciso “direito de inscrição” ser objecto de interpretação correctiva de modo a harmonizar-se com a letra e a teologia intrínseca do art. 2º da Lei nº 60/2005.”
3.ª A CGA considera que não se verificam os prossupostos que o STA considerou necessários para a manutenção do direito à inscrição na CGA.
4.ª A situação da Recorrida cai dentro do âmbito de aplicação do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, uma vez que, no seu caso, existe descontinuidade do vínculo jurídico laboral em termos formais.
5.ª A decisão impugnada violou, pois, o artigo 2º da Lei nº 60/2005, assim como violou o disposto no artigo 38º do CPTA, já que, ainda que o Recorrido tivesse razão, o que só por mera hipótese de raciocínio se concede, o deferimento da presente ação apenas poderia ter efeitos ex nunc e nunca a destruição retroativa de todos os atos já consolidados na ordem jurídica.
6.ª Acresce que não se nos afigura entendível a ponderação que é feita na página 15 e seguintes da Sentença, quando ali se conclui que não pode constituir um obstáculo ao reconhecimento do direito peticionado na presente ação “…a alegada complexidade da operação de revisão de milhares de reinscrições…”, a qual “…não é imputável à autora…” e que não se está perante “…operações matemáticas complexas, nem de análises de física quântica, mas de meras operações de somar e subtrair.” (sublinhado nosso)
7.ª Com o devido respeito, o Tribunal a quo não ponderou devidamente o facto de o pedido formulado nesta ações, com efeitos retroagidos quase 20 anos antes, implicarem uma articulação não só entre o serviço do ativo e os dois regimes de proteção social – no que respeita a quotas e contribuições –, mas também, em alguns casos, envolvendo o próprio utente, caso tenha ocorrido o pagamento de prestações ou a atribuição de benefícios específicos do regime de segurança social que os docentes pretendem agora ver desaplicado ao seu caso (o que a CGA já assinalara no art.º 8.º do requerimento apresentado aos autos em 2023-10-24 e no requerimento apresentado em 2024-01-10).
8.ª Outra questão que o Tribunal a quo também não ponderou prende-se com uma questão que é do conhecimento público (porque largamente veiculado pelos diversos meios de comunicação social e, bem assim, na página institucional do Governo e na página institucional da Presidência da República): a adoção pelo Governo de uma medida interpretativa relativamente ao tema, a qual veio a ser devolvida pelo Presidente da República sem promulgação “…solicitando que seja convertido em proposta de lei ou proposta de lei de autorização legislativa, assim permitindo conferir legitimidade política acrescida a tema que dividiu o topo da jurisdição administrativa e merece solução incontroversa.” (conforme consta publicado na página institucional da Presidência da República)
9.ª Na sequência, em 2024-09-05 foi aprovada em Conselho do Ministros “…uma Proposta de Lei que, em linha com decisão do Supremo Tribunal Administrativo, clarifica a interpretação da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, no que respeita a convergência do regime de proteção da função pública (Caixa Geral de Aposentações) com o regime geral da Segurança Social, garantindo o direito de reinscrição aos trabalhadores que tenham continuidade temporal no exercício de funções públicas.” (cfr. ponto 5 do Comunicado do Conselho de Ministros de 5 de setembro de 2004, publicado na página institucional do Governo).
10.ª Tratando-se de um tema que, na perspetiva da Presidência da República, “…dividiu o topo da jurisdição administrativa e merece solução incontroversa.”, parece evidente que estamos, afinal de contas, perante uma questão cuja resolução acarreta grande complexidade e que a perspetiva publicamente veiculada pela Presidência da República deve merecer a devida ponderação na decisão a proferir.
11.ª Cumprindo assinalar outro aspeto que, no nosso modesto entendimento, deverá também merecer ponderação por parte do Tribunal: estamos perante antigos subscritores da CGA inscritos neste regime após 1993-09-01, os quais, ainda que inscritos na CGA, nunca deixarão de ter as suas pensões de aposentação calculadas nos termos das normas legais aplicáveis ao regime geral da segurança social, como decorre do art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 286/93, de 20 de agosto, e do artigo 5.º, n.º 2, da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro
12.ª Pelo que não se compreende bem a utilidade destas ações, cuja finalidade não tem, seguramente, que ver com o regime de pensões aplicável a casos como o da Recorrida.
Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deverá ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e revogada a decisão recorrida, com as legais consequências.
[…]”

**

Notificada das Alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, a Autora ora Recorrida veio apresentar Contra alegações, a final das quais elencou as conclusões que ora se reproduzem:

“[…]
C) EM CONCLUSÃO:
a) Face à factualidade fixada na sentença recorrida - que não foi impugnada pela Ré / Recorrente - não podia o Tribunal a quo dar outra solução de direito às questões colocadas à sua apreciação. Assim sendo,
b) por ser conforme ao direito, não pode a sentença recorrida merecer qualquer censura, devendo ser mantida nos seus precisos termos. Vejamos:
c) a recorrente CGA reinscreveu a recorrida «AA» no regime de proteção social convergente com efeitos a 01.8.2023, como a mesma declarou e confessou nos autos (cfr. requerimento com a referência ...16, de 24.10.2023). Isto é, a recorrente praticou um ato de reconhecimento do direito da recorrida «AA».
d) Ao omitir tal facto, é manifesto que a recorrente CGA litiga de má-fé e a sua conduta constitui manifesto abuso de direito.
e) Pelo que, não pode este Tribunal conhecer o recurso na parte que se refere ao reconhecimento do direito como subscritora da CGA e à condenação das entidades demandadas a reconhecer esse direito a partir de 01 de agosto de 2023, porquanto tal direito foi reconhecido pela própria recorrente a partir de tal data.
Por outro lado:
f) O art.º 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, impede a CGA de inscrever como subscritor aquele funcionário/agente que, desde 01.1.2006, venha a ser titular da relação jurídica pública, pela primeira vez, o que não é a situação da recorrida «AA», uma vez que a sua inscrição ocorreu em 01.9.2002 (neste mesmo sentido, a título meramente exemplificativo, atente-se aos seguintes Acórdãos dos nossos mais altos Tribunais: - Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido em 06/03/2014 no âmbito do proc. n.º 889/13; - Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte proferido em 14/02/2020 no âmbito do proc. n.º 1771/17.0BEPRT; - Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte proferido em 28/01/2022 no âmbito do proc. n.º 1100/20.6BEBRG; - Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte proferido em 09/06/2022 no âmbito do proc. n.º 99/21.6BEBRG; - Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte proferido em 22/09/2022 no âmbito do proc. n.º 1974/20.0BEBRG; - Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte proferido em 06/10/2022 no âmbito do proc. n.º 307/19.3BEBRG; - Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte no proc. n.º 708/20.4BEPRT transitado em 04/11/2022; - Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte proferido no processo nº 714/20.9BEPNF proferido em 7 de dezembro de 2022 e transitado em julgado em 23 de janeiro de 2023).
g) E tal interpretação é a mais consentânea com o elemento literal e teleológico do art.º 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, bem como com os princípios da igualdade e das legítimas expetativas, previstos nos art.ºs 13.º e 18.º da CRP e art.º 6º do CPA, e foi reconhecido pela recorrente através do Ofício Circular n.º 1/2023.
h) Por outro lado ainda, alega a recorrente a existência da discussão pública de um diploma legal, que não era conhecido à data da prolação da sentença recorrida e, consequentemente, o mesmo nunca poderia ser aplicado.
i) O diploma legal entretanto publicado nunca poderia ser aplicado ao caso sub iudice em sede de recurso, porquanto o recurso apenas pode ter como objeto a sentença recorrida, que não emitiu – e não tinha de emitir – qualquer pronúncia sobre tal projeto de diploma legal.
j) Sem prescindir, mas se assim se não entender – o que se não aceita e só por necessidade de raciocínio se refere – sempre se dirá que, salvo o devido respeito, o art.º 2.º da Lei n.º 45/2024 é inconstitucional por violação dos princípios da separação de poderes, da igualdade, da legalidade, da proporcionalidade, da boa fé, da justiça, da razoabilidade e da tutela das legítimas expetativas do cidadão, previstos nos art.ºs 1º, 2.º, 13.º e 18.º da Constituição da República Portuguesa, dado que o órgão de soberania com a função legislativa pretende “impor” aos Tribunais uma dada interpretação por não concordar com a interpretação destes. O que se requer seja declarado, com as legais consequências.
k) E viola, também, os caracteres das normas jurídicas, que têm de ser gerais e abstratas, porquanto pretende ditar a solução a casos concretos, criando aliás um novo número em tal artigo legal, bem como viola o conteúdo funcional e os poderes de cada um dos órgãos de soberania e agrava / acentua a violação do citado princípio da igualdade.
l) Pelo que, não deve a citada Lei ser aplicada aos presentes autos;
m) Sem prescindir ainda, mas se assim se não entender – o que igualmente se não aceita e só por necessidade de raciocínio se refere – sempre se dirá que do art.º 2.º da Lei nº 60/2005 e do artº 2.º da Lei nº 45/2024 resulta que o legislador pretende que a Caixa Geral de Aposentações deixe de proceder à inscrição de novos subscritores a partir de 1 de janeiro de 2006, ou seja, aos funcionários e agentes que “iniciem” funções, a partir daquela data, passa a aplicar-se o regime da segurança social.
n) Assim, a recorrida «AA» podia e tinha o direito de pedir a renovação da sua inscrição como subscritora da CGA quando constituiu novo vínculo laboral com o 1º réu, como, aliás, resulta do artigo 22.º do Estatuto da Aposentação.
o) Acresce ainda que, existe uma relação contínua de funções por parte da recorrida «AA» desde 2002 até esta data, porquanto os períodos de tempo em que não exerceu funções ocorreram por facto não imputável à mesma, mas sim pela natureza das funções de docente por si exercidas.
p) Assim, a sentença recorrida deve ser mantida, nos seus precisos termos. O que se requer, com as legais consequências.
Sem prescindir:
q) para o caso de procedência das questões suscitadas pela recorrente, os Autores vêm, ao abrigo do art.º 636.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi artº 1º do CPTA, ampliar o âmbito do recurso, a título subsidiário, quanto aos pedidos principais por si formulados. Assim:
r) Os recorridos vêm requerer alteração da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, nos seguintes termos:
i) atento o confessado pela recorrente no seu requerimento com a referência ...16, de 24.10.2023, deve ser aditado o seguinte facto aos factos dado como provados: - a recorrida «AA» foi reinscrita no regime de proteção social convergente com efeitos a 01.8.2023, estando a pagar a respetivas contribuições desde essa data até à atualidade.
ii) atento o registo biográfico junto a fls. 4 do PA, deve ser aditado ainda o seguinte facto aos factos dado como provados: - desde 01.09.2002 até ao presente ano letivo, a autora (ora recorrida) celebrou com o Ministério da Educação, sucessivamente contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo (RCTFP) para exercer funções docentes em vários Agrupamentos e estabelecimentos de ensino;
iii) atento o Ofício n.º 1/2023 da recorrente, junto a fls. … dos autos, deve ser aditado também o seguinte facto aos factos dado como provados:- a Ré CGA emitiu e publicitou junto da autora e de terceiros, de forma pública, o seu Ofício
n.º 1/2023, cujo teor se dá integralmente por reproduzido.
O que tudo se requer.
s) Assim, face à matéria de facto que se deve ter como assente, é manifesto que a autora «AA» se encontra reinscrita na CGA com efeitos a 01.8.2023, por decisão da recorrente CGA, e os efeitos da sua reinscrição devem retroagir à data de 2009, uma vez que exerceu de forma contínua as suas funções de docente desde 2002 até esta data.
t) Pelo que, deve a ação ser julgada procedente, com o que se fará, Venerandos
Desembargadores, sempre com o mui douto suprimento de V.as Ex.as J U S T I Ç A !
[…]”



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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso interposto, fixando o seu efeito.

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O Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, no sentido de ser negado provimento, e de ficar por essa via prejudicado o pedido de ampliação do objecto do recurso.

*

Notificada desse parecer, a Recorrente veio exercer o contraditório, apresentando requerimento pelo qual, em suma e a final, sustentou não acompanhar o entendimento propugnado, e que continua a CGA a pugnar pela procedência do recurso por si interposto, tendo enfatizado que em face do estabelecido no n.º 3 artigo 2.º da Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, que entretanto foi publicada, a reinscrição no regime da CGA dos casos abrangidos pela ressalva prevista no n.º 2 do artigo 2.º daquela Lei somente poderá ser reportada a partir da data da sua entrada em vigor, sendo os períodos com contribuições para o regime geral de segurança social considerados para efeitos da aplicação do regime da pensão unificada, previsto no Decreto-Lei n.º 361/98, de 18 de novembro.

***

Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.




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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], e que passam por saber se o Tribunal a quo errou no julgamento por si prosseguido em matéria de interpretação e aplicação do direito.

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III - FUNDAMENTOS IIIi - DE FACTO

Para efeitos da prolação da Sentença recorrida, apreciou e decidiu o Tribunal a quo, nos termos que, por facilidade, para aqui se extraem como segue:

“[…]
IV.1 – DE FACTO
IV.1.1 – Factos Provados
Com interesse para a decisão da causa consideram-se como provados os seguintes factos:
1) A autora é professora, habilitada com a licenciatura em geografia – ramo educacional;
Docs. 1 e 2 juntos com a p.i.
2) Iniciou funções docentes, mediante celebração de contrato, na Escola .... 2 e 3 de
... a 01.09.2002;
Docs. 1, 2 e 3 juntos com a p.i.
3) E foi inscrita da CGA;
Doc. 2 junto com a p.i.
4) Celebrou sucessivos contratos com o Ministério da Educação, tendo lecionado em várias escolas;
Docs. 2 a 24 juntos com a p.i.
5) A 01.09.2009 a autora passou a exercer funções docentes no Agrupamento de
Escolas de ...;
Docs. 2 e 13 juntos com a p.i.
6) E foi inscrita na Segurança Social;
P.A., ME, fls. 8
7) Em janeiro de 2022 a autora realizava descontos para a Segurança Social;
P.A., ME, fls. 8
8) A presente ação foi instaurada a 21.12.2021, mediante remessa da p.i. por via eletrónica.
Fls. 1 e ss. dos autos
IV.1.2 – Factos não provados
Inexistem factos com interesse para a decisão da causa, que importe dar como não provados.
IV.1.3 – Fundamentação da matéria de facto
A convicção do Tribunal baseou-se na análise dos documentos juntos aos autos, bem como junto ao P.A.. Os documentos que suportam a convicção do Tribunal são especificados em cada um dos pontos.
[…]”

**

IIIi - DO DIREITO APLICAVEL

Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que com referência ao pedido formulado a final da Petição inicial, deduzido contra a Caixa Geral de Aposentações, o Instituto da Segurança Social e o Ministério da Educação, veio a julgar a acção procedente, reconhecendo o direito da Autora como subscritora da CGA desde setembro de 2009 e à concretização e prática dos actos materiais tendentes a repor essa inscrição.
Com o assim julgado não se conforma a Recorrente CGA, que no âmbito das conclusões das suas Alegações de recurso pugnou, a final e em suma, pela revogação da Sentença, e a Recorrida, por sua vez, nas conclusões das suas Contra alegações, pugnou pela manutenção da Sentença recorrida [para além de ter requerido, a título subsidiário, a ampliação do objecto do recurso].

Em face do que assim foi deixado vertido nas conclusões das Alegações de recurso enunciadas pela Caixa Geral de Aposentações, daí se extrai que a questão fundamental a apreciar e decidir pelo Tribunal a quo contendia em saber se a Autora ora Recorrida, atendendo ao disposto no n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, tinha direito à manutenção da sua inscrição enquanto subscritora da CGA. Nas conclusões das suas Alegações, sustentou para esse efeito que o Tribunal a quo errou no julgamento por si prosseguido em torno desse normativo, assim como do artigo 38.º, n.º 2 do CPTA, desde logo e essencialmente, por resultar evidente do registo biográfico da Autora que houve descontinuidade no exercício de funções públicas, assim como houve quebras do vínculo jurídico laboral público [cfr. conclusões 1.ª a 5.ª], e no fundo, que o Tribunal a quo não ponderou devidamente a matéria de facto, nem a especificidade da necessidade de articulação de dois regimes de proteção social entre si, assim como o facto ter sido aprovada pelo Conselho de Ministros uma proposta de Lei que visa clarificar a interpretação da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro [cfr. conclusões 6.ª a 11.ª].

Cumpre apreciar e decidir.

Depois de fixar o objecto do litígio e as questões a decidir [a saber, o reconhecimento do direito da Autora à manutenção da sua inscrição na Caixa Geral de Aposentações, e após, sobre se ocorria a caducidade do direito de acção, a falta de interesse em agir da Autora, e a final, sobre se a Autora tem direito a ser considerada como subscritora da CGA desde setembro de 2009], o Tribunal a quo fixou a factualidade que entendeu por relevante [por provada, e que o foi, essencialmente, a partir do acervo documental constante dos autos e do Processo Administrativo], tendo depois prosseguido pela sua submissão ao direito que julgou por convocável, e que passava por saber, essencialmente, se em face do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, se a Autora tinha ou não o direito de manter a sua inscrição na CGA [que se tinha iniciado em setembro de 2002].

Como assim deflui da Sentença recorrida, o Tribunal a quo jugou pela procedência da pretensão formulada pela Autora ora Recorrida com fundamento, em suma, na violação do disposto no artigo 2.º, n.º 2 da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro e no artigo 22.º do Estatuto da Aposentação, por ter a Autora sido indevidamente inscrita no regime previdencial da Segurança Social em setembro de 2009, quando o deveria ter sido na Caixa Geral de Aposentações, tendo por base o facto de a mesma ser já subscritora da CGA, desde 2002.

Neste conspecto, para aqui extraímos a essencialidade da fundamentação de direito aportada pelo Tribunal a quo na Sentença recorrida, como segue:

Início da transcrição
“[…]
Entende a autora que tem direito à reposição da sua inscrição na CGA desde setembro de 2009.
[…]
Portanto, a 01.09.2009 a autora exerce funções docentes em Escola tutela[da] pelo Ministério da Educação, como já exercia anteriormente, e desde 01.09.2002, pelo que tem direito a ver retomada a subscrição que tinha anteriormente na CGA. Repare-se que o artigo 22.º do Estatuto da Aposentação não impede o Ministério da Educação de reinscrever a autora na CGA, bem pelo contrário, impõe a sua reinscrição.
[…]
Note-se, portanto, que, à luz do EA, só há lugar ao cancelamento da inscrição do subscritor, com a consequente eliminação, quando aquele cesse, a título definitivo, não apenas o seu cargo mas qualquer outro no âmbito da função pública, já que o legislador teve o cuidado de ressalvar desse cancelamento a situação do trabalhador que for “investido noutro a que corresponda igualmente direito de inscrição”, isto é, que se limite a transitar, dentro da Administração Pública, de uma entidade pública para outra.
Por outro lado, prevê-se expressamente que essa qualidade de subscritor ressurja quando o trabalhador retome funções no âmbito de cargo que se integre na função pública.
Assim sendo, considerando a letra dos referidos preceitos (artigos 2.º da Lei n.º 60/2005 e 22.º, n.os 1 e 2 do EA), não se pode dizer que o subscritor ao transitar no âmbito da Administração Pública de uma entidade para outra esteja a iniciar funções, nos termos e para os efeitos do disposto naquele primeiro preceito.
Acresce que também quanto ao fim visado pelo artigo 2.º da Lei nº 60/2005 se afigura não existir incompatibilidade entre os dois preceitos, uma vez que, como se referiu, o que se pretende é alcançar a convergência progressiva através da proibição da entrada de novos subscritores, ou seja, o objetivo é cancelar novas entradas e não propriamente eliminar as que permanecem no sistema.
[…]
A autora obteve a qualidade de subscritora da CGA desde 01.09.2002, mantendo-se a fazer descontos para tal entidade durante vários e sucessivos contratos para exercer funções docentes em diversas Escolas tutelas pelo Ministério da Educação. Assim, quando a 01.09.2009 passa a exercer funções docentes em escola tutelada pelo Ministério da Educação tem direito a ver retomada a sua inscrição na CGA; por força do artigo 22.º, n.º 2 do EA, não podia ser inscrita na Segurança Social; antes deve ver retomada a sua qualidade de subscritora da Caixa Geral de Aposentações. Portanto, a manutenção da autora no regime geral da Segurança Social é ilegal. É certo que resulta dos autos que a CGA assume uma posição de conhecimento da jurisprudência dos Tribunais superiores e de aguardar instruções da tutela. No entanto, como a própria CGA dá conta na contestação apresentada, a alegada complexidade da operação de revisão de milhares de reinscrições não é imputável à autora, nem esta teve qualquer intervenção nessa circunstância, nem qualquer contributo para a sua resolução. Além disso, a alegada complexidade não resulta da própria natureza técnica da operação, que, aliás, é relativamente simples, vislumbrando-se relativamente fácil de quantificar, dado que não se vislumbra que os registos de descontos desde abril de 2009 não sejam fáceis de consultar através de um computador com ligação à rede interna da Segurança Social: tem que haver transferência de verbas (os descontos efetuados pela autora) da Segurança Social para a CGA e terá que ser assegurado à autora a diferença nas prestações que possam ter ocorrido nesse período de tempo – aliás, a própria CGA na sua contestação revela ter perfeito conhecimento disso. Não se tratam, por isso, de operações matemáticas complexas, nem de análises de física quântica, mas de meras operações de somar e subtrair. A alegada “complexidade” poderá resultar, isso sim, do número de professores envolvidos e das dificuldades orçamentais que uma transferência de montantes de tal índole pode envolver. Mas, quanto a estes aspetos, afigura-se que, por um lado, a autora é completamente alheia e não tem nem pode ter qualquer intervenção para os concretizar; e, por outro lado, é de assinalar que as entidades demandas têm vindo a ser condenadas em processos como o presente já há vários anos, o que significa que tiveram já espaço temporal para se preparem e acomodarem as operações orçamentais necessários. Não podendo, de qualquer modo, contestar o direito da autora com base em operações de que apenas elas são responsáveis.
[…]
Como já se referiu, as alegadas dificuldades em fazer as transferências, para além de não serem minimamente concretizadas, resultam mais do número de pessoas afetadas por esta necessidade do que uma dificuldade técnica específica em apurar ou quantificar o valor de descontos efetuado pela autora durante o período em causa. Importa também frisar a relevância do facto de na presente ação não estar apenas a CGA e o ISS, IP, mas também a entidade empregadora, o que significa que quanto às prestações sociais pagas à autora, não pode o ISS, IP deixar de reaver o seu montante junto da entidade que as deveria ter pago. De qualquer modo, os acertos entre o que a autora deveria ou não ter recebido e a entidade que deveria ou não ter pago, constitui um aspeto que contende com um encontro de contas entre as várias partes e que constitui um fundamento da execução ou materialização do direito da autora a ver restituída a legalidade, sendo o momento próprio de apreciar e concretizar estes aspetos a execução de sentença e não o processo declarativo.
A isto acresce que existem instrumentos legislativos e normativos que balizam esta matéria: a Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro que prevê a manutenção na CGA dos subscritores que já o eram antes de 01.01.2006; o artigo 22.º do EA que prevê também a manutenção dessa inscrição e o artigo 173.º do CPTA que expressamente prevê no n.º 2 que a Administração fica obrigada a praticar atos dotados de eficácia retroativa de modo a repor a legalidade.
Atento ao exposto, assiste razão à autora, pelo que esta não deveria ter passado a descontar para a Segurança Social, com a assinatura do contrato a 01.09.2009, devendo ter sido retomada a sua inscrição na CGA.
[…]”
Fim da transcrição

Ora, em torno da questão nuclear que se centra em face do momento da inscrição da Autora na Segurança Social, que como assim resulta do probatório, ocorreu já em data posterior à prevista no artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, ou seja, após 01 de janeiro de 2006, o Tribunal a quo julgou pela procedência da pretensão da Autora, com amparo em vasta jurisprudência dos Tribunais Superiores desta jurisdição administrativa.

Efectivamente, quanto a essa questão fundamental, o Tribunal a quo ancorou a fundamentação aportada na Sentença recorrida, tendo presente para tanto que a Autora já esteve inscrita na CGA, e que por essa razão não se tratava de inscrição neste regime de previdência de um novo subscritor, e também, porque antes da entrada em vigor da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, já a mesma tinha sido subscritora, o que julgamos tratar-se de um julgamento em conformidade com os normativos que a Recorrente, ao invés, fundado em erro de erro de interpretação, vem a apresentar nas suas conclusões recursivas como tendo sido violados.

O Tribunal a quo alinhou o seu julgamento em conformidade com jurisprudência de Tribunais Superiores desta jurisdição administrativa, designadamente, o Acórdão do STA datado de 06 de março de 2014, proferido no Processo n.º 0889/13, e o Acórdão deste TCA Norte, datado de 14 de fevereiro de 2020.

Por julgarmos com relevância para a decisão a proferir, para aqui extractamos o sumário do Acórdão do STA, datado de 06 de março de 2014, proferido no Processo n.º 0889/13, como segue:

Início da transcrição
“I – Considerando a letra do art. 2º da Lei nº 60/2005, de 29 de Dezembro, que se refere apenas ao pessoal que “inicie funções” e a sua razão de ser (proibir a entrada de novos subscritores), afigura-se claro poder retirar-se que o mesmo deve ser interpretado no sentido de a Caixa Geral de Aposentações estar impedida de inscrever como subscritor aquele funcionário/agente que pela primeira vez venha a ser titular de relação jurídica pública.
II – Assim sendo, tendo em conta a letra do preceito e visando o mesmo cancelar novas entradas no sistema e não eliminar os subscritores que permanecem no mesmo, temos de concluir não haver quebra do estatuto de subscritor quando o funcionário ou agente se limita a transitar de uma entidade administrativa para outra sem qualquer descontinuidade temporal, nos termos do estatuído no art. 22º, nº1, do Estatuto da Aposentação, devendo apenas o inciso “direito de inscrição” ser objecto de interpretação correctiva de modo a harmonizar-se com a letra e a teologia intrínseca do art. 2º da Lei nº 60/2005.
III – Se o Associado do Recorrente (professor do ensino superior politécnico) rescinde o contrato administrativo de provimento que o liga a uma instituição de ensino e celebra com outra instituição novo contrato, com efeitos a partir do dia seguinte, embora em termos formais haja descontinuidade do vinculo jurídico, não havendo descontinuidade temporal, a situação não cai no âmbito do art. 2º da Lei nº 60/2005, de 29 de Dezembro, em conjugação com o disposto no art. 22º, nº 1, do Estatuto de
Aposentação.”
Fim da transcrição

De igual modo, por também julgarmos com relevância para a decisão a proferir, para aqui extractamos o sumário do Acórdão deste TCA Norte, datado de 14 de fevereiro de 2020, proferido no Processo n.º 01771/17.0BEPRT, como segue:

Início da transcrição
“I - Os nº. 1 e 2 do artigo 2º da Lei nº. 60/2005, de 29 de dezembro, preconizam a inadmissibilidade de novas inscrições na Caixa Geral de Aposentações, e, bem assim, a obrigatoriedade de inscrição no regime geral de segurança social de todo o pessoal que “inicie funções” a partir 1 de janeiro de 2006, ao qual, nos termos da legislação vigente, fosse aplicável o regime de proteção social da função pública em matéria de aposentação, em razão da natureza da instituição a que venha a estar vinculado, do tipo de relação jurídica de emprego de que venha a ser titular ou de norma especial que lhe conferisse esse direito.
II - Na determinação do que se deve entender relativamente à previsão “iniciem funções” contida nos nº. 2 do artigo 2º da Lei nº. 60/2005, dever-se-á atender ao teor da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, espraiada seu aresto de 06.03.2014, no processo nº. 0889/13, que, quanto a este conspecto, considerou que o disposto no nºs.1 e 2 do artigo da Lei nº. 60/2005 visa apenas abranger o pessoal que inicie absolutamente funções.
III - Por razões atinentes a uma interpretação harmoniosa com a letra e a teleologia intrínseca do art. 2º da Lei nº 60/2005, a eliminação da subscrição do trabalhador em funções públicas decorrente da cessação do exercício do seu cargo prevista no nº.1 do artigo 22º do EA só ocorrerá se este não for investido noutro cargo a que antes de 01.01.2006 correspondesse direito de inscrição.”
Fim da transcrição

Ora, desde já referimos que nos revemos nesta jurisprudência [de entre outra prolatada por este TCA Norte, de que destacamos o Acórdão datado de 28 de janeiro de 2022, proferido no Processo n.º 496/20.4BEPNF, o Acórdão datado de 28 de janeiro de 2022, proferido no Processo n.º 1100/20.6BEBRG, o Acórdão datado de 11 de fevereiro de 2022, proferido no Processo n.º 99/21.6BEBRG, o Acórdão datado de 10 de março de 2022, proferido no Processo n.º 1974/20.0BEBRG, o Acórdão datado de 08 de abril de 2022, proferido no Processo n.º 307/19.3BEBRG [assim sinalizado pelo Tribunal a quo], o Acórdão datado de 30 de setembro de 2022, proferido no Processo n.º 708/20.4BEPRT - todos disponíveis em www.itij.pt], e o recente Acórdão deste TCA, datado de 22 de novembro de 2024, proferido no Processo n.º 148/24.6BEPNF, em que o ora Relator interveio na sua formação em julgamento, como 2.º Adjunto], e cuja fundamentação aqui damos por enunciada [com as adaptações que se mostrem devidas, designadamente em torno da matéria de facto], a fim ser prosseguida e obtida, em consonância com o disposto no artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil, uma interpretação e aplicação uniformes do direito.

Salientamos ainda que em formação de admissão preliminar, o STA negou a admissão de recurso de revista no Acórdão datado de 09 de junho 2022, proferido no Processo n.º 099/21.6BEBRG, de 14 de julho de 2022, proferido no Processo n.º 0496/20.4BEPNF, de 22 de setembro de 2022, proferido no processo
1974/20.0BEBRG, e de 06 de outubro de 2022, proferido no Processo n.º 307/19.3BEBRG, em situações cuja matéria de facto é similar à que ora está em causa nestes autos, e que na essência do que vinha sustentado pelos aí Recorrentes, a argumentação apresentada na instância superior não foi de molde a abalar a jurisprudência que vinha sendo firmada neste domínio.

Quanto ao que sustenta a Recorrente sob as conclusões 6.ª e 7.ª das suas Alegações de recurso, é manifesto que não lhe assiste razão, porquanto, compulsada a Petição inicial, em especial o pedido formulado a final e bem assim a causa de pedir que lhe está imanente, daí decorre que a Sentença proferida pelo Tribunal a quo se insere quer no âmbito do pedido, quer no âmbito dos poderes de cognição do Tribunal, sendo que a regularização da situação da Autora passará pela realização dos devidos ajustamentos procedimentais envolvendo as competentes entidades administrativas e a própria Autora, sendo que, podendo ser, abstractamente considerado, que para a CGA e para o ISS se tratará de uma operação de elevada complexidade, a sua determinação por parte de um Tribunal com competência material para o efeito, e em face de um pedido que lhe veio formulado por quem nisso tinha interesse, encerra-se perfeitamente no âmbito dos poderes dos Tribunais da jurisdição administrativa, que é na actualidade um contencioso de plena jurisdição [Cfr. artigo 1.º do ETAF e artigo
3.º do CPTA].

Salientamos que tendo presente o disposto no artigo 5.º, n.º 1 do CPC e no artigo 95.º do CPTA, não foram ultrapassados os poderes de cognição do Tribunal a quo, e bem assim, também não foi violado o princípio constitucional da separação de poderes, pois que o Tribunal exerceu a sua jurisdição no limite dos poderes que lhe estão legal e constitucionalmente dispostos.


Por outro lado, contrariamente ao sustentado pela Recorrente sob a conclusão 5.ª das suas Alegações de recurso, não divisamos por que termos é que o Tribunal a quo incorreu na violação do disposto no artigo 38.º, n.º 2 do CPTA, porquanto, e como assim emerge da fundamentação aportada na Sentença recorrida, o que está em causa é o pedido de reconhecimento de um direito, o que assim resulta assaz fundamentado.

Ou seja, a CGA não poderia ter deixado de ter e manter a inscrição da Autora como beneficiária, e sempre e de todo o modo, caso assim tivesse prosseguido, sempre deveria ter prolatado acto administrativo nesse sentido, o que assim não resulta do probatório.

Finalmente, em torno do vertido nas conclusões 8.ª a 11.ª, e em particular no que é atinente à invocada aprovação de uma Proposta de Lei na reunião de Conselho de Ministros realizada em 05 de setembro de 2024, e no que pela mesma era visado, sabe e conhece este Tribunal de recurso que entretanto entrou em vigor a Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro.

Porém, estando em apreço neste Tribunal Superior um recurso jurisdicional que visa impugnar a Sentença recorrida que aplicou o direito pré-vigente, e por outro lado, que aquele recente diploma legal, já publicado após a prolação da Sentença recorrida [datada de 06 de novembro de 2024] convoca no seu articulado a apreciação de diferentes termos e pressupostos para efeitos da aplicação do regime jurídico nele vertido, de que ressaltamos os elencados sob a alínea b) do n.º 2 do seu artigo 2.º, julgamos que estamos perante a invocação de questão nova por parte da Recorrente, pois que quanto à mesma não foi suscitado o seu julgamento por parte do Tribunal a quo, dada a evidência lógica e temporal da invocada matéria, o que assim se compreende.

Como assim dispõe o artigo 627.º, n.º 1 do CPC, as decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos, para efeitos de poderem ser evidenciadas perante o Tribunal Superior as irregularidades de que a Sentença pode enfermar [que se reportam a nulidades que afectam a Sentença do ponto de vista formal e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade], assim como os erros de julgamento de facto e/ou de direito, que por si são resultantes de desacerto tomado pelo Tribunal na formação da sua convicção em torno da realidade factual, ou da interpretação e aplicação do direito, em termos tais que o decidido não está em correspondência com a realidade fáctica ou normativa, sendo por isso que, com referência ao tempo em que o Tribunal a quo proferiu a Sentença recorrida, a matéria de facto assim como o direito por ele convocado não merecem censura alguma em face da solução jurídica por si alcançada.

Daí que o julgamento prosseguido pelo Tribunal a quo, não é merecedor da censura que que vem imputada pela Recorrente CGA, como assim patenteado nas conclusões das respectivas Alegações de recurso, sendo por isso de confirmar, mantendo-se assim a Sentença recorrida.

Efectivamente, em conformidade com a jurisprudência, firme e reiterada, tirada pelos Tribunais Superiores desta jurisdição administrativa, julgamos que a interpretação do direito prosseguida pelo Tribunal a quo em torno do referido artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, assim como do artigo 22.º do EA, e a final, aquela que conduziu à solução jurídica por si alcançada, no sentido de que só haverá cancelamento da inscrição do subscritor na CGA que, tendo cessado o exercício de anterior cargo, não venha a ingressar no exercício futuro de outras funções públicas, é aquela se mostra mais consentânea com a Lei e o Direito, sendo assim de salientar que a argumentação de que se vale a Recorrente está desprovida de qualquer indício de conformidade legal, pois que a Autora não pode ser qualificada como nova subscritora, pois que já o era desde o ano de 2002, não podendo assim dar-se o cancelamento da sua inscrição enquanto subscritora, pois que veio a ser investida no exercício de funções públicas a que se reportava o artigo 1.º do EA.

Ou seja, o cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que torna a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo
22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].

De maneira que, tem assim, forçosamente, de improceder a pretensão recursiva da Recorrente, e de ser confirmada a Sentença recorrida, pelo que fica prejudicado o conhecimento da requerida ampliação do objecto do recurso, como peticionado pela Recorrida.

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E assim, formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro; Direito de inscrição na Caixa Geral de Aposentações; Lei n.º 45/2004, de 27 de dezembro; Questão nova.

1 – Como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.
2 - O cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que vem a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo 22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].
3 - No que é atinente à entrada em vigor da Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro, estando em apreço neste Tribunal Superior um recurso jurisdicional que visa impugnar a Sentença recorrida que aplicou o direito pré-vigente, e por outro lado, que aquele recente diploma legal, já publicado após a prolação da Sentença recorrida [datada de 06 de novembro de 2024], convoca no seu articulado a apreciação de diferentes termos e pressupostos para efeitos da aplicação do regime jurídico nele vertido, de que ressaltamos os elencados sob a alínea b) do n.º 2 do seu artigo 2.º, julgamos que estamos perante a invocação de questão nova por parte da Recorrente, pois que quanto à mesma não foi suscitado o seu julgamento por parte do Tribunal a quo, dada a evidência lógica e temporal da invocada matéria.

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IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Subsecção Administrativa Social da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pela Recorrente Caixa Geral de Aposentações, IP, confirmando assim a Sentença recorrida.

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Custas a cargo da Recorrente – Cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

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Notifique.
*
Porto, 24 de abril de 2025.

Paulo Ferreira de Magalhães, relator
Fernanda Brandão
Rogério Martins