Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00387/12.2BEVIS |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 06/05/2025 |
| Tribunal: | TAF de Viseu |
| Relator: | PAULA MOURA TEIXEIRA |
| Descritores: | IVA, CORREÇÕES ARITMÉTICAS; FALTA DE AUDIÇÃO, FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO; ÓNUS DA PROVA; |
| Sumário: | I. Como resulta dos termos o n.º 3 do art. º 60.º da LGT apenas dispensa a audição prevista na alínea a) do n.º 1 (anterior ao ato de liquidação), e não em qualquer das outras situações previstas nas alíneas b) a e) do n.º 1 do mesmo artigo. II. O n.º 1 do art.º 75.º do Lei Geral Tributária (LGT) consagra o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, presumindo-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei fiscal e comercial. III. A presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT). IV. Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a Administração Tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos ou, quando tal não seja possível, a métodos indiretos. V. No entanto, e por força do art.º 74.º da LGT, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Conceder parcial provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO A Recorrente, [SCom01...], UNIPESSOAL, LDA., NIPC ...60, com sede na Rua ..., ... ..., interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra os despachos do Senhor Subdiretor, por subdelegação, datados de 19/03/2012, que negaram provimento aos recursos hierárquicos interpostos das decisões de indeferimento das reclamações graciosas apresentadas contra os atos de liquidação de IVA referentes aos exercícios de 2008 e 2009 e respetivos juros compensatórios, no montante global de 29.262,21 €. A Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…) 1. O presente recurso vem interposto de douta sentença que julgou improcedente a impugnação apresentada contra as liquidações de IVA, referentes aos exercícios de 2008 e 2009 e absolveu a Fazenda Pública. 2. A Administração Tributária, através dos ofícios n.ºs ...81 e ...83, de 2011/07/26, comunicou à recorrente que poderia, querendo, exercer o direito de audição sobre o projecto de decisão, exigindo, contudo que tal direito fosse exercido por escrito (facto provado E). 3. Ora, de acordo com o disposto nos artigos 60.°, n.° 5, da LGT e 60.°, ambos do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), o direito de audição tanto pode ser exercido por escrito como oralmente, cabendo ao contribuinte a opção pelo modo de o exercer. 4. O direito de audição foi, desta forma, inviabilizado, já que a Administração Tributária obrigou a que fosse exercido "por escrito", impedindo que se fizesse "oralmente". 5. Como evidencia o probatório da douta sentença, é manifesto que esta se apoiou no relatório da inspeção tributária mas não discriminou os factos e inexatidões que a Administração Tributária detetou. 6. A mesma sentença não se pronuncia sobre diversas situações referenciada nos artigos que tratam desta ilegalidade, designadamente nos artigos 50.° a 60.° da impugnação judicial. 7. Salvo o devido respeito, não se vê qual a fundamentação da douta decisão, pois, se por um lado, a AT faz fé nas palavras do SP, no que lhe é desfavorável já descridibiliza as suas palavras. 8. De facto, se por um lado tem-se em conta as declarações prestadas pelo SP, segundo as quais "o integrador [SCom02...], LD.ª garantia o preço mínimo do serviço prestado, de € 0,175 por cada frango entregue", por outro lado, não se teve em conta as suas declarações segundo as quais "o integrador não cumpriu o acordado verbalmente, recusando-se a pagar a totalidade dos serviços prestados" (facto provado A). 9. Daí, a recorrente apenas facturou o valor recebido por si efectivamente: não basta já ter sido prejudicada pelo facto de não ter recebido o que tinha sido previamente acordado com o integrador, como ainda fica prejudicada por ter de entregar imposto que não logrou receber, 10. Esquecendo-se a Administração Tributária que o IVA é um imposto indirecto que deve ser pago pelo consumidor final. 11. O certo é que, em parte alguma a AT põe em causa que o SP não recebeu efectivamente tal valor, contudo, ainda assim, pretende arrecadar tal valor que bem sabe não ter sido recebido. 12. O facto da AT ter justificado as correcções aritméticas efectuadas, a verdade é que não logrou fundamentar as razões que lhe permitiram recorrer a essas correcções, já que em parte alguma é atestado que o SP recebeu o valor liquidado. 13. Também, a liquidação dos juros compensatórios não obedece à fundamentação legal exigida. 14. Admitindo-se, por mera hipótese que o SP de facto não consegue demonstrar os suprimentos efectuados, tal não leva automaticamente a que tais valores sejam provenientes da venda de produtos derivados da madeira.... 15. Tal facto carece de fundamento e respectiva prova.... contudo, a AT não só não fundamenta, como também não prova, mas não se inibe de liquidar tais valores. 16. A douta sentença restringiu-se a considerações vagas, remetendo-se tão só para os fundamentos, invocados no Relatório da Administração Tributária, quando este, por sua vez, já padecia do vício da falta de fundamentação. 17. Face ao que fica referido, é certo que não se teve em conta que, em sede de fundamentação dos actos tributários, a lei impõe, quer a chamada fundamentação substancial (pressupostos reais e motivos concretos aptos a suportarem uma decisão legítima de fundo), quer a fundamentação formal do acto administrativo. 18. A Administração Tributária não teve, assim, em atenção que lhe cabe o ónus da prova material dos pressupostos das liquidações que, por não concretizados, gera fundada dúvida sobre a existência e qualificação do acto tributário. 19. Não foi facultada a audição prévia à decisão de recurso hierárquico, em claro desrespeito pelo disposto na lei e na circular n.° 17/2008, de 14 de Fevereiro, Série II, da Divisão de Documentação e Relações Públicas, da DGAIC, da DGCI. 20. Realce-se que, sendo um caso que afecta os direitos do contribuinte, por imperativo constitucional previsto no artigo 267. ° n.° 5 da CRP, a audição tem de ser sempre levada à prática, 21. É evidente que, foi vedado à recorrente o direito de audição, em todas as fases deste processo e, a douta decisão ao considerar o contrário, incorreu em erro de julgamento. 22. A recorrente invocou a falta de fundamentação legalmente exigida e a ausência de notificação de elementos essenciais, em sede de reclamação graciosa e em sede de impugnação judicial. 23. Nunca a Administração Tributária lhe notificou quaisquer dos elementos solicitados, limitando-se apenas a indeferir a reclamação apresentada, tal como aliás o fez com a impugnação judicial. 24. Assim, tudo se mantendo por esclarecer, numa demonstração clara de que a Administração Tributária considerou despiciendos os deveres de colaboração e informação a que está obrigada, para além de não ter cumprido o artigo 37.°, n.° 1 do CPPT. 25. A Administração Tributária não logrou afastar a presunção de veracidade de que goza a escrita da impugnante, não fornecendo, assim, os pressupostos para a determinação da matéria colectável por métodos de tributação. 26. Como fundamentação para as correcções efectuadas é mencionado que os valores apresentados revelam-se "insuficientes para compensar minimamente os custos suportados com a criação dos frangos", 27. Ora, com todo o respeito, tal fundamentação não se mostra suficiente para justificar o recurso a métodos directos para a determinação da matéria tributável, pois é consabido que em face da conjuntura económica, nem sempre as empresas logram obter lucros, não sendo tal razão para se pôr em causa a escrita do contribuinte, corrigindo-se os valores apresentados por si. 28. Por outro lado, não é porque a recorrente não consegue demonstrar a existência de suprimentos que tal desobriga a recorrida de fundamentar e provar que aqueles valores consubstanciam proveitos omitidos. 29. A douta sentença violou ou deu errada interpretação ao disposto nos artigos 35°, 54°, 55°, 56°, 59°, 60°, 74°, 77°, 81°, 87°, 88° e 98°, todos da LGT, 60.° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), 37° do CPPT, 7°, 124° e 125°, todos do CPA, 267° da CRP, e ao estabelecido na circular n.° 17/2008, de 14 de Fevereiro, Série II, da Divisão de Documentação e Relações Públicas, da DGAIC, da DGCI, incorrendo, em consequência, em erro de julgamento. 30. O que conduz inevitavelmente á nulidade da sentença, nos termos do disposto no artigo 125.°, n.° 1 do CPPT. Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, ser revogada a douta Sentença, proferida em la Instância, e substituída por outra que defira a impugnação judicial apresentada. ASSIM SE FAZENDO A ACOSTUMADA JUSTIÇA (…)” O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso por não se verificarem os vícios alegados. Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, com o seu consentimento, submetendo-se à Conferência para julgamento. 2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito: (i) por violação do direito de audição antes da liquidação, (ii) Por falta de fundamentação; (iii) por violação do direito de audição no recurso hierárquico; (iv) erro nos pressupostos das correções aritméticas. 3. JULGAMENTO DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “(…) A) A impugnante foi objeto de uma ação de inspeção levada a cabo pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças ..., no âmbito da qual foi elaborado o relatório de inspeção tributária constante de fls. 24/44 dos processos de reclamação graciosa apensos aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, destacando-se o seguinte: [...] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] B) Na sequência da ação de inspeção a que se alude em A) foram emitidas as seguintes liquidações: a. Liquidação n.º ...29, referente ao período 0803T, no montante de 410,40 €; b. Liquidação n.º ...28, referente ao período 0803T, no montante de 3.790,41 €; c. Liquidação n.º ...31, referente ao período 0806T, no montante de 370,94 €; d. Liquidação n.º ...30, referente ao período 0806T, no montante de 3.790,41 €; e. Liquidação n.º ...33, referente ao período 0809T, no montante de 317,28 €; f. Liquidação n.º ...32, referente ao período 0809T, no montante de 3.609,91 €; g. Liquidação n.º ...35, referente ao período 0812T, no montante de 281,28 €; h. Liquidação n.º ...34, referente ao período 0812T, no montante de 3.609,91 €. i. Liquidação n.º ...37, referente ao período 0903T, no montante de 194,12 €; j. Liquidação n.º ...36, referente ao período 0903T, no montante de 2.843,24 €; k. Liquidação n.º ...39, referente ao período 0906T, no montante de 164,83 €; l. Liquidação n.º ...38, referente ao período 0906T, no montante de 2.843,23 €; m. Liquidação n.º ...41, referente ao período 0909T, no montante de 136,48 €; n. Liquidação n.º ...40, referente ao período 0909T, no montante de 2.843,24 €; o. Liquidação n.º ...43, referente ao período 0912T, no montante de 148,61 €; p. Liquidação n.º ...42, referente ao período 0912T, no montante de 3.907,92 €. - cfr. fls. 2 dos processos de reclamação graciosa apensos aos autos e fls. 146/150, 153/156 e 160/161 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. C) Em 12/07/2011 a impugnante apresentou reclamação graciosa contra os atos de liquidação identificados em B), nos termos e com os fundamentos que constam de fls. 4/18 dos processos de reclamação graciosa apensos aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. D) Em 26/07/2011 a Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ... emitiu informações com o seguinte teor: [...] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] - cfr. fls. 59/61 dos processos de reclamação graciosa apensos aos autos. E) Através dos ofícios n.ºs ...81 e ...83, datados de 26/07/2011, a impugnante foi notificada, na pessoa do seu mandatário judicial, para exercer o seu direito de audição prévia sobre os projetos de decisão referidos em D), mediante exposição escrita, no prazo de 10 dias a contar da notificação - cfr. fls. 62/63 dos processos de reclamação graciosa apensos aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. F) A impugnante pronunciou-se sobre os projetos de decisão mencionados em D), através dos requerimentos constantes de fls. 64/69 dos processos de reclamação graciosa apensos aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. G) Em 10/08/2011 a Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ... emitiu informações com o seguinte teor: [...] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] - cfr. fls. 70 dos processos de reclamação graciosa apensos aos autos H) Sobre as informações mencionadas em G), recaíram despachos de concordância do Sr. Chefe de Divisão, por delegação do Sr. Diretor de Finanças ..., exarados em 10/08/2011 - cfr. fls. 71 dos processos de reclamação graciosa apensos aos autos. I) Em 12/09/2011, a impugnante interpôs recursos hierárquicos contra os despachos de indeferimento das reclamações graciosas a que se alude em H), nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 2/14 dos processos de recurso hierárquico apensos aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. J) Em 06/12/2011, pela Divisão de Administração II, da Direção de Serviços do IVA foram emitidas as informações n.ºs ...81 e ...82, constantes de fls. 19/34 dos processos de recurso hierárquico apensos aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, destacando-se o seguinte: [...] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [...] K) Sobre as informações mencionadas em J), foram exarados despachos de concordância da autoria do Sr. Subdiretor Geral, datados de 19/03/2012 - cfr. fls. 19 dos processos de recurso hierárquico apensos aos autos. L) A impugnante foi notificada dos despachos a que se alude em K), na pessoa do seu mandatário judicial, através dos ofícios n.ºs ...78 e ...88, de 27/03/2012, expedidos por correio registado com avisos de receção assinados em 28/03/2012 - cfr. fls. 35/36 dos processos de recurso hierárquico apensos aos autos. M) A petição inicial da presente impugnação judicial deu entrada no Serviço de Finanças ... em 26/06/2012 - cfr. carimbo aposto a fls. 5 dos autos. Factos não provados Não se provaram quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa. (…)” 4. JULGAMENTO DE DIREITO 4.1. A Recorrente alega nas conclusões 2. a 4., que a Administração Tributária através dos ofícios n.ºs ...81 e ...83 de 26/07/2011 comunicou-lhe que poderia exercer o direito de audição sobre o projeto decisão, exigindo contudo, que tal direito fosse exercido por escrito. E que de acordo com o disposto no artigo 60.º n.º 5 da LGT e 60.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT) o direito à audição tanto pode ser exercido por escrito como oralmente cabendo ao contribuinte a opção pelo modo de o exercer. Que o direito de audição foi inviabilizado já que a Administração Tributária obrigou a que fosse exercido “por escrito” impedindo que se fizesse “oralmente”. Vejamos. Relativamente à questão da ilegalidade do direito de audição previamente ao indeferimento da reclamação graciosa, a sentença recorrida após fazer uma análise do quadro de legal e doutrinal e jurisprudencial concluiu que “(…) Assim sendo, as notificações efetuadas pela Direção de Finanças ... para o exercício do direito de audição prévia sobre o projeto de indeferimento das reclamações graciosas, mediante exposição escrita, não só são legais, como asseguram perfeitamente o direito de pronúncia da impugnante. Refira-se, aliás, que ainda que a impugnante exercesse o direito de audição prévia oralmente, as suas declarações sempre seriam reduzidas a escrito, conforme preceituado nos artigos 45.º, n.º 3 do CPPT. Ante o exposto, sem necessidade de maiores considerações, improcede nesta parte a presente impugnação.” E desde já se diga que a sentença não nos merece censura. Com efeito da interpretação conjunta dos art.ºs 60.º da LGT, 45.º do CPPT, e do 60.º do RCPIT, resulta que no procedimento tributário afasta-se, em regra, da prática de atos orais, no entanto, há casos em que os mesmos são admitidos, nomeadamente no exercício do direito de audição, nos termos do n.° 5 do art.º 60.º da LGT e do nº 2 do art.º 45.º do CPPT, sendo reduzidas a termo. Importa trazer à colação a jurisprudência do acórdão do STA proferido no processo n.º 0109/12 de 19/02/2014, aliás citado na sentença, na qual consta que: “(…) 4.2. Da conjugação destes normativos [art.ºs 60.º da LGT, 45.º do CPPT e do 60.º do RCPIT] resulta que embora no procedimento tributário (diversamente do que sucede no procedimento administrativo – cfr. arts. 90º e 126º do CPA) se afaste, em regra, a prática de actos orais, há casos em que os mesmos são admitidos, como é o caso, no procedimento de avaliação indirecta da matéria tributável, da reunião de peritos a que se referem os arts. 91º, nº 3, e 92º, nº 1, da LGT, ou o do exercício do direito de audiência, nos termos do n° 5 do art. 60º da LGT e do nº 2 do art. 45º do CPPT. Mas, segundo se infere do nº 2 deste art. 45º do CPPT será a entidade instrutora do procedimento a determinar se o direito de audição deve ser exercido oralmente ou por escrito, conforme o objectivo do procedimento, pois é ela que, no âmbito dos seus poderes de direcção e de harmonia com o princípio do inquisitório (art. 58º da LGT), determina as diligências a efectuar para atingir esse objectivo. (Sobre esta matéria, cfr. Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária, Anotada e comentada, 4ª Edição, 2012, Encontro da Escrita Editora, Anotação 12 ao art. 54º, p. 444/445; bem como Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. I, 6ª ed., Áreas Editora, 2011, anotação 6 ao art. 45º, pp. 429/430.) Nos casos de audiência oral, as declarações do contribuinte serão reduzidas a termo (art. 45°, nº 3, do CPPT) e também a regra do procedimento ter forma escrita, impõe que seja reduzida a escrito a posição oralmente assumida pelo interessado no exercício do direito de audiência. E, também não se prevê no âmbito do processo tributário que a AT convoque o interessado para audiência oral (diversamente do que se dispõe no nº 1 do art. 102º do CPA), prevendo-se antes, em todos os casos, que ao titular do direito de audiência seja concedido um prazo para o seu exercício (nº 4 do art. 60º da LGT) e parecendo de concluir que «embora o titular do direito de audiência tenha de adoptar a forma oral de exercício do direito de audiência, quando tal for considerado mais conveniente pela autoridade instrutora, poderá escolher a ocasião para exercer tal direito, dentro do limite temporal fixado.» Ora, no caso vertente, tendo a AT indicado como forma para exercício do direito de audição, a forma escrita e tendo a recorrente exercido esse direito, no prazo legal (e sem, então, ter sequer questionado a forma de exercício do mesmo direito) então, mesmo que eventualmente se considerasse preterição de formalidade legal o não se ter indicado que o direito podia também ser exercido oralmente, não se vislumbra que essa circunstância haja coarctado qualquer direito da recorrente, até porque, de todo o modo, se esta tivesse optado por exercer apenas oralmente o direito, as respectivas declarações sempre seriam obrigatoriamente reduzidas a escrito.(…)” Como resulta do probatório, nos factos C), D), E), F), e G), a Recorrente nas reclamações graciosas foi notificada para audição escrita, sem, contudo, questionar esta forma, tendo exercido o direito pela forma escrita, cujos argumentos foram ponderados na decisão final, pelo que os seus direitos não foram coartados. No final das motivações das suas alegações concluiu a Recorrente que a preterição de tal formalidade conduz inevitavelmente à nulidade da sentença, nos termos do artigo 125.º n.º 1 do CPPT. Desde já se diga que, ao ocorrer erro este configuraria um erro de julgamento de direito e não uma nulidade de sentença, uma vez que está ligada à validade intrínseca da sentença e não ao erro de julgamento. Destarte improcede a pretensão da Recorrente. 4.2. Nas conclusões 5. a 18. alega, entre outros argumentos, que é manifesto que a sentença recorrida se apoiou no relatório de inspeção tributária, mas não discrimina os factos e inexatidões que a Administração detetou. Que a sentença não se pronunciou sob diversas situações referenciadas nos artigos que tratam desta ilegalidade nomeadamente, nos artigos 50º e 60.º da impugnação judicial. Alega que não se vê qual a fundamentação da douta decisão pois por um lado a AT faz fé nas palavras do sujeito passivo, no que lhe é desfavorável já descredibiliza as suas palavras. E que o facto de ter justificado as correções aritméticas efetuadas, a verdade é que não logrou fundamentar as razões que lhe permitiram recorrer a essas correções já que em parte alguma é atestada que o sujeito passivo recebeu o valor liquidado. A douta sentença restringiu-se a considerações vagas, remetendo-se tão só para os fundamentos, invocados no Relatório da Administração Tributária, quando este, por sua vez, já padecia do vício da falta de fundamentação. E que se, é certo que não se teve em conta que, em sede de fundamentação dos atos tributários, a lei impõe, quer a chamada fundamentação substancial (pressupostos reais e motivos concretos aptos a suportarem uma decisão legítima de fundo), quer a fundamentação formal do ato administrativo. E que a Administração Tributária não teve, assim, em atenção que lhe cabe o ónus da prova material dos pressupostos das liquidações que, por não concretizados, gera fundada dúvida sobre a existência e qualificação do ato tributário. Apreciando. A Recorrente parece confundir a falta de fundamentação da sentença recorrida com a falta de fundamentação do ato tributário, o que são realidades diferentes. E ainda parece imputar à sentença recorrida omissão de pronúncia sobre as diversas situações referenciadas nos artigos 50.º e 60.º da impugnação judicial. A falta de fundamentação da sentença e omissão de pronúncia configuram nulidades de sentença previstas no art.º 615.º do CPC, que podem conduzir à sua anulação. Da simples leitura da sentença, pode-se concluir que se encontra sobejamente fundamentada quer de facto quer de direito e também não ocorre qualquer falta de pronúncia pois a sentença no item ii) Vicio de forma, por falta de fundamentação, trata dessa mesma questão, no qual foi apreciado o invocado erro de falta de fundamentação dos atos de liquidação de IVA e correspondentes juros compensatórios. Da leitura dos artigos 50.º a 60.º, da petição inicial constam os argumentos esgrimidos pela Recorrente, com vista a convencer o Tribunal a quo que os atos não se encontravam fundamentados, porém não podemos deixar de relembrar que o tribunal, tem a obrigatoriedade de resolver todas as questões que lhe são equacionadas, mas não tem que responder a todos os argumentos aventado pelas partes. No que concerne ao eventual erro de julgamento do vício de forma, por falta de fundamentação do ato tributário dispõe o nº 3 do art.º 268º, da CRP, que: “[o]s actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos”. O art.º 77.º da LGT dispõe que “1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária. 2 - A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.”. Dos referidos normativos resulta que a fundamentação do ato tributário há-de ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão, clara/acessível, permitindo que, através dos seus termos, se compreendam os factos e o direito com base nos quais se decide, suficiente, possibilitando ao contribuinte um conhecimento concreto da motivação do ato; e congruente, de modo que a decisão constitua a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação. Sendo essencial que dê a conhecer ao seu destinatário todo o percurso cognitivo e de valorativo dos pressupostos de facto e de direito que suportam a decisão ou os motivos por que se decidiu num determinado sentido. As exigências de fundamentação variam de acordo com o tipo de ato e as circunstâncias concretas em que este foi proferido bastando-se, com a expressão clara das razões que levaram a determinada decisão, não tendo de reportar, a todos os factos considerados, vicissitudes ocorridas e a todas as ponderações feitas durante o procedimento que conduziu à decisão. A fundamentação pressupõe, portanto, a busca de um conteúdo adequado, que há-de ser, suficiente para sustentar formalmente a decisão administrativa. Trata-se de permitir ao destinatário normal a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão. Sendo jurisprudência reiterada e consolidada dos tribunais superiores, nomeadamente do acórdão do STA n.º 060/10 de 06.10.2010, TCAN 00035/04 de 11.11.2004 vasta jurisprudência aí citada e 0190/06.3 BEVIS de 16.10.2014. No entanto como refere o Acórdão do STA n. º060/10 de 06.10.2010 “(…) não deve confundir-se a suficiência da fundamentação com a exactidão ou a validade substancial dos fundamentos invocados. É que, como adverte Sérvulo Correia In “Noções de Direito Administrativo”, I, pág. 403., «a fundamentação pode ser inexacta e ser suficiente, por permitir entender quais os pressupostos de facto e de direito considerados pelo autor do acto. Deste modo, a inexactidão dos fundamentos não conduz ao vício de forma por falta de fundamentação. Ela pode sim revelar a existência de outros vícios, como o vício de violação de lei por erro de interpretação ou aplicação de norma, ou (...) por erro nos pressupostos de facto». Por conseguinte, o discurso fundamentador tem de ser capaz de esclarecer as razões determinantes do acto, para o que há-de ser um discurso claro e racional; mas, na medida em que a sua falta ou insuficiência acarreta um vício formal, não está em causa, para avaliar da correcção formal do acto, a valia substancial dos fundamentos aduzidos, mas só a sua existência, suficiência e coerência, em termos de dar a conhecer as razões da decisão.” (sublinhado nosso). Da interpretação conjugada dos artºs 268º, nº 3 da CRP, e 77.º da LGT, a fundamentação do ato tributário há-de ser expressa, clara, suficiente, congruente e contextual e permita ao destinatário do ato perceber o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão. A fundamentação formal do ato não se confunde com a valia substancial dos fundamentos aduzidos na motivação do ato. E como bem refere a sentença recorrida “(…) Com efeito, analisado o teor do relatório de inspeção tributária, constata-se que o mesmo explicita as razões que estiveram na origem das correções aritméticas efetuadas à matéria tributável, as quais se traduziram, em suma, no acréscimo de proveitos obtidos a título de vendas de derivados da atividade exercida a título acessório, do montante de 72.198,28 €, relativamente ao exercício de 2008, e no acréscimo de proveitos, a título de serviços prestados, na criação dos bandos de frangos referidos nas faturas n.º 142, de 15/10/2004 e n.º 154, de 05/12/2009, no montante de 5.323,40 €, correção ao valor das existências finais dum bando em final de criação, no valor de 7.297,48 € e ainda no acréscimo de proveitos, obtidos a título de vendas de derivados da madeira, no valor de 56.864,70 €, relativamente ao exercício de 2009. Não se vislumbra, pois, onde reside o invocado vício de falta de fundamentação. De igual modo, no âmbito dos procedimentos decisórios de segundo grau, constata-se que a Administração Tributária estribou as decisões de indeferimento das reclamações graciosas apresentadas contra os atos de liquidação em crise e as decisões que negaram provimento aos recursos hierárquicos interpostos daquelas decisões, essencialmente, nas conclusões vertidas no relatório de inspeção, para o qual remetem. Não se olvida que o dever de fundamentação dos atos tributários importa uma obrigação de pronúncia sobre os argumentos e/ou elementos factuais e jurídicos trazidos pelos interessados, sob pena de ocorrer vício de forma, por deficiência de fundamentação [cfr. artigo 60.º, n.º 7 da LGT]. Sucede que a impugnante, tanto nas reclamações graciosas, como nos recursos hierárquicos interpostos, não aduziu quaisquer argumentos suscetíveis de influir no reexame da decisão final, limitando-se a invocar, para além da falta de fundamentação dos atos de liquidação, a preterição de formalidades legais [preterição do direito de audição prévia e invalidade da notificação], questões que foram concretamente apreciadas pela Administração Tributária em ambos os procedimentos decisórios, tendo-se aí concluído pela inexistência das invocadas ilegalidades. No que tange às liquidações de juros compensatórios, importa chamar à colação o artigo 35.º, n.º 9 da LGT que dispõe que “a liquidação deve sempre evidenciar claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respetivo cálculo e distinguindo-o de outras prestações devidas”. Constitui entendimento jurisprudencial firmado que a liquidação de juros compensatórios deverá conter a indicação da quantia sobre que incidem os juros, o período de contagem e a taxa aplicada, para além das normas legais em que assenta a liquidação desses juros [cfr., inter alia, os acórdãos 29/02/2012, 16/10/2010, 21/04/2010 e 07/01/2009, proferidos nos processos n.ºs 0928/11, 0830/10, 0743/09 e 0871/08]. Como se escreveu no acórdão de 30/11/2011, proferido no processo n.º 0619/11, “Como é sabido, as exigências de fundamentação variam conforme as circunstâncias concretas, designadamente o tipo de ato, a não participação do interessado no procedimento anterior ao ato ou, no caso da participação, a extensão desta. No que respeita aos juros compensatórios, admitimos que as exigências de fundamentação sejam reduzidas ao mínimo. Eventualmente, ainda que com algumas reservas, admitimos que nem sequer se exija a referência à norma legal ao abrigo do qual os juros foram liquidados, pois é do conhecimento geral que se o atraso na liquidação do imposto devido for imputável ao contribuinte há lugar à liquidação de juros compensatórios. Admitimos ainda que se considere que a fundamentação do “atraso na liquidação por motivo imputável ao contribuinte” se baste com a mera referência ao ato omitido que o originou, ou seja, com a referência – que a sentença na alínea B) do probatório], verifica-se que as mesmas explicitam claramente a sua forma de cálculo, discriminando o montante do imposto sobre o qual incidiram os juros, o período de contagem e o regime legal aplicável, permitindo-lhe, assim, conhecer, em toda a sua extensão, as razões que lhes subjazem.(…)” No que concerne ao eventual erro de julgamento do vício de forma, por falta de fundamentação do ato tributário a sentença recorrida analisou detalhadamente o quadro legal, jurisprudencial e factual e analisado cada uma das situações concluindo que os atos de liquidação se encontram devidamente fundamentadas. Nesta conformidade, o julgamento efetuado não nos merece qualquer censura, pelo que improcede a pretensão da Recorrente. 4.3. Nas conclusões 19. a 21., a Recorrente traz à colação, o direito de audição no recurso hierárquico, em claro desrespeito pelo disposto na lei e na circular n.º 17/2008 de 14 de fevereiro. Sendo um caso que afeta os direitos do contribuinte por imperativo constitucional prevista no artigo 267.º n.º 5 da CRP, a audição tem de ser sempre levada à prática. E que lhe foi vedado o direito à audição em todas as fases desse o processo e a douta decisão ao considerar ao contrário incorreu em erro de julgamento. Os factos tributários reportam aos anos de 2008 e 2009, pelo que importa verificar qual era o regime em vigor nessa data. Dispunha o n.º 3 do art.º 60.º da LGT, na redação da lei n.º 16-A/2002 de 31 de maio que: “Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado”. Como se concluiu no acórdão do STA n.º 670/12 de 16.01.2013, “I - O nº 3 do art. 60º da LGT, com a redacção introduzida pela Lei nº 16-A/2002, de 31 de Maio, assume carácter de norma interpretativa, que lhe é atribuído pelo art. 13º, n.º 2, da mencionada lei, visando esclarecer que o direito de audição prévia consagrado no art. 60º só impõe nova audição do contribuinte ante a existência de factos que não tiverem sido anteriormente objecto de contraditório, como já era jurisprudência relevante no âmbito da redacção originária daquele preceito legal. II - Assim, nos termos do art. 60º da LGT, tanto na sua versão original como na redacção introduzida pela Lei nº 16-A/2002, de 31 de Maio, tendo o contribuinte sido notificado para exercer o direito de audição em determinada fase do procedimento administrativo, apenas terá de ser notificado para exercer de novo esse direito se ocorrerem factos novos.(…)” Como resulta dos termos o n.º 3 do art. º 60.º da LGT apenas dispensa a audição prevista na alínea a) do n.º 1 (anterior ao ato de liquidação), e não em qualquer das outras situações previstas nas alíneas b) a e) do n.º 1 do mesmo artigo. Salvo em casos em que essa intervenção no processo de formação da decisão se afigurar, com segurança, totalmente desnecessária, por inútil, se poderá admitir a sua dispensa. Como refere o acórdão do STA n.º 0406/13 de 04.10.2017, “(...) O n.º 3 do art. 60.º da LGT dispõe: «Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado». Como resulta da letra da norma («é dispensada a sua audição antes da liquidação»), a dispensa da audiência aí prevista refere-se ao procedimento de liquidação e ao momento anterior à prática do acto final desse procedimento (a liquidação propriamente dita). Ora, no caso, como deixámos já dito, não é o direito de audiência antes da liquidação que está em causa; é esse direito relativamente ao recurso hierárquico (rectius, o exercício desse direito previamente à decisão do recurso hierárquico) que foi interposto da decisão da reclamação graciosa deduzida contra a liquidação. Assim, não vislumbramos como possa aplicar-se aquele normativo à situação sub judice. Como resulta dos seus termos e deixámos já dito, o n.º 3 do art. 60.º da LGT apenas dispensa a audição prevista na alínea a) do n.º 1 (i.e., a que é anterior ao acto de liquidação), e não em qualquer das outras situações previstas nas alíneas b) a e) do n.º 1 do mesmo artigo. (…) Deixámos já dito que, a nosso ver, a dispensa da audiência do contribuinte antes da decisão do recurso hierárquico não pode ser justificada com base no n.º 3 do art. 60.º da LGT. Também não encontramos fundamento legal para que o facto de ter sido concedida ao Contribuinte a oportunidade de exercer o direito de audiência previamente à decisão da reclamação graciosa dispense a audiência previamente à decisão do recurso hierárquico. Só assim não seria caso a decisão do recurso hierárquico houvesse sido totalmente favorável ao Contribuinte, hipótese em que a alínea a) do n.º 2 do art. 60.º da LGT prevê a dispensa da audiência prévia, o que não foi o caso. Na verdade, sendo que a decisão do recurso hierárquico foi no sentido do deferimento parcial, a alínea b) do n.º 1 do referido art. 60.º da LGT impunha a audiência prévia. Por outro lado, apesar de ambos os procedimentos em causa – de reclamação graciosa e de recurso hierárquico – se destinarem à reavaliação da liquidação adicional, não podemos afirmar que a solução preconizada em cada um deles seja a mesma, como resulta manifesto da divergência de decisões neles proferidas: enquanto no primeiro a decisão foi de improcedência, no segundo a decisão foi de parcial procedência. O que significa que a argumentação jurídica considerada não foi a mesma ou, pelo menos, não foi integralmente a mesma ou não foi ponderada no mesmo sentido. Ora, sendo certo que há doutrina (Cfr. LIMA GUERREIRO, ob. cit., que sustenta que nos procedimentos de segundo grau apenas há lugar ao direito de audiência quando «se abrir nova fase instrutória», não existindo esse direito «quando a decisão se deva basear nos mesmos factos em que fundamentou a decisão anterior» (nota 11 ao art. 60.º, pág. 277).) e jurisprudência (Cfr. a jurisprudência invocada pela Recorrente e pelo Procurador-Geral Adjunto.) que restringem o exercício do direito de audiência em sede de procedimento de segundo grau aos casos em que há novos factos a motivar a decisão, nada na lei permite concluir que o direito de audiência se pode dispensar quando haja apenas matéria de direito a considerar na decisão a proferir. Como diz JORGE LOPES DE SOUSA, «há que notar que não é apenas quando a decisão se fundamenta em factos não afirmados pelos interessados que se justifica o direito de audiência, pois o direito de participação na formação na decisão constitucionalmente reconhecido reporta-se à sua globalidade, abrangendo por isso, o direito de este se pronunciar sobre qualquer questão de direito relativamente à qual não haja sintonia entre a sua posição e a que a administração tributária pretende adoptar no procedimento tributário» (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, I volume, anotação 3 ao art. 45.º, pág. 426.). O mesmo Autor explica detalhadamente por que o direito de audiência não se justifica só nos casos em que haja apreciação de factos, mas também tem lugar nos casos em que tenha de haver apenas apreciação de questões de direito (Ibidem, sendo que o Autor, comentando a Circular n.º 13/99, de 8 de Julho de 1999 (disponível em http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/D9501C35-463A-420D-A531- 3D2C5DAF846A/0/circular_13_de_08-07-1999_direccao_de_servicos_de_justica_tributaria.pdf), designadamente os casos aí previstos sob a alínea a) das «Decisões sujeitas a audiência» – casos descritos como «As decisões que se fundamentam em factos não revelados nos pedidos, petições, reclamações ou recursos hierárquicos, apresentados pelos contribuintes» –, salienta que «em relação à situação referida na alínea a), há que notar que não é apenas quando a decisão se fundamenta em factos não afirmados pelos interessados que se justifica o direito de audiência, pois o direito de participação na formação na decisão constitucionalmente reconhecido reporta-se à sua globalidade, abrangendo por isso, o direito de este se pronunciar sobre qualquer questão de direito relativamente à qual não haja sintonia entre a sua posição e a que a administração tributária pretende adoptar no procedimento tributário».). No procedimento administrativo comum, a dispensa de audiência prévia nos procedimentos de 2.º grau, como o é o recurso hierárquico, quando o interessado se tenha já pronunciado sobre todos os factos ou questões relevantes para a decisão em anterior fase do procedimento, nomeadamente em procedimento de 1.º grau, e não haja factos ou elementos novos no recurso, tem vindo a ser sustentada ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do art. 103.º do CPA, na redacção anterior à do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro, à qual hoje corresponde o art. 100.º, n.º 3, alínea d). Como resulta do que deixámos já dito, entendemos que esse regime não tem aplicação no procedimento tributário. Na verdade, da alínea b) do n.º 1 do art. 60.º da LGT resulta, expressamente, o dever de proceder a audição prévia do interessado, em caso de indeferimento total ou parcial, nos procedimentos de 2.º grau. Por outro lado, se é certo que com a alteração efectuada ao art. 60.º da LGT pela Lei n.º 16A/2002, de 31 de Maio (primeira alteração à Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, que aprova o Orçamento do Estado para 2002), o legislador contemplou um caso de dispensa de audição prévia em termos idênticos aos previstos na alínea a) do n.º 2 do art. 103.º do CPA, não o é menos que, como resulta expressamente do n.º 3 do art. 60.º da LGT, restringiu-o às situações anteriores à liquidação. Ora, porque a LGT se assume como lei especial relativamente ao CPA, prevendo aquela Lei causas específicas de dispensa da audiência prévia, não pode considerar-se (Sobretudo após a redacção dada ao n.º 3 no art. 60.º pela Lei n.º 16-A/2002, de 31 de Maio.) que exista lacuna (Lacuna é uma «incompletude contrária ao plano do Direito vigente, determinada segundo critérios eliciáveis da ordem jurídica global» (cfr. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 194.).) alguma, a justificar uma eventual aplicação subsidiária do CPA. Não desconhecemos que a AT afirmou a desnecessidade de audição em sede dos procedimentos de segundo grau, na doutrina subscrita na Circular n.º 13/99, de 8 de Julho de 1999 (Ver nota 11 quanto ao local em que a mesma está disponível para consulta.), da Direcção de Serviços de Justiça Tributária, em cujo ponto 3 se afirma que a audiência «poderá ser dispensada», nomeadamente, nos casos em que «A administração tributária pratique um acto com base em factos já submetidos, noutra fase do procedimento, a audiência dos contribuintes» [alínea c)], e, explicando porquê, afirma que «a participação do contribuinte só deverá verificar-se mais uma vez quando haja factos novos e apenas no âmbito de um procedimento que tenha diversas fases ou vários procedimentos sequenciais. Neste sentido dispõe a alínea a) do artigo 103.º do CPA.//Assim, por exemplo, não deverá haver direito de audição antes de uma liquidação quando esta se fundamenta em correcções efectuadas em acção inspectiva, sempre que nesta fase do procedimento já tenha sido possibilitado o exercício daquele direito.//O mesmo acontece nos procedimentos de segundo grau, de que são exemplo as reclamações e os recursos hierárquicos, sempre que não existam factos novos capazes de influenciar a decisão final e o contribuinte já tenha sido ouvido sobre os factos em discussão, no procedimento objecto do recurso ou reclamação». Ou seja, segundo a doutrina veiculada pela referida circular, nos procedimentos de 2.º grau, designadamente nas reclamações graciosas e recursos hierárquicos, a audição do contribuinte só terá lugar quando o fundamento da decisão se basear em matéria de facto nova, i.e., em factos que não constavam do procedimento de primeiro grau. Se bem alcançamos a razão de ser dessa doutrina, a mesma assenta no princípio da unidade do procedimento: o direito de audição, nos procedimentos de segundo grau, apenas existirá se se abrir nova fase instrutória, e já não quando a decisão se basear nos mesmos factos que fundamentaram a decisão anterior. Salvo o devido respeito, a doutrina só pode valer caso a decisão a proferir no procedimento de 2.º grau seja substancialmente idêntica à que foi proferida no procedimento de 1.º grau. Assim não sendo, ou seja, quando a decisão a proferir no procedimento de 2.º grau não seja idêntica, quer nos seus pressupostos factuais, quer na solução ou soluções jurídicas das questões sob apreciação, àquela que foi proferida no procedimento de 1.º grau, não encontramos base legal que autorize restringir o direito (constitucionalmente consagrado e, por isso, insusceptível de eliminação ou compressão pelo legislador ordinário) de participação, designadamente não concedendo ao sujeito passivo que deduziu recurso hierárquico a possibilidade de exercer o direito de audição prévia à decisão com o fundamento de que essa possibilidade lhe foi já concedida previamente à decisão da reclamação graciosa. Note-se que o princípio da máxima efectividade das normas constitucionais impõe que lhes seja atribuído o sentido que lhes der maior eficácia (Cfr. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional – Teoria da Constituição, 3.ª edição, pág. 1149.). Aliás, a própria Circular n.º 13/99, depois de no seu n.º 3 logo alertar que «[a] audiência dos interessados poderá ser dispensada, sem prejuízo da necessária ponderação do caso concreto e de adequada fundamentação» (sublinhado nosso), no seu n.º 4 salienta que «[a]s orientações divulgadas nas presentes instruções não obstam a que, em caso de dúvida, se possibilite o exercício do direito de participação» Por outro lado, ulteriormente à referida circular e como bem referiu o Recorrido, a extinta Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (A Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, cuja orgânica constava do Decreto-Lei n.º 82/2007, de 29 de Março, foi extinta pelo Decreto-Lei n.º 118/2011, de 15 de Dezembro, diploma que aprovou a orgânica da Autoridade Tributária e Aduaneira, tendo esta última entidade sucedido nas atribuições daquela, como resulta do respectivo art. 12.º, n.º 1.), emitiu doutrina em sentido contrário, através da Circular n.º 17/2008, de 14 de Fevereiro de 2008. Aí, com os mesmos fundamentos que acima enunciamos, no ponto 6 afirma-se expressamente que «em sede de recurso hierárquico regido pelos arts. 66.º e segs. do CPPT, deverá ser efectuada audição prévia, mesmo que não sejam invocados factos novos relativamente à decisão recorrida e o interessado já tenha sido ouvido em audição prévia em procedimento de 1.º grau, sob pena de invalidade do acto final de indeferimento do recurso». Por tudo o que deixámos dito, afigura-se-nos que bem decidiu a sentença ao concluir que a falta de audição da recorrida antes da decisão de indeferimento do recurso hierárquico que havia interposto consubstancia preterição de formalidade essencial com efeitos invalidantes, mas apenas sobre o recurso hierárquico, que não sobre a liquidação (Neste sentido, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - de 15 de Outubro de 2008, proferido no processo n.º 542/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 11 de Fevereiro de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2008/32240.pdf), págs. 1178 a 1182, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d726eabf7a9010b1802574e90 03a104a; - 27 de Janeiro de 2016, proferido no processo n.º 174/15, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/29e85eee45a6d43480257f4e0 03e6834.), uma vez que, obviamente, a verificação de um vício de forma em sede de recurso hierárquico não se repercute na legalidade da liquidação, acto anterior.(…)” Baixando ao caso dos autos e como resulta da matéria de facto provada nas alíneas C) a H) das liquidações efetuadas, foi interposta reclamação graciosa a qual foi tramitada e decidida e antes da decisão final, foi a Impugnante/Recorrente notificada para se pronunciar, direito que exerceu, não tendo logrado alterar o sentido do projeto decisão notificada. Decorre dos facto provados nas alíneas I) a L) que a Recorrente interpôs recurso hierárquico, com os fundamentos de fls. 2/14 do referido processo, o qual foi apreciado tendo no ponto 7 dispensado ao direito de audição sustentado na circular 13/99 de 8.7 referindo que “a recorrente já foi regularmente notificada para exercer o direito de audição sobre a situação em apreço, em fase anterior do processo, e uma vez que não trouxe factos ou elementos novos suscetíveis de alterar a decisão da reclamação graciosa propomos ser de dispensar nova audição a recorrente.” Compulsada a petição do recurso hierárquico e a informação n.º 1181 de 05.03.2012 em que sustentou o despacho de indeferimento, constante no facto provado em J) consta no ponto 5.1 no item I. sob o título “Do procedimento da própria reclamação graciosa” sendo imputados vícios relativo ao direito de audição e ao despacho de indeferimento da reclamação por insuficiente falta de fundamentação. E no demais, e como refere a citada informação “Termos em que manteve os fundamentos invocados na reclamação graciosa, dando-os por integralmente reproduzidos e requereu a reapreciação das questões suscitadas, com o deferimento e demais consequências legais.” Pese embora, os argumentos apresentados contra o despacho de indeferimento da reclamação graciosa, não primem pela sua inovação, por si só justificava a audição nos termos do n.º 3 do art.º 60.º da LGT, e ainda, dentro do espírito da Circular n.º 17/2008, de 14 de fevereiro de 2008, em vigor na data da decisão do recurso hierárquico, uma vez que foram equacionadas novas questões. Nesta conformidade entendemos que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, no entanto, e como consta do citado acórdão e outra jurisprudência do STA, nomeadamente n.º 0542/08.15.10.2008, a ocorrência de vício de forma em momento posterior à efetivação da liquidação, não projeta efeitos anulatórios sobre esse ato tributário de liquidação, antes conduzindo à anulação da respetiva decisão de indeferimento do recurso hierárquico. Destarte, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento neste segmento, o qual afeta tão somente a validade do Recurso Hierárquico, não contaminando as liquidações efetuadas previamente a esse procedimento. 4.4. Nas conclusões 22. a 24., alega a Recorrente que invocou a falta de fundamentação legalmente exigida e a ausência de notificação de elementos essenciais, em sede de reclamação graciosa e em sede de impugnação judicial. E que nunca a Administração Tributária lhe notificou quaisquer dos elementos solicitados, limitando-se apenas a indeferir a reclamação apresentada, tal como aliás fez com a impugnação judicial. Assim tudo se mantendo por esclarecer, numa demonstração clara de que a Administração Tributária considerou despiciendos os deveres de colaboração e informação que está obrigada para além de não ser cumprido o artigo 37.º n.º 1 do CPPT. Apreciemos. Sobre a questão consta da sentença recorrida. “Reiterando argumentação anteriormente aduzida, a propósito da alegada falta de fundamentação, sustenta ainda a impugnante que a Administração Tributária violou os deveres de colaboração e informação a que se encontra adstrita nos termos do artigo 59.º da LGT, para além de também não ter cumprido o disposto no artigo 37.º, n.º 1 do CPPT, visto que, apesar de ter invocado a falta de fundamentação legalmente exigida e a ausência da notificação de elementos essenciais das liquidações, no âmbito dos procedimentos de reclamação graciosa e recurso hierárquico, a Administração Tributária nada fez para colmatar essas ilegalidades. Não lhe assiste razão, mais uma vez. O n.º 1 do artigo 59.º da LGT prevê que “os órgãos da administração tributária e os contribuintes estão sujeitos a um dever de colaboração recíproco”, preceituando o n.º 3 do mesmo preceito legal que “a colaboração da administração tributária com os contribuintes compreende, designadamente: a) (…)”. b) (…)”. k) (…)”. Tanto no CPA, como na LGT, o princípio da colaboração tem como núcleo essencial deveres de informação recíprocos dos intervenientes, que permitam à administração tributária e aos particulares tomar conhecimento dos seus direitos por forma a eles serem tomados em conta na decisão do procedimento. Por sua vez, do artigo 37.º, n.º 1 do CPPT decorre que “se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a fundamentação legalmente exigida, indicação dos meios de reação contra o ato notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributária, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento. Ora, no caso vertente, não se vislumbra em que medida a Administração tenha violado os deveres de colaboração e informação a que se encontra adstrita, postergando os direitos de defesa. De facto, como já houve o ensejo de referir acerca da alegada falta ou insuficiência de fundamentação dos atos impugnados, a Administração Tributária pronunciou-se sobre as mencionadas ilegalidades, quer no âmbito dos procedimentos de reclamação graciosa, quer no âmbito dos procedimentos de recurso hierárquico, tendo concluído pela inexistência das mesmas. Contrariamente ao que a impugnante parece fazer crer a Administração Tributária não se limita a tecer meras considerações genéricas ou juízos conclusivos. Ao invés, explicita as razões pelas quais concluiu pela não ocorrência das referidas ilegalidades. Por certo que a impugnante não concorda com os fundamentos vertidos nas decisões de indeferimento das reclamações graciosas e subsequentes recursos hierárquicos, no entanto, não pode vir dizer que as mesmas padecem de falta ou insuficiência de fundamentação. De resto, se a impugnante entendia que as notificações das liquidações não continham a fundamentação legalmente exigida, sempre podia lançar mão do expediente previsto no citado artigo 37.º, n.º 1 do CPPT, requerendo a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, o que não fez. Ante o exposto, improcede igualmente nesta parte a presente impugnação.” A sentença recorrida não nos merece qualquer reparo. Decorre do art.º 59.º da LGT, o princípio da colaboração, impondo à administração tributária e aos contribuintes o dever recíproco de colaboração. Acresce que no exercício do direito de audição, antes da liquidação, que a Recorrente exerceu, em cumprimento do art.º 60.º da LGT, expõe-se detalhadamente os seus argumentos os quais foram escalpelizados, no item 9 da RIT e explicadas as razões pelas quais não foram consideradas os argumentos da Impugnante/Recorrente. [cfr. facto A)]. Em sede de procedimento de reclamações graciosas, [cfr. factos), F) e G)] foi exercido o direito de audição, e também explicadas as razões pelas quais não foram considerados os argumentos da Recorrente. Não resulta dos autos, qualquer facto que prove que a Recorrente solicitou à AT que lhe fosse notificado quaisquer dos elementos, nem mesmo a mesma o demonstra. O artigo 37.º do CPPT estipula, para os casos em que a notificação das decisões em matéria tributária foi realizada em termos incompletos ou insuficientes, o seguinte: “1- Se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a sua fundamentação legalmente exigida, a indicação dos meios de reação contra o ato notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento. 2- Se o interessado usar da faculdade concedida no número anterior, o prazo para a reclamação, recurso, impugnação ou outro meio judicial conta-se a partir da notificação ou da entrega da certidão que tenha sido requerida. (…)». Decorre do n.º 1 do art.º 37. º do CPPT, que as decisões em matéria tributária devem ser notificadas com inclusão da fundamentação legalmente exigida, da indicação dos meios de reação e dos outros requisitos exigidos pelas leis tributárias. Se a notificação for incompleta, o interessado pode requerer a notificação dos requisitos omitidos ou a passagem de certidão que os contenha dentro do prazo ali fixado. Como bem refere a sentença recorrida a AT pronunciou-se sobre as alegadas ilegalidades, nos procedimentos de reclamação graciosa, quer nos procedimentos de recurso hierárquico, tendo concluído pela inexistência das mesmas. E nesses procedimentos a Administração Tributária explicita as razões pelas quais concluiu pela não ocorrência das referidas ilegalidades. Não existe nos autos, nem a Recorrente o demonstra que tenha deitado mão ao mecanismo do artigo 37.º n.º 1 do CPPT, pelo que AT não estava obrigada por sua iniciativa a dar cumprimento ao referido preceito. Destarte, improcede a pretensão da Recorrente. 4.5. Nas conclusões 25. a 28., alega a Recorrente que a Administração Tributária não logrou afastar a presunção de veracidade de que goza a escrita da Impugnante, não fornecendo, assim, os pressupostos para a determinação da matéria coletável por métodos de tributação. E como fundamentação para as correções efetuadas é mencionado que os valores apresentados se revelam "insuficientes para compensar minimamente os custos suportados com a criação dos frangos", E que tal fundamentação não se mostra suficiente para justificar o recurso a métodos diretos para a determinação da matéria tributável, pois é consabido que em face da conjuntura económica, nem sempre as empresas logram obter lucros, não sendo tal razão para se pôr em causa a escrita do contribuinte, corrigindo-se os valores apresentados por si. Por outro lado, não é porque a Recorrente não consegue demonstrar a existência de suprimentos que tal desobriga a Recorrida de fundamentar e provar que aqueles valores consubstanciam proveitos omitidos. Vejamos. Nos presentes autos está em questão a legalidade das liquidações de IVA dos anos de 2008 e 2009, no valor global de € 29 262,21 respetivos juros compensatórios, os quais foram apuradas por avaliação direta. O n.º 1 do art.º 75.º do Lei Geral Tributária (LGT) consagra o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, presumindo-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei fiscal e comercial. Esta presunção vincula a Administração Fiscal à realização da liquidação com base nas declarações dos contribuintes, (art.º 59.º do CPPT) sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, ao controlo dos factos declarados. A presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT). Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a Administração Tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos ou, quando tal não seja possível, a métodos indiretos. No entanto, e por força do art.º 74.º da LGT, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte. E como a doutrina e a jurisprudência têm afirmado, “actuando a Administração Tributária no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabe-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação adicional, designadamente a prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efectuar as correcções técnicas que suportam essa liquidação”. – cf., por todos, acórdão do STA de 28/9/2011, Processo 0494/11. Ora a sentença recorrida entendeu que estavam verificados os pressupostos ao recurso à avaliação direta, no ano de 2008, com os seguintes fundamentos: “(…) Deste modo, importa, num primeiro momento, indagar se a Administração Tributária reuniu indícios suficientes para afastar a presunção de veracidade das declarações apresentadas pela impugnante. Como se colhe do discurso fundamentador vertido no relatório de inspeção tributária, a Administração Tributária detetou as seguintes irregularidades: ▪ Omissão de proveitos provenientes dos serviços prestados no âmbito da atividade de avicultura. Com efeito, partindo dos termos estipulados no contrato de prestação de serviços firmado entre a impugnante e o integrador “[SCom02...], Lda.”, bem como de elementos fornecidos por esta fornecidos, a Administração Tributária, apurou o valor do serviço prestado pela forma seguinte: - Os pintos recebidos foram valorizados a 0,2743 por pinto recebido; - A ração consumida foi de valorizada a 0,2569 por quilo; - Os medicamentos foram valorizados ao preço de mercado; - Os frangos entregues foram valorizados a 0,7357 por cada quilo de carne, pesada em vivo nas instalações do integrador; - O saldo resultante deste apuramento constitui o valor do serviço prestado pelo sujeito passivo, desde que este valor dividido pelo número de frangos fosse igual ou superior a 0,175 €, sendo sempre assegurado pelo integrador o preço mínimo de 0,175 € por cada frango, o que, aliás, foi corroborado pelo próprio sujeito passivo em auto de declarações no âmbito do procedimento inspetivo. Constatou, pois, a Administração Tributária que relativamente às faturas n.ºs 142 e 154, de 15/10/2009 e 05/12/2009, respetivamente, o quociente entre o saldo apurado e o número de frangos entregues foi inferior a 0,175 €, fixando-se em 0,10 € e 0,145, respetivamente, valores insuficientes para compensar minimamente os custos suportados com a criação dos frangos. Deste modo, a Administração Tributária procedeu à correção dos serviços prestados titulados pelas mencionadas faturas de acordo com o valor mínimo acordado com o referido integrador, ou seja, 0,175 € por cada frango entregue, donde apurou o valor total de 8.763,65 € [50078 frangos x 0,175 €] para a fatura n.º 142 e de 9.059,75 € [51770 frangos x 0,175 €] para a fatura n.º 154. Assim, obteve uma diferença de 5.323,40 € [3.763,65 € relativamente à fatura n.º 142 e 1.559,75 € relativamente à fatura n.º 154] entre o valor dos serviços prestados faturados e o valor ora apurado de acordo com o valor mínimo acordado com o integrador [SCom02...], Lda, a que corresponde a taxa de IVA 20% e valor de 1.064,68 €. ▪ Lançamentos sem suporte documental na conta de suprimentos - No ano de 2008 o valor do incremento dos suprimentos fixou-se em 87.653,28 €, dos quais apenas 15.455,00 €, encontram-se justificados através de transferências multibanco ou bancárias;(…)” Relativamente ao ano de 2009, consta da sentença recorrida a seguinte fundamentação: (…) - No ano de 2009, o valor do incremento dos suprimentos fixou-se em 69.614,70 €, dos quais apenas 12.750,00 € se encontram justificados por meio de transferências multibanco ou bancárias; ▪ Omissão de proveitos provenientes da atividade de produção e venda/revenda de resíduos de madeira exercida a título secundário. Partindo dos dados obtidos relativamente aos lançamentos efetuados na conta de suprimentos, a Administração Tributária verificou que o sócio da impugnante, «AA», nos anos de 2008 e 2009, declarou rendimentos em sede de IRS de cerca de 4.500,00 €, tendo concluído que os valores lançados a título de suprimentos do sócio, sem suporte documental, não tendo sido realmente entregue pelo sócio, tiveram origem na atividade exercida pela impugnante [vendas de produtos derivados da madeira] e não refletida na contabilidade. Deste modo, a Administração Tributária concluiu terem sido omitidos proveitos [vendas] no montante de 72.198,28 € em 2008 e de 56.864,70 € em 2009, correspondentes aos montantes de entradas não justificadas, lançadas na conta de suprimentos do sócio em cada um desses anos. ▪ Incorreção do valor das existências finais do ano de 2009 Constatou a Administração Tributária que a impugnante recebeu em 03/12/2009 um bando de 53.000 pintos, cuja cria e entrega à [SCom02...], Lda. decorreu entre 4 e 12 de janeiro de 2010. Uma vez que toda a despesa inerente à sua criação foi reconhecida como custo em 2009, entendeu a Administração Tributária que devia ser reconhecido no mesmo ano o proveito proporcional deste bando, procedendo ao cálculo do valor que este teria em 31/12/2009, o qual se fixou em 7.297,48 €.(…)” Face aos indícios recolhidos pela AT e constante do RIT, que se encontra parcialmente transcrito no facto A) da matéria de facto não impugnada, entendemos tal como a sentença que a Administração Tributária cumpriu o seu ónus da prova, coligindo dados concretos e objetivos de que a contabilidade da Impugnante/Recorrente não reflete a sua verdadeira situação tributária. Alega a Recorrente que é sabido que em face da conjuntura económica, nem sempre as empresas logram obter lucros, não sendo tal razão para se pôr em causa a escrita do contribuinte, corrigindo-se os valores apresentados por si. Porém o Recorrente não faz qualquer esforço probatório para demonstrar as razões pelas quais não obteve lucros e as razões das irregularidades existentes. Alega ainda a Recorrente que apesar de não conseguir demonstrar a existência de suprimentos, que tal não desobriga a Recorrida de fundamentar e provar que aqueles valores consubstanciam proveitos omitidos. Porém sem razão. Consta da matéria de facto provada [facto A)] no item 3 do RIT “Análise das contas de suprimentos” dos anos de 2008 e 2009. Constando aí que “(…) Muitos dos registos contabilísticos efetuados na conta do sócio (suprimentos) não tem suporte documental, nem sequer nota interna. Servem apenas para acertar os movimentos constantes do extrato bancário da firma com a respectiva conta corrente de bancos ou para manter o saldo de caixa devedor. A título de exemplo citem-se os valores de 13 000 e 17 000 euros debitados em “caixa” em Setembro e Dezembro de 2009, respectivamente, por contrapartida de “suprimentos”. O elevado número de lançamentos não corresponde ao documento em arquivo; o contabilista aproveitou para juntar parte dos movimentos das contas de “suprimentos” e “a bancos” outros lançamentos. (…)” Apurando o valor de incrementos suprimentos de € 87 653,28. Fazem uma análise relativamente aos suprimentos de cada sócio e concluem que no ano de 2008 encontram-se justificado por meio de transferências bancárias ou multibanco, um montante de € 15 445,00 resultando por justificar 72 198,28 (87 653,28 - € 15 445,00). No ano de 2009, a AT apurou o valor de incrementos de suprimentos de € 69 614,70. Encontram-se justificado por meio de transferências bancárias ou multibanco, um montante de € 12 750,00 resultando por justificar € 56 864,70 (€69 614,70- € 12 750,00). Feita esta prova pela AT, passou a recair sobre a Impugnante/Recorrente o ónus de demonstrar o desacerto da atuação da Administração Tributária ou, pelo menos, gerar dúvida fundada sobre a existência ou quantificação do facto tributário, previsto no artigo 100.º, n.º 1 do CPPT. A Recorrente/Impugnante, faz a sua defesa sustentando-se na presunção de veracidade da sua declaração, sem contudo ter alegado nem demonstrado factualidade concreta suscetível de pôr em causa as conclusões extraídas pela Administração Tributária a partir dos elementos coligidos no âmbito do procedimento inspetivo. Por fim na conclusão n.º 30 entende a Recorrente que o julgamento efetuado conduz inevitavelmente à nulidade da sentença, nos termos do disposto no artigo 125.°, n.° 1 do CPPT. Há nulidade da sentença quando a mesma é afetada por alguma das vicissitudes previstas no art.º artigo 125.°, n.° 1 do CPPT e no art.º 615.º Código de Processo Civil, nomeadamente, não conter a assinatura do juiz; não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; os fundamentos estar em oposição com a decisão ou a decisão é ininteligível devido a ambiguidade ou obscuridade; e o juiz deixar de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar. No caso em apreço nunca estaríamos perante uma nulidade de sentença, quando muito erro de julgamento de direito o que a Recorrente não logrou provar. Nesta conformidade, improcede o alegado erro de julgamento. 4.2. E assim formulamos as seguintes conclusões: I. Como resulta dos termos o n.º 3 do art. º 60.º da LGT apenas dispensa a audição prevista na alínea a) do n.º 1 (anterior ao ato de liquidação), e não em qualquer das outras situações previstas nas alíneas b) a e) do n.º 1 do mesmo artigo. II. O n.º 1 do art.º 75.º do Lei Geral Tributária (LGT) consagra o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, presumindo-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei fiscal e comercial. III. A presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT). IV. Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a Administração Tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos ou, quando tal não seja possível, a métodos indiretos. V. No entanto, e por força do art.º 74.º da LGT, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte. 5. DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, conceder parcial provimento anulando-se o recurso hierárquico, e no demais negar provimento ao recurso, mantendo-se sentença recorrida, na ordem jurídica, bem como as liquidações efetuadas. Custas a cargo da Recorrente e Recorrida fixando-se em 95% e 5% respetivamente. Porto, 05 de junho de 2025 Paula Maria Dias de Moura Teixeira (Relatora) Maria Celeste Oliveira (1.ª Adjunta) José Coelho (2.º Adjunto) |