Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01405/24.7BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/04/2025
Tribunal:TAF do Porto
Relator:RICARDO DE OLIVEIRA E SOUSA
Descritores:TAXA DE JUSTIÇA REMANESCENTE;
DISPENSA;
Sumário:
I. Nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, « Nas causas de valor superior a [euro] 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.».

II. Apresentando-se distintivo que a conduta processual das Recorrentes se revela conforme aos princípios de boa-fé e cooperação processual, e não justificando a complexidade da tramitação processual em causa a exigibilidade do montante remanescente de 6.053.751 € a título de custas, impõe-se dispensar a mesma do pagamento da taxa de justiça remanescente, sob pena de violação do princípio constitucional da proporcionalidade.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Deferir o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte - Secção de Contencioso Administrativo, subsecção de Contratos Públicos:
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I – RELATÓRIO

1. A [SCom01...], S.A., e a [SCom02...], S.A.U., com os sinais dos autos, notificadas do Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 23.05.2025, e exarado a fls. 1518 e seguintes [suporte digital], que negou provimento ao recurso jurisdicional por estas interposto, vem atravessar requerimento destinado a requerer a reforma do dito Aresto quanto a custas judiciais.

2. Substancia tal pretensão no entendimento de que (i) as partes mantiveram uma conduta processual irrepreensível e eficiente; (ii) submeteram peças processuais equilibradas, exercendo contenção na sua redação e dimensão; (iii) atuaram sempre de boa-fé; (iv) as questões a decidir nos presentes autos não revestiram especial complexidade; e (v) a produção de prova, toda com base em documentos, revelou-se simples e célere, impondo-se, por isso, reformar o Acórdão de 23.05.2025 no sentido da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, por respeito aos princípios constitucionais da proporcionalidade e do acesso efetivo à justiça e ao abrigo do n.º 7 do artigo 6.º do RCP.

3. Não se antolham obstáculos de natureza adjetiva impeditivos da apreciação do presente requerimento, pelo que cumpre apreciar e decidir.

4. Mostra-se útil começar um breve enquadramento necessário para a apreciação da questão.

5. Nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais/RCP, «A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento.».

6. Nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, « Nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.».

7. Como decorre da Tabela I do RCP, quando o valor da causa seja superior a € 275.000,00, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada 25.000 € ou fração, três unidades de conta, no caso da coluna A, uma e meia unidade de conta no caso da coluna B e quatro e meia unidades de conta no caso da coluna C.

8. Conforme refere Salvador da Costa, in Regulamento das Custas Processuais, anotado, 4.ª ed., p. 236, «É esse remanescente, ou seja, o valor da taxa de justiça correspondente à diferença entre 275.00,00 € e o efectivo superior valor da causa para efeito da determinação daquela taxa, que deve ser considerado na conta final, se o juiz não dispensar o seu pagamento. A referência à complexidade da causa significa, em concreto, a sua menor complexidade ou simplicidade e a positiva atitude de cooperação das partes».

9. Nos termos do artigo 527.º, n.º 1, do CPC, «[a] decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito».

10. Nos termos do n.º 2 do preceito, «[e]ntende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for».

11. Cientes destes considerandos de enquadramento legal, e revertendo agora ao caso sujeito, temos, para nós, que, quanto ao comportamento das Recorrentes, nada há a censurar à sua atuação processual, que se limitaram [sem qualquer violação dos deveres de boa-fé, cooperação, razoabilidade ou prudência] a lançar mão dos normais meios, que teve por adequado à defesa dos seus interesses, sem qualquer excesso ou requerimento abusivo ou injustificável.

12. No que concerne à complexidade da tramitação processual em análise, está-se em crer convictamente que a mesma não é em molde a legitimar, em termos de adequação e proporcionalidade, a cobrança de mais um valor pecuniário de 6.053.751 €, enquanto valor remanescente das custas se não for utilizado o poder de conformação casuística invocado nos autos.

13. Em tais termos, e em aplicação do critério normativo previsto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, é nosso entendimento que é de deferir a requerida reforma quanto a custas do Acórdão promanado em 23.05.2025, dispensando-se as Recorrentes do pagamento do remanescente da taxa de justiça, correspondente ao valor da causa, na parcela excedente a 275.000 €, atento o grau de complexidade do processado e a conduta processual da litigante.

14. Assim se decidirá.


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II – DISPOSITIVO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em DEFERIR a requerida reforma quanto a custas do Acórdão promanado em 23.05.2025, dispensando-se as Recorrentes do pagamento do remanescente da taxa de justiça, correspondente ao valor da causa, na parcela excedente a 275.000 €, atento o grau de complexidade do processado e a conduta processual da litigante.

Notifique-se.


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Porto, 04 de julho de 2025

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Ricardo de Oliveira e Sousa

Tiago Afonso Lopes de Miranda

Clara Ambrósio