Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01446/24.4BEPRT-S1
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/24/2025
Tribunal:TAF do Porto
Relator:TIAGO MIRANDA
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ CONTRATUAL;
ADOPÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS;
Sumário:
I – Não se nega que as Requerentes de aplicação da medida provisória de suspensão de execução do contrato adjudicado pelo acto impugnado alegaram alguns factos susceptíveis de contribuírem para a formação de um facto consumado que consistiria na superveniente insustentabilidade económico financeira do contrato se começado a executar após já ter havido parcial execução do adjudicado às CIs recorridas, porventura indevidamente. Admite-se até a validade da alegação da probabilidade de factos futuros e eventuais, enquanto fundamentação de facto de uma alegação de perigo concreto da ocorrência daquele alegado facto consumado, também ele futuro e incerto. Contudo, entre o conjunto das alegações de facto feitas e a alegação do perigo de ocorrência daquele facto consumado há uma solução de continuidade lógica, não sendo possível, concluir, sem mais, pela formação desse risco, pelo que se julga que bem andou a sentença recorrida quando baseou a improcedência do pedido na falta de alegação de factos concretos dos quais concluir pelo risco de verificação daquele alegado facto consumado.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - Relatório
I-[SCom01...], LDA. e [SCom02...], UNIPESSOAL, LDA., Autoras nos autos da acção do contencioso pré-contratual identificado em epígrafe, em que são Réu o Município ... e Contra-interessadas [SCom03...], S.A. & [SCom03...], UNIPESSOAL, LDA, interpuseram o presente RECURSO DE APELAÇÃO da sentença incidental de 17/09/2024, proferida nos termos do artigo 103º-B do CPTA, que indeferiu o pedido de adopção de medidas provisórias.

O teor do pedido incidental era o seguinte:
“Termos em que, e nos mais de Direito, com o sempre mui douto suprimento de V. Exa., deverá o presente requerimento ser julgado procedente, por provado, e, nessa medida, ser decretada, ao abrigo do disposto no artigo 103.°-B do CPTA, a medida provisória de suspensão da execução do contrato de gestão de eficiência energética celebrado ao abrigo do procedimento ora em causa até ao trânsito em julgado da sentença que venha a ser proferida nestes autos.”

As recorrentes remataram a sua alegação com as seguintes conclusões:
«CONCLUSÕES
I. Vem o presente Recurso interposto da sentença incidental proferida pelo douto Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, a 17.09.2024, com referência SITAF 008860160 através da qual se decidiu no seguinte sentido:
Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgo improcedente, por não provado, o incidente deduzido pelas Autoras e, em consequência, recuso a adopção das medidas provisórias requeridas.
Condeno as Autoras nas custas do incidente, nos termos acima fixados”;
II. Acontece que, tal como abaixo se demonstrará, a sentença ora recorrida enferma de um claro e evidente erro na aplicação do Direito uma vez que, ao contrário do nela decidido, não é juridicamente certeiro considerar que o pedido de adopção de medidas provisórias apresentado pela Recorrente sempre deveria ser julgado improcedente por “(...) manifesta ausência de alegação de facto”;
III. Como tal, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente, por provado, e, nessa medida, ser determinada a revogação da sentença recorrida e ordenada a sua substituição por um Acórdão que julgue procedente o presente incidente, determinando, assim, a medida provisória requerida (suspensão da execução do contrato de gestão de eficiência energética celebrado ao abrigo do procedimento ora em crise até ao trânsito em julgado da sentença que venha a ser proferida nos presentes autos);

IV. Analisado o requerimento de medidas provisórias apresentado pela Recorrente, verifica-se que dele constam, de forma clara, factos que justificam a necessidade de lhe ser garantida a execução integral do contrato para que a Recorrente esteia em condições de garantir a sua sustentabilidade económico-financeira:

V. A contrario sensu, do requerimento inicial, resulta, à saciedade, a alegação de que, tendo em conta as propostas apresentadas pela Recorrente e pelas Contra-interessadas, a não suspensão da celebração e posterior execução do contrato por força da recusa do decretamento das medidas provisórias irá acarretar para a Recorrente um atraso na execução do contrato que não é compatível com a sustentabilidade financeira do contrato;
VI. Ao contrário do que parece ter sido o entendimento do douto Tribunal a quo, o artigo 56.° do requerimento de adopção das medidas provisórias não tem apenas e tão só o sentido de reconhecer que as luminárias propostas são iguais às propostas pela Contra-interessada na sua proposta;
VII. Analisado tal artigo com a devida profundidade, verifica-se que através dele se afirma que as luminárias propostas por cada um dos concorrentes são iguais, mas também não é menos verdade que neles se afiança que os equipamentos de telegestão não são os mesmos.
VIII. A adução dessa realidade constitui inequivocamente a alegação de um facto que determina a impreterível necessidade de substituir todas as luminárias que venham a ser fornecidas pelas Contra-interessadas caso não se suspenda a execução do contrato como peticionado, o que, atrasando a execução do contrato, colocará em causa a sustentabilidade financeira daquele para as Recorrentes;
IX. Igualmente relevante para o mesmo efeito, isto é, da necessidade de se proceder à substituição das luminárias já instaladas pelas Contra-interessadas é igualmente o facto invocado pela Recorrente de ser necessário proceder à auditoria das luminárias, o que não é possível após a sua instalação;
X. Foi igualmente alegado pelas Recorrentes que a necessidade de substituição das luminárias instaladas pelo actual adjudicatário, resultava do facto de, por força dos riscos técnicos associados à operação a realização em execução do contrato de eficiência energética, não se poder responsabilizar, como sempre aconteceria ao abrigo da Cláusula 35.ª do Caderno de Encargos, pelo funcionamento e total operacionalidade de luminárias que não instalou;
XI. Para sustentar que, em caso de não decretamento da medida provisória requerida, estar-se-ia a colocar em causa a sustentabilidade económico-financeira do contrato por impossibilidade das Recorrentes o executarem desde o início, as Recorrentes alegaram ainda que o facto de a remoção das luminárias a substituir ter de ser realizada pelas Contra-interessadas atrasaria, ainda mais, o começo da execução do contrato por parte da Recorrente em caso de obtenção de ganho de causa;
XII. Foi ainda alegado o decréscimo da taxa interna de rentabilidade do projecto (TIR do projecto) de 6,42% para, no mínimo, 5,82%, uma vez que, como as Recorrentes tiveram oportunidade de explicitar, o primeiro valor tem como pressuposto 9,7 meses de serviço, de acordo com a sua proposta, valor esse que não poderá ser garantido no caso de, vencendo a presente acção, ter de proceder à reinstalação de luminárias já instaladas (perdendo assim 5,3 meses de serviço ou mais enquanto estiver pendente de juízo a presente lide);
XIII. De todos estes factos alegados fez o douto Tribunal a quo manifesta tábua rasa, tendo preferido, ao invés de proceder à sua análise e compreensão, defender uma carência alegatória que nunca se verificou, circunstância que se espera que venha a ser reconhecida por este douto Tribunal ad quem;
XIV. Tendo em conta que o que está em causa é garantir, através do decretamento de medidas provisórias, a utilidade da sentença que vier a ser proferida nos presentes autos, torna-se evidente que a alegação dos requerentes (neste caso das Recorrentes) tem sempre necessariamente que passar pela demonstração da situação que se constituirá caso as referidas medidas não sejam adoptadas, adoptando, claro está, um juízo de prognose;
XV. O contributo dado pela mais distinta Doutrina confirma tudo quanto se vem alegando e que já se havia alegado aquando da apresentação em juízo do requerimento inicial: o não decretamento da medida provisória requerida terá como consequência que a decisão final seja tomada numa fase em que o contrato já estará particularmente executado, mas da sua invalidação e suspensão das prestações contratuais resultaria um grande prejuízo para a satisfação das necessidades colectivas:
XVI. As Recorrentes foram capazes de, de forma clara, cristalina e circunstanciada, demonstrar, inclusive com base em dados constantes da sua proposta - e, por conseguinte, apenas aplicáveis ao presente procedimento - que a continuação da execução do presente contrato constituirá uma situação de facto consumado, situação de facto consumado essa que, como acima se demonstrou com recurso a autorizada Doutrina, não deve ser encarada como o douto Tribunal a quo linhas abaixo encarou, isto é, como correspondendo àquela em que “(...) exista a perspectiva de que, quando a sentença for proferida, o objecto do contrato já se encontre integralmente realizado ou próximo da sua integral execução, tornando-se inviável a restauração natural”.
XVII. Sobre o sentido e alcance do conceito jurídico de “facto consumado” realizado pela Doutrina, e apesar de o ter trazido à liça introdutoriamente, o Tribunal a quo não teceu uma única consideração, tendo optado, pelo contrário, por uma interpretação demasiado restritiva daquele conceito, o que o impediu de alcançar que a presente situação corresponde precisamente ao tipo de soluções descritas por aqueles autorizados Autores;
XVIII. O disposto no artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 50/2021, de 15 de Junho determina que o co-contratante de um contrato de gestão de eficiência energética será remunerado de acordo com o acréscimo de economias de energia que venha a alcançar durante o prazo de execução contratual, referência ao valor das economias de energia anuais garantidas contratualmente para a entidade adjudicante;
XIX. Da concatenação dos artigos 7.° e 13.° do Decreto-Lei n.° 50/2021, de 15 de Junho facilmente se constata que a natureza plurianual do contrato ora em causa corresponde ao período que se entende que o adjudicatário precisa para a amortização e remuneração do capital investido na implementação do projecto e que, como tal, se não for garantido, como não o será em caso de manutenção da sentença recorrida, colocará em causa a sustentabilidade financeira do contrato para as Recorrentes, tal como aquelas demonstraram amplamente não só no requerimento inicial, como inclusivamente nas presentes alegações de recurso, ao contrário do indevidamente defendido pelo douto Tribunal a quo:
XX. A tónica é e sempre foi sempre a mesma: sendo essencial para o equilíbrio económico-financeiro do contrato a sua integral execução pela Autora, algo que foi devidamente alegado e comprovado nos presentes autos, a não adopção das medidas provisórias requeridas pelas Recorrentes reduzirá, de forma clara, o prazo de execução contratual de que aquelas disporão para reaver o seu investimento e se remunerar, o que perfaz a constituição de um facto consumado que deveria ter sido devidamente valorado pelo douto Tribunal a quo para efeitos de cumprimento do disposto no n.° 1 do artigo 103.°-B do CPTA;
XXI. A formalização do auto de consignação não constituirá um óbice à constituição da situação de facto consumado arguida pela Recorrente tendo em conta o disposto na alínea f) da Cláusula 2.ª do Caderno de Encargos, uma vez que é do perfeito conhecimento do douto Tribunal a quo que já foi aposto visto prévio ao contrato ora em causa, tornando-se legítima (para não se dizer certa) a conclusão de que já terá igualmente sido formalizada a consignação e, nessa medida, foi já cumprida mais uma etapa tendente à execução do contrato ora em crise;
XXII. Mesmo tendo em conta os prazos previstos no n.° 1 da Cláusula 22.ª e 29.ª do Caderno de Encargos, não é crível a convicção de que os mesmos, por mais estendidos que sejam, não estejam já cumpridos à data do trânsito em julgado da sentença que decidirá os presentes autos, o que equivale por dizer que, por maiores dificuldades que as Contra-interessadas enfrentem na aprovação dos projectos de execução das medidas de melhoria da eficiência energética, nunca as mesmas serão idóneas a evitar a situação de facto consumado que as Recorrentes fundamentadamente perspectivaram e que se verificará inexoravelmente em caso de manutenção da decisão recorrida;
XXIII. Face a tudo quanto acima se expôs, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e, nessa sequência, ser a sentença recorrida substituída por um Acórdão que reconheça a verificação, in casu, do requisito do periculum in mora, para efeitos do disposto no n.° 1 do artigo 103.°-B do CPTA, e determine a adopção da medida provisória requerida;
XXIV. Tendo em conta que, tal como acima se demonstrou à saciedade, a Recorrente entende que se verifica, no caso sub judice, o requisito do periculum in mora e que foi com base no pressuposto da falta da sua verificação que foi dada como prejudicada a análise dos restantes requisitos legais, em caso de procedência do presente recurso de apelação - o que se espera que venha a acontecer atendendo à clareza e solidez das alegações que o corporizam - deverá este douto Tribunal ad quem conhecer da verificação ou não dos restantes requisitos de que depende o deferimento do requerimento de medidas provisórias apresentado pelas Recorrentes, nos termos dos poderes que lhe são conferidos pelo n.° 2 do artigo 149.° do CPTA, o que se requer para todos os devidos e legais efeitos;
Considerando que o presente recurso deve subir em separado, nos termos da parte final do n.° 1 do artigo 147.° do CPTA, requer-se, nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 646.° do Código de Processo Civil (doravante CPC), aplicável ex vi artigo 1.° e n.° 3 do artigo 140.° do CPTA, que o mesmo seja instruído com certidão judicial contendo os seguintes actos processuais:
(…)
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, deverá ser julgado procedente, por provado, o presente Recurso de Apelação, e, nessa medida, ser:
A) Ser revogada a Sentença recorrida revertendo-se, assim, a decisão de improcedência do presente incidente, ordenando-se a sua substituição por um acórdão que, julgando procedente o presente incidente, determine a adopção da medida provisória de suspensão da execução do contrato de gestão de eficiência energética ao abrigo do procedimento ora em causa até ao trânsito em julgado da sentença que venha a ser proferida nos presentes autos.».

Notificado, o Município ... respondeu à alegação, concluindo como segue:
«III. CONCLUSÕES.
A. As Recorrentes impugnam a Sentença proferida pelo Tribunal a quo imputando-lhe os seguintes vícios: a) Erro na aplicação do Direito resultante de uma suposta falta de alegação de facto; b) Deficiente interpretação do conceito de “facto consumado” ínsito no n.° 1 do artigo 103-B do CPTA, desconsiderando um dos meios de constituição desse tipo de factos previsto na mais autorizada Doutrina; c) Falta de ponderação da natureza jurídica própria do contrato em crise.
B. O recurso não tem qualquer fundamento, devendo ser julgado improcedente, desde logo porque as Recorrentes não impugnaram a decisão sobre a matéria de facto que consta da Sentença, que, por isso, já transitou em julgado, e os factos que o Tribunal a quo deu como provados não fornecem qualquer suporte factual à tese plasmada no recurso no que diz respeito ao requisito do periculum in mora, mais concretamente, à verificação de uma situação de facto consumado.
C. Aliás, as Recorrentes não alegaram nenhum prejuízo decorrente da não suspensão da execução do Contrato de Gestão de Eficiência Energética.
D. Na realidade, as Recorrentes defendem que alegaram factos reveladores da necessidade de, para garantir a sustentabilidade e equilíbrio negocial, lhes dever ser proporcionado, durante todo o prazo de vigência do contrato, a possibilidade de explorar, em regime de exclusivo, a eficiência energética dos edifícios da Recorrida e, bem assim, que lhe seja pago o competente preço contratual.
E. Porém, não pediram nas alegações de recurso para este Douto Tribunal ad quem dar como provado o facto X, Y ou Z, nem já será possível rever a decisão sobre a matéria de facto, porque esta já transitou em julgado.
F. Caso se entenda que as Recorrentes impugnaram a decisão da matéria de facto, o que não se admite, o recurso deve igualmente ser julgado improcedente visto que não cumpriram os requisitos estabelecidos no artigo 640.° do CPC, aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA.
G. Ora, sem a alegação de factos concretos e sem a indicação de meios de prova para os provar, é impossível a este Douto Tribunal ad quem proferir uma decisão sobre a matéria de facto que possa ir ao encontro daquilo que é pedido pelas Recorrentes nas suas alegações de recurso.
H. Nem será admissível, perante tal omissão, proferir despacho de aperfeiçoamento.
I. Sem prejuízo, entende o Recorrido que a Sentença a quo não merece qualquer reparo, dado que, na realidade, não se encontra no Requerimento Inicial (RI) que deu origem a este Incidente, UM ÚNICO facto revelador de que, se a acção principal for julgada procedente, não será possível reverter o contrato para as Recorrentes.
J. Em concreto, as Recorrentes alegam que a taxa interna de rentabilidade cairá dos 6,42% para 5,92%, conclusão que não decorre de nenhum facto alegado no RI para a suportar (artigo 87.° do RI);
K. Com efeito, sendo a TIR um percentual, calculado usando uma fórmula matemática, baseada em pressupostos que só as Recorrentes conhecem, é manifesto que a alegação daquelas percentagens não é um facto, mas uma conclusão alegada pelas Recorrentes;
L. Alegam que, se adicionarmos 4 meses de pendência da acção, essa taxa desce para 4,99%, conclusão que também não decorre de nenhum facto para a suportar (artigo 88.° do RI);
M. Que tal redução será progressivamente mais significativa (artigo 89.° do RI);
N. E que, se a suspensão não for decretada, constituir-se-á uma situação de facto consumado, “que coloca as Requerentes sobre o perigo iminente de não conseguir, por factos que não lhe são imputáveis, remunerar e amortizar o investimento por si realizado.”, o que também não constitui a alegação de qualquer facto (artigo 91.° do RI).
O. Sendo assim, o acerto da decisão proferida pelo Tribunal a quo na Sentença recorrida é inquestionável.
P. Acresce que, mesmo que de factos se tratasse, os mesmos não poderiam ser julgados como provados, nem as alegações de recurso das Recorrentes procedem.
Q. Com efeito, não existia quando a Sentença foi proferida, nem agora, uma iminência de início da colocação das luminárias, na qual as Recorrentes assentam toda a argumentação utilizada para defender que será oneroso para si o processo de desinstalação desses equipamentos.
R. Por outro lado, no caso hipotético de a acção principal ser julgada procedente, a anulação do contrato terá eficácia retroactiva, destruindo os efeitos jurídicos entretanto produzidos, e determinará a reconstituição da situação actual hipotética, impondo a restituição de tudo o que tiver sido prestado, ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente (cfr. artigo 285.°, n.° 2, do CCP, e regime das invalidades do CPA), o que, na prática, deixa em aberto todas as possibilidades de as Recorrentes não sofrerem qualquer prejuízo até à data em que transitar em julgado a Sentença que vier a ser proferida nos presentes autos.
S. O que significa que o prazo de execução do contrato que eventualmente seja adjudicado às Recorrentes não será prejudicado.
T. Sendo certo que é possível proceder à retirada das luminárias e controladores de telegestão e desactivação da plataforma de gestão, de modo que o contrato com as Recorrentes possa ser celebrado e cumprido nos seus exactos termos e nos termos da proposta por estas apresentada.
U. Alegam as Recorrentes que a remuneração contratual só será suficiente para amortizar o investimento a realizar na concepção e implementação das medidas de eficiência energética, se for paga durante o prazo de 16 anos da sua proposta.
V. Porém, a amortização do investimento a realizar pelas Recorrentes em 16 anos não está indicada em nenhum documento da sua proposta, nem o revela o seu estudo económico, além de que, em média, este tipo de investimentos tem uma amortização num prazo inferior àquele que deverá vigorar o contrato.
W. De todo o modo, não há nenhum indício de que o prazo do contrato que viesse a ser celebrado com as Recorrentes, na sequência da anulação do contrato adjudicado às Contra-interessadas, seria inferior a 16 anos.
X. Logo, não pode conceber-se que a não suspensão da execução do Contrato de Gestão de Eficiência Económica causará uma situação de facto consumado.
Y. A noção de facto consumado adoptada na Sentença a quo não merece critica, pois a argumentação das Recorrentes é que o contrato que lhe venha a ser adjudicado será insustentável económico-financeiramente se a suspensão não for decretada, o que aponta precisamente para a situação caracterizada na Sentença (a tal impossibilidade de restauração natural).
Z. A outra vertente dessa noção não é compatível com a argumentação das Recorrentes, visto que diz respeito à satisfação das necessidades colectivas.
AA. Como decidiu, e bem, o Tribunal a quo, atento o seu objecto e a sua natureza, o contrato em causa não é de execução imediata, mas de execução continuada no tempo, não existindo assim a perspectiva de que, quando a presente acção vier a ser decidida, o contrato celebrado se encontrará próximo da sua execução integral.
BB. Por outro lado, o facto de o contrato ora em crise ser um contrato de execução duradoura, afasta a possibilidade de ocorrer uma situação de facto consumado nos termos prescritos no n.° 1 do artigo 103-B, do CPTA, em qualquer das vertentes indicadas pelas Recorrentes, pois como se alegou, atento prazo de 16 anos de vigência do mesmo, é impossível que as prestações contratuais que constituíam o objecto do contrato já se encontrem integralmente realizadas ou o contrato próximo da sua integral execução quando transitar em julgado a decisão da acção principal.
Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o recurso interposto pelas Recorrentes ser julgado improcedente e, em consequência, ser mantida integralmente a Sentença proferida pelo Tribunal a quo, com o que se fará a costumada
JUSTIÇA!

As contra-interessadas também contra-alegaram, concluindo nos seguintes termos:
«II. CONCLUSÕES
A. Cabia às Recorrentes, requerentes da adopção de medidas provisórias ao abrigo do disposto no artigo 103.°-B do CPTA, carrear para os autos factos constitutivos da sua causa de pedir, em particular factos que demonstrassem que, caso tais medidas não fossem adoptadas, existia um risco concreto de formação de uma situação de facto consumado que impediria que viesse posteriormente a assumir a execução do contrato e que dessa situação resultariam para si prejuízos concretos e quantificados, superiores aos que resultariam para o interesse público e para o interesse das adjudicatárias da não adopção dessas medidas provisórias. 
B. O incumprimento desse ónus de prova acarreta a improcedência da pretensão das Recorrentes
C. Ora, foi exactamente isso que aconteceu: as Recorrentes não demonstraram nos autos quaisquer factos constitutivos da sua causa de pedir.
D. Pelo contrário, limitaram-se a invocar e alegar matéria conclusiva, de natureza genérica, abstracta e, em vários pontos, meramente hipotética e especulativa.
E. Em particular, não caracterizaram nem demonstraram minimamente a existência de um risco concreto de formação de uma situação de fait acompli.
F. Alegam as Recorrentes que a douta sentença recorrida não aplicou devidamente o direito face aos factos dados como provados, mas a questão é, precisamente, que não foram provados os factos essenciais da sua causa de pedir e não existiam nos autos quaisquer elementos suficientes para os comprovar.
G. Como refere a douta sentença recorrida “[as Recorrentes] não fornecem um único facto, densificado e concretizado, que permita sustentar estas afirmações genéricas e conclusivas. E, aliás, com dificuldade que se alcança a tese (genérica), desprovida de factualização e da necessária concretização, sobre a alegada (in)sustentabilidade financeira do contrato para as Autoras que poderá derivar da não adopção de medida provisória requerida e sobre os encurtamentos de prazos contratuais, incluindo a alegada perda de rentabilidade de 6,42% para 5,82%, que poderá cair para 4,99%. Nenhum destes argumentos permite, minimamente alicerçar qualquer juízo quanto à ocorrência de uma situação de facto consumado, muito menos a impossibilidade de retomar o procedimento pré-contratual”.
H. Alegam as Recorrentes que caso não sejam suspensa a execução do contrato, se depois vierem a obter ganho de causa e lhes for adjudicado o contrato, a taxa interna de rentabilidade do mesmo baixaria de 6,42% para 5,82%, podendo ir até 4,99%.
I. Contudo, a mera proclamação desta situação não equivale à sua comprovação, não estando articulado qualquer facto que permita sequer indiciar que da mera execução parcial do contrato decorreria para as Recorrentes uma baixa da taxa de rentabilidade. 
J. Muito menos que essa baixa seria de 6,42% para 5,82% ou para qualquer outro valor.
K. Mais pretendem as Recorrentes que caso tenham de assumir a execução do contrato no seguimento de as Recorridas o terem iniciado seriam forçadas a empreender do zero todo um processo de preparação e planeamento que demoraria pelo menos 3 meses.
L. Contudo isto é falso e não foi minimamente demonstrado pelas Recorrentes.
M. Tanto assim que, como as próprias Recorrentes confessam (cfr. artigo 56.° do requerimento), as luminárias propostas tanto por aquelas, como pelas Recorridas são as mesmas, o que significa que caso viessem a ter ganho de causa nos autos, não teriam de substituir quaisquer luminárias.
N. Nem teriam de realizar qualquer procedimento de planeamento que reduzisse o tempo de execução do contrato.
O. Pretendem ainda as Recorrentes que, não obstante as luminárias de ambas as propostas serem as mesmas, da diferença entre os equipamentos de telegestão das propostas deveria o tribunal a quo ter concluído pela existência de um risco de situação de facto consumado.
P. Mas, obviamente, se ambas as propostas propõem as mesmas luminárias, então os equipamentos de telegestão propostos são mutuamente válidos e eficazes, não carecendo de substituição.
Q. Não é, portanto, factual o que as Recorrentes alegam.
R. O mesmo se dizendo quanto à alegação de as Recorrentes teriam de promover uma nova auditoria às luminárias instaladas caso viessem a assumir a execução do contrato depois das Recorridas.
S. Como decorre do disposto na Cláusula 24.° do Caderno de Encargos, o contraente público assegura, a expensas suas, o acompanhamento e testagem da instalação das luminárias pelo contraente privado por parte de um técnico designado para o efeito, pelo que, depois de realizados os testes e ensaios previstos na Cláusula 24.ª, sob acompanhamento do contraente público na pessoa do referido técnico (e de validação por parte deste), é lavrado auto de aceitação dos equipamentos, sistemas e obras, conforme previsto na cláusula 25.ª do Caderno de Encargos.
T. Dito de outra forma, as Recorrentes beneficiariam de uma garantia isenta emitida por um técnico responsável nomeado pelo contraente público de que as luminárias foram correctamente instaladas e aceites pelo contraente público, de tal forma que, toda a qualquer irregularidade nas mesmas resultante de factores alheios às Recorrentes não lhes poderia ser assacada.
U. Não é, portanto, um facto que as Recorrentes tivessem de proceder a qualquer auditoria.
V. Alegam ainda as Recorrentes que poderia ocorrer uma incorrecta instalação dos equipamentos por parte das Recorridas, o que, pretendem, aumentaria os custos de manutenção em fase de serviço (cfr. art. 62.° do requerimento).
W. Mas não foi demonstrado nos autos pelas Recorrentes qualquer elemento que indicasse os presumíveis custos dessa operação.
X. Como também não é verdade que se as Recorridas iniciarem a instalação de luminárias as Recorrentes teriam depois de as substituir na totalidade por novas luminárias (exactamente do mesmo tipo) apenas por as primeiras serem propriedade das Recorridas.
Y. Sendo que as Recorrentes se limitam a proclamar, sem articular qualquer facto demonstrativo como seja valor pecuniário de tais custos de substituição.
Z. Alegam ainda as Recorrentes que seriam prejudicadas na amortização do empréstimo necessário para obterem os meios de executar o contrato - ora, tal alegação não foi demonstrada minimamente, em particular atendendo ao amplo prazo de execução do contrato (16 anos), que permitira sempre um amplo período de amortização, especialmente sabendo-se que a maior parte do investimento é efectuada na fase inicial de execução do contrato. 
AA. Em qualquer caso, “o capital investido na concepção e implementação das medidas” é assumido pelo co-contratante como resulta claramente do artigo 35.° do Caderno de Encargos.
BB. Em qualquer caso, não se vislumbra (nem as Recorrentes o demonstram) como a mera baixa da taxa de rentabilidade de 6,42% para 5,82% ou mesmo para 4,99% prejudicaria a execução do contrato ao ponto de reclamar a suspensão da sua execução.
CC. Dada a natureza urgente dos presentes autos - com tudo o que isso comporta em termos de redução de prazos, não suspensão durante férias judiciais e prioridade no processamento - não se verifica nenhuma razão objectiva para se considerar que a execução efectiva do contrato poderá prejudicar os efeitos práticos da sentença a proferir.
DD. Mas mesmo que assim não fosse e o transito em julgado da sentença a proferir apenas se verificasse após o início da execução do contrato, também nessa circunstância não se verificaria qualquer risco de as Recorrentes reaverem qualquer investimento que tivessem de suportar.
EE. Por último, alegam as Recorrentes que o tribunal a quo não ponderou devidamente a natureza jurídica do contrato de gestão de eficiência energética, na medida em que, para as mesmas, a menos que executem o contrato do primeiro ao último dia ficaria prejudicada a taxa de rentabilidade da sua proposta, a qual é projectada para todo esse prazo.
FF. Contudo, nada obsta a que um concorrente preterido, vindo posteriormente a ter ganho de causa na impugnação da adjudicação, (re)tome a execução do contrato, sem que tal acarrete para si qualquer prejuízo.
GG. Em primeiro lugar, considerando que as Recorrentes poderiam aproveitar o planeamento, implementação e execução inicial efectuadas pelas Recorridas a expensas próprias, seriam os seus encargos devidamente reduzidos nessa proporção, de tal forma que, mesmo que a taxa de rentabilidade teria de ser calculada incluindo também esse benefício. 
HH. Conforme supra-referido, nos contratos em questão os custos para os co-contraentes são suportados maioritariamente na fase inicial de execução (em parte por isso a lei prevê o prazo mínimo de 15 anos para estes contratos, por forma a promover o retorno do investimento inicial).
II. De tal forma que o “segundo” co-contraente beneficiaria duplamente; primeiro de não ter de suportar (pelo menos parte) desses avultados custos iniciais, suportados pelo “primeiro” co-contraente; segundo, beneficiaria de executar o contrato durante o período em que o retomo efectivo se repercute na esfera do co-contraente.
JJ. Ao que acresce que a execução do contrato depende da consignação ao adjudicatário e da aprovação do projecto a apresentar pelo adjudicatário em 90 dias - situações que ainda não se verificaram.
KK. Ora, considerando que os presentes autos correspondem a um processo urgente é manifestamente previsível que a acção principal esteja decidida e transitada em julgado ainda antes de se puder iniciar a execução do contrato celebrado com as Recorridas.
LL. Por outro lado, tratando-se de um contrato de execução continuada ao longo de 16 (dezasseis) anos, não se vislumbra (nem as Recorridas o demonstraram) que o normal decurso dos autos (no máximo alguns meses) pudesse de alguma forma constituir uma situação de facto consumado que impossibilitasse a retoma do contrato pelas Recorrentes.
MM. Nem foi demonstrado pelas Recorrentes que a não suspensão do contrato ora adjudicado prejudicaria ou impossibilitaria que aquelas pudessem depois executar a sua proposta na íntegra.
Nestes termos e nos mais de direito e sempre com o douto suprimento de V Exas. requerem mui respeitosamente se dignem julgar o recurso interposto improcedente e, consequentemente, se dignem manter e confirmar a douta sentença recorrida.

Dispensados os vistos, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

II- Do objecto do recurso
Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações, interpretadas em função daquilo que se pretende sintetizar, isto é, o corpo das alegações.
Assim, as questões que a Recorrente pretende ver apreciadas em apelação são as seguintes:

1ª Questão
A sentença recorrida erra no julgamento em matéria de direito porque assenta no pressuposto, de todo errado, de que não foram alegados factos geradores do perigo da formação de um facto consumado para os efeitos do artigo 103º-B do CPTA, pois constam claramente do Requerimento de Medidas Provisórias apresentado factos que justificam a necessidade da execução integral do contrato para que a Recorrente esteja em condições de garantir a sua sustentabilidade económico-financeira?

2ª Questão
A sentença recorrida erra também no julgamento de direito porque labora num conceito restritivo de facto consumado, i.e., o de que este só ocorre se o contrato já estiver executado, quando a melhor doutrina propaga um conceito prático que engloba o caso de a execução já se encontrar num estádio de implementação tal que uma sua invalidação resultaria num grande prejuízo para as necessidades colectivas?

3ª Questão
A sentença recorrida errou no julgamento de direito porque não valorou como facto consumado a diminuição do tempo de execução do contrato pelas recorrentes, se vencedoras, na medida do tempo já executado, diminuição que, num contrato plurianual em que o tempo de execução era factor da recuperação do investimento do co-contratante, buliria com o equilíbrio financeiro do contrato com as Recorrentes?

III – Apreciação do objecto do recurso
A sentença recorrida operou a seguinte selecção de factos indiciariamente provados relevantes:
«Com interesse para a decisão da requerida adopção de medidas provisórias, mostram-se indiciariamente provados os seguintes factos, atenta a matéria de facto alegada e assumida pelas partes nos seus articulados, bem como os documentos juntos:

A) - Por deliberação da CÂMARA MUNICIPAL ... de 28-09-2023, foi autorizada a abertura do procedimento pré-contratual, com vista à celebração de um contrato de Gestão de Eficiência Energética para a iluminação pública do Município ..., ao abrigo do Decreto-Lei n.° 50/2021, de 15 de Junho, incluindo-se no objecto do contrato a implementação de medidas de melhoria de eficiência energética no “Sistema de Iluminação Pública” no concelho ... - cf. documentos juntos com a p.i. e petição de incidente e PA;

B) - Consta do Caderno de Encargos referente ao procedimento pé-contratual identificado na alínea antecedente, cujo teor se dá por integralmente reproduzido,
Secção IV
Eficiência energética
Cláusula 15.ª
Medidas de melhoria de eficiência energética
As medidas de melhoria da eficiência energética a implementar e a executar no âmbito do Contrato constam da proposta adjudicada.
(...)
Cláusula 18ª
Bens afectos ao contrato
9. O Co-contratante deve solicitar a autorização prévia do Contraente Público para a remoção e substituição de bens existentes, com um prazo mínimo de antecedência de 30 dias em relação à data prevista para o efeito, com fundamento na sua necessidade para o desenvolvimento das actividades integradas no objecto do Contrato.
10. Nos termos do número anterior, o Co-contratante deve fornecer ao Contraente Público a informação sobre o destino dos bens removidos, assumindo a responsabilidade por todas as obrigações e encargos decorrentes.
11. Os equipamentos disponibilizados pelo Co-contratante no âmbito do Contrato passarão a ser propriedade do Contraente Público após o termo do Contrato.
12. O Co-contratante deverá disponibilizar ao Contraente público toda a informação contabilística relativamente aos bens que foram por si construídos, adquiridos ou locados assim como aos equipamentos afectos à execução presente contrato e que passem a ser propriedade do contraente público após o termo do contrato.
13. O Contraente Público terá acesso a todos os equipamentos instalados no âmbito deste contrato.
(...)
Secção VI
Fase de Implementação
Cláusula 22.ª
Implementação
1. A Fase de Implementação de todos os componentes do projecto tem o prazo máximo de 1 ano e inicia-se até seis meses a contar da data de produção de efeitos do Contrato.
2. O Co-contratante é responsável pela coordenação da implementação de todas as medidas de melhoria da eficiência energética constantes da proposta adjudicada nos termos e prazos dela constantes em conjugação com o disposto no número anterior, bem como pela salvaguarda do normal funcionamento das instalações integradas no objecto do Contrato.
3. O desenvolvimento das actividades integradas no objecto do Contrato inclui a aquisição e instalação dos equipamentos e a realização dos trabalhos e das obras necessárias, em conformidade com os respectivos projectos de execução constituintes elaborados e aprovados de acordo com o presente caderno de encargos e com as restantes condições técnicas contratualmente estipuladas.
4. No âmbito do número anterior pode ser incluída a realização de trabalhos fora do horário de funcionamento das instalações, ou por turnos, mediante prévio conhecimento e aprovação do Contraente Público e em conformidade com a legislação aplicável.
5. Para além das medidas de melhoria da eficiência energética nos termos constantes da proposta adjudicada, o Co-contratante pode, ainda, durante o período de vigência do Contrato, propor ao Contraente Público a implementação de medidas de melhoria adicionais, nos termos previstos no presente caderno de encargos e no Contrato
6. Para efeitos do disposto no número anterior, o Co-contratante deve submeter os projectos das medidas de melhoria adicionais á prévia consideração do Contraente Público com vista à sua aprovação, aplicando-se o procedimento referido nos n.ºs 5 a 13 da cláusula 27.?, com as necessárias adaptações.
(…)
Cláusula 25.5
Recepção das medidas de eficiência energética
1. Após a realização, com êxito, dos testes e ensaios previstos na cláusula 24.5 e da validação por parte do Contraente Público dos respectivos registos e evidências, é lavrado auto de aceitação dos equipamentos, sistemas e obras, o qual é assinado pela CAC.
2. A recepção das medidas de melhoria da eficiência energética pode ser parcelar e depende da realização dos testes e ensaios nos termos da cláusula anterior.
3. Após a recepção dos equipamentos, sistemas e obras, nos termos da presente cláusula, o Co-contratante dispõe de um período de 20 (vinte) dias para corrigir eventuais não conformidades detectadas.


Secção VII
Fase de Serviço
Cláusula 27.5
Serviço
1. A Fase de Serviço das medidas de melhoria da eficiência energética consiste na respectiva operacionalização e gestão para a medição e verificação das economias de energia garantidas e obtidas pelo Co-contratante nas instalações, incluindo, nomeadamente, as seguintes actividades:
a) Gestão técnica dos equipamentos e sistemas instalados, de acordo com os requisitos de serviço - Anexo II;
b) Gestão da energia das instalações;
c) Manutenção dos bens afectos ao Contrato;
d) Aplicação do Plano de Medição e Verificação.
2. A Fase de Serviço tem início no primeiro dia do mês seguinte ao da conclusão da implementação dos equipamentos, sistemas e obras associados às medidas de melhoria da eficiência energética que perfaçam, pelo menos 70 % do aumento da eficiência energética contratualizada e correspondentes poupanças, considerando-se aceite pelo Contraente Público se nada for comunicado no prazo de 15 (quinze) dias.
3. O cumprimento das obrigações e objectivos constantes da Fase de Serviço são aferidos nos termos dos Relatórios de Medição e Verificação, a elaborar pelo Co-contratante de acordo com a metodologia constante do IPMVP (volume I).
4. A partir do termo do primeiro ano completo após o inicio da Fase de Serviço, os Relatórios de Medição e Verificação devem ser apresentados periodicamente pelo Co-contratante, no prazo de 90 (noventa) dias a contar do primeiro dia do mês homólogo seguinte ao mês do início da Fase de Serviço, para a apreciação e aprovação do Contraente Público.
5. Nos 15 (quinze) dias subsequentes à apresentação de Relatório de Medição e Verificação nos termos do número anterior, o Contraente Público pode determinar o seu aperfeiçoamento mediante a notificação do Co-contratante, por uma única vez, para proceder à rectificação ou à prestação de esclarecimentos ou de outros elementos de informação considerados como necessários para a sua apreciação, suspendendo-se o procedimento pelo período de tempo previsto no número seguinte.
(...)
Cláusula 29ª
Projectos de Execução das Medidas de Melhoria da Eficiência Energética
1. A execução de cada uma das Medidas de Melhoria da Eficiência Energética objecto do Contrato depende da aprovação prévia dos respectivos Projectos de Execução das Medidas de Melhoria da Eficiência Energética pelo Contraente Público.
2. Para efeitos do disposto no número anterior, o Co-contratante deve submeter à aprovação do Contraente Púbico os Projectos de Execução das Medidas de Melhoria da Eficiência Energética no prazo de 90 (noventa} dias, contados da data do visto do contrato pelo Tribunal de Contas.
3. Os Projectos de Execução das Medidas de Eficiência Energética devem incluir os Projectos Luminotécnicos, constantes da proposta adjudicada, demonstrando o respeito pelos requisitos de serviço definidos no Anexo II ao presente Caderno de Encargos.
4. O Contraente Público deve pronunciar-se sobre os Projectos de Execução das Medidas de Melhoria da Eficiência Energética no prazo de 30 (trinta) dias a contar da respectiva apresentação, considerando-se os mesmos tacitamente aprovados em caso de ausência de pronúncia expressa dentro do referido prazo.
5. A solicitação, pelo Contraente Público, de correcções ou esclarecimentos ao Projecto de Execução das Medidas de Melhoria da Eficiência Energética apresentado tem por efeito a suspensão do prazo de pronúncia pelo Contraente Público até que seja feita a correcção ou prestado o esclarecimento solicitado.
6. As correcções e esclarecimentos solicitados devem ser apresentados pelo Co-contratante no prazo de 20 (vinte) dias contados da data de recepção da solicitação a que se refere o número anterior.
7. Sem prejuízo da aprovação dos projectos exigida nos números anteriores, o Co-contratante é o único responsável pelos Projectos de Execução das Medidas de Melhoria da Eficiência Energética e pela respectiva conformidade com a legislação e regulamentação aplicáveis e com as especificações técnicas do Contrato.
8. Todos os prazos de execução do contrato ficam suspensos até pronuncia do
Contraente Público sempre que esta for exigida.

C) - As Autoras, aqui Requerentes deste incidente, e as CIs, Requeridas deste incidente, apresentam proposta ao procedimento pré-contratual objecto desta acção, cujos teores se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos, designadamente os documentos relativos à Memória Descritiva das Medidas e Quantificação das Economias e planeamento dos trabalhos que integram as referidas propostas;

D) - Foi elaborado o relatório final pelo júri, no âmbito do qual foi proposta a ordenação e a adjudicação do procedimento pré-contratual em causa, nos seguintes termos:
5.6. Após analise das propostas admitidas a concurso, o Júri propõe a ordenação de propostas de acordo com o quadro seguinte:
ConcorrentesValor Global da propostaPontuação
[SCom03...], SA; [SCom03...], Unipessoal, Lda.9 747 064,83 €0.8927
I-[SCom01...], Lda.; [SCom02...], Unipessoal, l da9 886 943,00 €0.2279


E) - Em 20-05-2024, foi proferida decisão de adjudicação à proposta das CIs, o que foi comunicado aos concorrentes, via plataforma electrónica da contratação pública, em 27-05-2024;

F) - As Autoras deduziram impugnação administrativa em 03-06-2024;

G) - Em 13-06-2024, a ED e as CIs celebraram o “Contrato de Aquisição de Serviços”, de que se extrai,
- Que, a Câmara Municipal, em sua reunião realizada cm 28 de Setembro de 2023, deliberou aprovar a abertura do procedimento relativo à supra identificada aquisição de serviços, pelo preço base de €9.583.542.86 (nove milhões, quinhentos e oitenta e três mil, quinhentos e quarenta e dois euros e oitenta e seis cêntimos.); acrescido de Imposto sobre o Valor Acrescentado, e pelo período dc execução de quinze a devasseis anos. —
- Que, a Câmara Municipal, em sua reunião realizada em 20 de Maio de 2024. deliberou adjudicar à representada dos segundos outorgantes, mediante procedimento por concurso limitado por prévia qualificação a que corresponde o registo interno nº 102/23, a aquisição de serviços acima referida pelo preço contratual de €9 747 064,83 (nove milhões, setecentos e quarenta e seis mil e sessenta e quatro euros e oitenta e três cêntimos), acrescido de Imposto sobre o Valor Acrescentado, de acordo com a proposta apresentada e o caderno de encargos, bem como deliberou aprovar a respectiva minuta do contrato---------------------------------2024 foi aprovada uma alteração à minuta do contrato quanto ao início da contagem do prazo de execução, que é, efectivamente, após a daí a do auto de consignação e não após a obtenção do visto do Tribunal de Contas como indicado na primeira versão da minuta; -
- Que o prazo dc execução do presente contrato é de quinze anos, com inicio após a assinatura do aulo de consignação.
- Que a remuneração anual à representada dos segundos outorgantes far-se-á com base na cláusula 9ª no caderno de encargos.
(…)
H) - Em 27-06-2024, as Autoras propuseram acção de contencioso pré-contratual de impugnação do acto de adjudicação;
I) - Em 15-07-2024, as Autoras deduziram o presente incidente de adopção de medidas provisórias;
J) - Em data não concretamente apurada, que se situará entre Agosto e Setembro de 2024, o contrato celebrado em 13-06-2024, identificado supra, foi visado pelo Tribunal de Contas.»

Posto isto, enfrentemos as questões acima expostas.

1ª Questão
A sentença recorrida erra no julgamento em matéria de direito porque assenta no pressuposto, de todo errado, de que não foram alegados factos geradores do perigo da formação de um facto consumado para os efeitos do artigo 103º-B do CPTA, pois constam claramente do Requerimento de Medidas Provisórias apresentado factos que justificam a necessidade da execução integral do contrato para que a Recorrente esteja em condições de garantir a sua sustentabilidade económico-financeira?
No que toca a esta questão a sentença recorrida é redutível ao seguinte excerto:
«Descendo ao caso dos autos, podemos adiantar, desde já, que o presente incidente terá de improceder, em face da manifesta ausência de alegação de facto - concreta e circunstanciada - pelas Autoras (como era seu ónus), que permita fundar o preenchimento do requisito do periculum in mora.
Como referido pela ED e pelas Cl, no essencial, a tese das Autoras assenta no entendimento de que qualquer período temporal de que se vejam afastadas da execução do contrato, importará uma diminuição das condições em que terá de recuperar financeiramente o investimento que realizou com a concepção e implementação das medidas de eficiência energética.
As Autoras alegam, entre o mais, que “para que o co-contratante possa garantir a sustentabilidade e equilíbrio negocial, deve ser-lhe proporcionado, durante todo o prazo de vigência do contrato, a possibilidade de explorar, em regime de exclusivo, a eficiência energética dos edifícios do ente público e, bem assim, que lhe seja pago o competente preço contratual”; que “na eventualidade de tal não acontecer, nomeadamente no que diz respeito ao prazo contratual, o co-contratante ver-se-á constituído numa posição em que não estará em condições efectivas e materiais de garantir a sustentabilidade financeira do contrato, por motivos que não lhe são imputáveis e que, como tal, não podem deixar de ter a devida e necessária tutela jurídica”.
Mas não fornecem um único facto, densificado e concretizado, que permita sustentar estas afirmações genéricas e conclusivas. É, aliás, com dificuldade que se alcança a tese (genérica), desprovida de factualização e da necessária concretização, sobre a alegada (in)sustentabilidade financeira do contrato para as Autoras que poderá derivar da não adopção de medida provisória requerida e sobre os encurtamentos de prazos contratuais, incluindo a alegada perda de rentabilidade de 6,42% para 5,82%, que poderá cair para 4,99%. Nenhum desses argumentos permite, minimamente, alicerçar qualquer juízo quanto à ocorrência de uma situação de facto consumado, muito menos a impossibilidade de retomar o procedimento pré-contratual.
Mesmo percorrendo a alegação quanto à necessidade de substituição das luminárias em caso de ganho de causa - que reconhecem no artigo 56.° da petição que as que por si são propostas são iguais às propostas pelas Cl - as Autoras não concretizam custos/danos financeiros reais e actuais, sequer identificam factos concretos (para depois provar) demonstrativos da tal impossibilidade da reposição da legalidade, no plano dos factos, enredando-se numa tese baseada em conjecturas e em meras hipóteses (por vezes contraditórias) sobre eventuais dificuldades de reconstituição da situação jurídica em caso de procedência da acção, que, em rigor, à falta de melhor alegação, em momento algum sai efectivamente abalada.
Nada de concreto e de substancial foi alegado pelas Autoras que permita ao Tribunal considerar, neste momento da acção, que - mesmo considerando o curso da tramitação urgente desta acção - caso venha a ser proferida uma sentença favorável às pretensões das Autoras, o contrato que, eventualmente (depois de ultrapassada a fase de habilitação), venham a celebrar com a ED não possa vigorar na sua plenitude e de acordo com o que por si foi proposto, designadamente quanto ao seu prazo de execução.
Embora o Tribunal não descure as particularidades deste procedimento pré- contratual, submetido, aliás, a regras específicas pelo Decreto-Lei n.° 50/2021, o objecto deste Contrato, e, ainda, as incidências relativas às suas fases de (i) implementação e de (ii) serviço, não se vê como a argumentação das Autoras, generalista, que servirá para qualquer contrato desta natureza, e que não são mais do que lugares comuns decorrentes do cenário de quem não é a concorrente adjudicatária do procedimento, permite fundar o requisito do periculum in mora no caso concreto.
Importa recordar as Autoras que ocorre uma situação de facto consumado quando exista a perspectiva de que, quando a sentença for proferida, o objecto do contrato já se encontre integralmente realizado ou próximo da sua integral execução, tomando inviável a restauração natural. Não será este o caso deste contrato, pois, como ressalta do Decreto- Lei n.° 50/2021 e, no caso, dos termos contratuais que se extrai do Contrato de eficiência energética celebrado entre a ED e as Cl, o prazo de execução deste Contrato é, no total, de 15 anos, ou seja, não se trata de um contrato de execução instantânea, mas duradoura, que se prolonga no tempo, sendo que, mesmo quanto às prestações e obrigações contratuais incluídas na fase de implementação, a Autora não logrou demonstrar, com factos concretos, que é impossível proceder à sua restauração natural.
(…)
E não se pode associar a eventual prática de um acto de adjudicação e/ou um eventual início da execução de um contrato - que no caso, tudo aponta para que ainda não tenha sequer ocorrido, mesmo com a celebração do contrato e a obtenção do visto do Tribunal de Contas (v. cláusulas do CE e do contrato), já que depende da formalização do auto de consignação - à impossibilidade de retomar o procedimento pré-contratual, mesmo num caso como este, em que a execução do contrato contempla duas fases, com as obrigações daí decorrentes, sopesando ainda, neste juízo, a articulação dos prazos previstos nas cláusulas 22ª, n.° 1 e 29.° do CE.
(…)
Deste modo, as Autoras não lograram preencher o requisito do periculum in mora, por não cumprimento do ónus que sobre si impendia em decorrência do disposto no artigo 342.° do Código Civil, pelo que não podemos concluir que existe o risco se tomar irreversível a reconstituição da situação conforme a legalidade, no caso de a presente acção vir a ser julgada procedente, pelo que o presente incidente tem de improceder, não se mostrando legalmente devido que o Tribunal prossiga com a apreciação/ponderação dos vários interesses das partes em confronto.
Nesta conformidade, ante tudo quanto acima foi exposto, o presente incidente de adopção de medidas provisórias deve ser julgado totalmente improcedente.»
Ante esta discurso cumpre, antes de mais, dizer que fundamento da decisão recorrida não é a total inexistência de alegação de matéria de facto, mas si a falta de alegação factos concretos de que se possa extrair a conclusão de ocorrer o risco do facto consumado descrito e qualificado com tal pelas Recorrentes.
Em suma, a Sentença recorrida afirma que não vem alegada factualidade concreta que permite percorrer e levar a cabo o raciocínio cognitivo e valorativo integrante de um julgamento sobre se, a não ser suspensa a execução do contrato adjudicado às CIs, existe o risco de ocorrer o facto consumado de a outorga e a execução do contrato em disputa virem a já não poderem ser feitas pelas Autoras e Recorrentes, por o contrato, na nova circunstância de já estar parcialmente executado pelas CIs, ter deixado de ser viável financeiramente.
As recorrentes alegam que, sim, alegaram os factos concretos que impõem a conclusão da necessidade da execução integral do contrato para que a Recorrente esteja em condições de garantir a sustentabilidade económico-financeira do mesmo, por outras e nossas palavras, os factos de que resulta o perigo de ocorrer o facto consumado da insustentabilidade económico-financeira da sua proposta se a execução do contrato com as CIs não for decretada, como pediram.
Designadamente, segundo elas, os factos são os seguintes, alegados pelos seguintes modos:
a) - Resulta a contrario sensu, do requerimento inicial a alegação de que, tendo em conta as propostas apresentadas pela Recorrente e pelas Contra-interessadas, a não suspensão da execução do contrato irá acarretar para a Recorrente um atraso no início da execução do contrato que não é compatível com a sustentabilidade financeira do mesmo;
b) - No artigo 56.° do Requerimento não se alega apenas que as luminárias são iguais mas também que os equipamentos de telegestão não são os mesmos.
c) - Também é matéria de facto a alegação de ser necessário proceder à auditoria das luminárias e que isso já não é possível após a sua instalação;
d) - De facto é, também, a alegação de que a remoção das luminárias a substituir, havendo caso de ganho de causa das Autoras, terá de ser realizada pelas Contra-interessadas, o que atrasará, ainda mais, o começo da execução do contrato por parte da Recorrente;
e) - Alegação de facto foi, ainda, a de que a necessidade de substituição das luminárias instaladas pelo actual adjudicatário resultava dos riscos técnicos associados à operação;
f) - De facto foi, ainda, a alegação de que, com a não suspensão da eficácia do acto de adjudicação e o consequente inicio da execução do contrato e a execução sucessiva das Recorrentes, a terem vencimento, a taxa de rentabilidade interna (TIR) do projecto cairia de 6,42% para, no mínimo, 5,82%, uma vez que, como as Recorrentes tiveram oportunidade de explicitar, o primeiro valor tem como pressuposto 9,7 meses de serviço, de acordo com a sua proposta, valor esse que não poderá ser garantido no caso de, vencendo a presente acção, ter de proceder à reinstalação de luminárias já instaladas (perdendo assim 5,3 meses de serviço ou mais enquanto estiver pendente de juízo a presente lide);
Vejamos:
O suposto facto a) estaria alegado a contrario sensu. O argumento hermenêutico classicamente designado mediante a locução latina a contrario sensu consiste, pode dizer-se, em extrair, da afirmação ou da negação expressa de uma hipótese, a negação ou a afirmação tácitas, respectivamente, da hipótese absolutamente contrária.
As Recorrentes não identificam as alegações de facto de que resultaria a contrário sensu a proposição de que a não suspensão da execução do contrato irá acarretar para a Recorrente um atraso no início da execução do contrato e que esse atraso não é compatível com a sustentabilidade financeira do mesmo. Mas ainda que as identificassem ou fossem inequivocamente identificáveis no Requerimento Inicial, sempre se nos imporia uma evidência ontológica que é a de que esta alegação, alegadamente latente a contrario sensu no requerimento incidental, tal como nota a Mª Juiz a qua, não tem por objecto factos concretos, sindicáveis no plano do ser, que antecede o do valor. Por isso ela não pode suportar, no plano da fundamentação de facto, a adopção da medida pedida pelas Recorrentes.
O artigo 56º do Requerimento Inicial – que, segundo as recorrentes, conteria a alegação de facto de que os equipamentos de telegestão (previstos nas propostas das CIs e das Autoras (Recorrentes) não são os mesmos – e o seu contexto rezam assim:
«56º. Isto porque, tal como consta das propostas apresentadas pelas Requerentes e pelas Contra-interessadas, pese embora as luminárias propostas fornecer e instalar por cada uma daquelas sejam iguais, os equipamentos de telegestão são diferentes.
57º. Ora, não tendo as Requerentes proposto o mesmo equipamento de telegestão e, por conseguinte, não conhecendo os termos e a fiabilidade do seu funcionamento, não poderá proceder ao seu aproveitamento para efeitos de implementação do presente projecto.
Sem dúvida, é uma alegação em matéria de facto, a de que, embora as luminárias a instalar sejam iguais em ambas as propostas, os equipamentos de telegestão das mesmas são diferentes.
Contudo, se deste facto singelo pode concluir-se por alguma entropia num eventual aproveitamento, na execução do contrato pelas Recorrentes, do material entretanto instalado pelas CIs, já não resulta dele, sem mais, a conclusão da inviabilidade financeira do contrato com as Autoras se iniciado depois de ter começado a ser executado o eventualmente invalidado contrato com as CIs.
O facto c) não se encontra alegado tal como se suporia vir, lendo a conclusão IX do recurso. Com efeito, o que se alega nos artigos 58º a 60º não é que a auditoria das luminárias instaladas seja impossível, mas sim a necessidade dessa auditoria, pelas recorrentes, para poderem assumir o material instalado como meio de execução da sua prestação contratual.
«58°.
Ademais, para que as Requerentes possam cumprir a sua proposta, têm absoluta e imprescindível necessidade de substituir todas as luminárias fornecidas pelas contra-interessadas-interessadas.
59°.
Mesmo que assim não fosse, o que apenas se equaciona por dever de patrocínio, as luminárias instaladas pelas Contra-interessadas também não são susceptíveis de aproveitamento na medida em que as mesmas, após a sua instalação, necessitam de ser auditadas, de forma a ser possível comprovar que os componentes eletrónicos que as compõem estão em condições de pleno funcionamento, respeitando quer o contrato celebrado com o Requerido, quer as características garantidas pelo fornecedor daquele equipamento.
60°.
De igual modo, para além da auditoria, é importante dar nota de que as Requerentes fiscalizam directamente a execução das operações de instalação, sem prejuízo da subscrição por si realizada do competente seguro exigido à luz do preceituado na Cláusula 37.a do Caderno de Encargos.
De qualquer maneira, tão pouco estas alegações de facto bastam para a conclusão da suposta situação de facto consumado que seria a inviabilidade económico financeira do contrato dos Recorrentes se executado sem ter sido suspensa a execução do contrato com as CIs.
É de facto, também, a alegação (cf. alª d) e e) supra), de que a substituição das luminárias é inevitável e que a remoção das colocadas pelas CIs, havendo ganho de causa das Autoras, terá de ser realizada por aquelas, o que atrasará o começo da execução do contrato por parte da Recorrente;
Esta alegação, que envolve insuprida contradição com alegações de facto anteriores feitas no pressuposto da possibilidade de aproveitamento de material instalado pelas CIs, – Posto que se trata de matéria de facto cuja veracidade se está a afirmar, não é logicamente – para não dizer eticamente – sofrível propor uma ordem de subsidiariedade entre as duas alegações. encontra-se nos artigos 61º a 64º do Requerimento.
Não negamos a validade da alegação da probabilidade de factos futuros e eventuais, enquanto fundamentação de facto de uma alegação de perigo concreto da ocorrência de um facto ou uma situação fáctica também ela futura e eventual. Contudo, também aqui há uma solução de continuidade lógica entre o facto hipótese e a conclusão pela situação de facto consumado que seria a inviabilidade económico financeira da execução do contrato com as Recorrentes se o contrato com as CIs fosse, entretanto, começado a executar.
Por fim, a alegação f), porque omite os factos e os números concretos factores do subjacente cálculo, não pode ser tratada como uma alegação de matéria de facto, sindicável em termos de provado ou não provado, tal como também se sustenta na sentença recorrida.
Posto isto, fica claro que, embora o Requerimento de medidas provisórias contenha a alegação de alguns factos – designadamente os sobreditos - inclusive facto susceptíveis de concorrerem para a almejada conclusão de que sem a medida provisória peticionada o contrato a celebrar, em caso de vencimento na acção, deixaria provavelmente de ser viável económico-financeiramente, embora, ainda, seja admissível a alegação de factos hipótese, atentas a especial natureza da tutela cautelar, os factos alegados de modo nenhum eram suficientes para se poder concluir racionalmente por tal risco.
É negativa, portanto, a resposta a esta questão.

2ª Questão
A sentença recorrida erra também no julgamento de direito porque labora num conceito restritivo de facto consumado, i.e., o de que este só ocorre se o contrato já estiver executado, quando a melhor doutrina propaga um conceito prático que engloba o caso de a execução já se encontrar num estádio de implementação tal que uma sua invalidação resultaria num grande prejuízo para as necessidades colectivas?

Aqui os Recorrentes dão de barato quod est demonstrandum, isto é, que a sentença recorrida labora sobre um entendimento estrito do conceito legal de facto consumado.
Ora, por um lado, o teor literal da sentença, designadamente a citação feita, ainda que em tese geral, do comentário ao CPTA de Aroso de Almeida e Carlos A. Cadilhe, revela o contrário:
«Nas palavras de Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha “A primeira dessas situações ocorre quando os factos concretos alegados pelo requerente permitam perspectivar a impossibilidade da reposição da legalidade, no plano dos factos, no caso de o processo vir a ser julgado procedente. Será esse o caso, desde logo, quando exista a perspectiva de que, quando a sentença for proferida, as prestações contratuais que constituíam o objecto do contrato iá se encontrarão integralmente realizadas ou o contrato iá se encontrará próximo da sua integral execução. Nesse caso, os custos financeiros que resultam da retroacção da anulação do contrato, em resultado da invalidade de actos procedimentais, traduzidos na restituição das contraprestações efectuadas pelo adjudicatário e nos encargos com o lançamento de um novo procedimento, tomam inviável a restauração natural. Mas também poderá ser essa a situação quando exista a perspectiva de que, quando a sentença for proferida, o contrato se encontrará apenas parcialmente executado, mas decorreriam consequências fortemente negativas para a satisfação das necessidades colectivas em caso de invalidação do contrato e paralisação das respectivas prestações contratuais.
(...)
O n.° 1 do presente artigo caracteriza o periculum in mora, nos termos enunciados, como um requisito positivo cujo preenchimento é necessário para o efeito de justificar o recurso à tutela cautelar. Cabe ao requerente alegar que a medida provisória é necessária para evitar que ele fique definitivamente arredado da possibilidade de obter a adjudicação do contrato, quer através da constituição de uma situação de facto consumado, quer através da impossibilidade de retomar o procedimento. E só se for reconhecida a existência do risco de impossibilidade de reposição da legalidade, nos termos enunciados no n.° 1, é que cabe ao juiz. num segundo momento, averiguar se os danos que resultariam da adopção da medida provisória e que se projectam na esfera jurídica dos requeridos, são superiores aos danos que podem resultar para o requerente da não adopção da medida, nos termos do n.° 3.” (cf. in Comentário ao CPTA, 4.a Ed., Almedina, p. 850) - sublinhado e destaque nosso.»
Depois, e sobretudo, nada no discurso supratranscrito, obriga a concluir, nem as Recorrentes demonstram, que, ao tratar o caso em concreto, a Mª Juiz supõe que o facto consumado seria apenas a impossibilidade de se executar o contrato, por já estar todo, ou quase todo executado pelas CIs, ou de já não ser possível retomar o procedimento no ponto anterior à execução do contrato.
Como assim, é negativa, também, a resposta a esta questão.

3ª Questão
A sentença recorrida errou no julgamento de direito porque não valorou como facto consumado a diminuição do tempo de execução do contrato pelas recorrentes, se vencedoras, na medida do tempo já executado, diminuição que, num contrato plurianual em que o tempo de execução era factor da recuperação do investimento do co-contratante, buliria com o equilíbrio financeiro do contrato com as Recorrentes?

Também aqui jugamos que as recorrentes partem de um pressuposto que não está assente nem demonstrado.
Com efeito, se é certo que o requerimento de adopção da medida de suspensão da execução do contrato adjudicado às CIs a sentença tem um dos seus principais vectores na alegação de que um início tardio da execução do contrato por parte das Autoras e Recorrentes traria consigo o risco da perda do equilíbrio económico-financeiro do contrato, por haver menos tempo do que os 16 anos preconizados, para recuperação do investimento, também o é que a Mª Juiz a qua, longe de negar que, em abstracto isso possa consistir num facto consumado para efeitos do artigo 103º - B nº 1 do CPTA, apenas julgou que as recorrentes não haviam alegado os factos demonstrativos desses fatalidade ou sequer desse risco:
«As Autoras alegam, entre o mais, que “para que o co-contratante possa garantir a sustentabilidade e equilíbrio negocial, deve ser-lhe proporcionado, durante todo o prazo de vigência do contrato, a possibilidade de explorar, em regime de exclusivo, a eficiência energética dos edifícios do ente público e, bem assim, que lhe seja pago o competente preço contratual”; que “na eventualidade de tal não acontecer, nomeadamente no que diz respeito ao prazo contratual, o co-contratante ver-se-á constituído numa posição em que não estará em condições efectivas e materiais de garantir a sustentabilidade financeira do contrato, por motivos que não lhe são imputáveis e que, como tal, não podem deixar de ter a devida e necessária tutela jurídica”.
Mas não fornecem um único facto, densificado e concretizado, que permita sustentar estas afirmações genéricas e conclusivas (…).».
(…)
Nada de concreto e de substancial foi alegado pelas Autoras que permita ao Tribunal considerar, neste momento da acção, que - mesmo considerando o curso da tramitação urgente desta acção - caso venha a ser proferida uma sentença favorável às pretensões das Autoras, o contrato que, eventualmente (depois de ultrapassada a fase de habilitação), venham a celebrar com a ED não possa vigorar na sua plenitude e de acordo com o que por si foi proposto, designadamente quanto ao seu prazo de execução.
Pelo exposto, é negativa, também, a reposta a esta questão.

4ª Questão
Também errou no julgamento de direito, a sentença recorrida, quando julgou que a consignação dos trabalhos não ocorreria antes da decisão final no processo principal, mesmo tendo em conta os prazos previstos no nº 1 da cláusula 22ª e 29º do Caderno de Encargos, porque de facto não é crível que os mesmos, por mais estendidos que sejam, não estejam já cumpridos à data do trânsito em julgado da sentença que decidirá os presentes autos?
Estarão, as Recorrentes, a referir-se ao excerto que segue:
« E não se pode associar a eventual prática de um acto de adjudicação e/ou um eventual início da execução de um contrato - que no caso, tudo aponta para que ainda não tenha sequer ocorrido, mesmo com a celebração do contrato e a obtenção do visto do Tribunal de Contas (v. cláusulas do CE e do contrato), já que depende da formalização do auto de consignação - à impossibilidade de retomar o procedimento pré-contratual, mesmo num caso como este, em que a execução do contrato contempla duas fases, com as obrigações daí decorrentes, sopesando ainda, neste juízo, a articulação dos prazos previstos nas cláusulas 22.a, n.° 1 e 29.° do CE.»
Ao formularem a alegação que subjaz a esta questão, as Recorrentes mais não fazem do que expressar um juízo de prognose quanto a uma cronologia de certos actos no procedimento, divergente do juízo do Tribunal a quo, sem, contudo, demonstrarem ou, ao menos, sustentarem, por factos e um raciocínio reconstituível pelo interlocutor, a validade do seu juízo em detrimento daquele outro.
Como assim, a resposta a esta questão também é negativa.

Conclusão
Do veredicto negativo quanto a todas as questões supra, só pode resultar a improcedência do recurso.

Custas
Vencidas, as recorrentes arcarão com as custas do recurso: artigo 427º do CPC.

Dispositivo
Assim, acordam em conferência os juízes da subsecção de contratos públicos da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao recurso.
Custas pelas Recorrentes.
Porto, 24/1/2025

Tiago Afonso Lopes de Miranda
Ricardo Jorge Pinho Mourinho de Oliveira e Sousa
Maria Clara Alves Ambrósio