Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02557/10.9BELSB
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/03/2020
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Helena Canelas
Descritores:MEDICAMENTOS – COMPARTICIPAÇÃO
Sumário:I. - O artigo 6º do DL. nº 118/92, de 25 de junho, que estabelecia à data o regime de comparticipação do Estado no preço dos medicamentos, contemplava as condições e requisitos para que um medicamento pudesse ser incluído na lista de medicamentos comparticipados, os quais assentavam em critérios de natureza técnico-científica seja conexionados com a eficácia e efetividade para as indicações terapêuticas do medicamento seja por apelo a critérios de natureza distinta, tais como a existência de vantagens económicas ou terapêuticas.

II. - A decisão sobre o pedido de inclusão de um medicamento na lista de medicamentos comparticipados está, nos termos gerais, sujeita ao dever de fundamentação.

III. - Um dos vetores essenciais da fundamentação é o seu enquadramento legal; se no parecer a que aderiu a decisão administrativa impugnada refere apenas laconicamente que o pedido de comparticipação do medicamento não satisfaz «…as condições previstas no Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de junho», sem que tenha sido feita qualquer subsunção ao quadro normativo aplicável, em especial, sem que se justificasse qual a razão (ou conjunto de razões) que motivariam a entendimento de que o pedido não cumpria alguma, algumas ou nenhuma das condições e requisitos para que o medicamento pudesse ser incluído na lista de medicamentos comparticipados, tal tornará impercetível qual o enquadramento que terá sido feito pela entidade administrativa, por não se conseguir saber os fundamentos normativos da decisão, por inexistentes, ferindo a decisão administrativa de invalidade por falta de fundamentação. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:INFARMED, IP
Recorrido 1:L.,SA
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento aos recursos.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
A L., S.A. (devidamente identificada nos autos) autora na ação administrativa especial que instaurou contra o Ministério da Saúde e o INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P., (ambos igualmente devidamente identificada nos autos) na qual, impugnando o Despacho do Sr. Secretário de Estado da Saúde de 11/0872010, pelo qual se indeferiu o pedido de comparticipação do medicamento OSSIN 500, peticionou a sua anulação bem como a condenação das rés na prática do ato devido, consubstanciado na inclusão do OSSIN 500 (nas suas diferentes apresentações) na lista de medicamentos comparticipados pelo SNS, no escalão de 69% nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2, do artigo 6.º do DL. n.º 118/92, de 25 de junho.
Por sentença de 20/04/2016 o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (para o qual os autos foram remetidos na sequência de decisão de incompetência em razão da matéria proferida pelo Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa em 14/04/2011, onde a ação havia sido instaurada – fls. 75 SITAF) julgando a ação julgada procedente, anulou o despacho impugnado e condenou os réus à reapreciação do pedido, à luz dos critérios previsto no artigo 6º do Decreto-Lei nº 118/92, de 25 de junho.
Inconformado o réu INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P., dela interpôs recurso de apelação (fls. 266 SITAF), pugnando pela revogação da decisão recorrida, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
1.ª Da conjugação dos artigos 6.º/1 e 6.º/2/d) do DL 118/92 resulta claro que, para que um medicamento seja incluído na lista de medicamentos comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde, o mesmo terá de preencher as seguintes condições: i) evidenciar a sua eficácia e efectividade para as indicações terapêuticas reclamadas, de acordo com critérios de natureza técnico-científica; e ii) constituir uma das situações previstas no artigo 6.º/2, nomeadamente, a prevista na alínea d).
2.ª Acontece que, como resulta de forma explicita do Relatório de Avaliação Fármaco-Terapêutica ao medicamento em causa, não foi evidenciada a eficácia terapêutica do medicamento da ora Recorrida,
3.ª De facto, consta expressamente do referido relatório que, o medicamento em causa não respeitava o previsto no artigo 6.º/1 do DL 118/92, quando é referido que, “Isto significa uma de duas possibilidades: ou o medicamento não apresentou eficácia, ou o estudo não teve poder suficiente para distinguir o efeito benéfico da condroitina em relação ao placebo. É certo que não encontrou também diferença significativa entre a condroitina e glucosamina, mas o mesmo ocorreria se efectuassem um estudo com 1 doente por braço; com 5 doentes, provavelmente teriam obtido o mesmo resultado – que todas as opções eram comparáveis porque não apresentavam diferença entre elas. Mas se não apresentam diferença do placebo, então em termos farmacoterapêuticos não poderão ser comparticipados”.
4.ª Assim, e considerando que o Despacho do Secretário de Estado da Saúde recaiu sobre o referido relatório, e consequentemente a referida fundamentação, resulta inequívoco que é possível conhecer qual o iter cognoscitivo que levou a Administração a proferir o ato impugnado.
5.ª Por outro lado, em consequência do que agora se concluiu, verifica-se também que o douto Tribunal a quo não poderia ter considerado que a avaliação dos restantes vícios estava obstruída dada a falta de fundamentação – nomeadamente os vícios de violação do princípio da igualdade bem como das regras da concorrência – porquanto, os dois medicamentos em causa não são equivalentes, já que o medicamento da Recorrida não demonstrou a eficácia terapêutica, ao contrário do medicamento que serviu de comparador.
6.ª Desta forma, também deveria ter sido julgado improcedente o pedido de condenação à prática de ato devido.

Também o réu Ministério da Saúde interpôs recurso de apelação da sentença, aderindo às alegações de recurso do seu co-réu INFARMED (cfr. fls. 274 SITAF).

O recorrido contra-alegou (fls. 288 SITAF) pugnando pela improcedência de ambos os recursos, com manutenção da decisão recorrida, não tendo formulado conclusões.
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Remetidos os autos a este Tribunal em recurso, neste notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, a Digna Magistrada do Ministério Público não emitiu Parecer.
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Após redistribuição (cfr. Despacho nº 1/2019 de 04/01/2019 do Exmo. Senhor Juiz Desembargador Presidente deste TCA Norte) foram os autos submetidos à Conferência para julgamento, com dispensa de vistos.
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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (Lei n.º 41/2013) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pelos recorrentes as respetivas as conclusões de recurso, a questão essencial a decidir é a de saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao anular o ato impugnado, com fundamento em vício de falta de fundamentação, com condenação dos réus a reapreciar o pedido da autora.
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III. FUNDAMENTAÇÃO

A – De facto

O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, assim vertida ipsis verbis na sentença recorrida:
A – No âmbito do processo de autorização de introdução no mercado (AIM) do OSSIN 500 (sulfato de condroitina), foi emitido «Parecer Médico», datado de 18.09.2003 (cf. doc. a fls. 115 a 119 dos autos em proc. fis. que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
B – O OSSIN 500 obteve AIM por decisão do Conselho de Administração do INFARMED em 17.11.2003 (cf. doc. a fls. 16 a 18 dos autos em proc. fis. que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
C – Por despacho do Sr. Diretor Geral da DGAE, datado de 29.12.2009, foi autorizado que o OSSIN 500 na apresentação de 20 cápsulas de 500 mg tivesse um preço máximo de € 5,92 (cf. doc. a fls. 19 dos autos em proc. fis. que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
D – Em 30.12.2010, a Autora deu entrada nos serviços do INFARMED de um pedido de comparticipação para o medicamento OSSIN 500 na apresentação de 500mg em cápsulas (cf. docs. a fls. 3 a 75 do PA (pasta verde) que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
E – Em 09.05.2010, foi elaborado «Relatório de Avaliação Fármaco-Terapêutica», relativamente ao pedido referido na alínea anterior, no qual sob a epigrafe «Comentários» se retira relativamente ao OSSIN 500 que:
“[…] Trata-se de um medicamento descrito como DMOD, pertencendo ao mesmo grupo da glucosamina. O sulfato de condroitina foi já alvo de apreciação desfavorável no contexto de comparticipação (2005). Deste modo, apreciámos significativamente os ensaios clínicos publicados após a apreciação, nomeadamente: para a condroitina: Mazières et al. 2007; Kahan et al. 2009; para a glucosamina: Herrero-Beaumont et al. 2007; e uma comparação directa entre a condroitina e glucosamina, que não existia antes: Clegg et al. 2006.
É também efectuada uma comparação indirecta de meta-análises referentes à condroitina vs glucosamina. Devo referir que os ensaios clínicos considerados tiveram várias medidas de eficácia, e diferentes durações de tratamento, pelo que a escolha do máximo denominador comum entre todas estas medidas acaba por ser muito redutora. Deste modo não podemos considerar este estudo como piéce de resistance.
Dos novos ensaios de substância activa isolada contra placebo, denota-se melhoria metodológica em relação aos ensaios da década de 90. No entanto os dados fornecidos não consubstanciam de forma significativa uma mudança de comportamento em termos de eficácia ou segurança de qualquer das substâncias. Em relação ao ensaio de comparação directa, envolvendo 1583 participantes, ele decorreu com 5 braços: condroitina, glucosamina, placebo, celecoxib 200 mg ou associação de glucosamina com condroitina. De notar que a dose condroitina aqui avaliada foi de 1200 mg, seja isolada seja em associação com glucosamina. Neste estudo, por ventura muito ambicioso dadas as múltiplas comparações, não houve diferença significativa entre qualquer dos braços com DMOD vs. placebo ou entre eles.
Do referido acima não encontramos justificação para adicionar a condroitina à substância activa comparticipada como DMOD […]”. Neste parecer conclui-se que: “A não comparticipar”.
(cf. doc. a fls. 9 a 10 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
F – Em proposta dirigida ao Conselho Diretivo do INFARMED, datada de 17.05.2010, referente à comparticipação do medicamento supra indicado, retira-se que: “[…] Trata-se de um novo medicamento que não possui composição qualitativa idêntica à de outros já comparticipados, nem constitui inovação terapêutica. De acordo com os Relatórios de Avaliação Farmacoterapêutica (Anexo I), não foi comprovada a sua eficácia terapêutica, pelo que se propõem o indeferimento do pedido de comparticipação [...]” concluindo-se que o pedido de comparticipação “[…] não cumpre com o estipulado no Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de Junho, na sua redacção actual […]” (cf. doc. a fls. 7 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
G – Na proposta referida na alínea anterior foi aposto despacho por parte do Sr. Presidente do Conselho Diretivo do INFARMED, datado de 24.05.2010, nos seguintes termos: “Concorda-se com a proposta de indeferimento” (cf. doc. a fls. 7 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
H – A Autora foi notificada do relatório, da proposta e do despacho referidos nas três alíneas anteriores e para “[…] no prazo de 10 dias úteis, dizerem o que se lhes oferecer sobre o assunto […]” (cf. docs. a fls. 4 a 6 do PA que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
I – A Autora apresentou uma exposição escrita junto dos serviços do Réu INFARMED, datada de 08.06.2010, solicitando, a final, que fosse comparticipado o medicamento supra referido (cf. doc. a fls. 12 a 15 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
J - Em 09.05.2010, foi elaborado «Relatório de Avaliação Fármaco-Terapêutica», relativamente ao pedido referido nas alíneas anteriores, no qual sob a epigrafe «Comentários» se retira relativamente ao referido na alínea anterior que: “[…] Argumentando a resposta do detentor de AIM 273/06/10, devo referir:
As frases respeitantes ao estudo Clegg et al, 2006 devem ser entendidas adequadamente, e não podem levar à interpretação que o detentor de AIM expõe na sua carta. Senão vejamos: O estudo referido revela antes de mais que não houve diferença significativa entre o placebo e a controitina. Isto significa uma de duas possibilidades: ou o medicamento não apresentou eficácia, ou o estudo não teve poder suficiente para distinguir o efeito benéfico da condroitina em relação ao placebo. É certo que não encontrou também diferença significativa entre a condroitina e glucosamina, mas o mesmo ocorreria se efectuassem um estudo com 1 doente por braço; com 5 doentes, provavelmente teriam obtido o mesmo resultado – que todas as opções eram comparáveis porque não apresentavam diferença entre elas.
Mas se não apresentam diferença do placebo, então em termos farmacoterapêuticos não poderão ser comparticipados. Recordamos que a glucosamina se manteve em comparticipação visto que apresentou estudos considerados metodologicamente válidos, com outcomes de eficácia acima do placebo. O facto de neste estudo a diferença não foi significativamente diferente entre a glucosamina e o placebo, pode traduzir baixo poder do estudo, ou a escolha de outcomes de eficácia que não tenham beneficiado este grupo de medicamentos. Mas reitero que tal não é matéria para poder suportar a comparticipação da condroitina. […]” (cf. doc. a fls. 17 a 19 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
K – Em proposta dirigida ao Conselho Diretivo do INFARMED, datada de 30.07.2010, referente à comparticipação do medicamento supra indicado, retira-se que: “[…] A 11-06-2010, o titular da A.I.M. submeteu argumentação (Anexo II) em sede de audiência prévia à proposta de indeferimento (Anexo I) do processo referido em epígrafe. De acordo com a análise pelo perito farmacologista, constante no Relatório de Avaliação Farmacoterapêutico (Anexo III), a argumentação presente pelo titular de A.I.M. não justifica a alteração do sentido da decisão judicial, pois não foi demonstrado valor terapêutico que justifique a comparticipação.
Desta forma propõe-se o indeferimento final do pedido de comparticipação do medicamento supracitado, por não satisfazer as condições previstas no Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de Junho, dado ter sido submetido antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 48-A/2010, de 13 de Maio [...]” (cf. doc. a fls. 2 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
L – Na proposta referida na alínea anterior foi aposto despacho por parte do Sr. Secretário de Estado da Saúde, de 01.08.2010, com o seguinte teor:
“Indefiro conforme proposto” (cf. doc. a fls. 2 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
M – O relatório, a informação e o despacho referidos nas três alíneas anteriores foram objeto de notificação à Autora por ofício dos serviços do INFARMED, datado de 25.05.2011 (cf. docs. a fls. 22 a 30 dos autos em proc. fis. que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
N – Em 04.10.2011, foi elaborado pelo Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência da Faculdade de Medicina de Lisboa um parecer intitulado «Argumentação sobre as afirmações do Perito do Relatório de Avaliação Farmacoterapêutica referente a pedido de comparticipação do Ossin® (sulfato de condroitina)» (cf. doc. a fls. 156 a 169 dos autos em proc. fis. que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
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B – De direito

1. Da decisão recorrida
Na sentença recorrida o Tribunal a quo considerando verificado o vício de falta de fundamentação, assacado pela autora ao ato impugnado, anulou-o com tal fundamento.
E debruçando-se sobre o pedido de condenação à prática do ato devido, entendeu que a questão em dissídio pressupunha a apreciação discricionária feita pela administração do pedido de comparticipação de medicamento formulada pela autora, e que assim o Tribunal apenas podia condenar os réus a reapreciação o pedido à luz dos critérios previstos no artigo 6º Decreto-Lei n.º 118/92 (na redação dada pelos Decretos-Leis nºs. 305/98, 205/2000, 270/2002, 249/2003 e 65/2007), cabendo aos réus dentro da específica competência de cada um, dar nota da aplicação concreta ou afastamento dos critérios naquela norma.

2. Da tese dos recorrentes
Os recorrentes propugnam em primeira linha que da fundamentação vertida no Relatório de Avaliação Fármaco-Terapêutica sobre que recaiu o despacho do Secretário de Estado da Saúde resulta inequívoco que é possível conhecer qual o iter cognoscitivo que levou a Administração a proferir o ato impugnado – (vide conclusões 1ª a 4ª das alegações de recurso).
E defendem ainda que também deveria ter sido julgado improcedente o pedido de condenação à prática de ato devido por o medicamento da autora não ter demonstrado a eficácia terapêutica, ao contrário do medicamento que serviu de comparador – (vide conclusões 5ª a 6ª das alegações de recurso).

3. Da análise e apreciação do recurso
3.1 Está em causa nos autos o despacho do Secretário de Estado da Saúde que indeferiu o pedido de comparticipação do medicamento OSSIN 500 apresentação de 500mg em cápsulas que havia sido apresentado pela autora ao INFARMED.
A autora assacou a esse ato de indeferimento as seguintes causas de invalidade (que condensou assim no artigo 56º da PI):
- Vício de violação de lei, por não aplicar as regras constantes da alínea d), do n.º 2, do artigo 6º, do Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de junho e do artigo 3º, n.º 1 do CPA e artigos 266º, n.º 1 e 2 da CRP;
- Vício de falta de fundamentação, por a decisão recorrida assentar em fundamento diferente do constante da proposta de decisão, sobre o qual a autora se pronunciou, violando desse modo o disposto nos artigos 123º, n.º 1, alínea d), artigo 124º, n.º 1, alíneas a), c) e d) e no artigo 125º, todos do CPA, bem como o artigo 268º, n.º 3 da CRP;
- Violação do princípio da igualdade, previsto no artigo 5º do CPA e nos artigos 13º e 266º, n.º 2 da CRP, por criar objetivamente distorção na concessão de benefícios legais a produto equivalente para esse efeito e recusar a mesma comparticipação ao medicamento OSSIN 500;
- Violação das regras da concorrência ao conceder comparticipação ao medicamento Viartril S e recusá-la ao medicamento OSSIN 500, sem fundamento legal, e, consequentemente restringir e afetar de forma significativa a concorrência no mercado, uma vez que, naturalmente, as vendas de medicamento comparticipado são superiores às de medicamento equivalente e não comparticipado.

3.2 O Mmº Juiz a quo, visando apreciar os invocados vícios de violação de lei e de falta de fundamentação, pelos quais começou discorreu o seguinte, que se passa a transcrever:
«(…)
Segundo a Autora, o ato recorrido afronta o disposto na alínea d) do nº 2 do artigo 6.º, do Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de Junho na redação então vigente e o artigo 3.º, n.º 1, do CPA e artigo 266.º, n.º 1 e 2 da CRP.
Contudo, a argumentação da Autora cinge-se na sua globalidade ao vício de violação de lei ínsito no supra aludido Decreto-Lei n.º 118/92, sendo que as demais normas invocadas decorrem da interpretação que a Autora faz no sentido de ter sido desrespeitado o normativo citado e, com isso, se ter ofendido o princípio da legalidade. Deste modo, não há aqui uma verdadeira autonomização da violação deste princípio a se e de per se considerado.
Assim, dispunha o então vigente art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 118/92 (na redação dada pelos Decretos-Leis n.os 305/98, 205/2000, 270/2002, 249/2003 e 65/2007) que:

Artigo 6.º
Medicamentos comparticipáveis
1 - A avaliação dos medicamentos para efeitos de inclusão na lista de medicamentos comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde e a sua reavaliação sistemática nos termos do artigo 6.º-A assentam em critérios de natureza técnico-científica, que evidenciem a sua eficácia e efetividade para as indicações terapêuticas reclamadas.
2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a comparticipação depende da verificação de uma das seguintes situações:
a) Medicamentos contendo novas substâncias activas com um mecanismo de acção farmacológica inovador, que venham preencher uma lacuna terapêutica definida por uma maior eficácia e ou tolerância que tratamentos alternativos já existentes;
b) Novos medicamentos, com composição qualitativa idêntica à de outros já comercializados e comparticipados, se, em idêntica forma farmacêutica, apresentarem preço 5% inferior ao mais baixo dos comparticipados não genéricos, sendo o preço expresso por unidade de massa da substância activa;
c) Nova forma farmacêutica, novas dosagens ou nova embalagem de medicamentos já comparticipados com igual composição qualitativa, desde que seja demonstrada ou reconhecida vantagem e necessidade de ordem terapêutica e vantagem económica;
d) Novos medicamentos que não constituam inovação terapêutica significativa nem possuam composição qualitativa idêntica à de outros já comparticipados, se apresentarem vantagens económicas relativamente a medicamentos já comparticipados, utilizados com as mesmas finalidades terapêuticas e possuindo idênticos mecanismos de acção comprovados, através da documentação entregue;
e) Associações medicamentosas em cuja composição entrem substâncias activas já comparticipadas, se for demonstrada a sua vantagem terapêutica e se o preço não for superior ao somatório dos preços dos mesmos medicamentos quando administrados isoladamente em idênticas posologias;
f) Associações medicamentosas de substâncias activas que não existam no mercado isoladamente e que demonstrem vantagens sobre medicamentos do mesmo grupo terapêutico, através dos resultados de ensaios clínicos realizados.
3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, os medicamentos aprovados ao abrigo da alínea a) do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 72/91, de 8 de Fevereiro, poderão ser comparticipados se apresentarem preço igual ao do medicamento de referência e desde que solicitada a comparticipação em simultâneo com este último.
4 - Em derrogação do disposto nos n.ºs 2 e 3 e sem prejuízo do disposto no n.º 1 e no número seguinte, quando exista preço de referência autorizado para o grupo homogéneo onde o medicamento se insere, o seu preço de venda ao público não pode ser superior ao preço de referência.
5 - O PVP dos novos medicamentos genéricos a entrar nos grupos homogéneos deve ser inferior em 3% relativamente ao PVP do medicamento genérico de preço mais baixo, com pelo menos 10% de quota do mercado de medicamentos genéricos no grupo homogéneo.
6 - Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se “quota do mercado de medicamentos genéricos no grupo homogéneo” o peso das vendas totais de cada medicamento genérico no total de vendas dos medicamentos genéricos nesse grupo.”
No relatório inicial formulado pelos serviços do INFARMED e, sobretudo, na informação jurídica que nele foi aposta apontou-se como fundamento de um potencial indeferimento a circunstância do medicamento aqui em causa não ter direito à solicitada comparticipação à luz do regime legal vigente decorrente do Decreto-Lei n.º 118/92. Porém, a questão que se coloca é a de saber que concreta subsunção legal foi dada ao pedido do Autor.
Ora, a exigência de fundamentação dos atos administrativos, enquanto dever da Administração de enunciar explicitamente as razões ou motivos que conduziram à prática de um determinado ato por uma certa entidade administrativa, tem, desde logo e dada a sua essencialidade, assento ao nível constitucional, encontrando-se tal obrigação plasmada no n.º 3 do art.º 268.º da CRP.
Também, ao nível infra-constitucional e termos dos então vigentes arts.º 124.º e 125.º do CPA, o dever de fundamentação deve estar especialmente presente nos atos administrativos, assumindo a sua dispensa um carácter verdadeiramente excecional. Assim, os atos administrativos que estejam sujeitos à obrigação de fundamentação deverão conter os fundamentos de facto e de direito, ainda que enunciados de forma sucinta, destinando-se tal ónus a assegurar várias funções, nomeadamente uma função de pacificação, de defesa do administrado, de auto controlo administrativo e de clarificação e de prova (vide nesse sentido Rui Machete, in “O processo Administrativo Gracioso perante a Constituição Portuguesa de 1976”, in “estudos de Direito público e Ciência Política”, pag. 380).
Assim, a exigência de fundamentação dos atos administrativos implica que os fundamentos invocados não sejam obscuros, contraditórios ou insuficientes e que, por essas razões, não esclareçam concretamente a motivação do ato (n.º 2 do art.º 125.º do CPA na redação vigente à data dos factos). Por isso, esta última norma citada faz equivaler à falta de fundamentação, a fundamentação que, em concreto, não respeita os referidos ditames.
Um dos vetores essenciais da fundamentação é o seu enquadramento legal que, no caso, não foi suficientemente feita à luz do quadro legal aplicável. É que tal pressupunha que a autoridade decisora enquadrasse como fundamento da sua decisão a aplicação do critério geral do n.º 1 do art.º 6 do diploma citado, e/ou então, nos diversos critérios enunciados no n.º 2 do referido art.º 6.º (já para não mencionar os critérios do n.º 3 e n.º 4). Ora, no caso em apreço, tal não foi feito o que torna inatingível para o Tribunal o alcance dos fundamentos decisórios e que obsta a que se possa apreciar o apontado vício de violação de lei. Porém esta ininteligibilidade atinge sobretudo o destinatário do ato recorrido que, em face do mesmo, não pode reconstruir o percurso valorativo feito pela administração, ainda que o Autor configura como sendo devida a comparticipação solicitada à luz de um determinado e específico normativo.
Também tal obstrução se verifica a propósito dos demais vícios invocados como o da violação do princípio da igualdade e da sã concorrência.
Por isso, verifica-se o apontado vício de falta de fundamentação.»

3.1.2 Os recorrente sustentam que da conjugação dos artigos 6.º nº 1 e 6.º nº 2 alínea d) do DL nº 118/92, de 25 de junho resulta claro que, para que um medicamento seja incluído na lista de medicamentos comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde, o mesmo terá de preencher as seguintes condições: i) evidenciar a sua eficácia e efetividade para as indicações terapêuticas reclamadas, de acordo com critérios de natureza técnico-científica; e ii) constituir uma das situações previstas no artigo 6.º nº 2, nomeadamente, a prevista na alínea d); que como resulta de forma explicita do Relatório de Avaliação Fármaco-Terapêutica ao medicamento em causa, não foi evidenciada a eficácia terapêutica do medicamento da autora, constando expressamente do referido relatório que o medicamento em causa não respeitava o previsto no artigo 6.º 1 do DL 118/92, quando é referido que “Isto significa uma de duas possibilidades: ou o medicamento não apresentou eficácia, ou o estudo não teve poder suficiente para distinguir o efeito benéfico da condroitina em relação ao placebo. É certo que não encontrou também diferença significativa entre a condroitina e glucosamina, mas o mesmo ocorreria se efetuassem um estudo com 1 doente por braço; com 5 doentes, provavelmente teriam obtido o mesmo resultado – que todas as opções eram comparáveis porque não apresentavam diferença entre elas. Mas se não apresentam diferença do placebo, então em termos farmacoterapêuticos não poderão ser comparticipados” e que assim, considerando que o despacho do Secretário de Estado da Saúde recaiu sobre o referido relatório, e consequentemente a referida fundamentação, resulta inequívoco que é possível conhecer qual o iter cognoscitivo que levou a Administração a proferir o ato impugnado.
3.1.3 O DL. nº 118/92, de 25 de junho, que à data estabelecia, com as modificações entretanto sofridas, o regime de comparticipação do Estado no preço dos medicamentos (posteriormente revogado, com efeitos a 01/06/2020, pelo DL. n.º 48-A/2010, de 13 de maio, que aprovou o novo regime geral das comparticipações do Estado no preço dos medicamentos – artºs 7º e 10º) e, por conseguinte, o temporalmente aplicável à situação dos autos, dispunha o seguinte no seu artigo 6º (na redação em vigor à data):
“Artigo 6.º
Medicamentos comparticipáveis
1 - A avaliação dos medicamentos para efeitos de inclusão na lista de medicamentos comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde e a sua reavaliação sistemática nos termos do artigo 6.º-A assentam em critérios de natureza técnico-científica, que evidenciem a sua eficácia e efetividade para as indicações terapêuticas reclamadas.
2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a comparticipação depende da verificação de uma das seguintes situações:
a) Medicamentos contendo novas substâncias ativas com um mecanismo de ação farmacológica inovador, que venham preencher uma lacuna terapêutica definida por uma maior eficácia e ou tolerância que tratamentos alternativos já existentes;
b) Novos medicamentos, com composição qualitativa idêntica à de outros já comercializados e comparticipados, se, em idêntica forma farmacêutica, apresentarem preço 5% inferior ao mais baixo dos comparticipados não genéricos, sendo o preço expresso por unidade de massa da substância ativa;
c) Nova forma farmacêutica, novas dosagens ou nova embalagem de medicamentos já comparticipados com igual composição qualitativa, desde que seja demonstrada ou reconhecida vantagem e necessidade de ordem terapêutica e vantagem económica;
d) Novos medicamentos que não constituam inovação terapêutica significativa nem possuam composição qualitativa idêntica à de outros já comparticipados, se apresentarem vantagens económicas relativamente a medicamentos já comparticipados, utilizados com as mesmas finalidades terapêuticas e possuindo idênticos mecanismos de ação comprovados, através da documentação entregue;
e) Associações medicamentosas em cuja composição entrem substâncias ativas já comparticipadas, se for demonstrada a sua vantagem terapêutica e se o preço não for superior ao somatório dos preços dos mesmos medicamentos quando administrados isoladamente em idênticas posologias;
f) Associações medicamentosas de substâncias ativas que não existam no mercado isoladamente e que demonstrem vantagens sobre medicamentos do mesmo grupo terapêutico, através dos resultados de ensaios clínicos realizados.
3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, os medicamentos aprovados ao abrigo da alínea a) do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 72/91, de 8 de fevereiro, poderão ser comparticipados se apresentarem preço igual ao do medicamento de referência e desde que solicitada a comparticipação em simultâneo com este último.
4 - Em derrogação do disposto nos n.ºs 2 e 3 e sem prejuízo do disposto no n.º 1 e no número seguinte, quando exista preço de referência autorizado para o grupo homogéneo onde o medicamento se insere, o seu preço de venda ao público não pode ser superior ao preço de referência.
5 - O PVP dos novos medicamentos genéricos a entrar nos grupos homogéneos deve ser inferior em 3% relativamente ao PVP do medicamento genérico de preço mais baixo, com pelo menos 10% de quota do mercado de medicamentos genéricos no grupo homogéneo.
6 - Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se “quota do mercado de medicamentos genéricos no grupo homogéneo” o peso das vendas totais de cada medicamento genérico no total de vendas dos medicamentos genéricos nesse grupo.

3.1.4 As condições e requisitos para que um medicamento possa ser incluído na lista de medicamentos comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde assentam, assim, como mencionado no artigo 6º nº 1, em critérios de natureza técnico-científica, elencadas nas várias alíneas do seu nº 2 as situações em que tal sucederá.
3.1.5 Na situação presente, perante o pedido apresentado pela autora ao INFARMED para comparticipação para o medicamento OSSIN 500 foi elaborado «Relatório de Avaliação Fármaco-Terapêutica» datado de 09/05/2010, no qual, entre o demais, se fez constar o seguinte:
«(…) Trata-se de um medicamento descrito como DMOD, pertencendo ao mesmo grupo da glucosamina. O sulfato de condroitina foi já alvo de apreciação desfavorável no contexto de comparticipação (2005). Deste modo, apreciámos significativamente os ensaios clínicos publicados após a apreciação, nomeadamente: para a condroitina: Mazières et al. 2007; Kahan et al. 2009; para a glucosamina: Herrero-Beaumont et al. 2007; e uma comparação directa entre a condroitina e glucosamina, que não existia antes: Clegg et al. 2006.
É também efectuada uma comparação indirecta de meta-análises referentes à condroitina vs glucosamina. Devo referir que os ensaios clínicos considerados tiveram várias medidas de eficácia, e diferentes durações de tratamento, pelo que a escolha do máximo denominador comum entre todas estas medidas acaba por ser muito redutora. Deste modo não podemos considerar este estudo como piéce de resistance.
Dos novos ensaios de substância activa isolada contra placebo, denota-se melhoria metodológica em relação aos ensaios da década de 90. No entanto os dados fornecidos não consubstanciam de forma significativa uma mudança de comportamento em termos de eficácia ou segurança de qualquer das substâncias. Em relação ao ensaio de comparação directa, envolvendo 1583 participantes, ele decorreu com 5 braços: condroitina, glucosamina, placebo, celecoxib 200 mg ou associação de glucosamina com condroitina. De notar que a dose condroitina aqui avaliada foi de 1200 mg, seja isolada seja em associação com glucosamina. Neste estudo, por ventura muito ambicioso dadas as múltiplas comparações, não houve diferença significativa entre qualquer dos braços com DMOD vs. placebo ou entre eles.
Do referido acima não encontramos justificação para adicionar a condroitina à substância activa comparticipada como DMOD […]”. Neste parecer conclui-se que: “A não comparticipar.»

E no seu seguimento foi emitida a proposta de indeferimento, datada de 17/05/2010, onde foi referido, entre o demais, o seguinte: «(…) Trata-se de um novo medicamento que não possui composição qualitativa idêntica à de outros já comparticipados, nem constitui inovação terapêutica. De acordo com os Relatórios de Avaliação Farmacoterapêutica (Anexo I), não foi comprovada a sua eficácia terapêutica, pelo que se propõem o indeferimento do pedido de comparticipação (…)” concluindo-se que o pedido de comparticipação “(…) não cumpre com o estipulado no Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de Junho, na sua redação atual (…)».
Tendo essa proposta merecido despacho de concordância do Presidente do Conselho Diretivo do INFARMED, datado de 24/05/2010, foi a autora notificada daqueles Relatório, Proposta e despacho referidos para se pronunciar no prazo de 10 dias úteis. O que fez, propugnando pelo deferimento do pedido de comparticipação do medicamento.
Após essa pronúncia da autora foi então elaborado o «Relatório de Avaliação Fármaco-Terapêutica» de 09/05/2010, onde, entre o demais, se referiu o seguinte:
«(…)Argumentando a resposta do detentor de AIM 273/06/10, devo referir:
As frases respeitantes ao estudo Clegg et al, 2006 devem ser entendidas adequadamente, e não podem levar à interpretação que o detentor de AIM expõe na sua carta. Senão vejamos: O estudo referido revela antes de mais que não houve diferença significativa entre o placebo e a controitina. Isto significa uma de duas possibilidades: ou o medicamento não apresentou eficácia, ou o estudo não teve poder suficiente para distinguir o efeito benéfico da condroitina em relação ao placebo. É certo que não encontrou também diferença significativa entre a condroitina e glucosamina, mas o mesmo ocorreria se efectuassem um estudo com 1 doente por braço; com 5 doentes, provavelmente teriam obtido o mesmo resultado – que todas as opções eram comparáveis porque não apresentavam diferença entre elas.
Mas se não apresentam diferença do placebo, então em termos farmacoterapêuticos não poderão ser comparticipados. Recordamos que a glucosamina se manteve em comparticipação visto que apresentou estudos considerados metodologicamente válidos, com outcomes de eficácia acima do placebo. O facto de neste estudo a diferença não foi significativamente diferente entre a glucosamina e o placebo, pode traduzir baixo poder do estudo, ou a escolha de outcomes de eficácia que não tenham beneficiado este grupo de medicamentos. Mas reitero que tal não é matéria para poder suportar a comparticipação da condroitina. (…)».

E no seu seguimento foi emitida a proposta de indeferimento datada de 30/07/2010, onde se referiu, entre o demais, o seguinte:
«(…) A 11-06-2010, o titular da A.I.M. submeteu argumentação (Anexo II) em sede de audiência prévia à proposta de indeferimento (Anexo I) do processo referido em epígrafe. De acordo com a análise pelo perito farmacologista, constante no Relatório de Avaliação Farmacoterapêutico (Anexo III), a argumentação presente pelo titular de A.I.M. não justifica a alteração do sentido da decisão judicial, pois não foi demonstrado valor terapêutico que justifique a comparticipação.
Desta forma propõe-se o indeferimento final do pedido de comparticipação do medicamento supracitado, por não satisfazer as condições previstas no Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de Junho, dado ter sido submetido antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 48-A/2010, de 13 de Maio (…)»

E sobre ela foi aposto o despacho do Secretário de Estado da Saúde, que indeferiu, conforme o proposto, o pedido da autora.
3.1.6 É seguro que o ato em crise estava sujeito ao dever de fundamentação, nos termos do artigo 124º do CPA/91 (em vigor à data, e por conseguinte, aplicável à situação dos autos). Sendo sabido que nos termos do artigo 125º do CPA/9 a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato, equivalendo à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.
3.1.7 No caso o despacho impugnado foi aposto e aderiu à fundamentação vertida na proposta de indeferimento datada de 30/07/2010. A questão está em saber se o teor daquela proposta verteu de forma clara e suficiente os fundamentos da decisão de indeferimento.
3.1.8 Como bem disse o Mmº Juiz a quo na sentença recorrida um dos vetores essenciais da fundamentação é o seu enquadramento legal.
Ora, na verdade, no parecer a que aderiu o despacho impugnado refere apenas laconicamente que o pedido de comparticipação do medicamento não satisfaz «…as condições previstas no Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de junho», sem que tenha sido feita qualquer subsunção ao quadro normativo aplicável, em especial, sem que se justificasse qual a razão (ou conjunto de razões) que motivaram, à luz do disposto no supra citado artigo 6º, o pedido da autora não cumpria alguma, algumas ou nenhuma das condições e requisitos para que o medicamento pudesse ser incluído na lista de medicamentos comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde.
Sendo certo que para além de critérios de natureza técnico-científica, conexionados com a eficácia e efetividade para as indicações terapêuticas do medicamento, para que seja comparticipado pelo Estado, o nº 2 do artigo 6º do DL. nº 118/92, de 25 de junho faz apelo a critérios de natureza distinta, tais como a existência de vantagens económicas ou terapêuticas.
E que basta a verificação de um dos requisitos para que o medicamento pudesse ser incluído na lista dos medicamentos comparticipados.
3.1.9 Quando a autora diz na ação que o seu pedido de comparticipação resultou da verificação do requisito correspondente à alínea d) do n.º 2 do artigo 6º do DL. nº 118/92, isto é, da verificação de existência de vantagem económica do medicamento OSSIN 500 (vide, designadamente, artigos 18º ss. da PI), o que a motiva a sustentar que o ato administrativo de deferimento do pedido de inclusão na lista de medicamentos comparticipados pelo SNS, é devido nos termos do disposto na alínea b), do n.º 2, do artigo 6.º, do DL. n.º 118/92, de 25 de junho.
3.1.10 Por outro lado, os juízos eminentemente técnicos convocados pelo quadro normativo aplicável não se compadecem também com o caráter dúbio dos fundamentos do indeferimento, e a ausência de convocação de cada uma das hipóteses normativas constantes do referido artigo 6º.
O que também tornará impercetível qual o enquadramento que terá sido feito pela entidade administrativa. E que explicará também que a autora tenha igualmente invocado afigurar-se que o fundamento da decisão final de indeferimento não coincide com aquele que foi projetado no projeto de decisão que lhe foi notificado para exercício de audiência prévia. Mas na verdade, não se consegue sequer perceber se assim foi, por não se conseguir saber os fundamentos normativos da decisão, por inexistentes.
E isso mesmo também implica, como foi considerado pelo Tribunal a quo, a obstaculização do conhecimento dos demais vícios assacados ao ato, e a condenação das entidades administrativas a reapreciarem a pretensão da autora.
3.1.11 Deve, pois, ser mantida a sentença recorrida, que com fundamento na verificação do vício de falta de fundamentação anulou o ato de indeferimento, e condenou os réus a reapreciarem o pedido da autora à luz dos critérios previstos no artigo 6º do DL. n.º 118/92, de 25 de junho.
Improcedendo, assim, totalmente os seus recursos.
O que se decide.
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IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar total provimento a ambos os recursos, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pelos recorrentes - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro) e 189º nº 2 do CPTA.
*
Notifique (sem prejuízo do Provimento nº 3/2020 de 30 de março do Senhor Presidente deste TCA Norte nem da suspensão de prazos, nos termos do disposto no artigo 7º nº 1 e 2 da Lei nº 1-A/2020, de 19 março).
D.N.
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Porto, 3 de abril de 2020

M. Helena Canelas
Isabel Costa
João Beato