Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00437/18.9BECBR |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 11/11/2021 |
| Tribunal: | TAF de Coimbra |
| Relator: | Cristina da Nova |
| Descritores: | NULIDADE DA SENTENÇA, ISS CONTRIBUIÇÕES E COTIZAÇÕES, NATUREZA LABORAL OU PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS, PRESUNÇÃO DE LABORALIDADE, GRATIFICAÇÕES DE BALANÇO, PRÉMIOS |
| Sumário: | 1-A jurisprudência vem referindo a existência de dois elementos fundamentais que caracterizam o contrato de trabalho: Um vínculo de subordinação económica [atividade remunerada] e um vínculo de subordinação jurídica [autoridade e direção da pessoa a quem a atividade é prestada] e que entre eles se estabelece uma inter-relação, em termos de a prestação de trabalho, dar ao trabalhador o direito à remuneração e à entidade patronal o poder de autoridade e direção que não preexiste à prestação de trabalho, é condição natural e necessária na relação laboral. 2-É à sociedade recorrente que cabe o ónus [arts. 342º, do C. Civil, 100.º, n.º 1 do CPPT e 74.º, nº 1 da LGT] de provar que os montantes por si pagos a título de prémios ou gratificações de balanço não revestem a natureza de retribuição, não consubstanciando rendimentos que proporcionam ao trabalhador um acréscimo de capacidade contributiva e, como tal, suscetíveis de tributação pois que nos termos do nº 3 do art.º 249º do Código do Trabalho, existe uma presunção de que toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador constitui retribuição, pelo que, nos termos dos artigos 344º e 350º do Código Civil tem a Administração, no caso em questão, uma presunção a seu favor o que determina que não tenha de fazer prova do facto que invoca, sendo, contudo, ilidível esta presunção, que entendemos competir à impugnante, ora recorrente, mas que não logrou fazer com êxito.* * Sumário elaborado pela relatora |
| Recorrente: | Instituto da Segurança Social |
| Recorrido 1: | S., SA |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Negar provimento aos recursos. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer no sentido da improcedência dos recursos. |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO S., S.A. e Instituto da Segurança Social, I.P., impugnante e impugnada respetivamente, vêm recorrer da sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação, por vício de violação da lei, das contribuições e cotizações, sobre rendimentos pagos a prestadores e que manteve a liquidação respeitante às gratificações de balanço pagos aos prestadores de serviços. * Formula a recorrente S., S.A., nas respetivas alegações as seguintes conclusões, que se reproduzem:«1. O objecto da liquidação oficiosa ora em causa estava delimitado temporal e subjectivamente aos anos e aos concretos prestadores que constavam dos referidos mapas. 2. Ao não limitar o âmbito da decisão aos enfermeiros A. e N., por ter considerado demonstrado que exercendo funções de chefia não eram prestadores de serviço, a sentença é indeterminada na tutela jurisdicional que efectivou. 3. A sentença em crise ao decidir de forma indeterminada e genérica, conhece efectivamente de questões que não lhe foram colocadas e, por isso, não podia tomar conhecimento, sendo por isso nula nos termos do art.º 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC. 4. Ao considerar procedente a impugnação apenas relativamente aos prestadores que não exerçam funções de chefia, o Tribunal apreciou e decidiu, na prática, sobre um objecto diverso do pedido e, como se referiu, de forma indeterminada, violando, por isso, o disposto no art.º 615.º, n.º 1, alínea e) do CPC. 5. A sentença em crise é nula, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, alíneas d) e e) do CPC. 6. O presente recurso interposto da sentença proferida nos autos que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida anulando parcialmente a liquidação oficiosa operada pelo Instituto da Segurança Social, IP, ora Recorrido, considerando assim anulada a liquidação na parte que se refere às contribuições e cotizações dos meses de Janeiro a Maio de 2013, por caducidade e, quanto aos demais meses, no que se refere aos valores pagos aos prestadores de serviço que não exerçam funções de chefia. 7. O recurso é limitado à decisão proferida quanto: (i) À ilegitimidade da intervenção do ISS para qualificar relações contratuais de trabalho subordinado (ainda que apenas para o efeito de incidência de contribuições e cotizações), e a inconstitucionalidade da interpretação do art.º 256.º do Código dos Regimes Contributivos e do art.º 8.º, n.º 2, alínea c) (na redacção em vigor) da Portaria n.º 135/2012 de 8 de Maio (texto da Portaria n.º 102/2017, de 8 de Março), acolhida pela sentença; (ii) À qualificação das Gratificações de Balanço como remunerações sujeitas a incidência de contribuições e cotizações; (iii) Da limitação do vício de violação da lei aos prestadores de serviço que “não exerçam funções de chefia”. 8. O ISS é um Instituto Público que se rege pela Lei - Quadro dos Institutos Públicos (Lei n.º 3/2004, de 15 de Janeiro), pela respectiva Lei Orgânica (D.L. n.º 83/2012, de 30 de Março) e pelos respectivos Estatutos, aprovados pela Portaria n.º 135/2012, de 8 Maio. 9. Nos termos do disposto no art.º 8.º, n.º 2, alínea a) da Lei n.º 3/2004, de 15 de Janeiro, os institutos públicos não podem ser criados para desenvolver actividades que nos termos da Constituição da República Portuguesa (CRP) devam ser desempenhadas por organismos de administração directa do Estado. 10. Os institutos públicos não podem exercer actividades ou usar os seus poderes fora das suas atribuições (art.º 14.º, n.º 2 do citado diploma legal). 11. A verificação do “enquadramento” das remunerações em causa pressupõe a definição da relação jurídica subjacente, qualificação essa que não cabe ao ISS fazer, uma vez que o enquadramento referido na lei não pode querer deixar de se referir às regras aplicáveis à situação concreta (v.g. taxa aplicável, isenções, etc.), e não à qualificação da relação jurídica em causa já que, só definida esta, é possível fazer o enquadramento. 12. Fora dos casos de acção intentada pelos interessados na qualificação da relação laboral como de trabalho subordinado, é a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), um serviço central da Administração directa do Estado (art.º 1.º e 2.º do D.L. n.º 326-B/2007, de 28 de Setembro), a quem cabe promover a melhoria das condições de trabalho e a prevenção e controlo do cumprimento das normas em matéria laboral, no âmbito de relações laborais privadas. 13. Cabe em exclusivo ao Ministério Público, após participação da ACT, instaurar a Acção de Reconhecimento da Existência de Contrato de Trabalho (art.º 15.º-A, n.º 3 da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro). 14. Ao Recorrido só cabe instaurar o procedimento contra-ordenacional no âmbito do sistema da Segurança Social (art.º 2.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 da Lei n.º 107/2009 de 14 de Setembro). 15. É da competência exclusiva dos Juízos do Trabalho a apreciação das questões emergentes de relações de trabalho subordinado e das relações estabelecidas com vista à celebração do contrato de trabalho, das acções destinadas a anular actos e contratos celebrados por entidades responsáveis com o fim de se eximirem do cumprimento de obrigações resultantes da aplicação da lei do trabalho (art.º 126.º da Lei n.º 40-A/2016, de 22 de Dezembro – LOFTJ), cabendo também aos Juízos do Trabalho os recursos de decisões das autoridades administrativas em processos de contra-ordenação nos domínios laboral e da Segurança Social. 16. É da competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais (art.º 212.º da Constituição da República Portuguesa). 17. A liquidação oficiosa operada e impugnada, pressupõe a qualificação pelo ISS das relações contratuais de cada um dos prestadores, como sendo de trabalho subordinado, para só depois se proceder ao enquadramento contributivo respectivo. 18. O contrato celebrado entre a Recorrente e os seus prestadores referidos na sentença, não pode ser considerado como sendo de trabalho para uns efeitos (por exemplo, para efeitos contributivos), e de prestação de serviços para todos os outros. 19. Não existe qualquer disposição legal que confira ao Recorrido competência para qualificar os contratos celebrados entre as entidades beneficiárias e os prestadores de serviços, sendo que as correcções e regularizações propostas dependem exclusivamente dessa qualificação. 20. A liquidação oficiosa objecto de impugnação, porque assente na qualificação jurídica das relações contratuais entre a Recorrente e os seus colaboradores, necessariamente constitui acto administrativo nulo, nos termos do art.º 161.º n.º 2 alínea a) do CPA, por usurpação de funções. 21. A interpretação da alínea c) do n.º 2 do art.º 8.º da Portaria n.º 135/2012, de 8 de Maio e do art.º 256.º do Código dos Regimes Contributivos adoptada pela sentença em crise, no sentido de que cabe ao ISS, IP definir a qualificação de uma relação contratual como de trabalho subordinado, ainda que apenas para efeitos contributivos, é inconstitucional nos termos dos arts.º 13.º, 20.º, n.ºs 1 e 4 e 47.º, n.º 1 da Constituição da Republica Portuguesa, por violação, respectivamente dos princípios da igualdade relativamente às diferentes formas de prestação de serviços e de actividade, do direito de acção e de processo equitativo sem intervenção das partes contraentes e de liberdade de escolha da forma de exercer uma profissão nos quadros e regime legais disponíveis, mostrando-se ainda violado o art.º 212.º da CRP. 22. Relativamente à regularidade do pagamento das prestações de balanço, não pode confundir-se o exercício a que as gratificações respeitam e o ano em que são pagas, quando o pagamento respeitante a um determinado exercício é faseado pelos vários anos seguintes. 23. O requisito de regularidade, tal como definido no art.º 47.º do Código dos Regimes Contributivos (na versão em vigor até 31.12.2013), não se verifica quando se delibera pagar gratificações de balanço num determinado ano, mas se difere o pagamento efectivo por vários anos. 24. Não ficaram provados os montantes pagos em 2010 e 2011 (Facto 22), nem a que anos diziam respeito os vários pagamentos constantes das folhas de remunerações dos colaboradores relativas aos anos de 2012 a 2016, uma vez que nos Factos 23 a 27 da matéria assente, apenas ficou provado que naqueles anos foram pagos valores de gratificações de balanço, e não que os montantes pagos nesses anos diziam respeito a cada um dos exercícios em causa per si, e não antes a pagamentos faseados de um valor global de determinado exercício anterior. 25. As actas da Assembleia Geral dos sócios da sociedade holding, a S., SGPS, Lda (que domina a Recorrente) e o diferimento da aprovação de contas nas sociedades que consolidam contas, justificam a atribuição das gratificações, não podendo, por isso concluir-se que a atribuição de gratificações não está suportada pela correspondente documentação societária, neste caso do grupo onde se insere. 26. A sentença em crise não atendeu à totalidade do Regime do Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho em vigor na Recorrente, tal como não considerou a verdadeira natureza destas gratificações de balanço, já que, não corresponde à verdade que a prestação pecuniária em causa constituía um prémio de desempenho do trabalhador. 27. Os colaboradores da Recorrente não têm direito às quantias em causa, já que a mesma pode pura e simplesmente deliberar a não atribuição de prémios (Facto 31 dado por provado), sem ter que o justificar. 28. A disposição constante do Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho que atribui um poder discricionário à Recorrente, não constitui uma mera cláusula de salvaguarda, na medida em que, mesmo que o trabalhador atinja/preencha cumulativamente os critérios referidos no n.º 4 do artigo 5.º do Regulamento, o que efectivamente aconteceu em vários anos antes e depois do referido Regulamento, é que houve trabalhadores que atingiram e preencheram aqueles requisitos e não receberam gratificação, facto que não foi averiguado, pelo que a definição de critérios apenas pretende fixar as regras da atribuição eventual do “prémio”, e não o direito a esse “prémio”. 29. Todo o regime instituído para a atribuição das gratificações pagas e agora em causa, é incompatível com a noção de “prémio de desempenho” e de direito adquirido ou até de mera expectativa jurídica, não podendo o nomen utilizado vincular a uma qualquer qualificação, quando o regime instituído não é conciliável com tal conceito, nem está provado a que exercício respeitam os pagamentos efectuados em vários anos, tal como acertadamente consta do Parecer do Ministério Público. 30. Aos trabalhadores da Recorrente nas gratificações em causa não se aplica o regime previsto no art.º 46.º, n.º 2, alínea R) do Código dos Regimes Contributivos, uma vez que lhes está assegurada uma remuneração certa, nem a situação em apreço pode ser subsumível às situações previstas no art.º 46.º, n.º 2, alínea d) do Código dos Regimes Contributivos. 31. Assim, as gratificações de balanço pagas pela Recorrente não integram a base de incidência contributiva para efeitos da Segurança Social, pelo que a sentença em crise devia ter julgado a impugnação deduzida pela Recorrente procedente também quanto a estas gratificações. 32. É por toda a jurisprudência e doutrina reconhecida que as actividades em causa nos presentes autos podem ser desenvolvidas quer sob um contrato de trabalho quer através de um contrato de prestação de serviços, coincidindo na mesma estrutura organizativa colaboradores que desenvolvem a sua actividade através de um contrato de trabalho e outros através de prestação de serviços, sobretudo em actividades tão específicas e dotadas de autonomia técnica, como é o caso dos enfermeiros. 33. Não basta um critério aritmético de verificação de algum ou alguns dos índices de laboralidade previstos no art.º 12.º do Código do Trabalho, para imediatamente se concluir pela existência de um contrato de trabalho, prevendo a lei prevê apenas uma presunção iuris tantum. 34. O elemento verdadeiramente diferenciador entre um contrato de trabalho e um contrato de prestação de serviços, é a subordinação jurídica, e não o desenvolvimento de uma actividade ou mesmo a dependência económica do prestador. 35. Não é o poder directivo que melhor permite encontrar um critério decisivo para a qualificação do contrato de trabalho, mas a integração dos poderes directivo e disciplinar permitem uma conclusão ajustada e adequada à situação concreta. 36. A Recorrente não detém, e por isso nunca exerceu, qualquer poder disciplinar sobre os prestadores agora em causa, resultando de toda a matéria de facto dada por provada, designadamente nos Factos 35, 36, 41, 42, 43, 44 e 45, a absoluta inexistência de subordinação jurídica e a consequente total autonomia dos mesmos prestadores de serviço, o que é expressamente reconhecido pela sentença em crise. 37. Não andou bem a sentença quando veio a considerar que a qualificação da relação contratual da Enfermeira A. e ao enfermeiro N., por exercerem funções de chefia, já deverá ser entendida como de trabalho subordinado. 38. Tal qualificação não está de acordo com a matéria de facto dada por provada, designadamente a constante dos Factos 35, 36, 41, 42, 43, 44 e 45 dados por provados, na qual não se faz qualquer distinção entre os prestadores de serviço em causa, abrangendo também os Enfermeiros A. e N., o que significa que todos os índices de autonomia (por contraposição a índices de laboralidade), e que permitiram concluir que as relações contratuais em discussão não tinham natureza laboral, tanto se verificavam nos referidos dois enfermeiros como em todos os outros. 39. Não é uma qualquer coordenação exercida ou controle do número de horas prestadas por outros prestadores de serviço, que permitem a conclusão retirada na sentença de que se trata de um contrato de trabalho, ou pela existência de uma relação hierárquica entre os colaboradores. 40. Ficou provado que o controlo efectuado pela Recorrente da presença dos prestadores de serviço é feito apenas para controlo de pagamentos (Facto 36), pelo que o controlo efectuado pela Enfermeira A. não pode ter outro objectivo, não podendo significar mais para si do que para os outros enfermeiros. 41. Também a articulação entre médicos e enfermeiros, onde também se inclui a organização das disponibilidades temporais, não pode deixar de se inserir na coordenação técnica, e não jurídica, daqueles outros enfermeiros, pelo que, tal como ficou provado – Factos 47 e 49 – que a coordenação exercida pelos Enfermeiros A. e N. respeita aos processos técnicos do Serviço, mesmo que na sequência de directrizes, naturalmente técnicas, emanadas dos gestores das unidades, o que a sentença reconhece expressamente. 42. Não pode confundir-se subordinação jurídica com subordinação técnica, sendo que só a primeira é elemento essencial e definidor de uma relação de trabalho subordinado. 43. Os enfermeiros A. e N., tal como todos os outros prestadores de serviços como tal reconhecidos na sentença, não respondem hierarquicamente perante os gestores das unidades, e por isso, não têm horário pré-fixado, dão as suas disponibilidades, não lhe são marcadas faltas, etc.. 44. Do mesmo modo, a inserção destes enfermeiros (e dos outros prestadores de serviços) numa estrutura organizativa, decorre necessariamente do tipo de serviços prestados, atenta a necessidade de formação de equipas dentro da autonomia da prestação de serviços médicos, que necessitam de uma coordenação técnica, não se traduzindo esta coordenação em qualquer exercício de funções de chefia. 45. Os enfermeiros A. e N., não dão ordens aos prestadores de serviços, não são a sua hierarquia (a sua chefia) no sentido do exercício de um poder de direcção e conformativo da função, delegados pela entidade empregadora, típico de um contrato de trabalho subordinado. 46. A inserção destes dois enfermeiros não é na estrutura organizativa da Recorrente, mas antes nas equipas médicas (tal como acontece numa equipa de projecto nas áreas informática, de prestação de serviços jurídicos, etc.). 47. Os Enfermeiros em causa não têm uma categoria profissional (neste sentido e não no de qualificações técnicas inerentes à actividade) e não têm uma carreira na Recorrente (como têm, por exemplo, nos Hospitais Públicos), onde, aliás, ambos têm contratos de trabalho. 48. Ficou provado, também em relação a estes dois Enfermeiros, que não têm qualquer “dever de permanência”, registo de faltas, necessidade de justificação de ausências, marcação de férias, comunicação de baixas médicas, ordens emanadas ou dadas no âmbito de um poder de direcção, ou exercício, ainda que potencial, do poder disciplinar, etc., como é essencial a uma relação de trabalho subordinado, exercendo funções ou cargos de chefia, mas de coordenação técnica. 49. Tudo quanto se alegou foi já declarado judicialmente pelo Tribunal do Trabalho em Acções de Reconhecimento da Existência de Contrato de Trabalho que visaram enfermeiros, técnicos de fisioterapia no Centro Hospitalar (...), S.A., sociedade grupo societário em que se insere a Recorrente e é por esta maioritariamente detida, em relação a todos os enfermeiros e outros técnicos, exerçam ou não funções de coordenação técnica (que não de chefia) – Proc. n.º 1806/16.4T8LRA, no J1 da Instância Central – 1.ª Secção Trabalho da Comarca de Leiria, e Proc. n.º 1808/16.9T8LRA e n.º 1814/16.9T8LRA (J2 da Instância Central – 1.ª Secção Trabalho da Comarca de Leiria), nos processos n.ºs 1811/16.7T8LRA, 1813/16.0T8LRA e 1823/16.4T8LRA (J1 da Instância Central – 1.ª Secção Trabalho da Comarca de Leiria, no qual se decidiu pela existência de verdadeiros contratos de prestação de serviços. 50. A posição defendia pela Recorrente, e de acordo com a matéria de factos dada por provada, encontra apoio inequívoco na jurisprudência uniforme dos nossos Tribunais Superiores (v.g. Ac. do STJ de 09.09.2015, 139. Ac. do TRL de 18.11.2015 e Ac. do TRP de 22.02.2010, todos em www.dgsi.pt). 51. A liquidação oficiosa realizada pelo ISS e a sentença em crise na parte aplicável, fundou-se em pressupostos errados e em interpretações contrárias àquela que é a realidade dos factos e que foi dada por provada. 52. A sentença em crise violou, entre outros, o disposto nos arts. 13.º, 20.º, 47.º, n.º 1 e 4, 212.º, 266.º e 268.º da C.R.P., o art. 46.º, n.º 2, alínea d) do Código dos Regimes Contributivos e o art. 12.º do Código do Trabalho, o art. 8.º da Portaria n.º 135/2012, de 8 de Maio e o art. 8.º, n.º 2, alínea a) da Lei n.º 3/2004, de 15 de Janeiro. Termos em que, pelo que antecede, e pelo muito que V. Exas. haverão doutamente de suprir, deve ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se a decisão em crise na parte em que não considerou as gratificações de balanço e qualificou as relações contratuais dos Enfermeiros A. e N. como de trabalho subordinado, para assim se fazer JUSTIÇA!» * O recorrente Instituto da Segurança Social, I.P., formula nas suas alegações as conclusões que se reproduzem:«1.- Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Mm.ª Juíza do Tribunal a quo, que julgando parcialmente procedente a presente impugnação anulou parcialmente a liquidação oficiosa por entender padecer a mesma de erro quanto aos seus pressupostos de facto, quanto à liquidação de contribuições e cotizações sobre os rendimentos pagos aos prestadores de serviços que não exercem funções de chefia. 2.- Vem a Impugnante, ora Recorrida, com a presente ação, impugnar, nos termos e com os fundamentos nela expostos, o ato de liquidação oficiosa de contribuições para a segurança social e respetivos juros, notificado pelo ofício n.º 55896, datado de 16/06/2017, do Núcleo de Identificação, Qualificação e Gestão de Remunerações da Unidade de Prestações e Contribuições do Centro Distrital de Coimbra, nos termos do qual, lhe foi comunicado o registo oficioso das declarações de remunerações referentes ao período de Fevereiro de 2013 a Dezembro de 2016. 3.- Efetivamente, na sequência da abertura do processo de averiguações (PROAVE) à casa de saúde, ora Recorrida, tendo como objeto aferir a regularidade do comportamento da mesma ao nível da relação jurídica de vinculação e contributiva com o Sistema de Segurança Social, mais concretamente, se os trabalhadores dependentes e independentes se encontram corretamente enquadrados nos devidos regimes de proteção social e se todas as remunerações sujeitas a incidência contributiva estão a ser devidamente declaradas aos serviços de segurança social. 4.- Proferida que foi douta sentença pela Mmª Juíza, atenta toda a matéria de facto dada como provada com relevância para a decisão da causa, e que por razões de economia processual, se nos for permitido, nos dispensamos de reproduzir, fixada a factualidade relevante, concluiu a Mmª Juíza do Tribunal a quo, depois de definir o quadro legal aplicável na situação em apreço e perscrutada a jurisprudência a esse propósito vertida, no que se refere à qualificação dos contratos celebrados entre a ora Recorrida e os enfermeiros como Contratos de Trabalho ou de Prestação de Serviços e consequente enquadramento dos respetivos trabalhadores no devido regime de proteção social que, passando a citar: (...) “E devemos começar por frisar que a solução a dar ao mesmo não é simples nem linear, pois que a factualidade demonstrada não permite conduzir a uma conclusão inequívoca quanto à natureza da relação estabelecida entre a Impugnante e a generalidade dos prestadores de serviços, e que esteve na origem da liquidação de contribuições impugnada. Ao invés, tanto existe uma panóplia de factos suscetíveis de consubstanciar indícios da existência de um contrato de trabalho; como uma série de outros factos, já indiciadores da celebração de um contrato de prestação de serviços.” (...). 5.- Salvo o devido respeito, que é muito, por tal entendimento e embora, não ignorando toda a fundamentação aduzida na douta sentença recorrida, não podemos concordar com a subsunção, que da matéria fáctica apurada, foi efetuada pela Mmª Juíza a quo, ao quadro legal aplicável na situação em apreço, não lhe assistindo razão nos fundamentos que invoca, para decidir da forma como o fez. 6.- Assim, face ao exposto, é inequívoco, pelo menos, que foi objetivamente considerado provado um conjunto de factos que constituem claros indícios da existência de um Contrato de Trabalho precisamente por apontarem claramente no sentido de que os prestadores de serviços da aqui Recorrida estavam vinculados a um poder de subordinação e de direção desta. 7.- Ora, de acordo com a sentença proferida “Não podemos olvidar que neste Tribunal estiveram presentes prestadores de serviços da Impugnante (as testemunhas J. e J.), e dos seus depoimentos, globalmente considerados, não resulta que a sua vontade tenha sido de celebrar um contrato de trabalho com a Impugnante.”. 8.- Assim, ao valorar de modo decisivo a vontade das Partes manifestada nos depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento por alguns dos alegados prestadores de serviços, o Tribunal a quo limitou sobremaneira a sua valoração de prova ao sobrepor e fazer prevalecer essa vontade manifestada pelas testemunhas sobre todos os indícios relacionados com o concreto modo de execução da relação de trabalho. 9.- Importa sublinhar desde já que, ao contrário do que se enuncia na douta sentença, não está em causa aferir “(...) qual a natureza do contrato celebrado entre as partes (...)”. Está em causa, isso sim, avaliar o concreto modo de execução do contrato celebrado entre as partes e esta perspetiva não só não é irrelevante como é passível de induzir em erro a valoração de parte da prova produzida. 10.- Desta forma, o Tribunal a quo, na nossa modesta opinião, deveria ter relativizado a vontade das Partes, não podendo a mesma sobrepor-se a factos provados relativos à execução do contrato. 11.- Assim, a aqui Recorrente, não lhe resta outra hipótese que não seja abordar os outros elementos considerados pelo Tribunal a quo como passíveis de colocar em causa os fundamentos da decisão impugnada ou de abalar a convicção de estarmos perante trabalhadores subordinados. 12.- Quanto ao argumento referente ao tempo de exercício de funções dos prestadores de serviços sem nunca terem recebido um montante fixo e certo, facto esse irrelevante e que em nada afeta os factos provados indiciadores de subordinação jurídica. Nos termos definidos no artigo 261.º do Código do Trabalho, a retribuição pode ser certa, variável ou mista, sendo considerada certa a retribuição calculada em função de tempo de trabalho. No caso vertente, a remuneração é calculada em função do tempo de trabalho, conforme pontos 38 e 39 do probatório. 13.- Quanto aos horários dos turnos a cumprir pelos profissionais de saúde, facto esse também, irrelevante e que em nada afeta os factos provados indiciadores de subordinação jurídica. Na verdade, existiam turnos aos quais os trabalhadores ficavam vinculados após prévia consensualização entre estes e a aqui Recorrida. 14.- Sendo certo que os enfermeiros exercem as suas funções por turnos, os quais são fixados por acordo, tal não significa que os enfermeiros prestavam trabalho apenas quando tinham disponibilidade para o efeito e pelo período estritamente necessário à execução do “serviço”. 15.- Pelo contrário, daqui resulta que os mesmos estavam sujeitos a um horário de trabalho previamente fixado, por turnos, conforme expressamente regulado no artigo 220.º do Código de Trabalho e estavam sujeitos a uma obrigação de permanência nas instalações da entidade empregadora (no local de trabalho). 16.- Ou seja, os enfermeiros tinham verdadeiramente uma obrigação de prestação de atividade, dado que os mesmos estavam obrigados a permanecer nas instalações da Impugnante durante todo o turno e não apenas pelo tempo estritamente necessário para a prestação do serviço (obrigação de prestação de um resultado), pois que eram pagos à hora e não eram pagos por penso, curativo, ou por consulta de enfermagem, isto é, são pagos em função do tempo que permanecem na instituição, independentemente da quantidade de tarefas que realizem nesse tempo. 17.- Na verdade, o pessoal de enfermagem tem um dever de permanência no local de trabalho, assegurando o cumprimento da carga horária do turno atribuído, dever este que não se compadece com o modelo da relação de prestação de serviços. 18.- Quanto ao registo da assiduidade dos prestadores de serviços, a mesma é registada, em sistema de ponto métrico ou em folhas, o que em nada afecta os factos indiciadores da existência de subordinação jurídica. 19.- Ora, um sistema de assiduidade serve objetivamente para controlar a assiduidade e o número de horas de trabalho, o que é característico das relações de trabalho subordinado e não da prestação de serviços. 20.- É verdade, ainda que tal remuneração possa ser variável, certo é que, auferem uma remuneração periódica mensal como contrapartida do seu trabalho, remuneração esta fixada em função do número de horas ou tempo de trabalho despendido (obrigação de meios/de prestar uma atividade) e não em função de uma tarefa ou de um resultado (obrigação de resultado). 21.- Além disso, não ficou provado, não é crível que os enfermeiros não tenham de comunicar previamente faltas, folgas e dias de férias à entidade empregadora, pois a instituição tem de coordenar e compatibilizar as presenças e ausências dos vários enfermeiros de forma a assegurar que dispõe sempre, pelo menos, de um (ou de dois) enfermeiro (s) nas instalações. 22.- Por último, diga-se que, ainda que resulte demonstrado que vários profissionais de saúde que prestam serviços para a aqui Recorrida trabalham também em hospitais públicos do distrito de Coimbra, facto irrelevante e que em nada afeta os factos provados indiciadores de subordinação jurídica. 23.- Na verdade, não se vislumbra, ainda que remotamente, em que medida o facto dos profissionais de saúde não exercerem funções no regime de exclusividade possa assumir relevância na matéria em apreço uma vez que a acumulação de trabalho subordinado para entidades diferentes não só não está vedada legalmente como não interfere na qualificação das relações de trabalho entre si. 24.- Quanto ao facto de um Prestador de Serviços não comparecer num dia para o qual se encontrava escalado não tem, para o mesmo, qualquer consequência além da perda da remuneração correspondente, facto esse também irrelevante e que não afecta em nada os factos provados e indiciadores de subordinação jurídica. 25.- De facto, a perda de remuneração é, por excelência, a consequência principal da falta do dever de assiduidade de qualquer trabalhador subordinado e é precisamente isso que ocorre no caso em apreço. 26.- Quanto ao argumento que a aqui Recorrida não concede aos Prestadores de Serviços qualquer período de férias, nem estes pedem qualquer autorização para tirar férias, parece-nos, um facto descontextualizado face às restantes condições de execução das relações de trabalho avaliadas. 27.- O que é facto é que os alegados Prestadores de Serviços gozam de períodos de férias e, mais que isso, no caso dos enfermeiros do serviço de diálise, em concreto, ficou provado que estes recebem, no mês de junho e no mês de dezembro, uma quantia cujo valor corresponde a uma média do valor recebido nos últimos 6 meses, e que consta do valor global do recibo verde emitido nesses meses, ou de recibo verde autónomo emitido por referência aos mesmos, constituindo de forma clara subsídios de férias e de Natal – (ponto 50 do probatório). 28. Do exposto e da análise precedente retira-se, com o devido respeito por opinião diversa, que ao contrário do definido pelo Tribunal a quo, os factos apontados não constituem indícios suscetíveis de concluir que não estamos perante um Contrato de Trabalho, não podendo sequer afirmar-se, como o Tribunal faz, que correspondem a elementos típicos de contratos em que não existe subordinação jurídica, tal como se demonstrou na apreciação crítica concretizada supra, logo após a enunciação de cada um desses factos. 29.- Face ao exposto e salvaguardando adequada ponderação de todos os elementos de prova recolhidos, não podemos deixar de considerar que a análise casuística realizada demonstra que entre as situações de Contrato de Trabalho formalmente assumido pela aqui Recorrida e as situações dos alegados prestadores de serviços se evidenciam notórias semelhanças nas principais características do modo de prestação de trabalho (posto de trabalho, local de trabalho, horário, inserção hierárquica, etc.) diferindo apenas no facto de os abrangidos por Contrato de Trabalho terem, obviamente, mais direitos reconhecidos, direitos esses que não são reconhecidos aos contratados como prestadores de serviço, apesar de ocuparem postos de trabalho idênticos aos dos colegas com vínculo laboral. 30.- Donde, atento o supra exposto, tal como reconhecido na douta sentença recorrida, resultando provados os indícios que no entendimento da Mmª Juíza do tribunal a quo concorrem para que se considere existir no caso em apreço um ambiente contratual típico da existência de um contrato de trabalho, no âmbito da execução das funções prestadas pelos enfermeiros, acrescidos dos indícios resultantes da interpretação, que dos factos dados por provados, o ora Recorrente, no seu modesto entendimento e, salvo o devido respeito por opinião contrária, deve ser efetuada, conforme supra exposto, sendo ainda, particularmente relevante a desvalorização que a Mmª Juíza fez do facto de os prestadores de serviços de enfermagem desempenharem precisamente as mesmas funções, com idênticas características quanto ao modo de prestação de trabalho, que os enfermeiros devidamente enquadrados na segurança social como trabalhadores por conta de outrem da instituição, fazendo a correta interpretação e subsunção de tal factualidade apurada ao quadro legal aplicável no caso sub judice, entende o ora Recorrente, ao contrário do entendimento propugnado pela Mmª Juíza na douta sentença recorrida, que o vínculo jurídico estabelecido entre os trabalhadores e a impugnante consubstancia um contrato de trabalho subordinado e não de prestação de serviços. 31.-Pelo que, bem andaram os serviços do ora Recorrente, ao proceder ao correto enquadramento dos beneficiários em questão, no que concerne ao regime de segurança social aplicável – Regime Geral de Segurança Social dos Trabalhadores por Conta de Outrem. 32.- Verificando-se, assim, não padecer o ato impugnado, de qualquer erro quanto aos seus pressupostos que o inquine de nulidade ou sequer de anulabilidade, sendo o mesmo absolutamente válido e legal, pelo que deve ser mantido “qua tale”. Termos em que, e com o sempre douto suprimento de V. Exas. deve ser dado provimento ao presente recurso e em consequência revogar-se a douta sentença recorrida que anulou parcialmente o ato impugnado mantendo-se assim, o ato impugnado “qua tale”. Assim decidindo, Vossas Excelências Venerandos Conselheiros, Farão a costumada JUSTIÇA!» * A recorrida, S., S.A., apresentou as suas contra-alegações, cujas conclusões se reproduzem:«1. O Instituto da Segurança Social, IP (ISS) interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal “a quo” na parte que anulou parcialmente a liquidação oficiosa na parte referente às contribuições e cotizações dos meses de Janeiro a Maio de 2013 e, quanto aos demais meses, às contribuições e cotizações incidentes sobre valores pagos a todos os prestadores de serviço que não exercem funções de chefia. 2. Nesta parte andou bem o Tribunal “a quo” como resulta da extensa sentença e da fundamentação dela constante, pelo que o presente recurso deverá improceder. 3. Dá-se por reproduzida, em particular, a matéria de facto constante dos Factos n.ºs 35, 36, 37, 41, 42, 43, 44 e 45 da Matéria de Facto dada por provada. 4. Da resposta à matéria de facto resulta que ficaram provados factos suficientes, mais do que indícios, da inexistência de subordinação jurídica na relação entre a Recorrida e os seus prestadores de serviços e, nessa medida, pela impossibilidade da qualificação de tal relação como sendo de trabalho subordinado. 5. Os depoimentos testemunhais prestados forma isentos, imparciais e absolutamente esclarecedores quanto à vontade das partes no tipo de contratação e ao modo de execução dessa relação contratual, facto particularmente importante quando os contratos não foram reduzidos a escrito. 6. Nos presentes autos, não pode deixar de estar em causa a qualificação da própria relação contratual, pois só a partir dela, é possível efectuar o enquadramento legal e das obrigações decorrentes dessa qualificação, já que não podem ser considerados como sendo de trabalho para efeitos contributivos, e de prestação de serviços para todos os outros, inclusive perante todas as entidades oficiais, desde a Autoridade Tributária até, por exemplo, à ACT. 7. Não podem as partes deixar de poder usar do direito à livre iniciativa económica, constitucionalmente consagrada, e à liberdade de escolha de profissão e do modo do seu exercício, face às opções que a lei disponibiliza. 8. A relação de trabalho subordinado é uma relação jurídica individual e, nessa medida, não podia deixar de se analisar cada uma das relações contratuais com cada um dos prestadores de serviço em causa, o que não foi feito, partindo os serviços do Recorrente de uma amostra de situações por uma presunção colectiva de trabalho. 9. Não podem deixar de se considerar relevantes os factos dados por provados que se traduzem nos indícios de laboralidade nos termos do art.º 12.º do CT, tal como é reconhecido por toda a jurisprudência e doutrina. 10. É o caso da não existência de remuneração fixa, seja ela variável ou não, tendo a remuneração no caso dos autos sido fixada nos termos habituais para os honorários de prestadores de serviços qualificados (vg. consultores, advogados, médicos, enfermeiros, etc.). 11. A referência aos horários e às disponibilidades livremente informadas pelos prestadores de serviço, a prova foi clara, e é por demais evidente que se trata de um facto relevante, sendo a comparação com o regime do trabalho por turnos nos termos do art.º 220.º do C. Trabalho, manifestamente inaplicável, porque o que está em causa não é a modalidade da prestação do trabalho quanto ao horário, mas a liberdade ou não de serem os prestadores a indicar os períodos em que têm disponibilidades, sem que a Recorrida possa contar com os seus serviços fora daqueles períodos (que até podem alterar depois de inicialmente comunicados), o que não acontece numa relação de trabalho subordinado. 12. Não ficou provado, bem pelo contrário, que os enfermeiros estivessem sujeitos a um horário de trabalho previamente fixado. 13. Ficou provado que os prestadores de serviço informam semanalmente a Recorrida das horas que estão disponíveis, e só nesse contexto a mesma pode fixar as suas escalas, podendo “revogar” as suas disponibilidades, sem se quer terem que dar qualquer justificação, e sem que daí advenha qualquer consequência. 14. Quanto à forma de pagamento, ficou provado (Facto 45) que se um prestador de serviços não tiver utentes, não fica na clínica (o que não acontece seguramente e como é bom de ver, com um trabalhador subordinado), não existindo qualquer dever de permanência no local de trabalho, assegurando o cumprimento de uma carga horária. 15. O facto de a Recorrida registar a prestação de serviço apenas para efeitos de controlo de pagamento, pois não são marcadas quaisquer faltas, é absolutamente esclarecedor para concluir que os prestadores não estão subordinados à Recorrida, nem esta pode retirar qualquer consequência das “faltas”, ou melhor da não comparência dos prestadores mesmo nos períodos para os quais manifestaram disponibilidade para prestarem serviço, que não seja o não pagamento. 16. Também é relevante que os prestadores de serviço trabalhem em hospitais públicos, e que tenham autorizações específicas para prestar serviços, como resulta dos documentos juntos aos autos. 17. Quanto ao gozo de férias o Recorrente confunde esta realidade, enquanto direito consagrado no CT, com o pagamento ou não de quaisquer quantias em determinados meses. 18. Os enfermeiros em causa não gozam férias, nem a Recorrida lhes concede esse gozo, enquanto direito dos primeiros, já que os prestadores de serviço quando comunicam as suas disponibilidades e, consequentemente, os períodos em que não estão disponíveis, nem sequer têm que justificar o porquê de não terem disponibilidade. 19. Os prestadores de serviços em causa não marcam férias, não constam dos mapas de férias, nem comunicam as férias à Recorrida, nem a Recorrida exerce algum dos poderes que a lei lhe atribui, por exemplo, na marcação de férias, no gozo de um mínimo de dias de férias, no pagamento dos dias de ausência “por gozo de férias” (se não trabalham, ainda que porque em gozo de férias, os prestadores de serviço não recebem qualquer pagamento, ou seja, não há “retribuição” de férias). 20. Quanto aos Enfermeiros N. e A., o Tribunal considerou, ainda que mal, salvo o devido respeito, que aquilo que entendeu ser a inserção na estrutura organizativa da Recorrida, era suficiente para concluir pela existência de uma relação de trabalho subordinado, confundindo funções de Coordenação Técnica com funções de Chefia. 21. O Facto Provado n.º 49 é claro, ao referir que aqueles enfermeiros coordenam os processos técnicos dos serviços, não são superiores hierárquicos, nem exercem poderes de chefia relativamente aos restantes enfermeiros. 22. Todos os outros pretensos indícios de laboralidade (como o local de trabalho ou os instrumentos de trabalho) resultam apenas e só da natureza da actividade desenvolvida pela Recorrida – prestação de serviços de saúde – e dos serviços prestados pelos prestadores de serviço em causa. 23. Bem andou o Tribunal “a quo” ao decidir que os prestadores de serviço ora em causa, o são verdadeiramente, declarando, por isso, procedente a impugnação deduzida pela Recorrida, não apontando o Recorrente qualquer norma que tenha sido violada, pelo que deve o recurso improceder. Termos em que, pelo que antecede, e pelo muito que V. Exas. haverão de suprir, deve ser negado provimento ao presente recurso, para assim se fazer Justiça» * O recorrido, Instituto da Segurança Social, I.P., contra-alegou, concluindo nos seguintes termos:«A- O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida pelo tribunal “a quo” que julgou parcialmente procedente a liquidação oficiosa, na parte que se refere às contribuições e cotizações dos meses de janeiro a maio de 2013, e, quanto aos demais meses, às contribuições e cotizações incidentes sobre valores pagos a todos os prestadores de serviços que não exercem funções de chefia. B- Primeiramente, a Recorrente invoca que a sentença é nula de acordo com o artigo 615º, n.º1, alíneas d) e e) do CPC; C- Para tanto, considera que a sentença “decidiu individualizar, considerando não existir uma relação de prestação de serviços, em dois casos: a enfermeira A. e o enfermeiro N.”. D- Alega, que a “ sentença a não limitar o âmbito de decisão aqueles dois enfermeiros, por ter considerado demonstrado que não eram prestadores de serviços, a sentença é indeterminada, uma vez que não precisou quem eram os prestadores relativamente aos quais a Impugnação não procedia”. E- Por último, invoca ainda que o “tribunal a “quo” apreciou e decidiu sobre um objecto diverso do pedido”. F- No entanto, sem razão, como se verá de seguida. G- Ora, ao contrário do que a Recorrente pretende demonstrar a sentença é bastante clara, em relação a estes dois enfermeiros, ao determinar que existe o elemento essencial de existência de subordinação jurídica, que caracteriza o contrato de trabalho face ao contrato de prestação de serviços. H- De facto, o tribunal “a quo”, na nossa opinião erroneamente, teve dúvidas em relação aos demais colaboradores (apesar de claros indícios da existência de um Contrato de Trabalho), concluindo com isso que, face à existência de tais dúvidas e porque o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque, no caso o aqui Recorrido, restou ao tribunal decidir pela improcedência da tese do ISS, I.P., relativamente à generalidade dos Prestadores de Serviços. I- Ora, o tribunal considerou, e bem, que estes factos em relação a estes dois enfermeiros que exercem cargos de chefia são passíveis de indiciar a existência de um contrato de trabalho, motivo pelo qual o tribunal anulou parcialmente o ato de liquidação de contribuições, respeitante aos valores pagos aos prestadores de serviços da aqui Recorrente. J- Assim, e ao contrário do invocado pela Recorrente, o tribunal a “quo” não decidiu de forma indeterminada e genérica, pelo contrário, analisou detalhadamente o caso em análise fazendo a destrinça entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviços. K- A Recorrente, não conformada com tal decisão, entendeu interpor o presente recurso alegando os seguintes fundamentos: A ilegitimidade da intervenção do ISS para qualificar relações contratuais de trabalho subordinado (ainda que apenas para o efeito de incidência de contribuições e cotizações), e a inconstitucionalidade da interpretação do art.º 256.º do Código dos Regimes Contributivos e do art.º 8.º, n.º 2, alínea c) (na redação em vigor) da Portaria n.º 135/2012 de 8 de Maio (texto da Portaria n.º 102/2017, de 8 de Março), acolhida pela sentença; Da qualificação das Gratificações de Balanço como remunerações sujeitas a incidência de contribuições e cotizações; Da limitação do vício de violação da lei aos prestadores de serviço que “não exerçam funções de chefia”. L- Pedindo “in fine” que seja dado “provimento ao presente recurso, anulando-se a decisão em crise na parte em que não considerou as gratificações de balanço e qualificou as relações contratuais dos Enfermeiros A. e N. como de trabalho subordinado”. M- No entanto, sem razão, como se verá de seguida. N- A Recorrente vem, invocar que o aqui Recorrido em ponto algum da sua Lei Orgânica e respetivas normas regulamentares se prevê a intervenção deste instituto na verificação da regularidade do comportamento das entidades empregadoras ao nível das relações jurídicas de vinculação. O- No entender da Recorrente, a atividade do Recorrido nesta matéria cinge-se à regularização de contratos de trabalho decretados como tal por sentença judicial, normalmente na sequência de ação intentada pelo interessado trabalhador, individualmente considerado (conforme. artigo 256.° n.º alínea d) do Código dos Regimes Contributivos. P- Nesse sentido, afirma, que a qualificação de determinada relação contratual como de trabalho subordinado ou autónomo, é da exclusiva competência dos Juízos do Trabalho, e que pressupõe necessariamente um reconhecimento judicial e não administrativo, seja para que efeito for, ainda que apenas seja para a definição do regime contributivo. Q- Conclui que pressupondo a liquidação oficiosa aqui em causa a qualificação pelo Recorrido das relações contratuais de cada um dos prestadores, como sendo de trabalho subordinado, e, arguindo que o Recorrido não tem competência para fazer tal qualificação, a mesma constitui um ato administrativo nulo, nos termos do artigo 161.° n.º 2 alínea a) do CPA, por usurpação de funções. R- Não podíamos estar mais em desacordo com a argumentação apresentada pela Recorrente, pois a atuação do Departamento de Fiscalização do Recorrido não definiu qualquer situação jurídica e regime aplicável, invadindo competências dos Tribunais, limitou-se a apurar a factualidade que lhe foi dada a conhecer e subsumi-la no quadro legal que lhe é aplicável, no âmbito do exercício de competências próprias que a lei lhe confere. S- Mais, o Recorrido agiu de acordo com as suas competências, não dirimiu conflito de interesses em usurpação de função jurisdicional, prosseguiu o interesse público, não ocorrendo qualquer invasão da esfera de competências dos Tribunais Judiciais (nesse sentido o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 11/07/2018, Proc. n.º 1156/13.8BEALM). T- Ora, a Recorrente pretende demonstrar, sem razão, que estamos diante de uma nulidade – usurpação de poderes, porquanto considera que o ato impugnado teria tido como fundamento o facto de prestadoras de serviços da aqui Recorrente deverem ser consideradas trabalhadoras subordinadas e efetuar descontos para a Segurança Social. U- A Lei Orgânica do ISS, aqui Recorrido, confere-lhe várias atribuições, entre elas, a promoção do cumprimento das obrigações dos beneficiários do sistema de segurança social, a arrecadação de receitas, assegurando o cumprimento das obrigações contributivas, e o exercício da ação fiscalizadora no cumprimento das obrigações dos contribuintes (artigo n.º 3.°, n.º 2, alíneas b), c) e u) do D.L. n.º 83/2012, de 30 de Março). V- Ora, o objeto do ato de liquidação aqui em causa não é a qualificação das relações contratuais existentes entre a Recorrente e os prestadores de serviços, em si mesma. O ato aqui em causa consubstancia uma liquidação que, inequivocamente, o Recorrido tem competência para emitir. W- De facto, e ao contrário do que a Recorrente invoca, o Recorrido tem competência para fiscalizar e apurar qual o tipo de vinculo existente entre a Recorrente e os seus prestadores de serviços, conclusões essas que são espelhadas no relatório de averiguações e que servem de suporte ao ato de liquidação, ato impugnado nos presentes autos. X- Alias, o Recorrido ao ter formulado tais conclusões não visou dirimir um conflito jurídico entre a Recorrente e os referidos prestadores de serviços, relativo à definição da natureza do vínculo jurídico-laboral em causa, mas antes exercitar as competências que lhe estão atribuídas no âmbito da fiscalização do cumprimento das obrigações dos contribuintes do sistema de segurança social, como resulta evidente do teor do ato que viria a praticar. Y- Logo, e ao contrário do que a Recorrente pretendeu demonstrar não pode proceder o alegado vício de usurpação de poderes, por falta, esta sim, de sustento legal. Z- A Recorrente vem, no âmbito desta segunda ordem de fundamentos do seu recurso, alegar ainda que o Tribunal “a quo” procedeu a uma errónea apreciação dos factos e dos elementos probatórios carreados para os autos, nomeadamente, quanto “à qualificação das Gratificações de Balanço como remunerações sujeitas a incidência de contribuições e cotizações”. AA- Primeiramente, alega que as gratificações pagas em 2015 e 2016 são gratificações respeitantes ao exercício de 2014, tentando demonstrar que não existe um pagamento reiterado e ininterrupto desde o ano de 2010, de acordo com factos 22 a 31 da matéria provada. BB- De facto, a Recorrente sabe, e não pode ignorar, que independentemente do ano a que se refiram as gratificações pagas nesses anos, elas existiram e estão evidenciadas nos recibos de vencimento dos seus colaboradores, assim como existia a expectativa de auferir essa gratificação. CC- É verdade que entre 2010 e 2013, a atribuição do montante de gratificação aos colaboradores era fixado ao livre arbítrio da Recorrente, ao contrário do ano de 2014 em diante que o pagamento dos prémios encontrava-se especificamente regulamentado, embora condicionado a certos fatores: resultado líquido do exercício, avaliação de desempenho positiva, e razões de tesouraria ou de política económica financeira. DD- Os usos empresariais da Recorrente demonstram que a mesma tem, desde 2010, concedido sempre o prémio anual aos colaboradores com avaliação de desempenho positiva superior a 30 pontos, mesmo quando os seus lucros anuais diminuíram (teve um resultado de €1.872.426,76 no exercício de 2013 e um resultado de € 793.071,93 no de 2014 e sempre concedeu prémios), tendo os usos da empresa, a mesma relevância que o regulamento interno na delimitação das prestações que integram a base de incidência contributiva, ditam que a “S.” nunca condicionou a atribuição de prémios aquele fator. EE- De facto, e ao contrário do que a Recorrente pretende demonstrar, o condicionamento do pagamento dos prémios a determinados fatores não coloca em causa a regularidade desse pagamento e o conceito previsto no artigo 47º do Código Contributivo. FF- Na verdade, a administração da Recorrente pode decidir não distribuir prémios, conforme ponto 31 da matéria de facto provada, mas não pode, em caso algum, e ao contrário do que a Recorrente pretende demonstrar não atribuir prémios sem justificação objetiva. GG- Deste modo, e por não ter a Recorrente logrado provar factos que ponham em causa a regularidade do pagamento das gratificações aos trabalhadores, impõe-se concluir que as mesmas constituem remuneração para os efeitos previstos no Código Contributivo. HH- Face ao exposto, do ponto de vista substancial ou material, esta prestação pecuniária denominada pela entidade empregadora de “gratificação do balanço” é, na sua essência, um prémio de desempenho do trabalhador, concedido com carácter de regularidade, dado que tem vindo a ser consecutivamente pago nos anos de 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016. II- Por último, a Recorrente vem, no âmbito desta terceira ordem de fundamentos do seu recurso, alegar ainda que o Tribunal “a quo” procedeu a uma “errónea apreciação dos factos e dos elementos probatórios carreados para os autos, nomeadamente, quanto aos enfermeiros A. Reis e N.”. JJ- Cumpre dizer que a Enfermeira A., além das funções inerentes à profissão de enfermeira, faz, desde 2014, a organização dos horários dos seus colegas do serviço de endoscopia da Clinica (...), controla o n.º de horas que aqueles fazem para efeitos do seu pagamento e procede à articulação do serviço dos enfermeiros com os médicos, conforme auto de declarações e prova testemunhal - Facto 46 da matéria provada. KK- Em relação ao Enfermeiro N., também prestador de serviços da aqui Recorrente, é o responsável pela coordenação do pessoal de enfermagem do serviço de diálise, procedendo à elaboração dos mapas de turnos e à afetação dos profissionais por doente, conforme auto de declarações e prova testemunhal - Facto n.º 47 da matéria provada. LL- Os dois enfermeiros referenciados respondem aos gestores das respetivas unidades e recebem uma remuneração fixa mensal para o exercício do cargo de chefia (suplemento de chefia) contra a emissão de fatura-recibo - Facto n.º 48 da matéria provada. MM- Assim, e ao contrário do que a Recorrente pretende demonstrar a sentença é bastante clara a clarificar e a determinar (em relação a estes dois enfermeiros) o elemento essencial de existência de subordinação jurídica, que caracteriza o contrato de trabalho face ao contrato de prestação de serviços. NN- É que, contrariamente aos restantes colegas Prestadores de Serviços de enfermagem, estes, além das funções inerentes à profissão de enfermeiros, fazem a organização de horários dos seus colegas dos serviços de diálise e de endoscopia da Clínica (...) (tanto de prestadores de serviços como de trabalhadores dependentes), controlam o n.º de horas que aqueles prestadores fazem, para efeitos do seu pagamento, e procedem à articulação do serviço dos enfermeiros com os médicos e à afetação dos profissionais por doente - Factos n.º 46 e 47 da matéria provada. OO- Tanto assim é, que respondem aos gestores das respetivas unidades, que são quem emana as diretrizes que estes têm de observar na coordenação dos processos técnicos, e recebem uma remuneração fixa mensal pelo exercício do cargo de chefia - Factos n.º 48 e 49 da matéria provada. PP- Em função do referido, o Tribunal a “quo” considerou que nestes dois casos podemos encontrar uma maior correspondência com o conceito-tipo de Contrato de Trabalho do que com o de Prestação de Serviço. QQ- Considera, o aqui Recorrido, que esse vínculo jurídico se aplica a todos os prestadores de serviços e não apenas aqueles que exercem cargos de chefia. Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, com o douto suprimento de V.Exas., As presentes alegações de recurso devem ser julgadas improcedentes, por não provadas e, em consequência, revogar-se a douta sentença recorrida que anulou parcialmente o ato impugnado mantendo-se assim, o ato impugnado “qua tale”. Assim decidindo, Vossas Excelências Venerandos Conselheiros, Farão a costumada JUSTIÇA!» * O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se do seguinte modo:«S., S.A. e o Instituto da Segurança Social, IP recorrem da sentença proferida pela Mma Juíza do TAF de Coimbra que anulou parcialmente o ato de liquidação oficiosa referente a contribuições para a segurança social, com origem na atribuição de gratificações de balanço e na qualificação do vínculo de prestadores de serviço/trabalhadores, no período que mediou entre fevereiro de 2013 e dezembro de 2016, nos seguintes termos: “De tudo o que foi dito resulta a necessidade de anular parcialmente o ato de liquidação em causa nos presentes autos porquanto o mesmo padece de: (i) Vício de violação de lei por caducidade do direito a liquidar as contribuições e cotizações referentes aos meses de janeiro a maio de 2013; (ii) Vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto quanto à liquidação de contribuições e cotizações sobre os rendimentos pagos aos prestadores de serviços que não exercem funções de chefia. Quanto aos demais vícios invocados, conforme tivemos oportunidade de explanar, os mesmos não se verificam, o que conduz à procedência parcial da Impugnação.” Alega a recorrente S., resumidamente, que a sentença: - conheceu de questões de que não devia tomar conhecimento por não serem objeto do pedido, assim padecendo de nulidade nos termos do previsto no artº 615º, nº 1 alíneas d) e e) do CPC; - incorreu em erro de julgamento ao considerar que o ISS tem legitimidade para qualificar relações contratuais de trabalho subordinado (ainda que apenas para o efeito de incidência de contribuições e cotizações), não declarando a inconstitucionalidade da interpretação do art.º 256.º do Código dos Regimes Contributivos e do art.º 8.º, n.º 2, alínea c) (na redação em vigor) da Portaria n.º 135/2012 de 8 de Maio (texto da Portaria n.º 102/2017, de 8 de Março), ao qualificar as gratificações de balanço como remunerações sujeitas a incidência de contribuições e cotizações e ao limitar o vício de violação da lei aos prestadores de serviço que “não exerçam funções de chefia”, assim violando o disposto nos arts. 13.º, 20.º, 47.º, n.º 1 e 4, 212.º, 266.º e 268.º da C.R.P., o art. 46.º, n.º 2, alínea d) do Código dos Regimes Contributivos e o art. 12.º do Código do Trabalho, o art. 8.º da Portaria n.º 135/2012, de 8 de Maio e o art. 8.º, n.º 2, alínea a) da Lei n.º 3/2004, de 15 de Janeiro. Alega o recorrente ISS, IP, em síntese, que ao valorar de modo decisivo os depoimentos de alguns dos alegados prestadores de serviços “.. o Tribunal a quo limitou sobremaneira a sua valoração de prova ao sobrepor e fazer prevalecer essa vontade manifestada pelas testemunhas sobre todos os indícios relacionados com o concreto modo de execução da relação de trabalho”, que os factos apontados na sentença “ não constituem indícios suscetíveis de concluir que não estamos perante um Contrato de Trabalho, não podendo sequer afirmar-se, como o Tribunal faz, que correspondem a elementos típicos de contratos em que não existe subordinação jurídica, tal como se demonstrou na apreciação crítica concretizada supra, logo após a enunciação de cada um desses factos”. E conclui “Verificando-se, assim, não padecer o ato impugnado, de qualquer erro quanto aos seus pressupostos que o inquine de nulidade ou sequer de anulabilidade, sendo o mesmo absolutamente válido e legal, pelo que deve ser mantido “qua tale”. Vejamos. Em despacho prévio à remessa dos autos a este Tribunal pronunciou-se a Mma Juiza, conforme ao determinado pelo nº 1 do artº 617º do CPC, sobre a invocada nulidade, em termos que merecem a minha inteira concordância e me não suscitam quaisquer outras considerações. Quanto ao mais alegado pela S.. Parece-me não se suscitarem dúvidas sobre a competência do ISS para classificar as relações de trabalho, ainda que apenas para o efeito de incidência de contribuições e cotizações. Se assim não fosse, como bem salienta o Sr Procurador no seu parecer, “...seria a impugnante a determinar qual a natureza da relação jurídica, cabendo ao ISS apenas apurar o cumprimento das normas legais no que concerne aos valores a atender para a fixação do regime contributivo”. Ademais, de acordo com a sentença, o que está em causa é uma relação jurídica contributiva, e não qualquer relação laboral, sendo exemplificativo o ac. do Plenário do STA de 28-082018, proferido no Proc. n.º 0907/17, quando consigna «Embora fundada na relação laboral, esta relação jurídica contributiva não se confunde com ela, e apenas incide sobre um dos sujeitos da relação laboral, a entidade empregadora, pois que, como vimos, é esta a responsável pelo pagamento, mesmo na parte respeitante ao trabalhador”. Quanto ao demais alegado, parece-nos que os recursos se interligam, pois que ambos se prendem com a caracterização da relação laboral existente entre as partes. Desde logo se diga não ser estranho o trecho da sentença em que a sua subscritora assume não ser simples nem linear a solução a dará o caso, na medida em que se configuram factos indiciadores da existência de um contrato de trabalho e outros factos que conduzem para um contrato de prestação de serviços. Ora, “No que respeita à disciplina da impugnação da decisão da 1ª instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe à recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida (artº 685-B, nº 1 do CPC, ex vi do artº 281º do CPPT. Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no atual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redação resultante da Lei 41/2013, de 26/6; se a decisão do julgador, no que diz respeito à prova testemunhal produzida, estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção – ac. TCAS, de 29.9.2016, proc. 05386/12. No caso, os recorrentes extraem da prova reunida nos autos ilações diversas das do julgador. Porém, atentando na motivação da sentença, afigura-se correta a interpretação da prova no que se refere à qualificação da relação laboral, explanada quase até à exaustão no item “Do erro nos pressupostos de facto”, por referência às normas do Código do Trabalho citadas e com apoio em jurisprudência criteriosamente selecionada, não descurando ainda a questão do ónus da prova para concluir, com acerto, que “... as declarações remetidas mensalmente pela impugnante não refletem a sua matéria tributável”, e que no que se refere às gratificações que a SS se viu impedida de verificar se as prestações tinham ou não natureza retributiva. Em suma, não me merecendo a sentença qualquer reparo a nível de apreciação factual e sua integração no direito aplicável, deverá manter-se na ordem jurídica, assim improcedendo ambos os recursos.» * Sem vistos dos Exmos. Juízes adjuntos, por assim ter sido acordado, foi o processo à Conferência para julgamento.* 2.DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO: QUESTÕES A APRECIARCumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações: A- Instituto da Segurança Social, Saber se a sentença fez uma errada valoração da prova testemunhal produzida valorizando de sobremaneira em relação aos indícios colhidos pela inspeção e acionou uma fundamentação que não permite concluir pelo erro nos pressupostos de facto das contribuições e cotizações sobre os rendimentos dos prestadores de serviços; B- S., , S.A., 1-Saber se a sentença é genérica e indeterminada, padecendo de nulidade, decidindo sobre objeto diverso do pedido; 2- Saber se o ISS não tem legitimidade para qualificar as relações contratuais de trabalho e se a interpretação acolhida na sentença relativa aos arts. 256.º do Código dos Regimes Contributivos 8., n. º2, al c) da Portaria n.º 135/2012 de 8 de maio, é inconstitucional 3-Saber se a sentença errou de facto e de direito no que tange às gratificações de balanço como remunerações sujeitas a incidência contributiva e ainda incorreu em violação de lei quanto à qualificação de contrato de trabalho em relação aos enfermeiros A. e N., porquanto estes também não respondem hierarquicamente perante os gestores das unidades e não têm horário pré-fixado, dando apenas as suas disponibilidades. * 3. FUNDAMENTOS DE FACTO Em sede de probatório, a 1.ª Instância fixou os seguintes factos: 1. A Impugnante (doravante S.) é uma sociedade anónima e dedica-se à prestação de serviços médicos e paramédicos, casa de saúde com internamento e posto de socorros urgentes – cfr. certidão permanente de fls. 156 e ss. do p.a. apenso; 2. O conselho de administração da Impugnante no triénio de 2012/2015 era composto por M., J., na qualidade de vogais e P., na qualidade de presidente – cfr. certidão permanente de fls. 156 e ss. do p.a. apenso; 3. Em 24-08-2016 foram nomeados para o conselho de administração da Impugnante no triénio de 2016-2018 J., na qualidade de presidente, e P., na qualidade de administrador – cfr. publicações.mj.pt; 4. A S. foi alvo de um processo de averiguações (PROAVE n.º 201600005795), que foi determinado pelo despacho n.º 36/UFC/2016 de 29/02/2016, do Diretor da Unidade de Fiscalização do Centro do Instituto da Segurança Social I.P. – cfr. doc de fls. 2 e 3 do p.a. apenso; 5. Em 17/03/2016 foi a Impugnante notificada da instauração do processo de averiguações a que aludimos no ponto antecedente – cfr. doc. de fls. 35 do p.a. apenso; 6. A 10/05/2016 e 03/10/2016, e no âmbito do processo supra referido, foram pedidos documentação adicional e esclarecimentos, por escrito, à Impugnante – cfr. doc de fls. 101 do p.a. apenso cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 7. A 03/11/2016 foram expedidas missivas endereçadas a prestadores de serviços (de enfermagem) da S., convocando-os para prestarem declarações – cfr. docs. de fls. 229 a 236 do p.a. apenso; 8. A inquirição dos referidos prestadores de serviços (de enfermagem) foi realizada a 17/11/2016, lavrando-se os respetivos autos de declarações cfr. docs. de fls. 237 a 255 do p.a. apenso cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 9. A 18/11/2016 foram expedidas missivas endereçadas a trabalhadores independentes e dependentes que prestam (ou prestaram) trabalho na “S.”, ora Impugnante, convocando-os para prestarem declarações - cfr. docs. de fls. 274 a 280 do p.a. apenso; 10. A 07/12/2016 foram inquiridos os trabalhadores notificados pelos ofícios referidos no ponto precedente, tendo-se procedido à elaboração dos respetivos autos de declarações - cfr. docs. de fls. 281 a 295 do p.a. apenso cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 11. Em 16/02/2017 foi elaborado o Projeto de Relatório referente ao processo de averiguações mencionado em 2, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e que aqui se transcreve parcialmente: “(...) IV. Factos apurados a) Factos relativos à Administração e aos Trabalhadores dependentes (por conta de outrem) da entidade empregadora Consultada a base de dados SISS, constata-se que a entidade empregadora S. - , S.A. (NISS (...)), de ora em diante abreviadamente denominada por “S.”, tem, presentemente, cerca de 161 funcionários enquadrados no regime de proteção social dos Trabalhadores por Conta de Outrem (TCO). (...) Analisados os Balancetes Analíticos do encerramento de contas dos exercícios de 2012 a 2015, constatou-se que não constam gratificações na conta 6327 nos anos de 2012 e 2014, sendo que em 2013 constam €281.405,00 e em 2015 constam €186.947,73 de gratificações ao pessoal. Da análise dos mapas de processamento salarial, facultados pela entidade empregadora, resulta que: - No ano de 2012, no mês de agosto, a entidade empregadora pagou aos trabalhadores €297.890,00 a título de gratificações do balanço, quantia que não foi objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. - No ano de 2013, a entidade empregadora pagou aos trabalhadores €281.405,00 a título de gratificações de balanço, quantia que não foi objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. No mês de julho de 2013 pagou €100.000,00 de gratificação ao trabalhador H. e €100.000,00 de gratificação a J.. No mês de dezembro de 2013 pagou a remanescente quantia de €81.405,00 a vários trabalhadores. - No ano de 2014, no mês de dezembro, a entidade empregadora pagou aos trabalhadores €92.329,38 a título de gratificações de balanço, quantia que não foi objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. - No ano de 2015, a entidade empregadora pagou aos trabalhadores €186.947,73 a título de gratificações de balanço, quantia que não foi objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. No mês de fevereiro de 2015 pagou €50.000,00 de gratificação ao trabalhador H. e €50.000,00 de gratificação a J.. No mês de dezembro de 2015 pagou a remanescente quantia de €86.947,73 a vários trabalhadores. - No ano de 2016, nos meses de fevereiro e março, a entidade empregadora pagou €8.637,50, a título de gratificações de balanço, quantia que não foi objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. Acresce ainda que, segundo os esclarecimentos, prestados por escrito a 12 de janeiro de 2017, a entidade empregadora em averiguação também procedeu ao pagamento de gratificações do balanço aos seus colaboradores nos anos de 2010 e 2011, pelo que se conclui que o pagamento desta gratificação tem sido realizado de forma reiterada e ininterrupta, desde o ano de 2010 até, pelo menos, ao ano de 2016, assumindo uma periodicidade anual. Ora, solicitadas as atas sociais de aprovação de contas e de deliberação da distribuição de resultados pelos trabalhadores (gratificações do balanço) referentes aos exercícios económicos de 2013 a 2015, a entidade empregadora remeteu: - a Ata n.º 88 da Assembleia Geral da “S.”, datada de 17 de novembro de 2014, nos termos da qual a Assembleia Geral deliberou que os resultados positivos do exercício de 2013 transitavam para a conta dos resultados transitados, não constando da ata qualquer referência à distribuição de resultados do exercício de 2013 pelos trabalhadores; - a Ata n.º 91 da Assembleia Geral da “S.”, datada de 17 de fevereiro de 2016, nos termos da qual a Assembleia Geral deliberou que os resultados positivos do exercício de 2014 transitavam para a conta dos resultados transitados, não constando da ata qualquer referência à distribuição de resultados do exercício de 2014 pelos trabalhadores; - por outro lado, não foi facultada nenhuma outra ata social, nomeadamente de previsão ou de distribuição de resultados pelos trabalhadores. Solicitada a Ata de previsão da atribuição de Gratificações de Balanço e Ata de aprovação de contas e de deliberação da distribuição de resultados referentes ao exercício económico de 2015, a entidade empregadora remeteu uma ata social de outra empresa do grupo (Ata n.º 33 da Assembleia Geral da S. , SGPS, Lda. de 17 de fevereiro de 2016) que ratificava as quantias pagas em 2014 e 2015 por essa outra empresa a título de gratificações do balanço referentes aos exercícios, respetivamente, de 2013 e 2014. Portanto, pode concluir-se que a atribuição de “gratificações” aos trabalhadores não se encontra suportada pela correspondente documentação societária, isto é, não consta das atas sociais de aprovação de contas e de deliberação da distribuição de resultados pelos trabalhadores. Por outro lado, as “gratificações” são concedidas de acordo com o procedimento e os critérios constantes do Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho dos Trabalhadores do Grupo S. Medicina, que, aliás, denomina esta “gratificação” de prémio. Nos termos deste regulamento interno, as “gratificações” a atribuir a cada trabalhador são calculadas por aplicação de uma percentagem ao vencimento base e os critérios para a sua atribuição são: i) um resultado líquido positivo do exercício superior ao do exercício anterior; e ii) uma avaliação positiva do trabalhador de acordo com os parâmetros fixados no regulamento. Ou seja, de acordo com o n.º 2 do artigo 3.º e com o n.º 4 do artigo 5.º do Regulamento interno, a atribuição de prémios aos colaboradores depende da verificação cumulativa de dois critérios, sendo esses dois critérios fixados de forma objetiva e em termos gerais para todos os trabalhadores: i) a existência de um resultado líquido positivo superior ao do exercício imediatamente anterior; ii) uma avaliação de desempenho anual do colaborador superior a 30 pontos, sendo que o trabalhador é avaliado, numa escala de 1 a 5, em vários parâmetros, como conhecimento do seu trabalho/função, gestão e capacidade de resposta, trabalho em equipa, resolução de problemas, confiabilidade/responsabilização, gestão de mudança e melhorias, comunicação, resposta aos clientes, apresentação, segurança, capacidade de liderança. Acresce ainda que o trabalhador tem não só conhecimento prévio dos critérios objetivos e gerais a atingir, mas também tem conhecimento prévio da forma de cálculo do montante do prémio a receber, que corresponde a uma percentagem do valor da retribuição base (e não a uma percentagem do resultado do exercício a distribuir), percentagem essa que varia consoante a pontuação obtida na avaliação de desempenho anual. Portanto, compulsado o Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho dos Trabalhadores do Grupo S. Medicina, aplicável a todos os trabalhadores das empresas do grupo, incluindo a “S.”, verifica-se que a atribuição de prémios está diretamente relacionada com o desempenho individual e particular de cada trabalhador (e não com metas da empresa ou do grupo), sendo que o trabalhador tem conhecimento prévio dos critérios objetivos e gerais (porque constantes do regulamento interno) que terá de cumprir tendo em vista o seu recebimento, bem como da forma de cálculo a receber. O valor a que cada trabalhador tem direito a receber a este título está diretamente relacionado com o seu desempenho individual e não com o cumprimento de determinadas metas de gestão da organização (como os resultados obtidos por um determinado departamento, etc.). Portanto, do ponto de vista substancial ou material, esta prestação pecuniária é. na sua essência, um prémio de desempenho do trabalhador. Assim, verificando-se as duas condições cumulativas previstas no regulamento interno do grupo, o trabalhador tem não só a expetativa, mas o adquire o direito a receber o prémio de desempenho. Sucede, todavia, que a entidade empregadora faz depender a atribuição de prémios de desempenho aos funcionários da existência de um resultado líquido positivo superior ao do exercício anterior, sendo que a Administração pode decidir conceder o prémio mesmo que este requisito não se tenha verificado (o que já sucedeu, dado que a EE teve um resultado de €1.872.426,76 no exercício de 2013 e um resultado de €793.071,93 no de 2014 e sempre concedeu prémios). Por fazer depender a atribuição do prémio deste fator, a entidade empregadora classifica os prémios de desempenho que concede como “gratificações” aos trabalhadores, isto é, participações nos lucros dos trabalhadores e, por essa via, não os sujeita a incidência contributiva para efeitos de segurança social. Sucede, porém, que o facto de a concessão do prémio de desempenho estar condicionada à existência de um resultado líquido positivo do exercício superior ao do exercício anterior não afeta a natureza da prestação, pois “prémio” (seja de produtividade, de desempenho, de assiduidade ou outro) é a prestação diretamente relacionada com fatores pessoais do trabalhador, como o seu desempenho, a sua capacidade produtiva, a sua assiduidade, etc., pelo que o seu recebimento depende do esforço e do cumprimento de objetivos por parte do trabalhador, ainda que a empresa condicione o recebimento desse prémio ao cumprimento de determinadas metas da empresa ou ao resultado do exercício. Na verdade, o condicionamento do pagamento do prémio a fatores de tesouraria ou de política financeira da empresa não afeta nem a natureza da prestação, nem a regularidade da mesma, pois o artigo 47.º do Código dos Regimes Contributivos prevê que: “uma prestação reveste caráter de regularidade quando constitui direito do trabalhador, por se encontrar pré-estabelecida segundo critérios objetivos e gerais, ainda que condicionais, por forma a que este possa contar com o seu recebimento (. (sublinhado nosso). Por outro lado, o regulamento interno prevê uma cláusula aberta na alínea d) do artigo 5.º que refere que “O Conselho de Administração ou a Comissão Executiva podem introduzir descontos globais, ou individuais, por razões de tesouraria ou de política económico-financeira, nos valores dos prémios calculados (...), podendo mesmo deliberar a não atribuição global de prémios.” Esta “cláusula de salvaguarda” pretende contrariar a natureza de direito preestabelecido deste prémio de desempenho e reforçar que a sua concessão depende de um ato de vontade unilateral e discricionário da empresa que tornaria a prestação sempre de concessão irregular e, por essa via, excluída de incidência contributiva para efeitos de segurança social. Todavia, pela prova produzida no processo de averiguações, verifica-se que a prática da empresa é a de conceder, pelo menos desde o ano de 2010, de forma reiterada, estável e periódica (com periodicidade anual), prémios de desempenho aos seus colaboradores, nunca tendo a Administração deliberado a sua não concessão. Em suma, do ponto de vista substancial ou material, esta prestação pecuniária denominada pela entidade empregadora de “gratificação do balanço” é, na sua essência, um prémio de desempenho do trabalhador, concedido com carácter de regularidade, dado que tem vindo a ser consecutivamente pago nos anos de 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016. Portanto, não subsiste qualquer dúvida de que o trabalhador não comunga no lucro da empresa, até porque esses lucros podem vir a ser sucessivamente inferiores de ano para ano e o prémio do trabalhador pode vir a ser progressivamente superior de ano para ano, se o seu desempenho for nesse sentido. Face ao exposto, conclui-se que estamos perante gratificações do balanço descaracterizadas, que, no fundo, mais não são do que prémios de desempenho, pagos pela entidade empregadora aos seus trabalhadores, segundo critérios objetivos e gerais pré-determinados, de forma ininterrupta e com inequívoco caráter de regularidade, pelo que tais montantes constituem base de incidência contributiva para efeitos de segurança social, conforme previsto no n.º 2, alínea d) e n.º 5 do artigo 46.º do Código dos Regimes Contributivos. (...) b) Factos relativos aos trabalhadores independentes (prestadores de serviços) da entidade empregadora Analisados os valores constantes da conta 62 (fornecimento de serviços externos), mais concretamente da subconta 6224 (honorários) dos Balancetes, visando aferir-se o correto enquadramento dos prestadores de serviços, constata-se que os valores pagos a título de honorários são avultados, rondam €1.600.000,00 a €1.700.000,00 e resultam, sobretudo, do recurso à contratação de vários profissionais da área da saúde, como médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, técnicos de radiologia, entre outros. ba) Os prestadores de serviços de enfermagem Consultada a base de dados SISS/SICC/Entidades Contratantes, verificou-se, desde logo, que a entidade empregadora em averiguação foi notificada pelos serviços de segurança social reiteradamente por ter sido qualificada como Entidade Contratante de vários prestadores de serviços, na sua maioria enfermeiros de profissão. Assim, solicitou-se identificação dos prestadores de serviços que desempenharam e/ou desempenham funções de enfermagem, fisioterapia e imagiologia no período de 2013 a 2016, tendo em vista verificar a regularidade do seu enquadramento como trabalhadores independentes perante o sistema de segurança social. Da consulta à base de dados SISS/IDQ e SISS/CDF, da análise da documentação remetida pela entidade empregadora (listagem dos prestadores de serviços de enfermagem com identificação do tipo de vínculo à S. e serviço onde está afeto, listagem de faturas-recibo emitidas por aqueles e amostragem das escalas de serviço) e da inquirição dos referidos trabalhadores independentes, cujas declarações foram registadas em autos de declarações, conclui-se que: Portanto, os profissionais de enfermagem desempenham as suas funções na S. inseridos numa estrutura hierárquica, prestando contas do seu trabalho perante a sua chefia intermédia e cumprindo orientações, indicações e os horários estipulados por essa chefia. Algumas das chefias encontram-se, elas próprias, a exercer o cargo como prestadores de serviços. - conforme declarações prestadas pelos enfermeiros e registadas em auto de declarações. ii) Local de Trabalho Os prestadores de serviços de enfermagem executam a sua atividade nas instalações da S., na Clínica (...), na Avenida (…), no Centro Diagnóstico e Tratamento Integrado (...), na Rua (…), no Centro Hospitalar de (...), entre outros. iii) Horário de Trabalho Os prestadores de serviços de enfermagem estão adstritos ao cumprimento de um horário de trabalho, que pode ser por turnos, sendo a escala de turnos previamente elaborada pelo chefe de serviço da especialidade, ou que pode ser fixo. No serviço de internamento de doentes, os enfermeiros cumprem horário de trabalho, por turnos, de acordo com uma escala semanal de turnos, previamente elaborada pelo chefe do serviço, sendo que no serviço de internamento existem três turnos de trabalho, cada turno com uma duração de oito horas: o da manhã, das 08h00 às 16h00, o da tarde, das 16h00 às 24h00, e o da noite, das 24h00 às 08h00. O cumprimento dos três turnos de trabalho permite assegurar o funcionamento do serviço de internamento de doentes da S. 24 horas por dia. No serviço de cirurgia, os enfermeiros cumprem horário de trabalho, por turnos, de acordo com uma escala semanal de turnos previamente elaborada pela enfermeira chefe de serviço, sendo que no serviço de cirurgia a duração dos turnos não é rígida, mas variável em função da duração da cirurgia, e o início do turno não ocorre sempre à mesma hora, mas é fixado em função da hora da marcação da cirurgia. No serviço de esterilização de material de cirurgia, os enfermeiros cumprem horário de trabalho, por turnos, de acordo com uma escala mensal de turnos previamente elaborada pela enfermeira chefe do serviço de cirurgia, tendo cada turno de trabalho uma duração de oito horas. No serviço de diálise, os enfermeiros cumprem horário de trabalho, por turnos, de acordo com uma escala semanal (ou quinzenal) de turnos previamente elaborada pelo enfermeiro chefe de serviço, sendo que no serviço de diálise existem três turnos de trabalho, cada turno com uma duração de cinco horas: o da manhã, das 07h15 às 12h15, o da tarde, das 12h15 às 17h15, e o da noite, das 17h 15 às 22h15. O cumprimento dos três turnos de trabalho permite assegurar o funcionamento do serviço de diálise da S. desde a abertura ao encerramento do mesmo. No serviço de endoscopia (...), os enfermeiros cumprem horário de trabalho, por turnos, de acordo com uma escala semanal de turnos previamente elaborada pela enfermeira chefe do serviço. No serviço de atendimento permanente, os enfermeiros cumprem horário de trabalho por turnos, de acordo com uma escala de turnos previamente elaborada pelo diretor/coordenador, sendo que os turnos fixados em função do horário de funcionamento do serviço de atendimento permanente. No serviço de consultas externas, os enfermeiros cumprem horário de trabalho fixo, de segunda a sexta-feira. Note-se que a S. recruta muitos enfermeiros que têm um vínculo laboral a tempo inteiro com outras entidades, como é o caso do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, pelo que muitos enfermeiros desempenham as suas funções a tempo parcial na S., compatibilizando esse trabalho com o seu trabalho a tempo inteiro noutra entidade. – conforme informação disponível em SISS/IDQ e CDF. Assim, atendendo à disponibilidade dos profissionais, há enfermeiros que trabalham a tempo inteiro na S., executando um horário de trabalho com, pelo menos, 35 horas de trabalho semanal, e há enfermeiros que executam um horário a tempo parcial, com uma carga semanal inferior a 35 horas de trabalho semanal. - conforme declarações prestadas pelos trabalhadores e faturas-recibo juntas ao processo. Os prestadores de serviços de enfermagem asseguram o regular funcionamento dos serviços de enfermagem oferecidos pela S. aos seus clientes, estando adstritos ao cumprimento de um dever de permanência nas instalações que não se coaduna com a essência de uma relação jurídica de prestação de serviços. iv) Propriedade dos meios e materiais utilizados na execução das tarefas Os materiais e os meios operacionais (maquinaria, pensos, gazes, pomadas, medicação, termómetros, instrumentos contundentes, etc.) que os prestadores de serviços utilizam na execução das suas funções de enfermagem são integralmente fornecidos pela S.. v) Remuneração horária fixada em função do tempo de trabalho (e não em função de um determinado resultado ou por tarefa) Acresce ainda que os prestadores de serviços em causa auferem, como contrapartida do trabalho prestado, uma remuneração por cada hora de trabalho (cujo valor pode ir de €5,00 a €10,00 à hora), pelo que a sua remuneração mensal é variável em função do número de horas de trabalho prestado. Ou seja, auferem uma remuneração periódica mensal em função do tempo de trabalho despendido, e não em função de um determinado resultado ou por tarefa. Em alguns serviços, o valor da retribuição horária fixado para o período noturno e para dias de descanso ou feriados é superior ao valor da retribuição horária em dia de trabalho útil e em tempo diurno, à semelhança do que sucede com os trabalhadores por conta de outrem, que têm direito a um acréscimo remuneratório por cada hora de 47 trabalho prestada em período noturno ou em dia de descanso ou feriado (remuneração por trabalho noturno e por trabalho suplementar). Por outro lado, o valor da retribuição horária também varia consoante o serviço a que o enfermeiro foi afeto (por exemplo, os enfermeiros afetos ao serviço de diálise têm uma remuneração horária superior à dos demais enfermeiros), da antiguidade (por exemplo, no primeiro ano de trabalho o valor retribuição horária é inferior à do segundo ano de trabalho) e do cargo ocupado (a retribuição horária paga a enfermeiros chefe, quando estes fazem serviço de enfermagem, é superior à dos demais colegas, pois apresenta uma componente fixa correspondente ao suplemento pelo exercício do cargo de chefia). A S. faz relevar a antiguidade no posto de trabalho, na medida em que o valor por cada hora de trabalho pago pela S. aos enfermeiros obedece também a um critério de antiguidade do trabalhador, pelo que o valor hora pago no primeiro ano aos prestadores recém contratados é inferior ao valor hora pago no segundo ano. vi) Fardamento e registo de assiduidade Os enfermeiros dos serviços de Atendimento Permanente, Consultas, Internamento e Diálise desempenham as suas funções fardados com calça e túnica brancas da S., têm um número de funcionário atribuído e registavam, até meados de 2016, a sua assiduidade em sistema de registo ponto métrico, tendo a Administração recentemente emitido orientações no sentido de que apenas os trabalhadores dependentes deverão registar a assiduidade neste sistema. No serviço de Endoscopia/Gastroenterologia, os enfermeiros também desempenham as suas funções fardados com calça e túnica brancas da S., têm um número de funcionário atribuído e registam a assiduidade em folhas de horas. Os enfermeiros da Cirurgia e do serviço de apoio à Cirurgia utilizam bata cirúrgica descartável, própria para bloco operatório, concedida pela S. e registam a sua assiduidade em folhas de horas. vi) O gozo de férias e o pagamento de décimo terceiro e décimo quarto meses Os profissionais de enfermagem estão obrigados a comunicar prévia e atempadamente o gozo de férias e eventuais ausências aos seus chefes diretos, até porque as chefias precisam de saber quais os profissionais que estão disponíveis para elaborarem as escalas de serviço ou fazer substituições de profissionais escalados. Estes trabalhadores têm direito a gozar férias, embora a S. não os obrigue a gozar um número mínimo de dias por ano, sendo que, no período do gozo das férias, não são remunerados. A generalidade dos prestadores de serviços de enfermagem não recebe da entidade empregadora 13.º e 14.º mês (subsídios de férias e de natal). Todavia, os enfermeiros do serviço de diálise recebem, duas vezes por ano, duas quantias, referentes ao mês de junho e ao mês de dezembro (nesta última, o respetivo pagamento já recai no mês de janeiro do ano seguinte), cujo valor corresponde a uma média dos últimos seis vencimentos recebidos e que consta do valor global do recibo verde emitido nesses meses ou de recibo verde autónomo emitido por referência a esses meses. - conforme análise dos recibos verdes emitidos pelos enfermeiros desta especialidade e declarações prestadas por enfermeiros afetos ao serviço de Diálise. Na verdade, estas quantias, quer pela data de pagamento, quer pela sua forma de cálculo, são, na sua essência, equivalentes aos subsídios de férias e de natal dos trabalhadores dependentes. viii) O mesmo posto de trabalho ocupado por trabalhadores independentes e dependentes Na S., existem enfermeiros a desempenhar precisamente as mesmas funções, com idênticas características quanto ao modo de prestação de trabalho, mas com vínculos distintos. Uns desempenham as suas funções ao abrigo de contrato de trabalho, outros desempenham precisamente as mesmas funções, mas em regime de prestação de serviços. - conforme listagem de enfermeiros e respetivos vínculos profissionais com a S.. Mais. Vários enfermeiros foram considerados, pelos serviços de segurança social, trabalhadores independentes economicamente dependentes (isto é, trabalhadores abrangidos pelo regime contributivo dos trabalhadores independentes que faturam 80% ou mais do seu rendimento anual a uma única entidade) da S. - conforme informação disponível em SISS/Entidade Contratante - e a S. foi notificada, pelos serviços, para pagar a contribuição devida pela sua qualidade de Entidade Contratante. Nessa sequência, a S. celebrou contratos de trabalho com estes enfermeiros - conforme informação disponível em SISS/IDQ - e integrou-os no seu quadro de pessoal, reconhecendo, por esta via, que a alegada “prestação de serviços” executada por estes profissionais correspondia a um posto de trabalho do seu quadro de pessoal e que a sua atividade evidenciava características típicas de trabalho subordinado Assim aconteceu, por exemplo, com as enfermeiras C., A., A., M., L., A., J., J., A., entre outros, todas prestadoras de serviços que passaram, em 2015, a trabalhadoras subordinadas da entidade empregadora, sem que houvesse modificação substancial das características do modo da prestação de trabalho, havendo apenas uma melhoria das suas condições de trabalho por lhe serem reconhecidos, a partir dessa data, alguns direitos laborais (como o direito a receber uma remuneração base, os subsídios de férias e de natal, direito a férias retribuídas, direito ao dia de descanso semanal facultativo, direito a uma carga horária semanal máxima de 40 horas, direito a seguro de acidentes de trabalho), direitos que a prestação de serviços, pela sua própria natureza de vínculo precário, não lhes conferia. As características essenciais do modo da prestação de trabalho mantiveram-se inalteradas: ocupam o posto de trabalho que sempre ocuparam, desempenham, ao abrigo do contrato de trabalho, as mesmas funções que desempenhavam ao abrigo da prestação de serviço, o seu local de trabalho e horário de trabalho permanecem os mesmos, os materiais necessários para a execução de funções continuam a ser facultados pela S., usam a mesma farda e registam a assiduidade como sempre fizeram, prestam contas do trabalho à mesma chefia como sempre prestaram. Perante a factualidade descrita, verificam-se vários indícios, que reproduzem elementos do modelo típico do trabalho subordinado, e que comprovam a existência de uma relação laboral (relação com subordinação jurídica) entre os “prestadores” enfermeiros e a entidade empregadora averiguada: os trabalhadores têm local de trabalho (as instalações da S.), horário de trabalho (em regime de turnos ou horário fixo), ocupam um posto de trabalho (são recursos indispensáveis para assegurar o regular funcionamento dos serviços disponibilizados pela S. aos seus clientes; desempenham funções idênticas às funções dos enfermeiros abrangidos por contrato de trabalho), estão inseridos na estrutura hierárquica da empresa (havendo, inclusivamente, alguns prestadores a desempenharem cargos de chefia), utilizam os materiais e os meios disponibilizados pela S. e não materiais próprios na execução da sua atividade, utilizam farda da S., registam a assiduidade, auferem uma remuneração periódica mensal como contrapartida do seu trabalho, variável em função do número de horas de trabalho e não em função de uma tarefa ou de um resultado. Existe, portanto, prova bastante no processo de averiguações para considerar que os prestadores de serviços que desempenham funções de enfermagem na entidade empregadora em averiguação não são de todo prestadores de serviços, isto é, não são trabalhadores por conta própria, mas sim trabalhadores subordinados/por conta de outrem da S.. Conclui-se, assim, que, não obstante i) se encontrarem inscritos como trabalhadores independentes na Autoridade Tributária e Aduaneira; ii) emitirem faturas-recibo (“recibos verdes”) periodicamente à EE como quitação das quantias recebidas, simulando a existência de relações jurídicas de prestação de serviços, a verdade é que os alegados prestadores de serviços de enfermagem prestam trabalho na EE com características de trabalho subordinado (trabalho por conta de outrem). Assim, os mencionados trabalhadores deviam estar, e não estão, enquadrados no regime de proteção social dos trabalhadores por conta de outrem (TCP) e as suas remunerações deviam ser objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. bb) Os prestadores de serviços de fisioterapia Os prestadores de serviços de fisioterapia desempenham funções de reabilitação de funções motoras dos clientes da S., sendo a S. a entidade que fatura os serviços prestados aos clientes. Os prestadores de serviços de fisioterapia executam a sua atividade nas instalações da S., mais concretamente no Centro Diagnóstico e Tratamento Integrado (...), na Rua (...), em Coimbra. Estes profissionais desempenham as suas funções na S. inseridos numa estrutura hierárquica, prestando contas do seu trabalho perante a coordenadora do Centro de Medicina Física e de Reabilitação (...) e cumprindo orientações, indicações e os horários estipulados pela chefia. Os prestadores de serviços de fisioterapia estão adstritos ao cumprimento de um horário de trabalho, trabalhando por turnos, de duração variável, de segunda a sexta- feira, folgando aos fins de semana e feriados. Os prestadores de serviços de fisioterapia asseguram o regular funcionamento, incluindo abertura e encerramento diários, do serviço de fisioterapia da S., estando adstritos ao cumprimento de um dever de permanência na Clínica que não se coaduna com a essência de uma relação jurídica de prestação de serviços. Os materiais e os meios operacionais (correntes analgésicas, parafango, calor húmido, toalhas, etc.) que os prestadores de serviços utilizam na execução das suas funções são integralmente fornecidos pela S.. Acresce ainda que os prestadores de serviços em causa auferem, como contrapartida do trabalho prestado, uma remuneração por cada hora de trabalho (no valor aproximado de €6,00 por hora), pelo que a sua remuneração mensal é variável em função do número de horas de trabalho. Ou seja, estes profissionais auferem uma remuneração periódica mensal em função do tempo de trabalho despendido, e não em função de um determinado resultado ou por tarefa. Desempenham as suas funções fardados com calça e túnica da S., têm um número de funcionário atribuído e registam a assiduidade. Estão obrigados a comunicar prévia e atempadamente o gozo de férias e eventuais ausências. Estes trabalhadores têm direito a gozar férias, embora a S. não os obrigue a gozar um número mínimo de dias por ano, sendo que, no período do gozo das férias, não são remunerados. Estes profissionais prestam exatamente o mesmo trabalho e executam-no da mesma forma que os fisioterapeutas com quem a S. tem contrato de trabalho, que têm um vínculo laboral não com a EE objeto de averiguação, mas com uma outra empresa do “grupo”, a empresa Centro de Medicina Física e Reabilitação (...), Lda. (NISS (…)). Assim, temos profissionais a desempenharem precisamente as mesmas funções, com idênticas características quanto ao modo de prestação de trabalho, mas com vínculos distintos: uns com contrato de trabalho, outros em regime de prestação de serviços. - conforme informação disponível em SISS/IDQ e declarações prestadas pelos trabalhadores. Mais. As fisioterapeutas C. e L., anteriormente em regime de prestação de serviços, passaram, em 2015, a trabalhadoras subordinadas, respetivamente, da entidade empregadora Centro de Medicina Física e Reabilitação (...), Lda. e da entidade empregadora S. - S.A., aqui averiguada. Portanto, o “grupo” celebrou contratos de trabalho com estas profissionais e integrou-as nos seus quadros de pessoal, reconhecendo, por esta via, que a alegada “prestação de serviços” executada por estas profissionais correspondia a um posto de trabalho e que a sua atividade evidenciava características típicas de trabalho subordinado. As prestadoras de serviços passaram, em 2015, a trabalhadoras subordinadas da entidade empregadora, sem que houvesse modificação substancial das características do modo da prestação de trabalho, havendo apenas uma melhoria das suas condições de trabalho por lhe serem reconhecidos, a partir dessa data, alguns direitos laborais (como o direito a receber uma remuneração base, os subsídios de férias e de natal, direito a férias retribuídas, direito a uma carga horária semanal máxima de 40 horas), direitos que a prestação de serviços, pela sua própria natureza de vínculo precário, não lhes conferia. As características essenciais do modo da prestação de trabalho mantiveram-se inalteradas: ocupam o posto de trabalho que sempre ocuparam, desempenham, ao abrigo do contrato de trabalho, as mesmas funções que desempenhavam ao abrigo da prestação de serviço, o seu local de trabalho e horário de trabalho permanecem os mesmos, os materiais necessários para a execução de funções continuam a ser facultados pela S., usam a mesma farda e registam a assiduidade como sempre fizeram, prestam contas do trabalho à mesma chefia como sempre prestaram. Perante a factualidade descrita, verificam-se vários indícios, que reproduzem elementos do modelo típico do trabalho subordinado, e que comprovam a existência de uma relação laboral (relação com subordinação jurídica) entre os “prestadores de serviços” de fisioterapia e a entidade empregadora averiguada: os trabalhadores têm local de trabalho (as instalações da S.), horário de trabalho (em regime de turnos), ocupam um posto de trabalho (são recursos indispensáveis para assegurar o regular funcionamento do serviço de fisioterapia disponibilizado pela S. aos seus clientes; desempenham funções idênticas às funções dos fisioterapeutas abrangidos por contrato de trabalho), estão inseridos na estrutura hierárquica da empresa, utilizam os materiais e os meios disponibilizados pela S. e não materiais próprios na execução da sua atividade, utilizam farda da S., registam a assiduidade, auferem uma remuneração periódica mensal como contrapartida do seu trabalho, variável em função do número de horas de trabalho e não em função de uma tarefa ou de um resultado. Existe, portanto, prova bastante no processo de averiguações para considerar que os prestadores de serviços que desempenham funções de fisioterapia na entidade empregadora em averiguação não são de todo prestadores de serviços, isto é, não são trabalhadores por conta própria, mas sim trabalhadores subordinados/por conta de outrem da S. (alguns apenas a tempo parcial). Conclui-se, assim, que, não obstante i) se encontrarem inscritos como trabalhadores independentes na Autoridade Tributária e Aduaneira; ii) emitirem faturas-recibo (“recibos verdes”) periodicamente à EE como quitação das quantias recebidas, simulando a existência de relações jurídicas de prestação de serviços, a verdade é que os alegados prestadores de serviços de fisioterapia prestam trabalho na EE com características de trabalho subordinado (trabalho por conta de outrem). Assim, os mencionados trabalhadores deviam estar, e não estão, enquadrados no regime de proteção social dos trabalhadores por conta de outrem (TCP) e as suas remunerações deviam ser objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. bc) Os prestadores de serviços de radiologia Os prestadores de serviços de radiologia desempenham funções como técnicos de radiologia perante os clientes da S., sendo a S. a entidade que fatura os serviços prestados ao cliente. Tais prestadores executam a sua atividade nas instalações da S., mais concretamente no serviço de Imagiologia, localizado nas instalações da Clínica (...), na Avenida (…). Estes profissionais desempenham as suas funções na S. inseridos numa estrutura hierárquica, prestando contas do seu trabalho perante o coordenador do pessoal do serviço de Imagiologia, T., e cumprindo orientações, indicações e os horários estipulados pela chefia. Os prestadores de serviços de fisioterapia estão adstritos ao cumprimento de um horário de trabalho, trabalhando por turnos, de segunda a sexta-feira, folgando aos fins- de-semana e feriados. Eles asseguram o regular funcionamento do serviço de Imagiologia da S., que funciona das 08h00 às 20h00, de segunda a sexta-feira, estando adstritos ao cumprimento de um dever de permanência na Clínica que não se coaduna com a essência de uma relação jurídica de prestação de serviços. Os materiais e os meios operacionais (maquinaria, películas, CDs, etc.) que os prestadores de serviços utilizam na execução das suas funções são integralmente fornecidos pela S.. Acresce ainda que os prestadores de serviços em causa auferem, como contrapartida do trabalho prestado, uma remuneração por cada hora de trabalho (no valor aproximado de €7,00 por hora), pelo que a sua remuneração mensal é variável em função do número de horas de trabalho. Ou seja, estes profissionais auferem uma remuneração periódica mensal em função do tempo de trabalho despendido, e não em função de um determinado resultado ou por tarefa. Desempenham as suas funções fardados com bata da S. e registam a assiduidade em folhas de ponto. Estão obrigados a comunicar prévia e atempadamente o gozo de férias e eventuais ausências. Estes trabalhadores têm direito a gozar férias, embora a S. não os obrigue a gozar um número mínimo de dias por ano, sendo que, no período do gozo das férias, não são remunerados. Acresce ainda que as técnicas de radiologia A. e P. anteriormente em regime de prestação de serviços, passaram, em 2014, a trabalhadoras subordinadas da S.. Portanto, a S. celebrou contratos de trabalho com estas profissionais e integrou-as no seu quadro de pessoal, reconhecendo, por esta via, que a alegada “prestação de serviços” executada por estas profissionais correspondia a um posto de trabalho e que a sua atividade evidenciava características típicas de trabalho subordinado. Perante a factualidade descrita, verificam-se vários indícios, que reproduzem elementos do modelo típico do trabalho subordinado, e que comprovam a existência de uma relação laboral (relação com subordinação jurídica) entre os “prestadores” técnicos de radiologia e a entidade empregadora averiguada: os trabalhadores têm local de trabalho (as instalações da S.), horário de trabalho (em regime de turnos), ocupam um posto de trabalho (são recursos indispensáveis para assegurar o regular funcionamento do serviço de Imagiologia da S.; desempenham funções idênticas às funções dos técnicos de radiologia entretanto abrangidos por contrato de trabalho), estão inseridos n a estrutura hierárquica da empresa, utilizam os materiais e os meios disponibilizados pela S. e não materiais próprios na execução da sua atividade, utilizam farda da S., registam a assiduidade, auferem uma remuneração periódica mensal como contrapartida do seu trabalho, variável em função do número de horas de trabalho e não em função de uma tarefa ou de um resultado. Existe, portanto, prova bastante no processo de averiguações para considerar que os prestadores de serviços que desempenham funções como técnicos de radiologia na entidade empregadora em averiguação não são de todo prestadores de serviços, isto é, não são trabalhadores por conta própria, mas sim trabalhadores subordinados/por conta de outrem da S. (alguns apenas a tempo parcial). Conclui-se, assim, que, não obstante i) se encontrarem inscritos como trabalhadores independentes na Autoridade Tributária e Aduaneira; ii) emitirem faturas-recibo (“recibos verdes”) periodicamente à EE como quitação das quantias recebidas, simulando a existência de relações jurídicas de prestação de serviços, a verdade é que os alegados prestadores de serviços de radiologia prestam trabalho na EE com características de trabalho subordinado (trabalho por conta de outrem). Assim, os mencionados trabalhadores deviam estar, e não estão, enquadrados no regime de proteção social dos trabalhadores por conta de outrem (TCP) e as suas remunerações deviam ser objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. (...) VI. Conclusões Com o presente processo de averiguações, concluiu-se que: A entidade empregadora em averiguação paga aos seus trabalhadores, desde o ano de 2010, de forma reiterada e ininterrupta, com periodicidade anual, uma quantia que denomina de “gratificação do balanço”, sem que tal distribuição de resultados se encontre consignada nas atas societárias de aprovação de contas e de deliberação da distribuição de resultados pelos trabalhadores. As “gratificações” são concedidas de acordo com o procedimento e os critérios constantes do Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho dos Trabalhadores do Grupo S. Medicina, que, aliás, denomina esta “gratificação” de prémio, sendo atribuídas desde que verificados dois critérios objetivos e gerais, que são do conhecimento prévio dos trabalhadores: i) um resultado líquido positivo do exercício superior ao do exercício anterior; e ii) uma avaliação positiva do trabalhador de acordo com os parâmetros fixados no regulamento. Verificando-se as duas condições cumulativas previstas no regulamento interno do grupo, o trabalhador tem não só a expetativa, mas o adquire o direito a receber o prémio, cujo montante corresponderá a uma percentagem do vencimento base do trabalhador (e não a uma percentagem do resultado do exercício a distribuir). Assim, a atribuição das denominadas “gratificações” está diretamente relacionada com o desempenho individual e particular de cada trabalhador (e não com metas da empresa ou do grupo), pelo que, do ponto de vista substancial ou material, esta prestação pecuniária é, na sua essência, um prémio de desempenho do trabalhador. Face ao exposto, conclui-se que estamos perante gratificações do balanço descaracterizadas, que, no fundo, mais não são do que prémios de desempenho, pagos pela entidade empregadora aos seus trabalhadores, segundo critérios objetivos e gerais pré-determinados, de forma ininterrupta e com inequívoco caráter de regularidade, pelo que tais montantes constituem base de incidência contributiva para efeitos de segurança social, conforme previsto no n.º 2, alínea d) e n.º 5 do artigo 46.º do Código dos Regimes Contributivos. Por esta via, a entidade empregadora não declarou à Segurança Social, no período de 2013 a 2016, remunerações no valor de €569.319,61, que correspondem à omissão de contribuições devidas no montante de €197.838,57 (€97.788,24 em 2013, €32.084,46 em 2014, €64.964,34 em 2015 e €3.001,53 em 2016). Relativamente aos prestadores de serviço de enfermagem, fisioterapia e radiologia, verificam-se vários indícios, que reproduzem elementos do modelo típico do trabalho subordinado, e que comprovam a existência de uma relação laboral (relação com subordinação jurídica) entre estes “prestadores” e a entidade empregadora averiguada: os trabalhadores têm local de trabalho (as instalações da S.), horário de trabalho (em regime de turnos ou horário fixo), ocupam um posto de trabalho (são recursos indispensáveis para assegurar o regular funcionamento dos serviços disponibilizados pela S. aos seus clientes; desempenham funções idênticas a profissionais abrangidos por contrato de trabalho), estão inseridos na estrutura hierárquica da empresa (havendo, inclusivamente, alguns prestadores a desempenharem cargos de chefia), utilizam os materiais e os meios disponibilizados pela S. e não materiais próprios na execução da sua atividade, utilizam farda da S., registam a assiduidade, auferem uma remuneração periódica mensal como contrapartida do seu trabalho, variável em função do número de horas de trabalho e não em função de uma tarefa ou de um resultado. Existe, portanto, prova bastante no processo de averiguações para considerar que os prestadores de serviços de enfermagem, fisioterapia e radiologia, que desempenham funções na S. não são de todo prestadores de serviços, isto é, não são trabalhadores por conta própria, mas sim trabalhadores subordinados/por conta de outrem da S., a tempo completo ou parcial. Conclui-se, assim, que, não obstante i) se encontrarem inscritos como trabalhadores independentes na Autoridade Tributária e Aduaneira; ii) emitirem faturas-recibo (“recibos verdes”) periodicamente à EE como quitação das quantias recebidas, simulando a existência de relações jurídicas de prestação de serviços, a verdade é que os alegados prestadores de serviços prestam trabalho na averiguada com características de trabalho subordinado (trabalho por conta de outrem). Assim, os mencionados trabalhadores, melhor identificados nos mapas de apuramento anexos, deviam estar, e não estão, enquadrados no regime de proteção social dos trabalhadores por conta de outrem (TCO) e as suas remunerações deviam ser objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. Por esta via, a entidade empregadora não declarou à Segurança Social, no período de 2013 a 2016, remunerações no valor de €3.149.531,90 (€176.880,57 em prestações de serviços de radiologia, €152.309,07 em prestações de serviços de fisioterapia, €2.820.342,26 em prestações de serviços de enfermagem), que correspondem à omissão de contribuições devidas no montante de €1.094.462,33 (€61.466,00 em prestações de serviços de radiologia, €52.927,40 em prestações de serviços de fisioterapia, €980.068,93 em prestações de serviços de enfermagem). VII. Propostas Face ao exposto, com o presente processo de averiguações, concluiu-se pela existência de remunerações não declaradas à Segurança Social que correspondem à omissão de contribuições devidas no montante total de €1.292.300,90, conforme mapas de apuramento que seguem em anexo ao presente projeto de relatório. Face ao valor de contribuições apurado e às conclusões descritas neste relatório, propõe-se que se proceda ao envio de cópia do presente relatório e dos mapas de apuramento anexos, para que a EE interessada se pronuncie, por escrito, em sede de audiência prévia, nos termos dos artigos 121.º e seguintes do Código de Procedimento Administrativo. (...)” - cfr. Projeto de Relatório de fls. 376 e ss. do p.a. apenso; 12. Do Projeto a que aludimos no ponto antecedente foi dado conhecimento à Impugnante através de Ofício de 27/02/2017 - cfr. Ofício e respetivo A.R. de fls. 416 e 417 do p.a. apenso; 13. A Impugnante pronunciou-se relativamente ao apontado Projeto através do requerimento de fls. 427 e ss. do p.a. apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 14. Em 19/04/2017 foi elaborado o Relatório Final referente ao processo de averiguações mencionado em 2, onde consta, além do mencionado no ponto 8, o seguinte: “(...) V- Da realização da audiência de interessados e da apreciação da pronúncia da entidade empregadora Em 27/02/2017 procedeu-se ao envio, para a sede social da EE averiguada, de notificação escrita, nos termos dos artigos 121.º e ss. do Código de Procedimento Administrativo (CPA) e 39 º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), para que a entidade averiguada se pronunciasse, em sede de audiência de interessados, e no prazo de 10 dias úteis, sobre a intenção deste serviço em proceder à elaboração oficiosa das declarações de remunerações em falta e consequente liquidação oficiosa de contribuições. A referida notificação foi rececionada pela EE em 01/03/2017, como evidencia o aviso de receção junto ao presente processo. A 08/03/2017 a EE requereu prorrogação de prazo, por mais 10 dias úteis, para apresentação da sua pronúncia em sede de audiência de interessados, que foi deferida, beneficiando a entidade de 20 dias úteis para resposta, contados da receção da notificação, que ocorreu a 01/03/2017. A EE, devidamente notificada da audiência de interessados, exerceu o seu direito de audição tempestivamente, em 29/03/2017, apresentando resposta à audiência escrita de interessados, que cumpre, agora, apreciar. Ora, a entidade averiguada, na sua resposta à audiência de interessados, argumenta que: a) O serviço de fiscalização do Instituto de Segurança Social, I.P. (ISS, I.P.) não tem legitimidade para qualificar relações contratuais como trabalho subordinado, matéria que é da competência exclusiva dos Tribunais, pelo que o ato administrativo de liquidação de contribuições é nulo, nos termos do artigo 161.º, n.º 2, alínea a) do CPA, por ter sido praticado com usurpação de funções. Concretizando este argumento, a EE averiguada invoca que: i) A qualificação de determinada relação contratual como de trabalho subordinado ou autónomo é da exclusiva competência dos Juízos de Trabalho, não sendo da competência do ISS, I.P., nem dos Tribunais Administrativos e Fiscais em última instância, a qualificação de determinada relação contratual, daí retirando consequências jurídicas; ii) A verificação do correto enquadramento em regime contributivo dos trabalhadores pressupõe a definição da relação jurídica subjacente, qualificação essa que não cabe ao ISS, I.P. fazer, mas sim aos Juízos de Trabalho, cingindo- se o ISS, I.P. a reconhecer o enquadramento em regime contributivo na sequência da sentença judicial proferida em juízo, tal como prevê o artigo 256.º, n.º 1, alínea d) do Código dos Regimes Contributivos; iii) Os procedimentos pertinentes em caso de utilização indevida ou abusiva do contrato de prestação de serviços inserem-se no âmbito das atribuições da Autoridade para as Condições do Trabalho (e não do ISS, I.P.), que é a entidade estadual exclusivamente competente para participar factos relevantes ao Ministério Público, tendo em vista a instauração da Ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, segundo o disposto no artigo 15.º-A da Lei n.º 107/2009 de 14 de setembro. b) O ato administrativo de liquidação oficiosa de contribuições, perspetivado no projeto de relatório, não tem suficiente fundamentação de facto, sendo, por isso, nulo por violação do artigo 152.º do CPA e também inconstitucional por violação do artigo 268.º, n.º 3 da CRP, dado que “a partir de uma amostragem de uma dezena de situações, conclui pela existência de mais de uma centena de relações contratuais de trabalho subordinado”, não demonstrando, individualmente, para cada prestador de serviços, a verificação dos indícios de laboralidade previstos no artigo 12.º do Código do Trabalho; c) Relativamente às Gratificações do Balanço, estas não integram a base de incidência contributiva para efeitos de segurança social, nos termos do artigo 46.º, n.º 2, alínea d) do Código dos Regimes Contributivos, visto que: i) As Gratificações do Balanço não foram processadas com regularidade, nos termos definidos no artigo 47.º do Código dos Regimes Contributivos, dado que não é verdade que o seu pagamento tenha sido realizado de forma reiterada e ininterrupta desde 2010 até 2016, dado que, em 2015 e em 2016, não houve qualquer pagamento de gratificações; ii) A atribuição das gratificações está suportada por documentação societária: as atas da Assembleia Geral de acionistas da sociedade mãe, a S. SGPS, Lda.; iii) Nos termos do Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho dos Trabalhadores do Grupo S. Medicina, a atribuição das gratificações, em resultado da avaliação do trabalhador, depende exclusivamente do poder discricionário da “S.”, não podendo as gratificações ser consideradas, na sua substância, prémios a que o trabalhador tem direito em resultado da sua avaliação positiva de desempenho; iv) As gratificações não integram a noção de retribuição do trabalhador, pelo que não deverão integrar a base de incidência contributiva para efeitos de liquidação de contribuições. d) No que diz respeito aos Trabalhadores Independentes, a EE alega que: i) As atividades em causa (fisioterapia, enfermagem, radiologia) podem ser desenvolvidas quer sob um contrato de trabalho, quer através de um contrato de prestação de serviços, podendo existir na mesma estrutura colaboradores que desenvolvem a sua atividade através de um contrato de trabalho e outros através de prestação de serviços; ii) Não se deveria ter indagado os indícios de subordinação jurídica contemplados no artigo 12.º do Código do Trabalho, como o tipo de remuneração, a propriedade dos meios de trabalho, o local de trabalho, o fardamento do pessoal, os horários de trabalho vertidos nas escalas de turnos, a existência de uma estrutura hierárquica ou de registos de assiduidade, pois nenhum destes indicadores é determinante para a definição do tipo contratual em causa, mas dever-se-ia indagar se tais profissionais estão sujeitos a subordinação jurídica, isto é, a ordens e indicações da “S.”, para se concluir que os mesmos não estão, não sendo a “S.” quem determina ou ordena quando é que o colaborador presta os serviços, sendo aqueles prestados em função das disponibilidades manifestadas pelos profissionais; iii) No que se refere aos técnicos de fisioterapia e de radiologia, exigir que os mesmos auferissem uma remuneração em “função de um determinado resultado ou tarefa” significaria que aqueles técnicos tinham de se obrigar a assegurar a recuperação do doente, o que não faz qualquer sentido. Em primeiro lugar, a entidade averiguada alega, na resposta à audiência, que o serviço de fiscalização do Instituto de Segurança Social, I.P. não tem legitimidade para qualificar relações contratuais como trabalho subordinado, matéria que é da competência exclusiva dos Tribunais, pelo que o ato administrativo de liquidação de contribuições perspetivado é nulo, nos termos do artigo 161º, n.º 2, alínea a) do CPA, por ter sido praticado com usurpação de funções. No projeto de relatório elaborado, o serviço de fiscalização da segurança social faz um juízo, instrumental ou acessório, sobre a existência de uma relação laboral entre as partes, tendo em vista o correto enquadramento do trabalhador em regime de proteção social e inerente apuramento contributivo, pelas características fáticas, concretas e reais, de prestação do trabalho, socorrendo-se dos parâmetros do artigo 12.º do Código do Trabalho para aferir se tal relação fática é uma relação de trabalho subordinado e, como tal, enquadrável no regime contributivo dos Trabalhadores por Conta de Outrem. O serviço de fiscalização da segurança social não toma uma decisão sobre a qualificação da relação contratual, não formula um juízo, a título principal; sobre essa relação jurídica, daí retirando consequências jurídicas para as partes, trabalhador e empregador. Por isso, não viola qualquer princípio de reserva jurisdicional, nem usurpa qualquer competência, porque a decisão final do processo de averiguações consubstancia um ato administrativo de liquidação adicional de contribuições e não uma declaração de reconhecimento da existência de contrato de trabalho. Assim, o serviço de fiscalização do Instituto de Segurança Social, I.P. não invalida a documentação produzida pelas partes (não declara a invalidade de inscrições como trabalhador independente na Autoridade Tributária, não declara a invalidade de faturas- recibo emitidas, não declara a invalidade de eventuais contratos de prestação de serviços escritos), nem cria obrigações para as partes decorrentes dessa qualificação (não reconhece direitos a créditos laborais, não reconhece deveres indemnizatórios de uma parte para com a outra, etc.), pois não lhe compete zelar pelos direitos civis ou laborais das partes contratantes envolvidas, mas apenas pelo direito, de todos, à segurança social. Refere a EE averiguada que a verificação do correto enquadramento em regime contributivo dos trabalhadores pressupõe a definição da relação jurídica subjacente, qualificação essa que não cabe ao ISS, I.P. fazer, mas sim aos Juízos de Trabalho, cingindo-se o ISS, I.P. a reconhecer o enquadramento em regime contributivo na sequência da sentença judicial laboral proferida em juízo, tal como prevê o artigo 256.º, n.º 1, alínea d) do Código dos Regimes Contributivos. O artigo 256.º, invocado pela averiguada, insere-se no âmbito do regime jurídico do pagamento voluntário de contribuições prescritas, consagrado nos artigos 254.º a 260.º do Código dos Regimes Contributivos, mediante o qual o beneficiário apresenta requerimento para pagamento voluntário de contribuições prescritas ao competente Centro Distrital do Instituto de Segurança Social, I.P., instruindo o seu requerimento com um dos meios de prova previstos no artigo 256.º, n.º 1 do mencionado Código, nomeadamente Certidão de sentença do Tribunal de Trabalho, na sequência de ação judicial intentada contra a entidade empregadora e a instituição de segurança social para reconhecimento da relação de trabalho, respetivo período e remuneração auferida. Sucede que, como resulta do teor do próprio artigo 256.º do Código dos Regimes Contributivos, o juízo instrumental acerca da prestação de trabalho subordinado não tem de ser feito, necessariamente, a partir de uma sentença judicial (do foro laboral) que reconheça a relação de trabalho, pois este é apenas um dos meios de prova admitidos para permitir o pagamento voluntário de contribuições prescritas. Esse juízo instrumental, com repercussões em termos de enquadramento em regime de proteção social e em termos de obrigação contributiva, pode ser feito a partir de Duplicados das declarações para efeitos fiscais, devidamente autenticadas pelos serviços fiscais (artigo 256.º, n.º 1, alínea a) do Código) ou a partir da Cópia autenticada dos mapas de pessoal, desde que tempestivamente apresentados aos serviços oficiais competentes (artigo 256.º, n.º 1, alínea b) do Código), resultando inequivocamente do preceito legal que os meios de prova, subjacentes à decisão administrativa de enquadramento em regime contributivo e de liquidação de contribuições prescritas, não se restringem à sentença laboral, como a EE quer fazer crer. Note-se que este regime, consagrado nos artigos 254.º a 260.º do Código dos Regimes Contributivos, cinge-se à obrigação contributiva prescrita. Além deste, existe um outro regime jurídico no ordenamento jurídico da segurança social, o da liquidação oficiosa de contribuições (não afetadas pelo decurso do tempo e, como tal, ainda exigíveis), que consta dos artigos 8.º, n.º 2, al. b) da Portaria n.º 135/2012 de 8 maio e 40.º, n.º 3 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, e que parte também de um juízo instrumental acerca das características da prestação de trabalho, assente em prova idónea (prova documental, prova testemunhal, etc.) produzida em sede de processo de averiguações ou obtida em articulação com outros organismos do Estado, e que culmina com a decisão administrativa de enquadramento em regime contributivo e de liquidação oficiosa de contribuições. Portanto, a sentença laboral não constitui o único meio de prova em que o ISS, I.P. se pode basear para aferir as características da prestação de trabalho tendo em vista proferir uma decisão administrativa sobre se tal prestação de trabalho se subsume ao correto regime de proteção social do sistema obrigatório de segurança social. Alega ainda a EE que os procedimentos pertinentes em caso de utilização indevida ou abusiva do contrato de prestação de serviços inserem-se no âmbito das atribuições da Autoridade para as Condições do Trabalho (e não do ISS, I.P.), que é a entidade estadual exclusivamente competente para participar factos relevantes ao Ministério Público, tendo em vista a instauração da Ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, segundo o disposto no artigo 15.º-A da Lei n.º 107/2009 de 14 de setembro. Cumpre esclarecer que o ISS, I.P. não se debruçou sobre a utilização indevida ou abusiva do contrato de prestação de serviços, para daí retirar consequências jurídicas para as partes envolvidas no âmbito da sua relação contratual, matéria que se insere nas atribuições da Autoridade para as Condições do Trabalho, do Ministério Público e, a final, do juiz do foro laboral. Reitera-se que a consideração, formulada por este serviço, da relação entre as partes como uma relação laboral é uma consideração instrumental para efeitos de enquadramento do trabalhador no regime contributivo dos Trabalhadores por Conta de Outrem e consequente liquidação oficiosa de tributos (contribuições) à entidade empregadora. 0 Instituto de Segurança Social, I.P., entidade de natureza administrativa, não profere uma decisão sobre a natureza da relação profissional entre as partes, mas aprecia as características da sua relação profissional para extrair consequências, a título principal, ao nível do sistema de segurança social, proferindo, isso sim, um ato administrativo de enquadramento e um ato administrativo de liquidação oficiosa de contribuições (tributo), atos que podem ser impugnados judicialmente junto dos competentes Tribunais Administrativos e Fiscais. Estamos, portanto, no domínio das relações jurídico-administrativas de vinculação e de contribuição do sistema previdencial obrigatório de segurança social português, relações estabelecidas entre entidades empregadoras contribuintes e a administração estadual de Segurança Social, relações cuja fiscalização compete, na verdade, ao ISS, 1 P- (artigo 8.º, n.º 2, al. b) da Portaria 135/2012 de 8 maio), e não no domínio da apreciação da qualificação das relações contratuais ou relações jurídico-privadas. *Em segundo lugar, a EE argumenta que o ato administrativo de liquidação oficiosa de contribuições, perspetivado no projeto de relatório, não tem suficiente fundamentação de facto, sendo, por isso, nulo por violação do artigo 152.º do CPA e também inconstitucional por violação do artigo 268.º, n.º 3 da CRP, dado que “a partir de uma amostragem de uma dezena de situações, conclui pela existência de mais de uma centena de relações contratuais de trabalho subordinado”, não demonstrando, individualmente, para cada prestador de serviços, a verificação dos índices de laboralidade previstos no artigo 12.º do Código do Trabalho. Não assiste razão à entidade empregadora. De facto, foram inquiridos, por amostragem, alguns profissionais de saúde (enfermeiros, fisioterapeutas, técnicos de radiologia). Sucede que essa amostragem não foi selecionada de forma aleatória. Ao invés, trata-se de uma amostragem representativa do modo de execução do trabalho dos enfermeiros, dos fisioterapeutas e dos técnicos de radiologia em cada um dos serviços da “S.”, a saber: no Serviço de Fisioterapia; no Serviço de Imagiologia; no Serviço de Enfermagem e, dentro deste, especificamente, nos vários serviços de enfermagem que a “S.” disponibiliza: Serviço de Atendimento Permanente; Serviço de Consultas Externas (Centro de Atendimento Clínico); Diálise, Internamento de doentes; Cirurgia (bloco operatório); Serviço de esterilização de material de cirurgia (apoio à cirurgia); Serviço de Endoscopia/Gastroenterologia. Sendo as condições de trabalho dos profissionais de saúde afetos a um determinado serviço da “S.” comuns aos vários profissionais (como ficou demonstrado pelas declarações dos profissionais inquiridos), bastou inquirir uma amostra representativa das características de prestação de trabalho em cada um dos serviços da “S.”. Por outro lado, a generalização da amostragem é feita no final de cada Auto de declarações, quando o prestador de serviços inquirido, depois de prestar declarações sobre as características da sua própria prestação de trabalho, declara que essas características são transversais aos colegas de trabalho adstritos ao mesmo serviço, concretizando que os colegas de trabalho afetos ao mesmo serviço desempenham as mesmas funções que o declarante, usam a mesma farda que o declarante, no mesmo local de trabalho que o declarante, sob o mesmo regime horário que o declarante, obedecem a ordens e indicações do mesmo superior hierárquico, registam a assiduidade tal como o declarante, utilizam os mesmos meios e materiais facultados pela “S.”, tal como o declarante, recebem uma remuneração mensal, tal como o declarante. A identificação dos concretos colegas de trabalho afetos a cada serviço, que prestam trabalho com as mesmas características que os declarantes, resulta, por sua vez, das listagens dos profissionais e respetivo serviço facultadas pela entidade empregadora (que, aliás, foi lida em voz alta aos inquiridos, que a confirmaram) e, por isso, só relativamente aos profissionais discriminados nas listagens, foram retiradas conclusões sobre o modo de prestação de trabalho e consequências em termos de enquadramento e apuramento contributivo. Portanto, ainda que tenham sido inquiridos apenas alguns prestadores de serviços, a prova produzida na averiguação não diz respeito apenas aos inquiridos, mas a todos os profissionais de saúde, constantes das listagens de profissionais e respetivo serviço, facultadas pela entidade. Assim, não se verifica qualquer insuficiência na fundamentação de facto do ato, na medida em que os vários indícios de laboralidade foram demonstrados relativamente a todos os profissionais (identificados nas listagens) que desempenham funções nos serviços de Fisioterapia, Imagiologia e Enfermagem da “S.”. Sendo as funções e as características de prestação de trabalho idênticas ou comuns aos vários trabalhadores dentro de cada serviço, desnecessário se torna inquirir e descrever as condições relativamente a cada um deles. *O terceiro argumento prende-se com as Gratificações do Balanço. Refere a EE que as gratificações não integram a base de incidência contributiva para efeitos de segurança social, nos termos do artigo 46 º, n.º 2, alínea d) do Código dos Regimes Contributivos, desde logo porque não foram processadas com regularidade, nos termos definidos no artigo 47.º do Código dos Regimes Contributivos, dado que não é verdade que o seu pagamento tenha sido realizado de forma reiterada e ininterrupta desde 2010 até 2016, dado que, em 2015 e em 2016, não houve qualquer pagamento de contribuições. Da análise dos mapas de processamento salarial, facultados pela entidade empregadora, resulta que a entidade empregadora pagou aos trabalhadores, a título de gratificações de balanço: no ano de 2012, no mês de agosto, €297.890,00, no ano de 2013, nos meses de julho e dezembro, €281.405,00, no ano de 2014, no mês de dezembro, €92.329,38, no ano de 2015, nos meses de fevereiro e dezembro, €186.947,73, e no ano de 2016, nos meses de fevereiro e março, €8.637,50, quantias que não foram objeto de incidência contributiva para efeitos de segurança social. Acresce ainda que, segundo os esclarecimentos, prestados por escrito a 12 de janeiro de 2017, a entidade empregadora em averiguação também procedeu ao pagamento de gratificações do balanço aos seus colaboradores nos anos de 2010 e 2011, pelo que se conclui que o pagamento desta gratificação tem sido realizado de forma reiterada e ininterrupta, desde o ano de 2010 até, pelo menos, ao ano de 2016, assumindo uma periodicidade anual. Ainda que assim não fosse, não subsiste qualquer dúvida quanto à regularidade da prestação, até porque, como refere Albano Santos, anotação ao artigo 47º do Código, em Adenda ao Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social Anotado, Vida Económica (2013), a lei preceitua que “que essa prestação é regular se a frequência da sua atribuição ocorrer num prazo igual ou inferior a cinco anos”, isto é, basta haver uma repetição de atribuição da prestação dentro dos cinco anos subsequentes. Citando o mencionado autor, “se o prémio atribuído em 2014, por força do cumprimento das metas traçadas pela empresa, volta a ser pago em 2018 (frequência inferior a cinco anos) já estamos perante um prémio que tem carácter de regularidade e que, por isso, entra na base de incidência contributiva. E se, por ventura, o prémio atribuído em 2014 não foi objeto de contribuições para a segurança social por, então, não ser regular, ao ser repetido em 2018 passou a ser regular, pelo que, em nosso entender, passarão a ser devidas as contribuições e quotizações respeitantes ao prémio atribuído em 2014 que, por força do atribuído em 2018, passou a ser regular.” Alega ainda a EE que a atribuição das gratificações se encontra suportada pela respetiva documentação societária, as atas da Assembleia Geral de acionistas da sociedade mãe, a S. SGPS, Lda., dado estarmos perante um grupo societário, sujeito à apresentação de contas consolidadas. A par com as contas consolidadas do grupo, feitas pela empresa mãe, que evidenciam o resultado líquido positivo (consolidado) do grupo, existem as contas individuais do exercício de cada sociedade integrante do grupo societário. Quer a sociedade mãe, quer as demais sociedades do grupo, podem deliberar a distribuição de resultados pelos trabalhadores. Sucede que as gratificações que estão a ser objeto de análise no presente processo de averiguações não são as concedidas pela sociedade mãe, S. SGPS, Lda., mas as concedidas pela sociedade S. - S.A., sendo que os valores em causa e o universo dos trabalhadores contemplados com as verbas nem sequer são coincidentes. Portanto, de modo algum, poderão as atas sociais da S. SGPS, Lda., constantes do processo de averiguações, servir de suporte às gratificações pagas pela sociedade anónima “S.” aos seus colaboradores. Invoca a EE que, nos termos do Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho dos Trabalhadores do Grupo S. Medicina, a atribuição das gratificações, em resultado da avaliação do trabalhador, depende exclusivamente do poder discricionário da S.”, não podendo as gratificações ser consideradas, na sua substância, prémios a que o trabalhador tem direito em resultado da sua avaliação positiva de desempenho. Refere a EE que a atribuição de gratificações aos trabalhadores é um poder discricionário da empresa, na medida em que a alínea d) do n.º 4 do artigo 5.º do Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho, regulamento interno aplicável à empresa, prevê que “O Conselho de Administração ou a Comissão Executiva podem introduzir descontos globais, ou individuais, por razões de tesouraria ou de política económico-financeira, nos valores dos prémios calculados (...), podendo mesmo deliberar a não atribuição global de prémios.” Ora, como já foi referido anteriormente, esta “cláusula de salvaguarda” pretende, alegadamente, contrariar a natureza de direito pré-estabelecido deste prémio de desempenho e incutir a ideia de que a sua concessão depende de um ato de vontade unilateral e discricionário da empresa, que tornaria a prestação sempre de concessão irregular e, por essa via, excluída de incidência contributiva para efeitos de segurança social. Todavia, os usos - o costume - da empresa, que têm a mesma relevância que o regulamento interno na delimitação das prestações que integram a base de incidência contributiva (vide n.º 1 do artigo 46.º do Código dos Regimes Contributivos), evidenciam que a “S.” nunca condicionou, unilateralmente, a atribuição dos prémios de desempenho aos seus colaboradores, que, desde 2010, são concedidos de forma reiterada, estável e periódica (com periodicidade anual). Ou seja, apesar de a entidade empregadora proclamar, no regulamento interno de 2014, que a decisão de conceder prémios aos trabalhadores é exclusivamente sua e depende da sua discricionariedade, a verdade é que os usos empresariais evidenciam que, desde que o trabalhador atinja a avaliação exigida, adquirirá o direito pré-estabelecido ao prémio, embora os efeitos do seu direito fiquem condicionados a factos futuros e incertos, os fatores “de tesouraria ou de política económico-financeira” da empresa (condição suspensiva de eficácia do direito). Os usos da empresa ditam que a “S.” nunca condicionou a atribuição de prémios a qualquer outro fator que não fosse a avaliação de desempenho positiva do trabalhador. Mas, ainda que assim fosse, o facto de a concessão do prémio de desempenho estar condicionada a fatores de tesouraria ou de política económica não afeta a natureza da prestação, pois “prémio” (seja de produtividade, de desempenho, de assiduidade ou outro) é a prestação diretamente relacionada com fatores pessoais do trabalhador, como o seu desempenho, a sua capacidade produtiva, a sua assiduidade, etc., pelo que o seu recebimento depende do esforço e do cumprimento de objetivos por parte do trabalhador, ainda que a empresa condicione o recebimento desse prémio ao cumprimento de determinadas metas da empresa ou ao resultado do exercício. Na verdade, o condicionamento do pagamento do prémio a fatores de tesouraria ou de política financeira da empresa não afeta nem a natureza da prestação, nem a regularidade da mesma, pois o artigo 47.º do Código dos Regimes Contributivos prevê que: “uma prestação reveste caráter de regularidade quando constitui direito do trabalhador, por se encontrar pré-estabelecida segundo critérios objetivos e gerais, ainda que condicionais, por forma a que este possa contar com o seu recebimento (sublinhado nosso). Assim, apesar de a alínea d) do n.º 4 do artigo 5.º do Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho conter uma espécie de “cláusula de salvaguarda”, que obstaria à natureza de direito pré-estabelecido do prémio, a verdade é que essa natureza de direito pré-estabelecido do prémio, concedido em função do resultado positivo da avaliação, brota dos usos da empresa, à semelhança do que sucede com muita frequência nas pequenas empresas que não dispõem de regulamentos internos. Sem prejuízo, mesmo que não se considerasse esta prestação pecuniária um prémio, sujeita a incidência contributiva nos termos do artigo 46.º, n.º 2, alínea d) do Código dos Regimes Contributivos, o que por mera hipótese académica se equaciona, sempre a mesma seria considerada base de incidência contributiva por força da cláusula geral consagrada no artigo 46º, n.º 5 do Código, nos termos da qual “Constituem base de incidência contributiva, além das prestações a que se referem os números anteriores. Todas as que sejam atribuídas ao trabalhador, com carácter de regularidade, em dinheiro ou em espécie, direta ou indiretamente como contrapartida da prestação do trabalho” (sublinhado nosso). Acrescenta a EE que as gratificações não integram a noção de retribuição do trabalhador, pelo que não deverão integrar a base de incidência contributiva para efeitos de liquidação de contribuições junto dos serviços de segurança social. Resulta do disposto nos n.º 1 e 5 do artigo 46.º do Código dos Regimes Contributivos que constituem base de incidência contributiva, além das remunerações devidas pela entidade empregadora como contrapartida do seu trabalho, nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos, todas as prestações que sejam atribuídas ao trabalhador, com carácter de regularidade, em dinheiro ou em espécie, direta ou indiretamente como contrapartida da prestação do trabalho. Efetivamente, o conceito de base de incidência contributiva previsto no artigo 46.º do Código dos Regimes Contributivos é mais abrangente que o conceito de retribuição do trabalhador e inclui todas as prestações, pecuniárias ou em espécie, que sejam, direta ou indiretamente, contrapartida da prestação de trabalho, ainda que não possam, nos termos do Código do Trabalho, ser consideradas retribuição, como é o caso das ajudas de custo ou do subsídio de refeição em valor superior aos limites legalmente previstos para a sua isenção de tributação. No que diz respeito aos Trabalhadores Independentes, a EE alega que as atividades em causa (fisioterapia, enfermagem, radiologia) podem ser desenvolvidas quer sob um contrato de trabalho, quer através de um contrato de prestação de serviços, podendo existir na mesma estrutura colaboradores que desenvolvem a sua atividade através de um contrato de trabalho e outros através de prestação de serviços. É verdade que as atividades desenvolvidas pelos profissionais de saúde em causa podem ser, em abstrato, executadas quer sob um contrato de trabalho, quer através de um contrato de prestação de serviços, inclusivamente em situação de coexistência numa mesma entidade. Sucede, porém, que, pela análise casuística realizada, verifica-se que as características do modo de prestação de trabalho (posto de trabalho, local de trabalho, horário, inserção hierárquica, etc.) ao abrigo de um regime e de outro na “S.” são semelhantes, diferindo apenas no facto de os abrangidos por contrato de trabalho terem, obviamente, mais direitos reconhecidos (como o direito a receber uma remuneração base, os subsídios de férias e de natal, direito a férias retribuídas, direito ao dia de descanso semanal facultativo, direito a uma carga horária semanal máxima de 40 horas, direito a seguro de acidentes de trabalho), direitos que não são reconhecidos aos contratados como prestadores de serviço, apesar de ocuparem postos de trabalho idênticos aos dos colegas com vínculo laboral. Argumenta ainda a EE que a averiguação não se deveria ter focado nos indícios de subordinação jurídica contemplados no artigo 12.º do Código do Trabalho, como o tipo de remuneração, a propriedade dos meios de trabalho, o local de trabalho, o fardamento do pessoal, os horários de trabalho vertidos nas escalas de turnos, a existência de uma estrutura hierárquica ou de registos de assiduidade, pois nenhum destes indicadores é determinante para a definição do tipo contratual em causa, mas deveria ter indagado se tais profissionais estão sujeitos a subordinação jurídica, isto é, a ordens e indicações da “S.”, para concluir que os mesmos não estão, não sendo a “S.” quem determina ou ordena o horário em que o colaborador presta os serviços, sendo aqueles prestados em função das disponibilidades manifestadas pelos profissionais. Antes de mais, a verificação daqueles indícios permitem ajuizar sobre a existência de subordinação jurídica na relação profissional estabelecida entre as partes. De qualquer modo, o argumento invocado não colhe, porque é efetivamente a “S.” quem determina ou ordena o horário em que o colaborador presta trabalho. A averiguada alega que as escalas existentes são elaboradas para efeitos de organização de tempos de trabalho e de contabilização de honorários dos vários profissionais, afirmando que não determina, isto é, não ordena qual o concreto enfermeiro/radiologista/fisioterapeuta que realiza cada turno, nem o número de turnos que cada profissional realiza, sendo os turnos atribuídos dentro das disponibilidades manifestadas por aqueles profissionais. Ora, o facto de existirem mapas de turnos e turnos de trabalho a distribuir pelo pessoal é, por si só, indicador de que os mesmos estão sujeitos ao cumprimento de um horário de trabalho previamente estipulado. Por outro lado, a conciliação, feita mensalmente, das disponibilidades manifestadas e dos interesses pessoais dos vários profissionais de saúde exige, por si só, que alguém desempenhe funções de coordenação do pessoal de forma a assegurar o horário de funcionamento dos serviços da “S.”. Ainda que a “S.”, nas pessoas dos seus coordenadores de pessoal, não indique qual o concreto profissional que irá realizar determinado turno, nem quantos turnos fará cada profissional, deixando os trabalhadores coordenarem-se da melhor forma, não significa que não tenha de impor o cumprimento de um turno em caso de conflito entre os profissionais, pois só assim poderá assegurar que cumpre os rácios de pessoal necessários ao regular funcionamento dos serviços que disponibiliza aos clientes e pois só assim poderá assegurar o funcionamento, em permanência, dos seus serviços, nos horários de abertura ao público. Portanto, a “S.” tem poder de direção sobre estes profissionais, que pode não ser ostensivo na gestão corrente do pessoal, até porque são profissionais dotados de autonomia técnica, mas que é latente, existe e, no limite, será exercido, pois não pode a “S.” acatar, em pleno, as disponibilidades manifestadas por esses profissionais e encerrar os seus serviços por falta de disponibilidade daqueles. Por outro lado, não se pode afirmar que estes profissionais de saúde cumprem os turnos consoante a sua disponibilidade, pois alguns turnos têm horas pré-definidas de início e fim, bem como uma duração pré-definida em função dos interesses da “S.”. Embora não tenham de cumprir obrigatoriamente uma carga horária mínima semanal ou mensal, a verdade é que estes profissionais estão adstritos ao cumprimento de uma carga horária mínima diária, correspondente ao turno de trabalho diário atribuído. Assim, os profissionais nunca poderão executar as suas funções em disponibilidades de tempo inconciliáveis com o horário de funcionamento do serviço da “S.” ou com as horas de entrada e saída previamente fixadas para os turnos, encontrando- se verdadeiramente vinculados ao cumprimento de um horário de trabalho. Acresce que a existência de turnos com uma duração previamente fixada impossibilita que os profissionais prestem o “serviço” no período de tempo estritamente necessário para o efeito, não podendo, concluídas as tarefas, abandonar o local. Na verdade, o pessoal de enfermagem/radiologia/fisioterapia tem um dever de permanência no local de trabalho, assegurando o cumprimento da carga horária do turno atribuído, dever este que não se compadece com o modelo da relação de prestação de serviços. Por fim, a averiguada invoca que, no que se refere especificamente aos técnicos de fisioterapia e de radiologia, não se pode exigir que recebam uma remuneração em “função de um determinado resultado ou tarefa”, uma vez que isso pressuporia que aqueles técnicos se obrigavam a assegurar a recuperação do doente, o que não faz qualquer sentido. O argumento é falacioso. Efetivamente, estes profissionais da “S.” são remunerados em função do tempo de trabalho despendido ao serviço da empresa, à semelhança de qualquer trabalhador subordinado. Quando estes profissionais de saúde desempenham essas funções como autênticos e genuínos trabalhadores por conta própria, os mesmos são remunerados à tarefa, ou seja, são pagos por cada tratamento de fisioterapia ministrado ou por cada exame radiológico executado, independentemente da duração do tratamento ou do exame. (...)” – cfr. Relatório Final de fls. 489 e ss. do p.a. apenso cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 15. Do Relatório a que aludimos no ponto antecedente foi dado conhecimento à Impugnante através de Ofício de 03/05/2017 - cfr. Ofício e respetivo A.R. de fls. 550-552 do p.a. apenso; 16. Na sequência do processo de averiguações mencionado nos pontos antecedentes foram elaborados os mapas de apuramento de remunerações de fls. 519-545 do p.a. apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 17. Em 02/06/2017 os mapas de apuramento de remunerações foram corrigidos, tendo sido adicionado aos mesmos o valor de 6.863,18€, referente a contribuições relativas ao prestador de serviços J. – cfr. Ofício de fls. 565 do p.a. apenso; 18. Com base nos apontados mapas foram registadas oficiosamente remunerações referentes ao período de fevereiro de 2013 a dezembro de 2016, tendo sido apuradas, em resultado do referido registo oficioso, contribuições em dívida no valor global de 1.289.744,79€ - cfr. doc. de fls. 105 do dossier integrante do p.a. apenso; 19. Do registo oficioso a que se aludiu no ponto antecedente foi dado conhecimento à Impugnante através de Ofício de 16/06/2017, remetido para a sua sede, e recebido em 21/06/2017 – cfr. o apontado Ofício, respetivo A.R. e Print Screen da consulta de entregas da página dos CTT, a fls. 105, 132-133 do dossier integrante do p.a. apenso; 20. O mesmo ofício foi remetido para J. e viria a ser devolvido em 28/06/2017, por não ter sido reclamado – cfr. o apontado Ofício, respetivo A.R. e sobrescrito, a fls. 246, 273 e 274 do dossier integrante do p.a. apenso; 21. Do registo oficioso de remunerações foi ainda dado conhecimento a P. em 03/07/2017 – cfr. Ofício e A.R. de fls. 135 e 136-137 do dossier integrante do p.a. apenso; Mais se provou com interesse: 22. Nos anos de 2010 e 2011 foram atribuídas gratificações aos trabalhadores da Impugnante – acordo; artigo 102.º da p.i.; auto de declarações de I., a fls. 292-293 do p.a. apenso; 23. No ano de 2012, no mês de agosto, a ora Impugnante pagou aos trabalhadores € 297.890,00 a titulo de gratificações do balanço – acordo; 24. No ano de 2013 foi pago aos colaboradores da S. o valor global de 281.405,00€ a título de gratificações de balanço, do qual 200.000,00€ correspondem às gratificações pagas no mês de julho a H. e a J., e o remanescente às gratificações pagas no mês de dezembro aos colaboradores mencionados nas folhas de remunerações de fls. 187 e ss. do p.a. apenso – cfr. Relatório e contas 2014 a fls. 18-20, Balancete analítico a fls. 168 e Folhas de remunerações de fls. 176 e ss., todas do p.a. apenso; 25. No ano de 2014 foi pago aos colaboradores da S. o valor global de 92.329,38€ a título de gratificações de balanço – cfr. Folhas de remunerações de fls. 41-54 e ss. do p.a. apenso; 26. No ano de 2015 foi pago aos colaboradores da S. o valor global de 186.947,73€ a título de gratificações de balanço, do qual 100.000,00€ correspondem às gratificações pagas no mês de fevereiro a H. e a J., e o remanescente às gratificações pagas no mês de dezembro aos colaboradores mencionados nas folhas de remunerações de fls. 67 e ss. do p.a. apenso – cfr. Balancete analítico a fls. 173 e Folhas de remunerações de fls. 55-83, todas do p.a. apenso; 27. Nos meses de fevereiro e março de 2016 foram pagas a três colaboradores da Impugnante gratificações no valor global de 8.637,50€ - cfr. Folhas de remunerações de fls. 84 e ss. do p.a. apenso; 28. A partir do ano de 2014 os critérios estabelecidos pela Impugnante para atribuir as gratificações a que aludimos nos pontos antecedentes passaram a ser: a. As últimas contas do exercício aprovadas pela sociedade evidenciarem um resultado líquido superior ao do exercício imediatamente anterior; b. A avaliação realizada ao trabalhador ser positiva, nos termos previstos no Regulamento Interno da empresa. - cfr. esclarecimentos prestados na mensagem de correio eletrónico de 25/05/2016, a fls. 102-103 do p.a. apenso; 29. Ainda que o resultado líquido da sociedade não seja superior ao do exercício anterior, a administração pode deliberar a atribuição de gratificações aos trabalhadores, o que aconteceu, designadamente no ano de 2014 - cfr. esclarecimentos prestados na mensagem de correio eletrónico de 25/05/2016, a fls. 102-103 e atas de fls. 108 a 118 do p.a. apenso; 30. As gratificações a atribuir a cada trabalhador são calculadas por aplicação ao vencimento base da percentagem estabelecida para o resultado da avaliação, conforme previsto no regulamento interno da empresa – cfr. o apontado regulamento a fls. 209-214 e os esclarecimentos prestados na mensagem de correio eletrónico de 25/05/2016, a fls. 102-103 do p.a. apenso; 31. O conselho de administração da Impugnante ou a comissão executiva podem, por razões de tesouraria ou de política económico-financeira, introduzir descontos globais ou individuais nos prémios previstos no Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho dos Trabalhadores do Grupo S., podendo mesmo deliberar a não atribuição de prémios – cfr. artigo 5.º, n.º 4, al. d) do apontado regulamento a fls. 209-214 do p.a. apenso; 32. Para desenvolver a sua atividade, a S. necessita permanentemente de ter ao seu serviço profissionais de saúde, nomeadamente de enfermagem – facto resultante da instrução da causa; 33. Para esse efeito, contrata os referidos profissionais, e recorre a prestadores de serviços – facto resultante da instrução da causa; cfr. listagens de fls. 218 e ss. do p.a. apenso; 34. Os apontados prestadores, no desempenho das suas funções, estão adstritos aos diversos serviços da Impugnante, tais como internamento, bloco operatório, diálise, endoscopia, serviço de atendimento permanente, fisioterapia, e imagiologia, nas instalações da “S.”, na Clínica (...), na Avenida Emídio Navarro, em Coimbra, no Centro Diagnóstico e Tratamento Integrado (...), na Rua (...), em Coimbra, no Centro Hospitalar de (...), entre outros - cfr. listagens de fls. 218 e ss. do p.a. apenso; 35. A escala de serviço dos profissionais de saúde é organizada pela Impugnante, mediante as disponibilidades manifestadas pelos prestadores de serviços, de acordo com as necessidades da clínica e de modo a assegurar os serviços que ali se prestam aos utentes – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial e prova testemunhal infra; 36. Os profissionais em regime de prestação de serviços, no período compreendido entre 2013 e 2016, registaram a sua assiduidade, ou em sistema de ponto métrico, ou em folhas, para efeitos de controlo de pagamentos – cfr. prova testemunhal infra; 37. Vários dos profissionais de saúde que prestam serviços para a Impugnante trabalham também em hospitais públicos do distrito de Coimbra - cfr. prova testemunhal infra; autos de declarações de fls. 249-255 do p.a. apenso e informação do SISS - artigo 79.º da contestação; 38. Os enfermeiros, fisioterapeutas e técnicos de radiologia que prestam serviços para a Impugnante auferem uma remuneração horária, que varia, designadamente com as funções, com o dia (útil ou não útil), ou consoante a experiência que evidenciam, e que é fixada numa tabela interna – acordo; autos de declarações de fls. 249-255 e 281-291 do p.a. apenso e prova testemunhal infra; 39. A apontada remuneração é paga mensalmente, contra a emissão de uma fatura-recibo – acordo; autos de declarações de fls. 249-255 e 281-291 do p.a. apenso; 40. O local onde estes prestadores de serviços desenvolvem a sua atividade, os instrumentos, equipamentos de trabalho, bem como os produtos utilizados, pertencem à Impugnante, que também fornece as fardas que aqueles devem usar – acordo; cfr. prova testemunhal infra; 41. A Impugnante não concede aos prestadores de serviços qualquer período de férias, nem estes pedem à S. qualquer autorização para tirar férias – acordo; cfr. prova testemunhal infra; 42. A Impugnante não paga aos prestadores de serviços subsídio de férias ou de natal – cfr. autos de declarações de fls. 249-255 do p.a. apenso; acordo; 43. Não são registadas faltas aos prestadores de serviços - cfr. prova testemunhal infra; 44. A impossibilidade de um prestador de serviços comparecer num dia para o qual se encontrava escalado não tem, para o mesmo, qualquer consequência além da perda da remuneração correspondente – cfr. prova testemunhal infra; 45. Se um prestador de serviços não tiver utentes, não fica na clínica – cfr. prova testemunhal infra; 46. A Enf.ª A., prestadora de serviços da Impugnante, além das funções inerentes à profissão de enfermeira, faz, desde 2014, a organização de horários dos seus colegas do serviço de endoscopia da Clínica (...), controla o n.º de horas que aqueles fazem para efeitos do seu pagamento, e procede à articulação do serviço dos enfermeiros com os médicos – cfr. auto de declarações de fls. 254-255 do p.a. apenso e prova testemunhal infra; 47. O Enf.º N., prestador de serviços da Impugnante, é o responsável pela coordenação do pessoal de enfermagem do serviço de diálise da S., procedendo à elaboração dos mapas de turnos e à afetação dos profissionais por doente – cfr. autos de declarações de fls. 249-250 e 251-253 do p.a. apenso; 48. Os enfermeiros mencionados nos dois pontos antecedentes respondem aos gestores das respetivas unidades e recebem uma remuneração fixa mensal pelo exercício de cargo de chefia (suplemento de chefia) contra a emissão de fatura-recibo – cfr. prova testemunhal infra e respetivos autos de declarações de fls. 251-255 do p.a. apenso; 49. A Enf.ª A. e o Enf.º N. coordenam os processos técnicos dos serviços em conformidade com as diretrizes emanadas pelos gestores de unidade – cfr. prova testemunhal infra; 50. Os enfermeiros do serviço de diálise recebem, no mês de junho e no mês de dezembro, uma quantia cujo valor corresponde a uma média do valor recebido nos últimos 6 meses, e que consta do valor global do recibo verde emitido nesses meses, ou de recibo verde autónomo emitido por referência aos mesmos – cfr. nomes dos prestadores de serviços do serviço de diálise integrantes do doc. de fls. 18 do p.a. apenso confrontados com o valor auferido mensalmente pelos mesmos, constante dos mapas de apuramento de remunerações anexos ao Relatório Final; autos de declarações de fls. 249-253 do p.a. apenso; 51. As enfermeiras A., A., S., C. anteriormente prestadoras de serviços, passaram, em 2015, a trabalhadoras subordinadas da Impugnante, sem que houvesse alteração do posto de trabalho e sem que ocorresse qualquer modificação substancial nas características do modo da prestação de trabalho - cfr. os respetivos autos de declarações a fls. 237-245 e 281- 286 do p.a. apenso; 52. Desde que passaram a trabalhadoras dependentes da Impugnante passaram a trabalhar um n.º horas semanal fixo (40 horas), a ter duas folgas semanais obrigatórias, a ser remuneradas com uma quantia fixa mensal, a receber subsídios de férias e de natal e a gozar obrigatoriamente 22 dias úteis de férias - cfr. os respetivos autos de declarações a fls. 237-245 do p.a. apenso; * Motivação da matéria de factoNos termos do n.º 4 do artigo 607.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi art. 2.º, al. e) do CPPT, na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documento ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida, extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência. No que respeita aos factos provados, conforme especificado nos diversos pontos da matéria de facto provada, a decisão da matéria de facto efetuou-se com base na conjugação dos documentos não impugnados (cf. artigo 374.º e 376.º do CPC) e informações oficiais constantes dos autos, e ainda na posição assumida pelas partes em juízo, nos seus articulados (na parte em que foi possível obter a admissão por acordo; 574.º, n.º 2, 1ª parte, do CPC). Bem assim, foi tido em conta o depoimento das testemunhas arroladas. Foram arrolados e ouvidos como testemunhas o Dr. M., trabalhador de uma sociedade pertencente ao grupo da Impugnante, as Enf.ªs A., P., e D., Coordenadoras dos Serviços de Endoscopia, Internamento, e Bloco Operatório da Impugnante, respetivamente, o Téc. T., coordenador dos técnicos de radiologia ao serviço da Impugnante, a Dr.ª J., Assessora do CA da Impugnante desde 2014, e os Enf.ºs J. e J., prestadores de serviços da Impugnante. Foram ainda ouvidos dois funcionários do ISS – A. e C.. No seu depoimento, a Enf.ª A., explicou, de forma clara e congruente, a forma como funciona a organização das escalas. Mais explicou que é realizado um plano semanal em que estão incluídos os prestadores de serviços, mediante as disponibilidades previamente estabelecidas (cfr. facto provado sob o n.º 34). Afirmou que para que se possa cobrir todas as necessidades da S., há um conjunto de prestadores, sendo que é necessário um maior nº de prestadores do que aqueles que em cada momento são indispensáveis, para que se possa jogar com as disponibilidades destes e com as necessidades da clínica. Afirmou ainda que a partir de 2000 fez sempre o ajuste das horas de prestadores e que é quem procede ao controlo das horas realizadas pelos prestadores do serviço de endoscopia e envia para os recursos humanos para o pagamento das horas, o que contribuiu para se levar ao probatório os factos n.º 35, 45, 47 e 48. A mesma enfermeira explicou que os prestadores de serviços lhe comunicam os períodos de férias nos mesmos termos em que manifestam a sua disponibilidade (cfr. factos provados sob o n.º 40 e 45). Também explicou que os equipamentos e produtos/medicamentos necessários para administrar determinada terapêutica são fornecidos pela Impugnante (facto provado sob o n.º 39). Por fim, a Enf.ª A. explicou que se os prestadores não tiverem utentes não ficam na clínica, não tendo o dever de lá permanecer (facto provado sob o n.º 44). O discurso desta Enf.ª mostra uma total integração na estrutura da Impugnante, referindo-se sempre à S. e ao seu serviço na 1.ª pessoa do plural. A Enf.ª P., trabalhadora da Impugnante desde 2011, é coordenadora do seu serviço de internamento, procedendo à sua organização em termos de recursos humanos, designadamente elaboração de escalas de trabalho e articulação com os médicos. O seu depoimento, relativamente à organização das escalas de turnos, foi congruente com o referido pela Enf.ª A. (facto provado sob o n.º 34). Explicou que controla as horas de trabalho dos prestadores de serviços através das escalas e de uma folha não padronizada enviada por cada um dos enfermeiros, para efeitos de pagamento (facto provado sob o n.º 37). Mais afirmou que o registo de assiduidade já havia sido efetuado através de sistema biométrico (facto provado sob o n.º 35). A Enf.ª D. explicou que o valor da remuneração horária dos prestadores de serviços de enfermagem é fixada numa tabela interna, e varia de acordo com a experiência (facto provado sob o n.º 37). Também afirmou que apenas questiona os prestadores de serviços de enfermagem se estão disponíveis, não tendo qualquer papel na autorização ou concessão de períodos de férias (factos provados sob os n.ºs 34 e 40). O Técnico de Radiologia T. também afirmou não saber quando é que os prestadores de serviços de radiologia vão de férias (facto provado sob o n.º 40). Mais afirmou que os técnicos de radiologia, assim que fazem os exames que têm a fazer, vão embora da clínica (facto provado sob o n.º 44). Estes registam as horas em que prestam serviços numa “folha de honorários” (facto provado sob o n.º 35). Por fim, salientou ainda que a falta de comparência de um prestador de serviços não tem, para o mesmo, qualquer tipo de consequência (factos provados sob o n.º 42 e 43). O depoimento da Dr.ª J., conjugado com o depoimento da Enf.ª A., e com os autos de declarações desta e do Enf.º N., integrantes do p.a., foi preponderante para dar como provados os factos vertidos sob os n.ºs 45 a 48 do probatório. A assessora do CA da Impugnante explicou que os prestadores de serviços respondem às necessidades especificas dos serviços, representados pelas suas chefias. São eles (chefias, tais como todas as testemunhas que depuseram previamente) quem trata de tudo com os prestadores, e que articulam as necessidades dos serviços com as suas disponibilidades. Afirmou que a intervenção dos recursos humanos se limita à receção da informação dos chefes de setor (enfermeiros) relativamente ao n.º de horas de prestação de serviços para efeitos de pagamento. A mesma testemunha afirmou que os prestadores de serviços têm que respeitar a dinâmica do serviço e, a instâncias da I. Mandatária do ISS explicou que existem prestadores de serviços que fazem coordenação técnica, mas são residuais, como é o caso do Enf. N., que coordena a dinâmica da diálise (muito especifica) e funciona em coordenação com a direção técnica. Afirmou também que a Enf.ª A. se dedica à área da gastro no CHUC e tem um papel preponderante na gestão do serviço de endoscopia da Impugnante. Embora tenha referido que os apontados prestadores “não são gestores, são coordenadores daquela área porque dominam tecnicamente aquilo tudo”, e que “seguem orientações, mas de uma forma muito própria e de alguma forma distante”, centrando a sua intervenção nos processos técnicos e não nas pessoas, certo é que afirmou também que aqueles “respondem à gestão de unidade”, e “não fazem nada sem a conivência da gestora de unidade”. Mais disse que “eles não podem definir nada sozinhos. Toda a gestão tem regras próprias, e são emanadas pelo gestor de unidade. Eles fazem essas coisas em conformidade com as diretrizes emanadas”. Isto é, o depoimento da apontada testemunha foi incongruente com aquilo que a própria Enf.ª A. referiu na parte que se refere à gestão de pessoas. Se esta afirmou que a partir de 2000 fez sempre o ajuste das horas de prestadores e que é quem procede ao controlo das horas realizadas pelos prestadores do serviço de endoscopia e envia para os recursos humanos, não se pode dizer que não tem qualquer intervenção ao nível da gestão de pessoas. O Enf.º J. também afirmou não ter subsídio de férias ou de natal, e receber mais pelas horas de serviço noturno. Explicou que vão apontando numa folha de excel o n.º horas que fazem, para apurar o valor que tem a receber (cfr. factos provados sob os n.ºs 35, 37 e 40). Tanto a última testemunha referida, como a Enf.ª A., e o Enf.º J., têm a par com a prestação de serviços para a Impugnante, relações laborais com Hospitais Públicos da cidade de Coimbra (CHUC ou IPO) – cfr. facto provado sob o n.º 36. Quanto à demais matéria sobre as quais as testemunhas foram inquiridas, o conteúdo dos depoimentos não se revelou de qualquer utilidade para a decisão da matéria de facto provada, tendo em conta a prova documental produzida e, bem assim, atenta a causa de pedir e os factos que vêm alegados pela Impugnante na p.i. e pelo ISS, I.P. na contestação. * No mais, considera-se não provada, conclusiva, de direito ou sem relevância para a decisão a proferir, a matéria alegada a que se não fez referência.É esta, em suma, a motivação que subjaz ao juízo probatório formulado.» * 4.APRECIAÇÃO JURÍDICA DOS RECURSOS4.1.Recurso do Instituto da Segurança Social, entende que o tribunal a quo ao valorar de modo decisivo a vontade das partes manifestada nos depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento por alguns dos alegados prestadores de serviços, limitou sobremaneira a sua valoração de prova ao sobrepor e fazer prevalecer essa vontade manifestada pelas testemunhas sobre todos os indícios relacionados com o concreto modo de execução da relação de trabalho. Vejamos, A discordância sobre a valoração da prova testemunhal produzida e sobre a convicção do julgador, sem precisar ou identificar o vício lógico em que se incorre não permite a alteração da matéria de facto. A alteração da matéria de facto nos moldes pretendidos, pelo Tribunal de Recurso, só poderá ocorrer em situações de erro manifesto ou grosseiro ou se outros elementos, nomeadamente documentais fornecerem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi considerado em 1ª instância No sentido do texto Ac. do TCASul no processo 07219/13 de 29/5/2014, disponível no site da dgsi., ou então, por indicação dos fundamentos precisos que foram decisivos para a convicção do juiz. Como a própria recorrente reconhece a sentença aduziu fundamentação bastante, mas não concorda com a subsunção dos factos ao direito e/ou ao quadro legal aplicável, o que naturalmente se prende com os pressupostos do regime jurídico aplicável. Por outro lado, a observação de que as testemunhas J. e J. foram sobrevalorizadas não é acompanhada da identificação da razão dessa conclusão, nomeadamente, se estas testemunhas eram as únicas, no universo dos que trabalhavam para a recorrida, que não tinham vontade nem condições para prestar serviços no regime de contrato individual de trabalho, de tal modo que não são, de per si, suficientes para abalar os demais indícios apontados pela recorrente quanto aos restantes enfermeiros. Assim, improcede este segmento do recurso. A recorrente enfatiza, ainda, o desvalor dos outros elementos que o tribunal considerou para abalar a fundamentação da recorrente para qualificar uma situação de contrato de trabalho e não prestação de serviços, no sentido de que nenhum deles abala os indícios apontados por ela de subordinação jurídica, do seguinte modo: Quanto ao argumento referente ao tempo de exercício de funções dos prestadores de serviços sem nunca terem recebido um montante fixo e certo, facto esse irrelevante e que em nada afeta os factos provados indiciadores de subordinação jurídica. Nos termos definidos no artigo 261.º do Código do Trabalho, a retribuição pode ser certa, variável ou mista, sendo considerada certa a retribuição calculada em função de tempo de trabalho. Quanto aos horários dos turnos a cumprir pelos profissionais de saúde, facto esse também, irrelevante e que em nada afeta os factos provados indiciadores de subordinação jurídica. Na verdade, existiam turnos aos quais os trabalhadores ficavam vinculados após prévia consensualização entre estes e a aqui Recorrida Insiste, o ISS, que os enfermeiros estavam sujeitos a um horário de trabalho previamente fixado, por turnos, estavam obrigados a permanecer nas instalações da impugnante durante todo o turno e não apenas pelo tempo estritamente necessário para a prestação de serviço, eram pagos à hora e não à tarefa. Vejamos, Neste particular a sentença fez uma apreciação criteriosamente adequada e legal, fê-lo de acordo com a prova produzida com as consequências da regra do ónus da prova. Afastou a existência de uma relação de contrato de trabalho à generalidade dos enfermeiros excecionando os que tinham funções de chefia, identificando-os, e, explicou jurídico-factualmente por que assim concluiu. Pois bem, Muito se tem escrito sobre a qualificação jurídica entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviços, merecendo uma proficiente análise quer da doutrina quer da jurisprudência, no âmbito da qual se foi coligindo elementos e índices interpretativos Cfr. AC. do STJ de 16-01-2008 disponível em www.dgsi.pt tendentes a caracterizar ambos os contratos, permitindo ao intérprete e julgador estabelecer diferenças entre as duas modalidades, a mais das vezes não isenta de dificuldades. O art. 11.º do Cód. do Trabalho Em vigor a partir de 2009. que define a noção de contrato de trabalho, como aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas. Por sua vez, o art. 1154.º do Cód. Civil dá a noção de contrato de prestação de serviços, como sendo aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição, desprovida de qualquer referência a elocuções como organização, autoridade, direção ou subordinação, entendidos como vínculos definidores de uma relação laboral, que pressupõe a integração e a dependência de uma das partes- a que se obriga a proporcionar um resultado do seu trabalho- à outra parte, porquanto neste contrato a relação que se estabelece entre as partes decorre de forma livre e autónoma, importando apenas o resultado do trabalho prestado. Mas, também aqui, quem contrata ou encomenda um serviço não fica arredado ou impedido de dar instruções ao prestador de serviços sobre o que quer e de que modo pretende ver realizado esse trabalho. Há muito que a jurisprudência Ac. do STJ de 14-11-1986, in BMJ n.º 361º pág. 410., maxime, dos tribunais superiores, vem referindo a existência de dois elementos fundamentais que caracterizam o contrato de trabalho: Um vínculo de subordinação económica [atividade remunerada] e um vínculo de subordinação jurídica [autoridade e direção da pessoa a quem a atividade é prestada] e que entre eles se estabelece uma inter-relação, em termos de a prestação de trabalho, dar ao trabalhador o direito à remuneração e à entidade patronal o poder de autoridade e direção que não preexiste à prestação de trabalho, é condição natural e necessária na relação laboral. Como já se aflorou, a inexistência da subordinação jurídica não exclui ou afasta a possibilidade de o prestador de serviço, no quadro de um contrato desta natureza, poder receber instruções e diretivas por parte de quem contratou o serviço, dirigidas, estas, à obtenção do resultado do serviço a prestar e cuja qualidade se pretende assegurar. Assim, o uso dos factos-índices (ou método indiciário) permitirá estabelecer a diferença entre tais contratos, em função da prevalência de uns em relação a outros, sendo ainda, assim, complexo quando a prestação de serviços se integra numa organização empresarial, com o surgimento de novos modelos de organização do trabalho e do mercado de trabalho que favorecem estes em detrimento dos tradicionais meios de efetivação da prestação laboral e optam por outros mais consentâneos com as sociedades modernas. Devemos, por conseguinte, estar atentos a estas mudanças e refletir sobre a sua importância e alcance dos factos concretamente ajuizados e nos contornos trazidos e sedimentados pela prova produzida, para aquilatar de que regime se trata. A partir de 2009 a questão passou a ter indicadores legais, previstos no art. 12.º do Código do Trabalho, passando a existir uma presunção de laboralidade, mas que ainda assim não dissipa todas as dúvidas ou questões em volta dela. Na verdade, os indícios de laboralidade dos autos embora coincidentes com alguns dos elencados no art. 12.º do Código do Contrato de Trabalho, como o local de trabalho, os equipamentos e instrumentos utilizados, o pagamento com periocidade, em quantia certa, outros há que contrariam a presunção de existência de contrato de trabalho por se tratarem de factos, também, caracterizadores da relação estabelecida entre prestador e seu beneficiário. Desde logo, ter ficado provado que o trabalho prestado é pago à hora, sendo a remuneração determinada em função das horas efetivamente prestadas. Claro que a questão suscitada do pagamento do resultado e não do serviço prestado nem sempre é fator diferenciador pois que há que atender ás características da empresa e sua organização. A diferenciação da remuneração de per si [também a duração da relação de trabalho versus prestação de serviços] não será indiciador se conjugado com outras circunstâncias, como as que foram apuradas, sendo certo que alguns factos-índice: como variação da remuneração, diferenciação do valor hora em função da especialidade em que é prestado o serviço, o grau de experiência do profissional de saúde e o registo ponto métrico, são comuns aos dois tipos de relação laboral, contrato de trabalho e prestação de serviços, sendo indispensáveis à realização de uma prestação de serviços. Estamos a falar de uma entidade que age na área da saúde, uma clínica dispondo de várias especialidades, com internamentos, cirurgias, consultas externas, exames de diagnóstico e uma panóplia de outros serviços como a fisioterapia, hemodiálise (…). Neste contexto, naturalmente que o trabalho dos enfermeiros será prestado nas instalações da empregadora, com os seus materiais e equipamentos, no quadro organizativo em que se apresenta atividade de prestação de serviços de saúde. Diferenciador será o indicador relativo à subordinação jurídica, receber (ou não) ordens, ter (ou não) de as acatar; dever de obediência a instruções expressas da entidade empregadora, para a execução do serviço ou atividade, em que o trabalhador tem de conformar o seu desempenho a orientações que o vinculam; não ter que justificar as faltas sob pena de perda de direitos [descontar na antiguidade, processo disciplinar nas faltas injustificadas] não ter direito a férias pagas e o facto de exercer funções de chefia, são circunstâncias com relevo na diferenciação da relação laboral estabelecidas entre as partes. Vejamos, então, o que se retira do julgamento de facto quanto ao modo de prestar os serviços e relação estabelecida entre as partes. Na concretização da atividade da recorrida/impugnante necessita ter permanentemente ao serviço profissionais de enfermagem, com o que conta com prestadores de serviços e funcionários com contrato individual de trabalho, adstritos aos mais variados serviços e especialidades médicas, de terapêutica e diagnóstico; para o efeito, tem pessoal que operacionaliza as escalas de serviço em função das necessidades da clínica e segundo as orientações superiores, bem como em função das disponibilidades dadas pelos prestadores de serviços/enfermeiros; o trabalho é prestado e pago à hora, (a remuneração varia em função do número de horas efetivamente prestado nos respetivos serviços de saúde) para o que é elaborado mapa no qual são registadas as horas gastas por cada profissional, entre 2013 e 2016, fez-se uso do ponto métrico, os enfermeiros sem contrato individual de trabalho com a impugnante trabalham, também, para o setor público da saúde, no distrito de Coimbra, a remuneração de cada profissional é determinada em função das horas do serviço prestado, inexistindo uma remuneração base, a impugnante não atribuiu férias aos enfermeiros e técnicos de saúde que prestam serviço em regime de pagamento à hora, as férias que cada um destes prestadores faz não está dependente de qualquer autorização ou interferência da impugnante, não recebem subsídio de férias e de Natal, não são registadas faltas no caso de ausência ao serviço, apenas são assinalados as horas efetivas de trabalho. Há serviços em os enfermeiros ou técnicos se não tiverem utentes não têm de permanecer nas instalações da impugnante. Por fim, os enfermeiros do serviço de diálise recebem no mês de junho e no mês de dezembro um valor corresponde a uma média do valor recebido nos últimos seis meses, constando do valor global do recibo verde. Os enfermeiros com contrato de trabalho individual, trabalham 40 horas semanais (n.º de horas fixo) têm duas folgas semanais obrigatórias remuneradas, recebem subsídio de férias e de Natal e gozam obrigatoriamente 22 dias úteis de férias remuneradas. Os enfermeiros, A. e N. são coordenadores do processo técnico de serviço em conformidade com a diretrizes dos gestores das unidades de saúde, organizando horários e articulam o serviço dos enfermeiros com os médicos. Esta panóplia de factos que foram elencados e não impugnados, à luz do art. 12.º do Código do Trabalho, permitem com alguma segurança, presumir que aqueles enfermeiros que exercendo no quadro organizativo da empresa a função de chefia e coordenação dos demais profissionais, na falta de factos que contrariem ou afastem a presunção legal, embora sob a veste de prestação de serviços exercem na prática uma atividade com subordinação jurídica e modelada por quem detém o poder de direção da clínica. Contrapondo a situação destes enfermeiros com os demais, falham aos restantes outras características que possam assegurar que há um contrato de trabalho, ou seja, desde logo, a falta de subordinação jurídica, não recebem ordens expressamente vinculativas do conteúdo qualitativo e quantitativo (embora possam receber orientações no âmbito da aproximação da prestação de serviços ao quadro organizativo da empresa). O facto de receberem uma quantia certa, mas variável, em função das horas prestadas, sem que haja uma base de remuneração regular e igual, durante o período analisado, não terem o direito a exigir férias remuneradas não estarem submetidos a um regime de faltas ou ausências ao trabalho, são factos que menorizam ou desqualificam os demais indicadores do art. 12.º, tal como o local da prestação de serviço pertencer ao beneficiário dos serviços, o material e/ou equipamentos usados pertencer também ao beneficiário da atividade; não obstante haver um segmento de enfermeiros afetos a determinada especialidade que receberam em junho e dezembro a média do valor auferido nos últimos seis meses, respetivamente, não é suficiente para qualificar a existência de contrato de trabalho entendendo-se que tal pagamento integra uma remuneração das férias e do 14.º mês. Ora, como muito bem salientou a sentença, quem invoca um direito tem de o provar os factos constitutivos do direto a que se arroga. [art. 342.º do C.C.] e no caso de dúvida, a questão terá de ser decidida contra quem está onerada com esse dever. É claro que nos casos de maior dificuldade, a que não é alheio o caso dos autos, a parte que se arroga no direito de liquidar as contribuições e cotizações tem a tarefa mais dificultada, porquanto sobre si recai um esforço probatório mais preciso, importa uma recolha dos factos-índice mais densificados sob pena de a prova da parte contrária vir a ilidir a presunção decorrente do art. 12.º do CT. Por fim, cabe dizer que a presunção do art. 12.º não funciona de forma automática ou acrítica, ou seja, beneficiando da presunção, o ISS, no caso dos factos indiciadores não serem concludentes no sentido alegado, face à prova produzida pela parte contrária, implica o insucesso da sua pretensão. Neste sentido veja-se o Ac. de 09-09-2015 do STJ, no recurso 3292/13, 4.ª secção, disponível em www.dgsi.pt Na verdade, tais factos não operam em abstrato, mas em concreto, sendo que o efeito jurídico associado pela lei não opera pela verificação dos factos elencados de forma isolada ou atomística, antes se impõe que interajam num contexto mais globalizante da relação de prestação da atividade em causa. Por conseguinte, não se antolhe qualquer erro de julgamento da sentença ao concluir que em face ao quadro factológico provado, inexistem indícios passíveis de apontar para a existência de um elo de subordinação jurídica dos prestadores de serviços, com a exceção dos enfermeiros N. e A., os quais, simultaneamente exerciam funções de chefias e recebiam ordens da recorrida/impugnante, e, por isso, surgem numa relação global com características mais próximas do contrato individual de trabalho. Improcede, pois, o recurso do ISS. 4.2. Recurso da (...) [A] Nulidade da sentença A recorrente defende que a sentença é genérica e indeterminada, padecendo de nulidade, decidindo sobre objeto diverso do pedido. Porquanto conheceu de questões que não lhe foram colocadas, pois que a liquidação adicional operada estava relacionada com concretos prestadores de serviço que constavam nos mapas anexos à liquidação e a sentença ao individualizar dois casos concretos de enfermeiros e não referindo os restantes prestadores relativamente aos quais a impugnação não procedia. Por conseguinte a recorrente imputa à sentença vício que tem primazia no seu conhecimento. A formulação da nulidade da sentença é enviesada e tangencia a defesa dilatória. A recorrente ao acionar o vício da sentença, fá-lo de forma genérica, pois, afirma que a sentença decidiu sobre questões que não foram colocadas e decidiu sobre objeto diverso, mas não faz a necessária delimitação e concretização quer do excesso de pronúncia quer ainda a diversidade do objeto da decisão propriamente dita, face ao pedido por si formulado na p.i. Que questões não foram formuladas e o tribunal pronunciou-se? Que concretos prestadores foram considerados na sentença que não faziam parte dos mapas anexos à liquidação? Aliás, verifica-se do teor do restante recurso que este vício da sentença não é plausível. Por fim, o tribunal recorrido proferiu despacho de sustentação apontando as razões pelas quais não se verifica a nulidade da decisão que aqui se dão por reproduzidas. Na verdade, o pedido formulado pela impugnante é o seguinte: a) Que seja declarada a caducidade do direito à liquidação das cotizações e contribuições respeitantes a fevereiro, março, abril, maio e junho de 2013- pedido que foi conhecido no estritamente peticionado. b) Que seja declarada nula a liquidação oficiosa por ser inconstitucional a qualificação pelo ISS das relações contratuais em causa como sendo de trabalho subordinado, bem como por falta de fundamentação e violação das regras do ónus da prova; pedido igualmente apreciado e decidido no sentido da sua não verificação. c) Que seja anulada ou revogada a liquidação oficiosa das contribuições e quotizações respeitantes aos anos de 2013 a 2016, quer por estarem demonstradas verdadeiras gratificações de balanço, e não prémios de desempenho, quer por estarem em causa trabalhadores independentes e não trabalhadores subordinados. – Neste âmbito a sentença apreciou todos os elementos que sustentaram o ato de liquidação das cotizações e contribuições, na consideração de que todos os prestadores a que respeita o mapa anexo à liquidação eram todos conducentes a um contrato de prestação de serviços, concluindo que desse universo de prestadores apenas para dois deles se encontram indicadores que permitem afirmar a existência de um contrato de trabalho. Assim anuímos na fundamentação do despacho do tribunal a quo e julgamos igualmente não ocorrer a apontada nulidade da sentença, improcedendo este segmento do recurso. [B] A recorrente vem mais uma vez insistir, no recurso, que o ISS não tem legitimidade para qualificar as relações contratuais de trabalho para o que aciona os mesmos fundamentos da ação. Na verdade, a recorrente suscita novamente a questão, mas, não o faz de modo a imputar à sentença, neste segmento, o concreto erro ou vício em que incorreu ao concluir que não há vício de usurpação de funções ou poderes. Dispõe o art. 627.º, n.º 1, do CPC que: “As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recurso.” Quer isto dizer que o recurso constitui o principal instrumento de impugnação de decisões judiciais, permitindo a sua reapreciação por um tribunal de categoria hierarquicamente superior. O recurso tem assim por objeto a alteração total ou parcial da decisão recorrida que pressupõe que tenha incorrido em erro de julgamento, lato sensu, no qual o recorrente deve identificar as questões decididas e que pretende ver reapreciadas para o que deve enunciar e concretizar o que de errado fez a decisão recorrida. Concatenando a decisão recorrida, neste segmento, com as conclusões de recurso ressalta claro que a recorrente não reage a qualquer dos fundamentos que levaram a afastar a ilegitimidade do ISS para qualificar as relações contratuais de trabalho subordinado, antes insiste nos mesmos argumentos, reconduzindo o seu recurso aos fundamentos acionados na ação. Com efeito, o recurso não desfere qualquer ataque à decisão recorrida impossibilitando que este tribunal reaprecie ou analise o que quer que seja em matéria de questões que comportam a decisão que se recorre, pelo que se rejeita o recurso. Por fim, coloca a questão da interpretação acolhida na sentença relativa aos arts. 256.º do Código dos Regimes Contributivos 8., n. º2, al c) da Portaria n.º 135/2012 de 8 de maio, ser inconstitucional, mas também aqui não concretiza como a interpretação feita pelo tribunal às normas dos arts 256.º do Cód. dos Regimes Contributivos e a Portaria 135/12, no seu art. 8.º, violam a CRP, que princípios constitucionais ou normas foram violadas com a interpretação plasmada na decisão recorrida, pelo que também improcede este segmento do recurso. [C] Erro de julgamento quanto às gratificações de balanço e quanto à qualificação de contrato de trabalho dos enfermeiros A. e N.. 1- Gratificações de Balanço. Neste particular a recorrente esgrime uma série de argumentos nas conclusões 22.ª a 31.ª, no sentido de que não se pode confundir o exercício a que respeitam as gratificações e o ano em que são pagas, quando o pagamento respeitante a determinado exercício é faseado pelos anos seguintes, o que afasta o caráter de regularidade a que alude o art. 47.º do Cód. dos Regimes Contributivos; não ficou provado os montantes dos anos de 2010 e 2011 nem os anos a que respeitavam os vários pagamentos constantes das folhas de remunerações entre 2012 e 2016, que os colaboradores não têm direito às quantias em causa porquanto a recorrente pode deliberar a não atribuição, não sendo a disposição do Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho não constituiu uma mera cláusula de salvaguarda porquanto mesmo que o trabalhador atinja os critérios estabelecidos, certo é que há trabalhadores nestas condições e não receberam gratificação, não podendo por isso integrar a base de incidência contributiva para a segurança social. Está assim em causa a aplicação dos arts. 46.º, 47.º e 48.º do Cód. dos Regimes Contributivos, entende a recorrente que os prémios pagos não são sujeitos a contribuições para a segurança social, não há uma expectativa de recebimento, não sendo de considerar retribuição, sendo aleatório o seu pagamento e dependendo dos resultados económicos e da vontade do Conselho de Administração. Para o efeito importa nomear as normas seguintes: Artigo 46.º Delimitação da base de incidência contributiva Para efeitos de delimitação da base de incidência contributiva consideram-se remunerações as prestações pecuniárias ou em espécie que nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos são devidas pelas entidades empregadoras aos trabalhadores como contrapartida do seu trabalho. 2 - Integram a base de incidência contributiva, designadamente, as seguintes prestações: a) A remuneração base, em dinheiro ou em espécie; b) As diuturnidades e outros valores estabelecidos em função da antiguidade dos trabalhadores ao serviço da respetiva entidade empregadora; c) As comissões, os bónus e outras prestações de natureza análoga; d) Os prémios de rendimento, de produtividade, de assiduidade, de cobrança, de condução, de economia e outros de natureza análoga que tenham caráter de regularidade; (…). Artigo 47.º Conceito de regularidade Considera-se que uma prestação reveste caráter de regularidade quando constitui direito do trabalhador, por se encontrar preestabelecida segundo critérios objetivos e gerais, ainda que condicionais, por forma que este possa contar com o seu recebimento e a sua concessão tenha lugar com uma frequência igual ou inferior a cinco anos. Artigo 48.º Valores excluídos da base de incidência a) Os valores compensatórios pela não concessão de férias ou de dias de folga; b) As importâncias atribuídas a título de complemento de prestações do regime geral de segurança social; c) Os subsídios concedidos a trabalhadores para compensação de encargos familiares, nomeadamente os relativos à frequência de creches, jardins de infância, estabelecimentos de educação, lares de idosos e outros serviços ou estabelecimentos de apoio social; d) Os subsídios eventuais destinados ao pagamento de despesas com assistência médica e medicamentosa do trabalhador e seus familiares; e) Os valores correspondentes a subsídios de férias, de Natal e outros análogos relativos a bases de incidência convencionais; f) Os valores das refeições tomadas pelos trabalhadores em refeitórios das respetivas entidades empregadoras; g) As importâncias atribuídas ao trabalhador a título de indemnização, por força de declaração judicial da ilicitude do despedimento; h) A compensação por cessação do contrato de trabalho no caso de despedimento coletivo, por extinção do posto de trabalho, por inadaptação, por não concessão de aviso prévio, por caducidade e por resolução por parte do trabalhador; (Redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro) i) A indemnização paga ao trabalhador pela cessação, antes de findo o prazo convencional, do contrato de trabalho a prazo; j) As importâncias referentes ao desconto concedido aos trabalhadores na aquisição de ações da própria entidade empregadora ou de sociedades dos grupos empresariais da entidade empregadora. Neste contexto a sentença discreteou de modo que não nos oferece dúvida na medida em que sublinhou que Considera-se que uma prestação reveste caráter de regularidade quando constitui direito do trabalhador, por se encontrar preestabelecida segundo critérios objetivos e gerais, ainda que condicionais, por forma que este possa contar com o seu recebimento e a sua concessão tenha lugar com uma frequência igual ou inferior a cinco anos (cfr. artigo 47.º do mesmo diploma). Nesta última disposição, o legislador, embora sob a epígrafe regularidade, acaba por se referir também à determinabilidade e exigibilidade do pagamento da prestação do ponto de vista do trabalhador. Resultou provado nos presente autos (cfr. pontos 22 a 31) que nos anos de 2010 e 2011 foram atribuídas gratificações aos trabalhadores da Impugnante, embora não se saiba o seu valor global. Mais se provou que no ano de 2012, no mês de agosto, a ora Impugnante pagou aos trabalhadores € 297.890,00 a título de gratificações do balanço. Com referência aos anos visados na liquidação impugnada, provou-se que no ano de 2013 foi pago aos colaboradores da S. o valor global de 281.405,00€ a título de gratificações de balanço. No ano de 2014 foi pago aos colaboradores da S. o valor global de 92.329,38€ a título de gratificações de balanço. No ano de 2015 foi pago aos colaboradores da S. o valor global de 186.947,73€ a título de gratificações de balanço. Nos meses de fevereiro e março de 2016 foram pagas a três colaboradores da Impugnante gratificações no valor global de 8.637,50€. A partir do ano de 2014 os critérios estabelecidos pela Impugnante para atribuir as gratificações a que aludimos nos pontos antecedentes passaram a ser: a. As últimas contas do exercício aprovadas pela sociedade evidenciarem um resultado líquido superior ao do exercício imediatamente anterior; b. A avaliação realizada ao trabalhador ser positiva, nos termos previstos no Regulamento Interno da empresa. Ainda que o resultado líquido da sociedade não seja superior ao do exercício anterior, a administração pode deliberar a atribuição de gratificações aos trabalhadores, o que aconteceu, designadamente no ano de 2014. As gratificações a atribuir a cada trabalhador foram calculadas por aplicação ao vencimento base da percentagem estabelecida para o resultado da avaliação, sendo que o conselho de administração da Impugnante ou a comissão executiva podem introduzir descontos globais ou individuais nos prémios previstos no Regulamento do Sistema de Avaliação de Desempenho dos Trabalhadores do Grupo S., podendo mesmo deliberar a não atribuição de prémios. Foi reunida pelo ISS prova referente ao pagamento de gratificações aos colaboradores da Impugnante, tendo sido pedidos esclarecimentos e elementos contabilísticos referentes a estes pagamentos. Solicitada a ata de previsão da atribuição de Gratificações de Balanço e ata de aprovação de contas e de deliberação da distribuição de resultados referentes ao exercício económico de 2015, a Impugnante remeteu uma ata social de outra empresa do grupo (Ata n.º 33 da Assembleia Geral da S., SGPS, Lda., de 17/02/2016) que ratificava as quantias pagas em 2014 e 2015 por essa outra empresa a título de gratificações do balanço referentes aos exercícios, respetivamente, de 2013 e 2014 (ponto 6 do probatório - fls. 204 e ss. do p.a.). Assim, e não tendo a Impugnante apresentado a documentação que deveria constar da sua contabilidade, nem cumprindo os deveres que lhe cabiam de esclarecimento da sua situação tributária, a Segurança Social concluiu, face aos elementos que tinha disponíveis, que as apontadas gratificações tinham natureza retributiva. Ou seja, está-se perante o caso previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT, que impede a aplicação da presunção de veracidade das declarações, dados e apuramentos da contabilidade ou escrita da Impugnante, prevista no n.º 1 do mesmo artigo. E por se assim, cabia à Impugnante demonstrar que não estamos perante remunerações que devam integrar a base de incidência contributiva, o que, no entender do Tribunal, não aconteceu. Aliás, dizer que em 2015 e 2016 não houve qualquer pagamento de gratificações roça os limites da litigância de má fé. A Impugnante sabe, e não pode ignorar, que, independentemente do ano a que se refiram as gratificações pagas nesses anos, elas existiram e estão evidenciadas nos recibos de vencimento dos seus colaboradores. Ainda que no ano de 2013, à semelhança do que aconteceu nos anos anteriores, segundo afirma a Impugnante no artigo 102.º da p.i., os valores tenham sido fixados segundo o seu livre arbítrio, certo é que, atendendo aos usos da empresa, os colaboradores tinham uma legítima expectativa de auferir essa gratificação. Sendo que nos esclarecimentos prestados pela Impugnante no decorrer do procedimento esta não estabeleceu qualquer distinção entre os critérios para proceder ao pagamento de gratificações no ano de 2013 e nos restantes anos. Nunca explicou como eram anteriormente atribuídos os prémios, ou como eram calculados. De 2014 em diante, o pagamento de prémios encontra-se especificamente regulamentado, embora condicionado a determinados fatores: resultado líquido do exercício, avaliação de desempenho positiva, e razões de tesouraria ou de política económico financeira. A possibilidade de a administração poder introduzir descontos nos prémios por razões de tesouraria ou de política económico financeira não se nos afigura como mais do que uma condicionante, para os efeitos do disposto no artigo 47.º do Código Contributivo. Aliás, ao contrário do que refere a Impugnante esta possibilidade não permite à administração, discricionariamente, não atribuir prémios. Essa não atribuição terá que ser justificada pelas apontadas razões objetivas. Salienta-se que mesmo tendo a sociedade apresentado um resultado líquido inferior ao do ano de 2013 no ano de 2014, tais gratificações não deixaram de ser pagas. Deste modo, e por não ter a Impugnante logrado provar (e mesmo alegar, diga-se), factos que ponham em causa a regularidade do pagamento das gratificações aos trabalhadores, impõe-se concluir que as mesmas constituem remuneração para os efeitos previstos no Código Contributivo. Para esta conclusão foram decisivos os factos provados 22 a 31, no sentido de que foram pagas quantias aos trabalhadores, designadas por gratificações de balanço, todavia as quantias pagas, com caráter de regularidade, Ac. do STA de 10-01-2007 no rec. n.º 0646/06; Acs. do TCA SUL de 5-11-2020, processo 886/17 e de 13-05-2021 no processo 648/09. foram calculadas com referência ao vencimento base da percentagem determinada para o resultado da avaliação de desempenho, ainda que o resultado económico da sociedade não fosse superior ao ano anterior (ou fosse inferior) certo é que ainda assim essas quantias foram pagas ao trabalhador. Pese embora a prorrogativa do conselho de administração da sociedade para poder introduzir descontos individuais ou globais aos prémios referidos no RSADT [regulamento do sistema de avaliação de desempenho dos trabalhadores do Grupo S.] ou até deliberar não atribuir, certo é que tais pagamentos foram sendo feitos, constando dos recibos de vencimento. A questão suscitada no recurso prende-se com a inexistência de prova no sentido por si preconizado na ação, na verdade, a recorrente não apresentou a documentação que deveria constar na sua contabilidade, nem tão pouco esclareceu a sua situação contributiva, não demonstrou que o trabalhador tivesse tão só a expectativa de receber a prestação pecuniária e que a atribuição dos efeitos do resultado da avaliação no âmbito do RSAD está dependente de um poder discricionário da recorrente. Efetivamente não ficou plasmado que os trabalhadores, inclusive, colaboradores, H. e J. que receberam prestações pecuniárias de forma regular ao longo dos anos, ainda que incerto o momento do pagamento, essa atribuição estava perfeitamente dependente do poder discricionário da administração da recorrente, tratando-se de participação nos lucros da empresa, quando aqui se viu que ainda em anos que não havia melhores resultados económicos a prestação pecuniária era atribuída em função do RSAD. Cremos que, no caso, é à sociedade recorrente que cabe o ónus [arts. 342º, do C. Civil, 100.º, n.º 1 do CPPT e 74.º, nº 1 da LGT] de provar que os montantes por si pagos a título de prémios ou gratificações de balanço não revestem a natureza de retribuição, não consubstanciando rendimentos que proporcionam ao trabalhador um acréscimo de capacidade contributiva e, como tal, suscetíveis de tributação pois que nos termos do nº 3 do art.º 249º do Código do Trabalho, existe uma presunção de que toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador constitui retribuição, pelo que, nos termos dos artigos 344º e 350º do Código Civil tem a Administração, no caso em questão, uma presunção a seu favor o que determina que não tenha de fazer prova do facto que invoca, sendo, contudo, ilidível esta presunção, que entendemos competir à impugnante, ora recorrente, mas que não logrou fazer com êxito. A recorrente não logrou demonstrar o caráter aleatório ou casual e não regular do pagamento destas quantias pelo que improcede o recurso. 2- Qualificação de contrato de trabalho pelos serviços prestados pelos enfermeiros A. e N.. Defende a recorrente que não basta o critério aritmético de verificação de algum ou alguns dos índices de laboralidade do art. 12.º do CT Código do Trabalho para imediatamente se concluir pela existência de um contrato de trabalho, prevendo a lei apenas uma presunção iuris tantum. Entende, por isso, que não andou bem a sentença que qualificou a relação contratual da Enf.ª A. e Enf.º N. como contrato individual de trabalho, por exercerem funções de chefia, devendo ser considerado trabalho subordinado, porquanto todos os índices de autonomia verificados nos demais enfermeiros que permitiram dizer que não tinham natureza laboral também ocorrem nestes dois prestadores de serviço, não havendo qualquer relação hierárquica em relação a estes dois enfermeiros, o controlo por eles feito é apenas para efeito de controlo de pagamentos, a articulação entre médicos e enfermeiros, aonde se inclui as disponibilidades temporais, inserem-se no âmbito da coordenação técnica e não jurídica, sendo a coordenação destes enfermeiros meramente técnica, a inserção de tais enfermeiros não é na estrutura organizativa da recorrente (…). Vejamos, Para assim pugnar remete para os pontos 36, 47 e 49 do acervo factual provado. Ora, desde já se adianta que os factos provados apontados pela recorrente não permitem uma leitura tão benigna como aquela que pretende trazer ao processo, com efeito o que deles consta é que que os prestadores de serviços registaram a sua assiduidade em sistema métrico ou em folhas para efeitos de controle de pagamentos e que o enfermeiro N. é responsável pela coordenação do pessoal de enfermagem do serviço de diálise (não fazendo destrinça entre pessoal de enfermagem em regime laboral ou não) procedendo à elaboração dos mapas e à afetação dos profissionais por doente e ambos enfermeiros (N. e A.) coordenam os processos técnicos dos serviços em conformidade com a diretrizes emanadas pelos gestores de unidade. O que se colhe destes enunciados é que estes enfermeiros são coordenadores e integram o desenho funcional e de gestão da clínica sob alçada dos seus superiores na gestão de pessoal. Por outro lado, motivou a sentença, não impugnado pela recorrente que a enfermeira mostra uma total integração na estrutura da clínica permitindo, no quadro do que acima se expendeu no recurso do ISS, concluir que em relação a estes há uma maior aproximação ao contrato de trabalho e vai de encontro ao que estatuiu o art. 12.º do CT, cabendo à recorrente ilidir a presunção decorrente da norma. Também aqui improcede o recurso da recorrente (...). * 5. DECISÃONestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento a ambos os recursos, mantendo-se a decisão recorrida. Custas pelos recorrentes. Notifique-se. Porto, 11 de novembro de 2021 Cristina da Nova Cristina Bento Celeste Oliveira ________________________________________ i) No sentido do texto Ac. do TCASul no processo 07219/13 de 29/5/2014, disponível no site da dgsi. ii) Cfr. AC. do STJ de 16-01-2008 disponível em www.dgsi.pt iii) Em vigor a partir de 2009. iv) Ac. do STJ de 14-11-1986, in BMJ n.º 361º pág. 410. v) Neste sentido veja-se o Ac. de 09-09-2015 do STJ, no recurso 3292/13, 4.ª secção, disponível em www.dgsi.pt vi)Ac. do STA de 10-01-2007 no rec. n.º 0646/06; Acs. do TCA SUL de 5-11-2020, processo 886/17 e de 13-05-2021 no processo 648/09. vii) Código do Trabalho |