Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01961/21.1BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/20/2022
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Paulo Moura
Descritores:ARRESTO. FUNDADO RECEIO DA DIMINUIÇÃO DE GARANTIA DE COBRANÇA DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS.
REPETIÇÃO DE UMA LESÃO NO DIREITO DO CREDOR TRIBUTÁRIO.
Sumário:O fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis, não se limita à verificação de atos demonstrativos de dissipação ou ocultação de bens ou a intenção de subtrair bens ao património, mas também a uma série comportamentos que indiciam uma intenção séria e grave de não pagar impostos ou à repetição de uma lesão no direito do credor tributário.
Recorrente:A., LDA
Recorrido 1:Fazenda Pública
Votação:Unanimidade
Decisão:
Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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A., LDA., interpõe recurso da sentença que decretou o arresto, por entender que não estão preenchidos os pressupostos para o decretamento do mesmo.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
A. as presentes alegações de recurso, e respetivas conclusões, versarão sobre questões de direito; e no que a estas diz respeito, toda a argumentação assentará na demonstração que falta o requisito do “periculum in mora”, sem o qual não se poderá decretar a presente providência cautelar.
B. para ser decretado um arresto, necessário será a verificação de dois requisitos cumulativos, a saber: i) verosimilhança do direito de crédito; ii) e, existência de perigo de demora, devido ao facto de o devedor poder alienar bens que seriam suscetíveis de ser penhorados para garantia do crédito.
C. No que tange ao “perigo da demora”, inexiste um qualquer facto que sustente tal conclusão.
D. O tribunal a quo, apesar de ter enquadrado bem a questão no que respeita à inexistência da presunção do art. 136º, n.º 5 do CPPT; o certo é que, no momento em que se impunha concluir que não existia – nem existe – “perigo da demora”, contrariamente àquilo que se esperava, o Meritíssimo Juiz concluiu, com base em considerações falaciosas, que “existe um fundado receio da diminuição da garantia de cobrança de créditos tributário”.
E. Para que o Tribunal pudesse concluir pela existência do requisito “periculum in mora”, ter-se-ia de aferir antecipadamente se existiam – ou não – atos demonstrativos de dissipação ou ocultação de bens, por banda da requerida arrestada.
F. Se calcorrearmos e analisarmos, facto por facto, dos 36 itens dados como assentes que constituem o relatório da fundamentação factual da sentença; constatamos que nenhum deles habilita o Tribunal a concluir pelo “periculum in mora”.
G. Abrantes Geraldes (in Temas da Reforma do Processo Civil, 4º vol., pág. 187): “o critério de avaliação deste requisito (periculum in mora) não deve assentar em juízos puramente subjetivos do juiz ou do credor (isto é, em simples conjeturas, como refere Alberto Reis), antes deve basear-se em factos e em circunstâncias que, de acordo com as regras da experiência, aconselha a uma decisão cautelar imediata, como fator potenciador da eficácia...”
H. “O despacho que decretou o arresto se limita a uma mera conclusão de receio sem base em factos alegados e provados pela Fazenda Pública, o arresto tem que ser levantado. (Cfr. acórdão TCAN, processo 00110/04.5TF09918, proferido em 24/02/2005, cujo Relator é Valente Torrão).
I. O Tribunal a quo assentou o seu juízo em critérios “meramente subjetivos” e em “conjeturas”; pois que, concluiu que a requerida “atua de forma deliberada tendo em vista lesar o erário público o que, à luz das regras de experiência comum, permite supor que, com elevado grau de probabilidade, procurará também furtar-se ao pagamento do imposto que vier a ser liquidado já que a sua conduta denota um comportamento doloso face ao Estado”.
J. A requerida não tem nenhum “comportamento doloso face ao Estado” (como irá demonstrar em sede própria); e, salvo melhor entendimento, não é através deste método que se afere a existência de “perigo da demora”.
K. No rol dos factos provados, não se encontra nenhum resquício factual que permita ao Tribunal extrair a conclusão de que a requerida arrestada irá “furtar-se” ao pagamento dos tributos que vierem a ser liquidados contra si.
L. Nestes termos, pugnamos pelo levantamento do arresto decretado; porquanto inexistem factos provados (no rol de 36) que demonstrem, ou permitam concluir, pela existência de “perigo da demora”.
Termos em que, as presentes alegações e respetivas conclusões deverão ser julgadas procedentes; e, por consequência, deverão Vossas Excelências determinar o levantamento do arresto decretado através do despacho aqui recorrido; pois, só assim se fará a habitual e almejada....
Justiça!

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente, por considerar estar verificado o requisito de fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributários.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância das Exmas. Desembargadoras Adjuntas, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).
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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se estão preenchidos os pressupostos para o decretamento do arresto sobre os bens da Recorrente, mais concretamente se está satisfeito o requisito do fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis, também designado por periculum in mora.
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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
3. FUNDAMENTAÇÃO
FACTOS PROVADOS
Com relevância para a decisão a proferir, consideram-se indiciariamente provados os seguintes factos:
1) A “A., LDA.”, NIPC (…), ora requerida, é uma sociedade comercial por quotas constituída em 21-11-2008, que tem como objecto social o “fabrico, comércio, importação e exportação de artigos têxteis e confecção, tinturaria e acabamento de artigos têxteis e de vestuário” (cfr. certidão permanente de registo comercial a fls. 14-25 do PA);
2) O capital social da requerida ascende à quantia de 600.000,00 €, estando distribuído do seguinte modo: uma quota no valor de 330.000,00 € pertencente a A.G, NIF (…) e duas quotas pertencentes a B., NIF (…), uma no valor de 12.000,00 € e outra no valor de 258.000,00 € (cfr. certidão permanente de registo comercial a fls. 14-25 do PA);
3) A requerida iniciou a sua actividade em 01-04-2009, estando registada para o exercício da actividade de “fabricação de tecidos de malha” (CAE 13910) (cfr. página 3 do PRIT inserto no PA);
4) Actualmente a requerida está registada para o exercício das seguintes actividades:
TipoCódigoDesignaçãoData de Início
CAE Principal13301BRANQUEAMENTO E TINGIMENTO2019-04-24
CAE Secundário 1014390FABRICAÇÃO DE OUTRO VESTUÁRIO DE MALHA2019-04-24
CAE Secundário 2035112PRODUÇÃO DE ELECTRICIDADE DE ORIGEM TÉRMICA2019-12-16
(cfr. página 3 do PRIT inserto no PA);
5) A requerida está colectada em Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) no regime normal de periodicidade mensal e no regime geral de determinação do lucro tributável para efeitos de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) (cfr. página 3 PRIT inserto no PA);
6) A.S., NIF (...), é o gerente de facto e de direito da requerida (cfr. certidão permanente de registo comercial a fls. 14-25 do PA, página 3 do PRIT inserto no PA e respectivos anexos nºs 1, 6, 9, 10, 11, 12, 21, 31 e 34);
7) A.S., NIF (...), é pai de A.G, NIF (...) (cfr. página 3 do PRIT inserto no PA);
8) A.S., NIF (...), apresentou declarações de IRS relativas aos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020 nas quais declarou rendimentos da categoria A de 6.684,00 €, 6.902,00 €, 5.400,00 € e 7.620,00 €, respectivamente, não dispondo de bens móveis ou imóveis registados em seu nome (cfr. página 3 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA);
9) A.S., NIF (...), foi gerente da sociedade “A.”, NIF (…), a qual foi cessada oficiosamente em IRC em 31-12-2011 (cfr. página 3 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA);
10) A requerida contabilizou, nos anos de 2017 e 2018, facturas emitidas pelas sociedades “C., Lda.” (doravante apenas “C.”), NIF (...), e “T., Lda.” (doravante apenas “T.”), NIF (…), nos seguintes montantes:
EmitenteAnosValor baseIVATotal
C. LDA2017385.280,0088.614,40473.894,40
C. LDA2018314.120,0072.247,60386.367,60
T. LDA2017384.710,0088.483,30473.193,30
T. LDA2018314.020,0072.224,60386.244,60
Totais1.398.130,00321.569,901.719.699,90
(cfr. páginas 9-10 e 12-44 do PRIT inserto no PA e respectivos anexos nºs 4, 5, 7 e 8);
11) As sociedades “C.” e “T.” iniciaram actividade em 01-10-2016 e na mesma data celebraram contratos de prestação de serviços de mão de obra com a requerida os quais apresentavam o mesmo teor (cfr. contratos a fls. 132-134 e 157-159 do PA);
12) Segundo a informação registada no sistema e-fatura, as sociedades “C.” e “T.” só emitiram facturas à requerida (cfr. páginas 12 e 16 do PRIT inserto no PA);
13) As facturas referidas na alínea 10) foram emitidas com o valor da quantidade 1, independentemente do valor facturado, não contêm a quantificação e valorização por tipo de serviço prestado e não descrevem o número de trabalhadores, o número de dias e/ou o número de horas trabalhadas (cfr. anexos nºs 4, 5, 7 e 8 do PRIT inserto no PA);
14) As sociedades “C.” e “T.” tiveram, em 2017 e 2018, como único gerente M., NIF (…) (cfr. página 22 do PRIT inserto no PA e informação disponível publicamente no “Portal da Justiça” [https://publicacoes.mj.pt/pesquisa.aspx]);
15) As sociedades “C.” e “T.” cumpriram com as suas obrigações declarativas em sede de IVA mas não entregaram o imposto apurado nos cofres do Estado (cfr. página 22 do PRIT inserto no PA);
16) As sociedades “C.” e “T.” efectuaram retenções na fonte de IRS, decorrente do processamento de salários de trabalhadores sob as ordens directas da requerida, mas não entregaram o imposto retido nos cofres do Estado (cfr. página 22 do PRIT inserto no PA e respectivo anexo nº 1 e página 4 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA);
17) O IVA liquidado em cada uma das facturas referidas na alínea 10) é sempre superior a 7.000,00 € e inferior a 7.500,00 € (cfr. anexos nºs 4, 5, 7 e 8 do PRIT inserto no PA);
18) A requerida contabilizou, nos anos de 2017 e 2018, facturas emitidas pela sociedade “E., Lda.” (doravante apenas “E.”), NIF (…), nos seguintes montantes:
AnosValor baseIVATotal
2017193.378,5044.477,06237.855,56
2018273.679,4962.946,28336.625,77
Total467.057,99107.423,34574.481,33
(cfr. páginas 6-7 do PRIT inserto no PA e respectivos anexos nºs 2 e 3);
19) As facturas referidas na alínea anterior foram emitidas com o valor da quantidade 1, independentemente do valor facturado, não contêm informação quanto à forma como é feita a estimativa da energia consumida e não fazem referência ao número de horas e dias em que a energia é disponibilizada nem o valor da temperatura (cfr. anexos nºs 2 e 3 do PRIT inserto no PA);
20) A sociedade “E.” tem como sócio e único gerente A.G, NIF (...) (cfr. página 8 do PRIT inserto no PA e informação disponível publicamente no “Portal da Justiça” [https://publicacoes.mj.pt/pesquisa.aspx]);
21) A requerida contabilizou as facturas referidas nas alíneas 10) e 18), tendo deduzido o IVA nelas contido e tendo-as considerado como os gastos para efeitos de IRC (cfr. página 1 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA);
22) A requerida foi submetida, ao abrigo das ordens de serviço nº OI202100166, de 16-02-2021, e nº OI202100648, de 17-05-2021, a um procedimento inspectivo externo de âmbito parcial (IVA e IRC) relativo aos períodos de 2017 e 2018 (cfr. página 2 do PRIT inserto no PA);
23) A.S., NIF (...), prestou declarações no dia 29-04-2021, no âmbito do procedimento inspectivo referido na alínea 22), as quais foram reduzidas a auto de cujo teor se destaca o seguinte:
Questão 6: Os trabalhadores da C., LDA e da T.,3377
LDA recebiam ordens / eram supervisionados por quem?
Resposta: Os trabalhadores recebiam ordens diretas da A., Lda, e eram supervisionados pela A., Lda. à semelhança dos colaboradores diretos da A., Lda. O processamento de salários era inclusivamente efetuado nas instalações A., Lda. e os pagamentos dos salários eram efetuados por transferência bancária diretamente da conta bancária da A.,Lda. para as contas dos trabalhadores (inclusive para o próprio gerente comum das duas entidades que era o sr. M.C, também ele incluído na cedência de pessoal, o qual tinha essencialmente funções de manutenção de equipamento).
Os trabalhadores que estavam alocados a estas entidades subcontratadas eram trabalhadores da insol­vente A.C., LDA. Por sugestão do administrador de insolvência, e uma vez que a A., Lda não queria assumir a totalidade dos trabalhadores, foram os mesmos alocados àquelas entidades.
(cfr. anexo nº 1 do PRIT inserto no PA);
24) Foi elaborado, com data de 24-09-2021, o projecto de relatório de inspecção tributária (PRIT) relativo ao procedimento inspectivo referido na alínea 22), tendo os serviços de inspecção tributária (SIT) concluído pela necessidade de proceder a correcções aritméticas em sede de IVA e de IRC e à aplicação de métodos indirectos em sede de IRC, nos termos e com fundamento nos factos descritos nos pontos III (“descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável”), IV (“motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos”) e V (“critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indiretos”) do projecto de relatório, tendo tais correcções sido quantificadas do seguinte modo:
Correcções meramente aritméticas em IVA – deduções indevidas
PeríodoQuantia (€)PeríodoQuantia (€)
2017/0115.982,742018/0118.286,15
2017/0216.245,842018/0218.743,60
2017/0316.806,102018/0317.701,23
2017/0420.437,782018/0419.576,71
2017/0519.191,142018/0518.716,02
2017/0619.591,172018/0617.758,33
2017/0720.179,482018/0720.656,51
2017/0819.788,892018/0820.595,77
2017/0917.121,922018/0916.719,33
2017/1018.423,942018/1020.830,38
2017/1118.254,232018/117.724,59
2017/1219.551,532018/1210.109,86
Totais221.574,76Totais207.418,48
Correcções meramente aritméticas em IRC – Imposto em falta
DescriçãoAno
20172018
Correcção à dotação de benefícios fiscais – RFAI119.361,9795.000,00
Correcção à dedução de benefícios fiscais – DLRR11.808,060,00
Totais131.170,0395.000,00
Correcções por métodos indirectos em IRC
DescriçãoAno
20172018
Lucro tributável declarado277.772,4955.888,42
Lucro tributável corrigido253.837,76172.278,51
Correcção- 23.934,73116.390,09
(cfr. páginas 1 e 6-42 do PRIT inserto no PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
25) Os SIT remeteram à requerida o ofício nº 523.4259, de 27-09-2021, tendo em vista o exercício do direito de audição relativo ao PRIT referido na alínea anterior (cfr. fls. 33 do PA);
26) Não existem bens imóveis registados em nome da requerida (cfr. página 2 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA);
27) A requerida é proprietária dos seguintes bens registados no seu activo fixo tangível:
CódigoDescriçãoData de
aquisição
Valor de
aquisição

(€)
Depreciações
acumuladas
em 30-09-2021

(€)
Valor
contabilístico
(€)
Secadeira Industrial “MAPT”30-09-2019200.000,0059.500,00140.500,00
1002300Jet Overflow “MAPT”09-10-2018190.000,0081.396,00108.604,00
1002290Jet Overflow “MAPT”09-10-2018190.000,0081.396,00108.604,00
100208050-SQ-96 – Nissan30-04-201721.406,9621.406,960,00
1001830Máquina de tingir amostras
“AHIBA”
01-07-201611.660,008.741,502.918,50
1001770Máquina de abrir malha
tubular “Corino”
17-07-201540.000,0035.700,004.300,00
1001780Râmola “Bruckner”31-12-2015174.828,78145.632,3729.196,41
(cfr. página 11 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA, e listagem anexa).
28) Encontram-se pendentes, em nome da “C., Lda”, diversos processos de execução fiscal (PEF) instaurados pela AT para cobrança da quantia total de 400.659,21 € (cfr. página 5 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA);
29) Encontram-se pendentes, em nome da “T., Lda”, diversos PEF instaurados pela AT para cobrança da quantia total de 395.765,57 € (cfr. página 5 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA);
30) Os PEF referidos nas duas alíneas anteriores encontram-se declarados em falhas (cfr. página 5 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA);
31) A requerida foi notificada de uma penhora de créditos efectuada no âmbito dos PEF nº 0450201701008579 e apensos e nº 0450201701110012 e apensos, instaurados contra a “T., Lda”, tendo respondido que não reconhecia o crédito decorrente das facturas emitidas porque os valores devidos à executada não eram pagos à executada, mas sim directamente aos trabalhadores cedidos (cfr. página 5 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA);
32) O Serviço de Finanças de F…1 determinou, por despacho de 23-10-2019, que a requerida fosse executada no âmbito do PEF nº 0450201701008579 e apensos, ao abrigo do disposto no art.º 224º, nº 1, al. b), do CPPT, para pagamento da quantia de 139.777,22 €, tendo a requerida reagido judicialmente contra tal despacho por via da instauração de um processo de reclamação dos actos do órgão da execução fiscal, o qual foi autuado neste TAF sob o nº 1…./20.9BEBRG e julgado improcedente por sentença já transitada em julgado (facto de que o Tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções, nomeadamente através da consulta ao SITAF);
33) A requerida foi notificada de uma penhora de créditos efectuada no âmbito do PEF nº 0450201701020137 e apensos, instaurados contra a “C., Lda.”, tendo respondido que não reconhecia o crédito decorrente das facturas emitidas porque os valores devidos à executada não eram pagos à executada, mas sim directamente aos trabalhadores cedidos (facto de que o Tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções, nomeadamente através da consulta ao SITAF);
34) O Serviço de Finanças de F… 1 determinou, por despacho de 23-10-2019, que a requerida fosse executada no âmbito do PEF nº 0450201701020137 e apensos, ao abrigo do disposto no art.º 224º, nº 1, al. b), do CPPT, para pagamento da quantia de 152.827,50 €, tendo a requerida reagido judicialmente contra tal despacho por via da instauração de um processo de reclamação dos actos do órgão da execução fiscal, o qual foi autuado neste TAF sob o nº 7.../20.1BEBRG (facto de que o Tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções, nomeadamente através da consulta ao SITAF);
35) A requerida foi executada no âmbito dos PEF referidos na alínea 31), tendo lhe sido penhorados, em 13-08-2021, os seguintes bens:
Verba 1 – uma máquina Jet Mapt, modelo 250, adquirida em estado de nova em 31-03-2015, identificada na ficha de imobilizado com o código 1001640 e valor contabilístico de 27.898,00 €;
Verba 2 – uma máquina Jet Mapt, modelo 150, adquirida em estado de nova em 31-03-2015, identificada na ficha de imobilizado com o código 1001650 e valor contabilístico de 21.460,00 €;
Verba 3 – uma máquina Jet Mapt, modelo 150, adquirida em estado de nova em 31-03-2015, identificada na ficha de imobilizado com o código 1001660 e valor contabilístico de 21.460,00 €;
Verba 4 – uma máquina Jet Mapt Overflow, adquirida em estado de nova em 30-09-2019, identificada na ficha de imobilizado com o código 1001870 e valor contabilístico de 53.610,00 €;
(cfr. auto de penhora de bens móveis a fls. 362 do PA);
36) As correcções propostas no âmbito do PRIT correspondem, em sede de IRC, a imposto a liquidar na quantia aproximada de 65.434,40 € (cfr. página 10 da informação a que se refere o art.º 31º, nº 2, do RCPITA, inserta no PA).
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FACTOS NÃO PROVADOS
Não existem factos a dar como não provados com interesse para a decisão a proferir.
*
MOTIVAÇÃO
O Tribunal formou a sua convicção relativamente a cada um dos factos dados como indiciariamente provados tendo por base o exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, conforme especificado em cada uma das alíneas do probatório.
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Apreciação jurídica do recurso.

A Recorrente alega que os factos julgados provados não são suficientes para justificar o decretamento do arresto, pois não está demonstrado o “perigo de demora”, uma vez que o tribunal não aferiu se existiam ou não atos demonstrativos de dissipação ou ocultação de bens, sendo que nenhum dos factos elencados denota a intenção de subtrair bens ao património, por isso nenhum dos factos habilita o tribunal a extrair a conclusão (através de presunção judicial) de que existe “periculum in mora”, tendo a decisão sido preferida com base em conjeturas, inexistindo resquício factual que permita ao tribunal extrair a conclusão de que a recorrente irá “furtar-se” ao pagamento dos tributos que vierem a ser liquidados.
Mais refere que se pode concluir que as liquidações adicionais resultantes da fiscalização efetuada não são devidas, por isso deve ser levantado o arresto, porquanto inexistem factos provados que denotem ou permitam concluir pelo “perigo da demora”.

O Código de Procedimento e Processo Tributário, estabelece como requisitos do arresto.
Artigo 136.º (Requisitos do arresto)
1 - O representante da Fazenda Pública pode requerer arresto de bens do devedor de tributos ou do responsável solidário ou subsidiário quando ocorram, simultaneamente, as circunstâncias seguintes:
a) Haver fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis;
b) O tributo estar liquidado ou em fase de liquidação.
2 - Nos tributos periódicos considera-se que o tributo está em fase de liquidação a partir do final do ano civil ou de outro período de tributação a que os respectivos rendimentos se reportem.
3 — Nos tributos de obrigação única, o tributo considera-se em fase de liquidação a partir do momento da ocorrência do facto tributário. (redação da Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro)
4 - O representante da Fazenda Pública alegará os factos que demonstrem o tributo ou a sua provável existência e os fundamentos do receio de diminuição de garantias de cobrança de créditos tributários, relacionando, também, os bens que devem ser arrestados, com as menções necessárias ao arresto.
5 - As circunstâncias referidas na alínea a) do n.º 1 presumem-se no caso de dívidas por impostos que o devedor ou responsável esteja obrigado a reter ou a repercutir a terceiros e não haja entregue nos prazos legais.

Em função do alegado pela recorrente, verifica-se que a mesma apenas recorre na parte em que considera não estar demonstrado o periculum in mora, deixando de fora do recurso a parte relativa à aparência do direito.
Ora, em relação ao periculum in mora, a sentença recorrida fundamentou o decretamento do arresto da seguinte forma:
«Dada por assente a existência de fumus boni iuris, importa agora aferir se, no caso em análise, há uma probabilidade séria, fundada em factos objectivos, de diminuição do património dos responsáveis pelo pagamento da dívida tributária a ponto de este se tornar insuficiente para a sua satisfação.
Cumpre, portanto, aferir da existência, ou não, da prática de actos por parte do devedor dos quais se possa concluir, de acordo com as regras da experiência comum, que o mesmo se prepara para sonegar, ocultar ou desfazer-se do seu património, ou, por outra via, colocar os bens em situação que torne difícil ou obste à cobrança do crédito fiscal.
Tal como já tivemos oportunidade de referir, incumbe ao RFP, ainda que indiciariamente, a alegação e a prova de factos que sustentem o fundado receio de perda da garantia patrimonial do crédito tributário, isto é, demonstrativos de que a requerida está prestes a colocar-se numa situação susceptível de impedir que o seu património possa responder pelas dívidas tributárias em causa (art.ºs 342º do CC, 74º, nº 1, da LGT, 392º, nº 1, do CPC e 136º, nº 4, do CPPT).
Citando novamente Jorge Lopes de Sousa, diremos que “[d]everá haver um perigo logicamente justificado, uma probabilidade séria, com fundamentos objectivos baseados em regras de experiência comum, de que os patrimónios dos titulares de bens que servem de garantia à cobrança de créditos tributários (devedor originário, responsável solidário e responsável subsidiário) diminuam de valor a ponto de se tornarem insuficientes para cobrança dos créditos tributários. Nas hipóteses mais frequentes, tratar-se-á de situações em que, com base nas regras de experiência comum, seja de considerar provável que aqueles titulares de bens se preparem para criar uma situação em que seja inviável accionar os seus patrimónios para cobrança das dívidas, designadamente ocultando-os ou transferindo-os para a titularidade de pessoas que não possam ser accionadas para efectivar essa cobrança. Porém, a exigência de que o receio seja «fundado» impõe que não se possa considerar suficiente para decretar o arresto a mera convicção subjectiva e intuitiva do julgador, sendo necessário que essa convicção se alicerce em elementos indiciários objectivos existentes no processo, que apontem no sentido de o devedor ou responsável pretender alienar ou sonegar ou ocultar bens que devem servir de garantia do crédito tributário” (ibidem., p. 447).
Estes elementos indiciários objectivos “não se confundem necessariamente com «acções» ou «omissões» do devedor [pois] não é necessário que o devedor pratique actos conducentes à ocultação de bens ou à sua insolvência, nem tão pouco que se venha a consumar a ocultação de bens, ou a insolvência do devedor para que se verifique um «justo receio»”, podendo o justo receio ser “apurado perante as circunstâncias concretas do caso de acordo com o sentir do homem comum. Se para o homem comum for previsível, perante as especificidades da situação, que o devedor, irá sonegar os bens para pagamento da dívida exequenda, então o receio é fundado. Por outro lado, não se exige, perante a natureza cautelar do arresto a certeza inequívoca quanto à existência do perigo (…) [já que o] fundado receio, porque dirigido para o futuro, assenta necessariamente num juízo de probabilidade(cfr. o acórdão do TCAN de 26-09-2013, proferido no âmbito do processo nº 01252/12.9BEPRT).
No caso dos autos considera a RFP que se deverá dar por assente a verificação do requisito relativo ao fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributários na medida em que os factos apurados no âmbito do procedimento inspectivo indiciam que as sociedades “C.” e “T.” foram constituídas no interesse da requerida e tendo em vista o seu financiamento à custa do erário público, já que o IVA mencionado nas facturas emitidas por estas sociedades é deduzido pela requerida e as sociedades emitentes, por sua vez, não entregam nos cofres públicos o IVA liquidado, sem que possam ser penalmente responsabilizadas atentos os valores em causa (inferiores a 7.500,00 €), ao que acresce ainda a circunstância de por esta via a requerida evitar a entrega ao Estado das retenções na fonte de IRS relativas aos trabalhadores que se encontram ao seu serviço, situação de que não poderá deixar de ter conhecimento dado que o gerente nomeado nas referidas sociedades é um dos seus trabalhadores, ao que acresce ainda a “conduta no sentido de não responder pelas dívidas geradas” na esfera das sociedades “C.” e “T.”.
A tese da Fazenda Pública é, portanto, a de que a requerida actua de forma deliberada tendo em vista lesar o erário público o que, à luz das regras de experiência comum, permite supor que, com elevado grau de probabilidade, procurará também furtar-se ao pagamento do imposto que vier a ser liquidado já que a sua conduta “denota um comportamento doloso face ao Estado”.
Atendendo à matéria de facto alegada e indiciariamente provada, este Tribunal entende que a tese da Fazenda Pública se mostra suficientemente indiciada e, concomitantemente, considera que se deverá dar por assente que existe um fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributários, pois tendo resultado provados factos que “reflectem um comportamento por parte do contribuinte no sentido de prejudicar a Fazenda Pública” tal “permite prever um comportamento (…) no sentido de se furtar ao pagamento a que vier a ser chamado(cfr. acórdão do TCAN de 14-09-2017, proferido no processo nº 00213/17.6BEPNF).».
Temos de concordar com a fundamentação e decisão da sentença, na medida em que o fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis, não se limita à verificação de atos demonstrativos de dissipação ou ocultação de bens ou a intenção de subtrair bens ao património, mas também a uma série comportamentos que indiciam uma intenção séria e grave de não pagar impostos.
Veja-se sobre o assunto, o Acórdão deste TCA Norte de 26/09/2013, proferido no processo n.º 01252/12.9BEPRT (disponível em www.dgsi.pt), o qual a dado passo refere o seguinte:
Para que o arresto seja decretado terá de haver uma probabilidade séria, fundada em factos objectivos, de diminuição do património dos responsáveis pelo pagamento da dívida tributária a ponto de este se tornar insuficiente para a sua satisfação. O receio tem de ser justo, no sentido de fundamentado em factos concretos que levem a inferir, de acordo com as regras da experiência, que haverá o perigo de a dívida tributária não ser cobrada por insuficiência do património do devedor.
Não basta, assim, a alegação de meras convicções ou desconfianças de carácter subjectivo. É preciso que haja razões objectivas, convincentes, capazes de explicar a pretensão drástica do requerente que vai subtrair os bens ao poder de livre disposição do seu titular” (Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, II, 4ª edição, página 453).
E estas razões objectivas não se confundem necessariamente com “acções” ou “omissões” do devedor – não é necessário que o devedor pratique actos conducentes à ocultação de bens ou à sua insolvência, nem tão pouco que se venha a consumar a ocultação de bens, ou a insolvência do devedor para que se verifique um “justo receio”.
O justo receio há-se ser apurado perante as circunstâncias concretas do caso de acordo com o sentir do homem comum. Se para o homem comum for previsível, perante as especificidades da situação, que o devedor, irá sonegar os bens para pagamento da dívida exequenda, então o receio é fundado.
Por outro lado, não se exige, perante a natureza cautelar do arresto a certeza inequívoca quanto à existência do perigo - – Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol. III, Procedimento Cautelar Comum, página 88. O fundado receio, porque dirigido para o futuro, assenta necessariamente num juízo de probabilidade.
No mesmo sentido diversa jurisprudência deste TCA Norte, como por exemplo, os seguintes acórdãos: processo n.º 00213/17.6BEPNF, de 14/09/2017; processo n.º 575/20.8BEBRG, de 05/11/2020; e processo n.º 453/20.BEAVR, de 19/11/2020.

No caso concreto, foi verificada uma conduta de gestão em que a Recorrente participou num esquema montado com o intuito de se financiar junto do Estado pela via da dedução de IVA não entregue pelas empresas emitentes de faturas, mas deduzido pela Recorrente, sem que as pessoas envolvidas no referido esquema possam incorrer em responsabilidade criminal, ao que acresce uma conduta reiterada no sentido de não responder pelas dívidas tributárias.
Ora, este tipo de atuação, só por si indicia que a Recorrente já se está a “furtar” aos tributos antes da sua liquidação, quando engendrou um esquema de faturação que lhe permite deduzir o IVA indevidamente, assim como tendo contabilizado as faturas como despesas para efeitos de IRC – vide ponto 21) da matéria de facto.
Assim, conforme dado por assente nos pontos 10) a 17), verifica-se que a Recorrente contabilizou faturas, emitidas por duas empresas como sendo relativas a prestação de serviços de mão de obra, as quais foram emitidas com o valor da quantidade 1, independentemente do valor facturado, não contêm a quantificação e valorização por tipo de serviço prestado e não descrevem o número de trabalhadores, o número de dias e/ou o número de horas trabalhadas – vide ponto 13) da matéria de facto. Para além disso, as empresas emitentes, apenas emitiram faturas à Recorrente, tendo ambas o mesmo e único gerente, não entregaram o IVA devido, nem o IRS retido aos trabalhadores. Verifica-se, ainda, que o valor do IVA é sempre superior a € 7.00,00 e inferior a € 7.500,00.
Resulta, ainda, que as faturas não descrevem o número de trabalhadores que terão prestado os serviços de mão de obra, nem demais elementos que permitam aquilatar pela veracidade dos valores faturados.
Para além disso, o gerente da Recorrente, admitiu, em sede de inspeção tributária, que pagava diretamente aos trabalhadores, inclusive ao gerente comum às duas empresas, que também estava cedido à Recorrente – vide ponto 23) da matéria de facto. Portanto, cabe concluir que se foram pagos diretamente os trabalhadores, então não foram pagas as faturas às empresas emitentes; logo não terá sido pago o IVA. Isto porque, se pagou diretamente aos trabalhadores, estes não recebem IVA com o seu salário. A ser assim, seria então apenas pagaria o IVA constante das faturas às empresas emitentes das faturas, mas sobre o assunto o gerente da Arrestada nada disse. Para além disso, sabe-se que não foi entregue ao Estado o valor do IVA correspondente às faturas.
Ora, conforme decorre do n.º 1 do artigo 105.º do RGIT – Regime Geral das Infrações Tributárias, apenas a prestação tributária superior a € 7.500,00, deduzida nos termos da lei é passível de pena de prisão. Daqui resulta, que se pode admitir a existência de um modus operandi, conducente a não entregar o IVA ao Estado, sem que possa haver sanção penal. Ainda que esta situação se refira às empresas que emitem as faturas e não à Recorrente, atento o valor faturado (sempre entre os € 7.00,00 e os a € 7.500,00) e a regularidade dessa prática, é indiciário de que a Arrestada é conivente com essa situação, até mesmo beneficiária, através da dedução do IVA (dedução que a AT considera indevida, por as faturas não terem sido emitidas pela forma legal) e da contabilização dessas faturas como custos em sede de IRC – vide ponto 21) da matéria de facto.
Para além disso, a pessoa que está designada como gerente das empresas que emitem as faturas, afinal trabalha para a Recorrente e é paga diretamente por esta, conforme reconheceu o gerente da Arrestada – vide ponto 23) da matéria de facto; o que faz presumir uma relação de dependência económica entre a pessoa que emite as faturas e a Recorrente.
Por outro lado, conforme dado por assente no ponto 32) da matéria de facto, a Arrestada tem contra si pendente um processo de execução fiscal para cobrança de € 139.777,22, tendo reagido contra tal execução através de uma reclamação dos atos do órgão de execução fiscal, que foi julgada improcedente.
Resulta, ainda, do ponto 34), que a Arrestada tem pendente outro processo de execução fiscal para pagamento da quantia de € 152.827,50, tendo, igualmente, reagido judicialmente através de uma reclamação dos atos do órgão de execução fiscal, cujo resultado se desconhece.
Verifica-se, ainda, que foram penhorados em sede de execução fiscal, vários bens à Recorrente, conforme se pode ver pelo que ficou assente no ponto 35) da matéria de facto.
Portanto, a Recorrente tem já em execução fiscal quantias assinaláveis, sendo que a penhora de bens também indicia resistência ao pagamento das quantias exequendas.
Por sua vez, em sede de inspeção tributária, resulta que foi apurado o valor de IRC de € 65.434,40, através da aplicação de métodos indiretos e correções meramente aritméticas.
Tendo em conta todo este tipo de condutas, que não são devidamente negadas pela Recorrente, na medida em que se limita a referir que na sede própria demonstrará que as liquidações adicionais resultantes da fiscalização não são devidas, é legítimo concluir-se que existe, uma falta de vontade de não pagar impostos, até mesmo uma intenção de não pagar impostos, o que só por si indicia fortemente que pretende furtar-se ao pagamento de qualquer liquidação que venha a ser emitida no âmbito da inspeção de que foi alvo.
Desta forma, os factos acima mencionados e que permitem concluir pela séria intenção de não pagar impostos, constam do probatório, ao invés do alegado pela Recorrente.
Por seu turno, conforme referido na sentença (pág. 14): «Olhando aos valores de aquisição dos bens indicados e às correspondentes depreciações acumuladas, constata-se que os mesmos apresentam um valor contabilístico de 394.122,91 € (cfr. facto provado 27)), pelo que o seu arresto não se afigura desproporcionado face aos créditos cuja cobrança se pretende acautelar, os quais ascendem à quantia total de 494.427,64 €.».
Resulta, assim, que os valores em liquidação são superiores ao património conhecido da Arrestada, o que por si só não seria fator suficiente para o arresto, mas atenta a já referida conduta da Arrestada em não cumprir reiteradamente com as suas obrigações fiscais, bem como em engendrar um esquema de se financiar junto do Estado pela via da dedução de IVA liquidado em faturas entendidas pela AT como não emitidas sob a forma legal (e o IVA não entregue ao Estado), sem que as pessoas envolvidas no referido esquema possam incorrer em responsabilidade criminal, demonstram o pressuposto do periculum in mora.
Veja-se o que sobre o assunto refere o Conselheiro Abrantes Geraldes, nos Temas da Reforma do Processo Civil, IV vol., 2.º ed., Almedina, 2003, a págs. 188:
«58.3. A actual ou iminente superioridade do passivo relativamente ao activo constituirá certamente um dos elementos através dos quais se pode reconhecer uma situação de perigo justificativa do arresto, embora deva ser afastado o funcionamento automático desse factor.».

Por fim, compete referir que o fundado receio na cobrança do crédito também se afere pela conduta de incumprimento sistemático do devedor.
Veja-se, novamente, o Conselheiro Abrantes Geraldes, nos Temas da Reforma do Processo Civil, III vol., 2.º ed., Almedina, 2000, ainda que a propósito das providências cautelares, onde efetua uma comparação com o arresto, a págs. 87:
«“Fundado receio” terá a mesma significação que a expressão utilizada no art. 406.º, n.º 1, do CPC, ou no art. 619.º do CC, que a propósito do arresto exigem, respectivamente, o “justificador receio” ou o “justo receio” de perda da garantia da verificação ou repetição de uma lesão no direito.».
Segundo o referido por este autor, a repetição de uma lesão no direito, é motivo para se considerar demonstrado o fundado receio na cobrança do crédito.
Ora, a Administração Tributária já tem pendente execuções fiscais contra a Recorrente, inclusive com penhora de bens, o que demonstra que a Arrestada já lesou o direito deste credor, sendo que foram apurados novos créditos em sede de inspeção tributária, pelo que, atento o historial de incumprimentos por parte da recorrente, nada indicia que a mesma tenha intenção de pagar voluntariamente as quantias agora apuradas em sede inspetiva. Aliás, a Recorrente, diz mesmo nas alegações de recurso, que as liquidações adicionais não são devidas.
Em face de tudo o exposto, resulta que se pode considerar estar satisfeito o requisito do fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis, também designado por periculum in mora, motivo pelo qual o recurso não merece provimento.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, elabora-se o seguinte sumário:

O fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis, não se limita à verificação de atos demonstrativos de dissipação ou ocultação de bens ou a intenção de subtrair bens ao património, mas também a uma série comportamentos que indiciam uma intenção séria e grave de não pagar impostos ou à repetição de uma lesão no direito do credor tributário.
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Decisão

Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente.
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Porto, 20 de janeiro de 2022.

Paulo Moura
Irene Isabel das Neves
Ana Paula Santos