Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00364/21.2BEMDL
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/21/2024
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:PAULA MOURA TEIXEIRA
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO A LIQUIDAR;
PRAZO DE CADUCIDADE; SUSPENSÃO DO PRAZO;
ALARGAMENTO DO PRAZO POR EFEITO DE INQUÉRITO CRIMINAL;
Sumário:
Da conjugação dos n.ºs 1 e 5 do art.º 45.º da LGT, o direito de liquidar o tributo caduca no prazo de 4 anos, porém sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Seção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, melhor identificados nos autos, não se conformou com a sentença emitida, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Mirandela, que julgou procedente a impugnação judicial intentada por [SCom01...], Lda., contra o ato de liquidação de IRC de 2016 no valor de 57.464,35 € e de IVA de 2016 no valor de 186.896,84 €, a que acrescem juros compensatórios de 27.793,02 €.

A Recorrente interpôs o presente recurso, formulando nas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…)

1.ª – O presente recurso vem dirigido contra a decisão que declarou anuladas as liquidações de IVA de 2016 e IRC do ano de 2026 e respetivos juros compensatórios por considerar caducado o direito à liquidação.
2ª – Contrariamente à conclusão a que chegou o Tribunal a quo, as liquidações impugnadas foram notificadas à impugnante no prazo de caducidade, ( nº 5 art. 45º da LGT) porquanto, o prazo de inicio do procedimento inspetivo conta-se, nos termos do art. 51º n 2 do RCPITA, com a entrega da cópia da ordem de serviço ou do despacho de, o que in casu , ocorreu em 07.09.2020.
3ª- Mesmo que não houvesse lugar à instauração do inquérito criminal, a caducidade do direito de liquidar apenas ocorreria a 14.06.2021 e a Impugnante foi notificada das liquidações de IRC, em 16.03.2020 e das liquidações de IVA, em 24.03.2021.

Termos em que concedendo-se provimento, ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare, a presente impugnação totalmente improcedente, com as devidas consequências legais. PORÉM V.EX.AS DECIDINDO FARÃO A ACOSTUMADA JUSTIÇA. .(…)”

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto deste tribunal emitiu parecer, aderindo às alegações da AT, defende que, merece provimento o recurso.

Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, submetendo-se à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pela Recorrente, a qual é delimitada pelas conclusões das respetivas alegações, sendo as de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao ter verificada a caducidade do direito às liquidações de IRC e IVA do ano de 2016.

3. JULGAMENTO DE FACTO
3.1. Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:”(…)
A. Em 28-02-2020, a Inspecção Tributária remeteu à Impugnante carta aviso relativamente a inspecção tributária a desenvolver relativamente a IVA e IRC do período de 2016, por carta registada (fls. 1.6 do processo inspectivo);
B. Em 11-12-2020, a Inspecção Tributária solicitou à Impugnante esclarecimentos sobre (relatório de inspecção tributária a fls. 3.1 e ss. do procedimento inspectivo):
a. Cópia do(s) correspondente(s) documento(s) de suporte (factura, factura-recibo, etc.);
b. Documento relativo ao lançamento contabilístico integral (contas SNC movimentadas a débito e a crédito);
c. Cópia de contrato(s) realizado(s) entre as empresas em causa ('[SCom01...]' e Fornecedor), subjacentes às operações identificadas no quadro;
d. No caso de inexistência de contrato(s) escrito(s) a que se refere a alínea anterior. identificar a(s) pessoa(s) que foi(ram) intertocutora(s) da(s) empresa(s) que interveio(ieram) na negociação/contratualização das operações patenteadas pelas facturas supracitadas;
e. Identificar/nomear quem efectivamente transmitiu e/ou prestou os serviços que estiveram na base das operações reflectidas no quadro anterior, bem como, descrever especificamente no que consistiram (por exemplo, relevar os equipamentos objecto da reparação, manutenção. pintura, mecânica e arranjos) e quando aplicável, identificar os recursos humanos utilizados e a descrição dos materiais aplicados para a execução e/ou realização das operações em causa;
f. A(s) forma(s) e o(s) meio(s) de pagamento utilizado(s) relativamente aos valores envolvidos nas mencionadas operações. com apresentação da correspondente prova documentar:
g. Quaisquer outros elementos de prova e/ou explicações. que permitam à Inspecção Tributária, aferir a realidade das operações. designadamente, quanto à sua real execução, quem foram os intervenientes e valores envolvidos.
C. Em 29-12-2020 deu entrada resposta da Impugnante ao pedido de informação supra com o conteúdo que infra se reproduz (relatório de inspecção tributária a fls. 3.1 e ss. do procedimento inspectivo):
1 - A complexidade e extensão do solicitado não lhe confere /empo suficiente, para a recolha, verificação e envio de dados:
2 - Acresce que esta firma terá que destacar, retirar, fotocopiar e digitalizar documento a documento, o que na sua totalidade não estão ao seu alcance, dado que;
3 - As execuções dos seus elementos estão a cargo e responsabilidade da contabilista «AA». com escritório em ..., segundo consta dos documentos oportunamente indicados à AT;
4 - É na sede deste contabilista que foram. entretanto. depositados todos os documentos e elementos de escrita, reportados ao ano em causa (2016);
5 - Documentos esses já presentes ao Sr. Perito fiscalizador, no momento do único encontro verificado entre o mesmo, o gerente desta firma e o seu contabilista, que melhor poderá informar ou esclarecer
D. Em 22-02-2021 a Impugnante recebeu o relatório final de inspecção tributária titulada pela ordem de serviço n.º OI2019....48, com o conteúdo que infra se reproduz (fls. 3.1 e ss. e 3.45 e ss. do procedimento inspectivo):
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
E. Em 22-02-2021 a Inspecção Tributária emitiu auto de notícia nos termos dos arts. 35.º e 57.º do RGIT e 243.º do CPP, com o conteúdo que infra se reproduz (fls. 3.37 e ss do procedimento inspectivo):
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

F. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...19, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201601, no valor de 8.641,39 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
G. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...20, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201602, no valor de 1.358,81 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
H. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...29, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201611, no valor de 3136 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
I. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...29, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201611, no valor de 19.115,58 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
J. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...30, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201612, no valor de 21.325,16 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
K. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...19, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201601, no valor de 1691,59 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
L. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...20, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201602, no valor de 7.001,22 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
M. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...21, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201603, no valor de 4.533,58 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
N. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...21, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201603, no valor de 23.747,97 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
O. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...22, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201604, no valor de 2.604,58 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
P. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...22, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201604, no valor de 13.915,00 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
Q. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...23, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201605, no valor de 3.684,03 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
R. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...23, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201605, no valor de 20.010,00 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
S. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...24, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201606, no valor de 3.410,30 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
T. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...24, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201606, no valor de 18.860,00 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
U. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...25, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201607, no valor de 2.445,43 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
V. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...25, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201607, no valor de 13.800,01 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
W. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...26, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201608, no valor de 1.782,13 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
X. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...26, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201608, no valor de 10.234,11 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
Y. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...27, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201609, no valor de 2.832,43 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
Z. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...27, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201609, no valor de 16.589,17 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
AA. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...28, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201610, no valor de 2.297,40 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
BB. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...28, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201610, no valor de 16.374,17 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
CC. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...29, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201611, no valor de 3.136,00 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
DD. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...29, dirigida à Impugnante, relativa a IVA do período de 201611, no valor de 19.115,58 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41)
EE. Em 25-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...30, dirigida à Impugnante, relativa a juros de IVA do período de 201612, no valor de 3.426,04 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41);
FF. Em 24-02-2021 foi emitida a liquidação n.º ...88, dirigida à Impugnante, relativa a IRC do período de 2016, no valor de 57.464,35 € (Resposta (123389) Resposta (004515952) Pág. 1 de 28/01/2023 14:17:41);
GG. Em 27-04-2021 deu entrada no Serviço de Finanças reclamação graciosa apresentada pela Impugnante, da liquidações supra identificadas e ora impugnadas (fls. 2 do processo de reclamação graciosa);
Com interesse para a decisão da lide, não há factos que cumpra julgar não provados.
A convicção do Tribunal formou-se com recurso aos meios de prova indicados junto de cada facto dado como provado (documentos juntos aos autos e não impugnados pelas partes – cf. 362.º e ss. do CC).
O demais alegado não foi nem julgado provado nem não provado por ser conclusivo, matéria de direito, ou não relevar para a decisão da causa. (…)”

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A Recorrente imputa à sentença recorrida erro de julgamento ao considerar verificada a caducidade do direito às liquidações de IRC e IVA, por errónea apreciação das disposições legais estatuídas nos artigos 36.º 46.º, 49.º e 51.º do RCPITA e na estreita violação do nº 5 do art.º 45º. da LGT.
Vejamos.
Dispõe o art.º 45.º da Lei Geral Tributária, que: “1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.
2 - No caso de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo o prazo de caducidade referido no número anterior é de três anos.
3 - Em caso de ter sido efetuada qualquer dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito.
4 - O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.
5 - Sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o n.º 1 é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.
6 - Para efeitos de contagem do prazo referido no n.º 1, as notificações sob registo consideram-se validamente efetuadas no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil.”
No caso presente não é controverso o prazo de 4 anos, nem a forma como se conta, o referido prazo.
Assim sendo, para o IRC do ano de 2016 e IVA do mesmo ano, os prazos de caducidade iniciaram-se em 31.12.2006 e em 01.01.2017, respetivamente e completar-se-ia em 31.12.2020 e 04.01.2021 (por força do artigo 279.º, alínea e) do CC.
Por sua vez, n.º 1 do art.º 46.º da LGT, estabelece que: “O prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo desde o seu início, caso a duração da inspeção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação, acrescido do período em que esteja suspenso o prazo para a conclusão do procedimento de inspeção.”
Porém, como consta do probatório do ponto D. da matéria de facto provada foi realizado ação inspetiva externa ao sujeito passivo, a qual se iniciou em 07.09.2020, (data que a sentença recorrida aceita e não é controvertido) com a assinatura da ordem de serviço a que respeita a inspeção tendo terminado em 22.02.2021.
Assim, a inspeção teve a duração de 5 meses e 15 dias, não tendo ultrapassado o prazo de 6 meses, o que equivale a dizer que ocorreu a suspensão da caducidade, por igual período.
Tendo sido as notificações das liquidações de IVA enviadas em 25.02.2021 e IRC em 24.02.2021, como decorre dos factos provados em F. a FF. ocorreu dentro do prazo de caducidade.
Para além disso, não podemos olvidar, o n.º 5 do art.º 45.º da LGT, o qual preceitua que; “Sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o n.º 1 é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.”
Da conjugação dos n.ºs 1 e 5 do art.º 45.º da LGT, o direito de liquidar o tributo caduca no prazo de 4 anos, porém sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.
Do confronto dos factos provados e não impugnados, em 22.02.2021 a Inspeção Tributária emitiu auto de notícia nos termos dos artigos. 35.º e 57.º do RGIT e 243.º do CPP, o qual se reporta ao IRC de 2006 e IVA de 2006, conforme consta do auto de notícia transcrito no ponto E. da matéria de facto provada.
Nesta conformidade, a sentença recorrida errou ao considerar que o efeito suspensivo do prazo de caducidade durou mais de que o prazo de 6 meses previstos no n. º1 do art.º 46º da LGT, como alegado pela a Impugnante, e que na data em que foi emitido o auto de notícia já tinha decorrido integralmente o prazo de caducidade do direito à liquidação, pelo que não produziu qualquer efeito.
Nesta conformidade, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, pelo que não ocorreu, a caducidade do direito a liquidar o IRC e IVA.
Destarte procede o recurso da Recorrente.
Tendo a sentença recorrida julgado, a impugnação procedente por verificação da caducidade do direito à liquidação, deu como prejudicado o conhecimento das demais questões levantadas pela Impugnante, as quais passam pela verificação dos pressupostos de que depende a cumulação de pedidos; falta de fundamentação formal e substancial, errónea quantificação da matéria tributável, por irregularidades verificadas nas aquisições intercomunitárias a das correções aritméticas efetuadas em virtude de terem sido recolhidos indícios sérios credíveis, de que as faturas por si contabilizadas, de alguns dos seus fornecedores, não titulam efetivas e reais aquisições e prestações de serviços.
O n.º 2 art.º 665.º do CPC prevê a hipótese de o TCA se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhece no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha de elementos necessários.
E é jurisprudência deste tribunal espelhada nos acórdãos n.º 00104/03-Porto de 12.06.2014, 0820/06.2 BEVIS de 12.01.2012 e 0363/08.0 BEPNL de 13.11.2014 disponível em www.dgsi.pt., à exceção deste último que o TCAN conhecerá do mérito, em substituição, se os autos fornecerem os necessários elementos.
Consta do acórdão n.º 00104/03-Porto de 12.06.2014 com o qual se concorda sem reservas, que “(…) Porém, como se decidiu no Acórdão do S.T.A. de 17-10-2001, Proc. nº 26.193, tal conhecimento em substituição, apenas pode ter lugar quando o tribunal recorrido tenha conhecido e fixado o competente quadro probatório atinente à matéria do fundo da causa, já que o Tribunal superior pode alterar a matéria de facto fixada no probatório da sentença recorrida mas não se pode substituir por completo, àquele, no julgamento de tal matéria - cfr. nº 1 do art. 712º do C. Proc. Civil (actual art. 662º) - pelo que no caso, não tendo a M. Juiz do tribunal “a quo” fixado na sentença recorrida, qualquer matéria relativa às demais questões suscitadas quanto ao mérito da presente impugnação judicial, apenas tendo apreciada a aludida questão de inconstitucionalidade (e mesmo aqui sem considerar toda a dimensão da questão nos termos propostos pela impugnante) e considerada a matéria de facto relativa ao conhecimento da citada questão e na dimensão descrita, tal conhecimento em substituição logra inviabilizado, pelo que os autos terão de baixar à 1.ª Instância para tal matéria de facto ser julgada e ser proferida nova decisão em conformidade, se outro fundamento, diverso do ora decidido, a tal não obstar.(…)”
No caso sub judice, o tribunal à quo na sentença recorrida limitou-se a julgar a matéria de facto essencialmente direcionada para a verificação da caducidade do direito à liquidação, não julgando a restante matéria de facto segundo as várias soluções plausíveis de direito, o que pode passar pela inquirição de testemunha arrolada.
Nesta conformidade, este tribunal não dispõe dos elementos necessários para decidir em substituição, pelo que se impõe a baixa dos autos à 1ª instância para que o tribunal profira nova decisão, em conformidade com o estatuído no art.º 124º do CPPT, salvo se outro fundamento, diverso do ora decidido, a tal não obstar.


4. E assim formulamos a seguinte conclusão/sumário:

Da conjugação dos n.ºs 1 e 5 do art.º 45.º da LGT, o direito de liquidar o tributo caduca no prazo de 4 anos, porém sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, ordenar a baixa dos autos à 1ª instância para que o tribunal profira nova decisão, em conformidade com o estatuído no art.º 124º do CPPT, salvo se outro fundamento, diverso do ora decidido, a tal não obstar.

Custas a cargo do Recorrida, nos termos do art.º 527.º do CPC.

Porto, 21 de março de 2024


Paula Maria Dias de Moura Teixeira (Relatora)
Carlos Alexandre Morais de Castro Fernandes (1.ª Adjunto)
José Coelho (2.º Adjunto)