Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00801/17.0BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/16/2025
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:IRENE ISABEL GOMES DAS NEVES
Descritores:CONDENAÇÃO PARA ALÉM DO PEDIDO;
EXCESSO DE PRONÚNCIA;MÉTODOS INDIRECTOS;
VERIFICAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS;
Sumário:
I. O juiz não só não pode conhecer, por regra, senão das questões que lhe tenham sido apresentadas pelas partes, como também não pode proferir decisão que ultrapasse os limites do pedido formulado, quer no tocante à quantidade quer no que respeita ao seu próprio objeto, isto sob pena de a sentença ficar afetada de nulidade, quer no caso de o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, quer quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, quer ainda quando condene em quantidade superior ou em objeto diferente do pedido (artigo 615.º, n.º1, alíneas d) e e), do Código de Processo Civil)

II. O excesso de pronúncia verifica-se quando o Tribunal conhece, isto é, aprecia e toma posição (emite pronúncia) sobre questões de que não deveria conhecer, designadamente porque não foram levantadas pelas partes e não eram de conhecimento oficioso, no que respeita ao pedido, enquanto conclusão lógica do alegado na petição e manifestação da tutela jurídica que o autor pretende alcançar com a demanda, é, pois, de grande importância o modo como se mostra formulado, por o juiz não dever deixar de proferir decisão que se contenha nos estritos limites em que foi delineado pelo autor.

III. Quando a selecção dos factos não é devidamente impugnada, resta apreciar a subsunção dos factos ao direito aplicável tendo em vista uma solução jurídica diferente da decretada, pois o erro que subsiste não é um erro na apreciação da prova, mas sim um erro na aplicação do direito.

IV. A impossibilidade de comprovação e quantificação da matéria tributável, enquanto pressuposto sine quo non do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável, nos termos dos artigos 87º alª b) e 88º alª a) da LGT, tem de ser uma impossibilidade absoluta. Assim, não se verifica se a contabilidade ou as declarações do contribuinte, por via de erros e omissões detectados, não permitirem a quantificação exacta, mas o permitirem dados, informações e documentos obtidos no procedimento de Inspecção e no procedimento de revisão da matéria tributável.

V. De qualquer modo, a evidenciação dos pressupostos de recurso a métodos indirectos não se basta com a existência de meros elencos de irregularidades da contabilidade, sendo imprescindível que se espelhe de que forma essas irregularidades são impeditivas, no todo ou em parte, do recurso ao método directo de avaliação da matéria tributável.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira, (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 17.10.2023, que julgando procedente a impugnação judicial intentada por [SCom01...], Unipessoal, Lda., contra liquidações de IVA e juros compensatórios, referentes ao exercício de 2014, inconformada vêm dela interpor o presente recurso jurisdicional
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«(…)
A. Afigura-se-nos, desde logo, com o devido respeito, que a douta sentença recorrida ao ter procedido à anulação total das liquidações de IVA (e respetivos juros compensatórios) relativas aos períodos de imposto de 2014.03, 2014.07, 2014.09, 2014.10, 2014.11, 2014.12, ao invés da sua anulação parcial, se encontra ferida de nulidade (o que aqui se vem arguir), nos termos do artigo 125.º, n.º 1 do CPPT, bem como, do artigo 615.º/1, alíneas d) e e) do CPC, aplicável por força do artigo 2.º, alínea e) do CPPT, por ter condenado em quantidade superior e em objeto diverso do pedido ou, em todo o caso, por ter incorrido em excesso de pronúncia.
B. É que no âmbito da ação de inspeção tributária externa credenciada pelas ordens de serviço n.os ...72 e ...73, efetuada à ora impugnante pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças ..., foi elaborado o relatório da inspeção tributária (RIT) de fls. 1 a 18 do Processo Administrativo, tendo-se procedido para o ano de 2014, no que aqui importa, por um lado, a correções meramente aritméticas em sede de IVA, descritas no ponto III.1. do RIT (cf. páginas 1, 9 e 10 do RIT), relativas a Dedução indevida de IVA – Gastos não relacionados com a atividade, nos termos do artigo 20.º do CIVA e, por outro lado, a correções em sede de IVA com recurso à aplicação de métodos indiretos [Falta de liquidação e entrega de IVA por métodos indiretos, cf. ponto V.2.2.1. do RIT (vd. páginas 1, 26 e 27 do RIT)].
C. Sendo que através da presente impugnação judicial a impugnante veio insurgir-se contra a aplicação de métodos indiretos em sede de IVA.
D. Verificando-se que a douta sentença sob recurso apreciou e decidiu a questão da falta de verificação de pressupostos para a determinação da matéria tributável através de métodos indiretos (segmento A. do ponto 5 - Fundamentação de Direito da sentença).
E. Deste modo, as correções meramente aritméticas em sede de IVA, constantes do ponto III.1. do RIT (cf. páginas 9 e 10 do RIT, e quadro resumo das correções realizadas em sede de IVA no que se refere ao ano de 2014 que consta da página 1 do RIT), relativas a Dedução indevida de IVA – Gastos não relacionados com a atividade, nos termos do artigo 20.º do CIVA, não integraram o objeto da presente impugnação judicial e, portanto, tais correções meramente aritméticas, não constituindo objeto dos autos não podiam ser objeto de anulação.
F. O que significa, pois, salvo sempre o devido respeito, que a douta sentença recorrida foi além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes que se limitava a conhecer e decidir as liquidações de IVA (e respetivos juros compensatórios) relativas ao ano de 2014 na parte assente em correções relativas a métodos indiretos (segmento A. do ponto 5 - Fundamentação de Direito da sentença).
CORRELATIVAMENTE,
G. Face ao atrás exposto, afigura-se-nos, também, ainda que sem conceder e ressalvado o devido respeito, que, de todo o modo, a sentença sob recurso padece de erro de julgamento ao decidir pela anulação total das liquidações de IVA (e respetivos juros compensatórios) relativas aos períodos de imposto de 2014.03, 2014.07, 2014.09, 2014.10, 2014.11, 2014.12 (vd. páginas 9 e 10, 26 e 27 do RIT, e quadro resumo das correções realizadas em sede de IVA no que se refere ao ano de 2014 que consta da página 1 do RIT).
H. É que, como se viu, através da presente impugnação judicial a impugnante veio insurgir-se contra a aplicação de métodos indiretos em sede de IVA.
I. Enfatize-se que a douta sentença sob recurso apreciou e decidiu a questão da falta de verificação de pressupostos para a determinação da matéria tributável através de métodos indiretos (segmento A. do ponto 5 - Fundamentação de Direito da sentença).
J. Em consequência do que tendo a sentença recorrida procedido à anulação das liquidações de IVA (e respetivos juros compensatórios) relativas aos períodos de imposto de 2014.03, 2014.07, 2014.09, 2014.10, 2014.11, 2014.12 também na parte em que refletem as correções meramente aritméticas, incorreu em erro de julgamento, estando em contradição com o julgamento da matéria de facto e de direito.
K. E, a par disso, padece de igual modo de erro de julgamento traduzido na violação do princípio da divisibilidade do ato tributário, infringindo o disposto no artigo 100.° da LGT onde se prevê que o ato tributário pode ser objeto de mera anulação parcial.
PARALELAMENTE,
L. Entendemos, ressalvando-se sempre melhor e douto entendimento e, com o devido respeito, que incorre a sentença num vício lógico sobre a valoração da prova uma vez que da factualidade relevante da prova produzida e dada como provada resulta que os indícios enunciados no ponto IV. do RIT, de fls. 1 a 18 do Processo Administrativo (constantes do facto «6.» do subponto 3.1 – Matéria de facto dada como provada, do ponto 3 – Fundamentação da sentença) e, bem assim, no parecer no qual assentou a decisão do procedimento de revisão da matéria tributável, de fls. 71 a 78 do Processo Administrativo (constantes dos factos «11.» e «12.» do subponto 3.1 – Matéria de facto dada como provada, do ponto 3 – Fundamentação da sentença) são não só reveladores da falta de credibilidade da contabilidade da impugnante e bem demonstrativos de que a contabilidade da impugnante não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido, constituindo factos que ilidem a presunção de verdade dos valores declarados prevista no n.º 1 do artigo 75.º da LGT, como ademais evidenciam um quadro global, sólido e coerente de que a contabilidade da impugnante não merece credibilidade e que se mostra inviável a comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável, razão pela qual foi a mesma calculada com recurso a métodos indiretos, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 87.º e da alínea a) do artigo 88.º, ambos da LGT.
M. E, assim, a nosso ver, no caso em apreço, a factualidade apurada conduz logicamente ao resultado oposto àquele que integra o segmento decisório.
N. Com efeito, tendo o Tribunal a quo considerado provados os factos «6.», «11.» e «12.» do subponto 3.1 – Matéria de facto dada como provada, do ponto 3 – Fundamentação da sentença, transcrevendo no facto «6.» o ponto IV. do relatório final de inspeção (relativo aos motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indiretos) e transcrevendo no facto «12.» o ponto B.3. e o ponto C. do parecer no qual assentou a decisão do procedimento de revisão da matéria tributável (os quais respeitam à posição da perita da administração tributária e à apreciação da matéria tributável), reconhecendo a sentença recorrida que, no caso, é notório que a AT apresentou indícios suficientemente graves, precisos e concordantes para justificarem a conclusão de que a contabilidade, bem como as declarações que dela resultam, não está elaborada nos termos da lei e que, portanto, os elementos do sujeito passivo não merecem a presunção de verdade a que alude o artigo 75.º da LGT;
O. labora depois numa incongruência lógica, ao considerar que tal não é suficiente para justificar o recurso a avaliação indireta e que competia à AT alegar e demonstrar factos objetivos que indiciassem a existência de irregularidades contabilísticas e documentais que inviabilizassem a quantificação direta e exata do lucro tributável, considerando que a AT não cumpriu adequadamente esse ónus, ou seja, não arrolou indícios, suficientemente graves, precisos e concordantes para demonstrarem a necessidade de avaliação indireta e a alegada impossibilidade de determinar direta e exatamente o lucro tributável.
P. É que, como emerge da factualidade provada (factos «6.», «11.» e «12.» do subponto 3.1 – Matéria de facto dada como provada, do ponto 3 – Fundamentação da sentença) ficou demonstrado pelos serviços de inspeção tributária que, em virtude de a escrita da impugnante não refletir a realidade do seu negócio, nem o resultado efetivamente obtido, se tornou impossível quantificar e comprovar de modo direto e exato a matéria tributável.
Q. Por assim se entender, consideramos, pois, que incorre a sentença num vício lógico sobre a valoração da prova, pelo que, cometeu a douta sentença sob recurso erro de julgamento.
A par disso,
R. Entendemos que a douta sentença sob recurso fez também uma incorreta valoração e apreciação da prova incorrendo em erro de julgamento sobre a matéria de facto, porquanto, a nosso ver, não foram devidamente valorados e apreciados na douta sentença os factos «6.», «11.» e «12.» do subponto 3.1 – Matéria de facto dada como provada, do ponto 3 – Fundamentação da sentença.
S. Diga-se, pois, que a factualidade que foi levada ao probatório da sentença nos factos «6.», «11.» e «12.» do subponto 3.1 – Matéria de facto dada como provada, do ponto 3 – Fundamentação da sentença é reveladora de que os fundamentos que sustentam a aplicação de métodos indiretos se encontram devidamente comprovados pelo que se justificou o recurso aos mesmos, no sentido de se obter a quantificação da matéria tributável.
T. Quanto ao primeiro indício para a aplicação dos métodos indiretos (descrito no ponto IV.1.1 do RIT, de fls. 1 a 18 do Processo Administrativo), referente a resultados da atividade diminutos, não compatíveis com os empréstimos efetuados ao sócio gerente e emissão irregular de cheques, o Tribunal a quo constata que a impugnante não põe em causa que a sua contabilidade, quanto a este aspeto, padecia de insuficiências, porém considerou que na falta de mais elementos cabia à AT o ónus de indicar outros indícios que apontem no sentido da existência de proveitos não declarados, o que não logrou fazer.
U. Ora, a nosso ver, e salvo douta e melhor opinião, a sentença recorrida não podia retirar daqui esta ilação, uma vez que a irregularidade em causa contende, em si mesma, com o apuramento do resultado contabilístico e fiscal e, como tal, este indício tem gravidade e é relevante para a decisão de proceder a avaliação indireta.
V. Quanto ao segundo indício para a aplicação dos métodos indiretos (descrito no ponto IV.1.2 do RIT, de fls. 1 a 18 do Processo Administrativo), referente a ventilação das taxas de IVA, nomeadamente nas taxas de 23% e 6%, trata-se de uma grave irregularidade contabilística e fiscal, que reforça que a contabilidade da impugnante não se encontra elaborada nos termos da lei e que, portanto, o sujeito passivo e as suas declarações não merecem a presunção de verdade a que alude o artigo 75.º da LGT, comprovando tal irregularidade a impossibilidade de determinar direta e exatamente a matéria tributável (cf. laudo da perita da Autoridade Tributária a fls. 66 a 69 do Processo Administrativo e ata n.º 69/2017 a fls. 56 a 61, em particular fls. 57 verso do Processo Administrativo).
W. Com efeito, esta irregularidade põe em causa os registos contabilísticos da impugnante, bem como as declarações que neles assentam, não permitindo rastrear e apurar de forma direta os montantes reais que resultam daqueles registos contabilísticos, sendo relevante em si mesma para a decisão de proceder a avaliação indireta.
X. Quanto ao terceiro indício para a aplicação dos métodos indiretos (descrito no ponto IV.1.3 do RIT, de fls. 1 a 18 do Processo Administrativo), relativo a indícios de omissões de vendas, já que as margens amostrais calculadas são superiores às declaradas, ficou demonstrado que as margens obtidas são substancialmente superiores às margens declaradas, sendo que o desfasamento das margens calculadas versus margens declaradas revela a omissão de vendas na atividade da impugnante [cf. ponto IV.1.3 do RIT (vd. páginas 13 e 14 do RIT, de fls. 1 a 18 do Processo Administrativo) e ponto C. do parecer no qual assentou a decisão do procedimento de revisão da matéria tributável (de fls. 71 a 78 do Processo Administrativo)].
Y. Ora, tal omissão de vendas inviabiliza a determinação direta e exata da matéria tributável através dos elementos contabilísticos da impugnante, não bastando para tanto um mero cálculo aritmético, e justifica adequadamente o recurso a métodos indiretos.
Z. Quanto ao quarto indício para a aplicação dos métodos indiretos (descrito no ponto IV.1.4 do RIT, de fls. 1 a 18 do Processo Administrativo), referente à venda de produtos sem referência, denominados como “mercadoria 5%”; o mesmo produto a ser transacionado a diferentes taxas de IVA e elevado número de devoluções/anulações, cabe realçar que, tendo por referência a listagem dos 50 produtos com maior peso nas devoluções e tendo por base os quadros das páginas 14 a 16 do RIT, verifica-se que foram registadas muitas devoluções de montantes significativos no ficheiro SAFT de faturação, de entre os quais se encontra bacalhau, banana, cerejas, frango, fiambre, pão-de-ló, leite, batata, grelos, ou seja, trata-se de produtos perecíveis para os quais não se encontra justificação para a sua devolução por parte dos consumidores finais (cf. explicado no laudo da perita da Autoridade Tributária a fls. 66 a 69 do Processo Administrativo).
AA. Acresce que o SAFT de faturação apresenta outra irregularidade, o mesmo produto (com a mesma referência) foi transacionado a diferentes taxas de IVA, constituindo exemplos desta realidade, as vendas descritas nos quadros insertos no item 3 do ponto IV.1.4., páginas 16 a 19 do RIT.
BB. Deste modo, mais uma vez, a contabilidade da impugnante demonstra fragilidades relevantes que não permitem rastrear e apurar de forma direta os montantes reais que resultam de tais elementos, situação que sempre reforçaria a conclusão acerca da necessidade de recorrer à avaliação indireta.
CC. Quanto ao quinto indício para a aplicação dos métodos indiretos (descrito no ponto IV.1.5 do RIT, de fls. 1 a 18 do Processo Administrativo), relativo a irregularidades nos inventários a nível das quantidades e da valorização, cabe referir que se verifica, a nível de quantitativo, que relativamente a todos os produtos que integram a amostra existem divergências entre as existências finais apuradas pela inspeção tributária e as declaradas (conforme quadros constantes das páginas 19 e 20 do RIT) e, bem assim, que se verifica, a nível de quantitativo, que o inventário está sobrevalorizado face ao valor contabilizado, como se comprova através do quadro constante da página 21 do RIT.
DD. Tais irregularidades nos inventários constituem um indício sério e relevante da incongruência dos registos de compras e vendas, donde resulta necessariamente a impossibilidade de quantificar direta e exatamente o valor da matéria tributável.
Além disso,
EE. Com o que temos, então, de outro lado, que, no caso, considerando os factos apurados em sede de inspeção e descritos no RIT, bem como no parecer no qual assentou a decisão do procedimento de revisão da matéria tributável, aos quais fizemos acima expressa referência e dos quais se alcança o que acima mencionámos (ou seja, que os fundamentos que sustentam a aplicação de métodos indiretos se encontram devidamente comprovados pelo que se justificou o recurso aos mesmos no sentido de se obter a quantificação da matéria tributável), estamos perante a existência de erro de julgamento de direito por violação do disposto nos artigos 74.º/1 e 3, 75.º/1 e 2/alíneas a) e b), 77.º/4, 85.º/1, 87.º/1/alínea b), 88.º/alínea a), todos da LGT e, por último, do artigo 90.º do CIVA.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO DEVERÁ A SENTENÇA RECORRIDA SER REVOGADA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE CONTEMPLE AS CONCLUSÕES SUPRA ELENCADAS E JULGUE A IMPUGNAÇÃO TOTALMENTE IMPROCEDENTE,
ASSIM SE DECIDINDO FAR-SE-Á JUSTIÇA.»
1.2. A Recorrida ([SCom01...], Unipessoal, Lda.), notificada da apresentação do presente recurso apresentou as seguintes contra-alegações:
«(…)
I. O Recurso vem interposto da douta Sentença proferida pelo Tribunal, a quo, que julgou a Impugnação Judicial totalmente procedente.
II. A Recorrida considera, no entanto, que a douta Sentença, quanto à sua procedência, não merece qualquer juízo de censura, porquanto foi efetuado um correto julgamento da matéria de facto, está perfeitamente conforme com a matéria de direito e a procedência da Impugnação Judicial é da mais elementar justiça.
III. O Senhor Juiz, a quo, julgou a Impugnação Judicial totalmente procedente por falta de pressupostos para a aplicação de métodos indiretos.
IV. A douta Sentença não enferma de nulidade, porquanto foi efetuada uma correta aplicação do direito aos factos apreciados e a respetiva condenação foi na estrita medida do pedido formulado pela Recorrida.
V. A Autoridade Tributária tem a faculdade de decidir tributar adicionalmente os contribuintes em função das irregularidades que possam ter implicações no montante do imposto a entregar nos cofres do Estado, devendo fazê-lo, por norma, com recurso à tributação direta, mediante uma quantificação direta e exata da matéria coletável.
VI. Os erros contabilísticos ou declarativos devem ser corrigidos com recurso à tributação direta, assente numa operação meramente aritmética, com base na qual se pode quantificar de forma direta e exata o valor das correções que resultam desse erro contabilístico ou omissão declarativa.
VII. Daí que, a tributação indireta seja subsidiária da tributação direta e a Autoridade Tributária só pode recorrer à tributação indireta quando aquela seja manifestamente inviável e se apure factos que concretamente demonstrem que houve omissão suscetível de alterar o resultado declarado.
VIII. Ora, in casu, a Inspeção Tributária limitou-se a presumir uma sucessão de circunstâncias sem qualquer aderência à realidade jurídico-tributária da Recorrida para tentar aumentar o valor das correções que efetuou para além do que conseguia se ficasse pela tributação direta.
IX. Não existem duas liquidações de IVA, por cada período de imposto, suscetíveis de serem impugnadas, uma por tributação direta e outra por tributação indireta, razão porque a Recorrida limitou-se a impugnar as únicas liquidações que lhe foram notificadas, cuja matéria coletável foi fixada por métodos indiretos por despacho do Senhor Diretor de Finanças.
X. Resulta com toda a evidência que a Recorrida impugnou a totalidade das liquidações adicionais, as quais procederam por vício de falta de fundamentos para a aplicação de métodos indiretos, determinando-se, em conformidade, a anulação das liquidações.
XI. O Tribunal não promove, nem procede a quaisquer liquidações de imposto, mas sim limita-se a aferir se as liquidações que foram efetuadas e nos termos em que foram efetuadas são ou não legais.
XII. Quando a Inspeção Tributária decidiu enveredar por uma tributação indireta competia-lhe demonstrar estarem reunidos os pressupostos para a sua aplicação, o que manifestamente não fez.
XIII. Assim sendo, não conseguiu demonstrar qualquer omissão que não pudesse ser quantificada de forma direta e exata, razão pela qual estava impedida de recorrer ao mecanismo da tributação indireta.
XIV. A atuação da Inspeção Tributária tem que estar sujeita ao controle da legalidade, por isso, não pode pretender utilizar simultaneamente os dois critérios: tributar com recurso a métodos diretos e métodos indiretos a mesma realidade tributária, sem que a sua atuação abusiva possa ser alvo de escrutínio.
XV. A Inspeção Tributária quando decide tributar por via indireta tem que se certificar que estão reunidos os pressupostos exigidos e só depois pode definir o critério de quantificação que também ele terá que ser objeto de escrutínio, dentro dos limites da legalidade.
XVI. Sendo cada liquidação, por período de imposto, uma só, a Recorrida só podia impugná-la na totalidade, incumbindo ao Tribunal a quo decidir se a mesma era ou não legal.
XVII. O vício da falta de requisitos para a aplicação de métodos indiretos afetou a totalidade das liquidações e não parte delas, dado que toda a matéria coletável foi fixada por métodos indiretos.
XVIII. In casu, a douta Sentença foi proferida tendo em conta os argumentos da falta de requisitos formais e materiais que justificam o recurso à tributação indireta e não o seu quantum.
XIX. Não pode, pois, haver qualquer anulação parcial das liquidações como defende a Fazenda Pública, porque todas as liquidações estão feridas do vício de falta de pressupostos para o recurso à tributação por métodos indiretos.
XX. Razão porque, a contrário do que defende a Fazenda Pública não existe qualquer condenação em quantidade superior e em objeto diverso do pedido, nem, tão pouco, qualquer excesso de pronúncia.
XXI. A Autoridade Tributária não logrou demonstrar a existência de factos indiciadores da omissão de proveitos, baseou toda a sua génese fundamentadora em factos quantificáveis de forma direta e exata e em outros que constituem meras situações presuntivas, sem qualquer aderência à realidade jurídico-tributária da Recorrida, bem como não inverteu o ónus da prova que lhe competia, pelo que não podia lançar mão do mecanismo da tributação indireta.
XXII. Ainda assim, e sem prescindir, a Impugnação Judicial sempre haveria de proceder em razão das ilegalidades verificadas no método de quantificação da matéria coletável, pois, também nesta sede, a Autoridade Tributária não cumpriu adequadamente a sua obrigação e enveredou por um critério inadequado, assente numa sucessão de presunções sem qualquer aderência à realidade jurídico-tributária da Recorrida.
XXIII. Nesta sequência, o Senhor Juiz, a quo, ao decidir como decidiu pela falta de pressupostos para aplicação de métodos indiretos, fez um correto apuramento dos factos em conformidade com o direito aplicável, fazendo, por isso justiça.
Termos em que, nos mais de direito, aplicáveis, e, no prudente juízo de Vossas Excelências, deve o recurso ser declarado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida e, em consequência, declarada totalmente procedente a impugnação judicial, com as legais consequências.»
1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 709 e ss. do SITAF, em que pugna pela procedência do recurso.
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir: Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida: (i) enferma de nulidade por condenação em quantidade superior ao pedido, objecto diverso do pedido e, se assim não se entender em nulidade por excesso de pronúncia [conclusão A. a F.]; (ii) incorre em erro de julgamento ao ter procedido à anulação das liquidações de IVA (e respetivos juros compensatórios) relativas aos períodos de imposto de 2014.03, 2014.07, 2014.09, 2014.10, 2014.11, 2014.12 também na parte em que refletem as correções meramente aritméticas, em violação do disposto no artigo 100º da LGT ao não ter anulado parcialmente as liquidações de IVA [conclusões G. a K.]; (iii) incorreu em errada valoração da prova e subsequente erro de direito ao considerar não verificados os indícios que fundamentam o recurso aos métodos indirectos [conclusões L. a EE.].
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«1. A sociedade impugnante iniciou a sua atividade em 13.05.1980, encontrando-se fiscalmente inscrita para o exercício da atividade “Outro Comércio a Retalho Produtos Alimentares, Estab. Espec. N.E.” (CAE 47293) e enquadrada no regime geral do IRC e no regime normal, de periodicidade trimestral em 2013 e mensal em 2014, do IVA - Cf. fls. 3 do Processo Administrativo (PA).
2. Com base nas Ordens de Serviço ...72 e ...73, emitidas em 05.04.2016, pela Direção de Finanças ..., a AT levou a efeito uma ação inspetiva externa à atividade da sociedade impugnante, incidindo respetivamente, nos exercícios de 2013 e 2014. – Cf. fls. 2 e 47 do PA.
3. Aquela ação inspetiva teve por finalidade a “comprovação e verificação, visando a confirmação do cumprimento das obrigações dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários” e como motivação o facto de o contribuinte manter “relações especiais com outro contribuinte inspecionado que apresentava ventilação de taxas de IVA. Efetuada a análise de risco, verificou-se o mesmo problema, irregularidades ao nível das taxas de IVA e noutras cédulas de imposto”. – Cf. fls. 2 do PA.
4. A ação de inspeção acima referida iniciou-se em 19.04.2016, mediante assinatura e entrega à ora impugnante de cópias daquelas ordens e foi dada como concluída em 21.06.2016- Cf. fls. 2 e 47 do PA.
5. Por ofício n.º 8204930, de 01.07.2016, remetido sob registo postal n.º RD83.....58PT da mesma data, a AT notificou a agora impugnante para, querendo, exercer o direito de audição, relativamente ao projeto de relatório da inspeção tributária, não tendo esta exercido esse direito - Cf. fls. 17 e 43 do PA.
6. Em 01.08.2016 a AT elaborou o Relatório final de inspeção, do qual se extrata o seguinte:
“(…)
III. Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas
III.1 Em sede de IVA
III.1.1 Ano de 2013 e 2014
III.1.1.1. IVA indevidamente deduzido com reparação de viaturas e aquisição de outros bens
1. (…). Foram contabilizados como gastos diversas faturas de reparação de viaturas (exemplos em anexo 4), evidenciados nos mapas abaixo, nas quais não consta a matrícula reparada, pelo que não se consegue aferir da sua titularidade, se englobam ou não o ativo da empresa.
a) Período de 2013
Período Doc. Fact. Fornecedor Gasto IVA Valor Liq.
2013-12T 110266 1183 Pneus ... 236,04 44,14 191,90
2013-12T 100327 001/121 [SCom02...] 2.223,58 415,79 1.807,79
Total 2.459,62 459,93 1.999,69
b) Período de 2014
Período Doc. Fact. Fornecedor Gasto IVA Valor Liq.
2014-07 70291 218 [SCom02...] 132,52 24,78 107,74
2014-09 90246 9792 [SCom03...] 131,95 24,67 107,28
2014-10 100283 9803 [SCom03...] 226,17 52,02 174,15
100284 9821 [SCom03...] 41,00 9,43 31,57
2014-11 110316 9854 [SCom03...] 163,35 37,57 125,78
2014-12 120340 289 [SCom02...] 862,05 161,20 700,85
120341 290 [SCom02...] 145,14 27,14 118,00
Total 1.702,18 336,81 1.365,37
2. Foram também contabilizados como gastos duas faturas de aquisição de bens, não enquadráveis no âmbito do artigo anteriormente referido, nomeadamente terem sido adquiridos pelo sujeito passivo “para a realização de operações tributáveis (ativas)”. As referidas faturas encontram-se discriminadas abaixo e anexa-se cópia das mesmas (anexo 5):
Período Doc. Fact. Fornecedor Gasto IVA Valor Liq.
2014-03 30252 9 [SCom04...] 350,00 65,45 284,55
2014-07 70289 425 [SCom05...] 255,00 47,69 207,31
Total 605,00 113,14 491,86
3. Face ao exposto, O IVA mencionado nas tabelas acima, referente às faturas de aquisições de serviços sem relação com a atividade da empresa, nomeadamente o fogão, a máquina de lavar (bens de uso pessoal do sócio) e as reparações automóveis foi indevidamente deduzido, pelo que, deverá ser diminuído no campo 24 das respetivas declarações periódicas.
III.1.1.2 IVA indevidamente deduzido com reparação de viaturas e aquisição de outros bens
1. Como já anteriormente descrito no ponto II.3.5, foi apurada uma divergência a favor do sujeito passivo, entre os registos contabilísticos e os valores declarados na DP de outubro de 2014, no valor de 129,67€, como a seguir se demonstra:
(…)
2. Esta divergência deveu-se ao lapso no preenchimento da DP (…).
3. Em suma, as correções meramente aritméticas em sede de IVA, com impacto no apuramento do imposto a pagar (IVA indevidamente deduzido ou IVA liquidado AIB não deduzido/declarado pelo sujeito passivo) ascendem a 780,21€ a favor do Estado conforme quadro infra:
DescriçãoPeríodoTotal
20132014
IVA indevidamente deduzido - aquisição bens 113,14 113,14
IVA indevidamente deduzido - reparações 459,93 336,81 796,74
IVA contabilizado n/deduzido -129,67 -129,67
Total 459,93 207,14 780,21
(…)
IV. MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS
No decorrer da ação inspetiva foram verificados indícios claros e fundados de que a escrituração não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido, conforme explicaremos nos pontos seguintes:
IV.1.1 Resultados da atividade diminutos, não compatíveis com os empréstimos efetuados ao sócio gerente e emissão irregular de cheques;
1. A empresa apresenta em todos os anos analisados resultados tributáveis muito baixos, conforme resulta da análise do quadro abaixo:
Ano Vendas Result. Tributável Empr. a Sócios
2012 658.937,55 4.048,83 105.785,06
2013 654.680,80 4.133,77 84.704,51
2014 698.514,85 -8.853,94 172.990,43
2. A empresa tinha registado na conta de empréstimos aos sócios em 2012 o valor de 105.785,06€ valor que baixou para 84.704,51€ em 2013 mas que em 2014 assumiu o valor mais elevado - 172.990,43€. O acréscimo ocorrido em 2014 foi de 88.285,92€, comparativamente este foi o ano em que a empresa apresentou resultados negativos.
3. A documentação de suporte aos registos contabilísticos da conta dos empréstimos aos sócios resume-se a (diversos) cheques endossados ao sócio gerente («AA») e outros sem qualquer endosso, dos quais a título de exemplo se anexam cópias (anexo 6).
4. Assim os resultados declarados não são compatíveis com os empréstimos concedidos ao sócio, não existindo registo de quaisquer juros cobrados ao mesmo, no entanto, a empresa recorre a empréstimos para se financiar, suportando os respetivos encargos. Pese embora o facto de os financiamentos obtidos serem de valor muito superior aos concedidos, em 2014 a empresa aumentou o seu valor (na rubrica de curto prazo) em 89.000,00€ valor aproximado ao acréscimo ocorrido nos empréstimos concedidos aos sócios.
IV.1.2 Indícios da ventilação das taxas de IVA, nomeadamente nas taxas de 23% e 6%;
1. De acordo com resumo anual das declarações periódicas de IVA, foram analisadas as bases tributáveis declaradas por taxa e as deduções sobre as compras, o que permitiu imputar o valor das compras por taxas para cada ano:
DescriçãoTaxaIVA Ded. DecComp. Decl.Imp. %
2013Exist. – Taxa red. 6%17.891,39 297.891,37 55,74%
Exist. – Taxa int. 13%3.969,76 30.506,05 5,71%
Exist. – Taxa normal 23%47.430,32 206.012,38 38,55%
TOTAL69.291,47 534.409,80
DescriçãoTaxaIVA Ded. DecComp. Decl.Imp. %
2014Exist. – Taxa red. 6%18.749,00 313.561,78 55,02%
Exist. – Taxa int. 13%4.459,94 34.425,63 6,04%
Exist. – Taxa normal 23%50.873,41 221.952,11 38,94%
TOTAL74.082,35 569.939,53
2. Com base nos inventários disponibilizados pelo contribuinte, apurou-se a variação dos mesmos nos anos de 2013 e 2014 efetuando-se assim o cálculo do CMV de cada ano repartido pelas respetivas taxas de IVA.
DescriçãoTaxaComp. Decl.Imp. %Var. Inv.CMV Calc.
13 Exist. – Taxa red. 6%297.891,37 55,74%1.928,45 295.962,92
Exist. – Taxa int. 13%30.506,05 5,71%-407,4830.913,53
Exist. – Taxa normal 23%206.012,38 38,55%1.037,80 204.974,58
TOTAL534.409,80 2.558.77 531.851,03
DescriçãoTaxaComp. Decl.Var. Inv.CMV Calc.
14Exist. – Taxa red. 6%313.561,78 55,02%-3.230,16 320.333,74
Exist. – Taxa int. 13%34.425,63 6,04%-2.049,49 35.169,12
Exist. – Taxa normal 23%221.952,11 38,94%17.341,76 226.745,59
TOTAL569.939,53 12.062,11 582.248,45
3. Após o cálculo do CMV de cada ano, tendo em conta os inventários (existência inicial e final), e na posse dos valores das vendas declaradas distribuídos pelas respetivas taxas, passou-se ao cálculo das margens brutas sobre o CMV conforme mapa abaixo:
DescriçãoTaxaComp. Decl.CMV Cal.PesoVND DecMargemMG%
2013Exist. – Taxa 6%297.891,37 295.962,92 62,53%409.357,40 113.394,48 38,31%
Exist. – Taxa 13%30.506,05 30.913,53 57,29%47.704,67 16.791,14 54,32%
Exist. – Taxa 23%206.012,38 204.974,58 30,19%197.618,73 -7.355,85 -3,59%
TOTAL534.409,80 531.851,03 654.680,80 122.829,77
DescriçãoTaxaIVA Ded. DecCMV Calc.PesoVND DecMargemMG%
2014Exist. – Taxa 6%313.561,78 320.333,74 62,81%438.715,28 118.381,53 36,96%
Exist. – Taxa 13%34.425,63 35.169,12 6,44%44.967,02 9.797,90 27,86%
Exist. – Taxa 23%221.952,11 226.745,59 30,76%214.832,55 -11.913,04 -5,25%
TOTAL569.939,53 582.248,45 698.514,85 116.266,40
4. Resumindo, nos dois anos verificam-se margens muito díspares entre as várias taxas de IVA, sendo a margem mais elevada a verificada em 2013 de 54,23% nos produtos à taxa de 13%, seguida de 38,31% também em 2013 nos produtos a taxa de 6%. No entanto o mais anormal são mesmo as margens negativas verificadas em ambos os anos (-3,59% e -5,25%) nos períodos vendidos com a taxa de IVA de 23%. Note-se que em estabelecimentos similares, a maioria dos produtos em que incide a taxa normal, são os que normalmente apresentam margens mais elevadas.
5. Face ao exposto, existem indícios claros de que houve compras de mercadorias à taxa de IVA de 20% tendo a IVA sido deduzido, e na venda das mesmas, o registo foi efetuado por uma taxa diferente (13% ou 6%), o que implicou que o IVA liquidado declarado fosse inferior ao que deveria ter sido.
IV.1.3. Indícios de omissões de vendas: as margens amostrais calculadas são muito superiores as declaradas;
1. No sentido de validar os resultados apresentados, e tendo em consideração que a atividade do sujeito passivo corresponde essencialmente à compra e venda de mercadorias, foram utilizados procedimentos de auditoria consubstanciados na determinação da margem amostral das operações efetuadas.
2. Para o efeito, foram efetuadas amostras nos dois anos cuja representatividade sobre o volume de negócios foi de 43% em 2013 e 40% em 2014. Esta seleção recaiu sobre os produtos com maior peso em valor no total das vendas. A amostra foi dividida por produtos segundo as diversas taxas de IVA para apuramento das respetivas margens.
3. O cálculo da margem amostral sobre o preço de custo dessas referências teve por base os anos de 2013 e 2014, o custo médio unitário dos produtos e o valor médio de venda dos mesmos, ponderando-se o resultado obtido pelo peso de cada uma das referências no total das vendas da amostra. Deste cálculo resultaram as margens que abaixo se apresentam e cujos mapas se anexam (anexo 7)
ANOTAX. REDUZ. (6%)TAX. INTERM. (13%)TAX. NORMAL (23%)
201325,85%23,29%30,35%
201424,48%27,14%28,60%
4. Efetuou-se ainda o cálculo da margem bruta global incluindo os produtos vendidos às diversas taxas (anexo 8), ponderada pelo VN, sendo que os valores obtidos são bastante superiores aos declarados pelo sujeito passivo nos dois períodos em análise, o que indicia a existência de amissões ao nível das vendas declaradas.
ANOMg/DeclaradaMG/ Ponderada
201318,80%27,93%
201416.64%27,79%
5. No dia 02.06.2016, reunimos com o sujeito passivo e com o TOC, no gabinete de contabilidade, em ..., onde foram expostas as margens apuradas atrás referenciadas. Tanto o contribuinte como o TOC acharam as margens apuradas elevadas, no entanto não apresentaram qualquer facto que pusesse em causa as margens por nós apuradas na amostragem.
6. Face ao exposto, mantiveram-se as conclusões obtidas quanto ao desfasamento das margens agora calculadas face aos valores declarados, que se traduzem na existência de omissões de vendas na atividade exercida.
IV.1.4 Vendas de produtos sem referência, denominados como "diversos", o mesmo produto a ser transacionado a diferentes taxas de IVA e elevado número de devoluções/anulações.
1. Analisados os ficheiros SAFT das vendas dos anos de 2013 e 2014 verificou-se a existência de produtos com a descritivo "Mercadoria 5%" que apesar de a representatividade ser diminuta no valor de vendas declaradas, conforme dados abaixo extraídos dos ficheiros SAFT das vendas, indicia a possibilidade de vendas de mercadorias não especificadas a taxa reduzida.
ANODESCRIÇÃOTAXA RED. (6%)
2014MERCADORIA 5%3.754,98€
2013MERCADORIA 5%1.628,79€
5.383,77%
2. Foram também verificadas muitas devoluções/anulações (débitos no ficheiro SAFT), algumas de valor significativo, que aumentaram de 2013 (3.496,38€) para 2014 (4.055,08€). A seguir apresentam-se a título de exemplo os cinquenta produtos com mais peso nas devoluções de cada um dos anos:
a) 2013
DESCRIÇÃODEBITOCRÉDITOSALDO
VASILHAME GARRAFÃO 5L 337,50 399,00 61,50
BACALHAU ESPECIAL JUMBO ISL 276,80 12.657,22 12.380,42
MERCADORIA 5% 182,55 1.811,42 1.628,88
BACALHAU GRAUDO ISL 174,00 8.741,23 8.567,23
BACALHAU CRESCIDO NOR 169,37 12.793,49 12.624,12
BANANA DA MADEIRA 166,39 2.856,28 2.689,90
CEREJA 68,64 3.080,98 3.012,34
LEITE ... M/GORDO 55,14 5.978,70 5.923,56
FRANGO 51,65 749,49 697,84
OLEO ALIMENTAR ... 50,20 5.827,91 5.777,71
BACALHAU ESPECIAL ISL 39,58 12.183,68 12.144,10
FIAMBRE DA PERNA ... 35,71 1.057,09 1.021,38
V.VERDE BRAN. COOP. V.C. 750 35,22 307,68 272,46
CAMARAO ... 40/50 CX 2 KG 28,44 197,45 169,01
V.VERDE BRANCO ... 750 28,37 1.695,07 1.666,70
PAO 28,02 1.879,33 1.851,31
V.PORTO ... TAWNY 27,22 1.345,11 1.317,89
AMENDOAS ... TORRADA 125 GR 27,19 107,88 80,69
PERBORATO DE SODIO KILO 24,23 24,23 0,00
CEVADA SOLUVEL ... 200 GRS 23,22 888,57 865,35
BACALHAU SALGADO LOMBOS 22,53 4.626,00 4.603,48
ESP.... RESERVA BRUTO 21,90 111,79 89,89
POLVO CONGELADO N:2 2 A 3 KG 19,08 1.301,05 1.281,97
SORTIDO ... 700 GR 18,25 606,72 588,47
LEITE ... BEM ESP. S/LACTOSE 15,20 1.008,87 993,67
FRALDAS ... ETAPAS 2-5KG 28U 14,89 66,33 51,44
BOMBONS ... 195 GR 15,57 29,14 14,57
FRALDA ... 13-18 KG 52 UNI 14,13 113,06 98,92
FRALDA ... 3-6 KG 72 UNI 14,13 28,26 14,13
PAO DE LO PEQUENO ... 14,13 236,49 222,36
PENSOS ... SUPER 30 U 14,13 211,98 197,85
LAMINAS ... FUSION 4 13,80 400,34 386,54
LOÇAO ... CRIANÇA 50 13,80 55,22 41,41
AZEITE ... 1,5º AC 1L 13,74 732,85 719,11
LARANJA 13,63 4.900,68 4.887,05
PROTETOR SOLAR ... N-50 13,40 40,20 26,80
PENSOS ... NORMAL 24 U 13,25 216,34 203,09
V.VERDE BRANCO ... 5 LITS 13,24 1.704,84 1.691,60
V.BRANCO ... BOX 5 LT 12,89 371,63 358,74
SALVA CAMAS ... 60*90 20U 12,25 24,49 12,25
LEITEMIMOSA M/GORDO 11,74 2.311,95 2.300,21
SEQUILHOS CASEIROS 250GR 11,70 372,53 360,83
V.BRANCO ADEGA ... 5L 11,65 1.493,77 1.482,12
QUEIJO ... BOLA 11,52 1.407,67 1.396,15
BATATA SACO 11,30 2.981,28 2.969,97
FRALDAS ... MEDIA 30U 11,30 666,81 655,51
V.VERDE BRANCO ... 5 LT 11,03 874,88 863,86
PAO DE LO ... 10,85 197,27 186,42
GRELOS 10,74 982,84 972,11
BACALHAU CRESCIDO + ISL 10,59 4.609,28 4.598,69
V.TINTO ... RESERVA 750 ML 10,59 225,98 215,39
AGUARDENTE ... 10,55 10,55 0,00
DET. MAQ. ... 100 D 10,55 286,09 275,54
PRONTO ... 375 ML 10,54 63,22 52,68
PINHAO S/CASCA 9,90 9,90 0,00
b) 2014
DESCRIÇÃODEBITOCRÉDITOSALDO
BACALHAU GRAUDO NORUEGA 752,11 64,87 7.850,48
BACALHAU ESPECIAL JUMBO ISL 301,33 103,13 23.650,77
POLVO 800/1200 GR BRASMAR 163,76 71,48 374,30
VASILHAME GARRAFÃO 5 L 117,00176 147,00
FRALDAS ... LARGO 30U 98,99 116 1.529,12
BACALHAU ESPECIAL ISL 94,66 251,32 21.577,80
PAO DE LO FATIAS ... 69,46 42,98 301,94
ARROZ ... AGULHA 1 KG 54,50 341,98 1.312,34
MANTEIGA ... 250 GRS C/SAL 44,48 860 1.455,74
BACALHAU CRESCIDO NOR 43,20 33,11 1.517,17
COGUMELOS ... COV. 400 GR 41,43 12 82,87
LEITE ... M/GORDO 38,98 9743 5.435,14
TOALHAS ... LIMPABEM 20 38,98 19 84,45
CASTANHA PILADA 500 GR 38,96 12 77,92
BIFE AROUQUESA 33,88 5,7 67,75
CASYANHA CONG. 100/120 500 GR F.F. 33,61 18 67,72
BATATA SACO 31,99 36,38 1.746,71
V.PORTO ... 20 ANOS 31,69 2 31,69
V.TINTO ... BOX 5 LT 30,93 302 1.650,42
MERCADORIA 5% 30,97 2680,64 3.754,97
V. TINTO DAO ... C/JUNTA CONJ. 3 28,28 5 42,42
V. VERDE ROSE ADEGA COOP. .... 26,19 236 532,44
MA?A GOLDEN 25,42 1513,98 793,73
ATUM ... 24,92 145,96 2.242,58
OVOS ... 6U 23,87 5466 3.751,54
PINHAO S/CASCA 23,60 1,14 16,81
PAO DE LO DE ... 22,93 45,39 489,82
MIRTILOS CAIXA 21,65 3326 2.692,59
PADAS DE UL 21,38 36464 7.545,40
FIAMBRE DA PERNA ... 20,63 228,69 1.795,27
BRISE UN TOQUE REC. 2+1 19,02 14 34,24
BACALHAU GRAUDO ISL 18,92 117,61 11.822,52
IOG.... CD POLPA 18,38 164 117,11
POLVO CONG. 2/3KG CESANTOS 17,92 9,61 54,44
IOG. ... GREGO FRUT. CORT. 500 17,76 2266 4.445,67
BACON FATIADO ... 150 GR 16,68 272,33 120,72
CALDOS ... GALINHA 8 CUBOS 16,66 563 564,99
SALCHICHAS COCKTAIL ... 16,59 151 154,14
FIAMBRE PROMOÇÃO 16,12 392,93 2.060,67
BOL. ... MARIA 800 GR 33% GRA 15,51 442 571,22
V. PORTO ... 10ª 0.75LT 15,36 3 30,72
QUEIJO 15,21 251,6 1.613,65
CEREJA 14,55 766,49 2.986,42
LULA CONGELADA 14,21 94,26 422,94
MELÃO VERDE 13,36 1128,46 1.321,57
AGUA ... 5 LT 13,07 47,54 1.144,79
WISKY ... 12 ANOS 13,00 21 241,06
DET. MAQ. ... EFEVERSCENT 100 D 12,99 54 674,24
V. TINTO ... 750 ML 12,96 175 368,68
BACALHAU SALGADO LOMBOS 12,90 25,03 5.537,44
2.640,77 69.282,63 126.905,65
3. O SAFT das vendas apresenta ainda outra anormalidade, o mesmo produto com a mesma referência a ser transacionado com as taxas de IVA diferentes: a 6% e 13%; a 6% e 23%; 13% e 23%, conforme mostram os exemplos a seguir apresentados:
Produtos comercializados com incidência de IVA de 13% e 6%
a) 2013
DESCRIÇÃOTAXA INTERM. (13)TAXA RED. (6)TOTAL
CAFÉ ... PASTILHAS CX 10 480,29 2.121,67 2.601,96
V. TINTO ... 0.75 372,59 187,84 560,43
TOTAL 852,88 2.309,51 3.162,39
b) 2014
DESCRIÇÃOTAXA INTERM. (13)TAXA RED. (6)TOTAL
AGUA NASCENTE N/LOJA 5 LITROS 342,846,50 349,34
CEVADA TORRADA ... 250 GR 57,409,11 65,51
DET. MAQ. LIQ. ... 54 DOSES 78,88104,08 182,96
UVA PASSA MOSCATEL ... 150G 1,3833,41 34,79
TOTAL 480,50153,10 633,60
Produtos comercializados com incidência de IVA de 23% e 6%
a) 2013
DESCRIÇÃOTAXA NORMAL (23)TAXA RED. (6)TOTAL
CAFÉ NESCAFE ... 16 CAP 627,49 6.020,12 6.647,61
AÇUCAR ... BRANCO P/PASTICO 2,02 2.492,10 2.494,12
ATUM ... 120 GR 28,04 1.802,41 1.830,45
PAO DE LO ... 323,67 1.291,69 1.615,36
AZEITONA CURA NATURAL 179,64 1.209,44 1.389,08
OLEO ALIMENTAR N. LOJA 1L 11,30 1.347,22 1.358,52
AÇUCAR ... BRANCO PAC. PAPEL 391,69 876,30 1.267,99
DET. MÁQ. ... 93 DOSES 291,17 1.018,48 1.237,66
DET. MÁQ. LIQ. ... 63 DOSES 445,82 438,14 883,96
SCHOKOS BROTC. PANIC 6 CHOC. 275 148,82 708,53 857,35
ICE TEA PESSEGO 2 LITROS 786,68 56,90 843,58
LEITÃO ... 231,71 551,89 783,60
NOZES NACIONAIS 476,87 258,81 735,68
CHOC. ... OVO GRANSORPRESA 70,49 499,21 569,70
SUMO ... LARANJA 1.5L 88,82 460,06 548,88
SUMO ... ANANAS 200 5,57 496,06 501,63
... DONUTS 2 56,10 375,31 431,41
DET. LOIÇA LIMAO NOSSA LOJA 750 297,97 115,24 413,20
SEQUILHOS CASEIROS 250 GR 5,10 355,74 360,84
DET. MÁQ. ... 100 DOSES 124,14 230,86 355,00
CEREAIS ... ESTRELITAS 375 GR 221,59 89,38 310,97
BOL. ... MARIA 12 U 156,43 97,51 253,94
CASTANHAS ... 18,00 230,91 248,91
PAO DE LO PEQUENO ... 40,00 182,36 222,36
PAO DE LO ... 58,40 128,02 186,42
FERMENTO ... LATA 24,33 137,79 162,12
CHOC. ... 75 GR + 25 GR GRATIS 125,32 30,18 155,50
CAMARAO ... 30/40 KG 73,66 74,77 148,43
SUMO ... 8 FRUTOS 1 L 15,02 130,18 145,21
MELINDRES ... 25,65 116,95 142,60
MACEDONIA ... 400 +100 GR 64,65 33,74 98,39
PAO RALADO ... KILO 2,26 93,78 96,04
FARINHA ... NACIONAL 1KG 0,80 94,14 94,94
MORCELAS ... 16,00 64,51 80,51
LIX. ... 2L 55,43 23,51 78,94
ROSCAS DE AMENDOA ... 16,00 49,91 65,91
DET. MAQ. ... 104 DOSES 104 DOSES 25,17 37,70 62,87
CHARUTOS ... 16,00 45,21 61,21
SEMENTES LINHAÇA 250 GR 33,62 15,12 48,74
AMENDOA NAPOLITANAS CONE V. CAS 2,89 45,68 48,56
PEDRAS PARIDEIRAS ... 10,00 35,29 45,29
OREGAOS FOLHAS MARGAO 4GR 1,65 37,24 38,89
CAPRICHOS DE LULAS ... 9,04 25,53 34,57
BOL. BARQUETES MORANGO ... 24,64 5,66 30,30
BOLOS ... 200 GR 11,38 13,20 24,58
AMENDOA TORRADA V.C. 200 GR 1,59 20,61 22,20
TOALHITAS KANDOO 2X60 14,99 5,36 20,35
CAVACAS ... 4,22 15,47 19,69
BOL. ... CRISPY 200 GR 10,13 1,89 12,02
PATE ... FIG. PORCO PIC. 80 1,29 6,04 7,33
TOTAL 5.601,24 22.492,13 28.093,37
b) 2014
DESCRIÇÃOTAXA NORMAL (23)TAXA RED. (6)TOTAL
AÇUCAR ... BRANCO P/PASTICO 125,92 1.762,16 1.888,07
ÁGUA TONICA ... 25 CL 62,18 10,58 72,76
ALPERCE ... 250 GR 22,15 41,41 63,56
AMEIXA SECA S/CAROÇO ... 250 GR 127,64 30,99 158,63
AMEIXA SECA ... 250 GR 53,90 10,08 63,97
BAGAS DE GOJI ... 150 GR 57,37 77,70 135,06
CAFÉ ... PASTILHAS CX 10 20,65 2.483,04 2.503,69
CAFÉ NESCAFE ... 16 CAP 1.579,78 9.656,68 11.236,46
CAFÉ NESCAFE ... 16 CAP 327,63 82,81 410,45
CASTANHAS ... 18,00 263,66 281,66
CHA PRETO A N/LOJA 10 SAQ. 1,11 0,92 2,03
CHARUTOS ... 8,00 45,21 53,21
CHOC. CULINARIO CEM% 28,20 39,77 67,97
CHOC. NEGRO 100 GR CEM% 91,21 97,04 188,24
DET. AMAC. ROUPA QUANTO 2X4LT 228,84 143,79 372,64
DET. MAQ. ... SABAO NATURAL 90 347,32 1.018,52 1.365,84
DOCE ANANAS CEM% 15,82 94,93 110,75
IOG. ... LEITEIRA 6,47 3,74 10,21
LAMPARINA VERMELHO 60 LL 119,93 134,49 254,42
MIOLO AMENDOA C/PELE ... 44,69 33,62 78,31
MIOLO AMENDOA S/PELE ... 150 GR 54,78 39,77 94,55
MIOLO AVELA ... 100GR 14,56 9,03 23,59
MIOLO NOZ ... 80 GR 14,54 122,18 136,72
MIOLO NOZ ... 100 GR 67,80 274,18 341,98
MIOLO PINHAO ... 50 GR 48,00 50,77 98,77
MOLHO BECHAMEL ... 200ML 94,58 5,28 99,86
MORCELAS ... 8,00 45,21 53,21
OLEO ALIMENTAR A N. LOJA 1L 9,30 1.371,95 1.381,25
PAO DE LO ... 44,37 1.548,68 1.593,04
PAO RALADO ... KILO 3,39 2,62 6,01
PAO RALADO ... KILO 19,39 153,42 172,81
PEDRAS PARIDEIRAS ... 5,20 35,28 40,48
ROSCAS DE AMENDOA ... 8,00 67,81 75,81
SULTANA DOURADA ... 150 GR 9,76 11,36 21,12
SULTANA PRETA ... 150 GR 0,72 8,98 9,70
TOALHITAS ... 25 55,32 19,38 74,70
UVA PASSA DOURADA ... 100 GR 1,20 65,59 27,73
UVA PASSA S/GRAINHA ... 11,16 65,59 76,74
TOTAL 3.756,87 19.889,13 23.646,00
Produtos comercializados com incidência de IVA de 23% e 13%
a) 2013
DESCRIÇÃOTAXA INTERM (13)TAXA NORMALTOTAL
OLEO ALIMENTAR ... 5.660,67 117,99 5.778,66
CEVADA SOLUVEL ... 200 GRS 191,47 673,82 865,29
PRESUNTO FATIAS ... 397,66 91,11 488,77
FEIJAO MANTEIGA A.N. LOJA 570 GR 365,54 115,08 480,62
V. BRANCO ... BOX 5 LIT 340,52 124,39 464,91
V. TINTO J P 750 ML 227,18 53,60 280,78
FIGOS SECOS C/FARINHA 500 GR 207,80 48,45 256,25
MARMELADA A NOSSA LOJA 450 GR 122,92 75,66 198,58
PRESUNTOS NACOS ¼ ... 140,40 50,93 191,33
MARMELADA N/LOJA 900 GR 94,91 64,94 159,85
MIOLO NOZ ... 80 GR 50,10 109,04 159,14
PIZZA ... 320 24,64 123,55 148,19
DET. MAQ. LIQ. ... 54 DOSES 129,51 10,55 140,06
BACON FATIADO ... 150 GR 31,54 90,74 122,28
MIOLO PINHAO ... 50 GR 33,93 78,00 111,93
AMEIXA SECA ... 250 GR 6,85 65,51 72,36
PIRI PIRI ... 1.130 G 17,11 53,30 70,41
MISTURA FRUTOS VERMELHOS 450 GR 35,22 22,65 57,87
UVA PASSA S/GRANHA ... 100G 9,13 47,02 56,16
PICKLES ... 180 GR 13,69 39,30 52,99
DOBRADA C/FEIJÃO BRANCO 420 GR 14,09 35,56 49,65
MIOLO AVELA ... 100 GR 20,94 16,18 37,12
AMEIXA ... 16,73 6,05 22,78
SULTANAS ... 100 GR 2,1015,94 18,04
PATE ... FIG. PORCO 80 GR 5,7911,26 17,05
SULTANAS DOURADA 100 GR 3,4313,43 16,85
CORAZONES DE ALCACHOVAS 2,208,72 10,91
TOTAL8.166,04 2.162,76 10.328,80
b) 2014
DESCRIÇÃOTAXA INTERM. (13)TAXA NORMALTOTAL
BACON EXTRA NACOS ...7,5656,4263,98
CHOURIÇO CARNE ... 535GR37,61209,95247,56
FIGOS SECOS T. DOURO826,8377,25904,08
SALADA DE CENOURA ... 345 GR12,3921,5833,97
SALCHICHAS ... 8U59,0521,2080,25
SORTIDO FRUTA EUROPA ... 218,983,4922,47
TOTAL962,43389,891.352,32
4. A análise efetuada permite concluir que existem diversas anomalias ao nível do ficheiro SAFT, indiciando a sua manipulação e/ou os registos mal efetuados, já que um mesmo produto não pode ser vendidos a taxas de diferentes de IVA.
IV.1.5. Irregularidades nos inventários a nível das quantidades e da valorização
1. Foram efetuados testes aos inventários quanto às quantidades, através de amostragem que incluiu os produtos com maior peso em valor na sua composição total, cuja representatividade em 2013 foi de 30% (valor total de 84.019,40€) e em 2014 foi de 29% (valor total 71.957,85€) conforme quadros infra:
a) 2013
DESCRIÇÃOEI 2013COMPRASVNDEF CALCEI FINAL 2013DIF.ª
BACALHAU GRAUDO ISL 89 1.355,00 1371,76 72,24 250,00 -177,76
BACALHAU ESPECIAL JUMBRO 59 1.133,71 1134,88 57,83 111,00 -53,17
ALETRIA ... 500 GR 956 100,00 458 598,00 956,00 -358,00
CAFÉ MISTURA ... 200 GR 162 12,00 131 43,00 162,00 -119,00
CAFÉ NESCAFE ... 16 262 1.609,00 1678 193,00 262,00 -69,00
CEREAIS ... ESTRELITAS 375 381 36,00 200 217,00 381,00 -164,00
CANELA EM PAU MARGAO 30 GR 1097 0,00 262 835,00 1.097,00 -262,00
OLEO ALIMENTAR A N. LOJA 1L 328 885,00 1067 146,00 328,00 -182,00
AZEITE ... 1.º AC. 1L 178 12,00 281 -91,00 178,00 -269,00
AZEITE ... RESERVA 0.4º O.75 146 186,00 257 75,00 146,00 -71,00
CHA PLANTAS NATURAIS ... 328 99,00 199 228,00 328,00 -100,00
ATUM ... EM AZEITE 120 486 410,00 629 267,00 891,00 -624,00
... MOPA + 2 PANOS 9 2,00 4 7,00 89,00 -82,00
PLENITUDE VISIBEL RESULTS 16 0,00 0 16,00 64,00 -48,00
PLENITUDE REVITALIF DIA 13 48 40 21,00 107,00 -86,00
PAPEL HIG. ... 9 ROLOS 119 20,00 75 64,00 119,00 -55,00
PAPEL HIG. ... PERF. 12 212 224,00 313 123,00 212,00 -89,00
CHAMPO ... 200 ML 220 282,00 282 220,00 200,00 20,00
LAMINAS ... FUSION 4 14 37,00 30 21,00 42,00 -21,00
MAQ. GIL MACH 3 POWER NITRO 0 0,00 0 0,00 32,00 -32,00
COLORANTE P/CABELO ... 224 423 383 264,00 137,00 127,00
FRALDAS ... 17-28 KG 42 UNI. 4 0,00 1 3,00 41,00 -38,00
FRALDAS ... PANTS MEDIA 14 6 58 28 36,00 41,00 -5,00
FRALDAS ... LARGO 30 U 20 96,00 101 15,00 59,00 -44,00
FRALDA ... 3-6 KG 72 UNI 6 0,00 0 6,00 31,00 -25,00
FRALDA ... 13-18 KG 52 UNI 0 5 9 -4,00 28,00 -32,00
LOÇAO ... CRIANÇA 50 16 0,00 5 11,00 54,00 -43,00
SUMO COCA COLA 2 LT 541 668,00 831 378,00 541,00 -163,00
V. PORTO ... 10ª 0.75 LT 0 0,00 1 -1,00 28,00 -29,00
V.BRANCO ... 5 LITROS 0 19 44 -25,00 59,00 -84,00
V. TINTO ... 5 LITROS 79 129 154 54,00 71,00 -17,00
BRANDY ... 5 EST. 38% LT 0 0,00 11 -11,00 44,00 -55,00
LICOR ... 9 0,00 1 8,00 51,00 -43,00
V. PORTO BRANCO ... 0 240,00 132 108,00 99,00 9,00
V. PORTO LAGRIMA ... P 34 24,00 34 24,00 90,00 -66,00
V. PORTO ... TAWNY 177 186,00 233 130,00 177,00 -47,00
BOMBONS ... SACO 0 20,00 8 12,00 54,00 -42,00
... PANTS MEDIA 14-40% 11 12,00 46 -23,00 48,00 -71,00
SALVA CAMAS ... 60X180110,00 47,0053,00-46,00
V. PORTO ... 20 ANOS60,00 06,00157,00 -151,00
b) 2014
DESCRIÇÃOEI 2014COMPRASVND DECEF CALCEI FINAL 2014DIF.ª
AGUA ... 1,5 L 2018121514318380-62
ATUM ... 5619232012-33528-561
BACALHAU SORT. ESP. ISLANDIA 0875150725375350
CAFÉ ... PASTILHAS CX 10 311165830366414-48
CAFÉ NESCAFE ... 16 262286130457896-18
CHAMPO ... NORMAIS 1603002981628478
COLORANTE P/CABELO 137264318835231
DET. MAQ. ... 91 DOSES 02641131516487
ESPUMANTE ... RES. 14183202-570-75
FIAMBRE PROMOÇAO 0395,2539356,2539317,25
ICEA TEA PESSEGO 2. LITROS 321210775467249218
MIOLO NOZ ... 80 GR 38132611097237
NOZES NACIONAIS 0149,2163,46-14,2630-44,26
POLVO CONG. ... + 2 KILOS 0282,7298,69-15,9992,825-108,815
PRESUNTO FATIADO ... 1628026828129-101
SORTIDO ... 700 GR 3912081784335
... PANTS LARGE 14 0653926197
V. PORTO ... VELHOTES 34408194248872-624
V. PORTO ... TAWNY 9276139146190-44
V. PORTO ... TAWNY 177420335262107155
V. PORTO ... WHITE 9354254109248-139
V. TINTO ENC. ... BOX 5 LT 0184551291272
V. TINTO ... 281008750286509-223
WISKY ... 12 ANOS 133520281315
WHISKY ... 12 ANOS 61231518-3
2. Verifica-se que, da análise dos quadros anteriores elaborados com base nas listagens de inventário nas listagens de compras fornecidas pelo contribuinte (empresa informática), nem um único produto se encontra correto (existência inicial + compras – vendas = existência final). Existem diferenças consideráveis em muitos produtos entre a existência final apurada por nós e a existência final comunicada pelo contribuinte.
3. Foi também efetuada uma validação à valorização dos mesmos produtos verificando-se que em 2013 a diferença encontrada não é materialmente relevante (aproximadamente 500,00€). Ao contrário de 2014 a diferença nos produtos testados (29% do total do inventário) foi de 6.723,69€, valor considerado relevante, conforme mapa infra:
DESCRIÇÃOEF 2014P.UN.CP.SALDOP.UN.VSAL.CALCDIF.ª
ÁGUA ... 1,5 L 3800,280,49186,21,06106,4-79,8
ATUM ... 5280,91,39733,921,1475,2-258,72
BACALHAU SORT. ESP. 376,38,893.3336,792.373,75 -960
CAFÉ ... PASTILHAS CX 10 4142,112,991.237,86 3,01873,54-364,32
CAFÉ NESCAFE ... 962,953,99383,043,34283,2-99,84
CHAMPO ... NORMAIS 841,712,98250,322,33143,64-106,68
COLORANTE P/CABELO 523,415,98310,964,68177,32-133,64
DET. MAQ. ... 91 DOSES 646,158,99575,366,98393,6-181,76
ESPUMANTE ... RES. 703,365,19363,33,8235,2-128,1
FIAMBRE PROMOÇAO 394,416,98272,225,24171,99-100,23
ICEA TEA PESSEGO 2. LITROS 2490,71,19296,311,08174,3-122,01
MIOLO NOZ ... 80 GR 721,92,68192,962,49136,8-56,16
NOZES NACIONAIS 304,087,99239,75,54122,4-117,3
POLVO CONG. ... + 2 KILOS 92,8256,939,98926,398,67643,28-283,12
PRESUNTO FATIADO ... 1291,753,19411,512,23225,75-185,76
SORTIDO ... 700 GR 432,724,48192,643,55116,96-75,68
... PANTS LARGE 14 198,4512,98246,6211,42160,55-86,07
V. PORTO ... VELHOTES 8723,314,984.342,56 4,62.886,32 -1.456,24
V. PORTO ... TAWNY 1903,615,391.024,10 4,24685,9-338,2
V. PORTO ... TAWNY 1073,544,98532,863,95378,78-154,08
V. PORTO ... WHITE 2483,534,981.235,04 3,91875,44-359,6
V. TINTO ENC. ... BOX 5 LT 1274,96,48822,965,69622,3-200,66
V. TINTO ... 5092,523,861.964,74 2,861.282,68 -682,06
WISKY ... 12 ANOS 1310,6816,48214,2411,48138,84-75,4
WHISKY ... 12 ANOS 1813,2919,86357,4816,15239,22-118,26
20.647,04 13.923,36 -6.723,69
4. a diferença apurada na amostragem indicia que o inventário de 2014 se encontra sobrevalorizado em 48% (6.723,69€) face ao valor contabilizado. Aplicando o mesmo rácio de sobrevalorização ao total do inventário final declarado (71.957,85€) conclui-se que o mesmo deverá ser de 48.524,87€ (71.957,85€/1,48), resultando uma sobrevalorização de 23.432,99€.
IV.2. CONCLUSÃO DE FACTO E DE DIREITO
Atendendo ao supra exposto, importa sintetizar os factos que fundamentam a aplicação de métodos indiretos designadamente:
1. Resultados da atividade diminutos, não compatíveis com os empréstimos efetuados ao sócio gerente, bem como emissão de diversos cheques ao sócio ou sem identificação (ao portador);
2. Ventilação das taxas de IVA, nomeadamente nas taxas de 23% e 6%;
3. Indícios de omissões de vendas, já que as margens amostrais calculadas são superiores as declaradas;
4. Vendas de produtos sem referência, denominados como “mercadoria 5%”, o mesmo produto a ser transacionado a diferentes taxas de IVA e elevado número de devoluções/anulações;
5. Irregularidades nos inventários a nível das quantidades e da valorização.
Conclui-se assim que, no seguimento dos procedimentos de inspeção verificaram-se irregularidades na organização da contabilidade, infrações, erros e/ou inexatidões no registo das operações e indícios claros e fundados de que a escrituração não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido. Com efeito, a aplicação dos métodos de avaliação direta não conduz à matéria tributável real do sujeito passivo em análise (n.º 1, do artigo 81.º, artigo 82.º e 87.º, todos da LGT).
Simultaneamente, fica demonstrado que para efeitos de IRC não houve um cumprimento integral do disposto no artigo 123.º do Código do IRC. Também para efeitos de IVA a insuficiência de elementos compromete apuramento claro e inequívoco do imposto previsto no artigo 44.º do Código do IVA.
Neste sentido, em face do anteriormente descrito neste relatório, e em especial, no relevado neste capítulo, apuram-se factos que ilidem a presunção de verdade dos valores declarados constante do número 1, do artigo 75.º da Lei Geral Tributária (LGT), por se verificar o indicado nas alíneas a) e b), do número 2, da mesma norma.
Conclui-se assim que a escrituração do sujeito passivo, não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido, pelo que, face à impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável, e ao facto de as irregularidades e os fundamentos referidos no presente relatório serem insupríveis, se recorre, nos termos da alínea b), do número 1, do artigo 87.º e da alínea a), do artigo 88.º, da LGT, para os efeitos previstos nos artigos 87.º a 89.º, do citado diploma legal, 89.º, do citado diploma legal, por remissão do artigo 57.º do Código do IRC, do artigo 39.º do Código do IRS e do artigo 90.º do Código do IVA, à sua determinação por aplicação de métodos indiretos, nos anos de 2013 e 2014.
V. CRITÉRIO DE CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS.
V.1 CORREÇÕES TÉCNICAS AOS VALORES DECLARADOS
(..)
V.2. DETERMINAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL POR MÉTODOS INDIRETOS
V.2.1. Apresentação e fundamentação da adequação do critério
Não nos merecendo a contabilidade credibilidade pelos motivos expostos nos pontos anteriores, propõe-se para determinação/quantificação da matéria tributável o critério que se encontra previsto na alínea a) do n.º 1 do art. 90.º da LGT:
“1- Em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável, a determinação da matéria tributável por métodos indiretos poderá ter em conta os seguintes elementos:
a) As margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros;”
Assim o critério utilizado para cálculo da determinação da matéria tributável com recurso a métodos indiretos, passará por calcular a omissão de ganhos presumida através da aplicação das margens ponderadas sobre o custo das vendas, calculadas no Ponto IV.1.3. para o exercício de 2013 a 2014, calculando-se o lucro tributável presumido através da soma direta das correções ao resultado declarado pelo sujeito passivo através das Modelo 22 anterior e atempadamente apresentadas.
V.2.2. Quantificação da matéria tributável
V.2.2.1 Em sede de IRC
1. Foi corrigido o CMV do ano de 2014, sendo acrescidos 23.432,99€, ao valor declarado pelo contribuinte, este acréscimo resultou do valor presumido, face às irregularidades detetadas na valorização do inventário desse ano.
2. O valor relativo à correção foi apurado pela diferença entre o valor declarado pela empresa e a presunção relativa à valorização do inventário calculado no ponto IV.1.5 paragrafo 4 deste relatório.
ANOCMV DECLARADOCORREÇÃOCMV CORRIGIDO
2014582.248,4523.432,99605.681,44
3. Para a determinação do volume de negócios presumido, irão ser aplicadas as margens calculadas quadro do ponto IV. 1.3. (parágrafo 3) ao CMV, nos dois anos em análise, refira-se que no ano de 2014 CMV foi acrescido de 23.432,99€ conforme quadro acima.
a) 2013
RubricasReduz. (6%)Interm. (13%)Normal (23%)TOTAL
Custo Mercadoria Vendida - A 296.327,49 30.345,90 204.930,85 531.604,24
Mg Pond. CMV Calculada - B 25,85% 23,29% 30,35%
Volume de Negócios Presumido C=A*(1+B) 372.928,15 37.413,46 267.127,36 677.468,97
Volume de Negócios Declarado - D 409.357,40 47.704,67 197.618,73 654.680,80
Correção ao Volume de Negócios - E=C-D) -36.429,25 -10.291,21 69.508,63 22.788,17
b) 2014
RubricasReduz. (6%)Interm. (13%)Normal (23%)TOTAL
Custo Mercadoria Vendida - A 323.292,20 33.807,15 248.582,08 605.681,43
Mg Pond. CMV Calculada - B 24,48% 27,14% 28,60%
Volume de Negócios Presumido C=A*(1+B) 402.434,12 42.982,41 319.676,56 765.093,10
Volume de Negócios Declarado - D 438.715,28 44.967,02 214.832,55 698.514,85
Correção ao Volume de Negócios - E=C-D) -36.281,15 -1.984,61 104.844,01 66.578,25
4. Para a repartição do CMV declarado pelo contribuinte pelas três taxas de IVA foi aplicada ao mesmo, a imputação calculada tendo por base as compras (IVA dedutível), ponto IV.1.2.
5. Em virtude da correção ao volume de negócios com recurso a aplicação de métodos indiretos, e às correções técnicas, o resultado fiscal dos exercícios de 2013 e 2014 passa a ser respetivamente de 37.499,56€ e 46.188,61€, conforme quadros abaixo:
a) Correções 2013
DEMONSTRAÇÃO RESULTADOSDECLARADOCORREÇÃOCORRIGIDO
A5001 Vendas e serviços prestados 654.680,80 22.788,17 677.468,97
A5006 Custo merc. vendidas e matéria consum. 531.604,24 531.604,24
A5007 Fornecimentos e serviços externos 37.387,12 -4.034,04 33.353,08
A5008 Gastos com o pessoal 32.726,14 32.726,14
A5015 Outros rendimentos e ganhos 99,13 99,13
A5016 Outros gastos e perdas 20.657,05 20.657,05
A5017 Res. ant. depr., gastos de fin. e imp. 32.405,38 26.822,21 59.227,59
A5018 Gastos/ver. de depreciação e de amort. 12.674,78 12.674,78
A5020 Resultado operacional 19.730,60 26.822,21 46.552,81
A5022 Juros e gastos similares suportados 17.179,63 -5.103,38 12.076,25
A5023 Resultado antes de impostos 2.550,97 31.925,59 34.476,56
A5024 Imposto sobre o rendimento do período 1.626,14 1.626,14
A5025 Resultado líquido do período 924,83 31.925,59 32.850,42
A Acrescer 5.516,49 5.516,49
A deduzir 0,00 0,00
Resultado Tributável 6.441,32 31.925,59 38.366,91
b) Correções de 2014
DEMONSTRAÇÃO RESULTADOSDECLARADOCORREÇÃOCORRIGIDO
A5001 Vendas e serviços prestados 698.514,85 66.578,25 765.093,10
A5006 Custo merc. vendidas e matéria consum. 582.248,45 23.432,99 605.681,44
A5007 Fornecimentos e serviços externos 72.873,73 -3.922,43 68.951,30
A5008 Gastos com o pessoal 33.434,44 33.434,44
A5015 Outros rendimentos e ganhos 15.922,50 15.922,50
A5016 Outros gastos e perdas 9.674,61 9.674,61
A5017 Res. ant. depr., gastos de fin. e imp. 16.206,12 47.067,69 63.273,81
A5018 Gastos/ver. de depreciação e de amort. 13.630,72 13.630,72
A5020 Resultado operacional 2.575,40 47.067,69 49.643,09
A5022 Juros e gastos similares suportados 15.709,27 -7.974,86 7.734,41
A5023 Resultado antes de impostos -13.133,8755.042,5541.908,68
A5024 Imposto sobre o rendimento do período 369,21 369,21
A5025 Resultado líquido do período -13.503,08 55.042,55 41.539,47
A Acrescer 8.523,35 8.523,35
A deduzir 5,00 5,00
Resultado Tributável -4.984,73 55.042,55 50.057,82
7. Em todos os anos analisados, além do acréscimo d vendas presumidas e do CMV, foram deduzidos os gastos não aceites fiscalmente, anteriormente referidos, constantes nos quadros dos pontos V.1.2. parágrafo 2 (seguros de vida e reparações auto) e V.1.3. parágrafo 1 (parte proporcional dos gastos com empréstimos).
V.2.2.2 Em sede de IVA
1. Na atividade desenvolvida, o contribuinte aplica todas as taxas de IVA em vigor em Portugal continental, pelo que o cálculo do IVA a liquidar, pelas vendas presumidas, será efetuado proporcionalmente ao IVA dedutível declarado em cada período, assim o IVA em falta para os dois períodos é de 34.142,63€. (…)”, sendo o IVA corrigido de 2013 igual a € 12.463,37 e de 2014 igual a € 21.679,25. - Cf. fls. 1 a 18 do PA.
8. Por ofício n.º 8206550 de 10.08.2016, remetido sob registo postal n.º RD834701401PT da mesma data e recebido a 11.08.2016, a AT notificou a ora impugnante do teor do relatório de inspeção tributária com a fixação do lucro tributável em sede de IRC e os documentos de fixação/alteração do conjunto dos rendimentos líquidos dos exercícios de 2013 e 2014, que determinaram o apuramento dos rendimentos líquidos totais nos seguintes termos:
AnoIRC Lucro Tributário FixadoPrejuízo Fiscal
2013€ 38.366,91€ 0,00
2014€ 50.057,82€ 0,00
- Cf. fls. 40 a 42 do PA.
9. Em 12.09.2016, o impugnante pediu a abertura do procedimento de revisão da matéria coletável e nomeou perito - Cf. fls. 50 a 55 do PA.
10. Em 11.10.2016 e em 26.10.2016, na sede da Direção de Finanças ..., reuniram-se os peritos das partes sem que tivessem chegado a acordo de acordo - Cf. atas de fls. 56 a 69 do PA.
11. Por despacho do Diretor de Finanças ... de 28.03.2016, foi concluído o procedimento de revisão previsto nos artigos 91º e 92º da LGT com a fixação dos seguintes valores:
IRCIVA
AnoLucro tributável fixadoImposto liquidado
2013€ 38.366,91€ 12.463,36
2014€ 50.057,82€ 21.679,20
- Cf. fls. 71 do PA.
12. A decisão acima referida assentou no parecer, do qual se extrata o seguinte:
“(…)
B.2 — Posição do perito do contribuinte
Da leitura do parecer do perito indicado pelo contribuinte, em anexo à ata n.º 71/2016, retira-se que este defende a existência de erro nos pressupostos de quantificação da matéria tributável por métodos indiretos, porquanto a margem de comercialização utilizada pela IT é superior à média do setor de atividade onde se insere o contribuinte. Nenhuma razão é apontada no RIT que demonstre que a [SCom01...] beneficia de condições especiais de mercado que lhe permita ter rentabilidades superiores à do setor.
Por outro lado, defende que a amostra apenas inclui os produtos que proporcionam margens mais elevadas. Por este motivo, a margem obtida e utilizada pela IT origina um excesso de quantificação da matéria tributável por métodos indiretos.
Acresce o facto de a [SCom01...] exercer a atividade na proximidade de três grandes superfícies comerciais, as quais praticam permanentes campanhas promocionais.
Atendendo a que possuía toda a informação relativa à faturação das compras e vendas, a IT poderia, de uma forma simples e rápida, analisar todos os produtos em vez de selecionar uma amostra para o cálculo da margem de comercialização praticada.
Da mesma forma, porque possuía toda a informação da faturação, poderia calcular com rigor o valor das vendas sujeitas às diversas taxas de IVA, em alternativa ao critério subjetivo e discricionário que escolheu.
Acaba o seu parecer ao afirmar que “considera que as fixações de IRC e IVA relativas ao ano de 2013 e 2014 padecem de vícios que conduziriam a um manifesto excesso de quantificação da matéria coletável.”
B.3 - Posição da perita da administração tributária (PAT)
A posição da PAT encontra-se vertida no anexo n.º 1 da ata n.º 71/2016, sugerindo-se a sua integral leitura.
Da leitura das atas e do laudo da PAT conclui-se que esta contra argumentou a totalidade dos fundamentos alegados na petição e os surgidos durante o debate contraditório, referindo que:
1- Em ambos os anos, 2013 e 2014, as margens comerciais declaradas pelas várias taxas de IVA são muito dispares, sendo que as sujeitas à taxa de 23% se apresentam negativas: -3,59% e -5,25%, respetivamente.
Este facto é sintomático da opção do sujeito passivo em tributar bens à taxa de IVA de 6% ou 13%, os quais estão sujeitos à taxa de 23%, originando menos imposto a entregar ao Estado.
Esta constatação permite concluir que a escrituração do sujeito passivo não reflete o resultado efetivamente obtido, não sendo possível a quantificação exata e direta da matéria tributável porquanto esta irregularidade foi detetada na análise que incidiu sobre alguns produtos, tendo-se também presente que a IT apurou indícios de omissão de vendas, pois a margem praticada e que resulta dos produtos que compõem a amostra selecionada apresenta-se superior à declarada em cada um dos anos analisados. Registe-se que o PC ficou de apresentar na 2.ª reunião, a quantificação das vendas tendo em conta a correta ventilação das taxas de IVA, não o tendo feito.
2- Foram calculadas as margens comerciais praticadas por amostragem, cuja representatividade sobre o volume de negócios declarado é de 43% e 40%, respetivamente nos anos de 2013 e 2014. A amostra é composta por produtos sujeitos às diversas taxas de IVA.
A seleção das referências não esteve “adstrita a um conjunto de produtos que dependem do interesse e da vontade de quem fez a amostra”, tendo antes tido em conta os produtos com maior representatividade, em valor, no total das vendas declaradas.
O cálculo da margem do conjunto das referências que compõem a amostra teve por base o custo médio unitário e o preço médio de venda, por produto. A margem final foi obtida por ponderação do peso que cada referência tem no total das vendas da amostra.
As margens obtidas são substancialmente superiores às margens declaradas, o que indicia omissão de vendas. Acresce que foi apresentado o print retirado do sistema informático da AT, conforme solicitação da requerente, donde se conclui que a média e a mediana do rácio R16-MBI (margem bruta sobre as vendas) obtido através das declarações fiscais do conjunto de contribuintes inseridos no mesmo CAE (47293) da [SCom01...], é de 21,32 % e 21,51%, respetivamente.
Por outro lado, apesar de colocar em causa os resultados obtidos pela IT, o sujeito passivo nunca apresentou outros cálculos que pudessem demonstrar que as margens que resultaram da amostra estão erradas.
3 - Os empréstimos concedidos estão documentados por diversos cheques endossados ao sócio gerente «AA» e outros sem qualquer endosso. No entanto, os resultados declarados não são compatíveis com os empréstimos concedidos pela [SCom01...], nem existe registo contabilístico de quaisquer juros associados. Por outro lado, a sociedade recorre a empréstimos para se financiar, suportando os respetivos juros.
4- Quanto às irregularidades detetadas nos inventários, o exemplo dado no ponto 40 da petição (bacalhau graúdo ISL e bacalhau especial ISL) refere-se a dados de 2013, sendo que, para este período de tributação não é proposta nenhuma correção com base no estudo realizado. Já em relação ao ano de 2014, os testes realizados ao inventário - que incidiram sobre os produtos de maior valor, representando 29% do total- demonstraram que este se encontra sobrevalorizado. Há produtos valorados a preços de custo superiores aos reais e, até mesmo, a preços de venda unitários.
Refira-se que o PC confirmou que os preços unitários dos produtos estão efetivamente errados, desconhecendo a origem de tal escolha.
[Efetuada a validação à valorização dos mesmos produtos no inventário de 2013, obteve-se uma diferença de cerca de € 500,00, materialmente irrelevante, ao contrário da divergência obtida no inventário de 2014, de € 6.723,69.]
5-O RIT refere que algumas das devoluções são de valor significativo e não que o total de devoluções é considerado significativo quando comparado com o total das vendas, como pretende fazer crer a reclamante.
Na listagem dos 50 produtos com maior peso nas devoluções, encontra-se o bacalhau, a banana, as cerejas, o frango, o fiambre, o pão, o pão-de-ló, o leite, as batatas e os grelos. Tratando-se de produtos perecíveis e cuja venda se destina a consumidores finais, não se encontra justificação para a sua devolução.
Apesar do PC justificar que as notas de crédito em questão não respeitam a devoluções mas sim a anulações de faturas emitidas com erros e de ter ficado de apresentar comprovativos das afirmações prestadas, confirma-se que na 2.ª reunião não foram apresentados quaisquer documentos que corroborassem o defensado, nomeadamente as 2.ªs faturas emitidas sem conterem os erros iniciais.
Perante o exposto, tendo em conta os argumentos apresentados pelo contribuinte e pelo perito por si designado, a PAT concluiu- e bem- pela subsistência de anomalias e incorreções que inviabilizam o apuramento da matéria tributável por via direta.
É de notar que o sujeito passivo, sempre que confrontado com divergências e incoerências, tenta contestar sem, contudo, conseguir comprovar os factos por si invocados. Da mesma forma se constata que sempre que o PC ficou de apresentar, em 2.ª data, elementos que pudessem contraditar as conclusões da IT, não o fez, tendo, inclusivamente, reconhecido a existência de pressupostos para a aplicação de métodos indiretos (9).
Quanto à metodologia e critérios de quantificação utilizados entende a perita que a IT adotou o critério mais adequado para repor a verdadeira situação tributária do contribuinte ao utilizar informação que decorre da sua própria atividade: margens sobre o custo, calculadas por taxas de IVA e que resultaram da amostragem, aplicadas ao CMV (este corrigido, no ano de 2014(10)).
(9) Último parágrafo da pág. 3 da ata 71/2016.
(10) O CMV declarado em 2014 foi acrescido em €23.432,99, conforme ponto 4 da página 21 do RIT. A IT apurou e utilizou margens distintas conforme a sujeição dos produtos às várias taxas de IVA, sendo estas mais fidedignas e representativas da atividade em vez do recurso a uma taxa de 21,32% (média nacional da margem sobre as vendas, do CAE 47293), aplicada à totalidade dos produtos, conforme proposta do PC.
No entanto, a PAT verificou que a margem sobre as vendas praticada pela IT foi de 21,53% (11) para 2013 e € 20,84 % (12) para 2014, não se justificando a proposta feita pelo PC que certamente terá comparado a margem que propunha ("sobre as vendas") com as margens sobre o custo adotadas.
C-APRECIAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL
O n.º 1 do art. 75.º da LGT dispõe que “Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal”. O relatório da inspeção tributária fundamenta-se em vários argumentos que implicam o recurso à avaliação indireta, sendo de considerar, no essencial:
1 - Resultados da atividade diminutos versus empréstimos concedidos ao sócio gerente e emissão irregular de cheques:
Conforme quadro infra, os resultados declarados não são compatíveis com os empréstimos concedidos pela [SCom01...] ao sócio gerente, «AA», não existindo registo contabilístico de juros cobrados. Todavia, a empresa recorre a empréstimos para se financiar, suportando os respetivos encargos. Em anexo 6 ao RIT constam exemplos dos documentos de suporte às operações referidas.
AnoVendas declaradasResultado fiscal declaradoEmpréstimos aos sócios
2012658.937,55 €8.063,90 €105.785,06 €
2013654.680,80 €6.441,31 €84.704,51 €
2014698.514,85 €-4.984,73172.990,43 €
(11) Ano de 2013: margem s/vendas= (€677.468,97 - €531.604,24)/€677.468,97=21,53%
(12) Ano de 2014: margem s/vendas= (€765.093,10 - €605.681,44)/€765.093,10=20,84%
2- Ventilação das taxas de IVA (indicação/opção indevida das taxas de IVA nas vendas realizadas): Obtido o custo das mercadorias vendidas (CMV) e as vendas (VND) declaradas (cf. declaração anual do IVA e os inventários) ambas as rubricas subdivididas pelas respetivas taxas de IVA, calcularam-se as margens brutas sobre o CMV conforme mapa seguinte:
DescriçãoCMV declaradoVND declaradasPeso das VNDMargemMG/CMV
2013Exist. – Taxa 6%295.962,92€409.357,40€62,53%113.394,48€38,31%
Exist. – Taxa 13%30.913,53€47.704,67€7,29%16.791,14€54,32%
Exist. – Taxa 23%204.974,58€197.618,73€30,19%-7.355,85€-3,59%
TOTAL531.851,03€654.680,80€100,00%122.829,77€
2014Exist. – Taxa 6%320.333,74€438.715,28€62,81%118.381,53€36,96%
Exist. – Taxa 13%35.169,12€44.967,02€6,44%9.797,90€27,86%
Exist. – Taxa 23%226.745,59€214.832,55€30,76%-11.913,04€-5,25%
TOTAL582.248,45€698.514,85€100,00%116.266,40€
Destaca-se a margem negativa obtida nos produtos transacionados à taxa de 23%, nos dois anos analisados, para além da obtenção de margens muito divergentes consoante as diferentes taxas de IVA.
Esta constatação permite concluir que determinados bens adquiridos à taxa de 23%, foram posteriormente vendidos a uma taxa inferior (6 % ou 13%), originando imposto liquidado inferior ao devido.
3-Margens calculadas por amostragem superiores às declaradas:
Tendo em conta que a atividade do sujeito passivo é a compra e venda de mercadorias, foram calculadas as margens praticadas relativas aos produtos com maior peso no total do volume de vendas. A amostra representa 43% e 40% do total das vendas declaradas, respetivamente em 2013 e 2014.
Desde já referimos que, atendendo à grande diversidade de produtos, consideramos representativa a amostra selecionada e devidamente justificada a escolha dos produtos que a compõem.
Note-se que o cálculo da margem sobre o custo teve por base o custo médio de aquisição e o preço médio de venda. A margem final, por cada uma das taxas de IVA, foi obtida pela ponderação que cada uma das referências tem no total das vendas da amostra.
Conforme anexo 7 do RIT, as margens s/ CMV praticadas nos produtos que integram a amostragem são as descritas de seguida:
Ano Taxa de IVA 6% Taxa de IVA 13% Taxa de IVA 23%
2013 25,85% 23,29% 30,35%
2014 24,48% 27,14% 28,60%
Facilmente se conclui que as margens obtidas são mais coerentes com a realidade empresarial do que as declaradas. Conforme é referido no RIT, “em estabelecimentos similares, a maioria dos produtos em que incide a taxa normal, são os que normalmente apresentam margens mais elevadas.” (13)
(13) Primeiro parágrafo da página 13 do RIT.
O desfasamento das margens calculadas versus margens declaradas constitui um forte indício de omissão de vendas.
4- Anomalias no ficheiro SAFT de faturação:
No que respeita aos produtos descritos nos quadros das páginas 14 à 16 do RIT, foram registadas muitas devoluções de montantes significativos no ficheiro SAFT de faturação. Relativamente a determinados produtos, também não se conhecem motivos para que os débitos possam ser superiores aos créditos. O SAFT de faturação apresenta outra irregularidade: o mesmo produto (com a mesma referência) foi transacionado a diferentes taxas de IVA. São exemplos desta realidade, as vendas descritas nos quadros insertos no ponto 3 das páginas 16 a 19 do RIT.
5-Irregularidades nos inventários:
5.1-A nível quantitativo:
Face à extensão dos inventários, foram analisados os produtos inventariados por amostragem. Assim, foram escolhidos os produtos de maior valor, no total dos produtos arrolados. A amostra selecionada representa, no total dos inventários, 30% em 2013 e 29% em 2014.
A leitura dos quadros das páginas 19 e 20 do RIT leva-nos a concluir que, relativamente a todos os produtos que integram a amostra, existem diferenças - algumas bastante significativas - entre a existência final teórica (existência inicial+ compras - vendas) e a existência final comunicada pelo contribuinte.
5.2- No que respeita à valorização:
Quanto aos mesmos produtos, a IT efetuou uma validação à sua valorização, tendo concluído que diferença encontrada, de cerca de € 500,00, no inventário de 2013, não é significativa.
Ao invés, a diferença obtida no inventário de 2014, de grande significado, totaliza € 6.723,69, conforme cálculos expostos no quadro da página 21 do RIT. Esta diferença significa que os produtos da amostra se encontram sobrevalorizados 48% (€ 6.723,69/ € 13.923,36).
Por estimativa, aplicando-se o mesmo rácio ao total do inventário declarado de 2014 (€ 71.957.85) conclui-se que o mesmo se encontra sobrevalorizado em € 23.432,99.
Em conclusão, fica demonstrado que os inventários da [SCom01...] padecem de erros grosseiros, pelo que a contabilidade não reflete os efetivos resultados.
Conforme refere a al. a), do n.º 2, do art. 75.º da Lei Geral Tributária, não se presumem verdadeiros e de boa fé os dados e apuramentos inscritos na contabilidade ou escrita e as declarações apresentadas nos termos previstos na lei quando revelem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo.
Pelo anteriormente exposto, concluímos que a contabilidade do sujeito passivo apresenta deficiências importantes que impedem o apuramento da matéria tributável por métodos diretos, desde logo pela comprovada amissão de vendas, para além da incorreta aplicação das taxas de IVA as vendas declaradas, concluindo-se pela impossibilidade de controlar clara e inequivocamente o lucro tributável e o apuramento do IVA em falta, desde logo pelo desconhecimento da real amplitude das omissões e inexatidões, relativamente aos períodos de tributação de 2013 e 2014.
O contribuinte e o perito que o representa alegaram que a IT tinha possibilidade de apurar, de forma direta e exata, o IVA que deveria ter sido liquidado sobre as vendas declaradas, pela aplicação correta das diferentes taxas de imposto.
Quanto a esta questão, temos a referir que não compete à Autoridade Tributária substituir os contribuintes nas suas obrigações contabilísticas, nomeadamente no que respeita ao apuramento correto do IVA a liquidar, tendo em conta uma utilização assertiva e correta da taxa de IVA a aplicar a cada bem vendido. Apesar do PC se ter prontificado a quantificar, de forma direta e exata, as vendas declaradas, tendo em conta a correta ventilação das taxas de IVA, nunca o fez.
Encontram-se assim reunidos os pressupostos enunciados na al. b) do n.º 1 do art.º 87.º e na al. a) do art.º 88.º, ambos da Lei Geral Tributária, no art.º 59.º do Código do IRC e no art. 90.º do Código do IVA que preveem em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável o recurso à avaliação indireta.
Note-se que ambos os peritos concordaram pela existência de pressupostos que legitimam a quantificação da matéria tributável por métodos indiretos de avaliação.
Pelo exposto, afigura-se-nos que os fundamentos que sustentam a aplicação de métodos indiretos se encontram devidamente comprovados justificando-se assim o recurso aos mesmos, no sentido de se obter a quantificação da matéria tributável em cédula de IRC e IVA.
C.2-Quantificação da matéria tributável
Para o cálculo de lucro tributável presumido, a IT adotou e critério referido no ponto V (pág. 22 a 24) do relatório, o qual se consubstancia no seguinte:
Em sede de IRC:
(…)
Para o cálculo da matéria tributável presumida, em sede de IRC, a I.T. adotou o critério referido no ponto V.2.2.1 do relatório, o qual se consubstanciou na utilização da margem bruta sobre o custo obtida por taxas de IVA e relativas a amostragem selecionada pela IT. Estas margens estão indicadas na página 8 desta informação.
A fundamentação da adequação do critério encontra sustentação legal na al. a) do n.º 1 do art. 90.º da LGT e, de facto, não poderia haver indicadores mais apropriados para a quantificação das vendas omitidas, na medida em que aqueles resultam de elementos retirados da própria contabilidade do sujeito passivo. Mesmo que tenham sido obtidos por amostragem mais uma vez salientamos que, consideramos representativa a amostra selecionada e devidamente justificada a escolha dos produtos que a compõem.
Relativamente ao período de tributação de 2014, o CMV foi corrigido pelo acréscimo do montante que presumidamente foi calculado como respeitante à sobrevalorização detetada no inventário final de €23.432,99.
Assim, o montante do volume de negócios omitido e o resultado fiscal presumido são apurados através dos cálculos descritos nos quadros seguintes:
Ano de 2013IVA à taxa 6%Iva à taxa 13%IVA à taxa 23%Total
aCMV296 327,4930 345,90204 930,85531 604,24
bMG s/CMV ponderada25,85%23,29%30,35%
c=axb+aVendas presumidas372 928,1537 413,46267 127,36677 468,97
dVendas declaradas409 357,4047 704,67197 618,73654 680,80
e=c-dVendas omitidas-36 429,25-10 291,2169 508,6322 788,17
Ano de 2014IVA à taxa 6%Iva à taxa 13%IVA à taxa 23%Total
aCMV323 292,2033 807,15248 582,08605 681,43
bMG s/CMV ponderada24,48%27,14%28,60%
c=axb+aVendas presumidas402 434,1342 982,41319 676,55765 093,10
dVendas declaradas438 715,2844 967,02214 832,55698 514,85
e=c-dVendas omitidas-36 281,15-1 984,61104 844,0066 578,25
20132014
aLucro tributável declarado6 441,32-4 984,73
bVendas omitidas22 788,1766 578,25
cCMV omitidas0,0023 432,99
dCorreções técnicas9 137,4211 897,29
e=a+b-c+dLucro tributável presumido38 366,9150 057,82
(…)
D – Apuramento da matéria tributável (n.º 6, do art.º 92.º, da Lei geral tributária)
Face a tudo antes descrito, propomos que a RESOLUÇÃO que venha a ser assumida tenha em linha de conta as correções inicialmente propostas pelo serviço de inspeção tributária, conforme mapas que a seguir se apresentam:
(…)
Em sede de IRC – Ano de 2013
DEMONSTRAÇÃO RESULTADOSDECLARADOCORREÇÃOCORRIGIDO
A5001 Vendas e serviços prestados654 680,8022 788,17677 468,97
A5006 Custo merc. vendidas e matéria consum.531 604,24531 604,24
A5007 Fornecimentos e serviços externos37 387,12-4 034,0433 353,08
A5008 Gastos com o pessoal32 726,1432 726,14
A5015 Outros rendimentos e ganhos99,1399,13
A5016 Outros gastos e perdas20 657,0520 657,05
A5017 Res. ant. depr., gastos de fin. e imp.32 405,3826 822,2159 227,59
A5018 Gastos/ver. de depreciação e de amort.12 674,7812 674,78
A5020 Resultado operacional19 730,6026 822,2146 552,81
A5022 Juros e gastos similares suportados17 179,63-5 103,3812 076,25
A5023 Resultado antes de impostos2 550,9731 925,5934 476,56
A5024 Imposto sobre o rendimento do período1 626,141 626,14
A5025 Resultado líquido do período924,8331 925,5932 850,42
A Acrescer5 516,495 516,49
A deduzir0,000,00
Resultado Tributável6 441,3231 925,5938 366,91
Ano de 2014
DEMONSTRAÇÃO RESULTADOSDECLARADOCORREÇÃOCORRIGIDO
A5001 Vendas e serviços prestados 698.514,85 66.578,25 765.093,10
A5006 Custo merc. vendidas e matéria consum. 582.248,45 23.432,99 605.681,44
A5007 Fornecimentos e serviços externos 72.873,73 -3.922,43 68.951,30
A5008 Gastos com o pessoal 33.434,44 33.434,44
A5015 Outros rendimentos e ganhos 15.922,50 15.922,50
A5016 Outros gastos e perdas 9.674,61 9.674,61
A5017 Res. ant. depr., gastos de fin. e imp. 16.206,12 47.067,69 63.273,81
A5018 Gastos/ver. de depreciação e de amort. 13.630,72 13.630,72
A5020 Resultado operacional 2.575,40 47.067,69 49.643,09
A5022 Juros e gastos similares suportados 15.709,27 -7.974,86 7.734,41
A5023 Resultado antes de impostos -13.133,87 55.042,55 41.908,68
A5024 Imposto sobre o rendimento do período 369,21 369,21
A5025 Resultado líquido do período -13.503,08 55.042,55 41.539,47
A Acrescer 8.523,35 8.523,35
A deduzir 5,00 5,00
Resultado Tributável -4.984,73 55.042,55 50.057,82
(…)” – Cf. fls. 71 a 78 do PA.
13. Em 06.04.2017, a AT emitiu a liquidação de IRC n.º ...05, relativa ao exercício de 2014, no valor de €9.370,57 que foi objeto de impugnação judicial, originando a autuação do processo nº 799/17.1BEAVR deste Tribunal – consulta ao SITAF;
14. Em 07.04.2017 a AT procedeu às seguintes liquidações de IVA e respetivos juros compensatórios, que notificou validamente à agora impugnante para pagamento voluntário até 07.06.2014:
Nº Liquid.PeríodoIVAJCTotal
...80 2014/01 927,43 0 927,43
0 88,93 88,93
...85 2014/02 2685,80 0 2685,80
0 248,65 248,65
...87 2014/03 1480,60 0 1480,60
0 131,75 131,75
...98 2014/04 2198,12 0 2198,12
0 188,37 188,37
...00 2014/05 1618,74 0 1618,74
0 133,57 133,57
...04 2014/06 1550,14 0 1550,14
0 122,48 122,48
...16 2014/07 1084,09 0 1084,09
0 82,09 82,09
...19 2014/08 737,49 0 737,49
0 53,42 53,42
...23 2014/09 1012,80 0 1012,80
0 69,92 69,92
...34 2014/10 104,14 0 104,14
...39 2014/11 0 0 0
...43 2014/12 1766,82 0 1766,82
0 104,16 104,16
Total de 2014 15166,17 1223,34 16389,51
019166677 2015/06 831,23 0 831,23
0 72,35 72,35
...96 2015/08 497,29 0 497,29
0 38,59 38,59
...99 2015/09 432,83 0 432,83
0 31,70 31,70
...16 2015/10 461,35 0 461,35
0 31,71 31,71
...62 2015/12 3387,03 0 3387,03
0 202,96 202,96
Total de 2015 5609,73 377,31 5987,04
...86 2016/09 106,59 0 106,59
...96 2016/10 893,72 0 893,72
Total de 2016 1000,31 0 1000,31
TOTAL impugnado21776,21 1600,65 23376,86
– Cf. parte introdutória e artigo 153º da p.i. e documentos anexos, de fls. 34 a 64 e 462 a 484 do processo físico.
15. Em 03.09.2017, a impugnante apresentou a presente impugnação judicial. – fls. 1 do processo físico.

Matéria de facto dada como não provada:
Não há factos a considerar como não provados com relevância para a boa decisão da questão.

Motivação de facto
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao PA, que não foram impugnados, e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados – artigo 74º da LGT - também são corroborados pelos documentos juntos aos autos - artigos 76º, nº 1, da LGT e 362º e seguintes do Código Civil (CC) – identificados em cada um dos factos descritos no probatório.»
2.2. De direito
Em sede de aplicação do direito, a decisão recorrida julgou procedente a presente impugnação e, em consequência, anulou as liquidações de IVA, relativas ao ano de 2014, no montante total de € 21.776,21 acrescido de € 1.600,65 de juros compensatórios, identificada no item 14. do probatório, tendo sido fixado o valor da causa em € 23.376,86.
Cumpre não olvidar que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cf. artigo 639º, do CPC ex vi do artigo 281º, do CPPT).
2.2.1. A Recorrente (AT) dissente do julgado alegando, entre o mais, que a sentença ora em apreciação conferiu à impugnante um pedido de tutela jurisdicional para além do peticionado, ou seja, que com a prolação da sentença, ora posta em crise, condenou a Administração Fiscal para além do pedido que era exclusivo das correcções operadas com recurso aos métodos indirectos, abrangendo ao anular as liquidações de IVA as correcções meramente aritméticas extravasando o pedido formulado pela autora. Constatação esta que a Recorrente enquadra enquanto vício de nulidade da sentença recorrida, conforme o disposto no artigo 615, nº.1, al. d) e e), do CPC, ao ter aquela emitido decisão anulatória em objecto diverso do peticionado pela sociedade impugnante, ou, em todo o caso, por ter incorrido em excesso de pronúncia (cfr. conclusões A. a F. das alegações de recurso).
Em suma, com base em tal argumentação a Recorrente pretende concretizar uma nulidade da decisão recorrida, devido a condenação para além do pedido e excesso de pronúncia e, se assim não se entender, que seja considerada a ocorrência de erro de julgamento de facto e de direito ao decidir-se ma sentença pela anulação total das liquidações de IVA (e respetivos juros compensatórios), quando a sua apreciação se cingiu à questão da falta de verificação de pressupostos para a determinação da matéria tributável através de métodos indiretos (cfr. conclusões G. a K. das alegações de recurso).
Analisemos se a decisão recorrida padece de tal pecha.
Nos termos do preceituado no citado artigo 615º, nº.1, al. e), do CPC, ex vi do artigo 281º, do CPPT, é nula a sentença quando o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, assim infringindo o brocardo latino ne eat iudex ultra petita partium. Esta nulidade da sentença resulta da violação da regra consagrada no artigo 609º, nº.1, do mesmo diploma, sendo relativa aos limites da condenação, tudo tendo por pano de fundo o pedido formulado pelas partes e que circunscreve o thema decidendum [cf. artigo 3º, nº.1, do CPC; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.691; José Lebre de Freitas e Outro, Código de Processo Civil Anotado, II Vol., 4ª. Edição, Almedina, 2021, pág.735 e seg.; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. Edição, Almedina, 2009, pág.58; Jorge Lopes de Sousa, Código de Processo e Procedimento Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. Edição, 2011, pág.367 e seg.].
Por outro lado, deve relembrar-se que a petição inicial, à semelhança de outros articulados, reveste a natureza de acto jurídico, sendo interpretada, por força do disposto no artigo 295º, do Código Civil, em conformidade com as regras atinentes à interpretação da declaração negocial, para tanto devendo chamar-se à colação o regime de interpretação do negócio jurídico previsto no artigo 236º e seg. do citado diploma [cf. Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª. Edição, Coimbra Editora, 1989, pág.444 e seg.; Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 3ª. Edição, Coimbra Editora, 1982, pág.222 e seg.; acórdãos do STJ, de 20.02.2001, proc.01A048 e, de 25.03.2004, proc.04B107; acórdão do STA, de 13.10.2010, in rec. 0241/10, de 09.12.2021, in rec.1954/16.0BEPRT, de 22.06.2022, in rec.364/20.0BELRS].
Por sua vez o citado artigo 615º, nº.1, al. d), do CPC, ex vi do artigo 281º, do CPPT, alude à nulidade da sentença por excesso de pronúncia. O excesso de pronúncia pressupõe que o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes. Por outras palavras, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de ultra petita, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, questões e, por outro, razões ou argumentos para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das questões) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das razões ou argumentos invocados para concluir sobre as questões (cf. Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 143 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690 e seg.; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o excesso de pronúncia (vício de ultra petita), como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125º, nº.1, do CPPT, no último segmento da norma.
No caso sub judice, manifestamente não ocorre nem excesso de pronúncia nem condenação para além do peticionado, pelo que, carece de razão a Recorrente.
Vejamos.
In casu, no articulado inicial (cf. petição inicial junta a fls. 1 a 67 do processo SITAF), a sociedade impugnante e ora recorrida identifica claramente como objecto do processo as liquidações de IVA relativas ao ano de 2014, mais juntando, como documento nº.1, cópias das demonstrações de liquidação, identificando assim os actos impugnados e, quanto ao fundamento de impugnação ali expressamente delimita o mesmo quanto (i) aos motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos, constantes do ponto IV do Relatório Final de Inspeção [cf. artigos 1º a 126º da petição], (ii) dos critérios de cálculo dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos [cf. artigos 127º a 133º] e (iii) dos princípios violados [cf. artigos 134º a 150º].
Na contestação, a Fazenda Pública igualmente identifica como objecto do processo as liquidações adicionais de IVA e respectivas liquidações de juros compensatórios, relativos a períodos de imposto do ano de 2014 (cf. artigo 1º da contestação junta a fls.497 e seg. do processo SITAF) e de que por via da presente impugnação judicial a sociedade vem insurgir-se contra a aplicação de métodos indirectos em sede de IVA.
Também nas alegações escritas produzidas pelas partes nenhuma dúvida se coloca quanto ao objecto e fundamento do presente processo (cf. alegações juntas pela Fazenda Pública a fls. 547 a 550 do processo SITAF; e alegações juntas pela sociedade ora recorrida a fls. 553 a 581 do processo SITAF).
Por sua vez, na sentença objecto do presente recurso o Tribunal a quo, após identificar as mencionadas liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios no relatório, ali identificou as questões a tratar, quais sejam, (i) falta de verificação de pressupostos para a determinação da matéria tributável através de métodos indiretos (artigos 1º a 126º da p.i.); (ii) errónea quantificação por excesso da matéria coletável, decorrente de erro de cálculo na margem de comercialização utilizada (artigos 127º a 133º da p.i.), com consequente violação dos princípios da legalidade, da boa-fé, da justiça e da imparcialidade (artigos 134º a 152º da p.i.), e, de que a autora concluiu pedindo a anulação da liquidação e respetivos juros compensatórios, com todas as consequências legais.
Ora, de todos aqueles fundamentos quanto às liquidações adicionais de IVA de 2014 a decisão recorrida apenas se limitou na sua apreciação à falta de verificação dos pressupostos de recurso a métodos indirectos, dando como prejudicado o erro na quantificação, por excesso, da matéria colectável (vide fls. 28 a 44 da sentença). Isto é, em momento algum houve excesso de pronúncia, pois que as correcções meramente aritméticas operadas no âmbito do mesmo RIT em sede de IVA relativo ao período de 2014 não foram alvo de qualquer apreciação, como se impunha face ao objecto nos exactos termos em que o mesmo foi concebido pelas partes e pelo Tribunal a quo.
E, da circunstância de no segmento decisório se determinar anulação das liquidações, com todas as consequências legais, sem mais, consubstancia uma evidente falta de precisão, como se depreende claramente de todo o teor da petição inicial, da causa de pedir na mesma estruturada e da fundamentação de direito que antecede aquele decisório. Por outras palavras, o que poderá estar em causa é a interpretação a retirar daquele segmento decisório, sendo manifesto que a decisão tem que ser considerada como um todo e, como tal anulação terá que ser considerada como limitada à parte impugnada, qual seja na exacta medida em que as liquidações adicionais de IVA foram determinadas com recurso a métodos indirectos extensível aos juros compensatórios respectivos, ou seja, ressalvada daquela anulação os valores decorrente das correções meramente aritméticas.
Somos de concluir que perante a interpretação do segmento decisório que se impõem e sendo o único paginável com os articulados e a fundamentação da sentença, não padece a sentença recorrida das nulidades que lhe são imputadas.
Rematando, no mais e quanto ao erro de julgamento imputado quanto ao segmento decisório poder comportar as liquidações no seu todo, cumpre igualmente aqui considerar que o mesmo não se verifica atenta a interpretação a retirar daquela anulação, a qual a manter-se e a ser por nós confirmada será objecto de densificação e concretização a obviar qualquer errada acepção do seu sentido na parte dispositiva deste acórdão.

2.2.2. Prosseguindo, em face do mais alegado pela Recorrente, cumpre apreciar e decidir do erro de julgamento da errada valoração da factualidade assente e subsequente erro de julgamento de direito em que terá incorrido o Tribunal a quo ao ter considerado que “(...) os pressupostos em que assentou a decisão de recorrer a métodos indiretos de avaliação, apreciados de forma isolada ou em conjunto, não são adequados a esse fim.”.
Alega a Recorrente (AT) que da factualidade relevante da prova produzida e dada como provada resulta que os indícios enunciados no ponto IV. do RIT, de fls. 1 a 18 do Processo Administrativo (constantes do facto «6.» do subponto 3.1 – Matéria de facto dada como provada, do ponto 3 – Fundamentação da sentença) e, bem assim, no parecer no qual assentou a decisão do procedimento de revisão da matéria tributável, de fls. 71 a 78 do Processo Administrativo (constantes dos factos «11.» e «12.» do subponto 3.1 – Matéria de facto dada como provada, do ponto 3 – Fundamentação da sentença) são não só reveladores da falta de credibilidade da contabilidade da impugnante e bem demonstrativos de que a contabilidade da impugnante não reflete a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, constituindo factos que ilidem a presunção de verdade dos valores declarados prevista no n.º 1 do artigo 75.º da LGT, como ademais evidenciam um quadro global, sólido e coerente de que a contabilidade da impugnante não merece credibilidade e que se mostra inviável a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, razão pela qual foi a mesma calculada com recurso a métodos indiretos, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 87.º e da alínea a) do artigo 88.º, ambos da LGT. [vide conclusões L. a DD. das alegações de recurso].
O erro de julgamento recai sobre um elemento dos dois elementos que estruturam a decisão jurisdicional: a fundamentação de facto e a fundamentação de direito. O denominado erro de facto, por contraposição ao erro de direito, pode resultar de errada apreciação do material probatório que a ocorrer se estende a fixação da materialidade fáctica relevante para a decisão e/ou conduzir a uma desacertada interpretação dessa materialidade.
Como assertivamente se elucida, no acórdão do TCA Sul de 10.07.2014, proferido no âmbito do processo n.º 7813/14, “No primeiro caso o erro consubstancia-se numa indevida utilização da livre convicção, erro esse que deve ser demonstrado pelo recorrente através do exercício de um duplo ónus: um, (i) o de circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso indicando claramente os segmentos da decisão que considera padecerem de erro de julgamento; outro, (ii) fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa.
Ora, quando a selecção dos factos não é colocada em questão em sede de recurso, mas apenas se coloca a ênfase impugnatória na subsunção dos factos ao direito aplicável tendo em vista uma solução jurídica diferente da decretada, o erro que se suscita não é um erro na apreciação da prova, mas sim um erro de julgamento de direito.
Ora, como decorre das alegações e conclusões a impugnação da matéria de facto não foi correctamente estruturada segundo o regime legal aplicável (vide artigo 640º do CPC), para que seja possível a este Tribunal ad quem alterá-la. Pelo contrário a AT entende que ocorreu um erro na apreciação da matéria de facto, isto é, que os factos dados como provados conduzem a um resultado jurídico diferente daquele a que chegou a sentença e sobre os factos que considera erroneamente valorados, situações descritas no RIT e reafirmadas em sede de decisão proferida no procedimento de revisão, cinge-se no domínio da prova a divagações decorrente do bom senso e experiência e sua melhor interpretação e valoração em sede de subsunção jurídica que no seu entender, o Tribunal a quo, errou.
Assim sendo, não cumpre proceder a qualquer alteração ou aditamento ao probatório consignado na sentença, cumprindo tão só a este Tribunal ad quem, no que tange ao recurso da AT aferir do eventual erro na apreciação e valoração da matéria de facto e consequentemente, no julgamento de direito e na solução jurídica preconizada na sentença quanto ao erro que imputa ao julgamento de verificação dos pressupostos aos métodos indirectos relevados em sede do RIT.
Vejamos, pois, o que se nos oferece dizer, começando por efectuar um breve enquadramento jurídico do instituto da tributação com recurso a métodos indirectos – em sede de verificação dos pressupostos, para, após, apreciarmos da verificação, ou não, do erro de julgamento assacado à sentença recorrida.
Nos termos do artigo 81.º da Lei Geral Tributária (LGT):
“1 - A matéria tributável é avaliada ou calculada diretamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei”.
Por seu turno, o artigo 83.º do mesmo diploma determina que:
“1 - A avaliação directa visa a determinação do valor real dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação.
2 - A avaliação indirecta visa a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha”.
É desiderato constitucionalmente consagrado que a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real (cf. artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa). Reflexo desse princípio determina o artigo 85.º, n.º 1, da LGT, que a avaliação indirecta é subsidiária da avaliação directa.
Portanto, temos que a avaliação directa tem como ponto de partida as declarações dos contribuintes e/ou os dados apurados na sua contabilidade, que se presumem verdadeiros – cf. o artigo 75.º, n.º 1, da LGT. Contudo, como decorre desse mesmo normativo, no seu n.º 2, a presunção de veracidade da contabilidade cessa quando essa revelar “… omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”.
Atenha-se, todavia, que não é qualquer omissão, erro ou inexatidão das declarações ou da contabilidade do sujeito passivo que permite o recurso a métodos indirectos de avaliação da matéria coletável, sendo exigido que tais irregularidades sejam de tal forma relevantes que tornem inviável a quantificação directa. Logo, se, apesar de haver irregularidades contabilísticas, for possível quantificar directamente a matéria coletável, deve-se lançar mão dos métodos directos. Ou seja, sendo certo que a avaliação directa parte das declarações dos contribuintes ou dos dados constantes da contabilidade, a mesma ainda assim pode fundar-se noutros elementos objetivos, que permitam, com segurança, concluir no sentido da ocorrência do facto tributário e da sua quantificação concreta afastando o recurso a avaliação indirecta, aliás o que a lei privilegia.
Temos então, que o nosso ordenamento prevê que a avaliação da matéria tributável se possa realizar directa ou indirectamente, sendo que o recurso à avaliação indirecta funciona como ultima ratio, só podendo ocorrer quando se revele impossível o recurso à avaliação directa, esta a primeira premissa a reter, da qual se infere que o recurso a uma ou outra das formas de avaliação não é uma opção discricionária da AT, isto é, ou se verificam condições para a avaliação directa ou, não existindo, nos termos já assinalados supra, é possível recorrer à avaliação indirecta.
Daí o caráter subsidiário da avaliação indirecta, previsto no artigo 85.º da LGT, avaliação esta que deverá ocorrer apenas nos casos previstos nos artigos 87.º e 89.º do mesmo diploma legal. Tal decorre da LGT, para que especificamente remetem os artigos 57.º do CIRC e 90º do CIVA [pois que in casu estamos perante liquidações adicionais de IRC de 2011 a 2013].
Assim, perante rendimentos em que se verifique não ser possível a avaliação directa, a AT pode recorrer a métodos de avaliação indirecta, sendo que o facto de se recorrer à tributação por métodos indirectos não significa que a totalidade da contabilidade do sujeito passivo seja desconsiderada, mas tão-só a parte que se considera não reflectir a realidade e cuja presunção de veracidade é, por isso, afastada.
Para que seja legítimo o recurso à tributação por via dos métodos indirectos, segunda premissa, cabe à AT o ónus da prova de que se reúnem os pressupostos da sua aplicação, consubstanciando-se tal ónus probatório na demonstração da existência de situações fácticas, designadamente irregularidades contabilísticas, que assumam alcance tal que impossibilitam o recurso a métodos directos de avaliação.
Assim, nos termos do artigo 87.º, n.º 1, da LGT:
“A avaliação indirecta só pode efetuar-se em caso de:
(…) b) Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto…
(...)”.
Esta situação prevista na alínea b) supratranscrita remete-nos para o artigo 88.º da LGT, nos termos do qual:
“A impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, referida na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorreções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:
a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais;
(...)”.
[A transcrição dos preceitos é circunscrita às alienas invocadas em sede motivação do recurso aos métodos indirectos pelos SIT in casu, quais sejam artigos 87º, n.º 1 al. b) e 88º, al. a), ambos da LGT]
Socorrendo-nos do ditames jurisprudenciais, como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 07.10.2009 (Processo: 0422/09) diremos: “[S]ão excepcionais e obedecem a tipificação legal (em especial a contida no artigo 87.º da Lei Geral Tributária) os casos em que é lícito à Administração tributária fixar a matéria tributável dos contribuintes por “avaliação indirecta”, afastando-se dos valores declarados, porque inexistentes ou fundamentadamente desmerecedores de confiança, recorrendo a outros elementos (também objecto de previsão legal) que permitem a determinação do valor tributável”.
E, para que seja legítimo o recurso à tributação por via dos métodos indiretos, cabe à AT o ónus da prova de que se reúnem os pressupostos da sua aplicação.
A este respeito, escreveu-se no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 17.03.2010 (Processo: 01211/09), que: “Tendo a avaliação indirecta carácter excepcional (cfr. o n.º 1 do artigo 81.º da LGT) e subsidiário em relação à avaliação directa (cfr. o artigo 85.º, n.º 1 da LGT), cabe à Administração tributária a demonstração da verificação dos pressupostos do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT)”.
Temos então, que tendo a avaliação indirecta carácter excepcional (n.º 1 do artigo 81.º da LGT) e subsidiária em relação à avaliação directa (artigo 85. ° n.º 1 da LGT), cabe à AT a demonstração da verificação dos pressupostos do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74. ° n.º 3 da LGT).
Acresce que, face ao que determina o princípio da verdade declarativa, plasmado no artigo 75.º da LGT, a factualidade coligida pela AT tem de ser capaz de abalar a presunção de veracidade das operações constantes na escrita do sujeito passivo de imposto.
Com efeito, quem tem a seu favor uma presunção legal está dispensado da prova do facto presumido, conforme prescrevem os artigos 349.º e 350.º nº 1 do Código Civil.
Assim, os sujeitos passivos, tendo a sua escrita organizada conforme as exigências legais, não necessitam provar a veracidade dos dados que dela decorrem, a menos que se verifiquem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva.
Pois que, nos termos do que dispõe a alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT, deixa de se verificar a presunção de veracidade dos elementos contabilísticos quando “as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”. Ou seja, cessa a presunção “quando, estando, embora, a escrita ou contabilidade organizada de acordo com a lei, enferme de erros ou inexactidões, ou haja “indícios fundados” de que, apesar da sua correcta organização, não reflecte a matéria tributável efectiva” (cf. acórdão do Pleno da secção do Tributário do STA de 07.05.2003, in rec. 01026/02).
Nesta precognição cabe a situação da contabilidade bem organizada, mas com omissão de operações efectuadas ou valores incorrectos.
Por conseguinte e considerando que a AT actua no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, incumbe-lhe o ónus de provar que se verificam os pressupostos fáctico-jurídicos fundamentadores da sua actuação, recaindo sobre esta o ónus de demonstrar a factualidade que a levou a considerar que os valores declarados pela Impugnante ora Recorrente não eram os correctos, tendo ocorrido a omissão, erros ou inexactidões aventadas.
Assim quando a AT reúne esses indicadores, cumpre o ónus que sobre si incidia, tal qual alude o artigo 74.º da LGT. Isto porque tais indicadores são os factos constitutivos do direito a desconsiderar os dados da declaração do sujeito passivo, que deixam então de beneficiar da presunção.
Reunidos tais indícios, o sujeito passivo de imposto “já não pode reconduzir-se à presunção de verdade da sua declaração (porque esta já foi elidida) nem pode remeter para o ónus da AT (porque já foi cumprido), assim como também não pode amparar-se no facto de lhe estar a ser exigida uma prova impossível (a de que não teve os rendimentos que a AT lhe imputa) porque, como já não beneficia da presunção de verdade da sua declaração na parte correspondente, do que se trata é de provar um facto positivo: o de que os rendimentos” reais “correspondem aos valores declarados ou outros valores diferentes dos apurados.” - cfr. ainda o Acórdão do TCA Norte de 27.09.2012, rec.00885/07.0.
Acresce que, à AT não está vedado recorrer a provas indirectas ou a “factos indiciantes dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova (...). Tais juízos devem ser, contudo, suficientemente sólidos para criar no órgão de aplicação do direito a convicção da verdade...” – como alude Alberto Xavier, in Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 154.
Em jeito de síntese, diremos que cabe à AT a demonstração de que os pressupostos que legitimam o recurso a avaliação da matéria tributável por métodos indiretos se verificam, consubstanciando-se tal ónus probatório na demonstração da existência de situações fáticas, designadamente irregularidades contabilísticas, que assumam alcance tal que impossibilitam o recurso a métodos diretos de avaliação.
Tecidos estes considerandos e perante a posição abalizada em sede de recurso, cumpre, então, aferir se se encontra devidamente explanado e fundamentado o recurso a métodos indirectos, atendendo às regras do ónus da prova já referidas supra, ou seja, aferir se, no procedimento tributário, são identificadas situações de onde resulte a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável. Releva neste particular a fundamentação do acto tributário, porquanto a fundamentação a considerar tem de ser a que é contemporânea do acto, e não qualquer fundamentação a posteriori.
Vejamos então, o que a propósito se escreveu na sentença recorrida, para alcançarmos em que medida a fundamentação escorrida sobre a verificação dos pressupostos do recurso aos métodos indirectos é posta em causa pela Recorrente, em sede de errada valoração e subsunção dos factos assentes elencados em sede de conclusões, sendo que ali se discorreu nos seguintes termos:
«No caso dos autos, a AT começou por duvidar da verdade das declarações do contribuinte por ter verificado havia ventilação das taxas de IVA faturada em diversos produtos – pág. 2 do Relatório, a fls. 4vº do PA.
Depois, na ação inspetiva, a AT concluiu que resulta “da escrituração do sujeito passivo, não refletir a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido, pelo que, face à impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável, e ao facto de as irregularidades e os fundamentos referidos no presente relatório serem insupríveis…”
Para evidenciar a ocorrência de omissões e inexatidões que influenciaram o recurso a avaliação por métodos indiretos, a AT elencou, neste caso concreto, os seguintes factos-índice ou indícios:
(i) Resultados da atividade diminutos, não compatíveis com os empréstimos efetuados ao sócio gerente e emissão irregular de cheques;
(ii) Indícios da ventilação das taxas de IVA, nomeadamente nas taxas de 23% e 6%;
(iii) Indícios de omissões de vendas: as margens amostrais calculadas são muito superiores às declaradas;
(iv) Venda de produtos sem referência, denominados como “diversos”, o mesmo produto a ser transacionado a diferentes taxas de IVA e elevado número de devoluções/anulações;
(v) Irregularidades nos inventários a nível das quantidades e da valorização;
Tendo em conta os factos descritos no Relatório de inspeção, cumpre, agora, apurar se estes indícios podem constituir fundamento válido à decisão de proceder à avaliação indireta com fundamento na impossibilidade de determinação e quantificação direta e exata da matéria tributável da impugnante nos exercícios em causa, nos termos dos artigos 87º, nº 1, al. b), e 88º, da LGT.
Quanto ao primeiro indício, relativo aos “Resultados da atividade diminutos, não compatíveis com os empréstimos efetuados ao sócio gerente e emissão irregular de cheques”, a impugnante alega que os mesmos não são passíveis de justificar o recurso a métodos indiretos para a determinação da matéria tributável, podendo, quanto muito, originar uma correção técnica, desconsiderando-se os respetivos encargos bancários (artigos 3.º a 17.º da petição inicial).
A Fazenda Pública contesta alegando que os resultados declarados não são compatíveis com os empréstimos concedidos pela impugnante ao sócio gerente a que acresce não existir registo contabilístico de juros cobrados. Por outro lado, invoca que a sociedade recorre a empréstimos para se financiar, suportando os respetivos encargos (artigos 12.º a 14.º da contestação).
O MP adere a esta última posição.
A impugnante não põe em causa que a sua contabilidade, quanto a este aspeto, padecia de insuficiências, mas defende que bastaria fazer a mera correção técnica.
De facto, como já referimos, deverá privilegiar-se o recurso a métodos diretos de correção. Ou seja, apenas se poderá recorrer a métodos indiretos quando as irregularidades detetadas detenham caraterísticas tais que não seja possível, de modo algum, o recurso a métodos diretos.
No Relatório da inspeção, a AT quantifica os valores dos empréstimos concedidos aos sócios, possuindo elementos para efetuar as correções dos empréstimos concedidos pela impugnante ao sócio gerente com recurso a métodos diretos.
Com efeito, no RIT levado ao probatório e na decisão que recaiu sobre o procedimento de revisão, constam os resultados tributários apresentados pela impugnante e o valor dos empréstimos aos sócios, permitindo à AT proceder ao apuramento do lucro tributável por apuramento direto ou correções técnicas, bastando-lhe para tanto, e como bem refere a impugnante desconsiderar aqueles valores.
Porém, o Tribunal interpreta a invocação deste facto-índice, não no sentido de que a AT considera que a contabilização de tais empréstimos padece de falsidade, absoluta ou relativa, mas no sentido de que, não havendo lucros na empresa, isso não é compatível com a existência de liquidez suficiente para fazer empréstimos tão avultados a sócios, aparentemente gratuitos, o que denuncia a existência de proveitos não declarados. E que, nessa medida, não pode apurar direta e exatamente o valor desses proveitos omitidos, dado que nada garante que o seu valor se limita ao valor dos referidos empréstimos.
Contudo, na falta de mais elementos, o Tribunal considera que cabia à AT o ónus de indicar outros indícios que apontem no sentido da existência de proveitos não declarados, o que não logrou fazer, sabendo que, em tese, é possível que a gerência opte por pedir financiamentos, como comprovadamente fez, facto que aparentemente justifica a origem dos meios financeiros emprestados a sócios, dando a ideia de que esse capital não resulta de proveitos omitidos à contabilidade.
Assim, o Tribunal conclui que este argumento não é suficiente para permitir o recurso à avaliação por métodos indiretos.
O segundo facto indiciário apontado pela AT consiste na ventilação das taxas de IVA, nomeadamente nas taxas de 23% e 6%.
A AT sustenta que “existem indícios claros de que houve compras de mercadorias à taxa de IVA de 23% tendo o IVA sido deduzido, e na venda das mesmas, o registo foi efetuado por uma taxa diferente (13% ou 6%), o que implicou que o IVA declarado fosse inferior ao que deveria ter sido.”
Por sua vez, a impugnante invoca que, para quantificar a alegada ventilação de taxas, a AT tinha todos os dados de que necessitava para corrigir os produtos que, eventualmente, tivessem sido vendidos com taxa de IVA diferente da legalmente prevista, o que permitia a sua quantificação direta e exata vedando a aplicação de métodos indiretos à determinação da matéria coletável.
Sustenta que a AT poderia e deveria, porque estava ao seu alcance, identificar todos os produtos que apresentavam ventilação de taxas, mas que se limitou a basear-se numa percentagem, construída com base na amostra que, para esse concreto efeito construiu (artigo 18.º a 36.º da petição inicial)
Vejamos.
No cálculo da ventilação das taxas de IVA, a AT teve em conta o custo das mercadorias vendidas e as vendas declaradas por referência à declaração anual de IVA apresentada pelo sujeito passivo e os seus inventários, tendo subdividido ambas as rubricas pelas respetivas taxas de IVA.
Perante os resultados obtidos constatou nos anos de 2013 e 2014, uma margem negativa obtida nos produtos transacionados à taxa de 23% e ainda margens muito divergentes consoante as diferentes taxas de IVA, o que lhe permitiu concluir pela existência de imposto liquidado inferior ao devido.
Com base nisso, a AT concluiu que houve compras de mercadorias à taxa de 23%, e a respetiva dedução, que foram vendidas à taxa de 13% ou de 6%, implicando que o IVA liquidado e declarado fosse inferior ao que deveria ter sido.
Tal raciocínio pressupõe que tudo se completa dentro de uma alternativa: ou as margens do seu estudo são harmoniosas, e isso significa que não houve ventilação das taxas nem vendas a taxa inferior à respetiva taxa de aquisição, ou essas margens são divergentes, como é o caso, e isso significa que houve ventilação das taxas e vendas a taxas inferiores às de aquisição.
Todavia, não está provado que isso seja verdade no caso concreto.
Se assim era, a AT deveria ter exibido algumas situações concretas, a título de exemplo, não se limitando a presumir que a divergência das margens apurada no referido estudo tem unicamente o significado que ela própria lhe atribui.
Até porque a divergência de margens de lucro poderá resultar do facto de as mercadorias, adquiridas à taxa de 23% de IVA, serem vendidas a preços substancialmente inferiores e com a mesma taxa. O mesmo podendo suceder com as mercadorias adquiridas à taxa intermedia e à taxa reduzida.
Além disso, o facto de alegadamente ser “normal”, “em estabelecimentos similares”, que os produtos em que incide a taxa normal “são os que normalmente apresentam margens mais elevadas”, não é relevante para o caso concreto, quando está em causa a verificação dos pressupostos da aplicação de métodos indiretos.
Na verdade, como melhor se verá, tal decisão não pode assentar em presunções ou em juízos de “normalidade” porque isso está vedado pelo artigo 104º, nº 2, da CRP que dispõe que a tribulação das empresas incide fundamentalmente sobre o rendimento real (sobre a capacidade tributária real) e concreto, e não sobre a capacidade tributária que seria de esperar em condições normais (que são sempre abstratas).
Enquanto a AT não provar objetivamente que se verificam os pressupostos que legitimam a quantificação com recurso a presunções e estimativas, está impedida de usar tais métodos, sob pena de inversão metodológica, como melhor se explicará mais abaixo.
Além disso, a AT não refere de que modo a aludida ventilação das taxas a impossibilita de determinar direta e exatamente o valor do IVA omitido em consequência de tal comportamento e o Tribunal não vislumbra qualquer impedimento à prova dos factos concretos que confirmem ou infirmem a conclusão a que abstrata e indiretamente chegou.
Afigura-se que a AT tinha acesso a elementos (declaração anual de IVA apresentada e as vendas declaradas nos inventários, e, se necessário, as faturas de compra e de venda) para recorrer à quantificação direta e exata dos produtos transacionados às diferentes taxas de IVA e desse modo proceder à correção daquele imposto.
Assim, considerando, podemos igualmente concluir que este argumento, só por si, não é idóneo para permitir o recurso à avaliação por métodos indiretos.
A AT invoca, ainda, como terceiro facto indiciário, a aparente existência de omissões de vendas: porquanto as margens, apuradas com base numa amostragem efetuada por si, são muito superiores às declaradas.
Para testar a margem das operações efetuadas pelo sujeito passivo, a AT escolheu produtos com maior peso no valor total de vendas dos anos 2013 e 2014, que representavam 43% em 2013 e 40% em 2014 (relativamente ao volume de negócios).
Após, dividiu por produtos, segundo as diversas taxas de IVA, apurando as respetivas margens amostrais, de 2013 e 2014.
Finalmente, a AT calculou a margem amostral sobre o preço de custo desses produtos teve por base o custo unitário médio e o valor médio de venda dos mesmos, ponderando-se o resultado obtido pelo peso de cada uma das referências no total das vendas da amostra (anexo 7 do Relatório, a fls. 30 a 35 do PA).
A AT efetuou, ainda, o cálculo da margem global, incluindo os produtos vendidos às diversas taxas, ponderada pelo volume de negócios (anexo 8 do Relatório, a fls. 36 a 39 do PA).
A AT concluiu que as margens assim apuradas na amostra são superiores às margens declaradas, relativas à totalidade do negócio e que o desfasamento das margens calculadas face aos valores declarados traduzia a existência de omissões no registo de vendas.
A Impugnante sustenta que as margens amostrais estão mal calculadas, existindo erro de cálculo meramente aritmético nos produtos elencados pela AT, que teve uma implicação direta, na margem bruta de comercialização calculada pela AT, implicando uma diferença desfavorável à impugnante e um consequente excesso de quantificação da margem bruta de comercialização e, por consequência, da matéria coletável.
Sustenta ainda a existência de erro na determinação do preço de compra médio e ainda na escolha dos produtos que integraram a amostra e na desconsideração dos descontos e promoções inerentes às superfícies comerciais (artigos 60.º a 126.º da petição inicial).
Apreciando.
Está em causa a questão de saber se o resultado (divergente) obtido com base na amostragem é idóneo para justificar a conclusão de que houve omissão do registo de proveitos e que se justifica o recurso a métodos indiretos de avaliação.
Ora, a “análise amostral” é um mero teste de validação dos resultados declarados (pág. 13 do Relatório), aceitável em Auditoria, mas cujo resultado é meramente aproximativo da realidade global, e não necessariamente coincidente com ela, dado que se refere apenas a uma amostra, que por natureza é parcial e não representativa da globalidade dessa realidade.
Uma vez que transposição do resultado da amostragem para a globalidade do universo do qual foi retirado a amostra equivale a uma presunção (de que a realidade apurada numa amostra coincide com a realidade do universo do qual a amostra foi retirada e é uma parte), a apontada divergência entre a margem amostral e a margem declarada não pode servir de fundamento para justificar a decisão de proceder à quantificação com base em métodos indiretos, os quais são o resultado da mesma amostragem. Sob pena de inversão metodológica, como melhor se explicará mais abaixo.
E nesse sentido, este facto indiciário, só por si, também não é suficiente para permitir o recurso a métodos indiretos para determinação da matéria tributável.
O quarto facto indiciário apontado pela AT refere-se à venda de produtos sem referência, denominados como “diversos”, o mesmo produto a ser transacionado a diferentes taxas de IVA e elevado número de devoluções/anulações.
No Relatório inspetivo, a AT começa por referir a existência nos ficheiros SAFT de produtos com descritivo: “mercadoria 5%”, no total de € 3.754,98 (em 2014), e considera que isso indicia a possibilidade de vendas, de mercadorias não especificadas, à taxa reduzida, porque falta a referência dos referidos produtos e denominados “diversos”.
A impugnante alega que a AT identificou todas as situações passíveis de estarem naquelas circunstâncias, não encontrando outras que lhe tenha suscitado dúvidas, razão pela qual se mostra insuscetível o recurso a métodos indiretos (artigos 37.º a 40.º da petição inicial).
Ora, a parte do Relatório levado ao probatório evidencia que também aqui a AT detinha elementos que lhe permitiam recorrer à quantificação direta e exata dos produtos com o descritivo: “mercadoria 5%”, no total de € 3.754,98.
Com efeito, a AT refere que o ficheiro SAFT identificou aqueles produtos como venda de mercadoria a taxa reduzida e quantificou-os, o que permitia a correção direta e exata.
Acresce que o mero “indício da possibilidade” de haver omissão é, por definição e por natureza, um indício fraco, uma mera hipótese, entre outras possíveis.
Nesse sentido, podemos concluir que este argumento, só por si, não é idóneo para permitir o recurso à avaliação por métodos indiretos, embora seja importante para reforçar a prova de que a contabilidade não se encontra efetuada nos termos da lei e não merece a presunção de verdade.
A AT mencionou ainda no Relatório inspetivo a existência de muitas devoluções/anulações nos anos de 2013 e 2014, algumas de valor avultado e apresentou, a título de exemplo, uma listagem dos 50 produtos com mais peso nas devoluções por cada um dos anos de 2013 e 2014, e concluiu que “existem diversas anomalias ao nível do ficheiro SAFT, indiciando a manipulação e/ou os registos mal efetuados”.
A Impugnante sustenta que a AT não fundamenta nem especifica o significado dos quadros que apresenta, inviabilizando assim o recurso à tributação por via indireta (artigos 41.º a 44.º da petição inicial).
Apreciando.
A AT não retira qualquer consequência tributária do facto de existirem muitas devoluções/anulações, designadamente não alega nem prova a falsidade, relativa ou absoluta, de tais devoluções/anulações, sendo certo que a eventual existência de diversas anomalias ao nível do ficheiro SAFT, por erro ou dolo, apenas revelam que a contabilidade não merece a presunção de verdade, cabendo à AT proceder às correções que no caso concreto demonstrasse serem as mais adequadas.
Na falta de qualquer demonstração, tal situação é relativamente irrelevante para a decisão de proceder a avaliação indireta.
Por outro lado, sempre se poderá afirmar que a AT poderia e deveria ter elencado todos os produtos onde ocorreram as devoluções/anulações, (uma vez que não justifica no relatório a impossibilidade de o fazer) considerando a sua existência na contabilidade da impugnante e assim proceder à quantificação por via direta da matéria tributável.
Nesse sentido, podemos concluir que este argumento, só por si, não era idóneo para permitir o recurso à avaliação por métodos indiretos.
E o mesmo se diga quanto ao facto do mesmo produto com a mesma referência ser transacionado com taxas de IVA diferentes: a 6% e 13%; a 6% e 23%; 13% e 23%.
Com efeito, é possível em face dos produtos em causa, constantes do ficheiro SAFT, verificar qual a taxa de IVA aplicável a cada um e proceder à sua correção.
É que conforme relembramos, não basta, para recorrer ao apuramento da matéria tributável por métodos indiretos, que a contabilidade do sujeito passivo apresente deficiências sendo ainda necessários que essas incorreções não permitam proceder ao apuramento da matéria tributável por via direta.
O que não é o caso.
Nesse sentido, podemos concluir que este argumento, só por si, também não era idóneo para permitir o recurso à avaliação por métodos indiretos.
No quinto e último facto indiciário, a AT invoca irregularidades nos inventários, a nível das quantidades e da valorização.
Com efeito, quanto às quantidades, através da amostragem que inclui os produtos com maior peso em valor na sua composição total, com a representatividade de 30% em 2013 e 29% em 2014, elaborados com base nas listagens de inventário e nas listagens de compras fornecidas pelo sujeito passivo, a AT concluiu que existem diferenças consideráveis entre o stock final que estimou e o stock final que foi comunicado pela impugnante.
Além disso, a AT procedeu ao teste da valorização dos mesmos produtos e concluiu que não existem diferenças relevantes no inventário de 2013, mas que no inventário de 2014 existem diferenças, nos produtos testados de €6.723,69, o que, na sua perspetiva, indica a existência, no ano de 2014, de uma sobrevalorização do inventário em 48% face do valor contabilizado, o que equivale à sobrevalorização de € 23.432,99.
A impugnante defende-se alegando que, tendo a Inspeção Tributária tido acesso ao programa de faturação (ignorando a informação nele constante), tinha a obrigação de determinar exatamente a alegada sobreavaliação dos inventários e não a limitar-se a escolher alguns produtos, para poder alcançar um percentual que lhe permitisse fazer as correções que entendesse, as quais se apresentam erradas (artigos 51.º a 59.º da petição inicial).
Vejamos.
O inventário é um documento essencial de qualquer contabilidade. É tão importante que poderia dizer-se que sem ele não há contabilidade.
A falta de inventários (ou a existência de inventários incorretos), tal como a falta de contabilização de todos os custos e/ou proveitos, constitui irregularidade grave enquadrável na previsão do artigo 88º, al. a), da LGT.
Sendo o “inventário” um arrolamento dos bens existentes, efetuada por contagem física no final de cada ano (ou continuamente, no regime de inventário permanente), devidamente quantificado e valorado de acordo com a pertinente discriminação dos diversos bens existentes em stock, como uma imagem estática ou fotografia das “existências” do final de ano, as existências finais (Ef) de um exercício terão de ser necessariamente as mesmas que constituem as existências iniciais (Ei) do exercício seguinte (porque resultam da mesma contagem física e do mesmo instrumento contabilístico designado “Inventário” que, tendo sido reportado ao final de um ano, se aplica também ao início do seguinte).
Sabe-se que o valor das Ef (existências finais) é o que resulta da expressão “Ei + Compras – Vendas e Consumos” e que o “custo das mercadorias vendidas e ou consumidas” (CMVC) corresponde ao valor resultante da expressão “Ei + compras - vendas - Ef +- Regularizações ou devoluções”.
Ou seja, se a AT desconhecer algum dos valores exatos relativos às existências iniciais, às compras, às vendas ou às existências finais ficará impossibilitada de determinar exatamente o valor do CMCV.
Por outro lado, o valor das Vendas e Prestações de Serviços determina-se pela expressão “CMCV x % da Margem de lucro”, pelo que o desconhecimento de algum destes elementos ou a sua adulteração impossibilita a AT de conhecer rigorosamente o valor dos proveitos e, logo, da matéria tributável.
Ora, a AT consignou no Relatório de inspeção levado ao probatório que, com base nas listagens de inventário e nas listagens das compras fornecidas pelo contribuinte, “nem um único produto se encontra correto (existência inicial + compras – vendas = a existência final)” e ainda que “existem diferenças consideráveis em muitos produtos entre a existência final apurada por nós e a existência final comunicada pelo contribuinte.”.
No entanto, não pode deixar de se notar que as referidas conclusões da AT resultaram de uma comparação entre os valores declarados e os valores apurados com base numa “amostragem” que representa 29% dos produtos do inventário.
Uma vez que os resultados apurados na amostragem se reportam a apenas 29% do total dos produtos inventariados, tais resultados são, por natureza parciais e não necessariamente coincidentes com a realidade global da empresa.
Note-se que a mostragem, por mais “representativa” que seja, não deixa de representar realmente apenas os elementos daquela amostra, e nunca a totalidade do universo de onde foi retirada e de que é “parte”.
Como se sabe, a “amostragem” é uma técnica estatística de auditoria que recorre à análise de amostra, que é uma parte representativa da população (ou universo estatístico: conjunto de elementos - pessoas, objetos ou acontecimentos – sobre os quais recai o estudo) sobre a qual incidem as observações de uma determinada característica, que é a variável estatística (o dado) em estudo.
Assim, uma “amostra”, pela sua própria definição, não inclui todo universo a que respeita, sob pena de deixar de ser uma amostra. Trata-se de um modo de quantificação de base indutiva, generalizando conclusões a partir de uma base estatística. O método da amostragem pretende sustentar razões aceitáveis, no domínio da força ou do vigor dos resultados ou argumentos, e não deduções no domínio da sua validade, em que o resultado ou argumento só será válido se, e apenas se, for impossível a conclusão ser falsa sendo as premissas verdadeiras. Para que a generalização seja credível a amostra deve ser representativa de toda a população ou universo a partir da qual se pretende generalizar. As questões críticas quanto à amostragem são, no essencial, a aceitabilidade das premissas, a extensão da amostra, e possíveis vieses da amostragem ou no procedimento de seleção dos núcleos que constituem a amostra (cf. WALTER SINNOTT-ARMSTRONG /ROBERT J. FOGELIN, Understanding Arguments – An Introduction to Informal Logic, 9th edition, 2014, pp. 179-193).
Portanto, ao extrapolar o resultado da parte que integra a amostra para a universalidade do inventário, a AT contruiu uma presunção, partiu do facto conhecido, referente ao resultado da amostra, e assumiu que o mesmo se verifica na universalidade de que a amostra foi retirada, supondo que ficou a conhecer o facto relativo a essa realidade que antes desconhecia.
Assim, ao comparar o resultado obtido, por amostragem e subsequente presunção, com o resultado declarado, a AT comete o erro metodológico (de inversão da ordem de fatores que não são comutativos) que consiste em partir de uma presunção para justificar o recurso à avaliação por métodos presuntivos.
Ao usar o resultado da amostragem para justificar a decisão de recorrer à quantificação por estimativa e usar o resultado da mesma amostragem para efetuar essa quantificação presuntiva, a AT demonstra que a amostragem é, ao mesmo tempo, o ponto de partida e o ponto de chegada do seu raciocínio, e que este é circular. Tão fechado como a melhor ratoeira que não prevê qualquer ponto de escapatória às vítimas contra os quais for usada. Pelo que tal inversão metodológica só pode ser ilegal.
Ora, sabe-se que o recurso a presunções e estimativas só pode verificar-se na fase da quantificação, que se inicia depois de tomada e fundamentada a decisão de proceder a avaliação indireta e que esta só pode fundar-se em indícios objetivos, racionais e fundamentados que justifiquem o enquadramento em alguma das situações previstas no artigo 87º da LGT.
A referida inversão metodológica inquina a decisão de proceder a avaliação indireta de erro sobre os pressupostos de facto e ou de direito que apenas afeta esse fundamento da decisão. Pelo que a referida decisão pode, em tese, subsistir com outros fundamentos mais objetivos, que cumpre à AT alegar e provar, nos termos do artigo 74º, nº 1, da LGT.
Na verdade, o teste constituído pela dita amostragem apenas pode ser valorado como complemento de outros indícios mais objetivos.
Ou seja, no caso concreto, o Tribunal considera que a AT não provou adequadamente, com os argumentos agora sob análise, que os inventários não são credíveis e que, pelo contrário, os resultados apurados na amostra correspondem efetivamente à totalidade dos produtos do inventário.
Tudo conjugado, é notório que a AT apresentou indícios suficientemente graves, precisos e concordantes para justificarem a conclusão de que a contabilidade, bem como as declarações que dela resultam, não está elaborada nos termos da lei e que, portanto, os elementos do sujeito passivo não merecem a presunção de verdade a que alude o artigo 75º da LGT.
Contudo, como esse facto não é suficiente para justificar o recurso a avaliação indireta e competia à AT alegar e demonstrar factos objetivos que indiciassem a existência irregularidades contabilísticas e documentais que inviabilizassem a quantificação direta e exata do lucro tributável, o Tribunal considera que a AT não cumpriu adequadamente esse ónus, ou seja, não arrolou indícios, suficientemente graves, precisos e concordantes para demonstrarem a necessidade de avaliação indireta e a alegada impossibilidade de determinar direta e exatamente o lucro tributável.» [fim de transcrição]
In casu, conforme discorre do transcrito o Tribunal a quo considerou não estarem demonstrados os pressupostos de recurso a métodos indiretos, tendo entendido, em síntese, que os pressupostos elencados não permitiam extrair as ilações plasmadas, mormente da impossibilidade de proceder à correção dos valores com recurso a avaliação directa.
Desde já se adiante que se entende que andou bem o Tribunal recorrido, ao decidir pela não demonstração dos pressupostos de recurso à avaliação por métodos indiretos.
Com efeito, atendendo, desde logo, à secção IV do RIT “MOTIVOS EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS”, convocando o disposto no artigo 90º do CIVA e o disposto na al. b) do n.º 1 do artigo 87.º e al. a) do artigo 88º da LGT, para os efeitos previstos nos artigos 87º a 89º do citado diploma legal, AT concluiu que perante as situações expostas as mesmas descredibilizam a contabilidade e indiciam irregularidades na organização da contabilidade, infrações, erros e/ou inexatidões no registo das operações e indícios claros e fundados de que a escrituração não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido. Com efeito, a aplicação dos métodos de avaliação direta não conduz à matéria tributável real do sujeito passivo em análise (n.º 1, do artigo 81.º, artigo 82.º e 87.º, todos da LGT), sendo que para efeitos de IVA a insuficiência de elementos compromete apuramento claro e inequívoco do imposto previsto no artigo 44.º do Código do IVA. Para tanto, elenca a seguinte situações e/ou fundamentos:
1. Resultados da actividade diminutos, não compatíveis com os empréstimos efetuados ao sócio gerente, bem como emissão de diversos cheques ao sócio ou sem identificação (ao portador);
2. Ventilação das taxas de IVA, nomeadamente nas taxas de 23% e 6%;
3. Indícios de omissões de vendas, já que as margens amostrais calculadas são superiores as declaradas;
4. Vendas de produtos sem referência, denominados como “mercadoria 5%”, o mesmo produto a ser transacionado a diferentes taxas de IVA e elevado número de devoluções/anulações;
5. Irregularidades nos inventários a nível das quantidades e da valorização.
São estes, em primeira linha, os fundamentos de que a AT se socorreu para lançar mão dos métodos indirectos.
Ora, sobre as mesmas a sentença efectuou uma apreciação exaustiva que afasta aquelas situações como susceptíveis de per si e no seu todo de legitimar o recurso aos métodos indirectos, constatações essas nas quais nos revemos.
Sendo que do confronto das conclusões com a decisão recorrida não se percepciona qualquer ataque à sentença, aliás, o que a Recorrente faz é renovar nesta sede as razões da sua actuação em sede de motivação do recurso aos métodos indirectos, reafirmando aqui a mesma assente numa errada valoração pelo Tribunal a quo das situações espelhadas no capítulo IV do RIT, ou seja, o placo da discordância ab initio patente nos autos e mesmo no âmbito do procedimento de revisão.
Ora, o artigo 627.º, n.º 1, do CPC dispõe: “As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recurso.
Quer isto dizer que o recurso constitui o principal instrumento de impugnação de decisões judiciais, permitindo a sua reapreciação por um tribunal de categoria hierarquicamente superior.
O recurso tem assim por objeto a alteração total ou parcial da decisão recorrida que pressupõe que tenha incorrido em erro de julgamento, lato sensu, no qual o recorrente deve identificar as questões decididas e que pretende ver reapreciadas para o que deve enunciar e concretizar o que de errado fez a decisão recorrida; dito de outro modo, tem de desferir um ataque concreto à sentença e evidenciar, o que na sua perspetiva fez de errado e não renovar os mesmos argumentos.
E, efectivamente, escalpelizadas as conclusões de recurso não vislumbramos nenhum novo argumento a merecer reapreciação da parte deste Tribunal ad quem. A Recorrente pugna por reforçar que estamos perante irregularidades graves e notórias da contabilidade, o que aliás foi reconhecido pelo Tribunal a quo ao afirmar que os indícios elencados são suficientemente graves, precisos e concordantes para justificarem a conclusão de que a contabilidade, bem como as declarações que dela resultam, não está elaborada nos termos da lei e que, portanto, os elementos do sujeito passivo não merecem a presunção de verdade a que alude o artigo 75.º da LGT, pelo que a razão da discórdia se pauta pela falta de demonstração que aquelas irregularidades e erros inviabilizavam a quantificação directa da matéria tributável, ou seja, da falta de cumprimento do ónus da demonstração que a única via passível de alcançar a matéria tributável se pautava pelo recurso a métodos indirectos, e neste ponto central do dissente falha o ataque à fundamentação sob recurso pela Recorrente.
O que nos conduz a reafirmar a fundamentação exarada na sentença sob recurso e supratranscrita, e com ela a reafirmar de que a aparente existência de omissões de vendas: porquanto as margens, apuradas com base numa amostragem efetuada por si, são muito superiores às declaradas, de que um valor alcançado com base num análise amostral, serve para elucidar da existência de divergências e concluir de que estaremos perante uma omissão de proveitos, mas não permite a extrapolação de com ela se afastar a possibilidade de recorrer a correcções meramente aritméticas, tal indicio não se integra no conceito de erros e inexactidões na contabilidade das operações que inviabilizem o apuramento da matéria tributável por comprovação e quantificação directa a que aludem os artigos 87º, alínea b), e 88º, alínea a), da LGT.
Quanto ao deficiente controlo de inventários, das irregularidades a nível das quantidades e da valorização, temos igualmente de que perante o apurado, pelos menos quanto aos produtos utilizados na amostragem não permitem assumir a universalidade do inventário, assenta numa presunção e estimativa que não permite em si fundamentar o recurso à utilização de métodos indirectos quantificação da matéria tributável mesmo que considerados as famílias mais relevantes ali projetadas, os dados existentes e alcançados permitiam a utilização de correcções meramente aritméticas, tal estimativa seria elemento de trabalho na fase seguinte enquanto critério de quantificação da matéria tributável por amostragem.
E, por último quanto aos empréstimos efectuados ao sócio gerente aqui validamos a falta de instrução que recaiu sobre esta situação, pautada na sentença sob recurso, a não merecer credibilidade enquanto pressuposto de relevo para justificar o recurso aos métodos indirectos. Diremos nós, os empréstimos foram realizados, pela Recorrida apesar dos seus resultados serem diminutos, não cabe aqui nesta sede a mera suposição, sem assento, de que a mesmo não teria capacidade para realizar os mesmos, aliás o que até tem respaldo nos encargos bancários, e nesta sede, não cumpre equacionar da má gestão, cumpre tão só corrigir e isso seria possível, não se alcança é em que medida não era possível lograr a correcção por via da quantificação directa, e mais se diga, que este indício é de todo irrelevante em sede de IVA, apenas podendo ser considerado enquanto indiciador de uma eventual omissão de proveitos.
Em suma, as situações elencadas no seu todo permitem evidenciar a irregularidade da contabilidade, mas não permitem evidenciar de que forma aquelas irregularidades da contabilidade impedem avaliação directa ao ponto de obrigar à ultima ratio, consubstanciada no recurso a métodos indiretos.
Ademais, como já referido supra, a evidenciação dos pressupostos de recurso a métodos indiretos não se basta com a existência de meros elencos de irregularidades da contabilidade, sendo imprescindível que se espelhe de que forma essas irregularidades são impeditivas, no todo ou em parte, do recurso ao método direto de avaliação da matéria tributável.
Ora, compulsado o RIT, em momento algum é feita esta explanação. É apenas referido de forma conclusiva e assente maioritariamente em juízos de valores despojados de concretização inquisitória de que “(...) verificaram-se irregularidades na organização da contabilidade, infrações, erros e/ou inexatidões no registo das operações e indícios claros e fundados de que a escrituração não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido. Com efeito, a aplicação dos métodos de avaliação direta não conduz à matéria tributável real do sujeito passivo em análise (n.º 1, do artigo 81.º, artigo 82.º e 87.º, todos da LGT). (...) para efeitos de IVA a insuficiência de elementos compromete apuramento claro e inequívoco do imposto previsto no artigo 44.º do Código do IVA. / (...) a escrituração do sujeito passivo, não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido, pelo que, face à impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável, e ao facto de as irregularidades e os fundamentos referidos no presente relatório serem insupríveis, se recorre, nos termos da alínea b), do número 1, do artigo 87.º e da alínea a), do artigo 88.º, da LGT,”, não se explanando por que motivo ocorre tal impossibilidade. O elencar de situações que descredibilizam a contabilidade ou indiciam irregularidades apenas surtem o efeito de levantar a dúvida, mas era necessário passar da mera dúvida para o campo do concreto, ou seja, das irregularidades dos inventários ultrapassáveis, como disso dá nota o Tribunal a quo, passar para as irregularidades não ultrapassáveis a impedir a tributação directa.
Ou seja, a AT não demonstrou, ao contrário do que era seu ónus, a inviabilidade do recurso a métodos diretos de avaliação da matéria tributável, a contrário, de que o único caminho viável era o recurso aos métodos indirectos.
Aliás, atente-se ao afirmado em sede de decisão no procedimento inspectivo de que “O contribuinte e o perito que o representa alegaram que a IT tinha possibilidade de apurar, de forma direta e exata, o IVA que deveria ter sido liquidado sobre as vendas declaradas, pela aplicação correta das diferentes taxas de imposto. Quanto a esta questão, temos a referir que não compete à Autoridade Tributária substituir os contribuintes nas suas obrigações contabilísticas, nomeadamente no que respeita ao apuramento correto do IVA a liquidar, tendo em conta uma utilização assertiva e correta da taxa de IVA a aplicar a cada bem vendido.”
Podemos, pois, afirmar, que atenta a fundamentação da sentença recorrida e da subsunção dos factos que nela foram apreciados, valorados e subsumíveis por via duma argumentação incólume, a conclusão da Recorrente de que por via daqueles ficou demonstrada a legalidade do recurso a métodos indirectos assente nos fundamentos do RIT não é susceptível de abalar o julgado, o qual se mantém inabalado, quer de um ponto de vista lógico, quer de um ponto de vista prudencial, o que por si dita a improcedência do recurso e a confirmação do assim decidido em 1ª instância.
Concluindo, a decisão sob recurso na parte em que considerou não verificados os pressupostos do recurso aos métodos indirectos, não nos merece qualquer reparo.
Como assim, improcede in totum, o recurso.

2.2.3. Conclusões
I. O juiz não só não pode conhecer, por regra, senão das questões que lhe tenham sido apresentadas pelas partes, como também não pode proferir decisão que ultrapasse os limites do pedido formulado, quer no tocante à quantidade quer no que respeita ao seu próprio objeto, isto sob pena de a sentença ficar afetada de nulidade, quer no caso de o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, quer quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, quer ainda quando condene em quantidade superior ou em objeto diferente do pedido (artigo 615.º, n.º1, alíneas d) e e), do Código de Processo Civil)
II. O excesso de pronúncia verifica-se quando o Tribunal conhece, isto é, aprecia e toma posição (emite pronúncia) sobre questões de que não deveria conhecer, designadamente porque não foram levantadas pelas partes e não eram de conhecimento oficioso, no que respeita ao pedido, enquanto conclusão lógica do alegado na petição e manifestação da tutela jurídica que o autor pretende alcançar com a demanda, é, pois, de grande importância o modo como se mostra formulado, por o juiz não dever deixar de proferir decisão que se contenha nos estritos limites em que foi delineado pelo autor.
III. Quando a selecção dos factos não é devidamente impugnada, resta apreciar a subsunção dos factos ao direito aplicável tendo em vista uma solução jurídica diferente da decretada, pois o erro que subsiste não é um erro na apreciação da prova, mas sim um erro na aplicação do direito.
IV. A impossibilidade de comprovação e quantificação da matéria tributável, enquanto pressuposto sine quo non do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável, nos termos dos artigos 87º alª b) e 88º alª a) da LGT, tem de ser uma impossibilidade absoluta. Assim, não se verifica se a contabilidade ou as declarações do contribuinte, por via de erros e omissões detectados, não permitirem a quantificação exacta, mas o permitirem dados, informações e documentos obtidos no procedimento de Inspecção e no procedimento de revisão da matéria tributável.
V. De qualquer modo, a evidenciação dos pressupostos de recurso a métodos indirectos não se basta com a existência de meros elencos de irregularidades da contabilidade, sendo imprescindível que se espelhe de que forma essas irregularidades são impeditivas, no todo ou em parte, do recurso ao método directo de avaliação da matéria tributável.


3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso, manter a decisão recorrida de anulação das liquidações de IVA impugnadas na exacta medida de que as mesmas foram determinadas com recurso a métodos indirectos.
Custas a cargo da Recorrente.

Porto, 16 de janeiro de 2025

Irene Isabel das Neves
Paulo Moura
Graça Valga Martins