Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00123/24.0BEPNF-A |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 01/10/2025 |
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Tribunal: | TAF de Penafiel |
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Relator: | LUÍS MIGUEIS GARCIA |
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Descritores: | SUSPENSÃO DE EFICÁCIA; PERICULUM IN MORA; DIREITO À PRODUÇÃO DE PROVA; |
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Sumário: | I) – Mediante despacho fundamentado, o juiz pode recusar a utilização de meios de prova quando considere assentes ou irrelevantes os factos sobre os quais eles recaem ou quando entenda que os mesmos são manifestamente dilatórios (art.º 118º, n.º 5, do CPTA).* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: «AA» (Rua ..., ..., ... ...), intentou, sem êxito, no TAF de Penafiel, providência cautelar de suspensão de eficácia de “Notificação de Reposição de Verbas – Responsáveis Subsidiários PO POCI – Operação ...45/Dívida ...45-D01-2020, para efectuar a reposição de 11.330.088,00 €” contra a Agência para o Desenvolvimento e Coesão, m.i. nos autos (Entidade Demandada) e ainda conta a Autoridade de Gestão do COMPETE (m. i. nos autos) e a Agência para a Competitividade e Inovação, IP, (m. i. nos autos) na qualidade de contra-interessadas. Inconformado recorre, desenvolvendo sob conclusões: I. A sentença proferida pelo Tribunal a quo julgou “[…] não verificado requisito do periculum in mora, sendo de indeferir a requerida providencia”. II. Para tanto, concluiu o Tribunal que “não resultam do processo quaisquer elementos que permitam concluir que o ato suspendendo provocará prejuízos de difícil reparação ou uma situação de facto consumado, irreversível, de impossível reconstituição, pelo que, ter-se-á de concluir que não ocorre uma situação de periculum in mora”. III. O Recorrente não se conforma com a referida sentença, por considerar que a mesma padece de alguns vícios, os quais se concluirão de seguida. IV. Em primeiro lugar, o Recorrente considera existir erro de julgamento quanto à suficiência da prova documental e, por conseguinte, quanto ao indeferimento da produção de prova testemunhal. V. O Tribunal a quo no despacho que antecedeu a sentença, proferido em simultâneo com a mesma, considerou que “A prova documental e a posição processual das partes afiguram-se suficientes para apurar os factos relevantes à aferição dos requisitos legais de que depende a adopção da providência cautelar requerida, pelo que não se determina a realização de outras diligências de prova (art. 118º/3 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos).”. VI. O Recorrente não pode concordar com o referido despacho, porquanto, considera que a prova testemunhal é essencial para que alguns dos factos alegados possam ser provados, factos esses relevantes para aferir do cumprimento do periculum in mora, designadamente, quanto à suficiência ou insuficiência dos bens. VII. O ora Recorrente nos artigos 70.º e 71.º procedeu à indicação dos bens/património de que é titular/proprietário, tendo indicado a remuneração mensal que aufere e que é proprietário de um imóvel com valor patrimonial de cerca de €33.000,00. VIII. Nada mais indicou a esse título, sejam bem imóveis ou móveis, ou qualquer outro tipo de bens que traduzisse um valor económico pertinente para os presentes autos. IX. O Tribunal, a quo na sentença recorrida considerou que “Esta alegação não implica, por exemplo, que o R. não seja titular de participações sociais, direitos de crédito, ou inclusive de depósitos bancários que lhe permitam efectuar o referido pagamento. Assim se decidiu, por exemplo, no Ac. do TCAS de 06-10-2016, proc. 13617/16:” X. Ora, o Autor indicou na sua petição o património de que é titular e que poderia ser afetado pela execução fiscal que se avizinha. XI. O Tribunal considerou que a alegação constante do Requerimento cautelar não significa que “não seja titular de participações sociais, direitos de crédito, ou inclusive de depósitos bancários que lhe permitam efectuar o referido pagamento”. XII. Sucede porém que, se o Autor não indicou outros bens no requerimento cautelar, salvo o devido respeito, sempre deveriam ser os que o Tribunal a quo deveria ter considerado para aferir do cumprimento do requisito do periculum in mora. XIII. Até porque o Autor consegue provar, de modo contundente, os bens que tem, mas não consegue realizar prova negativa, ou seja, demonstrar que não é titular de outros bens para além dos que indicou. XIV. Nesse propósito, a prova testemunhal serviria o propósito de demonstrar que os bens que indicou são os únicos bens com relevância económica de que é titular. XV. Aliás, é o suposto não preenchimento do pressuposto do periculum in mora que compromete irremediavelmente o pedido cautelar deduzido, pelo que, a dilucidação dos factos relativos a esse requisito apresenta-se essencial para aferir da correta decisão de direito a proferir. XVI. Quer isto dizer que sem antes se esclarecer a factualidade relevante quanto a esse pressuposto, não poderá recair a solução de direito, como aconteceu no caso em apreço. XVII. Assim, a não produção da prova testemunhal no caso sub iudice, porque influiu na boa decisão da causa, determina a invalidade da sentença recorrida por erro de julgamento da matéria de direito na medida em que consubstancia a violação do disposto nos artigos 90.º e 118.º do CPTA, 607.º, n.os 3 e 4, do CPC (ex vi artigo 1.º do CPTA) e 20.º, n.º 1, da CRP. XVIII. Em segundo lugar, o Recorrente considera existir erro de julgamento da matéria de facto. XIX. Para além dos factos dados como provados na decisão de que se recorre [pontos A) a D)], o Tribunal a quo refere que “com interesse para a decisão da lide, não há factos que cumpram julgar não provados.”. XX. Sucede, porém, com o devido respeito, que tal não se afigura ser correto, porquanto, a Recorrente alegou vários factos com interesse para a decisão da causa que deveriam de ter sido considerados pelo Tribunal. XXI. A respeito do preenchimento do requisito do periculum in mora, a Recorrente alegou (e é relevante para a correta decisão da causa) no artigo 70.º do Requerimento Cautelar que “O Requerente aufere €2.250,00, acrescido de €5,20 por dia de trabalho prestado a título de subsidio de alimentação, pelo contrato de trabalho com a [SCom01...], lda.. cfr. documento n.º 16, que se junta e que, por brevidade, se dá por integralmente reproduzido”, no artigo 71.º alegou que “É também proprietário do de um imóvel com o valor de patrimonial de €33.486,94. cfr. documento n.º 17, que se junta e que, por brevidade, se dá por integralmente reproduzido.” e no artigo 72.º que “O Requerente despende cerca de €1.500,00 com as suas despesas mensais.”. XXII. Os referidos factos que foram alegados são relevantes para a apreciação da lide, motivo pelo qual, deveriam ter sido levados à base instrutória e decididos em conformidade. XXIII. Ora, os factos acabados de enunciar são, todos eles, independentemente de provados ou não provados, relevantes para a boa decisão da providência cautelar requerida. XXIV. Não se percebendo porque razão os mesmos não foram considerados, nem porque razão não se produziu prova sobre os mesmos. XXV. Nesta medida, o Tribunal, na seleção dos factos relevantes e irrelevantes/provados e não provados, ao não considerar os factos alegados nos artigos 70.º e 72.º, incorreu em erro no julgamento da matéria de facto, o que determina a invalidade da decisão proferida. XXVI. Em conseguinte, deve a decisão ser anulada e devolvida ao Tribunal a quo para que se pronuncie sobre os artigos 70.º a 72.º, conjuntamente com a prova testemunhal que vier a ser produzida, e, consequentemente, que tenha em consideração na averiguação da verificação dos requisitos legais de que depende adotação da providencia cautelar requerida. XXVII. Por fim e em terceiro lugar, considera o Recorrente que a Sentença padece de erro de julgamento da matéria de direito, já que, como referido, o Tribunal a quo julgou “improcedente, por não provado, o presente processo cautelar e, consequentemente, absolv[eu] a Entidade Requerida do pedido”. XXVIII. O Recorrente considera que a mera existência de uma execução fiscal pode causar danos indiretos e não apenas patrimoniais, cujo ressarcimento não é possível, já que, desde logo pode prejudicar a reputação do Recorrente, que dificulte o acesso a crédito e criar instabilidade emocional, principalmente num caso como este, onde o valor da execução fiscal atinge valores significativos e, por isso, geram mais interesse mediático – todos factos notórios e consequências comuns que não carecem sequer de prova. XXIX. Acresce que, para que o processo de execução fiscal fique suspenso é necessário demonstrar a insuficiência de bens, o que, ainda que o Recorrente considere que tal resulta como um facto notório, atendendo aos escassos bens que detém, não pode deixar de sublinhar que o deferimento da suspensão, seguindo a mesma lógica do Tribunal a quo, meramente eventual, pelo que também não deve ser um argumento atendível para o preenchimento do requisito do periculum in mora. XXX. Mais a mais, importa sublinhar que desde o momento em que é pedida a suspensão do processo de execução fiscal até à prolação de uma decisão pela Administração Tributária (que a prática nos mostra que a decisão sobre o pedido de suspensão raramente é deferido) possibilita a penhora de bens. XXXI. Uma vez mais, se mostra que a presente providência cautelar é o meio idóneo para fazer suster danos na esfera jurídica do Recorrente, danos estes que não são suscetíveis de ser acautelados por recurso a outros meios judiciais, designadamente, o pedido de suspensão do processo executivo por insuficiência de bens. Acresce que, XXXII. Refere ainda o Tribunal a quo que “No periculum in mora, o R. diz quanto aufere; quais as suas despesas mensais, e que é proprietário de um imóvel no valor de 33.486,94 €. Tal é insuficiente. XXXIII. Esta alegação não implica, por exemplo, que o R. não seja titular de participações sociais, direitos de crédito, ou inclusive de depósitos bancários que lhe permitam efectuar o referido pagamento. Assim se decidiu, por exemplo, no Ac. do TCAS de 06- 10-2016, proc. 13617/16 XXXIV. Quanto à possibilidade de o Recorrente “[…] ser titular de participações sociais, direitos de crédito, ou inclusive de depósitos bancários que lhe permitam efectuar o referido pagamento”, desde já se refere que tal não resulta dos factos provados, na realidade o Recorrente não indicou ser titular de qualquer outro rendimento ou património para além do que resulta do Requerimento Cautelar. XXXV. Por outro lado, discorda-se que as circunstâncias de facto do arresto indicado pelo Tribunal a quo, que o secunda, sejam similares ao caso dos presentes autos. XXXVI. E não são similares porque no caso do arresto, o montante em dívida no caso daqueles autos era de €25.000,00, auferindo o Autor dos referidos autor €1.890,00 mensais, pelo que, entre o valor em dívida e os rendimentos auferidos não resulta um diferencial significativo. XXXVII. No caso em apreço, o Autor aufere mensalmente €2.250,00, acrescido de €5,20 por dia de trabalho prestado a título de subsídio de alimentação, contudo, o valor em dívida é de €11.000.000,00. XXXVIII. Note-se que no caso dos presentes autos o Autor com os rendimentos que dispõe, não conseguiria pagar os juros que se venceram anualmente, pelo que a dívida é na realidade impagável. XXXIX. Claramente não é esse o cenário dos autos constantes do arresto invocado pelo Tribunal a quo! XL. No mesmo sentido, quando o Tribunal a quo refere que “Conforme decorre do art. 3.º/1 do CIRE: «É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas.»” E que, portanto, “Não basta que a entidade demandada seja titular de um crédito de 11 milhões de euros, que o R. discute judicialmente, para que se possa falar na sua situação de insolvência, sendo evidente que esta requer o incumprimento generalizado das obrigações vencidas e não o incumprimento de uma única obrigação.”, parece-nos que o Tribunal fez uma ponderação simplista. XLI. Isto porque, do n.º 2, do artigo 3.º do CIRE, também resulta que “(…) são também considerados insolventes quando o seu passivo seja manifestamente superior ao activo (…). XLII. Ora, dos rendimentos que o Recorrente comprovadamente aufere e do valor do bem imóvel que indicou, é notório que logo que o processo executivo seja movido contra o aqui Recorrente, este estará tecnicamente em insolvência na medida em que o passivo é muito superior aos seu ativos, como, de resto, seria o caso de 99% da população portuguesa. XLIII. Do mesmo modo, parece-nos constituir um facto notório e inevitável que um devedor de um crédito de €11.000.000,00 que apenas dispõe de rendimentos de €2.250,00 e um bem imóvel com uma avaliação de cerca de €33.000,00 esteja inevitavelmente destinado a incumprir, de modo generalizado, as suas obrigações. XLIV. Tendo em conta o exposto, é, pois, evidente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de direito ao ter considerado como não verificado o requisito do periculum in mora, violando o disposto nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da CRP e o artigo 120.º do CPTA, impondo-se, assim, a revogação da referida decisão, a qual deverá ser substituída por outra que, não apenas considere como preenchido o mencionado requisito, como todos os restantes que determinam a procedência da presente providência, nos termos que melhor resultam do RI (salvo se o Tribunal considerar que existem factos relevantes para a decisão que devam ser objeto de prova, constatando-se que, neste caso, os autos deverão ser remetidos para o tribunal de 1.ª instância). XLV. Por fim, caso o Tribunal ad quem considere que está na posse de todos os elementos para apreciar os restantes requisitos sobre os quais dependem o deferimento da providência cautelar, dá-se por reproduzido o alegado em sede de Requerimento Cautelar. Nestes termos e nos demais de Direito, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-se por outra que considere como preenchidos todos os requisitos que permitem o decretamento da providência cautelar requerida, nos termos que melhor resultam do Requerimento cautelar (salvo se o Tribunal considerar que existem factos relevantes para a decisão da causa que deverão ser objeto de prova, sendo que, neste caso, os autos deverão ser remetidos para o Tribunal de 1.ª instância) ou, caso assim não se entenda, deverão os autos ser remetidos para o Tribunal de 1.ª instância para apreciação do pedido formulado no requerimento cautelar. Sem contra-alegações. * Com legal dispensa de vistos, cumpre decidir. * A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta não emitiu parecer (art.º 146º, nº 1, do CPTA). * Factos, que o tribunal “a quo” fixou na decisão recorrida como povados: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] --- Mais se consignou na decisão recorrida que: «Com interesse para a decisão da lide, não há factos que cumpra julgar não provados. A convicção do Tribunal formou-se com recurso aos meios de prova indicados junto de cada facto dado como provado (documentos juntos aos autos e não impugnados pelas partes – cf. 362.º e ss. do CC). O demais alegado não foi nem julgado provado nem não provado por ser conclusivo, matéria de direito, ou não relevar para a decisão da causa.». * O Direito. O critério geral de decisão dos processos cautelares é-nos dado pelo disposto no art.º 120º do CPTA. Cfr. Ac. do STA, de 19-10-2023, proc. n.º 0118/23.1BALSB: - “o artº 120.º do CPTA faz depender o deferimento das providências cautelares da existência cumulativa dos dois requisitos positivos enunciados no seu n.º 1, o “periculum in mora” e o “fumus boni iuris”, exigindo ainda, no seu n.º 2, que da adopção da providência não resultem danos superiores aos que possam resultar da sua não adopção, face a um juízo de ponderação “dos interesses públicos e privados em presença” (…) Como se salienta no Acórdão do STA de 16.09.2016 (revista nº 0979/16), “a aferição da bondade desta providência deve metodologicamente começar pela análise dos requisitos ínsitos no n.º 1 do art. 120º do CPTA – sendo indiferente principiar por qualquer deles; e só no caso de ambos se verificarem passaremos ao cotejo imposto no n.º 2 do artigo”. O Mmº juiz do tribunal “a quo” viu que: «Acerca do periculum in mora o R. alega o seguinte: 70. O Requerente aufere €2.250,00, acrescido de €5,20 por dia de trabalho prestado a título de subsidio de alimentação, pelo contrato de trabalho com a [SCom01...], lda.. cfr. documento n.º 16, que se junta e que, por brevidade, se dá por integralmente reproduzido 71. É também proprietário do de um imóvel com o valor de patrimonial de €33.486,94. cfr. documento n.º 17, que se junta e que, por brevidade, se dá por integralmente reproduzido. 72. O Requerente despende cerca de €1.500,00 com as suas despesas mensais. 73. Caso a Ré proceda à execução fiscal do montante em dívida através da Autoridade, tal significará, a penhora das contas bancárias do Requerente, bem como, a liquidação do seu património, o qual é manifestamente insuficiente para pagar o valor extremamente avultado que se encontra em dívida (cerca de 11 milhões de euros). 74. O que consubstancia uma situação de facto consumado ou, pelo menos, a produção de prejuízos de difícil reparação, visto que, após a execução dos bens do Requerente, da perda de património e da dificuldade que este vai ter em gerir o seu quotidiano com uma dívida impagável de 11 milhões de euros, terá de recorrer à via da insolvência pessoal, com todas as consequências que tal acarreta. 75. Certo é que, tal situação se evitará se, como peticionado, o despacho impugnado no âmbito do processo principal for suspenso, e por conseguinte, a Requerida não poder promover a execução fiscal de um ato administrativo suspenso, enquanto os autos aguardam a prolação de sentença.». Entendeu que: «Quanto à penhora das contas bancárias e à liquidação do seu património pessoal, diga-se que a execução fiscal se inicia com a citação, a qual lhe confere a possibilidade se opor à execução, requerer a dação em pagamento, e efectuar pagamento em prestações – cf. art. 189.º do CPPT. Só findo este prazo é que se procederá à penhora dos bens do executado, conforme decorre do art. 215.º do CPPT. O R. poderá pedir a suspensão do processo de execução fiscal logo nessa fase inicial, ainda antes de serem praticados actos restritivos sobre o seu património, nos termos do art. 169.º do CPPT. Não nos debruçaremos aqui aprofundadamente sobre este regime – diremos apenas que para obter a suspensão do processo executivo nestes termos, bastará ao Requerente ter apresentado um meio de discussão da legalidade da dívida (a acção administrativa à qual esta providência está apensa) e demonstrar a sua insuficiência patrimonial – v. ainda art. 170.º/1 e 2 do CPPT e 52.º/4 da LGT. É um regime sem custos para o R., e com menos requisitos, que evita a produção de quaisquer danos na esfera do R., muito menos de danos ditos irreparáveis e que se traduzem apenas em danos de ordem patrimonial. A existência de uma execução fiscal não traz, per se, qualquer dano ao R., pelo que não releva para fundamentar a concessão de uma providência cautelar. Não nos limitamos, por isso, a concluir que o periculum in mora não se verifica porque o R. detém outros meios ao seu dispor a fim de evitar quaisquer actos ablativos sobre o seu património – mas que a mera existência de uma execução fiscal contra o R. não traduzirá necessariamente qualquer dano. As penhoras ou a ausência delas são ocorrências meramente eventuais. Por outro lado, acrescente-se ainda que o R. não concretizou exactamente os danos advenientes da existência de penhoras. Ser objecto de penhoras ou ter que pagar um determinado montante (o que, como vimos é meramente eventual) são danos de natureza patrimonial que podem ser objecto de ressarcimento a posteriori. Em situação semelhante o Ac. do TCAN de 30-08-2019, proc. 13/19.9BEMDL decidiu que os danos invocados pelo aí R. não eram concretos e mensuráveis, constituindo hipotéticos prejuízos (…) No periculum in mora, o R. diz quanto aufere; quais as suas despesas mensais, e que é proprietário de um imóvel no valor de 33.486,94 €. Tal é insuficiente. Esta alegação não implica, por exemplo, que o R. não seja titular de participações sociais, direitos de crédito, ou inclusive de depósitos bancários que lhe permitam efectuar o referido pagamento. Assim se decidiu, por exemplo, no Ac. do TCAS de 06-10-2016, proc. 13617/16: O R. alega ainda que terá que recorrer à insolvência pessoal. Com o devido respeito, não vemos que assim seja. (…) Não basta que a entidade demandada seja titular de um crédito de 11 milhões de euros, que o R. discute judicialmente, para que se possa falar na sua situação de insolvência, sendo evidente que esta requer o incumprimento generalizado das obrigações vencidas e não o incumprimento de uma única obrigação.». Acabou por tirar que «não se julga verificado o requisito do periculum in mora, sendo de indeferir a requerida providência.». Isto, depois de preliminarmente ter anunciado que «A prova documental e a posição processual das partes afiguram-se suficientes para apurar os factos relevantes à aferição dos requisitos legais de que depende a adopção da providência cautelar requerida, pelo que não se determina a realização de outras diligências de prova (art. 118º/3 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos)», e, como já consta supra, acompanhando no julgamento de facto que para lá do que foi consignado como provado se depararia o que considerou como «conclusivo, matéria de direito, ou não relevar para a decisão da causa». Mas não é assim. É evidente que o requerente/recorrente no que alegou sob os transcritos artºs. 70 a 75º do r. i. - longe de ser «conclusivo, matéria de direito, ou não relevar para a decisão da causa» - quis dar espelho da sua (in)solvabilidade patrimonial, com sentido de se limitar o seu activo patrimonial ao indicado quantitativo remuneratório por trabalho e ao valor de imóvel de que é proprietário, o que, dando também nota do nível de despesa mensal que assinala, não lhe permitirá satisfazer a ordenada reposição voluntária e a justificar o receio de se seguir execução e insolvência pessoal. Não se poderá ter como insuficiente alegação de um “periculum in mora”. Com atenção ao montante de reposição, se as circunstâncias de vida do requerente se revestirem da “modéstia” e limite com que foram alegadas [se, nas suas palavras, “provar, de modo contundente, os bens que tem” reduzidos aos que indica, nessa afirmação implicado que “não é titular de outros bens para além dos que indicou” (e o ónus, mesmo recaindo sobre facto negativo, não deixa de ser seu; o que pode atenuar é a exigência na convicção probatória)], ancora plenamente que com forte probabilidade se poderá seguir execução e mesmo insolvência. Resulta claro do art.º 118º, n.º 5, do CPTA, que a recusa da utilização dos meios de prova requeridos (apenas) pode ocorrer quando (i) os factos cuja prova se requer já estejam assentes, (ii) quando os mesmos sejam irrelevantes para a decisão da causa, ou ainda, (iii) quando a utilização de meios de prova requeridos seja manifestamente dilatória. Se assim acontecer. Não se pode precipitar um juízo de ausência de “periculum in mora” quando na dependência de um julgamento de facto ainda ausente sobre matéria revelante. O que o recorrente clama que o tribunal “a quo” faça, com razão. Com respectiva produção de prova. * Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida e baixando os autos para os ulteriores trâmites processuais. Custas: pelos recorridos. Porto, 10 de Janeiro de 2025. Luís Migueis Garcia Ana Paula Martins Alexandra Alendouro |