| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
«AA», com residência em Coimbra, «BB», com residência em ..., «CC», com residência em ..., «DD», com residência em ..., «EE», com residência em ..., nos Países Baixos, «FF», com residência na ..., «GG», com residência em ..., «HH», com residência no ..., «II», com residência em ..., «JJ», com residência no ..., «KK», com residência em ..., «LL», com residência em ..., «MM», com residência em ..., «NN», com residência em ..., «OO», com residência em ..., «PP», com residência em ..., «QQ», com residência em ..., «RR», com residência em ..., «SS», com residência em ..., «TT», com residência em ..., «UU», com residência em ..., «VV», com residência em ..., «WW», com residência em ..., «XX», com residência em ..., «YY», com residência em ..., «ZZ», com residência em Coimbra, «AAA», com residência em ... o ..., «BBB», com residência em ..., «CCC», com residência em ..., e «DDD» com residência em ..., instauraram providência cautelar contra os Ministérios da Justiça e das Finanças, todos melhor identificados nos autos, pedindo: i) a suspensão de eficácia com efeitos retroativos do despacho da Ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, de 04.10.2024, na parte em que autorizou a abertura de novo procedimento concursal para promoção à categoria de inspetor-chefe com vista ao preenchimento de 40 postos de trabalho do respetivo mapa de pessoal, bem como dos atos subsequentes, ii) a admissão provisória ao 2.º Curso de Formação de Inspetores-Chefes-2024, iii) a promoção e provimento provisório nos lugares vagos e na categoria de inspetor-chefe, 1ª posição remuneratória, nível 42 da carreira especial de investigação criminal.
Por sentença proferida pelo TAF do Porto, em antecipação do juízo da causa principal, foi julgada improcedente a ação.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, os Requerentes formularam as seguintes conclusões:
I. A Sentença recorrida é nula por violação da lei processual aplicável, é nula por omissão de pronúncia sobre factos e vícios alegados, incorre em erro de julgamento da matéria de facto e apreciação da prova e incorre em erro de julgamento da matéria de direito.
II. A Sentença recorrida, em vez de apreciar os factos e o direito alegado na petição da ação principal, apreciou os factos alegados e o direito invocado no requerimento inicial cautelar.
III. Os autores peticionaram o alargamento de 40 para 120 vagas e não 30 como se refere na decisão recorrida, a Sentença recorrido remete várias vezes para artigos do requerimento inicial cautelar, esqueceu-se de apreciar o vício de falta de audiência prévia, não analisou os factos alegados pelas Autoras nos artigos 30.°, 32.° a 37.°, 51.° a 59.° e 64.° a 68.° da petição inicial.
IV. O artigo 121.° do CPTA permite antecipar “o juízo da causa final”, pelo que o Tribunal deveria apreciar os factos e o direito da causa principal e não do processo cautelar.
V. A decisão recorrida é, assim, nula por ter praticado um ato processual não previsto, violando o disposto no artigo 121.° do CPTA, artigo 615.°, alínea d) do CPC, aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, artigo 94.° e 95.°, n.° 1 e 3 do CPTA.
VI. Por outro lado, o Tribunal proferiu decisão antecipada quando ainda estava a decorrer o prazo de 10 dias a contar da notificação das contestações e junção do processo administrativo, podendo os Autores exercer o contraditório e ampliar a causa a novos vícios mediante articulado superveniente.
VII. A Sentença é, assim, nula também por violação do princípio do contraditório, nulidade que expressamente se deixa arguida, sendo suscetível de influenciar a decisão da causa (artigo 195.° do CPC, aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA).
VIII. A Sentença é ainda nula por omissão de pronúncia, uma vez que não se pronunciou sobre factos articulados pelos Autores - artigos 30.°, 32.° a 37.°, 51.° a 59.°, 64.° a 68.°, 245.° a 249.° da petição inicial - que são essenciais à decisão da causa e que não foram impugnados pelos Réus, encontrando-se provados por documentos.
IX. Também não se pronunciou sobre os factos 14.° da contestação do Réu Ministério das Finanças e 35.° e 62.° a 67.° da contestação do Ministério da Justiça.
X. Estes factos demonstram, por um lado, que existe cabimentação para poderem ser alargadas para 120 as vagas no concurso a que concorreram os Autores e que o ato praticado teve como fundamento, em prejuízo dos Autores, dar “oportunidade” aos candidatos que não quiseram ou não podiam concorrer anterior concurso a possibilidade de serem providos através de um novo concurso, autorizado pelo despacho impugnado (violação do princípio da igualdade, imparcialidade e desvio de poder).
XI. A não apreciação destes factos e direito invocado pelas partes, nem enumeração das questões a analisar pelo Tribunal, acarreta a nulidade da Sentença por violação do disposto no artigo 615.°, alínea d) do CPC, aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, 94.° e 95.°, n.° 1 e 3 do CPTA.
XII. O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto.
XIII. No PONTO 15 da matéria de facto dada como provada deveria ser incluída a lista completa dos candidatos admitidos no novo Concurso, para ser comparada com a lista do concurso anterior e se verificar que alguns candidatos, que foram reprovados no concurso anterior, desta vez são admitidos.
XIV. Fazendo com que o argumento usado na Sentença recorrida (e pelo Ministério da Justiça) das “notas inferiores” deixe de ter sentido, já que no novo concurso admitem-se candidatos que anteriormente não foram aprovados.
XV. Devem ser aditados aos factos provados os artigos 30.°, 32.° a 37.°, 51.° a 59.°, 64.° a 68.° da petição inicial, por serem essenciais à decisão da causa.
XVI. Tais factos não foram impugnados especificamente, estão provados por documentos constantes de ambos os processos administrativos e documento 3 e 4 junto com a pá.
XVII. E demonstram a urgência e a necessidade para o interesse público em promover os Autores, atenta as necessidades da PJ e do Réu MJ, as idades dos Autores, os cargos de chefia que alguns exercem, as diminutas ou quase nenhumas diferenças de classificações para os candidatos que foram promovidos no 2.° Curso de Inspetores de 2024, o seu mérito, os prejuízos que lhe advêm para a sua carreira e a impossibilidade de facto de promoção em anos futuros.
XVIII. E, sobretudo, que à data de 17.10.2023, em que a Senhora Ministra da Justiça, Prof. Doutora Catarina Sarmento e Castro, emitiu parecer favorável à aprovação da proposta da Direção Nacional da Polícia Judiciária, já se conhecia a lista provisória de candidatos admitidos e excluídos, bem como a proposta de classificação e ordenação final, estando o processo de concurso em fase de audiência prévia, ao contrário do que vem referido na Sentença recorrida a fls. 24. - cfr. ATA n.° 17 do Concurso, p.a. apenso.
XIX. A Sentença recorrida errou, assim, ao analisar a prova documental, pois não atendeu a que lista provisória de candidatos aprovados era conhecida desde pelo menos 11.10.2023, data em que reuniu o Júri do Concurso - cfr. cit. ATA n.° 17.
XX. Quanto à violação do princípio da igualdade, da imparcialidade e desvio de poder - artigos 13.° da CRP, 6.° e 9.° do CPA -, a Sentença recorrida incorreu em manifestos erros de raciocínio.
XXI. Em primeiro lugar, a identidade dos candidatos (e os seus currículos), ao contrário do referido, era conhecida desde o final do prazo de aviso de abertura do concurso que terminou em 29.07.2022.
XXII. Em segundo lugar, a lista provisória foi proposta pelo Júri do Concurso em 11.10.2023, pelo que o despacho da anterior Ministra de 17.10.2023 é posterior ao conhecimento da proposta de classificação e ordenação que foi sujeita a audiência prévia.
XXIII. Em terceiro lugar, o despacho do Ministro das Finanças de 28.03.2024 é posterior à data de 12.01.2024 em que foi tornado público em Diário da República a lista de classificação e ordenação final dos candidatos (ponto 6 do probatório).
XXIV. Pelo que o argumento usado na Sentença recorrida de que o despacho apenas reproduziu propostas anteriores e despachos em que os candidatos não eram conhecidos mostra-se irrelevante e não correspondente à realidade dos factos.
XXV. O despacho impugnado de 4.10.2024 - que lesa o direito e legítimo interesse dos Autores - foi proferido posteriormente.
XXVI. De qualquer modo, os órgãos decisores não podem se limitar a reproduzir as propostas, informações, decisões, pareceres ou despachos anteriores, sem os escrutinar do ponto de vista legal e da sua oportunidade e conveniência.
XXVII. Devem cumprir e fazer cumprir os princípios e normas legais aplicáveis à atividade da Administração com respeito pelos direitos e legítimos interesses dos cidadãos, o que não foi feito in casu.
XXVIII. Os Autores não reclamam do favorecimento dos candidatos ordenados em 41.° e 80.° lugares, apenas pretendem o mesmo tratamento, ao contrário do que se refere na Sentença recorrida.
XXIX. Apenas discutem a legalidade e a forma como os Réus aprovaram o alargamento das 80 vagas, com recurso a um novo concurso, quando podiam ter aproveitado o anterior.
XXX. Verifica-se uma clara discriminação dos Autores, quer em relação aos candidatos ordenados em 41.° e 80.° lugares, quer também em relação aos candidatos que não quiseram concorrer ou não tinham condições e agora são candidatos ao novo concurso.
XXXI. É inaceitável e ofende os mais elementares princípios de direito administrativo dar uma nova “oportunidade” e proteger as “expetativas de promoção” destes novos candidatos, como alega e confessa o Réu Ministério da Justiça nos artigos 35.°, 62.° a 64.°, 66.° e 67.° da sua contestação, em prejuízo dos Autores.
XXXII. Com a opção tomada, que tinha dois caminhos, os Réus tomaram medida materialmente infundada, sem qualquer fundamento razoável e totalmente arbitrária.
XXXIII. A Sentença recorrida e o despacho impugnado não explicam porque razão se concedeu uma vantagem aos que ficaram classificados em 41.° e 80.° lugares e porque razão a “diferença de notas” e o mérito destes candidatos para os candidatos colocados em 1.° e 40.° lugares não foi relevante, tendo sido abrangidos pelos alargamento das vagas decidido.
XXXIV. Não há qualquer justificação e a que foi dada de dar uma “oportunidade” a quem não concorreu e até ficou reprovado no anterior concurso, ofende gritantemente o princípio da igualdade consignado no artigo 13.° da CRP, 6.° do CPA, constitui uma violação do princípio da imparcialidade previsto no artigo 9.° do CPA e um claro vício de desvio de poder.
XXXV. Quanto à violação do direito fundamental à progressão na carreira (artigos 18.° e 49.°, n.° 2 da CRP), o Tribunal a quo incorre uma vez mais em manifesto erro de raciocínio e falta de fundamentação.
XXXVI. Antes de mais a fundamentação é cingida às “notas inferiores” dos Autores que, como se viu não é argumento, pois os candidatos colocados nos 41.° e 80.° lugares também tiveram “notas inferiores” às dos classificados no 1.° e 40.° lugares e, nem por isso, deixaram de ser promovidos.
XXXVII. A Sentença recorrida incorre em outro erro, porque os Autores não peticionaram 30 vagas, mas o aumento de 40 para 120 vagas.
XXXVIII. O aumento das vagas peticionadas tem cabimento orçamental (artigo 14.° da contestação do Ministério das Finanças).
XXXIX. Os Autores foram aprovados em concurso tal como os candidatos colocados em 41.° e 80.° lugares, existindo a necessidade urgente de mais 80 inspetores-chefes além dos 40 iniciais.
XL. A partir do momento em que o Réu Ministério da Justiça decide alargar em 80 as vagas, a alegada “mera expetativa” dos Autores converte-se definitivamente em “direito de acesso e promoção em igualdade de circunstância”, não podendo este direito fundamental, que goza da força jurídica do artigo 18.° da CRP, ser restringido apenas a alguns candidatos.
XLI. O ato impugnado violou ostensivamente os artigos 18.° e 49.°, n.° 2 da CRP, incorrendo em manifesto erro de julgamento a Sentença recorrida por não ter aplicado a norma em causa à situação dos autos.
XLII. Quanto à violação do princípio do défice, o Tribunal não fundamentou a sua decisão.
XLIII. Os factos alegados são os mesmíssimos que fundamentam a violação do princípio da igualdade e da violação do direito de acesso e promoção dos Autores em igualde de circunstâncias por via de concurso.
XLIV. O direito dos Autores não foi salvaguardado, em clara desigualdade (ou défice) com os candidatos aprovados em 41.° e 80.° lugares.
XLV. As autoridades administrativas têm o dever de proteger e adotar as condutas que acautelem os direitos do mesmo universo de destinatários, o que não foi feito.
XLVI. O ato impugnado, ao contrário do decidido, violou desta forma o princípio do défice, não podendo ser argumentado e invocado o interesse dos candidatos que concorreram ao novo concurso porque não respeitam ao mesmo universo de destinatários.
XLVII. Quanto à violação do princípio da legalidade, o Tribunal a quo limita-se a remeter para o decidido em matéria de violação do princípio da igualdade e da violação do direito de acesso e promoção dos Autores e falta de fundamentação.
XLVIII. Igualmente se remete nestas alegações para o que se deixou alegado, quer na petição, quer nas presentes alegações, concluindo-se ao contrário do decidido pelo TAF do Porto que o ato impugnado violou o artigo 266.°, n.° 2 da CRP e o artigo 3.° e 152.° e 153.°, n.° 2 do CPA, uma vez que não respeitou a norma constitucional em causa, que goza do especial regime e força do artigo 18.° da CRP, nem as normas indicadas do Código de Procedimento Administrativo que regem a sua atividade.
XLIX. No que diz respeito à prossecução do interesse público em causa é parca a fundamentação do Tribunal recorrido.
L. Não é verdade que os Autores sustentem a substituição, alteração e anulação parcial do ato impugnado exclusivamente no seu “interesse pessoal”, já que do ponto de vista do interesse público é melhor a ampliação de mais 40 vagas do que a realização do novo concurso.
LI. Tal conclusão resulta da fundamentação da proposta da DNPJ para ampliar de 40 para 80 as vagas.
LII. Pelo que, se foi o interesse público que presidiu a tal necessidade de ampliação, o mesmo interesse público sustenta a ampliação requerida pelos Autores por via da presente ação.
LIII. A abertura de um novo concurso é que não foi devidamente justificado com base no interesse público e visa, como confessa o Réu Ministério da Justiça nos artigos 35.° e 62.° a 67.° sua contestação, dar a “oportunidade” a outro grupo de destinatários, privilegiando-os em detrimento dos Autores.
LIV. Além do mais, na realização do interesse público devem ser respeitados os direitos e legítimos interesses dos cidadãos, o que não foi feito no caso dos Autores e tido em conta na Sentença recorrida.
LV. O ato impugnado viola, assim, também o princípio da prossecução do interesse público, tendo o Tribunal feito errada aplicação dos artigos 266.°, n.° 1 e 4.° do CPA.
LVI. Quanto à violação do princípio da boa-fé, resulta do exposto e é patente da parte do Réu Ministério da Justiça uma conduta que frustra o direito e legítimo interesse dos Autores em benefício de candidatos que não puderam ou não quiseram concorrer ao concurso.
LVII. O comportamento é contraditório - constituindo um verdadeiro venire contra factum proprium - na medida em que, para a decisão recorrida e os Réus, o interesse público que justifica a ampliação não é o mesmo interesse público que fundamenta uma ampliação alargada.
LVIII. A Administração não age de boa-fé para com os Autores, abalando a sua confiança no direito à promoção em igualdade de circunstâncias com os demais candidatos do concurso a que concorreram, privilegiando outros destinatários com o ato impugnado.
LIX. A Sentença recorrida não soube aplicar ao caso os artigos 10.° do CPA e 266.°, n.° 2 da CRP.
LX. Quanto à violação dos princípios da proporcionalidade, justiça e razoabilidade e boa administração da justiça, a Sentença recorrida limita-se a formular meros juízos conclusivos sem qualquer relação com os factos dados como provados e a invocar o poder discricionário da administração.
LXI. Sucede é que a Administração tinha duas opções.
LXII. E escolheu a que menos satisfaz o interesse público em causa, sem qualquer respeito pelos direitos e interesses dos Autores.
LXIII. Em favor de candidatos que não puderam ou não quiseram concorrer ao primeiro concurso.
LXIV. A discricionariedade não significa arbitrariedade.
LXV. Tinha a Administração de fundamentar a sua opção, o que não fez e sendo certo que a defendida pelos Autores era a mais célere, menos onerosa e a que mais eficazmente assegurava a necessidade urgente de promover inspetores ao lugar de inspetores-chefe.
LXVI. O despacho impugnado, ao optar por um novo concurso, revela-se injusto, desproporcionado e sem motivo atendível, pelo que viola ostensivamente os artigos 5.°, 7.° e 8.° do CPA e 266.°, n.° 2 da CRP.
LXVII. Quanto à falta de fundamentação, não explica a Sentença recorrida (e o ato impugnado) porque motivo os Réus optaram por abrir um novo concurso em vez de decidirem alargar para 120 vagas as 40 iniciais.
LXVIII. No ato impugnado, nos despachos anteriores, pareceres e proposta que o sustenta, nem sequer foi ponderada a hipótese de alargar o concurso para 120 vagas.
LXIX. Porque motivo?
LXX. Se não foi ponderado ou avaliado, não se encontra o ato suficientemente fundamentado.
LXXI. Carece, assim, a Sentença recorrida de razão.
LXXII. A falta ou insuficiente fundamentação do ato que negue, restrinja ou afete direitos ou interesses legalmente protegidos, determina a anulabilidade do ato impugnado (artigos 152.°, n.° 1, alínea a) e d) e 153.°, n.° 2 do CPA).
LXXIII. O ato impugnado está fundamentado, mas não de forma suficiente por não ter sido ponderada sequer a opção pelo alargamento para 120 candidatos, tanto mais quando foi decidido restringir o alargamento para apenas 40 candidatos, com base nos mesmos princípio e preceitos legais aplicáveis (al. d) do n.° 1 do artigo 152.° do CPA).
LXXIV. Quanto à falta de audiência prévia, a Sentença recorrida é completamente omissa nesta parte, vício alegado nos artigos 245.° a 249.° da petição inicial.
LXXV. Atendendo a que o ato impugnado (aparentemente) se esqueceu dos Autores, pois não vem expressamente fundamentada a razão de ser do não alargamento das vagas à sua situação, é evidente que, sendo um ato que afeta os seus direitos e legítimos interesses e decide de modo diferente do que foi decidido para os candidatos colocados em 41.° e 80.° lugares, era necessário e imprescindível a sua audiência prévia.
LXXVI. O ato impugnado violou, assim, o direito dos Autores de audiência prévia consagrado nos artigos 121.° e segts do CPA e 267.°, n.° 5 da CRP, pelo que deve ser declarado nulo ou anulado.
Termos em, concedendo provimento ao presente recurso, com a consequente revogação da Sentença recorrida e substituição por Acórdão que julgue a ação procedente, por provada, farão inteira e merecida JUSTIÇA
O Requerido Ministério da Justiça juntou contra-alegações e concluiu:
A. Bem decidiu o Tribunal, ao julgar a presente ação improcedente, e, bem interpretou, as disposições constantes do artigo 121.º do CPTA, não padecendo a sentença de qualquer invalidade.
B. O artigo 121.º do CPTA, sob a epigrafe de “Decisão da causa principal” estabelece que, quando, existindo processo principal já intentado, se verifique que foram trazidos ao processo cautelar todos os elementos necessários para o efeito e a simplicidade do caso ou a urgência na sua resolução definitiva o justifique, o tribunal pode, ouvidas as partes pelo prazo de 10 dias, antecipar o juízo sobre a causa principal, proferindo decisão que constituirá a decisão final desse processo.
C. Os Requerentes no seu Requerimento Inicial (RI) da providência cautelar (artigos 317.º a 321.º do RI), peticionaram, nos termos do artigo 121.º do CPTA, a antecipação do juízo sobre a causa principal.
D. O Tribunal, face ao peticionado, notificou as partes, para se pronunciarem, sobre a antecipação do juízo sobre a causa principal, sem que qualquer delas se tenha oposto.
E. E, já tendo sido intentado o processo principal em 13-01-2025, e, face ao preenchimento dos requisitos do artigo 121.º do CPTA, o Tribunal a quo, decidiu antecipar o juízo da causa principal, conforme resulta da sentença recorrida.
F. Deste modo, a sentença, decidiu e bem, pela antecipação do juízo da causa principal, a conhecer na presente providência cautelar, logo, sobre o requerimento inicial da providência cautelar
G. Laborando os Requerentes num erro ao invocar a falta de decisão da causa principal, por a sentença ter apreciado os factos alegados e o direito invocado no requerimento cautelar, e, não ter apreciado os factos alegados e o direito invocado na PI, da ação principal.
H. Como aliás, defende Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in “Comentário ao Código de processo nos tribunais administrativo, no comentário ao artigo 121.º do CPTA, de que se retira o seguinte extrato:
“(...) este artigo admite que o tribunal antecipe o mérito da causa para o momento em que lhe cumpre decidir o processo cautelar, com o que se produz um fenómeno de convolação do processo cautelar em processo principal. O esquema gizado supõe que, no contexto da sentença mediante a qual profere a decisão final do processo principal, o juiz emita uma decisão, devidamente fundamentada, pela qual determina a convolação do processo cautelar, declarando-se em condições de apreciar o mérito da causa principal. A essa decisão seguir-se-á o julgamento da causa principal, o qual pode ser no sentido da procedência ou improcedência da pretensão formulada pelo demandante. (...) No acórdão do TCA Sul de 26 de março (processo n.° 2088/06), foi entretanto, entendido que da convolação operada ao abrigo do artigo 121.° emergem duas consequências: o processo permanece sobre o regime da tramitação urgente, em consonância com a situação de urgência expressa no n.° 1, e o objeto da causa principal que se impõe conhecer é aquele que decorre do primitivo articulado inicial cautelar que, por convolação, assume a natureza de petição inicial do meio de tutela final urgente. A decisão definitiva por convolação em processo principal do processo cautelar admite a formação de caso julgado material, o que não se verifica com as decisões cautelares, que apenas assumem valor de caso julgado formal, vinculativo apenas no âmbito do próprio processo.” (sublinhado nosso)
I. Face ao exposto, o tribunal ao antecipar o mérito da causa para o momento em que lhe cumpre decidir o processo cautelar, convolando assim, o processo cautelar em processo principal, vai conhecer do requerimento inicial cautelar, e não da PI da ação principal.
J. Deste modo, bem decidiu a sentença e os vícios alegados pelos Recorrentes não devem proceder, não se verificando a alegada violação do artigo 121.° do CPTA, e do artigo 615.°, alínea d) do CPC, bem como, dos artigos 94.° e 95.° n.°s 1 e 3 do CPTA.
K. A sentença recorrida não se esqueceu de apreciar o vício de falta de audiência prévia, uma vez que conforme reconhecem os Recorrentes apenas foi alegado na PI da ação principal, bem como todos os outros factos da PI que considera que não foram analisados. Antes pelo contrário, a sentença recorrida julgou de acordo com o artigo 121.° do CPTA, e se os Requerentes não pretendiam a antecipação do juízo da causa principal, não o deveriam ter peticionado.
L. Não se verificando assim, qualquer nulidade processual por falta de decisão da causa principal, sendo que, a Sentença bem decidiu, ao ter apreciado e julgado os factos e direitos de acordo com o RI cautelar, que por efeito da convolação, assumiu a natureza de petição inicial.
M. Quanto à invocada falta de cumprimento do princípio do contraditório, os Recorrentes laboram num erro, uma vez que, nos termos do artigo 121.° do CPTA, um dos requisitos para a antecipação do juízo da causa principal, apenas exige que o processo principal já tenha sido intentada, estando preenchidos todos os requisitos para decidir nos termos deste artigo, recaindo a decisão sobre o RI cautelar e sobre a oposição e nunca sobre as peças processuais entregues no processo principal.
N. Não se verifica qualquer violação do princípio do contraditório, nem estava a decorre qualquer prazo para pronúncia
O. Também não se verifica a alegada omissão de pronúncia, e sobre o alegado pelos Recorrentes, remetemos para o alegado nos artigos 4 a 18 destas contra-alegações.
P. Destacando sobre a omissão de pronúncia, o acórdão do STA, proc. n.° 12131/18...., de 10-12.2020, no seu sumário, retira-se o seguinte: I - A nulidade por omissão de pronúncia, representando a sanção legal para a violação do estatuído naquele n° 2, do artigo 608.°, do CPC, apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes. (Sublinhado nosso)
Q. Bem como, o Acórdão STA, processo 602/15..... de 11-10-2022, que decidiu que: “II- As nulidades da sentença/acórdão, encontram-se taxativamente previstas no art°. 615° CPC e têm a ver com vícios estruturais ou intrínsecos da sentença/acórdão também conhecidos por erros de atividade ou de construção da própria sentença/acórdão, que não se confundem com eventual erro de julgamento de facto e/ou de direito.
II - A Nulidade de sentença/acórdão, por omissão de pronúncia, só ocorre quando o julgador deixe de resolver questões que tenham sido submetidas à sua apreciação pelas partes, a não ser que esse conhecimento fique prejudicado pela solução a outras questões antes apreciadas.
III - O conceito de “questão”, deve ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, dele sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes” (Sublinhado nosso)
R. Assim, a sentença apreciou as questões que lhe foram submetidas pelas partes, ou seja, decidiu de acordo com o pedido e a causa de pedir, conforme se retira da seguinte recorrida.
S. Ainda, a propósito desta invocada omissão de pronúncia, por violação do disposto no artigo 95.º nºs 1 e 3 do CPTA, também Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in “Comentário ao Código de processo nos tribunais administrativos”, considera, no comentário deste artigo o seguinte: “(...) Não pode falar-se, porém em omissão de pronúncia quando o Tribunal, ao apreciar a questão que lhe foi colocada, não tome em consideração um qualquer argumento alegado pelas partes no sentido da procedência ou improcedência da ação;
(...) a omissão de pronúncia a que se refere o artigo 615.º n.º 1, alínea d), do CPC está em correspondência direta com o estabelecido no artigo 608.º, n.º 2 segunda parte, do mesmo código, onde se prescreve que que “o juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”
T. Face ao exposto, a sentença recorrida, não tinha de se pronunciar sobre todos os factos articulados pelo Recorrentes, nem sobre o os argumentos invocados, mas sim sobre as pretensões formuladas pelos mesmos, o que fez, não se verificando assim a invocada nulidade da sentença recorrida, por violação do disposto no artigo 615.º, alínea d) do CPC, e dos artigos 94.º e 95, nºs 1 e 3 do CPTA.
U. Também não se verifica o invocado erro de julgamento da matéria de facto, conforme referido sobre a omissão de pronúncia, a sentença não tem, ao contrário do invocado pelos Recorrentes, de se pronunciar sobre todos os factos alegados pelos mesmos, e muito menos sobre os factos alegados em sede de petição inicial da ação principal, para o que remetemos o alegado nos artigos 4 a 18 destas contra-alegações, sobre a decisão da causa principal.
V. Os Recorrentes ao alegar este erro de julgamento da matéria de facto, apenas invocam factos alegados pelos Recorrentes na petição inicial da ação principal, que consideram serem essências á decisão da causa, no entanto esquecem-se que a sentença recorrida, foi a antecipação do juízo sobre a causa principal, nos termos do artigo 121.º do CPTA.
W. Referindo-se que, o despacho da Senhora Ministra da Justiça recaiu, sobre o ofício n.º ...21, de 19-07-2023, dirigido ao Gabinete da Senhora Ministra da Justiça, pela Direção Nacional da Polícia Judiciária, em que foi apresentado um plano de recrutamento e promoção, nomeadamente, o alargamento do número de vagas dos procedimentos concursais de promoção para as categorias de inspetor-chefe (a decorrer na altura), bem como autorização de abertura de procedimento concursal de promoção, de 40 vagas, para a categoria de inspetor-chefe, da carreira especial de investigação criminal da Polícia Judiciária, pelas razões nele expostas, que aqui se dão por reproduzidas, por uma questão de economia processual.
X. Pelo que, tendo em conta a data da proposta apresentada à senhora Ministra da Justiça, pelo Diretor Nacional da Polícia Judiciária em 19.07.2023, o alegado pelos Recorrentes deve improceder, e bem decidiu a sentença conforme se extrai das fls. 24, 25 e 27 da mesma.
Y. A sentença recorrida apreciou corretamente a prova documental, uma vez que, como bem demonstra o Tribunal de forma exaustiva, que, a Senhora Ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, quando emitiu em 17-10-2023, parecer favorável à aprovação da proposta da Direção Nacional da Polícia Judiciária, de 19-07-2023, ainda, não era conhecida a lista provisória de candidatos aprovados, ao contrário do que alega o Recorrente.
Z. Sendo certo que, o que é impugnado é do Despacho da Senhora Ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, de 04-10-2025, na parte em que autorizou a abertura de novo procedimento concursal para a promoção á categoria de inspetor-chefe com vista ao preenchimento de 40 postos de trabalho do respetivo mapa de pessoal, bem como dos atos subsequentes. Motivo pelo qual, a sentença recorrida, não errou ao analisar a prova documental.
AA. Também não se verifica erro de julgamento sobre a matéria de direito, não se verificando, ao contrário do alegado pelos Recorrentes, a violação do princípio da igualdade, da imparcialidade e desvio do poder, previstas noas artigos 13.° da CRP, 6° e 9.° do CPA, por incorrer a sentença recorrida em manifestos erros de raciocínio.
BB. Tendo o Despacho impugnado ao contrário do alegado, cumprido os princípios e normas legais aplicáveis à administração pública com respeito pelos direitos e legítimos interesses dos cidadãos
CC. Ao contrário do entendimento dos recorrentes, o despacho da Ministra da Justiça de 04-10-2024, de autorização de abertura de novo procedimento concursal não é ilegal e também não viola os princípios constitucionais de igualdade, nem de acesso à profissão e promoção dos Recorrentes, nem os princípios da prossecução do interesse público, da proibição do défice, da proporcionalidade, do dever de fundamentação, da legalidade, da justiça e razoabilidade, da boa-fé e da boa administração, conforme se demonstrará.
DD. A abertura de um procedimento concursal corresponde a uma prerrogativa dos serviços da Administração Pública, que se encontra limitada, nos termos da lei, pelas necessidades e disponibilidades, visando a satisfação do interesse público, e não de interesses ou expectativas particulares, sendo certo que se visa, como em qualquer concurso, a seleção dos melhores para determinado cargo ou função.
EE. Salienta-se que, quando a Polícia Judiciária efetuou, conforme supra referido, em 19-07-2023, o pedido de ampliação do procedimento concursal de 2022, este ainda se encontrava em fase de aplicação dos métodos de seleção, designadamente, a realização da entrevista de avaliação de competências, sendo, assim, impossível saber-se quantos candidatos seriam aprovados, o que só veio a acontecer após a homologação da lista unitária de ordenação final, datada de 22-12-2023.
FF. A PJ não sabia quantos candidatos e quais os candidatos que ficariam aprovados, motivo pelo qual não poderia ter qualquer intenção de prejudicar os Recorrentes, e nem sequer violou o princípio da igualdade.
GG. Foi entendimento da PJ, na altura, que seria suficiente a abertura para 40 vagas, vindo a constatar-se posteriormente ser necessária a ampliação do procedimento para mais 40, como requereu e foi autorizada. Sendo que, a referida ampliação não invalidava a formalização de solicitação de autorização para abertura de um novo concurso de promoção à categoria de inspetores-chefes, tendo a PJ optado por esta solução, de forma assegurar o interesse público, pelas razões já aduzidas.
HH. Conforme foi referido no despacho, a abertura do novo procedimento concursal também teve em conta dar oportunidade aqueles que, por sua opção, não se apresentaram ao procedimento concursal anterior, e aqueles que reuniram, entretanto, as condições para o efeito e puderam concorrer no atual procedimento.
II. O mérito continua a ser o princípio fundamental, no que respeita à escolha e ao recrutamento. E, a discricionariedade corresponde ao poder de atuação administrativa, dentro dos limites permitidos em lei, ou seja, a lei deixa certa margem de liberdade de decisão diante do caso concreto, de tal modo que a autoridade poderá optar por uma de entre várias soluções possíveis, todas, porém, válidas perante o direito.
JJ. Não obstante, a aprovação que os Recorrentes obtiveram (candidatos graduados na lista de classificação final do anterior concurso - aberto pelo Aviso (extrato) n.º 13078/2022, de 1 de julho), a referida lista é válida para o concurso em causa. E a sua inclusão na lista como candidatos aprovados e em lugares não elegíveis não lhes dá o direito de pretender nova ampliação para mais 40 vagas, para os Recorrentes, candidatos sobrantes de um concurso anterior já terminado.
KK. Na perspetiva da defesa do interesse público associado ao recrutamento dos melhores para preenchimento de determinado cargo ou função pública, os candidatos aprovados no final da lista poderão não coincidir propriamente com os melhores para o cargo ou para a função.
LL. Deste modo, não se verificou a existência de um tratamento diferenciado ou ilegítimo. O que se verificou foi que os Recorrentes obtiveram notas inferiores aos restantes candidatos, designadamente em relação aos candidatos que foram admitidos a frequentar o 2.º curso de formação, por ter sido aumentado o número de vagas de 40 para 80.
MM. O princípio da igualdade obriga a que se trate por igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, não impedindo as diferenciações de tratamento, mas apenas as discriminações arbitrárias, ou seja, as distinções de tratamento que não tenham fundamento material bastante.
NN. As exigências do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP) reconduzem-se à proibição do arbítrio, não impedindo, em absoluto, toda e qualquer diferenciação de tratamento, mas apenas as diferenciações materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ou justificação objetiva e racional, o que não foi o caso.
OO. Também não se verifica a falta de fundamentação da decisão recorrida, nem a violação do direito fundamental à progressão na carreira.
PP. Ao dever legal de fundamentação, além da vertente garante da atividade administrativa consistente na melhor ponderação por parte da Administração, acresce a vertente do lado do destinatário do ato, de que apenas perante uma fundamentação suficiente - se um destinatário normal, face ao itinerário cognoscitivo e valorativo constante do ato em causa - fica em condições de saber o motivo porque se decidiu num sentido e não noutro.
QQ. A jurisprudência vem sustentando de modo unânime que uma decisão administrativa se encontra fundamentada quando um destinatário normal possa ficar ciente e tomar consciência do sentido e das razões que a justificam, não interessando conhecer quaisquer e todos os motivos da decisão, tão só os seus motivos determinantes, isto é, os motivos de facto e de direito sem cuja valoração o órgão administrativo decisor não teria decidido como decidiu.
RR. A discordância da fundamentação do ato impugnado não equivale a falta de fundamentação.
SS. A PJ não pretendeu, com a abertura do procedimento concursal de promoção para o preenchimento de 40 postos de trabalho do mapa de pessoal da Polícia Judiciária, da categoria de inspetor-chefe, da carreira especial de investigação criminal, beneficiar qualquer grupo de trabalhadores em detrimento de outros. Reiterando-se que, a autorização para abertura do referido procedimento concursal foi requerida mediante ofício do Diretor Nacional Adjunto da Polícia Judiciária, dirigido ao então Chefe do Gabinete da Ministra da Justiça, em 19-03-2023.
TT. Portanto, em data anterior à homologação da lista final de candidatos aprovados no concurso para o preenchimento de 40 postos de trabalho para a categoria de inspetor-chefe (Aviso n.° 13078/2022), publicada em 27-12-2023, pelo que ainda nem se sabia quantos candidatos ficariam aprovados neste concurso, em que concorreram 360 candidatos.
UU. Tendo o Despacho impugnado observou o quadro legal aplicável, no qual se fundou a decisão de abertura do procedimento concursal para a PJ, bem como na ampliação para mais 40 vagas do procedimento concursal a decorrer. Pelo que, a PJ atuou de acordo com um fim que não o legalmente previsto, não se verificando, o invocado desvio de poder.
VV. Também não se verifica a violação no acesso à função pública, prevista no n.° 2 do artigo 47.° da CRP. Uma vez que o n.° 2 do artigo 47.° da CRP tem por objetivo garantir que todos os cidadãos tenham o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via do concurso.
WW. Ao aceitar-se a ampliação do procedimento concursal de promoção na categoria de inspetor-chefe da Polícia Judiciária, para os Recorrentes, em igualdade de circunstâncias com os restantes 80 candidatos aprovados e providos no âmbito do mesmo concurso interno de promoção e preenchimento de 40 postos de trabalho do mapa de pessoal da PJ para a categoria de inspetor-chefe, 1ª posição remuneratória, nível 42, da carreira especial de investigação criminal, aí sim seria violado o princípio da igualdade, em relação ao candidatos que concorreram ao novo procedimento concursal de promoção, bem como o direito a um procedimento concursal justo.
XX. Pois não estaríamos a dar oportunidade àqueles que não se apresentaram ao procedimento concursal anterior e àqueles que, entretanto, reuniram, as condições para o efeito e puderam concorrer ao novo procedimento, sendo certo que as autorizações de abertura deste procedimento concursal foram obtidas antes de se saber quantos candidatos foram aprovados no procedimento anterior, em que os Recorrentes se encontram aprovados.
YY. Estariam assim, os Recorrentes a ser privilegiados face aos outros candidatos ao novo procedimento concursal, e também estes têm a expectativa de promoção, o que não se pode aceitar. Não se verificando assim a alegada violação, quanto ao direito de acesso à função pública, consagrado no n.º 2 do artigo 47.º da CRP, uma vez que os candidatos não foram prejudicados, podendo se assim o entenderem candidatar-se ao novo procedimento concursal de promoção.
ZZ. A violação do princípio da igualdade e da imparcialidade alegada pelos Recorrentes decorreria, não do ato impugnado, mas sim daquilo que os Recorrentes pretendem, ou seja, da colocação destes, numa situação de vantagem, em detrimento da expectativa que outros candidatos que reúnam os requisitos na abertura do novo procedimento concursal.
AAA. Este, sim, seria um comportamento parcial e desigual da Administração, o que é claramente inadmissível.
BBB. Pelo que, bem decidiu a sentença, ao considerar que não se verificava a violação dos princípios da proibição de défice, da prossecução do interesse público, boa-fé, proporcionalidade, boa administração, da igualdade.
CCC. Também não se verifica a falta ou insuficiência de fundamentação, conforme bem decidiu a sentença.
DDD. Quanto à falta de audiência prévia, sempre se dirá que a sentença não é omissa quanto à mesma, pois só foi alegada na PI, e não no RI cautelar, motivo pelo qual a sentença não se pronunciou sobre a mesma.
EEE. Mas, sempre se dirá que, quanto à alegada violação do princípio da audiência prévia, a invalidade imputada pelos Recorrentes ao ato impugnado origina mera anulabilidade e não nulidade.
FFF. Na ocorrência deste vício, tanto a doutrina como a jurisprudência têm considerado que determina a anulabilidade do ato administrativo. Não obstante, nem sequer procede o pedido de anulação por este alegada vicio, tendo em conta que não existia qualquer dever de ouvir os Recorrentes antes de ser exarado o despacho ora impugnado.
GGG. Aliás, conforme se referiu, as autorizações para a abertura deste novo procedimento concursal foram anteriores à conclusão do procedimento concursal em que os Recorrentes foram aprovados.
HHH. Referindo-se que a abertura de um procedimento concursal corresponde a uma prerrogativa dos serviços da Administração Pública, que se encontra limitada, nos termos da lei, pelas necessidades e disponibilidades, visando a satisfação do interesse público e não de interesses ou expectativas particulares, sendo certo que se visa, como em qualquer concurso, a seleção dos melhores para determinado cargo ou função.
III. Consequentemente, o ato impugnado não padecerá de vício de forma, por incumprimento do princípio da audiência de interessados, consagrado no n.º 5 do artigo 267.º da CRP e artigos 121.º e seguintes do CPA, conforme alegam os Recorrentes.
JJJ. Face ao exposto, bem decidiu a sentença recorrida ao considerar que o Despacho da Senhora Ministra da Justiça, de 04-11-2024, não padece que qualquer ilegalidade, nem se verifica a ofensa aos princípios da igualdade, do direito constitucional de acesso à profissão e promoção dos Recorrentes, da prossecução do interesse público, do princípio da proibição do défice, da proporcionalidade, do dever de fundamentação, da legalidade, da justiça e razoabilidade, da boa-fé, da boa administração e do direito de audiência prévia.
KKK. Em conclusão, a sentença recorrida julgou de acordo com os factos constantes do RI cautelar, fez uma correta interpretação do quadro legal aplicável, não merecendo qualquer reparo, devendo, por isso, manter-se na ordem jurídica.
Nestes termos, deve o recurso em análise ser julgado improcedente, mantendo-se a Sentença recorrida com as legais consequências.
A Senhora Procuradora Geral Adjunta notificada, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1. Em 01.07.2022, foi publicado no Diário da República n.º 126/2022, 2.ª série, o aviso (extrato) n.º 13078/2022, referente à abertura do procedimento concursal de promoção para o preenchimento de 40 postos de trabalho do mapa de pessoal da Polícia Judiciária, da categoria de inspetor-chefe, 1.ª posição remuneratória - nível 42, da carreira especial de investigação criminal - cfr. aviso (extrato) n.º 13078/2022 a página 2 do processo administrativo (p.a.) junto aos autos.
2. O Diretor Nacional da Polícia Judiciária dirigiu ao Chefe de Gabinete da Ministra da Justiça o ofício ...21, datado de 19.07.2023, cujo teor parcial se extrata: “(...) No procedimento para Inspetor Chefe apresentaram-se cerca de 120 candidatos e encontra-se em fase de aplicação dos métodos de seleção, designadamente, a realização da entrevista de avaliação de competências, sendo assim, impossível proceder à sua hierarquização.
* Alargamento do número de vagas do procedimento concursal de promoção às categorias de Inspetor Chefe e de Coordenador de Investigação Criminal da carreira especial de investigação Criminal
Nos concursos de promoção na PJ não há a possibilidade de recorrer a reserva interna de recrutamento, posto que tal faculdade está descartada pelo art.º 4.º da portaria específica dos concursos, da mesma forma que se apresenta afastada pelo aviso de abertura do procedimento de acesso a categoria de Inspetor Chefe a que acima se alude, quando expressamente refere que o mesmo cessa nos termos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 399 da Portaria 248/2021, de 11/11, excluindo, portanto, a alínea c) que aquela respeita.
A alternativa passa pela ampliação dos postos de trabalho a concurso e a consequente revogação/substituição parcial/alteração do despacho ministerial que autorizou a abertura do procedimento e as vagas (art.º 20.º da portaria dos concursos), bem como daquele que o publicita (art.º 26.º - aviso de abertura). (...)
Sublinha-se que a revogação/alteração/substituição que adiante formalmente se proporá se baseia ou fundamenta exclusivamente em motivos de interesse público, que, nos termos do art.º 266º da CRP, orienta toda a atividade da Administração Pública, e que aqui justifica inteiramente eventual decisão nesse sentido: regularização dos casos de chefias e coordenação em substituição, necessárias à investigação, sobretudo num contexto de futura integração de pessoal provindo de serviço extinto e objeto de fusão, a carecer de enquadramento funcional que, desejavelmente, deve acontecer com investidura no cargo e não em regime precário, tudo num contexto de procedimentos administrativos prolongados no tempo e de relativa estabilidade dos requisitos para apresentação a concurso.
Estão, ainda, salvaguardados os requisitos essenciais da decisão de autorização de qualquer procedimento de recrutamento: a existência de postos de trabalho no mapa de pessoal da PJ e a necessária cobertura orçamental, nos termos estabelecidos, na certeza de que este segundo requisito, só produzirá efeitos em 2024 e, mesmo assim, estaria sempre praticamente garantido, uma vez que as chefia/coordenação em substituição em funções vencem pela 1.ª posição remuneratória de Inspetor Chefe/Coordenador de investigação Criminal (art.° 70.°, n.° 3 da LOPJ), a mesma em que será colocado o pessoal que venha a ser apurado em sede concursal, caso a proposta adiante formalizada venha a merecer acolhimento.
Assim, com estes fundamentos e nos termos do disposto no art.° 20.° n.° 1 da Portaria n.° 248/2021, de 11/11, tenho a honra de propor a V. Ex. se digne promover junto de S. Ex. a Ministra da Justiça a necessária autorização para a ampliação para:
- 80 (oitenta) dos postos de trabalho na categoria de inspetor Chefe a preencher por via do procedimento concursal aberto pelo Aviso n.® 13078/2022, publicado na 2.ª Série do Diário da República, n.° 126, de 1 de julho de 2022, fixado em 40 (quarenta) pelo Despacho ...22...; e
- 40 (quarenta) dos postos de trabalho na categoria de Coordenador de Investigação Criminal a preencher por via do procedimento concursal ainda não publicado, mas autorizado pelo Despacho ...23..., fixado em 20 vagas.
* Abertura de Procedimento concursal de promoção à categoria de Inspetor Chefe da carreira especial de Investigação Criminal
A ampliação que se procurou justificar não invalida a formalização de solicitação de autorização para abertura de novo concurso de promoção à categoria de Inspetor Chefe da carreira especial de investigação Criminal no corrente ano de 2023, que apenas surtirá efeitos práticos em finais de 2024 e que, pelas mesmas razões que ficaram aduzidas, se justifica inteiramente.
Neste momento estão em formação 80 candidatos à categoria de Inspetor da carreira especial de Investigação Criminal, concurso aberto pelo Aviso de Abertura n.° ...36/2021.
No cumprimento da Portaria n.° 248/2021, de 11/11, a Polícia Judiciária tem aberto um procedimento concursal de ingresso para 150 vagas na categoria de Inspetor da carreira especial de Investigação Criminal e terá que abrir procedimento idêntico até ao fim do ano.
Tendo em atenção a entrada de 380 novos Inspetores (150+150+80) há necessidade de acautelar a sua integração numa cadeia hierárquica, onde a primeira chefia intermédia é o Inspetor Chefe.
De acordo com o sistema organizacional e a sua cultura institucional, as unidades básicas da Polícia Judiciária, designadas por Brigadas, são compostas por 6/8 Inspetores e 1 Inspetor Chefe, dai que seja necessário a abertura de um procedimento concursal de promoção a 40 Inspetores Chefes.
Tendo em consideração que, a ser deferida a pretensão, o procedimento só produz efeito em 2024, foi acautelada a respetiva previsão no mapa de pessoal e respetiva cabimentação orçamental desse ano (2024).
Assim, com estes fundamentos e nos termos do disposto no art.° 20.° n.° 1 da Portaria n.° 248/2021, de 11/11, tenho a honra de propor a V. Ex. se digne promover junto de S. Ex. a Ministra da Justiça a necessária autorização para a abertura de um procedimento concursal de promoção à categoria de
Inspetor Chefe da carreira especial de Investigação Criminal para 40 vagas. (...)” - cfr. páginas 6 a 13 do p.a. junto aos autos.
3. Em 17.10.2023, na informação n.º ...79 emitida pela Direção de Serviços Jurídicos de Contencioso da Secretaria Geral do Ministério da Justiça, com o assunto “autorização de procedimentos concursais da PJ”, a Ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, proferiu despacho cujo teor integral se extrata: “(...) Concordo com o proposto na presente informação, pelo que, nos termos do previsto no n.° 1 do artigo 126.ª do Decreto-Lei n.° 10/2023, de 8 de fevereiro (DLEO 2023), bem como do disposto no n.° 1 do artigo 20.° da Portaria n.° 248/2021, dou o meu parecer favorável:
a) ao aumento para 80 postos de trabalho, do procedimento concursal de promoção na categoria de Inspetor Chefe da Polícia Judiciária (P.J), aberto pelo Aviso n.° 13078/2022, anteriormente fixado em 40 vagas, pelo Despacho ...22...;
b) ao aumento para 40 postos de trabalho na categoria de Coordenador de Investigação Criminal da PJ, a preencher por via do procedimento concursal ainda não publicado, mas autorizado pelo Despacho ...23..., fixado em 20 vagas;
c) à abertura de um novo procedimento concursal de promoção, de 40 vagas, para a categoria
de Inspetor-Chefe da PJ.
Submeta-se o aumento do número de vagas dos procedimentos concursais supra referidos, bem como a abertura de novo procedimento concursal de promoção para a categoria de Inspetor-Chefe da PJ para 2024, a autorização dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da Administração Pública
e das finanças, em cumprimento do previsto no referido n.º 1 do artigo 126.º do DLEO 2023. (...)” - cfr. página 14 do p.a. junto aos autos.
4. Em 21.12.2023, a Secretária de Estado do Orçamento, Sofia Batalha, proferiu o despacho n.º 1246/2023/SEO, cujo teor se extrata: “(...) Nos termos e para os efeitos do artigo 126.°, n.° 1 do Decreto-Lei n.° 10/2023, de 8 de fevereiro, no âmbito do pedido remetido pelo Gabinete da Senhora Ministra da Justiça, considerando a informação e o enquadramento apresentados pela Secretaria-Geral do Ministério da Justiça e a informação da Direção-Geral do Orçamento, remeta se à consideração do Senhor Ministro das Finanças, a ampliação do número de vagas dos dois concursos anteriormente autorizados e a abertura de novo concurso interno de acesso, para promoção na carreira de investigação criminal da Polícia Judiciária, nos termos propostos:
aumento de 40 para 80 vagas no procedimento concursal de promoção na categoria de inspetor-chefe, aberto pelo Aviso n.º 13078/2022 (Despacho ...22...);
aumento de 20 para 40 vagas no procedimento concursal de promoção na categoria de coordenador de investigação criminal, ainda não aberto (Despacho ... ...23...); abertura de novo concurso de promoção à categoria de inspetor-chefe, com 40 vagas.
As promoções pretendidas têm um impacto orçamental anual de 771 000€, a ocorrer apenas em 2024, tendo a entidade informado que parte das promoções terão impacto orçamental neutro, uma vez que os trabalhadores aprovados nos dois primeiros concursos referidos substituirão outros nomeados provisoriamente que regressarão à sua situação de origem, pelo que deverá verificar-se a correspondente e efetiva diminuição das referidas situações transitórias previstas no n.º 10 do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 137/2019, de 13 de setembro, igualmente sujeitas ao disposto no n.º 1 do artigo 126.º do DLEO.
O pedido ainda não foi objeto de autorização pela Senhora Secretária de Estado da Administração Pública. (...)” - cfr. despacho a página 30 do p.a. junto aos autos.
5. Em 18.12.2023, o júri do procedimento concursal a que se alude no ponto 1 elaborou a ata n.º 22, com a seguinte ordem de trabalhos que se extrata: “(...)
1. Apreciação de reclamações e alegações efetuadas ao abrigo do exercício do direito de audiência prévia dos interessados, sobre o projeto de lista unitária de ordenação final dos candidatos do presente procedimento concursal. 2. Elaboração e ordenação de lista com os resultados de todos os métodos de seleção previstos para o presente procedimento concursal. 3. Elaboração e ordenação da lista com a classificação final dos candidatos com aprovação em todos os métodos de seleção, para posterior homologação superior (...)” - cfr. ata a páginas 33 e seguintes de fls. 148 aos autos.
6. Em 12.01.2024, foi publicado no Diário da República n.º 9, 2.ª série, o aviso (extrato) n.º 655/2024 que tornou público que a lista unitária de ordenação final do procedimento concursal, a que se alude no ponto 1, se encontrava afixada, conforme teor parcial que se extrata, “(...) faz-se público que a lista unitária de ordenação final do procedimento concursal para o preenchimento de 40 postos de trabalho do mapa de pessoal da Polícia Judiciária, de promoção à categoria de inspetor-chefe, 1ª posição remuneratória - nível 42, da carreira especial de investigação criminal, aberto pelo Aviso (extrato) n.º 13078/2022, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 126, de 1 de julho, devidamente homologada por despacho de 22 de dezembro de 2023, do Diretor Nacional Adjunto da Polícia Judiciária, encontram-se afixadas, nos termos do n.º 19.2 do aviso de abertura integral, em local visível e público das instalações da sede da Polícia Judiciária e ainda disponibilizada na sua página eletrónica da intranet. (...)” - cfr. aviso (extrato) n.º 655/2024, a página 3 do p.a. junto aos autos.
7. No âmbito do procedimento concursal a que se alude no ponto 1, foi elaborada a lista unitária de ordenação final do procedimento concursal cujo teor se extrata:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cfr. páginas 4 a 6 do p.a. junto aos autos.
8. Em 29.02.2024, o Diretor Nacional da Polícia Judiciária proferiu o despacho n.º 23/20..., cujo teor se extrata: “(...) Tendo em conta a conclusão do procedimento concursal para o preenchimento de 40 postos de trabalho do mapa de pessoal da Policia Judiciária, de promoção à categoria de inspetor-chefe, bem como a homologação e publicação da lista de candidatos aprovados, importa fixar a data de inicio do Curso de Formação de Inspetores-Chefes, a ter lugar no IPJCC. Assim, determino, nos termos do art.º 88° do Decreto Lei 138/2019 de 13 de setembro, o seguinte:
1. Aprovação, por um período de sensivelmente 2 meses, do Curso para promoção à categoria de inspetor-chefe, conforme proposto pelo IPJCC. Circunstâncias supervenientes e ponderosas, poderão determinar a necessidade de alterar a data de conclusão do Curso.
2. Fixação do dia 04 de março de 2024 como data de início do referido Curso de Formação, denominado Curso de Formação de Inspetores-chefes 2024. (...)” - cfr. despacho a fls. 219 dos autos.
9. Em 28.03.2024, no despacho n.º 1246/2023/SEO a que se alude no ponto 4, o Ministro das Finanças, Fernando Medina, proferiu o despacho interno n.º 91/2024/MF com o seguinte teor que se extrata: “Concordo e autorizo” - cfr. despacho interno a página 30 do p.a. junto aos autos.
10. Em 10.07.2024, Diretor Nacional da Polícia Judiciária proferiu o despacho n.º 68/20..., cujo teor parcial se extrata: “(...) Tendo em conta as necessidades de serviço, as preferências manifestadas pelo novos inspetores-chefes e a previsibilidade de, no corrente ano, se proceder à formação de mais 40 inspetores-chefes e a abertura de novo procedimento concursal de promoção, nos termos do artigo 16.° do Regulamento de Colocações do Pessoal da Polícia Judiciária, aprovado pelo Despacho Normativo n.º 8/2009, de 12 de fevereiro, determino as seguintes colocações: (...)” - cfr. despacho interno a fls. 223 do p.a. junto aos autos.
11. Em 04.10.2024, a Ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, proferiu o despacho n.º /...24..., com o assunto “Polícia Judiciária - Autorização de abertura e de ampliação de procedimentos concursais”, cujo teor se extrata: “(...) Considerando os pedidos formalizados pela Polícia Judiciária, em 19 de julho de 2023, com vista à ampliação para 80 e 40 dos postos de trabalho nas categorias, respetivamente, de inspetor-chefe e de coordenador, ambas da carreira de investigação criminal, antes autorizados para 40 e 20 vagas, conforme despachos n.ºs ...22... e ...23..., bem como visando a abertura de novo procedimento concursal de promoção à categoria de inspetor-chefe, para 40 postos de trabalho;
Atendendo a que os processos de promoções, independentemente da respetiva modalidade, dependem de despacho prévio favorável do membro do Governo responsável pela área em que se integra o serviço em causa, sendo posteriormente submetidos a autorização dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da Administração Pública e das Finanças, nos termos conjugados dos artigos 126.º e 127.º, respetivamente e pela mesma ordem, dos decretos de execução orçamental para 2023 e 2024, aprovados pelos Decretos-Leis n.ºs 10/2023 e 17/2024, de 8 de fevereiro e 29 de janeiro, e do artigo 20.º, n.º 1 da Portaria n.º 248/2021, de 11 de novembro;
Tendo presente o despacho da minha antecessora, de 17 de outubro de 2023, no qual se formula juízo favorável ao pedido acima referido, atento o parecer técnico emitido pelos serviços jurídicos da Secretaria-Geral do Ministério da Justiça, de 18 de agosto de 2023, onde se conclui, entre outros aspetos, "que a ampliação dos procedimentos concursais de promoção em análise, pode ser admitido", ainda que condicionada à autorização dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da Administração Pública e das Finanças;
Verificado que os imperativos impostos pelos artigos 126.º e 127.º dos decretos de execução orçamental, acima identificados, se encontram cumpridos, tendo em conta os despachos de autorização emitidos em 5 de dezembro de 2023 e em 28 de março de 2024, da Secretária de Estado da Administração pública e do Ministro das Finanças (despacho n.º 91/2024/MF), exarados sobre propostas da Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (inf. 521/DRJE/DGAEP) e da Secretaria de Estado do Orçamento (despacho n.º 1246/2023/SEO), de 29 de novembro e 21 de dezembro de 2023;
Confirmado que se encontra assegurada a pertinente cobertura orçamental por conta de dotações de 2024, conforme cabimentos n.ºs ...96, ...97, ...98, emitidos, em 22 de maio de 2024, pelo serviço proponente, juntos ao processo;
Fica a Polícia Judiciária autorizada a proceder, em conformidade com as disposições supra enunciadas e nos termos por si propostos:
1 - À abertura de procedimento concursal para promoção à categoria de inspetor-chefe com vista ao preenchimento de 40 postos de trabalho do respetivo mapa de pessoal;
2 - A ampliação, para 80 e 40, respetivamente, dos postos de trabalho a preencher nos procedimentos tendentes ao acesso às categorias, pela mesma ordem, de inspetor-chefe e de coordenador, ambas da carreira de investigação criminal, antes autorizados para 40 e 20 vagas, conforme despachos n.ºs ...22... e ...23...
3 - Transmita-se à Polícia Judiciária, conjuntamente com o pertinente expediente. (...)” - cfr. despacho a página 32 do p.a. junto aos autos.
12. Em 04.11.2024, o Diretor Nacional Adjunto da Polícia Judiciária proferiu o despacho n.º 110/20..., cujo teor se extrata: “(...) Considerando que:
. O procedimento concursal para o preenchimento de 40 postos de trabalho na categoria de Inspetor-Chefe da Polícia Judiciária, autorizado pelo Despacho n.º ...22..., ficou concluído em 22.12.2023, com a homologação da lista unitária de ordenação final;
. Dessa lista fazem parte 120 candidatos aprovados;
. Os primeiros 40 candidatos aprovados já concluíram o Curso de Formação para Inspetor-Chefe, tendo sido devidamente nomeados;
. Pelo Despacho de 04.10.2024 da Sra. Ministra da Justiça, foi autorizada a ampliação para 80 postos de trabalho, a preencher por recurso ao procedimento concursal autorizado pelo Despacho n.º ...22...;
. Importa fixar a data de início do Curso de Formação para Inspetor-Chefe, a ter lugar no IPJCC.
Face ao exposto, determino, nos termos do artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 138/2019, de 13 de setembro, o seguinte: 1. Aprovação, por um período de sensivelmente 3 meses, do Curso de Formação para Inspetor-Chefe, conforme proposto pelo IPJCC. Circunstâncias supervenientes e ponderosas, poderão determinar a necessidade de alterar a data de conclusão do curso. 2. Fixação do dia 18 de novembro de 2024 como data de início do referido Curso de Formação, denominado 2.º Curso de
Formação de Inspetores-Chefes - 2024. (...)” - cfr. despacho a páginas 34 e 35 do p.a. junto aos autos.
13. Em 12.11.2024, os Requerentes apresentaram o requerimento inicial que deu origem aos presentes autos cautelares - facto não controvertido.
14. Em 15.11.2024, foi publicado no Diário da República n.º 222, 2.ª série, o aviso (extrato) n.º 25514/2024/2, referente à abertura do procedimento concursal de promoção para o preenchimento de 40 postos de trabalho do mapa de pessoal da Polícia Judiciária, da categoria de inspetor-chefe, 1.ª posição remuneratória - nível 42, da carreira especial de investigação criminal - cfr. aviso (extrato) n.º 25514/2024/2 a página 36 do p.a. junto aos autos.
15. Em 19.12.2024, foi elaborada a ata n.º 2 denominada de “ata de reunião para o procedimento concursal de promoção e preenchimento de 40 postos de trabalho para a categoria de Inspetor-Chefe na carreira de investigação criminal da Polícia Judiciária”, cujo teor parcial se extrata: “(...) A reunião teve a seguinte ordem de trabalhos:
I. Apreciação dos processos de candidatura apresentados pelos candidatos e elaboração da lista provisória dos candidatos admitidos e excluídos (...)
Anexo A
Lista de candidatos admitidos
| Nome |
| «AA» (...) |
| «BB» (...) |
| «CC» (...) |
| «DD» |
| «EE» (...) |
| «FF» (...) |
| «GG» (...) |
| «HH» |
| «II» (...) |
| «JJ» (...) |
| «KK» (...) |
| «MM» (...) |
| «OO» |
| «NN» |
| «PP» (...) |
| «QQ» (...) |
| «RR» (...) |
| «SS» (...) |
| «TT» (...) |
| «UU» (...) |
| «VV» (...) |
| «XX» (...) |
| «YY» (...) |
| «ZZ» (...) |
| «AAA» (...) |
| «BBB» (...) |
| «CCC» (...) |
| «DDD» (...) |
- cfr. ata a fls. 474 dos autos.
DE DIREITO
É objecto de recurso a sentença proferida no processo cautelar que, em antecipação do juízo da causa principal, julgou a ação totalmente improcedente, por não provada, e absolveu os Réus do pedido.
Do enquadramento do processo -
Os Autores interpuseram em 12/11/2024 providência cautelar contra os Réus, pedindo:
i)a suspensão da eficácia com efeitos retroativos do despacho da Senhora Ministra, Dra. Rita Alarcão Júdice, de 4.10.2025, na parte em que autorizou a abertura de novo procedimento concursal para a promoção à categoria de inspetor-chefe com vista ao preenchimento de 40 postos de trabalho do respetivo mapa de pessoal, bem como dos atos subsequentes;
ii) a sua admissão provisória ao 2.º Curso de Formação de inspetores-chefe de 2024;
iii)a sua promoção e provimento provisório nos lugares vagos e na categoria de inspetor-chefe, 1.ª posição remuneratória, nível 42 da carreira especial de investigação criminal.
Com o requerimento inicial, invocaram, desde logo, a ilegalidade do despacho da Senhora Ministra, Dra. Rita Alarcão Júdice, de 4.10.2025, imputando-lhe os seguintes vícios:
i) violação do «princípio da igualdade» e do «direito de acesso em igualdade de circunstâncias com os demais candidatos à progressão na carreira em funções públicas»;
ii) violação do «princípio da proibição do défice»;
iii)violação do «dever de fundamentação»;
iv)violação do «princípio da legalidade»;
v) violação do «princípio da prossecução do interesse público»
vi)violação do «princípio da justiça e da razoabilidade»;
vii) violação do «princípio da boa-fé»;
viii) violação do «princípio da proporcionalidade»;
ix)violação do «princípio da boa administração»;
Os Autores alegaram diversos prejuízos tendentes a demonstrar a verificação do requisito do periculum in mora e peticionaram o decretamento provisório da providência, uma vez que o 2.° Curso de Formação de inspetores-chefe de 2024 se iria iniciar cerca de 6 dias após a entrada em juízo da providência cautelar.
O Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto declarou-se incompetente para conhecer em razão da matéria das providências requeridas, considerando que estaria em causa um processo de contencioso de massas (art. 99.° do CPTA) e, como tal, seria competente o TAC de Lisboa.
Os Autores reclamaram do despacho proferido para o Senhor Juiz Desembargador Presidente deste Tribunal Central Administrativo do Norte que, por decisão de 5.12.2024, deu razão aos Autores.
Em 16.12.2024 foi admitida a providência cautelar, isto é, quando o 2.° Curso de Formação de inspetores-chefe de 2024 já se havia iniciado quase há um mês, e em 20.12.2024 foi efetivada a citação dos Réus.
O facto de o 2.° Curso ter sido já ministrado em cerca de 1/3 da sua formação inicial, serviu de fundamentação para ser indeferido o pedido de decretamento provisório da providência.
Os Réus avançaram no novo concurso cuja suspensão de eficácia tinha sido requerida.
Os Réus deduziram oposição, na qual pugnaram pela improcedência das pretensões cautelares.
Em 13.01.2025, o Ministério da Justiça apresentou nos autos do processo cautelar resolução fundamentada que mereceu oposição dos Autores com a dedução do respetivo incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida.
Por decisão do TAF do Porto de 23.02.2025, foi julgado parcialmente procedente o incidente deduzido pelos Autores.
Os Autores não recorreram do incidente.
O TAF do Porto notificou as Partes que entendia ser de antecipar o juízo da causa principal, ao abrigo do artigo 121.º do CPTA.
Após pronúncias das Partes, sem que qualquer delas se tenha oposto, foi decidido antecipar o juízo da causa principal que deu entrada em juízo em 13.01.2025.
Os Autores em 24.02.2025 foram notificados das contestações apresentadas pelos Réus na ação principal.
Estando ainda a decorrer o prazo de 10 dias que terminava a 10.03.2025 para se pronunciarem sobre os documentos e processo administrativo, os Autores foram em 05.03.2025 notificados da decisão de antecipação do juízo da causa principal e da sentença recorrida.
Na ação principal os Autores peticionam:
a) que seja declarado nulo ou anulado o despacho da Exma. Senhora Ministra da Justiça, Dr.ª Rita Alarcão Júdice de 4 de outubro de 2024, com a consequente anulação do concurso aberto, correspondente ao Aviso (extrato) n.° 25514/2024/2, publicado no Diário da República n.° 222, 2.ª Série, de 15 de novembro de 2024;
b) seja condenado o 1.° Réu Ministério da Justiça a proferir novo despacho que substitua o ato impugnado e proceda à ampliação de 40 para 120 dos postos de trabalho a preencher no procedimento tendente ao acesso à categoria de inspetor-chefe, da carreira de investigação criminal, antes autorizado para 40 vagas;
c) seja condenado o 2.° Réu Ministério das Finanças a autorizar o novo ato praticado em substituição do anterior, designadamente, a ampliação de 40 para 120 dos postos de trabalho a preencher no procedimento concursal para promoção à categoria de inspetor-chefe, correspondente ao Aviso n.° 13078/2022, publicado no Diário da República n.° 126, de 1 de julho de 2022, no âmbito das competências que lhe assistem de controlo da inscrição orçamental e cabimento da respetiva despesa e verificação da observância das regras legais aplicáveis aos concursos na carreira e categorias da Polícia Judiciária;
d) seja condenado o 1.ª Réu Ministério da Justiça (através da Polícia Judiciária) a organizar e realizar para os Autores um novo Curso de Formação de Inspetores-Chefes;
e) seja condenado o 1.° Réu Ministério da Justiça (através da Polícia Judiciária) a promover os Autores e a conceder-lhes provimento nos lugares vagos e na categoria de inspetor-chefe, 1ª posição remuneratória, nível 42 da carreira especial de investigação criminal, que ficarem aprovados no referido Curso de Formação, com efeitos retroativos à data em que forem promovidos e providos nos lugares os candidatos que ficarem aprovados no 2.° Curso de Formação de Inspetores-Chefes - 2024, que se encontra a decorrer nesta data e a que alude o despacho n.° Despacho n.° /23/20... da Direção Nacional da Polícia Judiciária;
f) sejam condenados ambos os Réus nas custas e demais encargos da presente ação.
Na ação principal os Autores pedem ao Tribunal a condenação do Réu Ministério da Justiça à ampliação de 40 para 120 dos postos de trabalho a preencher no procedimento tendente ao acesso à categoria de inspetor-chefe, da carreira de investigação criminal, e não apenas de 30 como referido na decisão recorrida que, certamente por lapso, atendeu apenas à petição do processo cautelar.
Relativamente ao ato impugnado, na ação principal foi invocado, para além das ilegalidades mencionadas no requerimento cautelar que foram melhor explicitados com mais alguma matéria de facto e de direito, o vício de falta de audiência prévia.
Na óptica dos Autores e aqui recorrentes, a sentença recorrida é (i) nula por violação da lei de processo aplicável, (ii) por omissão de pronúncia sobre factos e vícios essenciais à decisão da causa, (iii) por erro de julgamento da matéria de facto e apreciação da prova (iv) e erro de julgamento da matéria de direito.
Vejamos,
Das nulidades processuais -
a) Falta de decisão da causa principal -
A sentença recorrida, como alegado, ao invés de apreciar os factos alegados e o direito invocado na petição inicial da ação principal, apreciou os factos alegados e o direito invocado no requerimento cautelar e respetivas oposições.
Desta feita argumentam os Recorrentes que não deu como provados ou não provados matéria alegada na petição da ação principal e nas contestações apresentadas pelos Réus, cingindo-se ao que foi articulado no processo cautelar.
Na verdade, refere-se na sentença recorrida que os Autores peticionaram o alargamento a 30 vagas, quando o que peticionaram foi o alargamento de 40 para 120 vagas (als. b) e c) do pedido da ação principal).
A sentença recorrida, a propósito do vício de violação de lei, remete a decisão para o “artigo 206.º da p.i.”, quando o artigo 206.° da petição da ação principal trata do «princípio da justiça e razoabilidade».
No artigo 206.° do requerimento inicial cautelar é que se aborda o «princípio da legalidade», coincidindo com o texto que foi transcrito na sentença recorrida.
O mesmo se pode dizer a propósito do princípio da boa-fé, quando remete para os artigos 237.° e 238.° como sendo da p.i., mas que na verdade são do requerimento inicial cautelar.
Como também invocado, a sentença recorrida não apreciou o vício de falta de audiência prévia alegado nos artigos 245.° a 249.° da petição da ação principal, mas não alegado no requerimento inicial.
Não analisou os factos alegados pelos Autores, nomeadamente, entre outros, os artigos 30.°, 32.° a 37.°, 51.° a 59.° e 64.° a 68.° da petição inicial, que os mesmos sustentam serem essenciais à decisão da causa.
E invocou alegações do Ministério da Justiça que não constam da contestação da ação principal, designadamente, a propósito das 30 vagas e da exclusão dos candidatos ordenados em 111.° a 120.° da lista final.
Como se sabe, o artigo 121.° do CPTA permite, cumpridos determinados pressupostos, ao Tribunal antecipar o “juízo da causa principal” e não do processo cautelar. Pelo que deveria o Tribunal ter apreciado e julgado os factos e o direito da causa principal e não do processo cautelar.
Tal equivale a dizer que a decisão recorrida é nula por ter praticado um ato processual não previsto, violando o disposto no artigo 121.° do CPTA e artigo 615.°, alínea d) do CPC, aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, 94.° e 95.°, 1 e 3 do CPTA.
b) Falta de cumprimento do princípio do contraditório (artigo 3.º do CPC) -
Como também aduzido, o Tribunal a quo proferiu a decisão (decidindo antecipar o juízo da causa final) sem que antes tivesse decorrido o prazo de 10 dias a contar da notificação das contestações e junção do processo administrativo (24/02/2025, presumindo-se efetuada no 3.° dia posterior).
É incontornável que os Autores tinham o direito processual de se pronunciarem sobre o processo administrativo, exercer o contraditório dos documentos e ainda de ampliar a causa a novos vícios por força da contestação apresentada, pelo que, como apontado, a sentença recorrida é também nula por violação do princípio do contraditório, uma vez que não se cumpriu a formalidade de aguardar o decurso do respetivo prazo que se encontrava a correr a favor dos Autores (artigo 195.° do CPC, aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA).
Em suma,
Estatui o artigo 3°, n.° 3, do CPC ex vi art.° 1° do CPTA, que “o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.”;
O que não sucedeu, in casu, em clara violação do princípio do contraditório, não tendo, de igual modo, sido invocada na sentença a manifesta desnecessidade em dar cumprimento ao mesmo;
A falta de cumprimento do contraditório (ínsito no art.° 3° n.° 3 do CPC) por parte do Tribunal a quo, consubstanciada na impossibilidade de os Autores se pronunciarem sobre o processo administrativo, exercer o contraditório dos documentos e ainda de ampliar a causa a novos vícios, sendo caso disso, reconduz-se à omissão de um acto exigido por lei, por um lado e, por outro, porque aquilo que os Requerentes ainda viessem a dizer poderia ser susceptível de influir no exame ou decisão da causa, o que constitui nulidade processual, nos termos e para os efeitos do disposto no art.° 195° n.° 1 do Código de Processo Civil;
A arguição de nulidade decorrente da violação do princípio do contraditório constitui nulidade, impugnável por meio de recurso;
A conceção ampla do princípio do contraditório é já há muito defendida pelo Professor Lebre de Freitas [in, Freitas, Lebre de (1992) Inconstitucionalidades do Código de Processo Civil”, em Revista da Ordem dos Advogados, 1992, I, pp. 35 a 38]; para o processo civil, traduz um direito à fiscalização recíproca ao longo do processo visto como uma “garantia da participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, em termos de, em plena igualdade, poderem influenciar todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação, direta ou indireta, com o objeto da causa e em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão”[ in, Freitas, José Lebre de; Redinha, João; Pinto, Rui (1999), Código de Processo Civil (anotado), vol. I, Coimbra: Coimbra Editora, pág. 8];
Esta vertente do contraditório revela grandes potencialidades práticas em termos de cooperação, de lealdade recíproca dos vários intervenientes processuais e de eficácia das decisões judiciais que passam, sempre, a ser previstas pelas partes;
E, na medida em que garante a igualdade das partes - pela possibilidade de pronúncia e resposta - leva a que, mais fácil e frequentemente, se obtenha a verdade material e que a solução do litígio seja a mais adequada e justa, logrando-se atingir num maior número de casos a realização dos verdadeiros objetivos finais de que o processo é um mero instrumento para alcançar;
Como ensina o referido professor Lebre de Freitas, o princípio do contraditório materializa-se em todas as fases do processo - quer ao nível dos factos, quer ao da prova, quer ao do direito propriamente dito - tendo as partes, em todos estes níveis, direito a, de modo participante e ativo, influenciar a decisão, tentando convencer, em cada momento e ao longo de todo o processo, o julgador do acerto da sua posição;
Ao nível do direito, o princípio do contraditório impõe que, antes de ser proferida a decisão final, seja facultada às partes a discussão de todos os fundamentos de direito em que ela vá assentar, sendo aquele princípio o instrumento destinado a evitar as decisões surpresa;
Assim, com o nº 3, do art. 3º do CPC, pretendeu-se uma maior eficácia do sistema, colocando, com maior ênfase e utilidade prática, a contraditoriedade ao serviço da boa administração da justiça, reforçando-se, assim, a colaboração e o contributo das partes com vista à melhor satisfação dos seus próprios interesses e à justa composição dos litígios;
A citada norma, introduzida pela Reforma de 1995/1996, veio ampliar o âmbito tradicional do princípio do contraditório, consagrando mais uma garantia de discussão dialética entre as partes no desenvolvimento de todo o processo, consagrando de forma ampla o direito a exprimir posição para influenciar a decisão;
Nenhuma decisão deve, pois, ser tomada sem que previamente tenha sido dada efetiva possibilidade ao sujeito processual contra quem é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar, possibilitando-se-lhe, assim, influir ativamente na decisão. A imposição de audição das partes em momento anterior à decisão é determinada por um objetivo concreto - o de permitir às partes intervirem ativamente na construção da decisão, chamando-as a trazerem aos autos a solução para que apontam;
O exercício do contraditório é, sempre, justificável e desejável se puder gerar o efeito que com ele se pretende - permitir que a pronúncia das partes possa influenciar a decisão do Tribunal;
Na estruturação de um processo justo o tribunal deve prevenir e, na medida do possível, obviar a que os pleiteantes sejam surpreendidos com decisões para as quais as suas exposições, factuais e jurídicas, não foram tomadas em consideração;
Em obediência ao princípio do contraditório e salvo em casos de manifesta desnecessidade devidamente justificada, o juiz não deve proferir nenhuma decisão, ainda que interlocutória, sobre qualquer questão, processual ou substantiva, de facto ou de direito, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que previamente tenha sido conferida às partes, especialmente àquela contra quem é ela dirigida, a efetiva possibilidade de a discutir, contestar e valorar;
Tal solução legal confere ao juiz possibilidade de uma maior ponderação e contribui para uma maior eficácia e satisfação das partes ao verem, com o seu contributo, mais rapidamente resolvidos os seus interesses em litígio;
A falta de cumprimento do contraditório (inserto no art.° 3°/3 do CPC) reconduz-se, pois, à omissão de um acto exigido por lei, por um lado e, por outro, porque aquilo que ainda viesse a ser dito poderia ser susceptível de influir no exame ou decisão da causa, o que, repete-se, constitui nulidade processual, nos termos e para os efeitos do estatuído no art.° 195°/1 do CPC;
O escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de incidir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo;
Como se sumariou no Acórdão do STA de 13/11/2007, proc. 0679/07
I-O princípio do contraditório é um dos direitos fundamentais das partes no desenvolvimento do processo já que, garantindo-lhes a possibilidade de intervir em todos os seus actos, permite-lhes defender os seus interesses e influenciar a decisão do Tribunal.
II-E, porque assim, tal princípio só pode ser postergado nos casos de manifesta desnecessidade ou nos casos em que o seu cumprimento poderia pôr em causa, injustificadamente, os direitos de uma das partes ou poderia comprometer seriamente a finalidade que determinou a instauração do processo.
III-O cumprimento do princípio do contraditório é essencial na marcha do processo e que, por isso, a sua violação constitui nulidade uma vez que pode influir no exame ou na decisão da causa a qual, por via de regra, determinará a nulidade de todo o processado que lhe é posterior. - nºs 1 e 2 do art. 201º do CPC;
Este princípio, conforme alegado, foi aqui postergado;
Procedem as Conclusões dos Apelantes, tornando-se despicienda a análise das demais questões invocadas.
DECISÃO
Termos em se concede provimento ao recurso, anula-se a sentença e determina-se que, baixando o processo ao TAF a quo, seja dado integral cumprimento ao princípio do contraditório, seguindo-se os ulteriores passos processuais, caso a tal nada obste.
Custas pela Entidade Recorrida.
Notifique e DN.
Porto, 04/7/2025
Fernanda Brandão
Paulo Ferreira de Magalhães
Isabel Jovita |