Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00039/15.1BEPRT |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 04/10/2025 |
| Tribunal: | TAF do Porto |
| Relator: | ROSÁRIO PAIS |
| Descritores: | OPOSIÇÃO; REVERSÃO; CULPA, PROVA; |
| Sumário: | ~ I – Deve ser rejeitado o recurso quanto à matéria de facto quando, embora identificando os depoimentos relevantes e os exatos excertos da gravação a ter em conta, o Recorrente não especifica os concretos factos simples que decorrem de tal prova e devem ser aditados os probatório.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. «AA», devidamente identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida em 07.10.2020 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada a parcialmente procedente a oposição que deduziu à execução fiscal nº ...95, que o Serviço de Finanças ... lhe moveu por reversão de dividas de IVA dos períodos de 2012/12T, 2013/03T e 2013/06T, IRC do ano de 2012, juros e legais acréscimos, no montante de global de €14.754,87, originariamente instaurada contra “[SCom01...], Lda.”. 1.2. O Recorrente terminou as suas alegações formulando as seguintes conclusões: «1) Deve ser dado como provado atenta a factualidade constante dos autos e a prova testemunhal produzida em sede de julgamento que o Oponente não teve culpa pela falta de pagamento das dívidas fiscais da Sociedade; 2) Não se verifica um dos requisitos para que seja operada a reversão das dívidas, ou seja, não se provou que tenha sido por culpa do Oponente que o património da sociedade se tornou insuficiente para pagar as dívidas fiscais; 3) O património da sociedade tornou-se insuficiente derivado da crise económica que o nosso país atravessou entre 2011 a 2013 bem como da falta de pagamento das faturas por parte da clientela e ainda uma quebra abrupta de pedidos por parte dos clientes; 4) A Sentença recorrida viola o disposto no artigo 24º da LGT. 5) Deve ser revogada a Sentença recorrida, com todas as consequências legais daí resultantes, o que, desde já e aqui se requer; Termos em que, nos melhores de direito, e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve a Sentença recorrida ser REVOGADA, por ser de: LEI, DIREITO, E JUSTIÇA». 1.2. A Recorrida Fazenda Pública não contra-alegou. 1.4. O EPGA junto deste TCAN teve vista dos autos e emitiu parecer com o seguinte teor: «1 – Nos presentes autos, o Ministério Público já teve oportunidade de se pronunciar, em primeira instância, acerca do mérito da causa ( fls. 322 e ss., digital), e fê-lo, quanto a nós, de forma clara, aprofundada e fundamentada, abrangendo todos os pontos que são objecto do litígio submetido a este tribunal , e analisando as questões essenciais que a lide suscita à luz da defesa da legalidade democrática pela qual a respectiva actuação se deve pautar, concluindo pela improcedência parcial da acção, em nosso entender com inteiro acerto - posição que veio a ser adoptada na decisão judicial objecto do recurso em apreço. 2 –Após a leitura dos autos e seus apensos, e porque nos revemos no teor do referido parecer do Ministério Público já entregue nos autos, onde muito bem se desenvolve e explicita o entendimento que perfilhamos, reafirmamos aqui essa linha de argumentação, que obteve acolhimento quase integral na decisão recorrida. 3 – Nesta conformidade, e por entendermos que o mencionado parecer do Ministério Público mantém inteira validade e actualidade, agora para a decisão do recurso interposto para este Tribunal Central Administrativo do Norte, limitamo-nos, por razões de celeridade e de economia processual, a remeter para o respectivo conteúdo e sentido, bem assim como para o teor da decisão judicial proferida nos autos, a qual é igualmente merecedora da nossa geral concordância. TERMOS EM QUE, Somos de parecer que o presente recurso não merece provimento, devendo confirmar-se a decisão recorrida.» * Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657º, nº 4, do Código de Processo Civil, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta. * 2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao não ter concluído pela inverificação do pressuposto da culpa, para efeito de reversão. 3. FUNDAMENTAÇÃO 3.1. DE FACTO 3.1.1. Factualidade assente em 1ª instância A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto: «1. A Autoridade Tributária instaurou contra a sociedade comercial “[SCom01...], Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ...44, o Processo de Execução Fiscal nº ...95 e apensos, que correm termos no Serviço de Finanças ... com vista à cobrança de créditos provenientes de coimas e encargos de processos de contraordenação, créditos de IVA dos períodos 2012/12T, 2013/03T e 2013/06T e créditos de IRC, relativos ao ano de 2012, juros e legais acréscimos, no montante global de € 14.754,87. 2. No Processo de Execução Fiscal identificado em 1, em 21/10/2013, foi lavrado o auto de diligências que consta a fls. 64 e se dá por reproduzido, do qual consta que a sociedade comercial “[SCom01...], Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ...44, não foram encontrados quaisquer bens penhoráveis ou qualquer prédio inscrito em seu nome na matriz; que se desconhece o destino dado aos bens do activo imobilizado, e que a gerência era exercida pelo Oponente e por «BB». 3. Na Conservatória ..., pela Ap. ...13, foi registado o contrato de constituição da sociedade comercial “[SCom01...] Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ...44, e nela figuram como sócios e gerentes, o Oponente e «BB», cada um deles com uma quota no valor nominal de respectivamente € 2.550,00 e € 2.450,00, conforme certidão permanente que consta a fls. 61/63. 4. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 102 do qual se extracta: “No Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, ... Juízo de Vila Nova de Gaia, no dia 02-07-2014, pelas 23,23 horas foi proferida sentença de declaração de insolvência do(s) devedor(es): [SCom01...], Lda., NIF ...44 (…)”. 5. Dão-se por reproduzidos os documentos de fls. 24 e 25 constituídos por cópia de dois cheques emitidos por «CC» no valor de € 15.000,00 e € 6.000,00. 6. No Processo de Execução Fiscal aludido em 1, em 11/7/2014, foi lavrado o “Despacho para Audição (Reversão)” constante de fls. 87, que se dá por reproduzido. 7. Em 23/9/2014, no Processo de Execução Fiscal aludido em 1, foi lavrado o despacho de reversão constante a fls. 171/176 do processo apenso que se dá por reproduzido, do qual se extracta: “Verificada e comprovada que está a inexistência de bens penhoráveis ou a fundada insuficiência do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido, suportada nos resultados obtidos nas diligências de rastreio de todas as aplicações informáticas de cadastro de bens e direitos ao dispor da DGCI (…)e averiguação externa (…) e identificadas que estão as pessoas que exercem ou exerceram funções de administração ou gerência (…) estão reunidos os pressupostos legais para a efectivação da responsabilidade tributária (…). A administração da sociedade [SCom01...] Lda., esteve a cargo de: «BB» e «AA» desde 2010-09-13”. 8. A Administração Tributária remeteu ao Oponente, sob registo postal, o ofício nº ...80/......, que consta a fls. 185, com vista à citação do Oponente na qualidade de responsável subsidiário, documento do qual se extracta: “Fundamentos da reversão: Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis, sem prejuízo do benefício da excussão prévia (art.º 23º/n.º 2 da LGT): Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo (art.º 24º/ nº 1/b) LGT). Insuficiência de bens da devedora originária (artigos 23º/1 a 3 e 7 da LGT e 153º/1/2/b do CPPT), decorrente de situação líquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em fase de insolvência declarada pelo Tribunal”. 9. O ofício referido em 8 foi devolvido com a menção “não atendeu” e remetido novamente, sob registo postal, do qual resultou a seguinte declaração, datada de 15/10/2014: “Na impossibilidade de Entrega depositei no Receptáculo Postal Domiciliário da morada indicada a CITAÇÃO a ela referente” - conforme documentos que constam a fls. 187/189. 10. A presente oposição foi apresentada em 17/11/2014. FACTOS NÃO PROVADOS Nada mais se provou com interesse para o conhecimento do mérito designadamente que muitos clientes da devedora originária não pagaram o preço devido pelos serviços prestados pela sociedade, que um trabalhador se apropriou indevidamente de parte dos pagamentos, e que a crise económica determinou a perda de clientes e a diminuição de encomendas.». 3.2. DE DIREITO O Recorrente não se conforma com a decisão do Tribunal a quo, por entender, em síntese, que se devia julgar provado que a situação de insuficiência patrimonial da devedora originária ficou a dever-se a fatores externos, concretamente, a crise económica enfrentada pelo país entre 2011 e 2013 e a falta de pagamento das faturas emitidas aos seus clientes. Vejamos, antes do mais, a fundamentação jurídica que sustenta a sentença sob escrutínio, na parte em que vem recorrida: «O Oponente alegou que a Administração Tributária não provou a culpa do Oponente pela insuficiência do património societário para pagamento dos créditos tributários, facto que não conseguiria demonstrar posto que o Oponente tudo fez para pagar aos credores. Porém, não lhe assiste razão. Como é sabido a responsabilidade subsidiária tem em vista, por um lado assegurar a cobrança coerciva da dívida tributária e, por outro responsabilizar os administradores e gerentes pela sua actuação. Para que opere a responsabilidade subsidiária é necessário que o património do devedor originário ou de eventuais responsáveis solidários seja insuficiente para garantir a cobrança da dívida, que exista uma intervenção na prática de determinados actos societários. Além disso, tem que se verificar um comportamento culposo quer quanto à imputabilidade da falta de pagamento da dívida, quer quanto à diminuição do património societário para o pagamento do imposto. (Vide José Maria Fernandes Pires, Gonçalo Bulcão, José Ramos Vidal, Maria João Meneses, “Lei Geral Tributária Comentada e Anotada”, Almedina, 2015, p. 213 e 214). Deste modo, os pressupostos da responsabilidade subsidiária por reversão são: a) insuficiência de bens no património do sujeito passivo originário; b) gerência (de facto) no período fiscalmente relevante; c) culpa pela falta de pagamento da dívida ou pela diminuição do património societário. Efectivamente, resulta do preceituado no artigo 153º do Código de Procedimento e de Processo Tributário que “o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias: a) Inexistência de bens penhoráveis de devedor e seus sucessores; b) Fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido”. E o mesmo resulta do nº 2, do artigo 23º, da Lei Geral Tributária posto que “a reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão”. Conforme resulta da factualidade assente, em 21/10/2013, foi lavrado o auto de diligências do qual consta que a sociedade devedora originária não possuía qualquer bem penhorável ou qualquer prédio inscrito em seu nome na matriz e que se desconhece o destino dado aos bens do activo imobilizado. Assim sendo, é manifesta a inexistência de património societário pelo que importa verificar se se encontram reunidos os restantes pressupostos de que depende a reversão. O Oponente não colocou em causa a sua qualidade de gerente de direito, facto comprovado pela Administração Tributária e confirmado mediante certidão da Conservatória do Registo Comercial ..., e assumiu o exercício da gerência de facto em relação à devedora originária, como decorre do auto de diligências constante dos autos, facto que também emergiu provado face à prova documental carreada para os autos, de onde resultou que o Oponente, no período em causa, exerceu a gerência de facto da sociedade, facto que aquele nem sequer colocou em causa. Na vigência do artigo 24º da Lei Geral Tributária é a gerência efectiva que releva para responsabilizar subsidiariamente quem exerceu tais funções. Os créditos em execução reportam-se a 2012 e 2013 pelo que, quanto à culpa pela falta de pagamento da dívida, quer na diminuição do património societário, quer no pagamento do imposto e respectivo ónus da prova, rege o nº 1, do artigo 24º, da Lei Geral Tributária, que determina, “os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si: a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação; b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento”. A citada alínea a) atribui à Autoridade Tributária o ónus da prova de que foi por culpa do gerente que o património se tornou insuficiente. Por sua vez, da alínea b) resulta uma presunção legal de culpa do gerente, o que significa que impende sobre este a prova de que não lhe foi imputável a falta de pagamento. Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14/2/2013, Processo nº 0642/12, “a alínea a) do nº 1 do art. 24º abrange apenas as situações em que o gerente à data da constituição das dívidas já não o era na altura em que estas deviam ter sido pagas (razão por que só responderá se tiver sido por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente para esse posterior pagamento, competindo à FP o ónus da prova dessa culpa), e que a alínea b) abrange a responsabilidade dos gerentes que exerceram o cargo à data do pagamento das dívidas, independentemente de o terem exercido ou não no período da constituição da dívida (razão por que lhe caberá provar que não lhe é imputável essa falta de pagamento).”. No caso “sub judice” os créditos em execução reportam-se aos exercícios de 2012 e 2013 sendo que o Oponente assumiu a gestão da sociedade devedora originária desde a sua constituição e portanto exerceu o cargo de gerente aquando do facto constitutivo da dívida e também quando terminou o prazo para pagamento voluntário. Assim sendo, assente que a dívida se venceu e devia ter sido paga no período de vigência da gerência do Oponente aplica-se a alínea b) do nº 1 do artigo 24º da Lei Geral Tributária, que como se afirmou, alude à data do pagamento da dívida independentemente do exercício do cargo no período da constituição da dívida. Consequentemente, impende sobre o Oponente o ónus da prova de que a falta de pagamento das quantias ora em execução não lhe pode ser imputada, designadamente que a não satisfação dos créditos fiscais decorrente da insuficiência do património da sociedade comercial não lhe pode ser assacada. A culpa que aqui releva afere-se pela diligência do “bom pai de família”, perante as especificidades do caso concreto. Nessa medida e levando em linha de conta a teoria da causalidade adequada, consagrada pelo nosso ordenamento jurídico, logo se infere que, em face da presunção da lei de que a actuação do revertido, enquanto gerente, trouxe, como resultado ou consequência normal, a insuficiência patrimonial da sociedade executada. Nos termos referidos no preceito legal, o demandado em tal qualidade, para se eximir a tal obrigação, teria de demonstrar que ou não exerceu a gerência de facto no lapso de tempo relevante e/ou que a sua conduta, enquanto gerente, não se mostra adequada àquela insuficiência patrimonial (Acórdão do TCAS, de 7/12/2004, Processo nº 53/03). O Oponente limitou a alegar que fez tudo o que estava ao seu alcance para pagar aos credores (alegação conclusiva que importava concretizar), que muitos clientes da devedora originária não pagaram o preço devido pelos serviços prestados pela sociedade (alegação genérica que impunha a identificação dos concretos clientes e montantes não pagos), que um trabalhador se apropriou indevidamente de parte dos pagamentos (sendo imprescindível a identificação do trabalhador e especificação dos montantes em causa), e que a crise económica determinou a perda de clientes e a diminuição de encomendas. Todavia, o Oponente limitou-se a juntar cópia de dois cheques de um terceiro que alegadamente comprovam empréstimos obtidos pelo Oponente junto de familiares, mas não comprovou que tais montantes foram aplicados na sociedade, que a ser assim teriam de constar da conta de suprimentos, nem que não se tratou de pagamentos devidos a outro título, inclusivamente para saldar dívidas particulares. Deste modo, afigura-se que a prova produzida é insuficiente para demonstrar que a falta de pagamento não se deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis por parte do Oponente. Como ensina o Acórdão do TCAN de 5/3/2020, no Processo nº 00749/11.2BEPNF “(…) não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente. Haverá, isso sim, que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor”. E como decidido no Acórdão do TCAS de 14/1/2003, Processo nº 6628/02, relatado pelo Exmo. Sr. Conselheiro Francisco Rothes, “Se na oposição que deduziu contra a execução que reverteu contra o gerente da sociedade originária devedora, na qualidade de responsável subsidiário pela dívida exequenda, este se limita a alegar, de forma genérica e pouco concretizada, diversas situações que, na sua perspectiva, demonstram que não teve culpa pela insuficiência patrimonial da sociedade, ao invés de alegar factos concretos de que possa concluir-se que a sua actuação como representante da sociedade respeitou as disposições legais e contratuais destinadas à protecção dos credores ou que a insuficiência do património social para o pagamento dos credores não resulta do incumprimento dessas disposições, não pode considerar-se que consiga ilidir a presunção de culpa que sobre ele recai. Seja como for, não permitindo a prova produzida dar como assente que a situação da sociedade teve origem exclusivamente em factores exógenos, designadamente na crise do sector em que a mesma se inseria e na falta de pagamento pelos clientes da mercadoria vendida, que, face a essa crise, o gerente tenha adoptado medidas de gestão ajustadas e, em todo o caso, demonstrado que ficou que o gerente não apresentou a sociedade em tempo útil à falência ou a processo de recuperação de empresas, por forma a possibilitar aos credores cobrarem os seus créditos à custa do património social, é de considerar que o gerente não conseguiu ilidir a presunção de culpa que sobre ele impendia.”. Como referido supra, e resulta das decisões transcritas, a prova é particularmente exigente e não basta demonstrar que existiu um comportamento diligente por parte do gestor, é ainda necessário demonstrar que a falta de pagamento não se deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis. Assim sendo, os elementos carreados para o processo não são suficientes para ilidir a presunção que impende sobre o Oponente de que a falta de pagamento da dívida em questão não lhe é imputável. Efectivamente, o Oponente não logrou provar a alegada quebra significativa de encomendas, a apropriação indevida de dinheiro por parte de um trabalhador, ou qualquer outro facto que alegou de forma genérica. Por outro lado, nos presentes autos está em causa o não pagamento de IVA, e assim sendo, atendendo ao mecanismo a que obedece este imposto mostra-se pouco credível que um gerente minimamente diligente não tenha dotação orçamental nos cofres da sociedade que representa para proceder à sua entrega, uma vez que o IVA cobrado não é receita própria da sociedade mas sim uma “quantia em trânsito” para ser entregue ao Estado, ou seja, trata-se de dinheiro entregue por terceiros, liquidado nas facturas emitidas, e de que o Oponente era um mero depositário, tendo obrigação de o entregar nos cofres do Estado. Deste modo, estando em causa montantes de IVA de que era mero depositário não se vê como pode inexistir culpa do gerente, ou pelo menos que a lei permita que o gerente de facto nessa situação, agindo em representação duma sociedade não tenha culpa. Consequentemente, impõe-se a responsabilização do Oponente, a título subsidiário, pelas dívidas em execução, por lhe ser imputável o seu não pagamento, e sobre ele recair a culpa pela insuficiência do património societário para satisfação das quantias em execução.». Nas sintéticas conclusões das alegações de recurso, o Recorrente sustenta que deve ser dado como provado, atenta a factualidade constante dos autos e a prova testemunhal produzida, que não teve culpa pela falta de pagamento das dívidas fiscais da sociedade e, por isso, que não está verificado um dos requisitos da reversão. Está em causa, portanto, o julgamento quanto à matéria de facto. Ora, como já é bem sabido, o recurso da decisão em matéria de facto, faz impender sobre o Recorrente a observância de formalidades que não podem ser dispensadas. Assim, de acordo com o disposto no artigo 640º, nº 1 do CPC, “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”. Como refere Abrantes Geraldes a propósito desta norma (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2018, 5ª edição, a págs.165) sempre que o recurso envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, «a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; b) Deve ainda especificar, na motivação os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão quanto a cada um dos factos; c) Relativamente a pontos da decisão da matéria de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos (…); e) O recorrente deixará expressa a decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente (…)». Esclarece ainda o mesmo autor (cfr. obra citada, pág. 168 e 169) que a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em alguma das seguintes situações: «a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 635º, nº 4, e 641º nº 2, a. b); b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640º, nº 1, al. a)); c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escritos, etc); d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda; e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação.». No caso, constatamos que, pese embora sejam identificados o meio probatório em que sustenta a sua pretensão e (no corpo das alegações) e os exatos excertos dos depoimentos gravados em que se baseia, o Recorrente não concretiza os factos, simples, que devem ser aditados ao probatório, que sustentem a conclusão da inverificação do pressuposto da culpa. Como vem sendo entendido, não é possível verter no probatório meras conclusões como, ao que tudo indica, pretende o Recorrente; por isso, era necessário que o Oponente identificasse os factos concretos que decorrem dos depoimentos prestados, evidenciadores de que teve uma gestão prudente e diligente, orientada, entre o mais, para a garantia de pagamento aos credores sociais, nomeadamente a AT. Perante a falta de concretização dos factos que, na sua ótica, resultam dos depoimentos prestados, deve ser rejeitado o recurso quanto à matéria de facto. Por consequência, uma vez que não se extrai do probatório qualquer facto evidenciador de que o Recorrente teve uma gestão diligente, de que tomou medidas para evitar o colapso financeiro da sociedade e, bem assim, para pagar as dívidas exequendas, mais não resta do que confirmar a sentença recorrida, com os fundamentos jurídicos dela constantes, que se afiguram essencialmente corretos. * Assim, preparando a decisão, formulamos a seguinte conclusão: I – Deve ser rejeitado o recurso quanto à matéria de facto quando, embora identificando os depoimentos relevantes e os exatos excertos da gravação a ter em conta, o Recorrente não especifica os concretos factos simples que decorrem de tal prova e devem ser aditados os probatório. 4. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença, na parte em que vem recorrida. Custas a cargo do Recorrente, nos termos do artigo 527º, nº 1 e 2 do CPC, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido. Porto, 10 de abril de 2025 Maria do Rosário Pais – Relatora Vitor Unas – 1º Adjunto Cláudia Almeida – 2ª Adjunta |