Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01045/21.2BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/24/2025
Tribunal:TAF de Braga
Relator:MARIA FERNANDA ANTUNES APARÍCIO DUARTE BRANDÃO
Descritores:HOSPITAL; PROCEDIMENTO CONCURSAL COMUM PARA A CATEGORIA DE TÉCNICO SUPERIOR DAS ÁREAS DE DIAGNÓSTICO E TERAPÊUTICA ESPECIALISTA
ANÁLISES CLÍNICAS E DE SAÚDE PÚBLICA - CARDIOPNEUMOLOGIA - RADIOLOGIA;
IRREGULARIDADES NO PROCEDIMENTO CONCURSAL;VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE;
ANULAÇÃO DA GRADUAÇÃO EFETUADA PELO JÚRI E A CONSEQUENTE CONTRATAÇÃO DO CONTRAINTERESSADO;
CONDENAÇÃO DA ENTIDADE DEMANDADA A EXCLUIR DO CONCURSO O CONTRAINTERESSADO E A NOMEAR A AUTORA PARA O CARGO EM CAUSA;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte -Subsecção Social-:

RELATÓRIO
«AA» propôs AÇÃO ADMINISTRATIVA contra o HOSPITAL 1..., EPE, indicando como contrainteressado «BB», todos melhor identificados nos autos.
Formulou o seguinte pedido (corrigido):
TERMOS EM QUE, deverá a presente ação ser julgada totalmente procedente por provada, e consequentemente, excluído o primeiro classificado no procedimento concursal aberto pelo aviso (extrato) n.° 20833/2020 - Despacho n.° 9656/2020, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.° 195, de 7 de outubro, para abertura de Procedimento Concursal Comum para a categoria de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica especialista - Análises Clínicas e de Saúde Pública - Cardiopneumologia - Radiologia, por irregularidades no procedimento concursal relativamente à sua candidatura, sendo a demandada condenada a admitir para o cargo de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica especialista - Análises Clínicas e de Saúde Pública - Cardiopneumologia - Radiologia a demandante na posição de candidata aprovada imediatamente a seguir.
Por decisão proferida pelo TAF de Braga foi julgada procedente a ação e:
- anulada a graduação efetuada pelo júri e a consequente contratação do Contrainteressado;
- condenada a Entidade Demandada a excluir do concurso o Contrainteressado e a nomear a Autora para o cargo em causa.
Desta vem interposto recurso pelo Contrainteressado.
Alegando, formulou as seguintes conclusões:

PRIMEIRA: A questão a decidir nos presentes autos consiste em saber se no procedimento concursal de recrutamento encetado pelo HOSPITAL 1..., E.P.E., tendente à mudança de categoria de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica (TSDT) para a categoria de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica especialista (TSDT especialista) para preenchimento de 1 (um) posto de trabalho para a categoria de TSDT Especialista da área profissional de Análises Clínicas e de Saúde Pública, 1 (um) posto de trabalho para a categoria TSDT Especialista da área profissional de Cardiopneumologia e 1 (um) posto de trabalho para a categoria TSDT da área profissional de Radiologia, foram cumpridos, de facto, respeitados todos os trâmites legais e os princípios especialmente aplicáveis à atividade da Administração Pública.

SEGUNDA: Sendo que, na douta Sentença recorrida, o Tribunal de P Instância concedeu, parcialmente, assistir razão à ora Recorrida, quanto à questão de saber se o facto de o júri ter possibilitado a três candidatos, entre os quais o Recorrente, a apresentação de documentos que não constaram ab inicio da sua candidatura e, quanto aos trâmites inerentes à nomeação daquele júri, saber se se verificou o cumprimento do princípio da imparcialidade ou da neutralidade do júri.

TERCEIRA: Por um lado, uma vez que o aviso de abertura do procedimento não exigia a apresentação da evidência de avaliação de desempenho positivo, não poderia o Recorrente (nem qualquer um dos restantes candidatos em situação semelhante) considerar que a falta de apresentação do referido documento cominaria com a penalização automática da exclusão da sua candidatura, pois que não resultava clara essa exigência no aviso de abertura, nem tão-pouco essa causa de exclusão resultaria da aplicação da legislação aplicável.

QUARTA: Caso resultasse numa automática exclusão das candidaturas, seria vertida no procedimento a prática de um ato do júri violador do princípio da proporcionalidade, pelo que, no espírito dos princípios da proporcionalidade, da boa-fé e da proteção da confiança, entende-se ser de admitir o pedido e o respetivo suprimento da irregularidade das candidaturas como juridicamente válidos.

QUINTA: Ainda que não assim não se entendesse, tratando-se o comprovativo de avaliação de desempenho de documento constante dos registos da entidade empregadora demandada, o júri poderia recorrer-se do expediente previsto no n° 2 do art. 115° do CPA, em conjugação com o disposto no n.° 4 do art. 21° da Portaria n.° 154/2020, de 23 de junho, sem prejuízo para o procedimento.

SEXTA: Por outro lado, ao apelar à violação do princípio da imparcialidade do júri, por meio da causa de suspeição prevista na alínea d), do n°1 do art. 73° do CPA, a Recorrida havia de evidenciar, como resulta da análise jurisprudencial, que da relação profissional entre os membros do júri e o Recorrente, resultariam «indícios suficientes que permitam concluir com razoabilidade duvidar seriamente da imparcialidade dos membros do júri», que determinassem haver «grande intimidade» entre o titular do órgão e a pessoa com interesse direto no procedimento, ie., o Recorrido.

SÉTIMA: Evidência e fundamentação essas que não é possível extrair nem da p.i, nem da douta Sentença recorrida.

OITAVA: E, por último, não tendo o Recorrido participado no ato decisório de definição e nomeação do júri do procedimento concursal, não se vislumbra a existência de quaisquer conflitos de interesses ou causa de suspeição que trouxessem ilegalidade ao procedimento.

DÉCIMA QUARTA: Pelo que, considerando inexistir qualquer violação da legislação ou dos princípios especialmente aplicáveis em resultado da atuação do júri, do contrainteressado - aqui Recorrente - e da entidade empregadora demandada, espera-se, por ser da mais elementar justiça, que seja revogada a Sentença recorrida, permitindo ao Recorrente assumir as funções inerentes ao cargo em causa, em obediência á graduação efetuada no procedimento concursal de recrutamento.

TERMOS EM QUE, PELOS MOTIVOS E RAZÕES ALEGADOS, DEVERÁ O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, ALTERANDO A DECISÃO RECORRIDA NOS TERMOS PUGNADOS NAS PRESENTES ALEGAÇÕES,

ASSIM FAZENDO A ACOSTUMADA JUSTIÇA

A Autora juntou contra-alegações, concluindo:

a. O recorrente, que em primeira instância assume a qualidade de contrainteressado, veio colocar em crise a sentença do tribunal “a quo”, centrando-se na temática da exclusão do recorrente do concurso público e da sua intervenção na nomeação do júri para esse mesmo concurso.

b. Sucede que, o recorrente não cumpriu, tempestivamente, a obrigação de prova do cumprimento dos requisitos de admissão,

c. Nomeadamente o recorrente não instruiu a sua candidatura com prova da sua experiência, e avaliação de desempenho positivo,

d. Os quais, em regime cumulativo, configuram requisitos de admissão.

e. Ao não instruir a sua candidatura com provas do cumprimento dos requisitos de admissão, a candidatura do recorrente teria de ser imediatamente excluída nos termos do ponto12.a, do aviso de abertura do procedimento concursal e da alínea a) do n.º 6 do artigo 21.º da Portaria 154/2020 de 23 de junho.

f. Resultou provado nos autos [pontos 4., e 5., da matéria de factos dada como provada, e não objeto de pedido de alteração] assente em documentos não impugnados, que o recorrente foi simultaneamente concorrente e participante na escolha dos elementos do júri, tendo participado nas reuniões preparatórias do próprio procedimento e na designação do júri,

g. O que viola o princípio da imparcialidade previsto no artigo 9.º do CPA, que alberga não só uma garantia de isenção objetiva, mas também de isenção subjetiva assente na confiança da existência de tal isenção, imparcialidade.

h. Quando o recorrente trabalha direta e ativamente na preparação do procedimento, definido os critérios de avaliação, e na determinação do júri, apresentando-se posteriormente nesse mesmo procedimento como candidato, essa pluralidade de intervenções impossibilita a verificação do princípio da imparcialidade ou na neutralidade do júri, o que determina igualmente fundamento para a exclusão do recorrente do procedimento concursal.

i. A douta sentença procedeu à correta interpretação e aplicação das normas jurídicas, não merecendo qualquer censura devendo o recurso ser julgado totalmente improcedente.

TERMOS EM QUE, em função de tudo o quanto vertido nas presentes contra-alegações, não assiste fundamento ao recurso apresentado pelo recorrido, DEVENDO O RECURSO SER JULGADO TOTALMENTE IMPROCEDENTE, mantendo-se todos os termos da sentença proferida.

A Senhora Procuradora Geral Adjunta notificada, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:

1) A autora chama-se «AA»;

Doc. 8 junto com a p.i.
2) A 19.03.2020 o foi nomeado como técnico superior de diagnóstico e terapêutica;
Doc. 9 junto com a p.i.
3) O contrainteressado era secretário do Conselho Técnico de Diagnóstico e Terapêutica do HOSPITAL 1..., EPE;
Doc. 10 junto com a p.i.
4) O contrainteressado esteve presente nas reuniões preparatórias do procedimento concursal referido em 7);
Docs. junto a fls. 759, 765,795
5) O contrainteressado participou na escolha dos elementos do júri no âmbito do concurso referido em 7);
Docs. juntos a fls. 725
6) A 09.12.2020 o júri do procedimento estabeleceu a calendarização do procedimento e definiu e fixou os parâmetros de avaliação, sua ponderação, grelha classificativa e sistema de valoração;
Doc. 3 junto com a p.i.
7) Através do Aviso (extrato) n.° 20833/2020, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.° 249, de 24.12.2020, foi publicitado a abertura de Procedimento Concursal Comum para a categoria de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica especialista - Análises Clínicas e de Saúde Pública - Cardiopneumologia - Radiologia no HOSPITAL 1..., EPE;
Doc. 1 junto com a p.i.
8) Previa-se entre o mais o seguinte no procedimento em causa:
Doc. 2 junto com a p.i.
(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(…)
(…)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
9) A autora e o contrainteressado apresentaram candidatura ao procedimento concursal referido;
Doc. 4 junto com a p.i.
10) A 22.01.2021 o júri reuniu para apreciação da admissibilidade das candidaturas, tendo deliberado, entre o mais, o seguinte:
Doc. 4 junto com a p.i. - ata n.º 2
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
11) A 05.02.2021 o júri reuniu para apreciar a documentação entregue na sequência do convite referido supra, a qual foi aceite, tendo sido aceites as respetivas candidaturas, tendo sido também agendadas a defesa das provas;
Ata n.º 3 junta no P.A., não numerado
12) A 17.02.2021 o júri aprovou a seguinte avaliação dos candidatos:
Doc. 5 junto com a p.i.
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

13) Tendo sido aprovada a seguinte ordenação:
Doc. 5 junto com a p.i.
14) Da ata n.º 4, relativa à avaliação e graduação referidas nos postos anteriores, consta que a «reunião teve como objetivo a aplicação do previsto no ponto 4 do artigo 8e da Portaria n- 154/2000, de 23 de junho, na sequência da aplicação do definido nos pontos 1 e 2 do mesmo artigo, tendo as provas decorrido nos dias 22,23,24 e 25 de fevereiro de 2021»;
Doc. 5 junto com a p.i.
15) A lista de graduação foi homologada por despacho do Presidente do Conselho de Administração de 15.04.2021;
P.A., não numerado
16) A 05.04.2021 a autora apresentou recurso hierárquico;
Doc. 6 junto com a p.i.
17) Ao qual foi negado provimento.
Doc. 7 junto com a p.i.
DE DIREITO
É pelas conclusões do recurso que se delimita o conhecimento do mesmo.
Assim,
O Tribunal a quo proferiu sentença julgando procedente a ação, anulando a graduação efetuada pelo júri e a consequente contratação do Contrainteressado e condenando a Entidade Demandada a excluir do concurso o Contrainteressado e a nomear a Autora para o cargo em causa.
O Recorrente coloca em crise tal sentença, focando-se na temática da sua exclusão do concurso público e da sua intervenção na nomeação do júri para esse mesmo concurso, defendendo quanto ao primeiro argumento, a não obrigatoriedade de entrega do documento de evidência de avaliação de desempenho positivo, e sem prejuízo da 1.º tese, a possibilidade de o mesmo ser junto ao concurso posteriormente a título de suprimento de irregularidades, e, quanto ao segundo, ser a designação do júri uma competência do Conselho de Administração, e que qualquer sugestão de nomes para júri por parte do Recorrente, seria isso mesmo, uma sugestão.
Cremos que carece de razão.
Vejamos,
A Autora, aqui recorrente, instaurou ação administrativa visando o procedimento concursal aberto pelo aviso (extrato) n.° 20833/2020 - Despacho n.° 9656/2020, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.° 195, de 7 de outubro, para abertura de Procedimento Concursal Comum para a categoria de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica especialista - Análises Clínicas e de Saúde Pública - Cardiopneumologia - Radiologia, apontando irregularidades no procedimento concursal,
Por essa razão, impugnou a graduação final do procedimento concursal.
Como se viu, proferida sentença, esta determinou a anulação da graduação efetuada pelo júri, mais condenando a Entidade Demandada a excluir do concurso o Contrainteressado e a nomear a Autora para o cargo em causa.
Temos para nós que decidiu com acerto.
Com efeito, contrariamente ao referido pelo Apelante, não foi cumprido por este, tempestivamente, a prova do cumprimento dos requisitos de admissão. Não sendo correcto que o Aviso de Abertura do Procedimento não era esclarecedor.
Nos pontos 3., e 4., do referido aviso, estão contidos o “Âmbito de recrutamento” e “Requisitos de Admissão”. Em especial, no ponto 4., “Requisitos de Admissão” pode ler-se,
“4- Requisitos de admissão:
4.1 - Podem candidatar-se ao procedimento concursal comum, aberto pelo
presente aviso, os TSDT, que integram a carreira especial « » e, os TSDT, providos na categoria de Técnico Superior de Diagnóstico e Terapêutica no âmbito da área de Radiologia com pelo menos seis anos de experiência efetiva em funções na categoria de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica e com avaliação que consubstancie desempenho positivo”, sendo naturalmente compreensível que, para a admissão ao procedimento concursal era exigido aos candidatos prova da sua experiência, e a avaliação de desempenho positivo.
A utilização da terminação “e” veio conferir um papel de complemento, um requisito cumulativo.
De modo que, e ao contrário do que o Recorrente alega, o documento comprovativo da experiência de 6 anos com avaliação que consubstancie desempenho positivo, tinha como função a prova do cumprimento dos requisitos mínimos de admissão.
Por sua vez, nesse mesmo aviso, no ponto 12., consta,
“12 - A não apresentação dos documentos comprovativos da reunião dos requisitos legalmente exigidos determina:
a) A exclusão do candidato do procedimento, quando a falta desses documentos impossibilite a sua admissão ou avaliação.
Exigências, determinações e consequência total e integralmente prevista no artigo 20.°, n.° 1, alíneas d) e i) (o qual remete para a artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 111/2017, de 31 de agosto), e artigo 21.°, n.° 6, alínea a), da Portaria n.° 154/2020 de 23 de junho, que regulamenta os requisitos e a tramitação do procedimento concursal de recrutamento para os postos de trabalho no âmbito da carreira especial de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica.
Assim, e de acordo com os factos provados, concretamente o facto n.° 10, o Recorrente não instruiu a sua candidatura ao procedimento concursal, com provas de cumprimento de avaliação de desempenho positivo, quanto aos 6 anos de experiência efetiva exigida. Por essa razão, impediu o júri de avaliar a admissão da sua candidatura (porque este facto era um requisito de admissão).
Logo, como era determinado no ponto 12.a, do aviso, da alínea a) do n.° 6 do artigo 21.° da Portaria 154/2020 de 23 de junho, e como bem foi decidido pelo Tribunal a quo, a candidatura do Recorrente teria de ter sido excluída.
Do exposto decorre que a sentença não merece reparo.
Por outro lado, resulta dos documentos juntos aos autos, que não foram objeto de impugnação, a participação ativa do Recorrente nas reuniões preparatórias do procedimento concursal, e a sua participação ativa na escolha dos elementos constitutivos do júri, figurando o Recorrente neste procedimento concursal, simultaneamente como concorrente no procedimento, e preparador, organizador do mesmo, como resulta dos pontos 4., e 5., da matéria de facto tida por assente. Situação que se afigura bizarra e violadora do princípio da imparcialidade.
Com efeito, os membros do Júri devem estar numa posição alheia aos interesses dos concorrentes, orientando-se, apenas, pela prossecução do interesse público.
E, no caso concreto, em prol dos contornos referidos, não se mostra assegurada a igualdade de oportunidades entre todos os candidatos, o que inquina o processo, por não se mostrar assegurado o princípio da transparência concursal, que constitui uma garantia da imparcialidade da Administração.
Como é elementar, à Administração não basta ser imparcial; exige-se também que pareça imparcial.
No caso, um tão estreito relacionamento profissional e de relacionamento entre candidato e membros de júri, suscita, de facto, num homem normal, no espírito do bonus pater famílias, sérias dúvidas no que tange à imparcialidade.
Como apontado pela Recorrida, a simples presunção de parcialidade é suficiente para impedir que o Júri fosse constituído com estes dois elementos, pelo que se verifica a violação do art.° 5°, n.° 2, alínea a), do DL 204/98, de 11 de julho.
Dispõe este preceito - art° 5°, n° 1 - que: “O concurso obedece aos princípios de liberdade de candidatura, de igualdade, de condição e de igualdade de oportunidades para todos os candidatos”.
Por seu turno, o n° 2, alínea a), refere que: “Para respeito dos princípios referidos no número anterior, são garantidos (...) a neutralidade da composição do júri”.
Esta norma, ao consagrar o princípio da neutralidade do júri, radica em especial, no princípio da imparcialidade administrativa, consagrado no n° 2, do art° 266° da CRP, e tem por objetivo garantir que o júri assuma um comportamento isento, equidistante relativamente a cada um dos candidatos, ou seja, pretende-se garantir, no fundo, a idoneidade do concurso.
Logo, a sentença procedeu à correta interpretação e aplicação das normas jurídicas, pelo que não merece censura.
Em suma,
Temos por bem decidido que há factos concretos que fundamentam o pedido da Autora e que justificam a demonstração dos pressupostos processuais da ação;
Como é sabido, a violação do princípio da imparcialidade consuma-se com a mera ameaça ou risco da quebra do dever de imparcialidade por parte da Administração;
A violação do princípio da imparcialidade ocorre sempre que sejam levados a cabo procedimentos que contenham o risco de consubstanciarem atuações parciais, independentemente da demonstração efetiva de ter ocorrido uma atuação destinada a favorecer algum dos interessados a concurso, com prejuízo de outros;
O princípio da imparcialidade impunha à Entidade Demandada, na sua relação com os particulares e, em especial, com o Recorrente, a adoção de um comportamento imparcial e isento, de modo a garantir a neutralidade, independência, objetividade e equidistância necessária na ponderação dos interesses com relevo para o contexto decisório;
Como bem se lê na fundamentação da sentença recorrida: A questão não se prende, sequer, com a concreta intervenção do contrainteressado na escolha dos membros do júri ou ma fixação dos critérios de seleção, mas com a possibilidade de tal poder ocorrer. É que de acordo com o artigo 9.° do CPA, o princípio da imparcialidade não se prende apenas com uma garantia de isenção objetiva, mas tem também uma dimensão subjetiva que se prende com a confiança na existência de isenção.
Efetivamente, o princípio da imparcialidade ou da neutralidade do júri não permitem a existência de qualquer fundamento que permita razoavelmente fazer suspeitar da isenção e retidão do funcionamento do júri - Acórdão do STA de 19.03.2003, Proc. 01225/02;
O princípio da imparcialidade é, neste conspecto, uma garantia do princípio da igualdade, na medida em que se pretende precaver a intromissão no concurso de ruído que possa colocar em causa a sua isenção;
Surge, também, como uma salvaguarda da confiança que o público tem na lisura da Administração;
Os concursos são um campo sensível para estas considerações;
Em matéria de concursos, os princípios norteadores do respetivo procedimento têm uma função essencialmente preventiva quanto à salvaguarda da isenção e imparcialidade da atuação administrativa, princípios de que a Administração se não deve afastar, constituindo o simples risco de lesão da isenção e da imparcialidade da Administração, fundamento bastante para a anulação do ato com que culminou tal procedimento - mesmo que em concreto se desconheça a efetiva violação dos interesses de algum candidato/concorrente -;
Não basta à Administração ser imparcial; é preciso também que pareça imparcial já que o que está em causa é evitar a prática de certas condutas da Administração, que possam ser tidas como susceptíveis de afectar a imagem pública de imparcialidade;
Dito de outro modo, basta que o perigo de violação do princípio da imparcialidade se verifique em abstracto, que tal dúvida possa existir, não se exigindo, a posteriori, um efectivo favorecimento ou uma concreta violação do dever de isenção por parte do agente da Administração Pública;
Para haver uma violação do princípio da imparcialidade não é necessária a prática de uma conduta efetiva de violação do mesmo, ou de atuação com vista ao favorecimento de algum candidato em concreto, bastando o risco potencial de manipulação dos resultados do concurso;
O princípio da imparcialidade está conexionado com o princípio da igualdade, exigindo aos titulares de poderes públicos que assumam uma posição isenta e equidistante em relação a todos os particulares, assegurando a igualdade de tratamento dos interesses dos cidadãos através de um critério uniforme de prossecução do interesse público, ocorrendo a sua violação quando a actuação daqueles titulares não seja ditada pela prossecução daquele interesse, mas influenciada pela intenção de favorecer ou prejudicar interesses privados;
A violação dos deveres impostos pelo princípio da imparcialidade não está, repete-se, dependente da prova de concretas actuações parciais, verificando-se sempre que um determinado procedimento faz perigar as garantias de isenção, de transparência e de imparcialidade, pois visa-se com ele evitar a prática de certas condutas que possam ser tidas como susceptíveis de afectar a imagem pública de imparcialidade - Acórdão do STA de 27/01/2010, no Proc. nº 0551/09;

In casu, o Tribunal a quo não incorreu em erro de julgamento na análise deste princípio.
Será mantida a sentença recorrida nos seus exatos termos.
Improcedem as Conclusões das alegações.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente.
Notifique e DN.

Porto, 24/01/2025

Fernanda Brandão
Rogério Martins
Isabel Jovita