Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00138/12.1BEMDL
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/06/2025
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:ANA PAULA ADÃO MARTINS
Descritores:INFARMED; INSTALAÇÃO DE FARMÁCIA; PROPRIEDADE DE FARMÁCIA;
LEI 2125 DE 20.03.1965; DECRETO-LEI Nº 48547 DE 27.08.1968;
PORTARIA Nº 806/87, DE 22.09;
Sumário:
I - À luz da Lei nº 2125, de 20.03.1965, só os farmacêuticos podem ser proprietários de farmácia e/mas nenhum deles pode ser dono de mais do que uma farmácia.

II - O evento que determina o início da contagem do prazo previsto no artigo 14.º, n.º 1 da Portaria 806/87, de 22.09, na redacção dada pela Portaria n.º 513/92, é a publicação em Diário da República do despacho que homologa a lista de classificação dos concorrentes.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - RELATÓRIO

«AA», melhor identificada nos autos, intentou acção administrativa especial contra INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P., com os demais sinais nos autos, com o seguinte pedido:
“A) Ser anulada a deliberação do Conselho Diretivo do Réu, de 22 de Dezembro de 2011, que indeferiu o requerimento da Autora para autorização de instalação da farmácia em apreço, rececionado em 19 de Julho de 2011, e
B) Ser o Réu condenado a proferir nova deliberação que defira o mesmo requerimento, com todas as decorrentes e legais consequências.”
Indicou contrainteressados, entre os quais «BB», única contestante.
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Por sentença de 18.11.2024, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela julgou a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu o Réu do pedido.
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Inconformada, a Autora interpôs recurso, concluindo assim as suas alegações:
1. Está em causa nos presentes autos um procedimento para instalação de uma farmácia no lugar e freguesia ..., em ..., Distrito ..., iniciado em 1997, há 27 anos, onde foram aprovadas três diferentes deliberações do Júri, com mapas de classificação definitiva dos concorrentes.
2. Nas duas primeiras, a ora Autora foi classificada em 2º lugar, com 5 pontos, e em primeiro lugar, com 7 pontos, ficou classificada a Dra. «BB».
3. Revogada a primeira decisão, a segunda classificação, datada de 09-09-2000, veio a ser anulada judicialmente, por sentença de 08/03/2007, transitada em Julgado em 30/04/2007, ficando, assim, anulado o concurso nos seus demais e sequentes actos, nomeadamente ficando anulada a atribuição da licença à concorrente Dra. «BB».
4. A Autora deparou-se, então, com uma continuada actuação do Réu (ou da sua máquina corporativa e burocrática) destinada a evitar que a legalidade fosse reposta, furtando-se continuadamente à obrigação de tirar as necessárias legais consequências da anulação da atribuição do alvará àquela outra concorrente, pelo que Autora teve de lançar mão de uma Acção de Execução de Sentença Anulatória de Acto administrativo, para obrigar o Réu a tomar uma decisão definitiva quanto à classificação no concurso.
5. Mas aquando da emissão de nova, e definitiva apreciação das candidaturas, que finalmente colocou, como devia, a Autora em primeiro lugar da classificação, o Réu preparou propositadamente um processo que se destinava a, como já referido, evitar cumprir a obrigação de tirar as necessárias legais consequências da anulação da atribuição, em 1999, do alvará à outra concorrente.
6. Sendo que, o único interesse que o Réu, pelo menos desde 2007, tem vindo a defender, é o seu interesse em evitar a reposição da legalidade e afastar as hipóteses de ter de proceder ao ressarcimento dos danos que a sua actuação provocou, com todo o decorrer do tempo, à Autora, deixando que a concorrente afastada detivesse e explorasse impunemente a farmácia até à presente data.
7. A sentença agora em causa analisou os fundamentos da acção separando em duas partes os vícios do acto impugnado invocados, analisando em primeiro lugar o «alegado vício de violação de lei pelo facto de o R. ter considerado, erradamente – na ótica da A. -, que o facto de a A. ser detentora de farmácia instalada obsta a que possa ser emitido alvará»
8. Considerando que à data da abertura do concurso se aplicava a Lei n.º 2125, o Decreto-Lei nº 48547, de 27 de agosto e a Portaria 806/87, sendo estes os diplomas a aplicar ao caso, a sentença constatou que, embora então fosse aplicada a Lei nº 2125, de 20.03.1965, que na Base II, nºs 1, 2 e 3 estipulava que: “A nenhum farmacêutico ou sociedade poderá ser concedido mais do que um alvará” concluiu que não se mostrava a Autora impedida de concorrer ao concurso em causa, na exata medida em que, à data da sua abertura, nenhum impedimento legal impendia sobre a mesma.
9. Mas defendeu, de seguida, de forma que se entende errada, que o facto de ter adquirido alvará para abertura de farmácia em momento posterior era um facto que relevava na fase de apreciação dos documentos previstos no artigo 14º, nº 1 da Portaria n.º 806/87, de 22.09, para efeitos de concessão do respetivo alvará.
10. E perante um entendimento corrente neste Tribunal Central Administrativo de que a concorrente, por estar classificada em primeiro lugar, poderia usar do direito de optar por esta farmácia em detrimento da que detém e lhe fora atribuída posteriormente às duas primeiras decisões neste concurso,
11. Também de forma que se entende errada, a sentença considerou que tal análise deveria ter lugar em sede de apreciação da documentação, e que impendia sobre a Autora, aquando da remessa dos documentos, a obrigação de presentar declaração declarando tal intenção, sob pena de, não o fazendo, ver denegado o direito de obter o pretendido alvará, e o procedimento concursal prosseguir nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 14º da Portaria n.º 806/87, de 22.09, interpretada extensivamente.
12. Tal entendimento foi errado porque, dando execução a todas as necessárias consequências da sentença anulatória de 2007 e da sentença que determinou os termos da execução daquela sentença, passando à fase de atribuição da farmácia, o Conselho Directivo do INFARMED não podia deixar de se referenciar, e apenas, às condições pessoais da concorrente e classificada em primeiro lugar, a ora Autora, à data da sua apresentação da candidatura e da sua admissão ao concurso.
13. E, atenta a circunstância pessoal da Autora, à data da admissão da sua candidatura, não existia fundamento legal para lhe ser recusada a atribuição da farmácia, nomeadamente por não ser proprietária de mais nenhuma. Esta é a correcta aplicação da portaria n.º 806/87.
14. E mesmo que se concluísse, por hipótese de análise, que a licença desta farmácia não podia ser concedida à Autora, por ser posteriormente detentora de outra, não podia deixar de lhe ser concedido, objectivamente, o direito de optar, podendo no momento da atribuição da farmácia em ... prescindir da farmácia em ....
15. Neste particular a interpretação e aplicação da lei propugnada pela sentença também foi incorrecta, pois, sendo as circunstâncias da candidata a ter em conta no procedimento, as que detinha à data da abertura do concurso, a apresentação dos documentos, prevista no art 14º da Portaria nº 806/87, teria de continuar a ter em conta as circunstâncias à data de 18 de Setembro de 1997 (sem prejuízo de se poder entender que os documentos mencionados nas alíneas do nº 1 do artº 14º daquela Portaria, teriam de estar actualizados, mas tendo em conta que tal decorreria do facto de os mesmos se reportarem especificamente, e apenas, às condições concretas de localização e instalação da Farmácia, e ao esclarecimento da situação profissional da concorrente, então sim, necessariamente atualizadas).
16. Tal como é incorrecto o entendimento da sentença, que criou uma exigência nova que não tem fundamento na lei, e com a qual veio erradamente a apoiar a decisão impugnada, ao determinar que a análise do facto de a Autora ter adquirido um alvará para abertura de farmácia em momento posterior relevava, ou tinha de relevar em fase de apreciação dos documentos previstos no artigo 14º, nº 1 da Portaria n.º 806/87 para efeitos de concessão do respetivo alvará, nos termos do artigo 16º (?) do mesmo diploma,
17. E ao entender que aquando da apresentação dos documentos a Autora estava obrigada a exercer o seu direito de opção por uma ou outra farmácia, e que, não o fazendo, devia ser automaticamente excluída e ultrapassada pelas concorrentes classificadas a seguir, nos termos dos nºs 2 e 3 daquele artº 15º da Portaria nº 806/87
18. Ora, a correcta aplicação das normas da segunda fase do procedimento regulado pela Portaria nº 806/87, não obrigavam à consideração, em sede de apreciação da documentação, de situações supervenientes que não tivessem alterado as condições de candidatura que a Autora detinha em 19 de Setembro de 1997, se não alterassem a sua capacidade e legitimidade de abrir e gerir a nova farmácia, e tampouco faziam impender sobre a Autora a obrigação de apresentar, previamente, uma declaração dando nota da sua intenção de optar pela nova farmácia a instalar, em detrimento da que lhe foi atribuída em 2001.
19. Apenas se a questão fosse então levantada à Autora pelo Réu, então deveria este, nomeadamente ao abrigo da alínea g) (que previa que a Direcção-Geral de Assuntos Farmacêuticos exigisse outros documentos que considerasse relevantes) notificar a Autora, indicando quais os necessários e, obrigatoriamente, justificando essa exigência.
20. Tal nunca sucedeu, e o Réu nem sequer assumiu essa situação, quedando-se por liminarmente indeferir a pretensão da Autora - aliás decisão que já se adivinhava e vinha na sequência da intenção de indeferimento, prévia e ilegalmente assumida pelo Réu.
21. A eventual apresentação de declaração de que prescindia do alvará da outra Farmácia teria de ser determinada pelo Réu, como entidade decisora, despois de verificar da viabilidade da pretensão concreta da Autora, e se entendesse que, nesse momento, o exercício da opção se impunha, fundamentando tal exigência
22. E acresce que a sentença errou na análise dos factos e na aplicação da lei, ao não verificar que tal apreciação não foi feita em sede de apreciação dos documentos previstos no artigo 14º, nº 1 da Portaria n.º 806/87, mas ainda na fase de classificação dos candidatos, e onde foi expressamente preparada a desclassificação das Autora na acta da decisão do Júri, posição que o Réu seguiu e comunicou à Autora na resposta que lhe dirigiu no ofício nº ...74, de 14-06-2011.
23. Num segundo plano, a sentença pronunciou-se sobre o «o alegado vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, pelo facto de o R. ter considerado extemporânea a apresentação do requerimento com a respetiva documentação»
24. Mas a sentença não procedeu à correcta consideração dos termos em que foi feita a publicitação do despacho que homologou a lista definitiva de classificação dos concorrentes, não atendendo a que, no caso em concreto, a publicação em Diário da República não conteve o verdadeiro despacho proferido, nomeadamente o teor das excepções de não admissibilidade da candidatura da Autora que a deliberação do Conselho Directivo do Réu assumiu, e que este transmitiu por notificação expressa por ofício de Maio de 2011 (conforme documento nº2 junto com a petição).
25. A notificação que o Réu fez à Autora, foi da lista de classificação final dos candidatos admitidos, enviada para publicação no Diário da República, mas também do teor da acta nº 6 do Júri do concurso, e ainda de que “de acordo com o nº 2 do artº 11º da Portaria nº 936-A/99, de 22 de Outubro, cabe recurso contencioso, a interpor nos termos e nos prazos definidos na lei geral”, o que era essencial para determinar os efeitos dessa notificação.
26. Assim, a sentença devia ter considerado que o pedido de informação e esclarecimento apresentado pela Autora se justificava, nos termos conjugados do direito à informação procedimental, e do estabelecido no nº 2 do artº 60º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos,
a) Pelo facto de ter ocorrido uma actuação de excepção por parte do Réu, ao comunicar a homologação da lista aprovada pelo Júri com a expressa notificação da Autora da decisão do Júri, e com expressa anexação do teor da acta da deliberação de Júri que incluia uma “decisão” sobre a impossibilidade da Autora apresentar a sua pretensão complementar de atribuição do alvará de funcionamento da farmácia.
b) Pelo facto de que cabia à Autora o direito de interpor recurso contencioso, nos termos e nos prazos definidos na lei geral,
c) Porque a notificação efectuada pelo Réu à Autora, fora feita como notificação de um acto único e completo, definitivo, que determinava a sorte da Autora no concurso em causa, dando justificada causa para o pedido de informação e esclarecimento de acordo com o estabelecido no nº 2 do artº 60º do CPTA, que a Autora apresentou, tendo em vista que da mesma notificação podia resultar a necessidade de impugnar contenciosamente a decisão;
27. Tendo esta justificação sido corroborada pelos termos da resposta que o Réu enviou à Autora, a sentença devia ter concluído que a notificação não era acompanhada do teor e dos elementos essenciais e dos fundamentos da deliberação do Conselho de Administração do INFARMED, nomeadamente não sendo esclarecido se a homologação se reportou exclusivamente à lista de classificação final dos candidatos a publicar, ou se incluiu uma homologação ou a adesão às demais e citadas “deliberações” do Júri na mesma reunião, não tendo sido enviado cópia ou extracto da acta da deliberação do Conselho Directivo do Réu. 28. Assim, a sentença errou ao não considerar que o prazo de 45 dias, referido na portaria nº 806/87, apenas se iniciou na data do recebimento pela Autora da resposta que o Réu lhe endereçou ao pedido de esclarecimento.
29. Pelo que devia ter decidido que a Autora apresentou em tempo os documentos exigidos pela referida Portaria,
30. Mais decidindo que ao considerar a apresentação dos documentos extemporânea, o acto impugnado - a deliberação do Conselho Directivo do Réu, de 22 de Dezembro de 2011, que indeferiu o requerimento da Autora para autorização de instalação da farmácia em apreço, recepcionado em 19 de Julho de 2011 – está eivado do vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, como defendido pela Autora.
31. Face ao exposto, deverá ser revogada a sentença proferida na 1ª instância, e efectuada nova sindicância do acto impugnado, concluindo pela ilicitude deste nos termos invocados, e pela sua anulação, substituindo-o por decisão que admita o requerimento da autora apresentado os termos do artº 14º da portaria nº 806/87, com todas as decorrentes e legais consequências.
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O Réu/ Recorrido Infarmed contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso, sem formular conclusões.
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Também a Contra-interessada/Recorrida «BB» contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso, sem formular conclusões.
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O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, não emitiu parecer.
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Sem vistos, mas com envio prévio do projecto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, vem o processo submetido à conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DE RECURSO

Atentas as conclusões das alegações do recurso interposto, que delimitam o seu objecto, nos termos dos arts 635º, nºs 4 e 5 e 639º, nºs 1 e 2 do CPC, ex vi art 140º, nº 3 do CPTA, as questões decidendas residem em saber se a sentença recorrida errou ao decidir que o facto de a Autora ser detentora de farmácia instalada obsta a que possa ser emitido um outro alvará e ao decidir pela extemporaneidade do requerimento apresentado com vista à autorização de instalação de farmácia.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provados os seguintes factos:
1. Através do Aviso n.º 6488/97, publicado no Diário da República (D.R.), II Série, n.º 216, de 18 de setembro de 1997, foi aberto concurso público para a instalação de nova farmácia no lugar e freguesia ..., concelho ..., Distrito ..., ao qual concorrerem, entre outros a Autora e a Contrainteressada «BB» (cfr. se extrata de fls. 1 do PA);
2. Por despacho do Presidente do Conselho Diretivo do INFARMED, de 14 de maio de 1999, foi homologada a lista de classificação final, publicada através do Aviso nº 9360/99 no D.R. de 26/05/99, 2.ª Série, n.º 122 (cfr. consulta sitaf do proc. n.º 274/11.1BEMDL e providência cautelar apensa).
3. Na lista referida no ponto que antecede, a Contrainteressada «BB» foi classificada em 1.º lugar, com 7 (sete) pontos e a aqui Autora, «AA», em 2.º lugar, com 5 (cinco) pontos (cfr. consulta sitaf do proc. n.º 274/11.1BEMDL e providência cautelar apensa);
4. O despacho identificado em 3. foi impugnado pela referida «CC», através do processo n.º 723/99, que correu termos do Tribunal Administrativo de Círculo (TAC) do Porto (cfr. consulta sitaf do proc. n.º 274/11.1BEMDL e providência cautelar apensa).
5. Por despacho de 19 de novembro de 1999 do Presidente do Conselho Diretivo do INFARMED, foi revogado o despacho impugnado, identificado em 3, e ordenada a prolação de nova deliberação sobre a classificação dos candidatos por parte do júri do concurso (cfr. consulta sitaf do proc. n.º 274/11.1BEMDL e providência cautelar apensa).
6. Através do Aviso nº 12897/2000, publicado no D.R. de 29/08/2000, 2ª Série, nº 199, foi publicada a lista de classificação final homologada por despacho de 09 de agosto de 2000, do Presidente do Conselho Diretivo do INFARMED, tendo a Autora ficado em 2.º lugar e a referida contrainteressada, em 1.º lugar (cfr. consulta sitaf do proc. n.º 274/11.1BEMDL e providência cautelar apensa).
7. A Contrainteressada procedeu à instalação da respetiva farmácia, tendo-lhe sido concedido o Alvará n.º 4371, de 09/10/2000 (cfr. consulta sitaf do proc. n.º 274/11.1BEMDL e providência cautelar apensa).
8. A farmácia da Contrainteressada abriu ao público em 16/10/2000 (cfr. acordo das partes).
9. Por sentença de 08/03/2007, proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, no âmbito do Proc. nº 985/00, foi anulado o despacho identificado em 7. (cfr. consulta sitaf do proc. n.º 274/11.1BEMDL e providência cautelar apensa).
10. A Autora requereu a execução da sentença referida no ponto anterior em 27/07/1999 (cfr. consulta sitaf do proc. n.º 274/11.1BEMDL e providência cautelar apensa).
11. Por sentença datada de 31/12/2008, foi o respetivo processo de execução da sentença julgado parcialmente procedente e, em consequência, condenado o INFARMED a retomar o procedimento concursal e a dar cumprimento à formalidade omitida – audiência prévia -, devendo posteriormente proferir novo ato de homologação da lista de classificação final, no prazo de 60 dias (cfr. consulta sitaf do proc. n.º 274/11.1BEMDL e providência cautelar apensa).
12. Por decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo Norte, de 09/10/2009, já transitada em julgado, foi confirmada a sentença do TAF do Porto referida em 11., nos termos que constam de fls. 206 a 211 do suporte físico da providência cautelar apensa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, da qual consta, designadamente, o seguinte: “Pelo exposto, e sem necessidade de outras considerações, perante a improcedência do exposto pela entidade requerida e da interessada particular no que concerne à falta de interesse na presente execução e no que diz respeito à invocação da existência de causa legítima de inexecução, julgo a presente execução parcialmente, por provada e, em consequência, condeno a entidade requerida no âmbito da retoma do procedimento em apreço, e considerando os factos acima expostos, dar cumprimento à formalidade omitida – audiência prévia – proferindo depois nova decisão sobre a matéria – homologação da lista de classificação final dos concorrentes ao concurso público para instalação de uma farmácia no lugar e freguesia ..., concelho ..., situação que deverá ocorrer no prazo de 60 dias, devendo ainda no mesmo prazo ser proferida decisão que determine o encerramento da farmácia da aqui interessada particular e anulado o respetivo alvará, salvo se no âmbito da nova decisão, a aqui interessada particular ficar novamente em primeiro lugar; caso em que a nova decisão deverá limitar-se a anular o alvará existente e a emitir o novo alvará que decorrerá de tal decisão, sendo que não se fixa qualquer sanção pecuniária compulsória para o caso de não cumprimento, dado que, a matéria constante dos autos não apresenta elementos decisivos que justifiquem tal imposição” (cfr. acórdão junto como documento n.º 1 pela A.)
13. Em 14/10/2009, o Departamento de Inspeção e Licenciamento do INFARMED elaborou uma proposta de nomeação do novo júri para a retoma do concurso público para a instalação de uma farmácia no lugar e freguesia ..., tendo essa proposta merecido a concordância do Secretário de Estado da Saúde, em 12.11.2009 (cfr. fls. 1 a 5 do PA);
14. Em 03/12/2009, o Departamento de Inspeção e Licenciamento do INFARMED elaborou uma nova proposta de nomeação do novo júri, tendo essa proposta merecido a concordância do Secretário de Estado da Saúde, em 17.12.2009 (cfr. fls. 6 a 17 do PA).
15. Em 03/02/2010, reuniu o Júri do Concurso que deliberou promover a audiência dos interessados, notificando-os da proposta de lista de classificação final (cfr. fls. 18 a 22 do PA).
16. Em 11/01/2011, o Júri reuniu para proceder à “elaboração da proposta de lista de classificação final dos candidatos admitidos” (cfr. fls. 70 a 82 do PA).
17. E nessa sequência, o júri deliberou que:
“Assim, pela conjugação e análise crítica de todos os elementos constantes do processo, e considerando, nomeadamente, o facto de em todos os documentos supra aludidos constar de forma consistente a morada da candidata no Porto, nas datas deles decorrentes, fica definitivamente afastada a força probatória do atestado de residência que instruiu a sua candidatura no sentido de que teria residido, de forma ininterrupta, no concelho ..., nos 5 (cinco) anos anteriores à data do termo do prazo de apresentação da candidatura. Em consequência, por se considerar que da prova já produzida no presente procedimento resulta cabalmente demonstrado que a candidata «BB» não residia no concelho ... no período em questão, o júri delibera, ao abrigo do disposto no art.º 104.º do Código do Procedimento Administrativo, indeferir a diligência complementar de audição de testemunhas por si requerida, porquanto, considerando que as menções relativas à residência constantes em todos aqueles documentos se deveram a declarações da própria candidata, efetuadas, inclusivamente, perante oficial público e sob a cominação da prática do crime de falsas declarações, não se vislumbra em que medida tudo quanto possa vir a ser dito por terceiros possa afastar o que foi declarado pela própria candidata.
Nestes termos, o Júri delibera não atribuir à candidata «BB» qualquer pontuação a título de residência no concelho” (cfr. fls. 70 a 82 do PA).
18. Mais deliberou que:
“face ao exposto, uma vez que de acordo com a nova decisão a candidata «BB» deixa de permanecer no 1.º lugar da lista de classificação final, deverá o INFARMED, I.P., em conformidade com o aresto proferido em sede de execução de sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (Proc. n.º 985-A/00), proferir decisão que determine o encerramento da farmácia a cuja instalação a mesma procedeu no âmbito do presente concurso, bem como a anulação do respetivo alvará” (cfr. fls. 70 a 82 do PA).
19. O júri deliberou elaborar a proposta de lista definitiva de classificação final dos candidatos e, em consequência da alteração introduzida, promover a audiência de interessados em relação à nova lista, na qual a Autora surge em 1º lugar (cfr. fls. 70 a 83 do PA).
20. Em reunião de 12.04.2011, o Júri concluiu que:
“considerando que, quer ao abrigo da Portaria n.º 806/87, de 22 de setembro, quer da Portaria n.º 936-A/99, de 22 de Outubro, a nenhum farmacêutico poderia ser atribuída mais do que uma farmácia por concurso, atendendo ao disposto no n.º 3 da Base II da Lei n.º 2125, de 20 de março de 1965, mais considerando que a candidata «AA» veio a sair vencedora de outro concurso público para atribuição de farmácia aberto ainda na vigência da legislação anterior, a consequência será a de que esta não poderá proceder à instalação da farmácia objeto do presente concurso, sob pena de violação de lei, apesar de, em termos de classificação final propriamente dita, dever permanecer em 1.º lugar, pois que uma coisa é a classificação final (e a candidata não poderá ser excluída, uma vez que à data do termo do prazo para a apresentação da candidatura preenchia os requisitos exigíveis – não era proprietária de nenhuma farmácia), e outra é o direito à efetiva instalação, este sim, posto em causa. Nestas circunstâncias, o júri delibera no sentido de que à candidata «AA» não poderá ser atribuída a farmácia objeto do presente concurso, apesar de nele dever permanecer classificada em 1.º lugar. Mais delibera que todo e qualquer candidato subsequentemente ordenado na lista de classificação a quem tenha sido concedido alvará de farmácia ao abrigo da legislação anteriormente vigente, não poderá pelas razões supra enunciadas, proceder à instalação da farmácia objeto do presente concurso” (cfr. fls. 177 a 196 do PA).
21. A referida deliberação do júri foi homologada pelo Conselho Diretivo do INFARMED em 14/04/2011 (cfr. fls. 197 do PA).
22. Em 14-04-2011, o INFARMED homologou a nova lista de classificação final do concurso para abertura de uma farmácia no Lugar ..., encerrando a farmácia da Contrainteressada «BB», sendo essa lista publicada em Diário da República, 2ª série, n.º 85, através do aviso n.º ...11, de 03-05-2011 (cfr. fls. 198 a 203 do PA).
23. Por carta data de 09/05/2011, a A. remeteu comunicação ao INFARMED, com o seguinte teor:
“(…) Notificada do envio para publicação na 2ª série do Diário da República da lista de classificação final dos candidatos admitidos a Concurso em referência, Tendo sido tal notificação acompanhada da ata n.º 6 da reunião de 12/04/2011 do Júri do Concurso, e do Aviso datado de 12 de Abril de 2011, assinado pela Snra. Presidente do Júri do concurso, para publicação da referida lista de classificação final dos candidatos, Estando no mesmo aviso aposto o carimbo com a decisão de homologação efetuada pelo Conselho de Administração, em 14/04/2011, Dado que as decisões tomadas na identificada ata do Júri do Concurso não se resumem à elaboração e aprovação da referida lista definitiva de classificação final dos candidatos admitidos, mas incluem também uma deliberação no sentido de que “à candidata «AA» não poderá ser atribuída a farmácia objeto do presente concurso, apesar de nele dever permanecer classificada em 1º lugar”, para além de outra no sentido de que “todo e qualquer candidato subsequentemente ordenado na lista de classificação a quem tenha sido concedido alvará de farmácia ao abrigo da legislação anteriormente vigente, não poderá, pelas razões supra enunciadas, proceder à instalação da farmácia objeto do presente concurso.”, Tendo em conta que estas últimas deliberações do Júri (1º) extravasam a sua competência, (2º) são contrárias ao disposto no artigo 173.º do CPTA (…) e (3º) constituem matéria inovatória relativamente à proposta inicial de decisão sobre a qual os concorrentes foram chamados a pronunciar-se em sede de audiência prévia, E, principalmente, tendo em conta que a notificação não é acompanhada do teor e dos elementos essenciais e dos fundamentos da deliberação do Conselho de Administração do INFARMED, nomeadamente não sendo esclarecido se a homologação se reportou exclusivamente à lista de classificação final dos candidatos a publicar, ou se inclui uma homologação ou a adesão às demais citadas “deliberações” do Júri na mesma reunião, não tendo sido enviado cópia ou extrato da ata da deliberação do Conselho, Vem, nos termos conjugados do direito à informação procedimental, e do estabelecido no n.º 2 do artigo 60.º do CPTA (pois a notificação não contém os elementos e os fundamentos da deliberação do Conselho de Administração) requerer o seguinte: - Que lhe seja esclarecido se a Deliberação do Conselho de Administração do INFARMED, nomeadamente se reportou exclusivamente à lista de classificação final dos candidatos a publicar, ou se incluiu uma homologação ou a adesão das demais citadas “deliberações” do Júri na mesma reunião, no sentido de que “à candidata «AA» não poderá ser atribuída a farmácia objeto do presente concurso, apesar de nele dever permanecer classificada em 1º lugar”, e no sentido de que “todo e qualquer candidato subsequentemente ordenado na lista de classificação a quem tenha sido concedido alvará de farmácia ao abrigo da legislação anteriormente vigente, não poderá, pelas razões supra enunciadas, proceder à instalação da farmácia objeto do presente concurso.”, e - Que lhe seja facultada cópia ou extrato certificado da ata da deliberação do Conselho de Administração, Tudo tendo em vista a possibilidade de eventual exercício dos legais direitos de impugnação das decisões em causa.” (cfr. fls. 220 a 222 do PA.)
24. Por comunicação de 14/06/2011, o R. remeteu comunicação à A., em resposta ao aludido em 23., com o seguinte teor:
“(…) cumpre informar que a deliberação do Conselho Diretivo do INFARMED, I.P., datada de 2014.04.14, se cingiu, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 11.º da Portaria n.º 936-A/99, de 22 de outubro, à homologação da lista de classificação final dos candidatos admitidos ao presente concurso.
Quanto à deliberação do Júri, no sentido de que a farmácia objeto do presente concurso não lhe poderá ser atribuída, pese embora V. Exa. permaneça classificada no primeiro lugar da lista de classificação final, em virtude de já lhe ter sido concedido um alvará de farmácia ao abrigo de legislação anteriormente vigente, o que será igualmente aplicável a todo e qualquer candidato subsequentemente ordenado naquela lista e que se encontre em idênticas circunstâncias, tal não reveste qualquer matéria inovatória relativamente à proposta inicial de decisão sobre a qual os concorrentes foram chamados a pronunciar-se em sede de audiência prévia, antes consubstanciando a consequência necessária da aplicação dos normativos legais aplicáveis, in casu, do n.º 3 da Base II da Lei n.º 2125, de 20 de março de 1965 (ex-vi art.º 56.º do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, que manda aplicar aos concursos públicos para licenciamento de farmácias a legislação em vigor ao tempo da respetiva abertura), que dispunha que em circunstância alguma, e para o caso que agora nos ocupa, um candidato poderia obter mais do que uma farmácia por concurso, sob pena de se incorrer em vício de violação de lei. Assim, pese embora V. Exa. reunisse, à data do termo de apresentação da candidatura, os requisitos necessários para poder concorrer ao presente concurso (razão pela qual não se procedeu, agora, à V/exclusão, antes a mantendo classificada em 1.º lugar), a verdade é que, supervenientemente, por lhe ter sido adjudicada outra farmácia, ao abrigo da mencionada legislação, V. Exa. deixou de reunir os pressupostos indispensáveis à concessão do alvará da farmácia objeto do presente concurso, enquanto decorrência necessária da aplicação dos supra citados normativos legais, o que se verificará relativamente a todo e qualquer candidato que se encontre nas mesmas circunstâncias”. (cfr. fls. 223 e 224 do PA)
25. Em 19-07-2011, a Autora procedeu à entrega da documentação tendente à instalação da farmácia (cfr. fls. 204 a 219 do PA).
26. Entre os documentos entregues pela A. e mencionados em 25., constam: - planta de localização da farmácia a instalar, emitida pelos serviços camarários; - certidão camarária onde consta o número de polícia do prédio; - descrição das áreas mínimas do estabelecimento; - declaração de atividade da A., em 1997 e na data em análise (2011); - Informação camarária sobre a população da freguesia ...; - documento da Ordem dos Farmacêuticos de inscrição da A.; - registo criminal; - documento da Ordem dos Farmacêuticos de inscrição da colega substituta da A. e seu registo criminal; (cfr. fls. 204 a 219 do PA).
27. Em 18-10-2011, foi elaborado projeto de decisão de indeferimento relativamente ao requerimento apresentado pela Autora em 19-07-2011 (cfr. fls. 227 a 232 do PA).
28. Em 22-12-2011, após audiência prévia, o INFARMED proferiu decisão de indeferimento relativamente ao pedido de instalação de farmácia no Lugar ... efetuado pela Autora, com a seguinte fundamentação:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

(cfr. fls. 243 a 262 do PA).
29. A Autora, na data mencionada em 21. e 22., era detentora de farmácia, em funcionamento no concelho ... - Acordo.
30. A A. é proprietária da “Farmácia ...”, sita em ..., cuja titularidade lhe adveio do Aviso n.º ...01 (2ª série), publicado no DR, 2ª série, n.º 137, suplemento, de 15-06-2001 – cfr. se extrata do documento a fls. 231 do PA.
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IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

A Autora intentou a presente acção, pedindo a anulação da deliberação do Conselho Directivo do Réu, de 22.12.2011, que indeferiu o requerimento da Autora para autorização de instalação de (nova) farmácia no lugar e freguesia ..., concelho ..., e a sua condenação a proferir nova deliberação que defira o mesmo requerimento.
O Tribunal a quo perspetivou a acção interposta pela Autora sob a análise dos vícios assacados ao acto impugnado – (i) vício de violação de lei pelo facto de o R. ter considerado, erradamente – na ótica da A. -, que o facto de a A. ser detentora de farmácia instalada obsta a que possa ser emitido alvará; e (ii) vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, pelo facto de o R. ter considerado extemporânea a apresentação do requerimento com a respetiva documentação -, concluindo pela improcedência de ambos. Mais concluindo que, improcedendo o pedido impugnatório, improcede igualmente o pedido de condenação.
Sobre o primeiro vício, decidiu o Tribunal a quo o seguinte:

“(…)
Está em causa apreciar a validade do ato proferido pelo INFARMED que, em suma, indeferiu o pedido da Autora para autorização de instalação da farmácia.
Importa referir que a Autora ficou graduada em primeiro lugar no concurso público para a instalação de uma farmácia no lugar e freguesia ..., concelho ..., ..., que foi aberto através do Aviso de abertura no 6488/97 – publicado no D.R. II Série, nº 216 de 18/09/1997.
Apesar de ter existido decisão anterior, a verdade é que a mesma foi objeto de anulação judicial, devendo, ao abrigo do artigo 173.º, n.º 1 do CPTA, proceder-se a uma reconstituição no plano dos factos, ou seja, como se o ato anulado não tivesse sido praticado, retrocedendo ao início do procedimento, sendo o enquadramento legal a observar o mesmo que se verificava no termo inicial do concurso público.
É neste quadro que, no âmbito do concurso público sub judice, a Autora acabou qualificada em primeiro lugar.
Este enquadramento temporal da abertura do concurso tem relevância evidente, desde logo, porque delimita os diplomas legais aplicáveis, uma vez que neste âmbito se visa apreciar se o ato impugnado, atentas as circunstâncias concretas da sua prolação e o seu entorno legislativo, é inválido em caso afirmativo aferir o seu desvalor, é o chamado princípio tempus regit actum (art.º 12.º do CC).
Note-se que nos situamos no âmbito de normas substantivas, ou seja, que determinam os requisitos para aceder ao concurso e a possibilidade de ser titular de licença que permita a abertura de farmácia e, nesse sentido, terá de se ter em conta os diplomas normativos em vigor à data da abertura do concurso.
À data da abertura do concurso aplicava-se a Lei n.º 2125, o Decreto-Lei nº 48547, de 27 de agosto e a Portaria 806/87, sendo estes os diplomas a aplicar ao caso que nos ocupa, até porque a Lei n.º 2125, de 20 de Março de 1965 e o Decreto-Lei n.º 48 547, de 27 de Agosto de 1968 foram objeto de revogação pelo Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto que dispunha no artigo 56.º que “Aos concursos públicos para o licenciamento de farmácias aplica-se a legislação em vigor ao tempo da respetiva abertura.”, o que resulta igualmente da norma transitória constante da Portaria n.º 1430/2007, nomeadamente do artigo 41.º.
Assim, vistos os diplomas legais aplicáveis ao caso dos autos, importa agora analisar se, à luz destes normativos, se verificam os imputados vícios do ato impugnado.
Ora, o artigo 39º do Decreto-Lei nº 48547, de 27 de agosto, que regulava ao tempo dos factos em apreço o exercício da profissão farmacêutica, estipula que “as farmácias só podem funcionar mediante alvará passado pela Direcção-Geral de Saúde, nos termos da Lei n.º 2125, de 20 de março de 1965 (…)”.
Por sua vez, o artigo 50º, nº 1 daquele mesmo diploma legal previa que “serão aprovadas, mediante portaria do Ministro da Saúde e Assistência, as condições em que será autorizada a instalação de novas farmácias ou a sua transferência, bem como a instalação de postos e ambulâncias de medicamentos”.
Regendo a Lei nº 2125, de 20.03.1965, na Base II, nºs 1, 2 e 3 que: “A nenhum farmacêutico ou sociedade poderá ser concedido mais do que um alvará.”
Resulta dos autos que a Autora, à data da abertura do concurso, não era detentora de alvará de farmácia, contudo, mais se constata que no decurso do procedimento a mesma se mostra titular de alvará que lhe permitiu a abertura de farmácia, a funcionar no concelho ....
Desta forma não se mostrava a Autora impedida de concorrer ao concurso em causa, na exata medida em que à data da sua abertura impedimento legal algum impendia sobre a mesma.
O facto de ter adquirido alvará para abertura de farmácia em momento posterior apenas releva em fase de apreciação dos documentos previstos no artigo 14º, nº 1 da Portaria n.º 806/87, de 22.09, para efeitos de concessão do respetivo alvará, nos termos do artigo 16º do mesmo diploma regulamentar.
Na verdade, conforme já foi sufragado pelo TCA Norte, pode não ser indiferente possuir uma farmácia neste ou noutro local podendo a Autora optar por esta farmácia em detrimento daquela.
Essa análise deverá ser efetuada em sede de apreciação da documentação, impendendo sobre a Autora aquando da remessa dos documentos apresentar declaração em que dê nota de tal intenção, sob pena de a sua atuação silente obstar à atribuição da farmácia, com as consequências previstas nos n.ºs 2 e 3 do artigo 14º da Portaria n.º 806/87, de 22.09, interpretado extensivamente.
Dito isto, no caso dos autos verifica-se que a Autora ficou graduada em primeiro lugar no concurso para atribuição da farmácia e que tal lista de classificação foi objeto de homologação pelo INFARMED, sem que a candidatura da Autora tivesse sido objeto de rejeição.
Todavia, a Autora não poderia ser titular de alvará que lhe permitisse a abertura da farmácia em ... pela singela razão de já ser proprietária de uma farmácia em ..., o que desde logo inviabiliza qualquer possibilidade de deter esta farmácia, na medida em que o concurso público que lhe permitiu ficar graduada em primeiro lugar ter subjacente a aplicação das normas ínsitas na Lei nº 2125, de 20.03.1965, na Base II, nºs 1, 2 e 3 que determinava que a farmacêutico algum poderá ser detentor de mais do que um alvará, o que consubstancia condição negativa.
A Autora ao ter adquirido, na pendência do concurso, alvará para instalação de farmácia em ... inviabilizou por completo a abertura de farmácia em ....
Mas, ainda a admitir-se que poderia a mesma optar entre a Farmácia ... e ..., a conclusão a retirar sempre seria a mesma.
Na verdade, após envio da documentação o INFARMED emitiu ato de indeferimento do pedido de autorização de instalação de farmácia, não sem antes ter notificado a Autora para o exercício do direito de audição prévia.
Ora, dos autos não resulta que a Autora tivesse emitido qualquer declaração ou manifestação de vontade em que ficasse explícito que pretendia encerrar a farmácia em ..., em prol da abertura de farmácia em ..., inexistindo qualquer declaração da Autora nesse sentido - seja em sede de remessa de documentação seja em sede de audiência prévia
Aliás, mesmo nesta sede a Autora não refere ser essa a sua intenção, referindo apenas que deveria ter essa possibilidade de escolha, sendo que a mesma efetivamente lhe foi permitida sem que a Autora a tivesse exercido.
(…)”.

O decidido é para manter.
Com efeito, atenta a legislação aplicável aos autos e bem assim as decisões judiciais que envolvem a situação em apreço, não poderia ser outra a solução.
Ao tempo da abertura do concurso, publicado através do Aviso nº 6488/97, no Diário da República, II Série, n.º 216, de 18.09.1997, o regime jurídico das farmácias era regulado pela Lei nº 2125 de 20.03.1965, pelo Decreto-Lei nº 48547 de 27.08.1968 e pela Portaria nº 806/87, de 22.09.
A Lei n.º 2125, de 20.03.1965, que promulga as bases para o exercício da actividade de farmácia, estabelece no nº 3 da Base II, no que aqui releva, que “A nenhum farmacêutico ou sociedade poderá ser concedido mais de um alvará. (…)”.
O DL n.º 48547, de 27.08.1968, que regulamentou o exercício da profissão farmacêutica, dedicando os artigos 39º a 55º à “abertura de farmácias”, prevê no art. 50º que: “1. Serão aprovadas, mediante portaria do Ministro da Saúde e Assistência, as condições em que será autorizada a instalação de novas farmácias ou a sua transferência, bem como a instalação de postos e ambulâncias de medicamentos. 2. Nas condições a estabelecer, ter-se-á em atenção a comodidade das populações e a viabilidade da exploração económica dos estabelecimentos.”
A Portaria nº 806/87, de 22.09, emitida ao abrigo deste art. 50.º, aprova o novo regime de abertura e transferência de farmácias, revogando as Portarias n.ºs 413/73, de 09.06, e 643/77, de 04.10.
A Portaria nº 806/87, de 22.09 - alterada pelas Portarias nº 513/92 de 22.06 e nº 325/97, de 13.05 – viria a ser revogada pela Portaria 936-A/99 de 22.10, que, no artigo 20º, epigrafado “Disposição Transitória”, ditava, no nº 1, que “os processos de instalação de novas farmácias, bem como os pedidos de transferência, pendentes à data da entrada em vigor da presente portaria continuarão a reger-se pelas normas em vigor à data da abertura do respectivo concurso e do pedido de transferência, cujo âmbito de aplicação se limitará apenas à resolução daquelas situações transitórias”.
O Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31.08, numa clara ruptura com a legislação anterior, veio estabelecer o regime jurídico das farmácias de oficina, revogando a Lei n.º 2125 e o DL n.º 48547 (cfr. artigo 60º). O seu art. 56º, epigrafado “Norma transitória material”, dispõe que “Aos concursos públicos para o licenciamento de farmácias aplica-se a legislação em vigor ao tempo da respectiva abertura.”
Em cumprimento do disposto no artigo 57.º do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31.08, foi promulgada a Portaria 1430/2007 de 02.11, que veio regular, entre outros, o procedimento de licenciamento e de atribuição de alvará a novas farmácias, revogando a Portaria n.º 936-A/99, de 22.10 (cfr. art. 42º). O nº 1 do art. 41º, sob a epígrafe “Norma transitória material” estabelece que “Os procedimentos de abertura e transferência de farmácias em instrução no INFARMED, I. P., regem -se pelas normas em vigor à data do início dos respectivos procedimentos e limitam -se à decisão daquelas situações transitórias.”
A Portaria 1430/2007, por sua vez, foi revogada pela Portaria 352/2012, que, no seu artigo 33º (norma transitória material), previa “os procedimentos de abertura e transferência de farmácias em instrução no INFARMED, I. P., regem-se pelas normas em vigor à data do início dos respetivos procedimentos e limitam-se à decisão daquelas situações transitórias”.
Feito este périplo, é nosso entendimento, mormente atento o teor das normas transitórias supra referidas, que o legislador quis que os procedimentos de instalação de novas farmácias se regessem até final pelas normas que vigoravam à data da abertura do respectivo concurso.
Não obstante o procedimento de instalação de uma farmácia passe por diferentes e sucessivas fases, em causa está um procedimento composto que culmina com o acto de licenciamento da instalação de nova farmácia.
Tendo presente que, como dispõe o art. 9º, nº 3 do CC, devemos presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, pelo que, caso não fosse intenção do legislador referir-se ao procedimento latu sensu, tê-lo-ia afirmado de forma expressa ou, pelo menos, mais evidente.
Concluímos, pois, que o procedimento em causa nos autos – em toda a sua extensão – deve obedecer ao regime legal vigente à data da abertura do concurso, ou seja, a Lei nº 2125 de 20.03.1965, o Decreto-Lei nº 48547 de 27.08.1968 e a Portaria nº 806/87, de 22.09.
E, em bom rigor, se diga que, nesta sede recursiva, a Recorrente não pugna já pela aplicação do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31.08, que pôs fim á limitação de um único alvará.
O que é dito pela Recorrente é que “dando execução a todas as necessárias consequências da sentença anulatória de 2007 e da sentença que determinou os termos da execução daquela sentença, passando à fase de atribuição da farmácia, o Conselho Directivo do INFARMED não podia deixar de se referenciar, e apenas, às condições pessoais da concorrente e classificada em primeiro lugar, a ora Autora, à data da sua apresentação da candidatura e da sua admissão ao concurso”; e que “atenta a circunstância pessoal da Autora, à data da admissão da sua candidatura, não existia fundamento legal para lhe ser recusada a atribuição da farmácia, nomeadamente por não ser proprietária de mais nenhuma. Esta é a correcta aplicação da portaria n.º 806/87”.
O mesmo é dizer que, segundo a Recorrente, a Entidade Demandada deveria ignorar ou não podia atender à circunstância de, na pendência do concurso, a Autora ter adquirido um alvará para abertura de farmácia.
Não podemos acompanhar tal entendimento.
É matéria pacífica nos autos que, aquando da apresentação da sua candidatura e da admissão da mesma, a Autora não era proprietária de nenhuma farmácia; e que, em momento posterior, a Autora procedeu à instalação de uma farmácia cujo direito lhe adveio do facto de ter ficado classificada em 1º lugar noutro concurso público, este aberto ao abrigo da Portaria 936-A/99.
Em observância do disposto no nº 3 da Base II da Lei n.º 2125, estava a Entidade Demandada impedida de conceder à aqui Autora mais de um alvará.
O nº 3 da Base II da Lei 2125 - vigente à data de abertura de ambos os concursos públicos aos quais a Autora foi oponente - contém em si uma proibição que atinge os farmacêuticos que já detenham a propriedade de uma farmácia, de forma que o farmacêutico que for proprietário de farmácia não pode ver constituído na sua esfera jurídica o direito à propriedade de uma nova farmácia.
Ora, a Lei 2125 é fonte normativa de hierarquia superior quando comparada com a Portaria (cfr. acórdãos do STA de 02/05/2006 (Proc. nº 01147/05), de 24/10/2006 (Proc. nº 0195/06) e de 17.01.2007 (Proc. nº 0116/16).
Não pode, pois, a aplicação das disposições da Portaria permitir o que não permite a Lei nº 2125. Neste mesmo sentido, decidiu já este TCAN, em acórdão proferido a 13.09.2019, no âmbito do processo nº 724/12.0BEBRG (não publicado) – com revista admitida.
No caso que nos ocupa, a Autora reunia as condições para concorrer ao procedimento de abertura de farmácia em causa, todavia, porque na sua pendência se tornou titular de um alvará de farmácia, deixou de ser possível ver-lhe concedido novo alvará no termo do concurso de que saiu vencedora.
Poder-se-ia cogitar se a Entidade Demandada, aquando da retoma do procedimento concursal, diante deste circunstancialismo, podia/devia, ter logo excluído a Autora do concurso ao invés de a classificar em 1º lugar para depois considerar precludido o seu direito de instalar a farmácia.
Tal discussão carece de interesse no concreto caso em análise.
Recorde-se que a deliberação, de Abril de 2011, pela qual o INFARMED homologa a nova lista de classificação final do concurso, na qual a Autora surge em 1º lugar, foi praticado em sede de execução do Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, proferido em 09 de Outubro de 2009, no âmbito da execução de sentença prolatada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (processo nº 985/00), nos termos da qual havia sido anulado o acto de homologação da lista de classificação final por preterição de audiência prévia e condenado o INFARMED a, no prazo de 60 dias (cfr. factos provados nºs 9, 10, 11, 12).
Consultado o acórdão deste TCAN, datado de 09.10.2009, constatamos que:
- consta no elenco dos factos provados da sentença recorrida que a exequente (aqui Recorrente) ficou em 1º lugar na lista de classificação final dos candidatos admitidos ao concurso público para instalação de uma farmácia em ..., concelho ...; e que, em 22.09.2003, a exequente obteve o alvará para instalação da dita farmácia, encontrando-se a mesma aberta ao público;
- a ali (e aqui) Contra-interessada suscitou a questão de a exequente ser já titular de um outro alvará, não tendo interesse executivo e constituindo causa legítima de execução;
- afirma-se na sentença recorrida o seguinte: “… quanto à questão do interesse da exequente na execução da sentença, diga-se que tal matéria foi já abordada na sentença proferida no processo principal, onde se considerou, e bem, que nada o obsta a que a ora exequente peticione a conclusão do procedimento no sentido de ficar em primeiro lugar para depois instalar uma farmácia no local de ..., sendo que o facto de entretanto ter instalado outra farmácia noutro local na sequência de um outro concurso não inviabiliza tal situação, dado que, o que releva neste domínio é a total legitimidade da exequente em reivindicar a conclusão de um procedimento que poderá trazer para si uma situação mais favorável, não podendo o argumento da instalação de uma farmácia funcionar para, logo à partida, colocar em crise a pretensão da exequente, na medida em que, só após a conclusão do procedimento, e caso a exequente seja classificada em 1º lugar, terá que ser equacionada a matéria agora apontada para inviabilizar a pretensão da exequente.”;
- este entendimento foi confirmado pelo TCAN, que acrescentou: “sendo certo que à data da prática do acto anulado a exequente apenas podia ser titular de uma alvará (Lei nº 2125, de 20 de Março de 1965 e a Portaria nº 806/87, de 22.09), não se pode afirmar que o facto de neste momento possuir outro alvará perde interesse pois, pode não ser indiferente possuir uma farmácia neste ou noutro local”.
Assim, a Administração, face ao decidido no processo nº 985/00, não podia, na prolação do acto renovado, considerar situação de facto inexistente ao momento da prática do acto anulado.
Este entendimento foi reforçado no âmbito do processo nº 274/11.1BEMDL, acção instaurada pela aqui Contra-interessada contra a entidade aqui demandada, na qual figura como interessada, entre outros, a qui Autora, e na qual é pedida a “anulação da deliberação de 12 de abril de 2011, do Conselho Diretivo do INFARMED que homologou a lista de classificação final do concurso para instalação de uma nova farmácia no Lugar ..., freguesia ..., concelho ..., bem como a condenação do INFARMED à prática do ato de homologação de nova lista de classificação final na qual a Autora seja classificada em primeiro lugar no âmbito do concurso público para a instalação de uma nova farmácia no Lugar ...”.
A referida acção foi julgada totalmente improcedente por sentença de 21.09.2020 e confirmada por acórdão deste TCAN de 19.03.2021.
No que aqui releva, verifica-se que foi ali suscitada como causa de invalidade do acto a circunstância de a aqui Autora ser entretanto já titular de uma farmácia, tendo o Tribunal a quo se pronunciado nos seguintes termos: “ … ainda que a contrainteressada seja titular de outra farmácia, a sua classificação em primeiro lugar neste concurso público não inquina o despacho impugnado, dado que a mesma poderá optar por desfazer-se dessa farmácia em prol de poder instalar e abrir ao público a nova farmácia em ..., ....
Deste modo, o controlo dessa condição legal será feito “a posteriori”, concretamente aquando da apreciação dos documentos previstos no artigo 14º, nº 1 da referida portaria para efeitos de concessão do respetivo alvará, nos termos do artigo 16º do mesmo diploma regulamentar, podendo obstar à sua atribuição, com as consequências previstas nos n.os 2 e 3 do citado artigo 14º, interpretado extensivamente.”.
O TCAN confirmou a sentença, afirmando que “a discordância da recorrente, querendo fazer revelar a posterior titularidade de outro alvará por banda da contra-interessada para o que tem de ser considerado a tempo pretérito, não tem bom sustento.”
Donde, a titularidade de uma farmácia na pendência do concurso sempre teria de ser considerada a posteriori.
Quando? A lei não o diz. Não o diz a Lei 2125 e não o diz a Portaria n.º 806/87, de 22.09, que “ignorou” o estatuído no nº 3 da Base II.
Assim, apontar a fase de apreciação dos documentos previstos no artigo 14º, nº 1 da Portaria n.º 806/87, como sendo o momento idóneo para a análise do facto de a Autora ter adquirido um alvará para abertura de farmácia em momento posterior, compreende-se na medida em que é o evento que dá início à segunda fase do procedimento ou ao subprocedimento (instalação stricto sensu da farmácia). Veja-se que se a Autora, por alguma razão, não apresentasse tais documentos, a Entidade Demandada não seria confrontada com a questão e com a necessidade de a dirimir.
Alega ainda a Recorrente que “mesmo que se concluísse, por hipótese de análise, que a licença desta farmácia não podia ser concedida à Autora, por ser posteriormente detentora de outra, não podia deixar de lhe ser concedido, objectivamente, o direito de optar, podendo no momento da atribuição da farmácia em ... prescindir da farmácia em ....” (cfr. conclusão 14).
Critica a sentença recorrida “ao entender que aquando da apresentação dos documentos a Autora estava obrigada a exercer o seu direito de opção por uma ou outra farmácia, e que, não o fazendo, devia ser automaticamente excluída e ultrapassada pelas concorrentes classificadas a seguir, nos termos dos nºs 2 e 3 daquele artº 15º da Portaria nº 806/87.”
Assente que a Autora não poderia ser titular de duas farmácias e adiantado já por este TCAN que sempre a mesma deveria poder optar por passar a ser titular da farmácia concedida pelo concurso em causa, em detrimento da farmácia de que obteve posterior alvará, a posição da Recorrente apresenta duas dificuldades.
A primeira é que, não tendo este direito de opção que se lhe reconhece consagração legal, inexiste uma regulamentação da sua efectivação à qual o Réu estivesse vinculado. Concretamente, inexiste norma que disponha sobre o momento adequado para a formulação desta opção assim como sobre o modo, mormente se cabia à Entidade Demandada suscitar a questão junto da Autora (como defende a Recorrente) ou se, ao invés, cabia à Autora a iniciativa de manifestar tal opção (posição defendida na sentença recorrida).
A segunda reside na circunstância destacada na sentença recorrida de que: “dos autos não resulta que a Autora tivesse emitido qualquer declaração ou manifestação de vontade em que ficasse explícito que pretendia encerrar a farmácia em ..., em prol da abertura de farmácia em ..., inexistindo qualquer declaração da Autora nesse sentido - seja em sede de remessa de documentação seja em sede de audiência prévia.
Aliás, mesmo nesta sede a Autora não refere ser essa a sua intenção, referindo apenas que deveria ter essa possibilidade de escolha, sendo que a mesma efetivamente lhe foi permitida sem que a Autora a tivesse exercido.”
O que se mantém em sede recursiva.
Com efeito, a Recorrente sustenta que tinha que lhe ser dado o direito de optar e que a questão tinha que ser levantada pelo Réu.
Todavia, em momento algum, quer em sede procedimental, quer em sede judicial, a Autora, ora Recorrente, afirma/assume que a sua opção é/seria a instalação e abertura de farmácia em ..., concelho ..., em detrimento da que detém actualmente em ....
Não o fez quando tomou conhecimento da posição da Entidade Demandada exarada na comunicação de 14.06.2011, em resposta à sua carta de 09.05.2011 (cfr. factos 23 e 24); não o fez quando foi notificada para se pronunciar sobre o projecto de decisão de indeferimento do requerimento apresentado pela Autora em 19.07.2011 (entrega da documentação tendente à instalação da farmácia); não o fez em qualquer momento da presente acção, mormente na petição inicial e nas alegações de recurso.
Neste circunstancialismo, improcede o presente fundamento de recurso.
*
Sobre o alegado vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, pelo facto de o Réu ter considerado extemporânea a apresentação do requerimento com a respectiva documentação, decidiu o Tribunal pela sua improcedência, com a seguinte fundamentação:
“(…)
A A. dentro deste concreto vício suscita várias questões, desdobrando o mesmo e 3, a saber:
- Qual o normativo aplicável quanto ao prazo de entrega da documentação;
- Se o facto de a A. ter apresentado um requerimento ao Conselho Diretivo do INFARMED, em 9 de Maio de 2011, nos termos conjugados do direito à informação procedimental, e do estabelecido no nº 2 do artº 60º do CPTA, faz com que o termo inicial do prazo de entrega da documentação apenas ocorra a partir do momento da resposta do R.;
- Se o facto de o Conselho Diretivo do INFARMED que procedeu à homologação da lista de classificação dos candidatos admitidos ao concurso ter referido que o fazia “...nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 11.º da Portaria no 936-A/99, de 22 de Outubro” faz com que seja essa a legislação aplicável.
Cumpre, pois, analisar o suscitado vício, nas diferentes dimensões suscitadas.
Quanto ao normativo aplicável, importa aqui referir que o prazo de entrega da documentação se insere no âmbito do mesmo procedimento, ou seja, no momento da entrega da documentação o procedimento ainda não se encontra encerrado (apenas finalizando com a emissão do respetivo alvará).
Assim, estando em curso o procedimento, as normas a aplicar serão as vigentes à data de abertura do concurso, na exata medida em que, como se disse, todo procedimento é delimitado pelos diplomas legais aplicáveis à data de abertura do concurso, o chamado princípio tempus regit actum (art.º 12.º do CC).
À data da abertura do concurso aplicava-se a Portaria 806/87, sendo este o diploma a aplicar ao caso que nos ocupa, até porque a norma transitória constante da Portaria n.º 1430/2007, artigo 41.º, assim o indicia, referindo que aos concursos públicos para o licenciamento de farmácias aplica-se a legislação em vigor ao tempo da respetiva abertura.
Assim sendo, no caso, tem aplicabilidade a Portaria n.º 806/87, com as alterações preconizadas pela Portaria n.º 513/92, de 22 de junho, regendo no artigo 14.º, n.º 1: “O concorrente classificado em primeiro lugar dispõe de 45 dias, a contar da data da publicação no Diário da República do despacho referido no n.º 1 do número anterior, para apresentar os seguintes documentos: (…)”.
Desta forma, o prazo de que dispunha a A. para apresentar a documentação legalmente exigível era de 45 dias, contabilizados a partir da data da publicação em DR do despacho que homologue a lista de classificação dos concorrentes à instalação de farmácia.
Assim, estando definida a norma a aplicar, importa agora atender quando iniciou esse prazo, nomeadamente se a apresentação de requerimento pela A. (a solicitar informações) interrompeu o prazo em curso.
A A. refere que apresentou requerimento ao Conselho Diretivo do INFARMED, em 9 de Maio de 2011, nos termos conjugados do direito à informação procedimental, e do estabelecido no nº 2 do artº 60º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e que a resposta, e assim a notificação cabal e efetiva da decisão do Conselho Diretivo do INFARMED, apenas foram fornecidas pelo ofício datado de 14 de Junho de 2011, recebido em 20 do mesmo mês, apenas então se considerando perfeita a notificação da Autora da decisão (arº 68º do Código do Procedimento Administrativo) e apenas então começando a correr o prazo regulamentar para apresentação do requerimento de atribuição da farmácia.
A disposição ínsita no artigo 60.º do CPTA tem a seguinte redação:
(…)
Este normativo estabelece um principio de inoponibilidade da notificação ou publicação para efeitos de impugnação contenciosa, não tendo aplicabilidade em termos procedimentais, ou seja, não interrompe qualquer prazo administrativo, que seria no caso de entrega de documentação.
Neste sentido, em anotação ao artigo 60.º do CPTA, referem Aroso de Almeida e Carlos Cadilha (Comentário ao CPTA, 4ª Edição, p. 416 e ss.) que este normativo “estabelece o regime de inoponibilidade da notificação ou publicação e os meios de reação contra a notificação ou publicação deficientes, completando o artigo 59.º, que fixa o modo de contagem dos prazos de impugnação do ato administrativo (…)”
Referindo ainda os ilustres Autores que “o regime de notificação dos atos administrativos consta dos artigos 110.º a 114.º do CPA, reportando-se o artigo 114.º, n.º 2, ao conteúdo da notificação.
O n.º 1 deste artigo 60.º estabelece, para efeitos da impugnação contenciosa, um princípio de inoponibilidade da notificação ou da publicação, quando esta não dê a conhecer ao interessado o sentido da decisão, o que significa que se não inicia o prazo para a utilização do meio processual impugnatório enquanto não for efetuada uma nova notificação que identifique o conteúdo e o objeto da decisão.
Quanto faltem outros elementos que devam constar da notificação e que o interessado considere necessários para deduzir o meio impugnatório, poderá este requerer a notificação das indicações em falta ou a passagem de certidão que as contenha (cfr. o n.º 2).”
Concluindo, a apresentação de requerimento pela A., nos termos em que o fez, aludindo expressamente ao artigo 60.º do CPTA apenas interrompe o prazo para a utilização do meio processual impugnatório (contencioso), devendo nesse caso requerer a notificação das indicações em falta ou a passagem de certidão que as contenha, nos termos do n.º 2 do artigo 60.º do CPTA, mas nada rege este normativo quanto à interrupção e suspensão de prazos procedimentais.
Ora, no caso que nos ocupa, não está em causa a intempestividade da prática de ato processual, mas antes a apresentação extemporânea de documentos no âmbito procedimental e, nesse caso, o requerimento apresentado pela A. não interrompe nem suspende o prazo que se encontrava em curso, desde a publicação em DR.
Finalmente, quanto à alegada menção, do Conselho Diretivo do INFARMED, que procedeu à homologação da lista de classificação dos candidatos admitidos ao concurso, ter referido que o fazia “...nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 11.º da Portaria nº 936-A/99, de 22 de Outubro” não faz com que seja este o normativo aplicável.
Na verdade, na publicação em DR não consta qualquer menção à Portaria em causa e, além disso, inexiste qualquer notificação endereçada à A. que tenha mencionado que se aplicam os prazos constantes da Portaria nº 936-A/99, de 22 de Outubro, que pudesse colocar em causa o principio da proteção da confiança.
Pelo exposto, conclui o tribunal que o prazo aplicável é o constante na Portaria 806/87, sendo de 45 dias, que iniciou o seu termo em 4 de maio de 2011. Ora, tendo a A. entregue os documentos em 19 de julho de 2011, tal entrega ocorreu fora de prazo, na medida em que esse prazo findou em 08-07-2011 (contabilizado em dias úteis, nos termos do artigo 87.º do CPA).”
A Recorrente não se conforma com o decidido.
Em nota distintiva da petição inicial, acolhe agora o entendimento de que “à data da abertura do concurso aplicava-se a Portaria 806/87, sendo este o diploma a aplicar ao caso que nos ocupa”.
E afirma que o prazo de que dispunha “para apresentar a documentação legalmente exigível era de 45 dias, contabilizados a partir da data da publicação em Diário da República do despacho que homologue a lista de classificação dos concorrentes à instalação de farmácia”.
O erro que aponta à sentença recorrida situa-se no dia a partir do qual se inicia a contagem do prazo de 45 dias, que segundo a Recorrente apenas se iniciou na data do recebimento pela Autora da resposta que o Réu lhe endereçou ao pedido de esclarecimento.
Alega que a sentença devia ter considerado que o pedido de informação e esclarecimento apresentado pela Autora se justificava, nos termos conjugados do direito à informação procedimental, e do estabelecido no nº 2 do artº 60º do CPTA, pelo facto de ter ocorrido uma actuação de excepção por parte do Réu, ao comunicar a homologação da lista aprovada pelo Júri com a expressa notificação da Autora da decisão do Júri, e com expressa anexação do teor da acta da deliberação de Júri que incluía uma “decisão” sobre a impossibilidade da Autora apresentar a sua pretensão complementar de atribuição do alvará de funcionamento da farmácia; pelo facto de que cabia à Autora o direito de interpor recurso contencioso, nos termos e nos prazos definidos na lei geral; e porque a notificação efectuada pelo Réu à Autora, fora feita como notificação de um acto único e completo, definitivo, que determinava a sorte da Autora no concurso em causa, dando justificada causa para o pedido de informação e esclarecimento de acordo com o estabelecido no nº 2 do artº 60º do CPTA, que a Autora apresentou, tendo em vista que da mesma notificação podia resultar a necessidade de impugnar contenciosamente a decisão.
A argumentação da Recorrente padece de uma falha, que insiste em ignorar.
O normativo aplicável – agora pacífico -, ou seja, o artigo 14.º, n.º 1 da Portaria 806/87, na redacção dada pela Portaria n.º 513/92, determina que o “concorrente classificado em primeiro lugar dispõe de 45 dias, a contar da data da publicação no Diário da República do despacho referido no n.º 1 do número anterior, para apresentar os seguintes documentos: (…)”.
É, pois, claro que a contagem do prazo de 45 dias se inicia a partir da data da publicação em Diário da República do despacho que homologa a lista de classificação dos concorrentes, que, no caso, ocorreu a 03.05.2011 (cfr. facto 22).
Na contagem deste prazo não releva a notificação levada a cabo pela Entidade Demandada “do envio para publicação na 2ª série do Diário da República da lista de classificação final dos candidatos admitidos a Concurso”, “acompanhada da ata n.º 6 da reunião de 12/04/2011 do Júri do Concurso, e do Aviso datado de 12 de Abril de 2011, assinado pela Snra. Presidente do Júri do concurso, para publicação da referida lista de classificação final dos candidatos”.
E se não releva esta notificação – a sua eficiência ou deficiência - não releva também qualquer pedido de esclarecimento que tenha recaído sobre a mesma e respectiva resposta.
Donde, iniciado o prazo (de 45 dia úteis) em 04.05.2011, o mesmo já havia decorrido, a 19.07.2011 quando a Autora entregou a documentação exigida.
Aqui chegados, é nosso entendimento que bem andou o Tribunal a quo ao validar a decisão da Administração de não autorizar o pedido de instalação e abertura da farmácia em causa, seja porque a tanto impunha o nº 3 da Base II da Lei 2125, seja porque, ainda que assim não fosse, a Autora apresentou o referido pedido de forma extemporânea.
Termos em que improcede, na integra, o presente recurso.
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V - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do TCA Norte em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custa a cargo da Recorrente.
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Registe e notifique.
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Porto, 06 de Junho de 2025

Ana Paula Martins
Catarina Vasconcelos
Conceição Silvestre