Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 01609/16.6BEBRG |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 05/29/2025 |
| Tribunal: | TAF de Braga |
| Relator: | ANA PATROCÍNIO |
| Descritores: | DESPACHO INTERLOCUTÓRIO, DISPENSA DE PROVA TESTEMUNHAL; SENTENÇA FINAL, REVERSÃO; CULPA, ÓNUS DE ALEGAÇÃO, ÓNUS DA PROVA; |
| Sumário: | I - Embora o tribunal tenha, em princípio, de admitir todos os meios de prova que as partes ofereçam, pode recusar a sua produção caso exista norma legal que limite ou proíba determinado meio de prova ou julgue que as provas oferecidas são manifestamente impertinentes, inúteis ou desnecessárias. II - No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto [artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT]. III – Haverá que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor. IV - A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores, pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Negar provimento aos recursos. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório «AA», contribuinte fiscal n.º ...49, com domicílio fiscal na Rua ..., ..., ... ..., interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 21/05/2019, que julgou parcialmente improcedente a oposição ao processo de execução fiscal n.º ...79 e apensos, originariamente instaurado contra a sociedade comercial “[SCom01...], S.A., em Liquidação”, pessoa colectiva n.º ...35, contra si revertido, para cobrança de dívidas de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e de Imposto Municipal sobre Imoveis, relativas aos anos de 2007, 2008, 2009 e 2010, no valor global de € 69.974,49. As dívidas referentes ao ano de 2007 foram declaradas prescritas pelo tribunal recorrido, pelo que já não são objecto do recurso. Igualmente, interpôs recurso do despacho interlocutório, proferido em 04/09/2017, que considerou que os autos se encontravam instruídos com a prova documental necessária à decisão, não tendo, por isso, sido produzida a prova testemunhal solicitada. Este recurso foi admitido, em 20/10/2017, para subir com o recurso que viesse a ser interposto da decisão final; pelo que se iniciará com a sua apreciação. O Recorrente terminou as alegações referentes ao recurso sobre o despacho interlocutório formulando as conclusões que se seguem: “1. O presente recurso tem por objeto a reapreciação do despacho datado de 04/09/2017 a dispensar a inquirição das testemunhas. 2. Entendeu o tribunal de 1ª instância, não vislumbrar necessidade em realizar tal inquirição reduzindo a matéria controvertida às questões de direito e por a matéria de facto ser susceptível de prova documental, já junta. 3. Porém, o Tribunal de 1ª Instância não atendeu ao fim visado com os factos alegados nos artigos 26 a 50 que se destinam a demonstrar que não teve culpa no não pagamento dos impostos em questão. 4. Para prova de tais factos, os documentos juntos com a petição, devem ser complementados com a inquirição das testemunhas arroladas 5. pois torna-se fundamental demonstrar o que aconteceu à sociedade para que esta não tivesse os meios económicos e financeiros suficientes para pagar os impostos, qual a culpa do oponente na insuficiência e qual o comportamento deste para reverter tal situação. 6. Pelo que, é essencial a inquirição das testemunhas arroladas para aferir da falta de culpa do oponente no não pagamento dos impostos. NESTES TERMOS: e com mui douto suprimento de V/Exas. deve ser dado provimento ao presente recurso, alterando-se o despacho proferido, no sentido de serem inquiridas as testemunhas arroladas. Com o que farão aliás como sempre inteira e sã justiça.” O Recorrente terminou as suas alegações de recurso relativas à sentença formulando as seguintes conclusões: “A. O presente recurso tem por objeto a reapreciação da matéria de facto e de direito no que diz respeito à decisão de considerar improcedente, por não provada, a oposição apresentada quanto à decisão de reversão das dividas dos anos de 2008, 2009 e 2010, executadas no pef nº ...79 e aps., instauradas originariamente contra a sociedade “[SCom01...], SA, em Liquidação”, NIPC ...35, e contra si revertida. B. O tribunal de 1ª instância, considerou que o recorrente não logrou provar a ausência de culpa na falta de pagamento das dívidas revertidas. C. Por despacho datado de 04/09/2017 o Tribunal de 1ª Instância dispensou a inquirição das testemunhas arroladas na petição inicial por julgar desnecessária face aos elementos constantes nos autos e face à natureza da matéria controvertida. D. A sentença proferida padece de erro de julgamento por violação dos artigos 115.º e 118.º do CPPT, e art. 392.º do Código Civil, na medida em que lhe devia ter dado oportunidade para produzir prova testemunhal. E. Ao contrário do que foi julgado, os elementos disponíveis nos autos não são suficientes para permitir um cabal conhecimento das causas de pedir e do pedido formulado. F. Tendo o oponente alegado factos concretos para realização da inquirição das testemunhas arroladas na petição inicial, e sendo estes relevantes para a decisão da causa, a omissão de tal diligencia de prova, afetou o julgamento da matéria de facto, acarretando assim a anulação da sentença por défice instrutório. G. O Recorrente arrolou testemunhas para inquirição sobre os factos alegados nos pontos 23, 24, 26, 30 a 50 da petição inicial. H. Por despacho datado de 04/09/2017 foi dispensada a prova testemunhal, por entender-se não se vislumbrar necessidade em realizar tal inquirição. I. Assim para prova de tais factos, deveriam ter sido complementados com a inquirição das testemunhas arroladas, pois era fundamental demonstrar o que aconteceu à sociedade para que esta não tivesse os meios económicos e financeiros suficientes para pagar os impostos e qual o comportamento do oponente para reverter tal situação e análise da culpa deste. J. As testemunhas arroladas tinham conhecimento direto sobre os factos de que se pretendia fazer prova, e se revelavam úteis para a descoberta da verdade material. K. Determinou o Tribunal de 1ª instância como questões a decidir I) A prescrição [de parte das dívidas] e II) Da (in)verificada culpa alegada pelo oponente [para as dívidas de 2008, 2009 e 2010, atento o decidido supra para as dívidas de 2007] L. Antes de se verificar se a prova da falta de culpa do oponente foi feita, cabe primeiramente e oficiosamente, por se tratar de um requisito legal, verificar se se demonstra comprovado o efetivo exercício de facto da gerência pelo oponente. M. Não resulta da matéria de facto provada, nem foi feita qualquer pronuncia, que o oponente era o gerente de facto no período de vencimento das dividas revertidas. N. A falta de prova da gestão de facto da devedora originária por parte da Administração Tributária devia ter sido conhecida pelo Tribunal a quo. O. Pois, este encontra-se adstrito à descoberta da verdade material, de acordo com o disposto no artigo 265. ° do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 2. ° do CPPT e 13. °, n.° 1 também CPPT. P. O Tribunal a quo é competente para conhecer de todas as questões do processo, independentemente da sua alegação pelas partes. Q. E, não tendo a Administração Tributária logrado obter tal prova no processo, temos de concluir que a douta decisão tinha de considerar a presente oposição procedente, por falta de prova da gestão de facto do revertido, aqui oponente. R. Termos em que, face à prova produzida sempre deveria o recorrente ter sido considerado parte ilegítima na reversão operada, improcedendo a sentença recorrida de erro de julgamento e violação de lei. NESTES TERMOS, e com mui douto suprimento de V/Exas. deve ser dado provimento ao presente recurso, com as demais consequências legais. Com o que farão aliás como sempre inteira e sã justiça.” **** A Recorrida não contra-alegou. **** O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser ordenada a remessa dos autos à 1.ª instância para a produção da prova testemunhal arrolada e posterior nova decisão sobre a alegada falta de culpa, nos termos previstos no artigo 662.º, n.º 2, alíneas b) e c) do CPC. **** Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; submete-se o processo à Conferência para julgamento. **** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa apreciar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto, por défice instrutório, e de direito, ao considerar ser o Recorrente parte legítima na execução, por estarem demonstrados os pressupostos para operar a reversão, nomeadamente, a sua culpa na falta de pagamento dos tributos em causa; e se a decisão interlocutória enferma de erro, por terem sido alegados factos susceptíveis de produção de prova testemunhal, sendo esta essencial para aferir da falta de culpa do oponente no não pagamento dos impostos. III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Com interesse para a decisão da causa consideram-se provados os factos seguintes: A) A AT instaurou a execução fiscal n.º ...79 aps., contra a sociedade “[SCom01...], SA, em Liquidação”, NIPC ...35, por dívidas de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e de Imposto Municipal sobre Imoveis, relativas aos anos de 2007, 2008, 2009 e 2010, no valor global de € 69.974,49 [sessenta e nove mil novecentos e setenta e quatro euros e quarenta e nove cêntimos] – cf. PEF apenso; B) A sociedade a que se alude em A. foi constituída em 1986, com a firma “[SCom02...], S.A.”, tendo adoptado a firma “[SCom01...], S.A.” após alteração ao contrato social, no ano de 2010; C) As dívidas que originaram os PEF´s a que se alude em A. venceram-se entre 20-10-2009 e 14-12-2011– cf. PEF apenso; D) Em 2008 foi instaurada uma providência cautelar contra a sociedade a que se alude em A., na altura sob a firma “[SCom02...], S.A.”, que correu termos no ... Juízo do Tribunal Judicial de Esposende sob o proc. n.º 3../0...TBEPS, E) Em 25-03-2009 (foram) no âmbito da acção a que se alude na al. anterior foram arrestados os bens (da) móveis da mesma – cf. auto a fls. 33 e ss da paginação electrónica; F) Em 10-01-2012 a sociedade mencionada em A. foi declarada insolvente por sentença proferida no âmbito do processo n.º ..55/1...TBBCL, que correu termos no, então, ... Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo; G) Em 29-04-2016 o aqui oponente exerceu o direito de audição prévia, à reversão, nos termos do art. 23.º, n.º 4 e 60.º da LGT; H) Em data não concretamente apurada, mas que se situa antes de 20-05-2016, foi proferido despacho de reversão contra o oponente, constando de relevante o seguinte: “(…) FUNDAMENTOS DA REVERSÃO Dos administradores, directores ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhe ser imputável a falta de pagamento da dívida quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art.º 24/nº 1/b) da LGT]. Insuficiência de bens da devedora originária (artigos 23º/1 a 3 e 7 da LGT e 153º/1/2/b do CPPT), decorrente de situação líquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face de insolvência declarada pelo Tribunal. E os constantes da(s) folha(s) anexa(s), parte integrante do presente despacho.” – cfr. pág. 17 da numeração electrónica da PI; I) Em 20-05-2016 a AT expediu carta de citação mediante registo com aviso de recepção, mostrando-se o mesmo assinado em 24-05-2016, por pessoa diferente do citando; J) Em 21-06-2016 o oponente apresentou oposição ao PEF identificado em A. K) Pelo OEF foi proferida informação nos termos do art. 208.º do CPPT aquando da remessa da presente oposição para Tribunal, da qual se destaca aqui o seguinte: [cfr. imagem no original, que aqui se tem por reproduzida] - cfr. pág. 66 e ss. da numeração electrónica da PI. Factos não provados Inexistem. * A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base na análise crítica dos documentos e informações constantes do processo, referidos em cada uma das alíneas do elenco dos factos provados.” Para cabal compreensão, transcreve-se o teor do despacho interlocutório recorrido, proferido em 04/09/2017: “Compulsados os autos constata-se que os vícios apontados na Petição Inicial, assumem, na maioria, a natureza de questões de direito e a matéria de facto ali invocada susceptível de prova documental, encontrando-se os autos munidos de tal prova. Entendemos, assim, que o processo contém os elementos necessários à decisão pelo que, decidir-se-á pelo imediato conhecimento do pedido, sem que haja produção de prova (cfr. arts. 113.º, n.º 1, e 114.º, do CPPT, ex vi, n.º 1 do art. 211.º do mesmo código). Nos termos dos arts. 114.º e 120.º do CPPT, dispenso a inquirição de testemunhas e, consequentemente entendo não se justificar ordenar a notificação das partes para alegações. Nada sendo requerido, abra vista ao Ministério Público, nos termos e para os efeitos do n.º 1 do art. 121.º do CPPT, ex vi, do n.º 1 do art. 211.º do mesmo código.” 2. O Direito Comecemos por sindicar o despacho interlocutório recorrido que decidiu dispensar a prova testemunhal. O Recorrente alega que o despacho recorrido, que dispensou a inquirição das testemunhas, infringe o preceituado nos artigos 115.º e 118.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e artigo 392.º do Código Civil, devendo ser alterado no sentido de serem inquiridas as testemunhas arroladas. Relativamente à não consideração das diligências de prova requeridas, no caso, a prova testemunhal, é sabido que o processo judicial tributário é, pelo menos desde a Lei Geral Tributária, um processo de partes, pautado pelo princípio da legalidade, do contraditório e da igualdade de partes, devendo o tribunal decidir conforme os factos e as provas que lhe são apresentados dentro das regras processuais. E, por isso, o juiz só pode dispensar a fase de instrução dos autos «se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários» (artigo 113.º do CPPT), devendo, caso contrário, ordenar as diligências de prova necessárias, nomeadamente a testemunhal, em conformidade com o disposto nos artigos 114.º, 115, n.º 1 e 118.º do CPPT. Assim, embora o tribunal tenha, em princípio, de admitir todos os meios de prova que as partes ofereçam - posto que em processo tributário de impugnação são, em regra, admitidos todos os meios gerais de prova (artigo 115.º do CPPT) - pode recusar a sua produção caso exista norma legal que limite ou proíba determinado meio de prova ou julgue que as provas oferecidas são manifestamente impertinentes, inúteis ou desnecessárias. O direito à prova no procedimento e no processo tributário existe e é objecto de uma tutela muito forte, mas não constitui um direito absoluto, pois que o legislador ordinário estabeleceu limites e indicou critérios precisos de restrição do uso de meios de prova em relação a factos determinados, como acontece com o artigo 392.º do Código Civil, onde se estabelece que “A prova por testemunhas é admitida em todos os casos em que não seja directa ou indirectamente afastada”, e com o disposto nos artigos 393.º, 394.º e 395.º desse Código, que prevêem as situações em que é inadmissível a prova testemunhal. Em suma, compete ao juiz examinar, em cada processo judicial, se é legalmente permitida a produção dos meios de prova oferecidos pelas partes, e, no caso afirmativo, aferir da necessidade da sua produção em face das questões colocadas, sabido que a instrução tem por objecto os factos controvertidos e relevantes para o exame e decisão da causa tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito. Nesta linha de raciocínio, resulta claro que a dispensa, a não produção de quaisquer diligências de prova, não implica uma violação de qualquer acto/formalidade imposta por lei, já que é a própria lei que expressamente atribui ao juiz a faculdade de dela poder prescindir e não se vislumbra compatível que, de um passo, se confira ao juiz o poder de não produzir prova requerida pelas partes litigantes e, de outro e em simultâneo, se sancione a utilização de tal poder com um vício de forma fulminado com a nulidade. Em todo o caso, e com referência à avaliação do juiz que suporta a sua decisão de não considerar quaisquer diligências de prova, pode estar inquinada de erro, isto é, pode ter considerado, à luz das soluções jurídicas que postule como possíveis ao caso em apreciação, que os elementos provados já disponíveis eram bastantes e suficientes, sem que tal tenha, efectivamente, aderência à realidade, matéria em que nos deparamos com um vício de fundo consubstanciado em erro de julgamento, nessa medida inquinando o valor doutrinal da decisão proferida sem que tenha o apoio da prova prescindida – cfr. Acórdão deste TCAN, de 30/10/2014, proferido no âmbito do processo n.º 1073/09.6BEVIS. Antes de mais, cumpre, então, apreciar a fundamentação do despacho interlocutório proferido em 04/09/2017. Não olvidamos que o Recorrente peticiona a alteração do despacho recorrido e a sua substituição por outro que ordene a inquirição pelo Tribunal das testemunhas. No entanto, a análise de tal pedido reconduz-se a um controlo objectivo por parte deste tribunal, que passará sempre pela verificação e conhecimento da fundamentação ínsita no despacho recorrido; pois é, designadamente, em face das normas legais invocadas no despacho em crise que se poderá discernir se são essas ou outras as aplicáveis ao caso. Em síntese, a fundamentação do despacho ditará se a motivação do tribunal a quo se adequa ao pedido do Recorrente. De harmonia com o disposto no artigo 13.º CPPT, aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direcção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer. Por sua parte, como vimos, o artigo 114.º do mesmo diploma prevê que, não conhecendo logo do pedido, o juiz ordena as diligências de prova necessárias. Porém, desses preceitos não decorre que o juiz esteja obrigado à realização de todas as provas que sejam requeridas pelas partes, antes o dever de realizar e ordenar as correspondentes diligências se deve limitar àquelas que o tribunal considere, no seu livre juízo de apreciação, como úteis ao apuramento da verdade. Como entende Jorge Lopes de Sousa, no seu CPPT, anotado e comentado, 5.ª edição, na anotação 9 ao artigo 13.º, é o critério do juiz que prevalece no que concerne a determinar quais as diligências que são úteis para o apuramento da verdade, sendo inevitável em tal determinação uma componente subjectiva, ligada à convicção do juiz; o que não significa que a necessidade da realização das diligências não possa ser controlada objectivamente, em face da sua real necessidade para o apuramento da verdade, em sede de recurso (v. Jorge de Sousa, in CPPT anotado e comentado, páginas 168 e 169). É aqui pertinente o decidido no Acórdão do STA, de 05/04/2000, no âmbito do processo n.º 024713: “No processo judicial tributário vigora o princípio do inquisitório, o que significa que o Sr. Juiz não só pode, como também deve, realizar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade. Deste modo, tendo sido sugerida a realização de uma diligência, o Sr. Juiz só não deve fazer se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado.” Provavelmente já suscitando dúvidas à Meritíssima Juíza “a quo” a utilidade da prova testemunhal requerida, determinou, por despacho judicial de 23/01/2017, a notificação do autor para indicar, por referência ao respectivo articulado, os factos (sem suporte documental junto aos autos – caso contrário estar-se-ia a praticar actos inúteis) sobre os quais hão-de versar os depoimentos requeridos, de forma a melhor habilitar o tribunal na apreciação da necessidade de inquirição da(s) testemunha(s) arrolada(s), bem como a agendar a respectiva diligência. O oponente veio informar o tribunal acerca dos factos que pretendia provar com a prova testemunhal arrolada, indicando os artigos 23, 24, 26, 30 a 50 da petição inicial. Em requerimento autónomo, solicitou, ainda, a alteração do rol de testemunhas. Ora, num primeiro momento, o tribunal “a quo” parecia tencionar realizar a diligência de inquirição de testemunhas, dado que deferiu a requerida alteração do rol de testemunhas. Depois, acabou por considerar que os autos já tinham os elementos necessários para a decisão da causa e dispensou a prova testemunhal, através do despacho recorrido. Verifica-se, desde logo, que o vertido nesses artigos indicados consubstancia matéria vaga e genérica, como, mais tarde, é reconhecido na sentença recorrida, considerando-a conclusiva. Saliente-se que, apesar de o poder de realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados estar previsto oficiosamente, sempre poderá ser exercido a requerimento das partes ou do Ministério Público, não perdendo de vista que a descoberta da verdade material deve ser conjugada com os princípios da eficácia e racionalidade do processo tributário – cfr. anotação ao artigo 99.º da Lei Geral Tributária, efectuada por António Lima Guerreiro, na página 413, na Edição de Rei dos Livros. Ora, a concretização do princípio do inquisitório em direito fiscal abstrai-se de aspectos formais, relevando somente, como vimos, averiguar se determinada diligência é substancialmente útil. Na verdade, o tribunal a quo considerou que seria um acto desnecessário (inútil, proibido por lei), determinar a inquirição das testemunhas indicadas pelo Recorrente, além do mais, por os autos estarem munidos de prova documental. Os fundamentos do despacho recorrido, apesar de serem apresentados de forma não concretizada, são apreensíveis através da concatenação de todos os elementos ínsitos nos autos, no sentido da desnecessidade de mais instrução. Relembramos que, com a matéria alegada nos artigos 23, 24, 26, 30 a 50 da petição de oposição, o Recorrente pretendia afastar a presunção de culpa que sobre si impende, por força do disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b) da LGT – quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento. O tribunal recorrido anteviu que a matéria alegada não seria suficiente para ilidir a referida presunção de culpa e que foi apresentada de forma conclusiva. Não vislumbramos qualquer erro de julgamento nessa apreciação, pois ao longo dos referidos artigos do articulado de oposição o Oponente pretendeu somente remeter para factores exógenos, sem indicar um único comportamento que tivesse adoptado, limitando-se a afirmar que sempre actuou responsavelmente com intuito de cumprir todas as obrigações a que se encontrava obrigado por dever de zelo, nomeadamente em relação às obrigações fiscais, quer declarativas quer de pagamento dos tributos. Recordamos competir ao juiz examinar, em cada processo judicial, se é legalmente permitida a produção dos meios de prova oferecidos pelas partes e, no caso afirmativo, aferir da necessidade da sua produção em face das questões colocadas, sabido que a instrução tem por objecto os factos invocados controvertidos ou de que oficiosamente o tribunal pode conhecer e relevantes para o exame e decisão, tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito – cfr. artigo 99.º, n.º 1 da LGT. Ora, o oponente invocou, essencialmente generalidades, não contextualizadas no espaço e no tempo, não individualizando quaisquer situações. Aludiu a graves dificuldades financeiras e inesperadas indisponibilidades de tesouraria, ficando em causa o pagamento atempado dos impostos (artigo 26.º), que decorreram de factores externos (artigo 27.º); apesar de a empresa sempre ter tido uma carteira de encomendas normal para a sua dimensão, as dívidas de clientes foram-se avolumando ao longo de vários anos (artigo 35.º), sem que se concretize o significado de uma carteira de encomendas normal, nem se quantifique ou identifique as dívidas de clientes e em que anos; não obstante os vários esforços desenvolvidos para o recebimento das dívidas de clientes, os valores efectivamente recebidos foram quase sempre residuais (artigo 36.º), não se individualizam as acções (esforços) no sentido de receber os montantes em dívida, nem o que foi realmente recebido; dificuldades na obtenção de financiamento (artigo 37.º); acentuada quebra nas vendas (artigo 38.º), sem concretizar a sua dimensão – da dificuldade e da quebra; diminuição muito significativa na facturação da empresa (artigo 39.º); acentuar da crise económica global, restrições cada vez maiores ao crédito e a venda de imóveis praticamente estagnou (artigos 40.º a 42.º), insistindo-se nos conceitos vagos e indeterminados e nos juízos conclusivos nestes e nos artigos seguintes, jamais concretizando a falta de liquidez no momento em que deveriam ter sido pagos os tributos em causa (artigo 50.º). É absolutamente notório que a técnica, socorrendo-se de uma formulação vaga e genérica, utilizada nestes artigos da petição inicial não permite que se produza qualquer tipo de prova sobre esta matéria, uma vez que encerra essencialmente ilações e conclusões de facto. É de total clareza que tais juízos conclusivos jamais poderão integrar o probatório. Nestes termos, apesar de a fundamentação do despacho interlocutório recorrido não se afigurar concretizada e direccionada a qualquer específica alegação, tendo antes optado por uma formulação genérica remissiva, menos convincente, - compulsados os autos (…) encontrando-se os autos munidos de tal prova - os elementos ínsitos nos autos são, com efeito, suficientes para decidir a causa - dado ressaltar um problema de alegação - apresentando-se a produção da prova testemunhal um acto inútil (proibido legalmente). Pelo exposto, será de negar provimento ao recurso da decisão interlocutória, que considerou que os autos estavam instruídos com os documentos necessários à decisão, e mantê-la na ordem jurídica. O recurso da sentença recorrida tem, também, como fundamento a circunstância de o tribunal recorrido ter dispensado a produção da prova testemunhal, vedando, dessa forma, a possibilidade de o Recorrente demonstrar a sua ausência de culpa na falta de pagamento dos impostos devidos. Para tanto, sustenta ter alegado factos concretos para realização da inquirição das testemunhas arroladas na petição inicial, e sendo estes relevantes para a decisão da causa, a omissão de tal diligencia de prova, afectou o julgamento da matéria de facto, acarretando assim a anulação da sentença por défice instrutório. Acrescentou que, para prova de tais factos, deveriam ter sido complementados com a inquirição das testemunhas arroladas, pois era fundamental demonstrar o que aconteceu à sociedade para que esta não tivesse os meios económicos e financeiros suficientes para pagar os impostos e qual o comportamento do oponente para reverter tal situação e análise da culpa deste. O tribunal recorrido acabou por acentuar, na sentença, o carácter conclusivo das alegações na petição inicial. E, como já deixámos claro na análise ao recurso da decisão interlocutória, configurava uma narrativa de generalidades e juízos conclusivos, sem sustentação em factos concretos. Com efeito, é notório que o problema do presente caso é de alegação, dado afirmar que somente com o fim do arresto foi possível refazer a contabilidade e que tal facto, em conjunto com a exposição abaixo, determinou o incumprimento verificado; quando supostamente iria concretizar na petição de oposição, individualizar e densificar os factos, o oponente limita-se a transmitir generalidades e conclusões, insusceptíveis de produção de prova – cfr. artigos 26.º, 30.º a 50.º, já escalpelizados na análise do recurso do despacho recorrido. Ora, não podemos deixar que acolher a motivação da sentença recorrida, que recupera a jurisprudência pacífica aplicável ao caso. Em boa verdade, não perdendo de vista a alegação, o Recorrente nada fez, tão-pouco apresentou a sociedade à insolvência; sem que se mostre quantificada a insuficiência de fundos ou de liquidez na data em que devia ter pago os tributos e sem que nada alegasse sobre a concreta actividade de gestão por si exercida, que fosse passível de prova testemunhal. O que se exige é tão-só o empenho e actividade dedicada do gestor no pagamento dos créditos fiscais e/ou na preservação do património que há-de, a final, garantir o seu pagamento (o património do devedor constitui a garantia geral dos créditos tributários – artigos 50.º, n.º 1 LGT e 601.º do Código Civil). E se, porventura, esse pagamento se tornar impossível, que o gestor demonstre, pelo menos, ter feito tudo o que estava ao seu alcance para que os créditos fiscais não fossem defraudados. Esta exigência é o que se reputa de «condição mínima» para «desculpabilizar» a falta de pagamento de qualquer imposto, sem distinguir as repercussões e características próprias de cada um – cfr. Acórdão do TCAN, de 18/09/2014, proferido no âmbito do processo n.º 1126/06.2BEBRG. Não foi descrito qualquer comportamento do Recorrente neste sentido, logo não será possível produzir a respectiva prova. Apesar da dificuldade que existe na prova de um facto negativo, como é o caso da ausência de culpa, o oponente não pode deixar de alegar e provar factos concretos de onde se possa inferir que o não pagamento das dívidas tributárias revertidas se deveu a circunstâncias que lhe são alheias e que não lhe podem ser imputadas. Para afastar a responsabilidade subsidiária por dívidas de impostos cujo prazo de pagamento terminou durante a gestão, o gestor tem pois que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável (cfr., entre outros, Acórdãos do STA, de 12/03/2003, in recurso n.º 1209/02, de 11/07/2012, in recurso n.º 824/11, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e Processo Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.465 e ss. e Isabel Marques da Silva, in A Responsabilidade Tributária dos Corpos Sociais, em Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, Lisboa, 1999, pág.121 e seg.). Demonstrada que seja a falta de pagamento ou de entrega da dívida tributária por parte da sociedade originária devedora, recairá sobre o gestor o ónus da prova da falta de culpa por tal facto, sendo certo que a lei impõe a quem exerça funções de administração em pessoas colectivas ou entes fiscalmente equiparados «o cumprimento dos deveres tributários das entidades por si representadas» (artigo 32.º da LGT). Para tanto, sempre haveria que provar-se factualidade que permitisse a conclusão de que a sociedade não tinha os fundos necessários à entrega do imposto e que o Oponente nenhuma responsabilidade tinha nessa situação – cfr., neste mesmo sentido, o Acórdão do TCAN, de 29/10/2009, proferido no âmbito do processo n.º 00228/07.2BEBRG. O que manifestamente não ocorreu no caso em análise. In casu, é notória a insuficiência da alegação do oponente na petição de oposição, remetendo-se a meras generalidades, num contexto de crise económica, como deixámos expresso supra. Haveria, isso sim, que demonstrar que a falta desse pagamento, da entrega desse imposto, não foi imputável ao oponente, o que passaria pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora (entre 20-10-2009 e 14-12-2011) para efectuar o pagamento e que tal falta se não deveu a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor. Recordamos que a dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores, pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o Oponente. Sublinha-se, portanto, que o cumprimento do ónus probatório, nestas situações, só se alcança mediante prova positiva e concludente, sendo que qualquer situação de dúvida se decide contra a parte onerada com o mesmo, no caso, o Oponente, ora Recorrente. A falta de instrução que é apontada neste recurso ao tribunal recorrido não é de acolher, na medida em que a matéria sobre que incidiria a prova testemunhal dispensada (cfr. conclusão G) não são verdadeiros factos simples, individualizados, poderiam ter sido invocados em qualquer processo, faltando a densificação e recondução ao caso da devedora originária, concretizando a diminuição do volume das suas vendas, a quantificação da insuficiência financeira ou a expressão das dívidas dos clientes. Na falta de alegação de factos pertinentes, é impossível a prova da matéria que não foi invocada. Sendo também inviável, por esse mesmo motivo, ao tribunal retirar ilações sobre a imputação ou a ausência de culpa. Ora, temos por líquido que a matéria de facto só deve integrar factos concretos e não formulações genéricas, de direito ou conclusivas, mormente quando, como no caso, preencham, só por si, a hipótese legal, dispensando qualquer subsunção jurídica ou, dito de outro modo, traduzam uma afirmação ou uma valoração de facto que se insira na análise das questões jurídicas que definem o objecto da acção, comportando uma resposta ou componente de resposta àquelas questões. No caso, verifica-se que a matéria que nos é proposta e cuja demonstração se pretende realizar através da inquirição das testemunhas indicadas (ausência de culpa) é constituída por matéria conclusiva e que pode ser considerada matéria de direito, o que impede a sua recondução ao probatório. Nesta conformidade, não vislumbramos qualquer utilidade na audição das testemunhas, nem verificamos défice instrutório para a decisão da causa. Sem necessidade de mais amplas considerações, importa concluir no sentido da improcedência deste segmento do recurso. Alega, ainda, o Recorrente que foi omitida pronúncia sobre a gerência de facto pelo oponente, tarefa que incumbia ao Tribunal, por se encontrar adstrito à descoberta da verdade material, de acordo com o disposto no artigo 265.º do CPC, aplicável por força do artigo 2.º e 13.º, n.º 1, ambos do CPPT, sendo certo que, na sua óptica, a AT não apresentou a inerente prova relativamente a este pressuposto necessário para poder operar a reversão. Compulsando o procedimento de reversão, observamos que a AT afirma expressamente o exercício da gerência pelo oponente, que este, tendo sido ouvido em sede de audição prévia, nada referiu a esse propósito, não tendo negado a gerência de facto, que foi proferido despacho de reversão aludindo ao exercício efectivo da gerência, com indicação de vários actos praticados e de várias intervenções do gerente nominal, que era gerente único, remetendo para os respectivos documentos comprovativos, e que na oposição em apreço, meio onde poderia ter sido discutida amplamente a legalidade do despacho de reversão, seja do ponto de vista formal seja da perspectiva substantiva, o oponente limita-se a reconhecer o exercício da gerência e a AT, na sua resposta, considerou tratar-se de confissão, que expressamente aceitou. Com efeito, ressalta do teor da oposição que o oponente pretendeu demonstrar que in casu inexiste qualquer culpa sua na falta de pagamento do imposto em débito. Referindo no artigo 22.º da petição inicial que, no exercício das funções de administrador da devedora originária, o oponente sempre atuou responsavelmente com intuito de cumprir todas as obrigações a que se encontrava obrigado por dever de zelo, nomeadamente em relação às obrigações fiscais, quer declarativas quer de pagamento dos tributos. Não residem dúvidas que o efeito jurídico pretendido pelo oponente, ora Recorrente, com a presente oposição é a extinção do processo de execução fiscal em relação a si, conforme consta da petição in fine. Para alcançar tal resultado pedido, observamos que o Recorrente invocou a sua ilegitimidade substantiva, por considerar não se verificarem os pressupostos previstos legalmente para a sua responsabilidade subsidiária pelas dívidas em cobrança coerciva. Desses requisitos para operar a reversão da execução fiscal, o oponente destacou um na petição de oposição para demonstrar a sua ilegitimidade nesse processo executivo: o gerente (não) ter actuado com culpa na falta de pagamento dos tributos em causa. Este fundamento é a causa de pedir, é a questão colocada para atingir o efeito jurídico pretendido – a extinção do processo de execução fiscal. Percorrendo todo o articulado, o oponente aborda o requisito da culpa pressupondo o efectivo exercício das suas funções enquanto gerente (único) da sociedade devedora originária – cfr. artigo 22.º da petição de oposição. Nesta conformidade, o facto jurídico que o Recorrente introduz nestas alegações é diferente do invocado na petição inicial. Verifica-se que no articulado não foi autonomizada a questão da gerência de facto, o que sai reforçado nas alegações de recurso quando se apela ao princípio da descoberta da verdade material e se sustenta que o Tribunal deve conhecer de todas as questões, independentemente da sua alegação pelas partes. Face ao que vem invocado na petição inicial, não residem dúvidas que, se por um lado, o Recorrente nunca põe em causa a sua gerência na sociedade executada originária, por outro, dedica toda a sua argumentação a invocar a ilegitimidade por ausência de culpa na falta de pagamento das dívidas aqui em causa. In casu, como se viu, a falta de culpa na insuficiência do património/omissão de pagamento nada tem que ver com a falta de gerência da sociedade executada originária, embora sejam ambos pressupostos da ilegitimidade, são questões autónomas, isto é, se o tribunal recorrido tivesse apreciado na sentença tal suposto vício, estaríamos perante excesso de pronúncia, dado que, além de não ser de conhecimento oficioso, como parece querer fazer crer o Recorrente, também consubstancia causa de pedir distinta da invocada pelo oponente, que sempre assumiu a gerência, como vimos. A omissão de pronúncia ocorre quando o Juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, acarretando a nulidade prevista no artigo125.º do CPPT. Não é manifestamente o caso, pois todas as questões suscitadas na petição de oposição foram apreciadas na sentença, tudo se reconduzindo, no fundo, à ilegitimidade do Recorrente por inexistência de culpa na insuficiência patrimonial de devedora originária, não incumbindo ao tribunal recorrido qualquer análise sobre a gerência de facto. Não omitiu, também, a sentença pronúncia sobre factos alegados na petição, dado que a postura do Recorrente sempre se orientou no sentido da admissão do exercício efectivo da gerência, sendo natural que o tribunal “a quo” desse por assente a verificação deste outro pressuposto para poder operar a reversão; apresentando-se, agora, algo temerário o comportamento do Recorrente neste recurso, alertando inovatoriamente para o disposto nas conclusões L) a Q) das alegações. Urge, assim, concluir no sentido da improcedência da totalidade das conclusões do recurso, e, assim, julgá-lo totalmente não provido. Conclusões/Sumário I - Embora o tribunal tenha, em princípio, de admitir todos os meios de prova que as partes ofereçam, pode recusar a sua produção caso exista norma legal que limite ou proíba determinado meio de prova ou julgue que as provas oferecidas são manifestamente impertinentes, inúteis ou desnecessárias. II - No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto [artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT]. III – Haverá que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor. IV - A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores, pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente. IV. Decisão Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento a ambos os recursos. Custas a cargo do Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais Porto, 29 de Maio de 2025 Ana Patrocínio Maria do Rosário Pais Ana Paula Rodrigues Coelho dos Santos |