Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 01819/20.1BEBRG-S1 |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 06/30/2022 |
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Tribunal: | TAF de Braga |
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Relator: | Carlos de Castro Fernandes |
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Descritores: | PROVA PERICIAL; |
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Sumário: | I – No processo de impugnação judicial compete ao juiz examinar se é legalmente permitida a produção da prova pericial solicitada pelas partes em face das normas que disciplinam a admissibilidade desse meio de prova, e, no caso afirmativo, aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária. Aliás, a rejeição de perícia requerida apenas pode ocorrer com fundamento na sua impertinência ou carácter dilatório. II – O tribunal só não deve realizar uma diligência instrutória requerida se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado. III – Se entender que a diligência pericial não é impertinente nem dilatória, o juiz ouve a parte contrária sobre o objeto proposto, facultando-lhe aderir a este ou propor a sua ampliação ou restrição – cfr. artigo 476.º, n.º 1 do Código de Processo Civil. IV – O julgador, ao determinar o objeto da prova pericial, indefere as questões suscitadas pelas partes que considere inadmissíveis ou irrelevantes – cfr. artigo 476.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.* * Sumário elaborado pelo relator |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I – AA--- (recorrente), melhor identificada nos autos, veio apresentar recurso do despacho proferido nestes, datado de 28.10.2021, pelo qual se indeferiu a realização de prova pericial. No presente recurso, a ora Recorrente formula as seguintes conclusões: 1.º O despacho recorrido parece colidir com o princípio do inquisitório, porquanto os autos ainda não dispõem de factos que permitam a distinção entre aglomerados, betumes e filer ou se aqueles produtos (aglomerado, betume e filer) se incluem ou não na mistura betuminosa ou no mástique betuminoso; sendo certo que tal inexistência é passível de suprimento com os meios de prova requeridos. 2.º O facto de a impugnante apresentar meios de prova para o suporte factual acima referido e a inexistência de tais factos não permitem que o Tribunal indefira tais meios probatórios e remeta as respetivas consequências para as regras de distribuição do ónus da prova. 3.º O princípio do inquisitório é especialmente compactado, porquanto em relação à prova pericial, o Tribunal nunca solicitou à impugnante o que pretendia ver provado com a respetiva prova. 4.º O indeferimento de prova pericial violou o princípio do inquisitório, o que se invoca para os devidos efeitos. 5.º O artigo 388.º do Código Civil impõe o recurso à prova pericial quando «sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem». 6.º O indeferimento da prova pericial in casu é suportado pela inexistência de necessidade de conhecimentos especiais. 7.º Não é conforme ao princípio do inquisitório que os apuramentos daqueles «conhecimentos especiais» sejam aferidos em concreto, perante determinado julgador. 8.º O conhecimento necessário ao apuramento da natureza dos produtos acima referidos (betume, pó mineral, filer, mistura betuminosa e mástique betuminoso) e à correspondente classificação pautal não decorre da cultura geral e da experiência comum. 9.º Está-se perante uma matéria iminentemente técnica, que reclama conhecimento científico e técnico altamente especializado em abstrato; o qual por não fazerem parte da cultura geral e da experiência comum, se devem presumir não serem detidos pelo juiz. 10.º Nestes termos, o indeferimento de prova pericial violou o princípio do inquisitório e a imposição legal imposta no artigo 388.º do Código Civil, o que se invoca para os devidos efeitos. Termina a Apelante peticionando que seja concedido provimento ao presente recurso, proferindo-se acórdão que decida pela revogação do despacho recorrido. Notificada do presente recurso, a Recorrida nada veio a dizer. * Indo os autos com vista ao digno Procurador-Geral Adjunto, o mesmo emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao presente recurso (cf. fls. 145 e segs. dos autos – paginação do SITAF).Do referido parecer foi dado conhecimento às partes em presença. * Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.-/- II – No presente recurso cabe decidir se o despacho recorrido, na parte em que se indeferiu a realização de prova pericial, padece de erro de julgamento. -/- III – Cumpre apreciar e decidir o presente recurso. Assim, há que previamente referir que o presente recurso foi tempestivamente interposto, sendo esta a instância competente para dele conhecer (cf. n.º 1 do art.º 280.º do CPPT). Igualmente há que ter em conta que o presente recurso tem como objeto uma decisão proferida pelo Tribunal de primeira instância e pela qual se rejeitou um meio de prova, pelo que estamos perante uma situação de apelação autónoma (cf. alínea d) do n.º 2 do art.º 644.º do CPC ex vi art.º 281.º do CPPT). Ora, para melhor apreciar a presente questão convém ter presente algumas circunstâncias factuais que decorrem dos presentes autos. Assim, destes resulta que: 1 – A Recorrente intentou no TAF de Braga uma impugnação judicial que deu origem ao processo n.º 1819/20.1BEBRG e na qual solicitou a declaração de invalidade da liquidação de ISP 2020/90... de 26-03-2020 – cf. fls. 2 e segs. dos autos – paginação do SITAF; 2 – Em 28.10.2021, foi proferido o seguinte despacho pelo(a) MMº.(ª) Juiz(a) titular dos presentes autos, do qual se retira que: “[…] i). Atenta a falta de resposta ao Despacho a fls 115 do SITAF, analisada a prova documental constante dos autos, a posição das partes nos articulados apresentados bem como as regras de distribuição do ónus da prova, entende este Tribunal não haver necessidade em inquirir as testemunhas arroladas nem se antevê qualquer interesse na prova pericial requerida, na medida em que não estão em causa factos cuja apreciação e percepção careçam de conhecimentos especiais, tal diligência é impertinente e dilatória – Cf. art. 388º do CC ex vi art. 2.º, al. a) do CPPT e art. 2.º, al. d) da LGT e arts. 411º, 413º e 476º, todos do CPC ex vi art. 2.º, al. e) do CPPT, a contrario. No mais, compulsados os autos, entendemos que o processo contém todos os elementos necessários à decisão pelo que decidir-se-á pelo imediato conhecimento do pedido nos termos do artigo 113.º do C.P.P.T. Nestes termos, dispenso a inquirição das testemunhas arroladas bem como a prova pericial requerida.[…]” – cf. fls. 2 e segs. dos autos – paginação do SITAF. Na perspetiva da ora Recorrente, a decisão jurisdicional ora recorrida afronta a regra do princípio do inquisitório, assim como o disposto no art.º 388.º do Código Civil. A propósito de uma situação com contornos semelhantes à dos presentes autos, já teve a oportunidade de se pronunciar este TCA. Assim, no acórdão proferido por esta instância no processo n.º 00374/19.0BEAVR-R1, datado de 14.07.2020 (in www.dgsi.pt), relatou-se que: “[…] De harmonia com o disposto no artigo 13.º Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direcção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer. Por sua parte, o artigo 114.º do mesmo diploma prevê que, não conhecendo logo do pedido, o juiz ordena as diligências de prova necessárias. Porém, desses preceitos não decorre que o juiz esteja obrigado à realização de todas as provas que sejam requeridas pelas partes, antes o dever de realizar e ordenar as correspondentes diligências se deve limitar àquelas que o tribunal considere, no seu livre juízo de apreciação, como úteis ao apuramento da verdade. Como entende Jorge Lopes de Sousa, no seu CPPT, anotado e comentado, 5.ª edição, na anotação 9 ao artigo 13.º, é o critério do juiz que prevalece no que concerne a determinar quais as diligências que são úteis para o apuramento da verdade, sendo inevitável em tal determinação uma componente subjectiva, ligada à convicção do juiz; o que não significa que a necessidade da realização das diligências não possa ser controlada objectivamente, em face da sua real necessidade para o apuramento da verdade, em sede de recurso (v. Jorge de Sousa, in CPPT anotado e comentado, páginas 168 e 169). Mantém pertinência o decidido no Acórdão do STA, de 05/04/2000, no âmbito do processo n.º 024713: “No processo judicial tributário vigora o princípio do inquisitório, o que significa que o Sr. Juiz não só pode, como também deve, realizar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade. Deste modo, tendo sido sugerida a realização de uma diligência, o Sr. Juiz só não deve fazer se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado.” Também o regime da proposição e da fixação do objecto da prova pericial aponta no mesmo sentido. Conforme se dispõe no artigo 475.º, n.º 1, do CPC, no caso de a perícia ser requerida por alguma das partes, a requerente, indica logo, sob pena de rejeição, o respectivo objecto, enunciando as questões de facto que pretende ver esclarecidas através da requerida diligência. Acrescentando-se no seu n.º 2 que a perícia pode reportar-se quer a factos articulados pela própria requerente, quer pela parte contrária. Nos termos do seu artigo 476.º, entendendo que a diligência não é impertinente nem dilatória, o Juiz ouve a parte contrária sobre o objecto proposto, facultando-lhe aderir a este ou propor a sua ampliação ou restrição, cabendo ao Juiz, no despacho em que ordene a realização da diligência, determinar o respectivo objecto, indeferindo as questões suscitadas pelas partes que considere inadmissíveis ou irrelevantes ou ampliando-o a outras que considere necessárias ao apuramento da verdade. Efectivamente, como resulta dos preceitos acima citados, a rejeição da perícia requerida apenas pode ocorrer com fundamento na sua impertinência ou carácter dilatório. Ao dizer-se na norma acabada de citar que incumbe ao juiz, ao determinar o objecto da prova pericial, indeferir as questões suscitadas pelas partes que considere inadmissíveis ou irrelevantes, tal significa que o juiz tem o dever de pronunciar-se sobre o objecto da perícia proposto pelas partes. E significa, também, que o poder de rejeitar esse objecto não é um poder discricionário; o juiz só o pode rejeitar com fundamento na respectiva inadmissibilidade ou irrelevância. […] Nos termos do disposto no artigo 115.º e seguintes do CPPT, são admissíveis no processo tributário os meios gerais de prova, nomeadamente, a pericial, permitindo o artigo 113.º, n.º 1 do mesmo diploma que o juiz conheça de imediato o pedido se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários. […] Efectivamente, o Recorrente, na petição inicial, enunciou factualidade que, em seu entender, permite concluir pelo erro na quantificação da matéria tributável, juntando prova documental, além de ter arrolado testemunhas, e solicitou a produção de prova pericial. “(…) O processo judicial tributário é, pelo menos desde a Lei Geral tributária, um processo de partes, pautado pelo princípio da legalidade, do contraditório e da igualdade de partes, devendo o tribunal decidir conforme os factos e as provas que lhe são apresentados dentro das regras processuais. E, por isso, o juiz só pode dispensar a fase de instrução dos autos "se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários" (artigo 113° do CPPT), devendo, caso contrário, ordenar as diligências de prova necessárias, (…), em conformidade com o disposto nos artigos 114°, 115° n°1 e 119° do CPPT. Assim, embora o tribunal tenha, em princípio, de admitir todos os meios de prova que as partes ofereçam - posto que em processo tributário de impugnação são, em regra, admitidos todos os meios de prova (artigo 115° do CPPT) - pode recusar a sua produção caso exista norma legal que limite ou proíba determinado meio de prova ou julgue que as provas oferecidas são manifestamente impertinentes, inúteis ou desnecessárias (…)” – cfr. Acórdão do STA, de 14/09/2011, proferido no âmbito do processo n.º 0215/11. Em suma, compete ao juiz examinar, em cada processo judicial, se é legalmente permitida a produção dos meios de prova oferecidos pelas partes e, no caso afirmativo, aferir da necessidade da sua produção em face das questões colocadas, sabido que a instrução tem por objecto os factos invocados controvertidos ou de que oficiosamente o tribunal pode conhecer e relevantes para o exame e decisão, tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito – cfr. artigo 99.º, n.º 1 da LGT. […]” Ora, como resulta do art.º 388.º do CC: “a prova pericial tem por fim a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objeto de inspeção judicial”. Na situação ora em apreço, resulta que a razão subjacente ao indeferimento da perícia requerida pela então Impugnante seria que não estariam em causa factos cuja apreciação e perceção carecessem de conhecimentos especiais. Por isso, na visão do Tribunal recorrido, tal diligência seria impertinente e dilatória. Ora, se atentarmos na petição inicial que aqui se faz alusão podemos constatar que, do ponto de vista formal, é indicada a matéria a que se pretende que seja realizada a perícia. Assim, quanto ao objeto da perícia, a Impugnante no seu articulado inicial refere que pretende que a mesma incida sobre a classificação pautal e o valor aduaneiro das mercadorias em causa (embora, quiçá, tal pedido merecesse melhor concretização, em conexão com a matéria alegada nos diferentes artigos da petição inicial). Ora, quanto a este propósito probatório insurgiu-se a Recorrida, alegando, em suma, que era incontroversa a classificação pautal dos produtos, assim como era indubitável a sua inserção normativa para efeitos de aplicação do imposto em causa (ISP) (cf. contestação a fls. 135 e segs. dos autos – paginação do SITAF). Deste modo, se atentarmos no teor da petição inicial do processo de impugnação aqui referenciado, podemos constatar que o ora Recorrente contesta quer a classificação pautal em causa efetuada pelos serviços da Recorrida, quer a forma como terá sido apurado a quantificação das mercadorias em causa. Com efeito, a então Impugnante (aqui Recorrente) afirmou, designadamente, na petição inicial que: 111.º O código 2715 atribuído pela autoridade tributária e previsto no Regulamento (CEE) 2658/87 não tem por fito a tributação de aglomerados mas de mástiques betuminosos e cut-backs (betumes fluidificados). 112.º De facto, aquele Regulamento prevê que é classificado o código 2715 quando se está perante misturas betuminosas com custos sociais no domínio dos Impostos Sobre os Produtos Petrolíferos – é esta a lógica do sistema de Impostos Sobre o Consumo; 113.º E para tal o Regulamento, dentro deste «espírito tributário de custos sociais relacionados com a poluição»; 114.º O legislador exemplificou o que entende por misturas betuminosas: mástiques betuminosos ou cut-backs – são estes que comportam custos sociais de poluição de produtos petrolíferos ou energéticos no domínio dos Impostos Sobre os Produtos Petrolíferos. 115.º Para tal, basta estudar os termos técnicos no domínio da engenharia civil. 116.º A título exemplificativo, veja-se a tese de doutoramento de Hugo Manuel Ribeiro Dias da Silva, apresentada à Escola de Engenharia da Universidade do Minho em 2005, com o título «Caracterização dos Mástique Betuminoso e da ligação Agregado- Mástique: Contribuição para o Estudo do Comportamento das Misturas Betuminosas», disponível no sítio em linha http://hdl.handle.net/18225981 . 117.º Nesta, refere-se, sem margem para dúvidas, que há uma distinção entre «mistura betuminosa» e o «mástique betuminoso», que é o que está sujeito à classificação 2715. 118.º O mástique betuminoso consiste numa «mistura de filer e de betume (…) [o qual] forma uma matriz com um comportamento visco-plástico» (ver página 72 e página 73 da referida tese de doutoramento). 119.º O filer, um pó de origem rochosa, formado por calcário ou cal hidráulica, tem a função de impermeabilização; 120.º O betume, designado por ligante betuminoso, é obtido pela destilação direta do petróleo puro sendo classificado através do valor obtido no ensaio de penetração a 25 graus celsius durante 5 segundos (norma EN 1426), para avaliar o grau de viscosidade ou dureza (página 15 da tese de doutoramento). ASSIM, 121.º A junção do betume ao filer cria um produto betuminoso (aglomerante) designado por «mástique betuminoso». 122.º Excluem-se do conceito de «mástique betuminoso», consequentemente, os respetivos agregados (aglomerados) – que podem ser as referidas areias finas ou grossas (brita) ou pedra. 123.º Os agregados têm uma origem geológica, podendo ser constituídos por areias de rios ou rocha britada, com a finalidade de dar resistência às deformações permanentes dos pavimentos (páginas 28 a 30 da tese de doutoramento). 124.º Assim, os agregados não se confundem com os mástiques betuminosos, antes dando origem a diferentes pavimentos, consoante o tipo de agregado (página 90 da tese de doutoramento). 125.º Em suma, o que é tributado por força do Regulamento (CEE) 2658/87 é o aglomerante – mástique betuminoso – e não o aglomerado. 126.º Foi precisamente o que o legislador pretendeu, ao exemplificar o que deve ser tributado, indicando os mástique betuminosos e os cut-backs, que são betumes fluidificados. 127.º Nestes termos, os produtos em causa estão erroneamente classificados no código 2715, tendo em conta que nesse código não se incluem os aglomerados. 128.º No mesmo sentido, o valor aduaneiro das mercadorias está erroneamente quantificado. 129.º Assim, requer-se a correta classificação pautal e o valor aduaneiro das mercadorias em causa.” Desta alegação, complementada com o que no demais vai dito na petição inicial, torna-se particularmente evidente que estamos perante matéria de caráter eminentemente técnico e que diz respeito à composição concreta de um determinado produto e sua caraterização, sendo que para estas ter-se-á que apelar a específicos conhecimentos de natureza técnica conexos com a caraterização física dos materiais aqui em causa e que foram sujeitos a ISP. Denote-se que no despacho interlocutório aqui em causa não se explicita a razão concreta para a rejeição do presente meio de prova solicitado, quedando-se o decidido por uma formulação genérica quanto à desnecessidade de conhecimentos técnicos especiais. Porém, torna-se patente que assim não é, uma vez que a configuração dos produtos sujeitos à tributação impugnada é, do ponto de vista técnico, em si mesma controvertida e requer uma amplitude de conhecimentos que não são de indubitável intelecção pelos Tribunais. Ora o apontado juízo insere-se na pertinácia da perícia requerida, sendo que quanto ao apontado e decidido caráter dilatório, o Tribunal recorrido nada de concreto afirma e que possa consubstanciar um eventual efeito processualmente ilícito de atraso no prosseguimento e decisão dos presentes autos. Por isso, deveria o Tribunal recorrido ter-se pronunciado concreta e especificadamente sobre a pertinência e utilidade da perícia requerida e, caso não a admitisse, deveria ter explicado a motivação de tal decisão, de acordo com o imposto pelos artigos 13.º do CPPT, 99.º da LGT e 476.º, n.º 1 do novo CPC. Por outro lado, não se nos afigura que a realização da requerida perícia seja impertinente, ou que possa ser considerada como um expediente processual dilatório. Assim, deverá o Tribunal recorrido dar cumprimento ao disposto no artigo 476.º do novo CPC, admitindo a realização da prova pericial e definindo concretamente o objeto da perícia, desta forma se dando cumprimento ao dever de apuramento da verdade, matriz processual que dimana do disposto no art.º 13.º do CPPT. Por isso, conclui-se que terá que proceder o presente recurso. -/- Nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, assume-se aqui o seguinte sumário retirado do processo n.º00374/19.0BEAVR-R1: I – No processo de impugnação judicial compete ao juiz examinar se é legalmente permitida a produção da prova pericial solicitada pelas partes em face das normas que disciplinam a admissibilidade desse meio de prova, e, no caso afirmativo, aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária. Aliás, a rejeição de perícia requerida apenas pode ocorrer com fundamento na sua impertinência ou carácter dilatório. II – O tribunal só não deve realizar uma diligência instrutória requerida se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado. III – Se entender que a diligência pericial não é impertinente nem dilatória, o juiz ouve a parte contrária sobre o objeto proposto, facultando-lhe aderir a este ou propor a sua ampliação ou restrição – cfr. artigo 476.º, n.º 1 do Código de Processo Civil. IV – O julgador, ao determinar o objeto da prova pericial, indefere as questões suscitadas pelas partes que considere inadmissíveis ou irrelevantes – cfr. artigo 476.º, n.º 2 do Código de Processo Civil. -/- IV – Com os fundamentos supra expostos, concede-se provimento ao recurso, revogando-se a decisão interlocutória recorrida, anulando todos os atos subsequentes com ela incompatíveis, e determina-se que o processo n.º 1819/20.1BEBRG retome a fase de instrução, se a isso nada mais obstar. Custas pela Recorrida (por vencida, não sendo por esta devida a taxa de justiça pela interposição do presente recurso, uma vez que não contra-alegou). Porto, 30 de junho de 2022 Os juízes desembargadores Carlos A. M. de Castro Fernandes Tiago A. Lopes de Miranda Cristina da Nova |