Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00447/10.4BEMDL |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 04/27/2022 |
| Tribunal: | TAF de Mirandela |
| Relator: | Rosário Pais |
| Descritores: | NULIDADE DA SENTENÇA; ESPECIFICAÇÃO FACTOS NÃO PROVADOS; ANÁLISE CRÍTICA DA PROVA; IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO; CORREÇÃO MATÉRIA COLETÁVEL; USO SIMULTÂNEO DE MÉTODOS DIRETOS E INDIRETOS |
| Sumário: | I - A falta de especificação dos factos não provados e de análise da prova testemunhal apenas determinam a nulidade da sentença na exata medida em que uns a outra sejam relevantes para a decisão a proferir. II - De acordo com o artigo 640.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi do artigo 281.º do CPPT, quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o Recorrente deve especificar, sob pena de rejeição, quais (i) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, bem como (ii) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e (iii) a decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre os pontos de facto impugnados diversa da recorrida. O não cumprimento deste ónus implica a rejeição do recurso nesta parte. III – Sendo possível a correção à matéria coletável da impugnante por métodos diretos, a AT tem o dever de lançar mão dos referidos métodos. No entanto, em relação aos rendimentos em que se verifique não ser possível a avaliação direta, nos termos legais, a AT pode recorrer a métodos de avaliação indireta.* * Sumário elaborado pela relatora |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer, tendo concluindo pela nulidade da sentença. |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. AA. e BB..., devidamente identificados nos autos, vêm recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela em 06.06.2016, pela qual foi julgada improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra as liquidações adicionais de IRC e respetivos juros dos anos de 2000, 2001 e 2003. 1.2. Os Recorrentes terminaram as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: «1ª) O recurso vem interposto da sentença que julgou improcedente a impugnação deduzida pelos recorrentes contra liquidações adicionais de IRC que foram praticadas com referência aos exercícios de 2000, 2001 e 2003, no montante global de € 59.909,25. 2ª) Salvo o muito e devido respeito, que é inteiramente justificado, os recorrentes não podem aceitar a sobredita sentença. 3ª) Impugnam impugnar a decisão de facto, por entenderem que existiu erro na apreciação da prova produzida. 4ª) É também firme é convicção dos recorrentes que, atentas as normas jurídicas aplicáveis ao caso sub judice, a decisão deveria ter sido no sentido da procedência total da impugnação. 5ª) As liquidações adicionais de IRC e dos respectivos juros, no montante global de € 59.909,25, com referência aos exercícios de 2000, 2001 e 2003, respeitam à sociedade PF---., Lda, contribuinte fiscal no (...), com sede na Rua da (…). 6ª) Os apuramentos da matéria tributável ocorreram através da utilização cumulativa de métodos de avaliação directos e indirectos (DOC. Nº 3 da PI). 7ª) Tanto basta para provar que as liquidações impugnadas são ilegais, uma vez que esses métodos de avaliação são alternativos. 8ª) A Administração Fiscal usou de dois pesos e de duas medidas, ao admitir como credível a escrita da devedora originária para motivar as correcções meramente aritméticas e, do mesmo passo, ao considerar essa mesma escrita como não credível para fundamentar o recurso a métodos de avaliação indirecta. 9ª) Assim, está demonstrada a verificação do vício de forma por incongruência, contradição e obscuridade da fundamentação das liquidações impugnadas. 10ª) Mas mais, a Administração Fiscal apurou o todo através de avaliação indirecta – socorrendo-se de indícios, presunções e estimativas – e depois acrescentou ao todo mais umas partes através das correcções meramente aritméticas, daí resultando uma duplicação de matéria tributável. 11ª) Deste procedimento também resulta o vício de violação de lei por se terem atropelado os princípios gerais de direito que são estruturantes do nosso ordenamento jurídico tributário, designadamente os da tributação de acordo com a capacidade contributiva e o rendimento real. 12ª) O procedimento aqui atacado enferma de erros de Direito, tanto na sua interpretação como na sua aplicação. 13ª) As liquidações impugnadas também enfermam do vício de errónea quantificação da matéria colectável. 14ª) Na verdade, como a Administração Fiscal muito bem sabe, a primitiva devedora nunca conseguiu resultados positivos ao longo da sua penosa actividade. 15ª) Os prejuízos que foram sendo acumulados tornaram-se insuportáveis, conduzindo ao sucessivo encerramento dos estabelecimentos referidos no relatório da acção de inspecção e obrigaram à cessação dessa ruinosa actividade. 16ª) Não se percebe como é que a Administração Fiscal apura lucros tributáveis elevados quando é do conhecimento geral, o Fisco incluído, que esses mesmos lucros inexistiram. 17ª) Assim, verifica-se também uma ilegalidade decorrente dos erros quanto aos pressupostos de facto em que se fundaram as liquidações impugnadas. 18ª) Na sentença ora recorrida não se entendeu como ilegal a utilização cumulativa de métodos de avaliação indirecta e de correcções meramente aritméticas. 19ª) Não foi abordado o facto de a sociedade devedora originária contra quem foram praticadas as liquidações ter resultados negativos em todos os exercícios – o que aliás é do conhecimento do Fisco! 20ª) Com o devido respeito, que é muito e inteiramente justificado, os recorrentes estão firmemente convencidos que fizeram prova suficiente de que inexistiu matéria colectável a tributar em sede de IRC em todos os exercícios. 21ª) E, continuam convictos de que os métodos de apuramento da matéria colectável são alternativos. 22ª) Assim, a sentença padece de erro de julgamento no âmbito da valoração da prova produzida e na aplicação do direito. Termos em que deve ser dado provimento ao recurso e consequentemente ser revogada a sentença recorrida, com todas as consequências legais, nomeadamente a anulação das liquidações impugnadas, por ilegalidade – art. 99° do CPPT, assim se cumprindo a Lei e se fazendo Justiça.». 1.3. A Recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações. 1.5. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer com o seguinte teor: «AA. e mulher BB... vêem interpor recurso da sentença do Mmº Juiz do TAF de Mirandela que, no âmbito de impugnação judicial da decisão de indeferimento de recurso hierárquico interposto contra a decisão da reclamação graciosa deduzida relativamente à liquidação adicional de IRC dos anos de 2000,2001 e 2002 e respectivos juros compensatórios, a julgou improcedente. Os recorrentes na sequência de reversão contra ambos efectuada, no processo de execução fiscal intentado contra a sociedade “P..., Lda”, impugnaram as referidas liquidações, invocando, designadamente, a cumulação de métodos indirectos e directos e a errónea quantificação da matéria tributável. * É jurisprudência pacífica que o âmbito do recurso é definido pelas conclusões extraídas pelos recorrentes das respectivas alegações.A Fazenda Pública não contra-alegou. * Alegam AA. e mulher BB..., em síntese, que a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito na valoração da prova produzida e na aplicação do direito.QUESTÃO PRÉVIA Dispõe o artigo 123º do CPPT: 1 - A sentença identificará os interessados e os factos objecto de litígio, sintetizará a pretensão do impugnante e respectivos fundamentos, bem como a posição do representante da Fazenda Pública e do Ministério Público, e fixará as questões que ao tribunal cumpre solucionar. 2 - O juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões. In casu, a sentença não especifica que factos é que o julgador considerou como não provados, uma vez que não existem. Acresce que foram inquiridas três testemunhas arroladas pelos recorrentes (v. fls. 59 e seg) e nada se sabe sobre a relevância desses depoimentos ou da credibilidade que mereceram, dado que o julgador nenhuma referência lhes faz, preterindo o dever de examinar criticamente essa prova testemunhal, omitindo o dever de fundamentação, pelo que, a sentença enferma de nulidade nos termos do art. 125º nº 1 do CPPT e 615º nº 1,h) do CPC. Igualmente não existe o exame crítico da prova. Citando o Ac. do TCAN de 8/3/2012, no processo 00329/05...., in www.dgsi.pt: “I - A nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto, abarca não apenas a falta de discriminação dos factos provados e não provados, a que se refere o artigo 123º, nº 2 do CPPT, mas também a falta de exame crítico das provas, prevista no artigo 659º, nº 3 do CPC. II - A falta de discriminação da matéria de facto não provada, no domínio do contencioso tributário, é equiparável à falta de indicação da matéria de facto provada, para efeitos da nulidade prevista no art.º 125º, nº1 do CPPT. III - A exigência de fundamentação da sentença tem naturalmente várias valências, pois que, num primeiro momento, serve para impor ao juiz da causa que pondere e reflicta criticamente sobre a decisão, mas também para permitir que as partes, ao recorrerem da sentença, estejam na posse de todos os elementos que determinaram o sentido da decisão e, por último, torna possível ao Tribunal de recurso apreciar o acerto ou desacerto da sentença recorrida. IV - Assim, padece da apontada nulidade a sentença recorrida que não discriminou a factualidade não provada, apesar de terem sido inquiridas as testemunhas e de na mesma se ter referido que a impugnante não havia logrado fazer a prova do erro ou excesso na quantificação, o que só pode significar que os factos alegados, sobre os quais recaiu a prova testemunhal, eram relevantes para a decisão da causa.” Em face do exposto, em nosso entender, o Tribunal Superior deve julgar nula a sentença recorrida por falta de especificação dos fundamentos de facto da decisão e ordenar a baixa dos autos ao TAF de Mirandela, para que aí seja proferida nova decisão que inclua os fundamentos de facto, provados e não provados, bem como uma análise da prova produzida.». * Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657º, nº 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.* 2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações dos Recorrentes, cumpre apreciar e decidir se a sentença enferma de nulidade, bem como de erro de erro na apreciação da prova e na aplicação do direito. 3. FUNDAMENTAÇÃO 3.1. DE FACTO A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto: «Com interesse para a decisão os factos provados são os seguintes: 1. Em 13/1/2003, foi elaborado relatório de inspecção quanto à sociedade PF--- Ldª que consta de fls. 39 e ss do PA, que aqui se dá por reproduzido, com o seguinte destaque: “ [imagem que aqui se dá por reproduzida] 2. Nessa sequência foram instaurados os seguintes processos de execução fiscal contra a sociedade PF--- Ldª – cfr. fls. 30 dos autos e 15 a 17 do PA: a. Em 26/6/2003, Processo ...18 relativamente a IRC de 2000, no valor de 34.696,71 €; b. Em 18/7/2003, Processo ...17 relativamente a IRC de 2001, no valor de 15.345,04 €; c. Em 17/7/2003, Processo ...20 relativamente a IRC de 2002, no valor de 7.483,81€; 3. Por despacho datado de 12/9/2008, foi determinada a reversão contra os aqui Impugnantes, – cfr. fls. 31 dos autos; 4. Em 12/1/2009 os Impugnantes deduziram reclamação graciosa – que foi indeferida em 15/7/2009 - cfr. fls. 31 dos autos e 74 e 74/V do PA; 5. Em 12/8/2009, os Impugnantes deduziram recurso hierárquico – que foi indeferido em 9/7/2010 – Fls. 31 dos autos, 2 e parte final do PA, na parte referente a recurso hierárquico, em fls. não numeradas.». 3.2. DE DIREITO 3.2.1. Da nulidade da sentença Na perspetiva do DMMP «a sentença não especifica que factos é que o julgador considerou como não provados, uma vez que não existem. // Acresce que foram inquiridas três testemunhas arroladas pelos recorrentes (v. fls. 59 e seg) e nada se sabe sobre a relevância desses depoimentos ou da credibilidade que mereceram, dado que o julgador nenhuma referência lhes faz, preterindo o dever de examinar criticamente essa prova testemunhal, omitindo o dever de fundamentação, pelo que, a sentença enferma de nulidade nos termos do art. 125º nº 1 do CPPT e 615º nº 1,h) do CPC. // Igualmente não existe o exame crítico da prova.» tudo isto concorrendo para a nulidade da sentença que, a seu ver, deve ser declarada, por falta de especificação dos fundamentos de facto da decisão, ordenando-se a baixa dos autos ao TAF de Mirandela, para que aí seja proferida nova decisão que inclua os fundamentos de facto, provados e não provados, bem como uma análise da prova produzida. No entanto e como decorre da jurisprudência pertinentemente citada no seu douto parecer, as faltas de especificação dos factos não provados e de análise da prova testemunhal apenas determinariam a nulidade da sentença na exata medida em que uns a outra fossem relevantes para a decisão a proferir. Sucede que, no caso que nos ocupa, nenhuma destas situações se verifica pois, para além de não vislumbrarmos qualquer facto que, com pertinência para a decisão a proferir, devesse ser consignado como não provado, em face das questões suscitadas na p.i., também descortinamos ali qualquer facto relevante para a decisão da causa e suscetível de ser demonstrado por prova testemunhal. Improcede, assim, a arguida nulidade da sentença. 3.2.2. Do erro na apreciação da prova Na conclusão 3ª das suas alegações, os Recorrentes referem impugnar a decisão de facto, por entenderem que existiu erro na apreciação da prova produzida. No que respeita às regras da impugnação da matéria de facto e à apreciação da prova, vigora no processo tributário português o regime jurídico estabelecido para o processo civil, por força do disposto nos artigos 2º, alínea e), e 281º do CPPT. Num breve enquadramento legal das regras a que a Recorrente está sujeita para a impugnar a matéria de facto e dos poderes do TCA para a sua apreciação, importa atender aos artigos 662. ° e 640.º, ambos do Código de Processo Civil, de cuja leitura conjugada resulta que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto sempre que, em seu juízo autónomo, os elementos de prova acessíveis determinem uma solução diversa. Isto, porém, sem prejuízo do especial ónus de impugnação que recai sobre o Recorrente, concretizado nas três alíneas do nº 1, do artigo 640º do CPC, as quais lhe impõem a especificação (i) dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, (ii) dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos a matéria de facto impugnados diversa da recorrida e (iii) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. A especificação daqueles três itens é, como expressamente resulta do corpo do nº 1 do artigo 640º, obrigatória e a sua inobservância tem por consequência a rejeição do recurso quanto à decisão relativa à matéria de facto. No caso presente, os Recorrentes não cumprem o ónus impugnatório a seu cargo pois, a respeito da impugnação da matéria de facto, dizem apenas e só, o que consta da conclusão 3ª. Assim, nesta parte, vai rejeitado o recurso. 3.2.3. Do erro de julgamento Os Recorrentes entendem que a matéria tributável do IRC dos anos de 2000, 2001 e 2003 ocorreu através da utilização cumulativa de métodos indiretos e diretos, o que é ilegal, a seu ver, pois a AT usou dois pesos e duas medidas e tais métodos são alternativos. Por isso, ocorre também vício de forma por incongruência, contradição, obscuridade da fundamentação das liquidações. Há duplicação da matéria tributável, mostrando-se violados os princípios gerais de direito, designadamente os da tributação de acordo com a capacidade contributiva e o rendimento real. Sobre esta questão, considerou-se na decisão recorrida o seguinte: «(…) Contudo, e no que diz respeito ao IRC, a questão da análise da liquidação em resultado da cumulação e aplicação de métodos indirectos com a de métodos directos não se coloca porque ela apenas diz respeito à liquidação do IVA, referentes a períodos de 2000 e 2001, sem que as mesmas tivessem sido acompanhadas dos meios de pagamento desse imposto. Portanto, também inexiste duplicação de colecta no que concerne a IRC. Todavia, sempre podemos dizer que nada impede a cumulação. A avaliação indirecta é subsidiária da avaliação directa aplicando-se, àquela, sempre que possível e a lei não prescrever em contrário, as regras de avaliação directa, determinando-se por intermédio desta avaliação a matéria tributável relativamente aos períodos de tempo em que pode ser levada a cabo. – Cfr. Art.º 85.º da LGT e Diogo Leite Campos e Outros in LGT comentada e anotada, 3ª edição, pág.424 e 425 Há, portanto, uma preferência legal absoluta pela utilização de métodos de avaliação directa para a fixação da matéria tributável, que não é mais do que o corolário do princípio da tributação do rendimento real. Apesar da avaliação directa dever prevalecer, podendo esta ser aplicada, mesmo que em parte, impõe-se à Administração Tributária que o faça. O objectivo da tributação é que esta se aproxime o máximo possível da realidade, da verdadeira capacidade contributiva do sujeito passivo e se tal pode ser obtido, quanto a uns aspectos por via directa e quanto a outros por via indirecta, nada impede que assim seja. Neste sentido, cfr. acórdão do TCA Sul de 02.06.2009 proferido no processo 02803/08, Por outro lado, e apesar da discordância, tem de se concluir que os Impugnantes perceberam o que estava em causa, pois que apresentaram reclamação graciosa, recurso hierárquico e impugnação judicial, demonstrando ter apreendido o itinerário cognoscitivo da inspecção tributária.». Analisado o documento 3 junto com a p.i., constata-se que, ao contrário do que foi considerado pelo Tribunal a quo, nos anos de 2000 e 2001 foram efetuadas correções em sede de IRC através de métodos diretos e indiretos. Apesar disto, entendemos que a sentença recorrida procedeu a uma adequada aplicação do direito. É sabido que, em regra, a tributação faz-se de acordo com a declaração do próprio contribuinte, mas quando a Administração Tributária entenda que tal declaração sofre de erros, incorreções ou omissões, pode proceder a alterações à declaração do contribuinte lançando mão de correções técnicas, ou seja, pode proceder a alterações à declaração do contribuinte, mas ainda com recurso aos elementos contabilísticos apresentados pelo mesmo contribuinte. Porém, quando a declaração do contribuinte seja inexistente ou de tal modo inexata ou incompleta pode a AT lançar mão dos métodos indiretos (tributação por métodos indiretos). Este modo de tributação efetua-se a partir de indícios, presunções ou outros elementos, assenta na tributação presumida e tem carácter extraordinário ou excecional. Dispõe o artigo 85º, nº 1 da LGT que a avaliação indireta é subsidiária da avaliação direta, entendendo-se, por isso, que o recurso a métodos indiretos de determinação da matéria coletável é uma ultima ratio, apenas podendo ser aplicado quando não seja possível que esta avaliação seja feita por via direta, em conformidade com o princípio constitucional segundo o qual a tributação das empresas recai fundamentalmente sobre o seu rendimento real (cfr. artigo 104.º, n.º 2 da CRP). Assim, sendo possível, para parte das correções à matéria coletável da impugnante, fazê-lo por métodos diretos, a AT tem o dever de lançar mão dos referidos métodos. No entanto, em relação aos rendimentos em que se verifique não ser possível a avaliação direta, nos termos legais, a AT pode recorrer a métodos de avaliação indireta. O facto de se recorrer à tributação por métodos indiretos não significa que a totalidade da contabilidade da impugnante seja desconsiderada, mas tão-só a parte que se considera não refletir a realidade e cuja presunção de veracidade é, por isso, afastada – neste sentido, cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 07.10.2008, rec 01946/07 e de 17.10.2019, rec. 487/11.6BECTB, ambos disponíveis em www.dgsi.pt. A sentença recorrida que assim também entendeu não merece qualquer censura. Os Recorrentes sustentam, como o haviam feito na petição inicial, que da utilização simultânea de métodos diretos e indiretos resultou uma duplicação da matéria tributável; contudo, não concretizaram minimamente esta alegação por forma a permitir ao Tribunal analisar este alegado vício. Mais alegam os Recorrentes terem feito prova suficiente de que inexistiu matéria coletável a tributar em sede de IRC em todos os exercícios, mas, como já assinalámos, não substanciaram esta alegação, designadamente identificando os meios probatórios onde consta tal prova; no que respeita ao facto de a sociedade devedora originária ter resultados negativos em todos os exercícios, os Recorrentes também não identificam o(s) documento(s) constante(s) dos autos que evidenciam essa realidade. Perante o exposto, o presente recurso não pode proceder, devendo manter-se a sentença recorrida no ordenamento jurídico. 4. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida. Custas a cargo dos Recorrentes, que saem vencidos neste recurso, nos termos do artigo 527º, nº 1 e 2, do CPC. Porto, 27 de abril de 2022 Maria do Rosário Pais - Relatora José Coelho - 1.º Adjunto Irene Isabel das Neves - 2.ª Adjunta |