Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00086/23.0BEBRG |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 06/26/2025 |
| Tribunal: | TAF de Braga |
| Relator: | VITOR SALAZAR UNAS |
| Descritores: | OPOSIÇÃO; FUNDAMENTAÇÃO FORMAL; |
| Sumário: | I – Como vem afirmando a jurisprudência e a doutrina, o ato encontra-se suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática. II – Encontra-se devidamente fundamentado o despacho de reversão, no tocante ao pressuposto da insuficiência de bens, que refere a insolvência da sociedade executada e o desconhecimento de bens por consulta da base de dados e faz alusão aos preceitos legais aplicáveis. III – A declaração de insolvência da sociedade originária devedora constitui fundamento bastante para que se considere haver fundada insuficiência do património daquela, e para justificar a reversão contra, no caso, o responsável subsidiário /Recorrente pela dívida exequenda.* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO: [SCom01...], contribuinte fiscal n.º ...30, com os demais sinais nos autos, interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, nos termos da qual foi julgada improcedente a oposição à execução fiscal n.º ...69 e apensos, [originariamente instaurada contra a devedora sociedade «[SCom01...], Unipessoal, Lda.»], revertida contra a oponente, por dívidas de IRS, respeitantes aos períodos de 2018 e 2019 e dívidas de IVA respeitantes ao período de 01.10.2018 a 31.12.2018, cuja quantia exequenda ascende a € 7.922,55. A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: «(…) 1 – A sentença recorrida considerou a oposição totalmente improcedente, considerando a recorrente responsável, a título subsidiário, pelas dívidas em execução, por este não ter logrado “afastar a presunção de culpa sobre si incidente, o que terá de ser valorado contra o mesmo, determinando, por conseguinte, a sua legitimidade na instância executiva quanto ao tributo em execução.” 2 – É exclusivamente a partir da fundamentação expendida no despacho de reversão que deve aferir-se a legalidade do mesmo; 3 – O despacho de reversão padece de vício de falta de fundamentação; 4 – Pelo que, no caso de reversão baseada no citado artº.24, nº.1, al. b) da LGT, como no caso sub judice, a fundamentação deverá consistir na indicação dos respectivos pressupostos de facto, bem como das normas legais em que se baseia, tal como na extensão da mesma reversão; 5 - Ora, “in casu”, a falta de fundamentação do despacho de reversão é formulada quanto à inexistência de bens penhoráveis da Executada, uma vez que são omitidas as razões que conduziram à mesma, com prejuízo dos condicionalismos previstos no nº 2 do artº 153º do CPPT de que dependeria a responsabilidade da ora recorrida, tanto mais que a devedora originária foi declarada insolvente e foram aí apreendidos a favor da massa insolvente. 6 – Na verdade, compete à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária e essa prova não foi conseguida nos autos, em relação aos factos tributários neles discutidos; 7 – Donde se conclui que, in casu, pela falta de fundamentação do despacho de reversão uma vez que no mesmo não se mencionam quais os bens existentes, nem a razão da sua insuficiência, tratando-se de um despacho simplificado e pró-forma, manifestamente insuficiente para dar a conhecer à oponente todo o iter seguido pela AT. 8 - A sentença recorrida violou, assim, entre outros, por erro de interpretação e aplicação, o disposto nos arts. 22º, 23º, 24º e 74º da LGT. Nestes termos, e nos melhores de direito que Vas. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente ser alterada a sentença recorrida por outra que julgue a oposição totalmente procedente. Assim decidindo, farão V. Exas., Venerandos Desembargadores, a habitual JUSTIÇA.» Não foram apresentadas contra-alegações. O Digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer, concluindo pelo não provimento do recurso, do qual se extratam os seguintes termos: «(…). Vistos os autos, constata-se que: - O despacho para audição da oponente proferido, antes da reversão, alude às diligências efectuadas pela AT que comprovavam a fundada insuficiência de bens da executada originária para o pagamento das dívidas tributárias. O Serviço de Finanças já não lograra identificar nem obter bens, da executada originária, suficientes para o pagamento da dívida. Tem pois plena aplicação o disposto no art.º 153.º n.º 2 do CPPT quando determina que o chamamento à execução do devedor subsidiário depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias: a) inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores b) fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido. O despacho de reversão está suficientemente fundamentado uma vez que a reversão da execução fiscal podia ocorrer com a verificação de qualquer daqueles pressupostos. No que concerne à alegada falta de fundamentação dir-se-á que o direito à fundamentação dos actos administrativos e tributários que afectem direitos e interesses legalmente protegidos é princípio constitucional consagrado no artº 268º da Constituição da República. Nos termos do CPA, a fundamentação dever ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto. De acordo com o mesmo preceito legal, equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto. Os mesmos requisitos, critérios e exigências recorrem do art. 77º da LGT. Só assim a parte pode analisar a decisão e ponderar se lhe dá ou não o seu acordo; também só por essa via, ela fica munida dos elementos essenciais para poder impugnar a decisão; só sabendo quais os factos concretos considerados pelo decisor, ela pode argumentar se eles se verificam ou não; só conhecendo os critérios valorativos do julgador sobre esses factos, ele pode discuti-los. Ou seja, a fundamentação tem de traduzir-se numa declaração formal externa ou explicita que dê a conhecer ao seu destinatário, a motivação funcional da decisão, os motivos por que se decidiu num determinado sentido e não em qualquer outro. Como se refere no acórdão do TCAN (processo 00018/02 de 22.10.2010) a fundamentação há-de ser: - expressa através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; - clara, permitindo que através dos seus termos se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; - suficiente, possibilitando ao administrado ou contribuinte um conhecimento concreto da motivação do acto, ou seja as razões de facto e de direito que determinaram o agente ou órgão a actuar como actuou; - congruente, de modo que a decisão constitua conclusão lógica e necessária dos motivos indicados como sua justificação envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão. O chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da inexistência ou da fundada insuficiência de bens da devedora principal. Isso implica que a administração tributária faça algumas diligências tendentes a identificar esses bens e que as documente nos autos de execução fiscal, o que, no caso dos autos, aconteceu. A administração tributária não identificou bens da executada originária, que eram manifestamente insuficientes para pagamento da quantia exequenda. Logo, não existia qualquer razão para que o processo de execução fiscal não revertesse contra o gerente da executada como executado subsidiário. – Questão a resolver nestes autos consiste em saber se a Oponente pode ser responsabilizada pelas dívidas tributárias da executada originária. Nos termos do artº 21º da LGT, salvo disposição legal em contrário, quando os pressupostos do facto tributário se verificarem em relação a mais de uma pessoa, todas são solidariamente responsáveis pelo cumprimento da dívida tributária. Nos termos do artº 22º nº2 da LGT, a responsabilidade tributária recai sobre os sujeitos passivos originários e pode abranger, solidária ou subsidiariamente, outras pessoas. As pessoas, solidária ou subsidiariamente responsáveis, poderão reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhe for atribuída nos mesmos termos do devedor principal devendo, para o efeito, a notificação ou a citação conter os elementos essenciais da sua liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais - artº 22º nº4 da LGT A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal - artº 23º nº1 da LGT Nos termos do nº2 deste preceito legal, a reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo de benefício da excussão. Nos termos do artº 153º nº1 e 2 do CPPT, o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias: a) inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores b) fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido. Nos termos do artº 24º da mesma Lei, os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si: a)- pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação b)- pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do cargo quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento Daqui resulta que a responsabilidade subsidiária assenta numa presunção de culpa funcional relacionada com o exercício efectivo de funções por parte do gerente pelo que não basta a mera qualidade jurídica de administrador ou gerente. No caso concreto, constitui um pressuposto da responsabilidade subsidiária a fundada insuficiência de bens penhoráveis à devedora principal desde que se consiga provar que foi por culpa da Oponente que a sociedade originária se tornou insuficiente para a satisfação dos créditos fiscais. Por outro lado, está consagrado pela LGT o benefício da excussão o que quer dizer que, antes de revertida a execução contra o responsável subsidiário, devem ser penhorados e vendidos os bens do devedor principal e dos responsáveis solidários. Resulta do teor do artigo 24º da LGT «que só relativamente às dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo (alínea b) do art.º 24º) se faz incidir sobre o gerente ou administrador o ónus de provar que a falta de pagamento das dívidas tributárias pela sociedade não lhe é imputável. Assim, a LGT limita a inversão do ónus da prova da culpa do não pagamento das dívidas, às dívidas vencidas no período do exercício de funções. Resulta claro dos autos que a Oponente exerceu de facto a gerência da sociedade devedora originária. As dívidas em causa encaixam na previsão do art. 24º nº 1 alínea a) da LGT. Traz-se à liça o Acórdão do TCA Sul de 06.10.2009, proc. 03336/09: “VII) -Provando-se que o Oponente foi nomeado gerente e que no período temporal a que se reportam as dívidas exequendas assinou documentos necessários ao giro comercial da sociedade, tem-se por verificada a gerência de facto não obstante se admita que todos os demais actos típicos de gerência eram praticados por terceira pessoa.” Num patamar seguinte, e quanto à culpa na insuficiência do património da sociedade, resulta à saciedade dos factos provados que a Oponente contribuiu decisivamente para o facto de a sociedade deixar de ter património suficiente para o pagamento das suas obrigações fiscais e nenhuma prova fez em contrário. Em conclusão, entendemos que o presente recurso não merece provimento, devendo ser confirmada a sentença que se acompanha em tudo o mais suscitado pela recorrente, e na íntegra. » * Com dispensa dos vistos legais [cfr. artigo 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil], cumpre agora apreciar e decidir o presente recurso. * II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR. A única questão que cumpre conhecer está relacionada com a fundamentação formal do despacho de reversão a propósito da insuficiência de bens. * III – FUNDAMENTAÇÃO: Na sentença foi fixada matéria de facto nos seguintes termos: «1. Contra a sociedade [SCom01...], UNIPESSOAL, LDA foram instaurados os processos de execução fiscal n.º ...69 e apensos (...63, ...20, ...55, ...47, ...20, ...69), por dívidas de IRS, respeitantes aos períodos de 2018 e 2019 e dívidas de IVA respeitantes ao período de 01.10.2018 a 31.12.2018, tendo por quantia exequenda o valor de € 7.972,55 – cfr. informação e certidões de dívida de fls. 36-53 do documento com a referência SITAF n.º 006749543. 2. Em 21.07.2022, o Diretor Adjunto da Direção de Finanças ... proferiu despacho de concordância, com a proposta de reversão da execução fiscal com o n.º de processo ...69 e apensos, contra a aqui Oponente e contra «AA», originariamente instaurados contra a sociedade [SCom01...], UNIPESSOAL, LDA, tendo por quantia exequenda o montante de € 7.972,55 – cfr. despacho e informação de fls. 1-8 do documento com a referência SITAF n.º 006749543. 3. Em 25.07.2022 a Direção de Finanças ... remeteu à Oponente, por carta registada, ofício de notificação, para efeitos de exercício do direito de audição prévia, sobre o projeto de reversão aludido no ponto anterior, rececionada por aquela em 26.07.2022 – cfr. talão de aceitação de registo e comprovativo de entrega de correio postal de fls. 13, 14 e 17 do documento com a referência SITAF n.º 006749543. 4. Em 28.11.2022, o Diretor de Finanças ... proferiu despacho de reversão contra a Oponente, por adesão à informação elaborada pela Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ... – cfr. despacho de fls. 19 e informação de fls. 23- 28 do documento com a referência SITAF 006749543. 5. Da informação aludida no ponto anterior consta, entre o mais, o seguinte: “(…) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…)” – cfr. informação de fls. 23-28 do documento com a referência SITAF 006749543. 6. Em 30.11.2022, o Diretor de Finanças ... emitiu ofício de citação, endereçado à Oponente, na qualidade de responsável subsidiária na execução fiscal aludida nos pontos anteriores – cfr. ofício de fls. 55 do documento com a referência SITAF 006749543. 7. O ofício aludido no ponto anterior foi remetido à Oponente, por carta registada em 31.11.2022, por esta rececionada em 02.12.2022 – cfr. talão de aceitação de registo de fls. 79 e aviso de receção de fls. 83, todas do documento com a referência SITAF 006749543. Mais se provou o seguinte: 8. Em 04.05.2010, através da AP...04, inscrição ..., foi registada, na Conservatória do Registo Predial/Comercial de ....... a constituição da sociedade [SCom01...], UNIPESSOAL, LDA e a designação de [SCom01...] como gerente da mesma – cfr. certidão permanente de fls. 2-8 do documento com a referência SITAF n.º 006749539. 9. Em 08.01.2013, através da AP...08 foi averbado, ao registo aludido no ponto anterior, a cessação de funções de gerência de [SCom01...] – cfr. fls. 2-8 do documento com a referência SITAF n.º 006749539. 10. Na mesma data, através da AP...08, inscrição ..., foi registada a designação de «AA» como gerente da sociedade – cfr. fls. 2-8 do documento com a referência SITAF n.º 006749539. 11. Em 05.09.2019, através da AP...05, inscrição ..., foi efetuado registo provisório por natureza da declaração de insolvência da sociedade [SCom01...], UNIPESSOAL, LDA, por sentença proferida em 29.08.2019 – cfr. fls. 2-8 do documento com a referência SITAF n.º 006749539. 12. No período compreendido entre 2013 e 2019 a Oponente admitiu, pelo menos, duas trabalhadoras para exercerem funções na sociedade devedora originária – facto provado por testemunhas. 13. Era a Oponente que, diariamente, dava ordens aos trabalhadores da empresa distribuindo as funções a executar por cada um, a cada momento, e em que local– facto provado por testemunhas. 14. A Oponente tudo decidia relativamente aos trabalhadores da sociedade devedora originária, designadamente, férias e faltas dos trabalhadores bem ainda autorização para se ausentarem momentaneamente do posto de trabalho – facto provado por testemunhas. 15. Até ao encerramento de sociedade devedora originária, a aqui Oponente nunca esteve sujeita a qualquer autoridade superior, escolhendo o seu horários e funções sendo frequente trabalhar nas máquinas de confeção, lado a lado com os demais trabalhadores, nos setores que julgasse mais atrasados na produção – facto provado por testemunhas. 16. Até ao encerramento da sociedade devedora originária foi sempre a Oponente que atendeu todas as pessoas que se apresentassem na empresa, designadamente clientes, fornecedores, distribuidores postais, etc. – facto provado por testemunhas. 17. Em período não concretamente apurado, imediatamente anterior ao encerramento da empresa, a Oponente deixou de comparecer na sede da mesma, alegadamente por motivo de doença – facto provado por testemunhas. 18. Em data não concretamente apurada, no ano de 2019, o filho do Oponente, «AA», reuniu com os trabalhadores na sede da devedora originária e comunicou aos mesmos que a empresa iria encerrar – facto provado por testemunhas. 19. Pelo menos desde 2013, o filho da Oponente, «AA» reunia com o contabilista certificado da devedora originária, a quem entregava a documentação da empresa. 20. O filho da Oponente, «AA» compareceu ao longo dos anos, pontualmente, sem qualquer assiduidade, na sede da empresa, onde reunia com a Opoente no escritório. * Factos não provados 1. Desde que renunciou à gerência, em 07.01.2013, a Oponente não contratou trabalhadores, não deu ordens àqueles, não negociou com fornecedores nem clientes. * Motivação da decisão da matéria de facto Os factos elencados na factualidade assente resultaram da análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente os documentos constantes dos autos e do processo de execução fiscal, não impugnados, conforme remissão feita a propósito de cada número do probatório, sendo indicado expressamente, em cada número, o documento que contribuiu para a extração de tal facto, através da indicação das folhas do processo eletrónico. Motivação Para prova dos factos constantes dos pontos 12-18 e 20 do probatório, o Tribunal teve em conta o depoimento das testemunhas «BB» e «CC», ex-trabalhadoras da sociedade devedora originária que considerou isento, espontâneo e desinteressado. O depoimento das referidas testemunhas, foi concordante quanto à posição de poder que a Oponente ocupava no dia a dia da empresa, convencendo o Tribunal que era, de facto, a Oponente que admitia os trabalhadores, geria o trabalho destes, os seus intervalos, faltas, férias e demais assuntos da empresa. Desconsiderou o Tribunal, totalmente, o depoimento da testemunha «DD» também ex-trabalhadora da sociedade devedora originária, não só porque o seu depoimento contrariou cabalmente, o depoimento das duas testemunhas acima mencionadas, mas, sobretudo porque o considerou não isento. Com efeito, foi-se tornando evidente, ao longo do depoimento da testemunha em questão, que esta se esforçou por oferecer uma versão dos factos de acordo com a versão defendida pela Oponente nos presentes autos. Tal revelou-se, desde logo pela ansiedade, manifestada pela testemunha, durante todo o depoimento, adiantando-se frequentemente às perguntas dos Ilustres Mandatários, para reforçar e repetir a ideia de que “era só o «AA»” que mandava na empresa, “era só o «AA»” que dava ordens aos trabalhadores sendo a Oponente uma trabalhadora como as demais. A falta de isenção da testemunha revelou-se ainda em pequenas contradições em que foi incorrendo, ao longo do seu depoimento, de que são exemplo as seguintes: a testemunha começou por declarar ao Tribunal que conhecia a Oponente (apenas) como colega de trabalho, a partir de 2016, data em que ficou desempregada e foi pedir emprego ao “«AA»”, por conhecer este como “patrão” da devedora originária. Sucede, porém, que, mais à frente, no seu depoimento, a testemunha revelou, sem se aperceber, que, afinal conhece o “«AA»” desde pequenino e que é vizinha e amiga da Oponente e do “«AA»”, há muitos e longos anos, mantendo, até hoje, relações de amizade com ambos. A testemunha entrou igualmente em contradição quando revelou, inicialmente, desconhecer que a devedora originária tenha tido outro “patrão” que não o “«AA»”, para, mais à frente, admitir que tem conhecimento que a Oponente teve empresas evidenciando, ainda, memória seletiva, relativamente à designação da devedora originária, sua ex-entidade patronal de 2016 a 2019 que, conforme é consabido, coincide com o nome da aqui Oponente. Por tudo o exposto o depoimento da testemunha foi totalmente desconsiderado. Para prova dos facto julgado provado no ponto 19 foi tido em conta o depoimento da testemunha «EE», contabilista certificado, que referiu que a contabilidade da devedora originária era levada ao gabinete de contabilidade pelo Sr. «AA», pelo menos desde 2013, data em que a testemunha “herdou” a pasta, na sequência do falecimento do colega de gabinete que costumava tratar do assunto. Para além do referido facto, o depoimento da testemunha não se revelou muito elucidativo pois não soube esclarecer quem contratou os serviços de contabilidade, nunca se deslocou à devedora originária, desconhecendo a operação fabril, bem ainda a Oponente e sempre tendo lidado apenas com o referido «AA» nos assuntos da contabilidade. O depoimento da testemunha «FF» não se revelou relevante para prova da matéria de facto controvertida, pois dada a dimensão da empresa que gere foram sempre os seus funcionários e não a testemunha a lidar com a sociedade devedora originária. O facto único julgado não provado resulta de alegação da Opoente infirmada pela prova produzida através do depoimento das testemunhas supramencionadas.» * Aditamento oficioso à matéria de facto [art. 662.º, n.º 1 do CPC]. 5.a) Na informação que integrou a fundamentação do despacho de reversão, consta, ainda, o seguinte: «(…). Bens da devedora originária 7. Dispõe o n.º 2 do art.º 23.º da LGT, que “A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão”. 8. Tal como já acima referido, a devedora originária foi declarada insolvente em 29-08-2019, no âmbito do Processo de Insolvência n.º ....9/1...T8GMR, o qual já se encontra encerrado. 9. A declaração de insolvência da sociedade devedora originária é fundamento bastante para que o órgão da execução fiscal considere haver “fundada insuficiência” do património, a justificar a reversão contra o(s) responsável(eis) subsidiário(s) pela dívida exequenda (art.º 23.º, n.ºs 2 e 7, da LGT). 10. Acresce que, consultada a base de dados da AT, não são conhecidos quaisquer bens em nome da devedora originária. 11. Pelo que estão, desde já, reunidos os pressupostos para se proceder à referida reversão da(s) dívida(s)» [cfr. informação de fls. 23-28 do documento com a referência SITAF 006749543]. IV –DE DIREITO: No instrumento recursivo, conforme resulta das respetivas conclusões que delimitam o objeto do recurso, é questionada a fundamentação formal do despacho de reversão quanto à inexistência de bens «uma vez que são omitidas as razões que conduziram à mesma, com prejuízo dos condicionalismos previstos no nº 2 do artº 153º do CPPT de que dependeria a responsabilidade da ora recorrida, tanto mais que a devedora originária foi declarada insolvente e foram aí apreendidos a favor da massa insolvente.»; e «uma vez que no mesmo não se mencionam quais os bens existentes, nem a razão da sua insuficiência, tratando-se de um despacho simplificado e pró-forma, manifestamente insuficiente para dar a conhecer à oponente todo o iter seguido pela AT.». A invocação da falta de fundamentação do despacho de reversão quanto à insuficiência de bens, conforme enunciada, apenas se compreende já no limite extremo do dever de patrocínio, por não poder haver qualquer dúvida quanto à clareza e detalhe da fundamentação do ato, devidamente refletida nos pontos 5. e 5b) da matéria de facto. E, diga-se, clareza e detalhe que se verificam, também, relativamente aos demais requisitos, como bem decidiu o tribunal a quo. É indiscutível que a responsabilidade subsidiária se efetiva por reversão do processo de execução fiscal [cfr. o n.º 1 do artigo 23.º da Lei Geral Tributária] e que o despacho de reversão, sendo um ato administrativo tributário, está sujeito a fundamentação [cfr. o artigo 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa e os artigos 23.º, n.º 4 e 77.º, n.º 1 da LGT], devendo o mesmo, em termos de fundamentação formal, incluir a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa [cfr. o n.º 1 do artigo 77.º da LGT), e deve incluir, igualmente, a declaração dos pressupostos da reversão e referir a extensão temporal da responsabilidade subsidiária [cfr. artigo 23.º, n.º 4 da LGT]. Como vem afirmando a jurisprudência e a doutrina, o ato encontra-se suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática. Daí que no acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 16 de Outubro de 2013, proferido no Processo n.º 0458/13, integralmente disponível em www.dgsi.pt, que a fundamentação formal do despacho de reversão se basta com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efetivada, «não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.» [cfr., no mesmo sentido, os Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 31 de janeiro de 2012 e 23 de janeiro de 2013, proferidos nos Processos nºs 580/12 e 953/12, respetivamente, também integralmente disponíveis em www.dgsi.pt]. Essencial é que a fundamentação responda às necessidades de esclarecimento do contribuinte, informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do ato administrativo permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática. Sendo que, em caso de discordância, o revertido exercerá o direito de defesa mediante dedução de oposição, como a Oponente efetuou nos presentes autos, funcionando depois as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis às situações previstas legalmente. Ora, no caso concreto, a informação que sustenta o despacho de reversão e onde se colhe a sua fundamentação torna claramente percetíveis as razões, de facto e de direito, pelas quais o órgão de execução fiscal considerou existir fundada insuficiência de bens, destinando especificamente um capítulo para esse fim com o título Bens da devedora originária. [cfr. ponto 5 e ponto 5.b), aditado, da matéria de facto]. Em termos de facto, a decisão encontra-se fundamentada com base (i) na insolvência da devedora originária, mencionando que essa evidência mostra-se bastante para considerar verificada a insuficiência de bens [pontos 8 e 9] e (ii) no desconhecimento de quaisquer bens em nome da sociedade após a consulta da base de dados [ponto 10]; e de direito faz expressa menção ao teor do art. 23.º, n.ºs 2« “A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão”» e referência ao n.º 7, da LGT. Portanto, inelutavelmente, o despacho de reversão encontra-se devidamente fundamentado de facto e de direito do ponto de vista formal [que é o que constitui objeto do recurso] quanto ao pressuposto em exegese, por um lado. E face ao vertido no artigo 23.º da Lei Geral Tributária, verifica-se que a atuação da Administração Fiscal não merece censura, pois traduz a jurisprudência pacífica a propósito da relevância de, no âmbito do procedimento de reversão, ter chegado ao conhecimento do órgão de execução fiscal a declaração de insolvência da sociedade devedora principal. Na verdade, tem sido entendimento recente da jurisprudência que a declaração de insolvência da sociedade devedora originária, quando for conhecida no processo de execução fiscal, constitui fundamento bastante para se considerar existir fundada insuficiência do património daquela e justificar a reversão contra o responsável subsidiário pela dívida exequenda. A propósito da fundada insuficiência do património da devedora originária, declarada insolvente chamamos à colação o entendimento jurisprudencial vertido no acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 08.07.2020, processo n.º 0484/15.2BESNT, sumariado no sentido de que «I - O conhecimento pelo órgão da execução fiscal da declaração de insolvência da sociedade originária devedora é fundamento bastante para que considere haver fundada insuficiência do património daquela, a justificar a reversão contra o responsável subsidiário pela dívida exequenda (art.23.º nºs 2 e 7 LGT).» [vide, ainda e a título de mero exemplo, acórdão deste TCA de 29.05.2025, proc. n.º 2023/12.8BEBRG, com intervenção do mesmo relator e da segunda adjunta desta formação]. Pelo exposto, sem necessidade de maiores considerações, julgamos não provido o recurso. * Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, formula-se o seguinte SUMÁRIO: I – Como vem afirmando a jurisprudência e a doutrina, o ato encontra-se suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática. II – Encontra-se devidamente fundamentado o despacho de reversão, no tocante ao pressuposto da insuficiência de bens, que refere a insolvência da sociedade executada e o desconhecimento de bens por consulta da base de dados e faz alusão aos preceitos legais aplicáveis. III – A declaração de insolvência da sociedade originária devedora constitui fundamento bastante para que se considere haver fundada insuficiência do património daquela, e para justificar a reversão contra, no caso, o responsável subsidiário /Recorrente pela dívida exequenda. * V – DECISÃO: Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e, nessa sequência, manter a sentença no ordenamento jurídico. Custas pela Recorrente, sem prejuízo da proteção jurídica de que beneficia. Porto, 26 de junho de 2025 Vítor Salazar Unas Cláudia Almeida Ana Patrocínio |