Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 00016/16.5BEPRT |
| Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
| Data do Acordão: | 06/05/2025 |
| Tribunal: | TAF do Porto |
| Relator: | VIRGÍNIA ANDRADE |
| Descritores: | IVA; INFORMAÇÃO VINCULATIVA; VINCULAÇÃO AT; FACTOS; |
| Sumário: | I. O Tribunal a quo não tem de conhecer de todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes. II. A nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o juiz deixe de se pronunciar sobre as questões pelas partes submetidas ao seu escrutínio, como sejam as pretensões formuladas, mas não os argumentos invocados. III. As consequências do incumprimento do teor da informação vinculativa emitida pela AT são a anulabilidade do acto praticado. IV. No entanto, a informação vinculativa está sempre limitada aos factos enunciados pelo contribuinte e reporta-se ao enquadramento jurídico que deles fazem os serviços, que encontra justificação no facto do acto tributário ter sempre na sua base uma situação de facto concreta. V. O recurso apenas pode incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o Tribunal ad quem com questões novas.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
| Votação: | Unanimidade |
| Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte 1 – RELATÓRIO [SCom01...], S.A., contribuinte n.º ...12 vem interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 5.02.2020 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a impugnação intentada contra a liquidação adicional de IVA n.º ...90, e a correspondente liquidação de Juros Compensatórios n.º ...91, relativas ao período 1006T, no total de €1.242.288,02. A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: “i. Entende a AT que a “reversão de bens para o domínio público, não se consubstanciando numa actividade económica, como entendeu o sujeito passivo, não configura uma operação tributável pelo que a liquidação de IVA efectuada é desprovida de sentido – IVA indevidamente liquidado.”. ii. Em sentido inverso, a propósito do enquadramento fiscal da entrega de infraestruturas ao domínio público na concreta operação imobiliária em causa nos autos, concluiu a AT, através de informação vinculativa, que: “Trata-se, efectivamente, de operações sujeitas a IVA” Cfr. fls 151 a 164 do PA iii. Entende o Tribunal a quo¸ sufragando a posição da Fazenda Pública, que a mencionada informação vinculativa não tem qualquer efeito vinculante para a AT – e perde, por isso, todo e qualquer valor doutrinário ou orientador - na medida em que a Impugnante não seguiu, no caso concreto, o descrito procedimento documental. iv. Todavia, é plena e firme convicção da Recorrente que, ao invés do decidido pelo Tribunal a quo, o circuito documental jamais seria susceptível de inverter radicalmente o enquadramento fiscal da operação em causa – de sujeição a IVA, para não sujeição a IVA. v. Em momento algum o Tribunal a quo demonstra, ou sequer invoca, que a existência de um redébito acarreta necessariamente a alteração das regras de incidência de imposto – sendo que, para proceder à liquidação adicional em causa nos autos, a própria AT não dá qualquer relevância ao circuito documental para efeito da qualificação da operação como sujeita a IVA vi. Logo, tal factualidade nunca foi erigida, sequer, como minimamente relevante para o enquadramento da operação em sede de IVA no âmbito da informação vinculativa. vii. Para efeito de estabelecer uma vinculação administrativa apenas é exigível a subsunção dos factos substanciais às mesmas normas legais e não das questões formais que deles decorrem – mormente o tratamento documental, sobretudo quando do mesmo não se divisa qualquer alteração da solução legal . viii. Note-se, que no ponto 4 da informação vinculativa em causa, a própria AT refere que «Trata-se, efectivamente, de operações sujitas a IVA e dele não isentas face ao disposto no artigo 4.º, n.º 1 do CIVA, (independentemente do facto de o respectívo débito a efectuar pelos promotores ao Município 1... corresponder, ou não, a um mero reembolso de custos suportados).». ix. Cumpre fazer notar que, para efeito da dedução de IVA, a nota de débito é equivalente à factura – como sufragado pela Jurisprudência Comunitária 15 - pelo que até obedece aos mesmos requisitos legais 16 . x. Como é evidente, estando em causa o direito à dedução de IVA, a legítima expectativa da Recorrente – como da de qualquer Contribuinte colocado na sua posição – tinha por base a qualificação da operação como sujeita a IVA. xi. Caso a AT tivesse entendido que a entrega de infraestruturas ao domínio público “não configura uma operação tributável, pelo que a liquidação de IVA efectuada é desprovida de sentido ”, seria absolutamente despiciendo e irrelevante glosar sobre a emissão de factura ou documento equivalente – dado que, em qualquer circunstância, não seria liquidado qualquer IVA. xii. Acresce que, não se verifica a existência de qualquer sensível alteração aos aludidos pressupostos a que o Tribunal a quo se refere – muito menos determinante de diferente solução jurídica , porquanto ficou provada que: a) A Recorrente é uma entidade promotora do projecto “[SCom02...]” pontos 6, 9 e 10 da matéria assente ; b) A Recorrente celebrou com o Município 1... , na qualidade de promotora, um contrato de urbanização relativo à execução de infraestruturas a reverter para o domínio público pontos 11 e 16 da matéria assente ; c) A Recorrente suportou custos com a realização das infraestruturas a reverter para o domínio público ponto 17 da matéria assente ; d) A Recorrente debitou ao Município 1... os aludidos custos com a realização das infraestruturas a reverter para o domínio público ponto 19 da matéria assente ; e) «Os encargos suportados pelos promotores serão repartidos entre si de acordo com critérios que venham a ser acordados entre si.» ponto 6 da matéria assente - o que pressupões o débito dos respectivos encargos. xiii. Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, resulta documentalmente demonstrado nos autos: QUE a “factura ou documento equivalente” foi emitido em nome da Autarquia ; QUE o débito dos custos com a infraestruturas foi efectuado pelos promotores; QUE o IVA foi efectivamente suportado por esses promotores – mormente a Recorrente. xiv. Logo, não se compreende por que motivo conclui o Tribunal a quo que a Recorrente não podia razoavelmente presumir que a qualificação da operação, pela AT, como sujeita a IVA, acarretava o concomitante direito à dedução do IVA – o que constitui falta absoluta de fundamentação, na medida em que não externa qualquer fundamentação factual ou jurídica susceptível de confortar tal juízo conclusivo. xv. A Recorrente apenas não poderia contar, legitimamente, pelo direito à dedução de IVA caso a operação tivesse sido qualificada pela AT, ab initio, como não tributável – pois, nesse caso, nenhum IVA teria sido liquidado. xvi. Salvo o devido respeito, não se vislumbra uma outra situação em que seja mais gritante e ostensiva a violação dos mais basilares cânones da justiça proporcionalidade e boa -fé! xvii. Parafraseando a nossa Doutrina, «A informação vinculativa acaba, desse modo, por garantir uma aplicação mais uniforme da lei tributária, uma aplicação menos sujeita ao capricho ou iniquidade, que o contribuinte pode antecipar com maior facilidade também .» 17 . xviii. No caso em apreço, ao invés do decidido pelo Tribunal a quo, a AT não pode pretender emitir um avultado acto tributário com base na invocação de que “a liquidação de IVA efectuada é desprovida de sentido” quando, no caso concreto, informara o Contribuinte que tal liquidação tinha todo sentido… xix. Sobretudo quando é essa a base central da liquidação adicional que emitiu em evidente venire contra factum próprio, e quando nunca erigiu o tratamento documental como pressuposto para a incidência de IVA ou como razão determinante para a sua superveniente alteração de entendimento. xx. Os entendimentos da AT vertidos em informação vinculativa - como em qualquer outro instrumento administrativo , circular ou ofício-circulado - atenta a sua natureza e propósito, criam no Contribuinte uma razoável e legítima expectativa de que a AT adoptará um critério uniforme para situações factuais semelhantes. xxi. De notar que a introdução do mecanismo de informação vinculativa está intimamente relacionada com a implementação do mecanismo de autoliquidação do imposto – de que o IVA é um exemplo paradigmático xxii. Daí que a vinculação da AT às orientações administrativas por si emanadas “ implica que, mesmo que a administração tributária venha a considerar ilegal uma determinada interpretação da lei, tem de aplica-la aos casos concretos que ocorram durante o período de tempo em que ela vigorava por força de uma orientação genérica . Esta aplicação traduz-se, assim, no sacrifício do princípio da legalidade, restringindo à norma que concretamente regula a situação, para salvaguarda dos princípios da igualdade e da boa fé, que também integram o bloco da legalidade.»18 . xxiii. Aliás, estando em causa o ano de 2010, nem sequer era conhecido pela Impugnante (ou existente) qualquer entendimento divergente da AT reportado à referida data – o que é confirmado pela AT e consta do ponto 50 da matéria assente . xxiv. Como a AT admite na decisão impugnada, tal entendimento apenas veio a ser alterado após os factos em causa, sendo que, entretanto, a sobredita orientação administrativa havia já firmado na Impugnante a legítima expectativa de que o entendimento sufragado pela AT a colocaria a salvo de actos tributários como o presente . xxv. Salvo o devido respeito, que é muito, ao assim não decidir, o Tribunal a quo pretende atribuir todos os ónus e deveres ao Contribuinte e todas as prerrogativas e direitos à AT – linha de raciocínio que, de resto, percorre toda a decisão recorrida . xxvi. Como resulta da própria motivação da decisão recorrida, a páginas 30 da sentença, a testemunha «AA» – que era administrador da Recorrente à data dos factos – atestou, quanto ao procedimento concretamente adoptado pela Recorrente, que «Colocamos elevado rigor e elevada exigência nesse procedimento. E depois seguiu-se um trabalho interno e externo, com auxílio na análise de todos os documentos relativos às normas. Foi a [SCom03...] que assegurou essa análise em conjunto com a [SCom01...].». xxvii. De igual modo, como a páginas 30 da sentença, a mesma testemunha «AA», referiu que, na senda do sobredito rigor e diligência na implementação do procedimento em causa nos autos, “decidimos solicitar um pedido de informação vinculativa sobre como proceder quanto â entrega das infraestruturas ao domínio público”. xxviii. Destarte, sinalizam os autos, documental e testemunhalmente, que previamente à adopção do procedimento em causa nos autos – mormente, antes da liquidação de IVA pela operação – a Recorrente tomou um conjunto de diligências destinadas a obter até a confirmação administrativa quanto à incidência de IVA. xxix. E daí que, quando a AT vem invocar, como fundamento das correcções que promoveu, que “a liquidação de IVA efectuada é desprovida de sentido – IVA indevidamente liquidado., salvo o devido respeito, afigura-se claro e evidente que a Recorrente tinha a legitima expectativa de que o IVA estava a ser “devidamente liquidado”. xxx. Cumpre sublinhar que no centro dos presentes autos, como referido no ponto 6 da matéria assente , está um Contrato de Investimento com o Estado Português e um Contrato de Urbanização com o Município 1... relativo à execução de infra-estruturas no âmbito do Plano de Urbanização ... . xxxi. E daí que seja evidente que, neste contexto, a informação prestada pela AT inculcou da Recorrente a legítima confiança que de que aquela actuaria segundo a informação prestada – mormente no sentido de que, sendo a operação sujeita, era devida a liquidação de IVA – pois de outro modo fica completamente malbarato o princípio da confiança e boa-fé plasmado no artigo 266.º n.º 2 da CRP. xxxii. Basta pensar que, no caso em apreço, a AT inverte por completo o seu entendimento quanto à própria INCIDÊNCIA OBJECTIVA DO IMPOSTO, mas refere, com guarida do Tribunal a quo, que tal alteração de entendimento – que marcou indelevelmente a actuação do Contribuinte – em nada releva, face à emissão de notas de débito. xxxiii. O artigo 68.º da LGT na interpretação segundo a qual a vinculação da AT apenas se verifica no caso de identidade absoluta das situações fácticas – mormente dos factos que em nada alteram o recorte jurídico aplicável – seria materialmente inconstitucional, por violação artigo 266.º n.º 2 da CRP. xxxiv. Ao contrário do invocado pelo Tribunal a quo, não está em causa saber qual o valor tributável, a taxa de IVA aplicável ou o tratamento documental para efeito da liquidação de IVA – o que, como é evidente, tudo seria absolutamente irrelevante caso a operação não fosse sujeita a IVA. xxxv. Por outro lado, para sustentar a liquidação em causa e, concomitantemente, para proferir a decisão impugnada, a AT suporta-se, claramente, em doutrina administrativa posterior aos factos em causa e, sobretudo, posterior à doutrina administrativa em que a Impugnante, em manifesta boa-fé, suportou a sua actuação – o que constitui violação do disposto no artigo 68.º-A n.º 2 da LGT. xxxvi. Todavia, o Tribunal a quo omitiu pronúncia sobre esta relevante questão, atinente à violação do disposto no artigo 68.º-A n.º 2 da LGT – o que acarreta a nulidade da sentença por omissão de pronúncia. xxxvii. O princípio da protecção da confiança encontra consagração na Sexta Directiva de IVA19 e na mais jurisprudência emanada pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias 20: «A Sexta Directiva, interpretada à luz do princípio da protecção da confiança, obsta à aplicação retroactiva do imposto, se, através de uma informação de um órgão fiscal nacional, tiver sido criada a confiança legítima na isenção de uma operação como a do processo principal .». xxxviii. Como resulta da sentença recorrida, «(…) o enquadramento a aplicar ao IVA suportado nos gastos com as infraestruturas para o domínio público será efetuado em função do enquadramento das operações ativas do sujeito que se encontrem a jusante e (,) porque (,) a Impugnante, àquela data, era sujeito passivo isento, o IVA suportado com estes custos não confere(m) direito à dedução (…)». xxxix. Resulta demonstrado nos autos, mormente no ponto 4 da matéria assente , que a partir de 14.05.2009 a Recorrente passou a ser um sujeito passivo misto; e resulta evidenciado nos autos, designadamente no ponto 17 da matéria assente , que a liquidação do IVA em causa foi efectuado no ano de 2010 – pelo que existe uma evidente contradição entre os fundamentos e a decisão, a acarretar a nulidade da sentença. xl. Quanto a este específico segmento da decisão recorrida, a mesma tem como pressuposto, como é óbvio, a prévia consideração de que – contrariamente ao informado pela AT - não está em causa uma qualquer operação tributável, pelo que tendo a Recorrente actuado com a plena convicção de que estavam em causa operações sujeitas a IVA – tal como informado - procedeu à liquidação de IVA e exerceu o inerente direito à dedução. xli. A liquidação de juros compensatórios, por força do disposto no artigo 35.º da LGT, apenas é legítima quando exista dolo ou negligência do Contribuinte e um nexo de causalidade adequada entre o atraso na liquidação e a actuação do Contribuinte, susceptível de um juízo de censura ético-pessoal 21 ,. xlii. Assim não entendeu o Tribunal a quo, invocando, por um lado, que a Recorrente, na qualidade de Contribuinte, tinha a obrigação de analisar a informação vinculativa na sua integralidade , e, por outro lado, que apenas em sede de reclamação graciosa comunicou a existência da descrita informação vinculativa – o que, no entender do Tribunal a quo, acarreta que a Recorrente “não actuou com a diligência normal no cumprimento das suas obrigações fiscais ”. xliii. Salvo o devido respeito, por um lado, o Tribunal a quo faz por esquecer que apenas foi liquidado IVA pela entrega de infraestruturas ao Município 1... por expressa informação nesse sentido pela própria AT. xliv. Por outro lado, para efeito da aferição sobre os pressupostos legais para a liquidação de juros compensatórios, o Tribunal a quo decide convocar uma suposta deficiência na instrução documental do procedimento de reclamação graciosa - que carece em absoluto de previsão legal. xlv. Estando em causa um pedido de informação vinculativa emitido no caso concreto, era à AT a quem incumbia, ex oficio, e em estrito cumprimento do princípio do inquisitório22, dar nota da existência de tal doutrina administrativa, da sua própria autoria. xlvi. Salvo o devido respeito, que é muito, o segmento decisório em causa é demonstrativo de que, no caso em apreço , o Tribunal a quo pretende atribuir todos os ónus e deveres ao Contribuinte e todas as prerrogativas e direitos à AT – que fica incólume à mínima reprimenda. xlvii. Embora estivesse em causa um projecto a que subjaz um contrato de investimento com o Estado Português, bem como um contrato de urbanização com o Município 2... - ambos com avultados contornos financeiros, quando instada a empreender uma análise sobre o enquadramento tributário da entrega das infraestruturas em sede de IVA, a AT concluiu, sem margem para dúvidas: “Trata-se, efectivamente, de operações sujeitas a IVA”. xlviii. Está em causa, note-se, a emanação de uma orientação administrativa sufragada pelo Director Geral dos Impostos – através da qual foi emanado um entendimento no sentido da determinação da incidência de IVA – o qual, como é por demais evidente, determinou clara e necessariamente uma liquidação de IVA pela Recorrente que, SEIS ANOS MAIS TARDE, a mesma AT veio a reputar de indevida. xlix. Logo, em sentido diametralmente oposto ao decidido pelo Tribunal a quo, para além de ser evidente a forma leviana como a AT, por um lado promoveu a liquidação de IVA que depois reputa de “indevida”, não subsistem quaisquer razões, de facto ou de Direito, que justifiquem a manutenção das liquidações de imposto, e muito menos de juros compensatórios. l. Aliás, seria assim ainda que a informação vinculativa não incidisse sobre o caso concreto e tivesse sido dada a um terceiro 23 . Nestes termos e nos melhores de direito, deve conceder-se provimento ao presente recurso e, por via disso, anular-se a decisão recorrida - o que se fará por obediência à Lei e por imperativo de J U S T I Ç A !” ** O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, considerando que “a douta sentença não merece qualquer reparo pelo que concordando, por inteiro, com os seus termos e fundamentos”. ** Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos ao abrigo do disposto no artigo 657.º n.º 4 do Código de Processo Civil, submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. ** Objecto do recurso O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos Recorrentes, como resulta do disposto no artigo 608.º n.º 2, artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º n.º 1, todos do Código de Processo Civil. Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir i) da nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia e por contradição entre os fundamentos e a decisão e ainda por falta de fundamentação ii) do erro de julgamento de direito. É certo que no corpo alegatório a Recorrente vem invocar o erro de julgamento da matéria de facto, no entanto, as conclusões formuladas são totalmente omissas quanto à matéria da impugnação da decisão da matéria de facto. Ora, tal como vem entendido a Jurisprudência e a melhor doutrina “Os ónus processuais de alegação recursiva previstos no art. 640º, 1 e 2, do CPC, relativos à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, conjugam-se com o ónus de formulação de conclusões, cominado, em caso de incumprimento, com o indeferimento do recurso”, pois que “com esta omissão foi ignorada e incumprida a função essencial da formulação de conclusões na economia da peça recursiva: elaborar a “síntese final” que permite delimitar o objecto de pronúncia ao tribunal ad quem e confrontar o recorrido com o ónus de contra-alegação, evitando a formação de dúvidas e equívocos sobre a matéria ou matérias que correspondem ao escopo e âmbito da impugnação” – cfr. Acórdão do STJ de 9.06.2021, proc. 10300/18.8T8SNT.L1.S1. Razão pela qual não será apreciado o erro da matéria de facto assente. ** 2 - Fundamentação 2.1. Matéria de Facto O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte forma, que aqui se reproduz: “1. A Impugnante, [SCom01...], S.A., contribuinte fiscal n.º ...12, com sede no Lugar ..., ..., ... ..., é uma sociedade comercial anónima, que se dedica ao exercício da atividade principal de compra e venda de bens imobiliários – CAE 68100, constituindo o seu objecto social a “Compra e venda de bens imobiliários (e mobiliários), a urbanização de terrenos, a construção de imóveis e a comercialização das respectivas actividades; e a exploração de parques de estacionamento”. – Cfr. facto não controvertido; relatório de inspeção tributária (RIT) de fls. 131-147 do PA apenso; 2. Para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), está enquadrada no regime geral de tributação, sendo tributada de acordo com o Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), integrando o grupo denominado “[SCom02...], S.A.”, contribuinte fiscal n.º ...59, com sede no distrito .... – Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; 3. Para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), esteve enquadrada, até 14/05/2009, no regime de isenção (artigo 9º, n.º 30 do Código do IVA – operações sujeitas a IMT). – Cfr. facto não controvertidos; prints visão integrada do contribuinte a fls. 97 e 98 do PA apenso; RIT a fls. 131-147 do PA apenso; 4. A partir dessa data (14/05/2009), na sequência de contrato de cessão de exploração de um parque de estacionamento sito num resort turístico da Península ..., designado de “[SCom02...]”, passou a estar enquadrada no regime normal de tributação de periodicidade trimestral, misto com afetação real – Cfr. facto não controvertido; prints visão integrada do contribuinte a fls. 97 e 98 do PA apenso; RIT a fls. 131-147 do PA apenso. 5. À data de 31/12/2010, a Impugnante era detida a 100% pela [SCom02...], S.A., contribuinte fiscal n.º ...59. Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso. 6. Em 23/01/2007, a [SCom04...] SGPS, S.A, dirigiu à Direção de Serviços do IVA um pedido de Informação Vinculativa relativamente ao enquadramento tributário da situação que apresentou nos seguintes termos: “(…) I. SITUAÇÃO 1. A [SCom04...] reúne um conjunto de participações em sociedades que desenvolvem a actividade turística, traduzindo uma aposta estratégica neste sector. 2. Tendo como objectivo o desenvolvimento da referida actividade, a [SCom04...] celebrou, em 16 de Maio de 2000, um Contrato de Investimento com o Estado Português, (…), que visou regular as obrigações assumidas pelas partes no âmbito do projecto definitivo de investimento para a Península .... 3. O contrato referido no número anterior representa o ponto de partida para um projecto de investimento turístico que se desenvolve em ..., distribuído por quatro núcleos territoriais principais denominados: Núcleo Urbano (…); Núcleo da Praia (…); Núcleo Hotel-Resort (…); Núcleo Eco-Resort (…). 4. As entidades da [SCom04...] que participam neste projecto são: (…) [SCom01...], S.A. (“[SCom01...]”); (…)” (…) 6. Tendo em vista a execução do referido projecto definitivo de investimento para a Península ..., foi celebrado, em 6 de Outubro de 2005, um Contrato de Urbanização relativo à execução de projectos e infraestruturas no âmbito do Plano de Urbanização .... 7. Este Contrato de Urbanização foi celebrado entre o Município 1... e várias entidades, a saber: (…) [SCom01...] (…). 8. Neste contexto, no contrato referido no número anterior, celebrado entre o Município 1... e os promotores, ficou estabelecido que o Plano de Urbanização ... (“PU”) e os planos de pormenor (“PP”) aplicáveis às Unidades Operativas de Planeamento e Gestão (as “UNOP”) serão executados através do sistema de compensação, por iniciativa dos promotores, os quais “(…) prestarão ao Município 1... compensação por meio da realização das Infraestruturas gerais de equipamento e de espaços verdes e de utilização colectiva na Península ...”. (…) 10. No âmbito deste contrato, os referidos Promotores assumiram diversas obrigações, tendo como contrapartida o licenciamento do projecto, entre elas a compensação por meio da realização de Infraestruturas Gerais e de Infraestruturas Locais, na Península .... 13. Apresentamos abaixo um detalhe das obras de Infraestruturas Gerais e Locais a realizar em cada uma das UNOP (1 a 4). (…) 15. Refira-se, ainda, que, nos termos do referido contrato, as infraestruturas serão executadas pelos promotores, os quais suportarão os custos com a realização e/ou reforço das mesmas, contratando directamente para o efeito, em seu nome e sob sua responsabilidade, com projectistas, empreiteiros e outros fornecedores. 16. Os encargos suportados pelos promotores serão repartidos entre si de acordo com critérios que venham a ser acordados entre si. 17. As Infraestruturas serão realizadas e/ou reforçadas em terrenos pertencentes ao domínio público, pelo que os promotores se comprometeram a ceder ao Município 1..., sem encargos, as parcelas necessárias para a realização destas infraestruturas. 18. Uma vez concluídas as respectivas obras de realização e/ou reforço nos termos previstos no referido contrato, as infraestruturas serão entregues pelos promotores ao Município 1..., mediante auto de recepção. II. QUESTÕES A ANALISAR 19. A requerente pretende ver confirmado o seu entendimento sobre o enquadramento em IVA das infraestruturas a realizar e/ou reforçar descritas na secção I do presente requerimento e que irão ser entregues ao Município 1... pelos promotores do empreendimento, em particular, os seguintes aspectos: a) Qualificação da operação para efeitos de IVA; b) Exigibilidade do imposto; c) Determinação do valor tributável da operação; d) Definição da taxa de IVA a aplicar; e) Direito à dedução do IVA incorrido; (…) Em face do exposto, solicita a V. exa. Informação prévia Vinculativa que confirme o entendimento de que: 1. A entrega das Infraestruturas pelos promotores ao Município 1... configura uma prestação de serviços sujeita a IVA, não abrangida por qualquer norma de isenção; 2. O valor tributável é o valor normal do serviço, i.e., no caso em apreço, o valor dos serviços de empreitado facturados às entidades Promotoras pelos empreiteiros; 3. Esta prestação de serviços é uma operação enquadrável na verba 2.17 da Lista I anexa ao Código do IVA e, portanto, incide IVA à taxa de 5% sobre o valor das infraestruturas entregues ao Município 1...; 4. Sendo uma operação tributável, o IVA incorrido pelos promotores para a realização das empreitadas é dedutível. (…)” (realce conforme original) – Cfr. requerimento a fls. 152 a 164 do PA apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; 7. Em 22/02/2008, foi prestada, no âmbito do Processo A1002007053, a Informação Vinculativa n.º 1121, com o seguinte teor: “(…) 4. ENTREGA DAS INFRAESTRUTURAS PELOS PROMOTORES AO Município 1... – Trata-se, efectivamente, de operações sujeitas a IVA e dele não isentas face ao disposto no art. 4º, n.º 1, do CIVA, conjugado com os artigos 1º, n.º 1, alínea a) e 2º, n.º 1, alínea a), do CIVA (Independentemente do facto de o respectivo débito a efectuar pelos promotores ao Município 1... corresponder, ou não, a um mero reembolso de custos suportados). 5. VALOR TRIBUTÁVEL 5.1 De acordo com o disposto no art. 16º, n.º do CIVA, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do mesmo artigo, o valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto será o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro. 5.2 Por sua vez, o n.º 3 do mesmo artigo preceitua que se a contraprestação não for definida, no todo ou em parte, por dinheiro, o valor tributável será o montante recebido ou a receber, acrescido do valor normal dos bens ou serviços dados em troca e a alínea c) do n.º 5 do citado artigo estabelece que o valor tributável incluirá as subvenções directamente conexas com o preço de cada operação, considerando como tais as que são estabelecidas em função (…) do volume dos serviços prestados e sejam fixadas anteriormente à realização das operações. 5.3 Consequentemente, o valor tributável (dos serviços facturados ao Município 1... – correspondentes às infraestruturas entregues) incluirá não só o “custo das empreitadas” mas também as contrapartidas referenciadas em 5.2. 6. ENQUADRAMENTO NA VERBA 2.17 LISTA I ANEXA AO CIVA (…) 6.4 Na realidade, os promotores em causa, actuando na qualidade de empreiteiros – tendo, obviamente, em atenção as regras de exigibilidade do imposto constantes dos artigos 7º e 8º do CIVA – poderão aplicar a taxa reduzida de liquidação em IVA (no caso, 5%) no âmbito da entrega das indagadas infraestruturas ao Município 1... em causa, ao abrigo do disposto na supra citada verba 2.17, desde que a respectiva factuaração seja emitida em nome da autarquia adquirente (à semelhança, aliás, do entendimento constante, entre outras, da informação desta direcção de Serviços, n.º 1955, de 13.11.03, com despacho concordante de 12.12.03, a propósito das obras entregues às autarquias por empresas municipais que actuem eventualmente na qualidade de empreiteiro). 7. DEDUÇÃO DO IVA SUPORTADO – Finalmente, esclarece-se que o imposto efectivamente suportado pelos promotores concernente às referidas empreitadas – operações tributáveis – é passível do direito à dedução (art. 20º, n.º 1, al. “a”) nos termos consignados nos artigos 19º e seguintes do CIVA. (…)”. – Cfr. Informação Vinculativa a fls. 42-44 da RG que integra o PA apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzida; 8. Sobre a supra identificada Informação Vinculativa foi exarado despacho, em 11/04/2008, pelo Diretor-Geral dos Impostos, nos seguintes termos: “Concordo. Apesar de o requerimento não ter sido dirigido ao dirigente máximo do serviço, requisito essencial do Art.º 68.º da LGT, invocado pelo contribuinte, proceda-se à emissão de uma Informação Vinculativa nos termos constantes da presente informação.” – Cfr. despacho exarado na Informação a Vinculativa a fls. 42-44 da RG que integra o PA apenso; 9. O «Grupo A...» desenvolveu um projeto imobiliário na Península ..., que consistiu na construção de um resort turístico, denominado “[SCom02...]”, que engloba diferentes empreendimentos turísticos compostos por hotéis, vilas turísticas, apartamentos turísticos, campo de golf, piscinas, campos de ténis, marina, restaurantes, bares, zonas de parqueamento. Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 10. A exploração turística desse resort é feita de uma forma integrada, por outras empresas do «Grupo A...», incluindo a Impugnante, e tendo em conta o conjunto de infraestruturas e empreendimentos que o integram. –Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 11. Tendo em vista a realização deste projeto, foi celebrado um Contrato de Urbanização relativo à execução de infraestruturas no âmbito do Plano de Urbanização ... entre o Município 1... e várias entidades do «Grupo A...» promotoras do projeto, incluindo a Impugnante. – Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 12. As referidas infraestruturas dividem-se em Infraestruturas Gerais e Locais, sendo que estas últimas consistem naquelas a realizar nas diferentes Unidades de Planeamento e Gestão (UNOP). – Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 13. Os custos com a realização das obras de infraestruturas entregues ao domínio público foram integralmente suportados pela sociedade [SCom02...] S.A. – Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 14. A [SCom02...] procedeu ao redébito de parte dos custos suportados com a realização das obras entregues ao domínio público à Impugnante. – Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 15. Estão em causa custos decorrentes da construção de arruamentos, rede de abastecimento de água, redes de água pluviais, redes viárias, infraestruturas elétricas, telecomunicações, estação de tratamento de águas residuais – RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 16. Tais infraestruturas foram executadas em terrenos pertencentes ao domínio público e foram ulteriormente entregues ao Município 1.... – Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 17. Em 30/04/2010, a [SCom02...] procedeu à emissão de Notas de Débito em nome da Impugnante (n.º 60000025, 60000026, 60000027, 60000028, 60000029 e 60000030), com valor base total de € 7.147.013,58 e IVA no montante global de € 357.350,68, com o descritivo: “No âmbito do contrato de urbanização da península ..., a [SCom02...] suportou os custos com as infraestruturas Gerais, tendo direito de regresso de 46,38% desses custos sobre a Vossa empresa”, tendo subjacentes faturas com as seguintes designações “Licenças e Seguros – Infraestruturas Gerais; Licenças e Seguros – Infraestruturas UNOP1; Projetos de Arquitetura, Engenharia Management, Estudos, Consultoria; Eletricidade e Comunicações - Infraestruturas UNOP1; Obras de Construção Civil – Infraestruturas Gerais”. – Cfr. facto não controvertido; quadro a páginas 11 do RIT a fls. 131-147 do PA apenso; 18. Na mesma data, a Impugnante emitiu as Notas de Crédito (n.º 7800055, 7800056, 7800057, 7800058, 7800059 e 7800060), – Cfr. facto não controvertido; quadro a páginas 11 do RIT a fls. 131-147 do PA apenso; 19. Em 30/04/2010, a Impugnante procedeu à emissão de Nota de Débito n.º 0007800002, em nome do Município 1..., com valor de incidência de € 7.134.577,40 e IVA no montante de € 356.728,87, contendo a seguinte descrição: “Valor que levamos a débito de V/ conta referente a 5% do IVA apurado no âmbito da entrega de obra das infraestruturas ao Município 1....” – Cfr. Nota de Débito a fls. 103 do PA apenso; 20. Em 30/04/2010, a Impugnante procedeu à emissão de Nota de Crédito n.º 0007800003, em nome do Município 1..., com valor de € 356.728,87, contendo a seguinte designação: “Valor que levamos a crédito de V/ conta referente a 5% do IVA apurado no âmbito da entrega da obra das infraestruturas ao Município 1....” – Cfr. Nota de Crédito a fls. 104 do PA apenso; 21. Em 18/05/2010, a Impugnante procedeu à emissão de Nota de Débito n.º 0007800004, em nome do Município 1..., com valor de incidência de € 12.436,20 e IVA no montante de € 621,81, contendo a seguinte descrição: “Valor que levamos a débito de V/ conta referente a complemento à N/ ND 7800002 de 30/04/2010.” – Cfr. Nota de Débito a fls. 105 do PA apenso; 22. Em 18/05/2010, a Impugnante procedeu à emissão de Nota de Crédito n.º 0007800005, em nome do Município 1..., com valor de € 621,81 contendo a seguinte designação: “Valor que levamos a crédito de V/ conta referente a complemento à N/ ND 7800002 de 30/04/2010.” – Cfr. Nota de Crédito a fls. 106 do PA apenso; 23. Em 17/12/2010, a [SCom02...] procedeu à emissão de Notas de Débito em nome da Impugnante (n.º 60000041, 60000042, 60000043, 60000044, 60000045 e 60000046), com o descritivo: “Valor que levamos a débito da Vossa conta referente à quota parte dos custos suportados com as Infraestruturas da UNOP1 da península ... (…)”, tendo subjacentes faturas com as seguintes designações “Licenças e Seguros – Infraestruturas Gerais; Licenças e Seguros – Infraestruturas UNOP1; Serviços de Construção Civil, com IVA devido Adquirente - Infraestruturas UNOP1; Serviços de Construção Civil, Projetos de Arquitetura, Engenharia, Management, Estudos, Consultoria e Outros- Infraestruturas UNOP1; Serviços de Construção Civil, com IVA devido Adquirente – Infraestruturas Gerais”. – Cfr. facto não controvertido; quadro a páginas 12 do RIT a fls. 131-147 do PA apenso; 24. A Impugnante exerceu o direito à dedução do IVA relativamente às Notas de Débito emitidas pela [SCom02...] em abril de 2010 aludidas em 18. e 19. supra. – Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 25. A Impugnante não exerceu o direito à dedução do IVA relativamente às Notas de Débito emitidas pela [SCom02...] em dezembro de 2010 aludidas em 23. supra. – Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso; prova testemunhal; 26. A Impugnante procedeu à submissão das declarações periódicas (DPs) de IVA, referentes aos quatro trimestres do ano de 2010, tendo apurado no período 1006T (2.º trimestre de 2010) um montante de € 237.572,38 a entregar ao Estado. – Cfr. resumo de declarações e consulta de declaração periódica a fls. 99 e 100 do PA); 27. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI24.....11, motivada pela “Validação das declarações periódicas de IVA; Transição POC-SNC”, foi a Impugnante sujeita a ação de inspeção externa, âmbito parcial – IVA e IRC – com incidência no ano de 2010. – Cfr. facto não controvertido; RIT a fls. 131- 147 do PA apenso; 28. Em 11/04/2014, no decurso do procedimento inspetivo supra, a Inspeção Tributária procedeu ao envio à Impugnante de comunicação solicitando informações. – Cfr. RIT (página 10) a fls. 131-147 do PA apenso; 29. A Impugnante procedeu ao envio da seguinte informação: «O «Grupo A...» desenvolveu um projeto imobiliário na Península ..., que consistiu na construção de um resort turístico, o qual engloba a construção de hotéis, aldeamentos turísticos, aparthotéis, casino, marina, entre outras infra-estruturas. Tendo em vista a realização deste projeto, foi celebrado um Contrato de Urbanização relativo à execução de infra-estruturas no âmbito do Plano de Urbanização ..., entre o Município 1... e várias entidades do «Grupo A...» promotoras do projeto, incluindo a [SCom01...]. As referidas infra-estruturas dividem-se em: infra-estruturas gerais e locais (estas últimas consistem naquelas a realizar nas diferentes Unidades Operativas de Planeamento e Gestão – “UNOP” (…) O custo com a realização das obras entregues ao domínio público foram integralmente suportadas pela empresa [SCom02...], SA. A [SCom02...] procedeu ao redébito de parte dos custos suportados com a realização das obras entregues ao domínio público anteriormente referidas, às diversas entidades promotoras dos projetos. O dever de entrega das obras era da empresa [SCom02...], SA e das demais entidades promotoras dos projetos, nos termos do Contrato de Urbanização. (…)”. – Cfr. RIT (página 10) a fls. 131-147 do PA apenso; 30. Em 08/07/2014, a Impugnante procedeu à entrega, em mão, de resposta ao pedido de informação da Inspeção Tributária, atinente com Notas de Débito e de Crédito emitidas ao Município 1..., nos seguintes termos: “A operação que envolve estas Notas de Débito e de Crédito, emitidas pela [SCom01...] ao Município 1... ..., refere-se à entrega das obras de infraestruturas executadas no âmbito do Plano de Urbanização ..., celebrado entre o Município 1... e as várias entidades promotoras do projeto, nele identificadas, nas quais se inclui a [SCom01...], conforme abaixo explicitamos: Após a assinatura do Auto de recepção das obras de infra-estruturas por parte do Município 1..., cuja cópia se envia em anexo, e na sequência da exaustiva segregação dos documentos/operações relacionadas com a entrega destas infra-estruturas gerais, a empresa [SCom02...] procedeu à emissão de Notas de Débito, às diversas sociedades promotoras, na qual se incluía também a sociedade [SCom01...], no valor imputável a cada uma delas. Tendo como suporte estas notas de débito emitidas pela [SCom02...] procedeu à correspondente dedução do IVA. Por sua vez, a [SCom01...] emitiu duas Notas de Débito à C.M.... no montante do IVA a entregar ao Estado, isto é, 5% relativo ao IVA apurado no âmbito da entrega das infra-estruturas ao Município 1.... A declaração periódica do IVA do 2º trimestre de 2010, considerou estes dois débitos. Posteriormente a [SCom01...] emitiu duas Notas de Crédito à C.M. ..., que foram relevadas contabilisticamente no seu ativo, em Inventários (classe 3) e em Ativos Fixos Tangíveis (classe 4) (…)”. – Cfr. resposta a fls. 101-106 do PA apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzida; RIT (páginas 13 e 14) a fls. 131-147 do PA apenso; 31. Em 11/07/2014, através de mensagem de correio eletrónico, registo de saída n.º ...79, a Inspeção Tributária dirigiu ao Município 1... a seguinte comunicação: “(…) solicita-se o envio de uma relação dos documentos contabilísticos emitidos pela sociedade [SCom01...], S.A. NIPC. ...12, em nome do Município 1..., NIPC. ...18, com data de 2010, assim como correspondente registo e tratamento contabilístico. (…)”. – Cfr. mensagem de correio eletrónico a fls. 107 do PA apenso; 32. Na mesma data, o Município 1... procedeu à remessa de mensagem de correio eletrónico com o seguinte teor: “(…), no ano 2010 não houve registo contabilístico emitido pela sociedade [SCom01...], S.A com o número de contribuinte ...12. (…)”. – Cfr. mensagem de correio eletrónico a fls. 108 do PA apenso; 33. Em 15/07/2014, foi elaborado, no âmbito do procedimento inspetivo identificado, supra, projeto de relatório de inspeção. – Cfr. projeto de inspeção tributária a fls. 111 a 127 do PA apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido; 34. Na mesma data, através de ofício n.º ...46/0510, foi levado ao conhecimento da Impugnante, por contacto pessoal, o teor do aludido projeto de relatório de inspeção tributária. – Cfr. ofício a fls. 110 do PA apenso; 35. Em 04/08/2014, foi elaborado Relatório Final de Inspecção do qual resultaram, no que ora releva, correções meramente aritméticas, imposto em falta – “IVA liquidado indevidamente e Iva deduzido indevidamente” que aqui, em parte, se transcrevem: “(…) III.2.1 IVA liquidado indevidamente e IVA deduzido indevidamente Conforme referiu o sujeito passivo: «O «Grupo A...» desenvolveu um projeto imobiliário na Península ..., que consistiu na construção de um resort turístico, o qual engloba a construção de hotéis, aldeamentos turísticos, aparthotéis, casino, marina, entre outras infra-estruturas. Tendo em vista a realização deste projeto, foi celebrado um Contrato de Urbanização relativo à execução de infra-estruturas no âmbito do Plano de Urbanização ..., entre o Município 1... e várias entidades do «Grupo A...» promotoras do projeto, incluindo a [SCom01...]. As referidas infra-estruturas dividem-se em: infra-estruturas gerais e locais (estas últimas consistem naquelas a realizar nas diferentes Unidades Operativas de Planeamento e Gestão – “UNOP” (…) O custo com a realização das obras entregues ao domínio público foram integralmente suportadas pela empresa [SCom02...], SA. A [SCom02...] procedeu ao redébito de parte dos custos suportados com a realização das obras entregues ao domínio público anteriormente referidas, às diversas entidades promotoras dos projetos. O dever de entrega das obras era da empresa [SCom02...], SA e das demais entidades promotoras dos projetos, nos termos do Contrato de Urbanização. (…)”. Refira-se ainda que o redébito foi efetuado com base num critério de repartição aos encargos comuns dos empreendimentos do ... Resort, às entidades promotoras dos projetos, nomeadamente à [SCom01...]. Resume-se, de seguida, os redébitos efetuados pela [SCom02...] à [SCom01...], tendo em conta as Notas de Débito e os mapas de apoio apresentados pelo sujeito passivo, assim como, as Notas de Débito e de Crédito efetuadas pela [SCom01...] ao Município 1... ..., no exercício de 2010: (…) IVA DEDUZIDO pelas Notas de Débito da [SCom02...] Conforme se verifica, a [SCom01...] exerceu o direito à dedução relativamente às Notas de débito emitidas pela [SCom02...] no mês de Abril de 2010, no valor total de € 1.429.402,71. Este IVA encontra-se deduzido no 2.º trimestre de 2010, no campo 20 (Imobilizado) e 22 (Existências à taxa normal), cujos valores ascendem a € 116.682,16 e € 1.312.720,55, respectivamente. Já no que respeita às aquisições de serviços cujas Notas de Débito da [SCom02...] datam de Dezembro, apesar de relativos ao mesmo Plano de Urbanização ..., também referentes a infra-estruturas gerais e locais e também cedidas a domínio público, não exerceram o direito à dedução. IVA LIQUIDADO pelas Notas de Débito da [SCom01...] Pelos quadros acima pode ainda verificar-se que, através das Notas de Débito emitidas pela [SCom01...], foi liquidado IVA à taxa de 5% sobre € 7.147.013,58 (que corresponde no valor dos custos com as obras sobre as quais foi exercido o direito à dedução). Entretanto, com a mesma data, a [SCom01...] emitiu duas Notas de Crédito ao Município 1..., com os mesmos valores, resultando num saldo de conta corrente zero em nome do Município 1.... Questionado o Município 1... relativamente à receção e tratamento contabilístico dos referidos documentos, responderam que não receberam quaisquer documentos, ou seja, a emissão destes documentos em nome do Município 1... acarretaram, em termos contabilísticos, a liquidação de IVA sobre o valor das obras (entregues ao Estado), com consequente capitalização do mesmo em contas do Ativo da empresa. Tal faturação pretendeu ainda justificar exercício do direito à dedução das operações a montante (Notas de Débito da [SCom02...]). (…) ENQUADRAMENTO DAS OPERAÇÕES EFETUADO PELA [SCom01...] Questionado o sujeito passivo sobre as operações descritas, nomeadamente sobre a emissão das Notas de Débito ao Município 1... e consequente liquidação de IVA à taxa de 5%, veio referir que: “A operação que envolve estas Notas de Débito e de Crédito, emitidas pela [SCom01...] ao Município 1... ..., refere-se à entrega das obras de infra-estruturas executadas no âmbito do Plano de Urbanização ..., celebrado entre o Município 1... e as várias entidades promotoras do projeto, nele identificadas, nas quais se inclui a [SCom01...], conforme abaixo explicitamos: Após a assinatura do Auto de recepção das obras de infra-estruturas por parte do Município 1..., cuja cópia se envia em anexo, e na sequência da exaustiva segregação dos documentos/operações relacionadas com a entrega destas infra-estruturas gerais, a empresa [SCom02...] procedeu à emissão de Notas de Débito, às diversas sociedades promotoras, na qual se incluía também a sociedade [SCom01...], no valor imputável a cada uma delas. Tendo como suporte estas notas de débito emitidas pela [SCom02...], a [SCom01...] procedeu à correspondente dedução do IVA. Por sua vez, a [SCom01...] emitiu duas Notas de Débito à C.M.... no montante do IVA a entregar ao estado, isto é, 5% relativo ao IVA apurado no âmbito da entrega das infra-estruturas ao Município 1.... A declaração periódica do IVA do 2º trimestre de 2010, considerou estes dois débitos. Posteriormente a [SCom01...] emitiu duas Notas de Crédito à C.M. ..., que foram relevadas contabilisticamente no seu ativo, em Inventários (classe 3) e em Ativos Fixos Tangíveis (classe 4”. Questionada ainda sobre o exercício do direito à dedução do IVA suportado nas Notas de Débito da [SCom02...], respondeu que: “As obras entregues ao domínio público pela [SCom02...] e restantes entidades promotoras incluindo a [SCom01...] correspondem a serviços de construção civil, realizados no âmbito de um contrato de empreitada de bens imóveis” A entrega das infra-estruturas pelos promotores ao Município 1... é uma operação tributada em IVA, dado tratar-se de um serviço de empreitada de bens imóveis. Assim sendo, a [SCom01...] deduziu o IVA na medida em que a entrega das obras em causa se encontra sujeita a IVA”. A fundamentação apresentada pela [SCom01...] confere às operações económicas descritas, um enquadramento legal e fiscal incorreto, conforme se justifica de seguida. CORRETO ENQUADRAMENTO LEGAL E FISCAL DAS OPERAÇÕES DESCRITAS Em primeiro lugar, acautela-se, mais uma vez, o facto de a empresa não ter seguido a mesma conduta contabilística e fiscal relativamente aos documentos recepcionados e emitidos em Abril e Dezembro de 2010, com relação aos gastos com as infra-estruturas gerais e locais na Península .... Conforme se verifica pelos quadros acima, a [SCom01...] exerceu o direito à dedução relativamente aos documentos com data de Abril. Em segundo lugar, verifica-se que o facto de a [SCom01...] ter debitado as obras e outras despesas com as referidas infra-estruturas, ao Município 1..., onde procedeu à liquidação de IVA à taxa reduzida de 5% revela um enquadramento incorreto das operações em causa porquanto não estamos perante o exercício de uma atividade da empresa que configure uma prestação de serviços ou uma transmissão de bens (tão pouco uma operação assimilada a uma transmissão de bens como é o caso das transmissões gratuitas). Ora, não constituindo a entrega destas infra-estruturas (entrega de obra ao domínio público) uma operação a jusante da atividade da empresa por falta de “autonomia económica ou jurídica”, mas sim uma condição gratuita e inseparável das operações que a empresa se propõe realizar a que se inserem na compra e venda de bens imóveis ou construção para venda, conforme definido no próprio relatório de gestão e atividade social da empresa, os custos associados às mesmas concorrem para a formação do preço final dos bens que serão, neste caso, sujeitas a IMT, sendo o seu enquadramento em sede de IVA dependente do enquadramento dessas operações que lhe estão associadas – operações isentas pelo artigo 9º nº 30 do CIVA. Assim, essa reversão de bens para domínio público, não se consubstanciando numa atividade económica como defendeu o sujeito passivo, não configura uma operação tributável, pelo que a liquidação de IVA efetuada é desprovida de sentido – IVA Indevidamente Liquidado. Desta mesma forma, o enquadramento a aplicar ao IVA suportado nesses gastos será em função do enquadramento das operações ativas da empresa que se encontrem a jusante. Uma vez que estamos perante uma empresa cujas operações se enquadram no regime de isenção estabelecido pelo art. 9º do CIVA – Isenção Incompleta, o IVA suportado com estes custos indissociáveis da mesma, não conferem Direito à Dedução – IVA Indevidamente Deduzido. Face ao exposto, será efetuada uma correção ao IVA indevidamente liquidado e ao IVA indevidamente deduzido (…) Nestes termos, apura-se uma correção ao imposto no valor de € 1.072.052,03. (realce conforme original) – Cfr. RIT a fls. 131-147 do PA apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; 36. Através do ofício n.º ...0, datado de 05/08/2014, remetido através de carta registada com aviso de recção – registo dos CTT n.º RF07......26PT – foi levado ao conhecimento da Impugnante o teor do Relatório de Inspeção. – Cfr. facto não controvertido; ofício a fls. 128-129 do PA apenso; 37. Em 07/08/2014, a Impugnante tomou conhecimento do aludido Relatório de Inspeção Tributária. – Cfr. data e assinatura apostas no aviso de receção a fls. 130 do PA apenso; 38. Em 24/11/2014, na sequência das correções efetuadas em sede inspetiva, foram emitidas as seguintes liquidações adicionais de IVA n.º ...90, no montante de € 1.072.052,03 e de Juros Compensatórios n.º ...91, no montante de € 170.235,99, perfazendo um montante total a pagar de € 1.242.288,02, com data limite de pagamento em voluntário em 31/10/2014. – Cfr. prints de liquidação de fls. 19-21 do PA junto aos autos; liquidações a fls. 30-34 do procedimento de RG que integra o PA; 39. Em 24/11/2014, foi emitida a certidão de dívida n.º ...72, relativa à dívida de IVA, período 1006T, no montante de € 1.072.052,03. – Cfr. certidão de dívida junta a fls. 26 e 27 do PA apenso, que aqui se dá por reproduzida; 40. Na mesma data, foi emitida a certidão de dívida n.º ...73, relativa à dívida de Juros Compensatórios, período 1006T, no montante de € 170.235,99. – Cfr. certidão de dívida junta a fls. 28 e 29 do PA apenso, que aqui se dá por reproduzida; 41. Na mesma data, com base nas certidões de dívida supra, foi instaurado contra a Impugnante, na qualidade de executada originária, o processo de execução fiscal n.º ...84. – Cfr. tramitação de processo a fls. 23-29 do PA apenso; 42. Em 18/12/2014, a Impugnante prestou, no âmbito do supra identificado processo de execução fiscal, garantia, na modalidade de fiança, prestada pela sociedade [SCom05...] SGPS, S.A., NIPC ...86. – Cfr. requerimento prestação garantia e decisão de fls. 30-89 do procedimento de RG que integra o PA; 43. A garantia supra veio a ser declarada idónea e, em 30/04/2015, o processo de execução fiscal foi suspenso. – Cfr. requerimento prestação garantia e decisão de fls. 30-89 do procedimento de RG que integra o PA; 44. Em 02/03/2015, a Impugnante deduziu procedimento de reclamação graciosa (RG) contra as liquidações aludidas em 38. supra, autuada com o nº ...33. – Cfr. fls. 3 a 13 do procedimento de RG que integra o PA apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais; data do registo dos CTT aposto no envelope a fls. 36 do referido procedimento administrativo; 45. Em 13/08/2015, no âmbito do aludido procedimento de RG, foi proferido projeto de decisão de indeferimento, nos seguintes termos: “(…) Nos termos e com os fundamentos constantes do parecer infra, projeto o indeferimento do pedido. (…)”. (realce conforme original) – Cfr. projeto de indeferimento a fls. 55 a 61 do procedimento de RG que integra o PA apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; 46. Em 21/09/2015, o projeto de decisão foi convertido em decisão final de indeferimento, nos termos e com os seguintes fundamentos: “(…) Destarte deve o projeto de decisão, constante de fls. 55 a 60 dos autos, oportunamente notificado, converter-se em decisão definitiva, sendo indeferida a pretensão da reclamante. (…)”. (realce conforme original) – Cfr. despacho a fls. 63 da RG que integra o PA apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais; 47. Por ofício n.º ...78, de 22/09/2015, remetido através de carta registada com aviso de receção – registo dos CTT ... – foi dado a conhecer à Impugnante a decisão final de indeferimento proferida no procedimento de reclamação graciosa. – Cfr. ofício a fls. 64 e 65 da RG que integra o PA apenso; 48. Em 25/09/2015, a Impugnante tomou conhecimento da aludida decisão de indeferimento. – Cfr. data e assinatura apostas no aviso de receção a fls. 66 da RG que integra o PA apenso; 49. Em 04/01/2016, a Impugnante deduziu a presente Impugnação Judicial. – Cfr. data da mensagem de correio eletrónico que antecede a petição inicial (p.i.); 50. Em 16/06/2016, a Direção de Serviços do IVA procedeu à elaboração de Informação n.º 1595, em resposta a questões suscitadas pela Direção de Serviços de Justiça Tributária no decurso da presente Impugnação Judicial, nos termos e com os fundamentos que, na parte relevante, se transcrevem: “(…) 7. Relativamente à Informação Vinculativa n.º 1121, de 2008-02-22, correspondente ao Processo A1002007053, esclarecemos o seguinte: i. A informação vinculativa não se encontra publicada no Portal das Finanças; ii. O entendimento prestado na Informação Vinculativa n.º 1121, de 2008- 02-22, não foi revogado (nos termos do artigo 68º n.º 16 da LGT) para a situação concretamente descrita na mesma, pelo que era o que vigorava em 2010 e ao qual a AT estava vinculada. iii. No pedido de Informação Vinculativa solicitado pela [SCom04...] SGPS, S.A a esta Direção de Serviços, em 23 de janeiro de 2007, mais concretamente no ponto 4 desse pedido, a [SCom01...], S.A., é identificada como uma das “(…) entidades da [SCom04...] que participam neste projecto (…)”. (…)” – Cfr. Informação a fls. 149 e 150 do PA apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzida para os devidos efeitos legais; 51. No decurso do procedimento inspetivo a que se alude em 27. a 37. supra, a Impugnante não referenciou a existência da Informação Vinculativa n.º 1121, de 22/02/2008. – Cfr. facto não controvertido; RIT a fls. 131-147 o PA apenso; * Factos não provados Inexistem factos a dar como não provados para a decisão da causa. * Motivação: A decisão sobre a matéria de facto provada resultou, em conjunto, da posição assumida pelas partes e da análise crítica dos documentos juntos aos autos e constantes do procedimento administrativo, assim como, das informações oficiais, tudo tal como indicado acima por referência a cada concreto ponto da matéria de facto. Quanto aos factos vertidos em 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15 e 16 do probatório, a convicção do Tribunal resultou da análise crítica dos documentos existentes nos autos, nomeadamente do RIT, corroborada pela prova testemunhal. Concretizando. A testemunha, «BB», Consultor Fiscal, afirmou conhecer a Impugnante em virtude de, em 2008/2009, ter trabalhado na [SCom03...], no Departamento de IVA, e ter assessorado a empresa no âmbito da análise do enquadramento fiscal num projeto imobiliário na Península .... Esclareceu que a Impugnante é uma sociedade do «Grupo A...». Explicou ao Tribunal que: - A sua intervenção se concentrou na análise, para efeitos de IVA, de um conjunto alargado de obras que foram desenvolvidas pelas entidades promotoras, no âmbito de um Contrato de Urbanização com o Município 1.... - Essas obras envolveram arruamentos, redes viárias, redes de água, estação de tratamento de águas residuais, cais. Um conjunto alargado de infraestruturas. E que foram realizadas em terrenos propriedade do Município 1..., ou seja, em terrenos do domínio público. - Foram as entidades promotoras que suportaram os custos relacionados com essas obras, depois entregues ao Município 1...; - Com vista ao tratamento, para efeitos de IVA, solicitaram uma informação à AT quanto ao enquadramento e qualificação da operação de restituição dessas obras ao domínio público que mereceu o entendimento de que “a entrega das obras configura um serviço sujeito a IVA e em consonância deveria ser deduzido o IVA incorrido na aquisição dos serviços de empreitada.” - Quanto ao tratamento fiscal empregue pela Impugnante afirmou que terá sido feito a dedução do IVA de acordo com as regras gerais; - A nível contabilístico havia uma clara segregação e divisão de todo o projeto; havia uma classificação analítica que permitia saber com rigor quais eram as obras públicas. - A UNOP 1 é uma das unidades que envolveu várias intervenções e vários projetos, havendo nesse âmbito obras para o domínio público, podendo, também, existir obras para o domínio privado. O Tribunal, não obstante a testemunha haver sido interveniente no estudo que esteve na génese da pronúncia por parte da AT da informação vinculativa e, por isso, ser evidente a sua posição, considerou o depoimento desta testemunha credível, pois, as suas respostas foram espontâneas e coerentes, tendo a testemunha respondido de forma assertiva, sem hesitações ou contradições. Ademais, limitou-se a afirmar a factualidade já revelada na documentação vertida nos autos e relatada pela Impugnante, no decurso do procedimento inspetivo, que não foi posta em causa pela Inspeção Tributária. A testemunha «AA», aos costumes, disse ter sido administrador da Impugnante entre os anos de 2008 a 2012. Explicou ao Tribunal todos os procedimentos antecedentes à operação imobiliária de requalificação da Península ..., esclarecendo que: - Em 2005, várias empresas celebraram com o Estado Português um contrato para a requalificação da Península .... Nessa altura, foi celebrado um Contrato de Urbanização que contemplou várias infraestruturas (redes de esgotos) que faziam parte do desenvolvimento da Península que pertenciam à Câmara Municipal ... e que, só por economia de meios, foram realizadas pela [SCom01...] e pela [SCom02...]. - Essas infraestruturas foram executadas em terrenos do domínio púbico. - A [SCom02...] era detida pela [SCom04...] SGPS, que detinha um conjunto de participadas que possuíam vários terrenos na Península .... Nesses contratos de Investimento e Urbanização ficaram previstos os parâmetros que deveriam ser cumpridos em cada um dos terrenos que foram designados por UNOP (unidades operativas). - O projeto Resort X foi um projeto de grande dimensão e que esteve sujeito a um complexo processo de licenciamento e escrutínio das autoridades. Foi feito com o máximo rigor com alocação a cada uma das empresas das infraestruturas gerais e privativas que diziam respeito a cada uma das entidades. - A [SCom01...] era detentora da UNOP 3 e 4, terrenos de dimensão significativa. - Quanto ao procedimento em sede de IVA, relatou que o «Grupo A...» colocou grande diligência na aquisição desses terrenos. A aquisição foi em 1997. Apenas em 2005, foram iniciadas as obras. Nesse momento foi estabelecido o prazo de execução das obras de 3 anos que foi integralmente cumprido. Em setembro de 2008, já depois dos períodos de licenciamento, o Resort X foi inaugurado e, nessa altura, com valores de investimento já apurados, decidimos solicitar um pedido de informação vinculativa sobre como proceder quanto à entrega das infraestruturas ao domínio público. Colocamos elevado rigor e elevado diligência nesse procedimento. E depois seguiu-se um trabalho interno e externo, com auxílio na análise de todos os documentos relativos às normas. Foi a [SCom03...] que assegurou essa análise em conjunto com a [SCom01...]. - As UNOP 3 e 4 tinham infraestruturas para o domínio público e outras que não eram para o domínio público. Concretizando que estes tipos de infraestruturas não têm rigorosamente nada a ver com parques de estacionamento, casino. - O Auto de entrega ao domínio público ocorreu em 2009 e inícios de 2010, que foi um processo complexo e que os atos formais decorreram nesse período O Tribunal valorou o depoimento desta testemunha, pois, apesar das suas funções como administrador, as suas respostas foram espontâneas e coerentes, tendo a testemunha respondido de forma assertiva e imparcial, sem hesitações ou contradições, revelando profundo conhecimento direto dos factos, nomeadamente, quanto aos negócios celebrados em fase anterior à execução do empreendimento turístico, às próprias obras de infraestruturas e ao procedimento fiscal adotado quanto às operações de restituição de infraestruturas ao domínio público. Ademais, este depoimento limitou-se a afirmar a natureza das infraestruturas que foram revertidas para o domínio público e os negócios jurídicos que estiveram subjacentes às referidas operações (contrato de financiamento e contrato de urbanização). Não ignora o Tribunal que a primeira testemunha se referiu à UNOP 1, enquanto que a segunda testemunha aludiu, expressamente, às UNOP 3 e 4, sendo que, quando interpelado a instâncias do ilustre mandatário se não era a UNOP 1, reiterou que seriam aquelas UNOP 3 e 4. Tal incongruência, porém, foi desatendida pelo Tribunal. A correção subjacente às liquidações impugnadas circunscreveu-se a considerar ilegal o IVA liquidado na operação de reversão das infraestruturas para o Município 1..., com fundamento em que tal operação não constitui prestação de serviços para efeitos de IVA, e, em consequência, considerar indevido o IVA deduzido por a Impugnante ser sujeito passivo isento. É esta a fundamentação das liquidações em causa. Desta fundamentação não decorre que a Inspeção Tributária tenha indagado sobre a natureza, tipo ou valor dos custos suportados com as infraestruturas. Razão pela qual, não valorou o Tribunal esta incongruência, por a mesma se revelar irrelevante para a decisão da causa. Foi a análise crítica de toda a prova enunciada que, em conjugação com as regras da experiência comum, sedimentou a convicção do Tribunal quanto aos factos provados e não provados – cfr. artigos 74º, 76º, n.º 1, ambos da Lei Geral Tributária (LGT) e 362º e seguintes do Código Civil (CC). *** 2.2 – O direito Constitui objecto do presente recurso a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a impugnação intentada contra a liquidação adicional de IVA n.º ...90 e a correspondente liquidação de Juros, relativas ao período 1006T. A Recorrente, discordando do sentido da decisão recorrida veio invocar a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia, por contradição entre os fundamentos e a decisão e por falta de fundamentação, assim como o erro de julgamento de direito. 2.2.1 Da nulidade da decisão recorrida 2.2.2. Omissão de pronúncia A Recorrente vem invocar a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia, por considerar que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre o facto da doutrina administrativa em que se sustentou ter surgido posteriormente aos factos em causa. Vejamos. Decorre do disposto no n.º 1 do artigo 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário que “Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”. Acresce que, também resulta do disposto no artigo 615.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 2.º alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que: “1 - É nula a sentença quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido” Ora, como estatui o n.º 2 do artigo 608.º do Código de Processo Civil, “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras” Por último, o n.º 1 do artigo 609.º do Código de Processo Civil determina que “A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir”. “Impõe-se ali um duplo ónus ao julgador, o primeiro (o que está aqui em causa) traduzido no dever de resolver todas as questões que sejam submetidas à sua apreciação pelas partes (salvo aquelas cuja decisão vier a ficar prejudicada pela solução dada antes a outras), e o segundo (que aqui não está em causa) traduzido no dever de não ir além do conhecimento dessas questões suscitadas pelas partes (a não ser que a lei lhe permita ou imponha o seu conhecimento oficioso)” – cfr. Acórdão do STJ de 11.10.2022, proc. n.º 602/15.0T8AGH.L1-A.S1. No entanto, o conhecimento de todas as questões não significa que o Tribunal tenha de conhecer de todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes – neste sentido vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.05.2022, proc. 3334/19.7T8STR.E1.S1 e mais recentemente o Acórdão do STA de 28.02.2024, proc. 01321/22.7BEPRT. Isto porque, “como constitui communis opinio, o conceito de “questões”, a que ali se refere o legislador, deve somente ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, ou seja, abrange tão somente as pretensões deduzidas em termos do pedido ou da causa de pedir ou as exceções aduzidas capazes de levar à improcedência desse pedido, delas sendo excluídos, como já acima deixámos referido, os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes (vide, por todos, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª. Ed., Almedina, págs. 713/714 e 737.” e Abrantes Geraldes, in “Recursos em Processos Civil, 6ª. Ed. Atualizada, Almedina, pág.136.”).” – cfr. Acórdão do STJ de 11.10.2022, proc. n.º 602/15.0T8AGH.L1-A.S1. Com efeito, e “como é comummente reconhecido, vale a este propósito, ainda hoje, o ensinamento de Alberto dos Reis, na distinção a que procedia: (…) «São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.»” – cfr. Acórdão do STA de 28.02.2024, proc. 01321/22.7BEPRT Assim, “a nulidade por omissão de pronúncia, representando a sanção legal para a violação do estatuído naquele nº 2, do artigo 608.º, do CPC, apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes” – cfr. Acórdão do STJ de 10.12.2020, proc. 12131/18.6T8LSB.L1.S1 Retornando ao caso dos autos, e em sede do articulado inicial a Recorrente peticionou a anulação das liquidações impugnadas, sustentando para tal que a entrega de infra-estruturas ao domínio público pelos promotores configura uma operação sujeita a IVA e dele não isenta para os efeitos dos artigos 1.º n.º 1 alínea a) e 4.º n.º 1 do Código do IVA. Acresce que, a Recorrente também sustentou a sua pretensão em informação vinculativa emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, defendendo a vinculação daquela à informação proferida, invocando que tal entendimento veio a ser alterado após os factos em causa. Ora, como se infere da decisão recorrida, a fls. 36 a 45, o Tribunal a quo, analisou e decidiu dos termos e factualidade respeitante à informação emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira e concluiu que “não é legítima a invocação, por parte da Impugnante da referida informação, na qualidade de informação vinculativa, porquanto, os pressupostos de facto em que assentou o pedido dessa informação não são coincidentes com a materialidade fática carreada e provada nos presentes autos”. Assim, e relativamente a esta questão, o Tribunal a quo, apesar de não se ter debruçado sobre a alteração posterior ao entendimento vertido na informação emitida, apreciou a questão principal relativamente à sobredita informação vinculativa. Nesta senda, a apreciação da alteração do entendimento posterior é um argumento inócuo e desnecessário para a decisão da causa. Nesta senda, tendo o Tribunal a quo apreciado e decidido das questões relevantes e necessárias para apreciar e decidir da pretensão formulada pela Recorrente, impõe-se negar provimento à nulidade invocada. 2.2.3. Da contradição entre os fundamentos e a decisão A Recorrente vem invocar a nulidade da decisão, por considerar que se verifica contradição entre os fundamentos e a decisão, uma vez que a decisão considerou que a Recorrente à data dos factos era sujeito passivo isento de IVA, decorrendo, no entanto, da matéria de facto assente que a Recorrente era um sujeito passivo misto de imposto. Vejamos. Como já aqui demos conta, decorre do disposto no artigo 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário que constituem causas de nulidade da sentença, entre outros a oposição dos fundamentos com a decisão. Acresce que, dispõe o artigo 615.º nº 1 alínea c) do Código de Processo Civil que “é nula a sentença quando (…) os fundamentos estejam em oposição com a decisão (…)”. “É pacífico na doutrina e jurisprudência o entendimento segundo o qual a nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão aí contemplada pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la: a contradição geradora de nulidade ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto ou, pelo menos, de sentido diferente (cf. nesse sentido, na doutrina Professor Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, , Vol. V, pág. 141, Coimbra Editora, 1981, Amâncio Ferreira, Manual de Recursos no Processo Civil, 9ª edição, pág. 56 e Lebre de Freitas e Isabel Alexandra, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª edição, pág. 736-737, e na jurisprudência, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Secção Social, de 28.10.2010, Procº nº 2375/18.6T8VFX.L1.S3, 21.3.2018, Procº nº 471/10.7TTCSC.L1.S2, e 9.2.2017, Procº nº 2913/14.3TTLSB.L1-S1).” – cfr. Acórdão do STJ de 14.04.2021, proc. n.º 3167/17.5T8LSB.L1.S1 Ora, o alegado não consubstancia qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão recorrida, senão vejamos. O Tribunal a quo começou por dar conta (a fls. 51 da decisão) que os Serviços de Inspecção consideraram que “Desta mesma forma, o enquadramento a aplicar ao IVA suportado nesses gastos será em função do enquadramento das operações ativas da empresa que se encontrem a jusante. Uma vez que estamos perante uma empresa cujas operações se enquadram no regime de isenção estabelecido pelo art. 9º do CIVA – Isenção Incompleta, o IVA suportado com estes custos indissociáveis da mesma, não conferem Direito à Dedução – IVA Indevidamente Deduzido”, para, em seguida fazer uma resenha do regime do IVA . Acresce que, como também se discorreu na decisão recorrida “O probatório (cfr. ponto 3 da factualidade provada) revela que, até 14/05/2009, a Impugnante esteve enquadrada para efeitos de IVA no identificado regime de isenção (artigo 9º, nº 30 do Código do IVA).”, para de seguida mencionar que “na ausência de uma relação imediata e direta entre os bens ou os serviços e a operação tributável, o direito à dedução está limitado pela aplicação de um pro rata ou é recusado quando a operação a jusante é uma operação isenta.” – negrito nosso. Nesta medida, o Tribunal a quo, ciente que a Impugnante se encontrava num regime misto com afectação real, procedeu à análise da operação em questão por forma a fazer o seu enquadramento nas operações tributáveis ou isentas, tendo concluído que “em consonância com a jurisprudência do TJUE, na medida em que o IVA suportado nos gastos com as infraestruturas entregues ao domínio público não é utilizado ou suscetível de o ser “para os fins das próprias operações tributáveis”, tal IVA encontra-se excluído do direito à dedução” – fim de citação. Pelo exposto, não se verifica a apontada nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, na medida em que, o Tribunal a quo teve em atenção o regime da Recorrente para efeitos de tributação em IVA, negando-se provimento ao alegado. 2.2.4. Da falta de fundamentação da decisão recorrida A Recorrente vem invocar a falta de fundamentação da decisão recorrida, pois considera que esta não externa qualquer fundamentação factual ou jurídica susceptível que suporte a conclusão de que a Recorrente não podia razoavelmente presumir que a qualificação da operação, pela AT, como sujeita a IVA, acarretava o concomitante direito à dedução do IVA confortar tal juízo conclusivo. Ora, não obstante, a Recorrente não qualificar o vício que alega, este, a verificar-se acarretará a nulidade de decisão recorrida. Vejamos. Dispõe o n.º 2 do artigo 123.º do CPPT que “O juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões” Por sua vez, estatui o n.º 4 do artigo 607.º do CPC relativamente à elaboração da sentença, aplicável ex vi artigo 2.º alínea e) do CPPT que “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência” Nesta medida, constitui nulidade da sentença, entre outras “(…) a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, (…)” – cfr. artigo 125.º do CPPT Acresce que, também resulta da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º alínea e) do CPPT que é nula a sentença quando o juiz “Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”. Ora, como decidido pelo STA no Acórdão de 26.05.2022, proc. n.º 058/10.4BEPRT “Como, de forma uniforme e reiterada vem sendo afirmado por este Supremo Tribunal Administrativo, a falta de fundamentação prevista como nulidade na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC apenas ocorre quando a fundamentação seja absolutamente inexistente e já não quando a fundamentação seja incorrecta ou meramente deficiente ou insuficiente (cfr. a título meramente exemplificativo e como sinal da constante jurisprudência neste sentido ao longo dos anos, os acórdãos desta Secção e Tribunal de 28-1-2009, de 28-10-20220 e de 5-2-2014, proferidos, respectivamente, nos processos n.ºs 667/08, 365/18.8BEVIS e 1846/13). 3.1.2. É também este, de resto, o sentido que a doutrina atribuiu desde sempre à referida expressão legal, citando-se, por todos, e ainda com indiscutível actualidade, o que já ensinava Alberto dos Reis: «Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade» (Código de Processo Civil Anotado, volume V, pág. 140. No mesmo sentido, agora numa aplicação directa ás nulidades em processo tributário, pode consultar-se Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, II volume, anotações 7 e 8 ao artigo 125.º, págs. 357 a 360.).” Nesta medida, e como é consabido, “esse dever de fundamentação, causa de nulidade da sentença, respeita à falta absoluta de fundamentação, como dão nota A. Varela, M. Bezerra e S. Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª edição, 1985, p. 687, ao escreverem “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente e incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito” – cfr. Acórdão do STJ de 3.03.2021, proc. n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1. Com efeito, o decisor deve exteriorizar quais as razões que o levaram a decidir em determinado sentido e não noutro, verificando-se nulidade da decisão quando a sentença não encerra em si qualquer fundamentação, não bastando que esta seja deficiente ou incompleta. Retornando ao caso dos autos, e contextualizando a pretensão da Recorrente, esta vem alegar que não compreende porque motivo o Tribunal a quo concluiu que a Recorrente não podia razoavelmente presumir que a qualificação da operação pela Autoridade Tributaria e Aduaneira acarretava o concomitante direito à dedução a IVA. Ora, o Tribunal a quo (pag. 33 a 35) começou por dar conta da factualidade assente, para, de seguida, fazendo o enquadramento jurídico da emissão de informação vinculativa, proceder à subsunção dos factos ao direito e concluir que “os pressupostos de facto em que assentou o pedido dessa informação não são coincidentes com a materialidade fática carreada e provada nos presentes autos” (pag. 36 a 44). Acresce que, o Tribunal a quo, fundamentando o que considera ser uma vinculação inter-partes, foi mais longe, fazendo uma análise detalhada ao pedido de informação, constatando que a [SCom04...] peticionou uma pronúncia, não só quanto à qualificação da operação de entrega das infraestruturas pelos promotores ao Município 1... como uma prestação de serviços sujeita a IVA, mas também, uma informação respeitante à exigibilidade do imposto, determinação do valor tributável da operação, definição da taxa de IVA a aplicar e direito à dedução do IVA incorrido. Assim, impõe-se concluir que a sentença recorrida, para além de não padecer de qualquer nulidade por falta de fundamentação, pois a mesma está minimamente fundamentada, também logrou externar as razões factuais e jurídicas para a decisão que proferiu. Pelo que, não ocorreu a nulidade que vem invocada, negando-se provimento ao alegado, não padecendo a decisão recorrida de qualquer nulidade. 2.3. Do erro do julgamento de direito 2.3.1. Da vinculação da informação administrativa O Tribunal a quo decidiu que a informação vinculativa emitida pela Fazenda Pública não tem qualquer efeito validante, uma vez que, os pressupostos de facto em que assentou o pedido dessa informação não são coincidentes com a materialidade fática carreada e provada nos presentes autos A Recorrente, discordando do assim decidido, vem invocar o erro de julgamento de direito, pois considera que para se estabelecer uma vinculação administrativa apenas é exigível a subsunção dos factos substanciais às mesmas normas legais e não de questões formais que deles decorrem, sobretudo quando do mesmo não se divisa qualquer alteração da solução legal. Vejamos. Como decorre da Constituição da República Portuguesa, artigos 266.º e 268.º, ao abrigo do princípio da boa fé a Autoridade Tributária e Aduaneira e o contribuintes estão obrigados ao um dever de colaboração reciproco, plasmado no artigo 59.º da Lei Geral Tributária, que estabelece que “Os órgãos da administração tributária e os contribuintes estão sujeitos a um dever de colaboração recíproco”, estatuindo ainda na sua alínea e) do n.º 3 que “A colaboração da administração tributária com os contribuintes compreende, designadamente: (…) e) A prestação de informações vinculativas, nos termos da lei” Com efeito, “concretizando o princípio da colaboração e o direito à informação, o legislador instituiu que os administrados podem pedir e obter da Administração pronúncia relativa às incidências fiscais de uma dada situação de facto, ficando ela obrigada a actuar, oportunamente, conforme a informação prestada, verificado que seja um certo circunstancialismo” – cfr. Acórdão do STA de 7.12.2004, proc. n.º 0908/04. Assim, o artigo 68.º da Lei Geral Tributária veio estabelecer o regime legal do procedimento de prestação das informações vinculativas. Nessa medida, prevê o n.º 1 do artigo 68.º da Lei Geral Tributária que “As informações vinculativas sobre a situação tributária dos sujeitos passivos, incluindo, nos termos da lei, os pressupostos dos benefícios fiscais, são requeridas ao dirigente máximo do serviço, sendo o pedido acompanhado da descrição dos factos cuja qualificação jurídico-tributária se pretenda.” – negrito nosso. Como discorreu o Tribunal a quo “A informação vinculativa está sempre limitada aos factos enunciados pelo contribuinte e reporta-se ao enquadramento jurídico que deles fazem os serviços. Assim, a informação prestada perde qualquer validade se os factos ocorrerem em termos diversos daqueles que foram apresentados aos serviços, nomeadamente se ocorrerem com contornos que lhe tenham sido ocultados. Do mesmo modo, a informação prestada perde validade se as normas jurídicas que serviram à qualificação tributária dos factos vierem, entretanto, a ser alteradas. (…) (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 22/11/2011, processo n.º 03013/09; SÉRGIO VASQUES, “O Mecanismo da Informação Vinculativa”, C.T.F. 397, Jan/Mar 2000, páginas 118 e 119).” – fim de citação Com tem entendido a jurisprudência, do que se trata, aqui é “«de uma informação e não de um acto de definição da situação jurídica, ainda que a título provisório, nem do deferimento ou indeferimento de uma pretensão do requerente», estando limitados «os efeitos constitutivos da informação favorável ao respectivo conteúdo» – acórdão de 21 de Janeiro de 2003, recurso nº 830/02.” – cfr. Acórdão do STA de 7.12.2004, proc. n.º 0908/04. Assim, a limitação da vinculação da Autoridade Tributária e Aduaneira aos concretos factos subjacentes à informação vinculativa por ela emitida encontra justificação no facto do acto tributário ter “sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto.” - cfr. Acórdão do TCA Sul de 16.04.2013, proc. n.º 05906/12. Ademais, “As consequências do incumprimento do teor da informação vinculativa são a anulabilidade do acto praticado. Caso a administração tributária proceda em sentido diferente do constante da informação vinculativa, a jurisprudência (ver infra os acórdãos do TCA Sul de 10-07-2014, no Processo 07558/14, e de 22-11-2011, no Processo 03013/09, na parte correspondente à jurisprudência relacionada com este artigo) tem considerado que existe vício de violação da lei, gerador de anulabilidade do acto praticado, por a lei não prever especificamente a nulidade como sanção deste vício (cfr. artigos 161°, e 163° do CPA). “ – cfr. José Maria Fernandes Pires, Gonçalo Bulcão e outros in Lei Geral Tributária, 2015, Almedina, pag. 765. Retornando ao caso dos autos, e como deu conta o Tribunal a quo na decisão recorrida: “A Impugnante, conforme espelha o probatório (cfr. facto 1 da matéria assente) é uma sociedade comercial anónima que se dedica ao exercício da atividade principal de compra e venda de bens imobiliários. Em sede de IRC, está enquadrada no regime geral de tributação, sendo tributada de acordo com o Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), integrando o grupo denominado “[SCom02...], S.A.” (cfr. pontos 2 e 5 do probatório). Já para efeitos de IVA, está assente que, até 14/05/2009, esteve enquadrada no regime de isenção, previsto no artigo 9º, n.º 30 do Código do IVA que consagra a isenção de imposto nas operações sujeitas a Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT). E, a partir de 15/05/2009, passou a estar enquadrada no regime normal de tributação de periodicidade trimestral, misto com afetação real, em consequência de contrato de cessão de exploração de um parque de estacionamento sito num resort turístico da Península ..., designado de “Resort X” (cfr. factos 3 e 4 da matéria provada). Está provado, igualmente, que o «Grupo A...» desenvolveu um projeto imobiliário na Península ..., que consistiu na construção de um resort turístico, denominado “Resort X”, que englobou diferentes empreendimentos turísticos compostos por hotéis, vilas turísticas, apartamentos turísticos, campo de golf, piscinas, campos de ténis, marina, restaurantes, bares, zonas de parqueamento. A exploração turística desse resort foi executada de uma forma integrada por outras empresas do «Grupo A...», incluindo a Impugnante (cfr. factos 9 e 10 do probatório). Com vista à execução desse projeto, a Impugnante, na qualidade de promotora, celebrou um Contrato de Urbanização com o Município 1... relativo à execução de infraestruturas respeitantes a construção de arruamentos, rede de abastecimento de águas, redes de água pluviais, redes viárias, infraestruturas elétricas, telecomunicações, estação de tratamento de águas residuais, que foram, posteriormente, entregues ao domínio público (cfr. pontos 11 e 12 do probatório). Os custos com a realização das obras das identificadas infraestruturas entregues ao domínio público foram integralmente suportados pela empresa “[SCom02...] S.A.” que, na sequência da emissão de notas de débito e respetivas notas de crédito, em abril de 2010, foram redebitados, no montante de € 7.134.577,40 e IVA no montante de € 356.728,87, à Impugnante (cfr. 13 a 19 da materialidade assente). A Impugnante emitiu nota de débito em nome do Município 1... com valor de incidência de € 7.134.577,40, coincidente com os descritos custos, e IVA no montante de € 356.728,87 e exerceu o direito à dedução do IVA relativamente às notas de débito emitidas pela [SCom02...], em abril de 2010 (cfr. factos 20 a 24 da matéria provada).” – fim de citação. Tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira realizado procedimento inspectivo à aqui Recorrente, e perante a factualidade supra referenciada, assim como a que consta dos pontos 27. a 35. do acervo probatório, os Serviços da Inspecção Tributária efectuaram correções por considerarem que a reversão das infraestruturas para o domínio público não consubstancia uma atividade económica suscetível de se subsumir à definição de prestação de serviços ou transmissão de bens para efeitos de IVA, pelo que o IVA liquidado nas notas de débito emitidas pela Impugnante ao Município 1..., constitui imposto indevidamente liquidado. Acresce que, como também decorre dos pontos 6. a 8. da factualidade assente, em 23.01.2007, a [SCom04...] SGPS, S.A, dirigiu à Direção de Serviços do IVA um pedido de Informação Vinculativa, tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira emitido a informação vinculativa n.º 1121, prestada no âmbito do processo n.º A1002007053. Ora, em sede de tal pedido, foi veiculado que “as infraestruturas serão executadas pelos promotores, os quais suportarão os custos com a realização e/ou reforço das mesmas, contratando directamente para o efeito, em seu nome e sob sua responsabilidade, com projectistas, empreiteiros e outros fornecedores.” – cfr. ponto 6. do acervo probatório. No entanto, a factualidade aí considerada não coincide com a dos presentes autos, na medida em que, como decorre dos pontos 13. e 14. da factualidade assente, os custos com a realização das obras de infraestruturas entregues ao domínio público foram integralmente suportados pela sociedade [SCom02...], SA, tendo esta, por meio de uma operação de redébito, transmitido tais custos à aqui Recorrente. Sustenta a Recorrente que o circuito documental jamais seria susceptível de inverter radicalmente o enquadramento fiscal da operação em causa. Ora, não podemos concordar com o alegado, na medida em que, o circuito documental a que se refere a Recorrente acarreta a alteração da factualidade que consta do pedido de informação vinculativa, não se cingindo a mera questão formal. Não se trata aqui do enquadramento em sede de IVA da operação em questão, e as regras de incidência do imposto em questão, mas da vinculação da Autoridade Tributária e Aduaneira relativamente à informação vinculativa por ela emitida, que tem subjacente concreta factualidade. Assim, não se encontrando a Autoridade Tributária e Aduaneira vinculada, no caso aqui sob apreciação, à informação vinculativa, não ocorre venire contra factum próprio. A Recorrente vem também invocar que “o artigo 68.º da LGT, na interpretação segundo a qual a vinculação da Autoridade Tributária apenas se verifica no caso de identidade absoluta das situações fácticas – mormente dos factos que em nada alteram o recorte jurídico aplicável – seria materialmente inconstitucional, por violação artigo 266.º n.º 2 da CRP” Vejamos. Como decorre do disposto no n.º 3 do artigo 635.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “Delimitação subjetiva e objetiva do recurso”, “Na falta de especificação, o recurso abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente” Assim, “a natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objeto decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas. Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estes sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. (…) A assunção desta regra encontra na jurisprudência numerosos exemplos: a) As questões novas não podem ser apreciadas no recurso, quer em homenagem ao princípio da preclusão, quer por desvirtuarem a finalidade dos recursos, pois estes destinam-se a reapreciar questões e não a decidir questões novas, pois estes destinam.se a reapreciar questões, e não a decidir questões novas, por tal apreciação equivaler a suprimir um ou mais órgãos de jurisdição. Ac. do STJ, de 1-10-02, CJ, t. III, p.65”- cfr. António Santos Abrantes Geraldes (in Recursos em processo Civil, 7ª Edição atualizada, Almedina, pag. 139 a 141). No mesmo sentido, vide Acórdão do STA de 29.10.2014, proc. 0833/14. No caso presente, e como se infere da petição inicial, a Recorrente não invocou a inconstitucionalidade da interpretação do artigo 68.º da LGT, na interpretação segundo a qual a vinculação da Autoridade Tributária e Aduaneira apenas se verifica no caso de identidade absoluta das situações fácticas seria materialmente inconstitucional, por violação artigo 266.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, razão pela qual o Tribunal a quo também não a ter apreciado e decidido. Por outro lado, também não se pode defender que tal argumento surge da fundamentação da decisão recorrida, uma vez que, como transparece de fls. 9 do projecto da decisão da reclamação graciosa vertida na factualidade assente, ponto 45., a Autoridade Tributária e Aduaneira já nessa sede sustentou o indeferimento por considerar que “verifica-se que em relação à matéria aqui em apreciação não se encontram estabelecidas as mesmas condições para a incidência de IVA, conforme as Orientações vertidas na Informação Vinculativa, da DSIVA (…)” Nesta senda, sendo a questão que vem colocada questão nova, por não ter sido invocada, apreciada e/ou decidida pelo Tribunal a quo e não sendo de conhecimento oficioso, não irá ser conhecida por este Tribunal, por impossibilidade legal. Por último, vem a Recorrente invocar que, “Os entendimentos da AT vertidos em informação vinculativa - como em qualquer outro instrumento administrativo, circular ou ofício-circulado - atenta a sua natureza e propósito, criam no Contribuinte uma razoável e legítima expectativa de que a AT adoptará um critério uniforme para situações factuais semelhantes”, concluindo que “a vinculação da AT às orientações administrativas por si emanadas “ implica que, mesmo que a administração tributária venha a considerar ilegal uma determinada interpretação da lei, tem de aplica-la aos casos concretos que ocorram durante o período de tempo em que ela vigorava por força de uma orientação genérica . Esta aplicação traduz-se, assim, no sacrifício do princípio da legalidade, restringindo à norma que concretamente regula a situação, para salvaguarda dos princípios da igualdade e da boa fé, que também integram o bloco da legalidade.” Vejamos. A Autoridade Tributária e Aduaneira, parte integrante da Administração Pública “visa a prossecução do interesse público no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”, encontrando-se obrigada a agir segundo os princípios da legalidade, igualdade, proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade - cfr. alude o artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa e o artigo 55º da Lei Geral Tributária. O princípio da boa fé determina assim que a Administração “deve relacionar-se com os particulares de acordo com as regras da boa fé, ponderando os valores fundamentais do direito, designadamente, a confiança suscitada pela sua actuação e objectivo a alcançar (art. 6.º-A do CPA)” - cfr. Jorge Lopes de Sousa in LGT anotada e comentada, 4ª edição, 2012, pag.449. “Os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança assumem-se como princípios classificadores do Estado de Direito Democrático, e que implicam um mínimo de certeza e segurança nos direitos das pessoas e nas expectativas juridicamente criadas a que está imanente uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado” – cfr. decidido no Acórdão do STA de 13.11.2007, rec. 0164A/04. Como o Tribunal Constitucional tem repetidamente afirmado “muito embora seja certo que o Estado de Direito consagrado no art.º 2° da CRP envolve uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e exija que a actuação da Administração se paute pelo respeito do direito à certeza e segurança jurídicas e à protecção das suas legítimas expectativas - o que conduz a que devam considerar ilegais os actos que de forma intolerável, arbitrária ou demasiado opressiva violem aqueles mínimos de certeza e segurança que as pessoas e a comunidade têm direito - também o é que os princípios da confiança e da segurança jurídica só devem ser considerados violados quando tais condutas se traduzam numa afectação inadmissível, arbitrária ou excessivamente onerosa das expectativas criadas. E, porque assim, isto é, porque nesta matéria se confrontam os direitos e as legítimas expectativas dos cidadãos com o dever da Administração prosseguir o interesse público, onde se inclui a liberdade de escolher as condutas que melhor satisfaçam esse interesse, importa proceder a um justo balanceamento nesse confronto, tanto mais quanto é certo que dele pode resultar o sacrifício daqueles interesses legítimo” Vd., exemplificativamente, Acórdão n.º 556/03, de 12.11.2003, proc. n.º 188/03. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 68.º-A da Lei Geral Tributária “A administração tributária está vinculada às orientações genéricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza, independentemente da sua forma de comunicação, visando a uniformização da interpretação e da aplicação das normas tributárias.” Assim, impõe-se à Autoridade Tributária e Aduaneira, que, em determinados contextos, depois de prestada informação ao contribuinte sobre a aplicação da lei fiscal a uma determinada situação, não actue contrariamente a essa orientação. No entanto, no caso sob apreciação e como aqui já enunciamos, não estamos perante uma orientação administrativa de aplicação generalizada, constante de circular, regulamento ou instrumento de idêntica natureza que vincule a Autoridade Tributária e Aduaneira, mas sim perante uma informação vinculativa que, ao abrigo do disposto no artigo 68.º da Lei Geral Tributária somente tem carácter vinculativo quanto aos concretos factos subjacentes à informação vinculativa por ela emitida, o que, como decidimos supra, não se verificou. Ademais, constatando-se que a informação vinculativa n.º 1121 emitida no âmbito do Processo A1002007053, foi prestada em 22.02.2008, não se percepciona como é que a Recorrente tinha uma expectativa de deduzir o IVA, na medida em que, relativamente às notas de débito emitidas no mês de Abril de 2010 procedeu à dedução do IVA, no entanto, quanto às notas de débito de Dezembro de 2010, a Recorrente não exerceu o direito de dedução (cfr. pontos 7. e 35. da factualidade assente), mostrando assim um comportamento distinto e não conducente com o alegado. Com efeito, se a Recorrente tivesse uma efectiva expectativa de deduzir o IVA em questão nos presentes autos, não teria em Dezembro do mesmo ano deixado de proceder à dedução do mesmo. Assim, para além de não se vislumbrar em que medida os princípios que aqui referenciamos foram violados, pois a expectativa da Recorrente não se mostra legítima, também não se pode concluir que a Recorrente tivesse firmado a expectativa que alega, pois a sua actuação dirigi-nos para sentido oposto. Por último, e quanto à aplicação retroactiva de entendimento prosseguido pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativamente aos factos aqui em discussão, analisado o relatório do procedimento, coligido no ponto 35. da factualidade assente, não se percepciona que tenha sido mencionado no relatório do procedimento inspectivo qualquer informação, circular ou instrução administrativa, nem que tenha, nessa medida, servido para fundamentar a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira. Aliás, como foi dado conta pelo Tribunal a quo, plasmado na factualidade assente, ponto 51., no decurso do procedimento inspetivo, a Recorrente nem sequer mencionou a existência da Informação Vinculativa n.º 1121, de 22.02.2008. Pelo que, impõe-se negar provimento ao alegado. 2.3.2. Da ilegalidade da liquidação dos juros compensatórios A Recorrente vem pugnar pela ilegalidade da liquidação dos juros compensatórios, sustentando que “por força do disposto no artigo 35.º da LGT, apenas é legítima quando exista dolo ou negligência do Contribuinte e um nexo de causalidade adequada entre o atraso na liquidação e a actuação do Contribuinte, susceptível de um juízo de censura ético -pessoal”, o que considera não estar verificado, na medida em que, “ainda que se entendesse que a AT não se encontrava vinculada à informação que prestou – o que não se concede – afigura-se evidente que a actuação da Recorrente encontrou pleno suporte na interpretação que a própria AT efectuou da lei fiscal.” Vejamos. No que respeita à liquidações de juros compensatórios aqui também impugnadas e nos termos do n.º nº 1 e 2 do artigo 35.º da Lei Geral Tributária, estes são devidos quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente ou ainda quando recebido reembolso superior ao devido. Acresce que, conforme dispõe o n.º 8 do mesmo preceito, “Os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados” A este propósito, o TCA Norte em Acórdão de 23.07.2009, rec. 00368/06.5BEPNF, considerou que “(…) Em suma, os juros compensatórios constituem “uma espécie de reparação cível”, legitimada pela “dupla presunção de que quem é privado da disponibilidade de uma quantia sofre um prejuízo patrimonial e de que este prejuízo é o que resulta da aplicação da taxa de juro prevista na lei à quantia de que o Estado esteve indevidamente privado” cfr. Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, Juros nas Relações Tributárias, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, 1999, Vislis, pág. 145.” – fim de citação. Não subsistindo dúvidas de que os juros compensatórios se reportam à dedução indevida de IVA, importa considerar essa interdependência entre ambos, pelo que o apuramento dos juros compensatórios está condicionado pelo resultado da impugnação da liquidação do imposto correspondente. Tendo-se decidido pela justeza da liquidação de IVA aqui em análise, por não verificados os fundamentos alegados, e, resultando a mesma conforme a lei, a liquidação de juros compensatórios emitida também é consequentemente legal. Ademais, e parafraseando Rodrigues Pardal, (in Questões de Processo Fiscal Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, págs. 19 e seguintes), “Os juros compensatórios aparecem como um agravamento "ex-lege" proveniente de omissão de declarações ou de apresentação de documentos ou de falta de autoliquidação ou insuficiente liquidação ou da falta de participação de qualquer ocorrência as quais tiveram como consequência o atraso da liquidação.” Assim, conclui que os juros compensatórios “Fundamentam-se no princípio geral de que a utilização de um capital ou de uma coisa frutífera alheia obriga o utente ao pagamento de uma quantia correspondente ao tempo do respectivo gozo. Trata-se de uma «indemnização» pelo dano resultante do atraso da liquidação (cfr. artº 562º do Cód. Civil).” Com efeito, os requisitos da existência de juros compensatórios são o retardamento da liquidação base do imposto devido, por facto imputável ao contribuinte ou quando recebido reembolso superior ao devido. O nexo de imputação do facto (indevida dedução de IVA) ao agente, nos termos gerais de direito, porque só há responsabilidade objectiva quando expressamente prevista (artigo 483.º do Código Civil)‚ é um nexo subjectivo baseado na culpa, na modalidade de erro de conduta, que se traduz no incumprimento ou cumprimento defeituoso da obrigação fiscal de deduzir IVA por Lei permitido. Acresce que, o princípio da legalidade da tributação impõe que se afira a obrigação de juros pelo princípio da causalidade adequada face ao qual o retardamento da liquidação/recebimento de reembolso‚ pela conduta omissiva ou deficiente deste, que é causalmente adequada à verificação do dano até ao momento da prática do acto legalmente previsto para pôr termo às consequências danosas dessa conduta omissiva. Ora, “o erro do contribuinte”, no caso vertente, decorre desde logo da indevida dedução de IVA, constituindo-se assim na obrigação de indemnizar o credor tributário. Impõe-se assim concluir que a Recorrente agiu com culpa, na medida em que, a actuação cuidadosa e diligente face aos termos da lei seria a de efectivamente não proceder à dedução do imposto suportado. Salienta-se, como supra referenciado, que a Recorrente nem sequer logrou comprovar a existência de efectiva expectativa, na decorrência da emissão por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira, uma vez que actuou de forma distinta em Abril e em Dezembro do mesmo ano, relativamente à aquisição de serviços de construção civil (cfr. ponto 35. da factualidade assente). De todo o modo, decorre dos princípios previstos na lei civil quanto à vigência, interpretação e aplicação da lei (parte geral, título I, capítulo II, artigo 6º do Código Civil), que a ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas. Assim, os juros compensatórios aqui em dissídio mostram-se devidos por decorrem de actuação ilegal por parte da Recorrente, sendo esta directamente responsável por tal comportamento. Nesta senda, tendo-se decidido pela improcedência do alegado, e, nessa medida, pela legalidade da liquidação de IVA aqui em análise, a liquidação de juros compensatórios emitida é consequentemente legal. Pelo que, também quanto a este fundamento nega-se provimento ao invocado e, em consequência mantem-se a decisão recorrida. *** Nos termos do disposto no artigo 663.º nº 7 do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte SUMÁRIO: I. O Tribunal a quo não tem de conhecer de todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes. II. A nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o juiz deixe de se pronunciar sobre as questões pelas partes submetidas ao seu escrutínio, como sejam as pretensões formuladas, mas não os argumentos invocados. III. As consequências do incumprimento do teor da informação vinculativa emitida pela AT são a anulabilidade do acto praticado. IV. No entanto, a informação vinculativa está sempre limitada aos factos enunciados pelo contribuinte e reporta-se ao enquadramento jurídico que deles fazem os serviços, que encontra justificação no facto do acto tributário ter sempre na sua base uma situação de facto concreta. V. O recurso apenas pode incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o Tribunal ad quem com questões novas *** 3 – Decisão Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida. Custas pela Recorrente, nos termos do disposto no artigo 6.º n.º 2, artigo 7.º n.º 2 e artigo 12.º n.º 2, todos do Regulamento das Custas Processuais e tabela I-B. Porto, 5 de Junho de 2025 Virgínia Andrade Cristina da Nova Paulo Moura |