Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00199/06.2BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/24/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:IRENE ISABEL GOMES DAS NEVES
Descritores:IRC; AUTOLIQUIDAÇÃO;
DECLARAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO;
ARTIGOS 76º E 151º DO CPT;
Sumário:
I. Estamos perante um erro material, susceptível de rectificação, em virtude de se ter escrito coisa diferente daquela que se pretendia, atento o disposto no então artigo 667º, nº 2 do Antigo CPC

II. No que respeita ao IRC, com a apresentação da declaração periódica de rendimentos, estamos perante uma situação de autoliquidação, ou seja, liquidação do imposto directamente pelo contribuinte, sendo que o pagamento deverá ser feito em simultâneo com a autoliquidação, se a ele houver lugar.

III. Nos casos de autoliquidação de imposto, no caso de IRC, não existe obrigação de notificação da liquidação por parte da AT.

IV. Sendo certo que o artigo 76º, n.º 3 do CPT, na versão então aplicável em 1991, permitia a substituição da declaração até à liquidação, pelo que a declaração apresentada após aquele momento é manifestamente intempestiva.

V. Nos termos do artigo 151º do CPT, o termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial do acto de autoliquidação é de 90 dias após a apresentação da declaração, o qual estava manifestamente ultrapassado em 12.12.1991 (data de apresentação da declaração de substituição).
IV. Não tinha a AT de convolar a declaração de substituição apresentada para além do termo do prazo legal em reclamação graciosa e sendo o único fundamento invocado na impugnação judicial da liquidação adicional que substituiu a auto-liquidação do exercício de 1990, a não atendibilidade da declaração de substituição, mormente por violação dos princípios da verdade material e da tributação pelo lucro real, a mesma está condenada ao fracasso.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. O Banco 1... S.A. (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 03.10.2011, que julgou improcedente a presente Impugnação Judicial por si deduzida contra a liquidação de IRC, de 1990, no montante global de € 1.137.363,87, inconformado vêm dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«(...)
1.ª O presente recurso é deduzido contra a sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pela ora Recorrente contra o acto tributário consubstanciado na liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) n.º ............501, datada de 04.08.1995, na sequência da decisão de indeferimento que recaiu sobre a reclamação graciosa apresentada pelo Impugnante, ora Recorrente, com referência àquele acto tributário, determinando a sua manutenção na ordem jurídica;
2.ª O Tribunal a quo julgou a impugnação judicial apresentada integralmente improcedente, por considerar, desde logo, que se impunha ao ora Recorrente a apresentação de reclamação graciosa da autoliquidação, de acordo com o disposto no artigo 151.º do CPT, para que os elementos constantes da declaração de substituição entregue fossem processados pela administração tributária, sendo que, mesmo assumindo a suficiência da declaração de substituição apresentada pelo ora Recorrente, a circunstância de esta ter sido apresentada para além do prazo previsto no artigo 151.º do CPT – como o Tribunal a quo julga demonstrado – impossibilita que os elementos constantes da mesma sejam relevados pela administração tributária;
3.ª Considerou também o Tribunal recorrido que inexistia qualquer violação dos princípios da verdade material e da tributação pelo lucro real, consagrados no artigo 6.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT) e no artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e no artigo 17.º do Código do IRC, respectivamente, atenta a circunstância de, em suma, o ora Recorrente não ter procedido à apresentação da reclamação graciosa contra a autoliquidação e de não incumbir sobre a administração tributária qualquer dever de realização de correcções oficiosas a favor do contribuinte;
4.ª Todavia, não pode proceder o entendimento vertido na sentença sub judice porquanto a mesma incorre em erro de julgamento, devendo ser anulada;
5.ª Sem prejuízo do exposto infra, importa previamente atentar que a sentença recorrida procede à incorrecta menção de que a declaração modelo 22 de substituição apresentada pelo Recorrente corrigiu o lucro tributável em € 1.959.448,59 (quando, na verdade, a mesma visou corrigir o lucro tributável para € 1.959.448,59), o que consubstancia erro ou lapso material, o qual, nos termos do disposto no artigo 667.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, é susceptível de conduzir à rectificação da sentença, o que se requer para os devidos efeitos legais;
6.ª A sentença recorrida incorre em erro de julgamento de facto, consubstanciado na errónea apreciação e valoração dos elementos probatórios constantes dos autos e na injustificada relevação dos mesmos em desfavor do ora Recorrente;
7.ª Com efeito, a sentença deu como provado (cf. ponto 7 do probatório da sentença recorrida) que a liquidação n.º..............901, de 24.07.1991, resultante da apresentação, em 24.05.1991, da declaração periódica de rendimentos modelo 22, originou um reembolso de € 41.367,39, tendo sido emitido em 25.07.1991 o cheque n.º ...00, pago em 05.08.1991 (cf. fls. 96 a 99 do procedimento de reclamação graciosa apenso aos autos);
8.ª Para tanto – e, assim, para a conclusão de que a notificação daquela liquidação efectivamente ocorreu – suportou-se o Tribunal a quo num print informático junto aos autos pela administração tributária, designado como “CONSULTA LIQUIDAÇÃO DE DR MOD 22”, emitido pela Direcção-Geral dos Impostos, em 24.07.1991 (cf. fls. 113 do processo administrativo instrutor), no qual se procede à validação dos montantes apurados pelo Recorrente com referência ao exercício de 1990 no âmbito da autoliquidação por si efectuada, bem como na informação prestada pelo serviço de finanças de Lisboa-3 a fls. 96 a 99 dos autos, consubstanciada, de igual modo, em prints informáticos, e da qual decorre, alegadamente, que em 25.07.1991 foi emitido um cheque no valor de € 41.367,39, pago em 05.08.1991;
9.ª Sucede que, contrariamente ao que resulta da sentença recorrida, a referida documentação não permite dar tal facto como provado;
10.ª Efectivamente, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 685.º-B do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, o Recorrente não pode deixar de impugnar o ponto 7) do probatório da sentença recorrida, por incorrectamente julgado, na medida em que o conteúdo e valor probatório dos meios probatórios supra indicados (cf. fls. 96 a 99 dos autos e fls. 113 do processo administrativo instrutor) impunham decisão diversa sobre aquele ponto do probatório da sentença recorrida;
11.ª Com efeito, ainda que se considere ter sido emitida tal liquidação, a mesma não foi validamente notificada ao Recorrente, como se lhe impunha;
12.ª É que, apesar da junção aos autos daqueles elementos (cf. fls. 96 a 99 dos autos e fls. 113 do processo administrativo instrutor), sempre se impunha que, concomitantemente e como requerido na p.i., se apurasse se o aludido acto de liquidação foi ou não notificado ao Recorrente e em que data ocorreu a sua notificação, através da junção aos autos da respectiva cópia do registo postal e do aviso de recepção, para que, subsequentemente, se possa determinar se na data em que a declaração de substituição foi apresentada, o referido acto já havia sido notificado e, consequentemente, da tempestividade da declaração de substituição apresentada pelo contribuinte;
13.ª Ora, tal não foi efectuado pelo, que recaindo o ónus da prova da realização da notificação à Fazenda Pública, nos termos do disposto no artigo 342.º do Código Civil e no artigo 74.º da LGT, tal liquidação é ineficaz perante o contribuinte, concluindo-se, pelo conseguinte, que a declaração de substituição foi apresentada de acordo com o prazo legalmente previsto para o efeito;
14.ª Efectivamente, prevendo o n.º 3 do artigo 76.º do CPT que a declaração de substituição pode ser apresentada até à liquidação – sendo manifestas as diferenças estatuídas na mesma norma quanto à entrega da declaração pelo contribuinte e o acto de liquidação emitido pelos serviços da administração tributária, bem como que apenas a este último aquele n.º 3 se refere – é evidente que, não tendo ocorrido tal liquidação, nem a mesma sido regularmente notificada ao contribuinte, a declaração de substituição apresentada pelo ora Recorrente é manifestamente tempestiva;
15. Idêntica conclusão – qual seja, a de que a declaração de substituição apresentada o foi de acordo com o prazo legalmente previsto – se alcançaria mesmo que, o que apenas por dever de patrocínio se admite, sem conceder, se considere que o disposto no artigo 76.º do CPT não tem aplicação no caso sub judice;
16.ª Com efeito, mesmo considerando a aplicação apenas do disposto no artigo 151.º do CPT, como se determina na sentença recorrida, a correcção visada com a declaração de substituição apresentada dentro do prazo para a dedução da reclamação graciosa referida naquela norma não pode deixar de ser relevada para os devidos efeitos legais, convolando-se em reclamação graciosa (solução que, aliás, já se admitia na Circular n.º 4/94, de 04.02.1992), sob pena de, sob um formalismo manifestamente inaceitável, se frustrarem as legítimas expectativas dos contribuintes;
17.ª É, pois, evidente, em face de todo o exposto, que ao fazer errónea valoração da prova junta aos autos e ao dar como provada a notificação da liquidação resultante da validação do apuramento efectuado na autoliquidação, a sentença recorrida incorreu em manifesto erro de julgamento de facto, devendo ser anulada;
18.ª Sem prejuízo do exposto, e ainda que não se considere procedente o vício acima invocado, o que apenas se admite por dever de patrocínio, sem conceder, sempre se dirá que a sentença recorrida incorre também em erro de julgamento de direito;
19.ª Com efeito e desde logo, não assiste razão ao Tribunal recorrido quando sustenta pela inaplicabilidade do artigo 76.º do CPT com fundamento no facto de o artigo 151.º do CPT se tratar de uma norma especial;
20.ª Efectivamente, tratam-se, antes, de normas que prevêem situações fácticas distintas e que não se excluem entre si, afigurando-se possível, por um lado, a apresentação de declarações de substituição até à liquidação – como preceitua o artigo 76.º do CPT – e, por outro, a dedução de reclamações graciosas da autoliquidação como pressuposto prévio da apresentação de impugnações judiciais desta última – como estabelece o artigo 151.º do CPT;
21.ª Com efeito, apenas se, à data em que se pretendesse promover a correcção do erro, os serviços já houvessem promovido a mencionada liquidação, aquela correcção apenas poderia ser obtida por via de reclamação graciosa ou de impugnação judicial, mas, ao invés, se tal liquidação ainda não havia ocorrido, nem regularmente notificada ao contribuinte, a correcção poderia fazer-se mediante a entrega de declaração de substituição;
22.ª Não tendo a sentença recorrida acolhido tal entendimento, a mesma padece de manifesto erro de julgamento, devendo ser anulada;
23.ª Acresce que, para além do acima exposto, a sentença recorrida também incorre em erro de julgamento quando considera que a liquidação de imposto relevante ocorreu em 24.05.1991, data da autoliquidação do tributo consubstanciada na entrega da declaração periódica de rendimentos modelo 22, porquanto tal retira qualquer efeito prático ao disposto no artigo 76.º do CPT;
24.ª Com efeito, a liquidação de imposto ali mencionada não pode ser, como a administração tributária defende, a autoliquidação de imposto, mas antes o momento em que a administração tributária concretiza e materializa o processo de apuramento do imposto ou da validação do seu apuramento pelo contribuinte, e que assume a sua expressão formal, enquanto acto tributário, na nota de liquidação notificada ao contribuinte;
25.ª Tanto assim é que, com efeito, existem dois momentos para efeitos do disposto no artigo 76.º do CPT: um deles, correspondente à apresentação da declaração de rendimentos pelo contribuinte; um outro, correspondente à liquidação de imposto efectuada pela administração tributária na sequência da entrega daquela declaração (ou, caso a mesma não tenha sido entregue, efectuada oficiosamente) e que, para produzir os seus efeitos, não pode deixar de ser regularmente notificada ao contribuinte;
26.ª Deste modo, em face de todo o exposto, sendo evidente a impossibilidade prática de coincidência entre a data da autoliquidação e a data da entrega da declaração de substituição para efeitos daquela norma, assim como manifestas as diferenças estatuídas na mesma norma quanto à entrega da declaração pelo contribuinte e ao acto de liquidação emitido pelos serviços da administração tributária e que, em consequência, apenas a este último o n.º 3 do artigo 76.º do CPT se pode referir, resulta, pois, que não assiste razão ao Tribunal recorrido quando refere que a liquidação ocorreu em 24.05.1991;
27.ª É, pois, evidente que a declaração de substituição em apreço deveria ter sido processada pelos serviços e reconhecida a correcção visada naquela pelo ora Recorrente em quaisquer das liquidações adicionais de imposto posteriores respeitantes àquele exercício de 1990, como a presente;
28.ª Acresce, por fim, que, como é evidente, não é pelo facto de o artigo 151.º do CPT prever a necessidade de dedução de reclamação graciosa prévia à impugnação judicial do acto de autoliquidação, que se conclui, sem mais, no caso vertente, pela impossibilidade de apresentação de uma declaração de substituição;
29.ª Com efeito, a necessidade de apresentação prévia daqueloutra não implica, nem invalida a apresentação de uma declaração de substituição, isto é, a admissibilidade de apresentação de uma declaração de substituição em nada fica prejudicada pelas condições de impugnabilidade do respectivo acto de autoliquidação;
30.ª Razão pela qual, em face de todo o exposto, uma vez demonstrada a violação do artigo 76.º do CPT, deve a sentença recorrida ser anulada e a impugnação judicial julgada procedente, anulando-se o acto impugnado;
31.ª Por fim, também não assiste razão ao Tribunal recorrido quando sustenta que não ocorreu qualquer violação dos princípios da verdade material e da tributação pelo lucro real, consagrados no artigo 6.º do RCPIT, no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e no artigo 17.º do Código do IRC, respectivamente, atenta a circunstância de, em suma, o ora Recorrente não ter procedido à apresentação da reclamação graciosa contra a autoliquidação e de não incumbir sobre a administração tributária qualquer dever de realização de correcções oficiosas a favor do contribuinte;
32.ª Efectivamente, a admitir-se tal entendimento, verifica-se uma inaceitável sobreposição do formalismo à realidade material que aquele sempre deve fazer prevalecer por força do princípio da tributação pelo lucro real e do princípio da verdade material;
33.ª É inquestionável que a verdade material prevalece sobre os interesses quer da administração tributária, enquanto entidade individualmente considerada, quer sobre os dos contribuintes, razão pela qual a lei confere àquela o poder/dever de, oficiosamente, adoptar todas as medidas tendentes àquele objectivo;
34.ª Pelo que, ao não agir da forma descrita, aquando da acção inspectiva que deu origem à liquidação impugnada, e da prolação da decisão de indeferimento a que se aludiu, a administração tributária violou aqueles princípios e normas, inquinando, consequentemente, do vício de ilegalidade a liquidação objecto da presente impugnação;
35.ª Assim, ao aderir ao entendimento propugnado pela administração tributária, a sentença recorrida incorre, também ela, em manifesta ilegalidade, devendo, pois, ser anulada;
36.ª Sem prejuízo de todo o exposto e mesmo que tal não fosse procedente, o que só a benefício de raciocínio se pode admitir, uma outra razão e fundamento ditava a ilegalidade da liquidação em crise, qual seja, a violação do princípio da justiça previsto no artigo 55.º da LGT e no artigo 266.º, n.º 2, da CRP;
37.ª Efectivamente, a desconsideração desta dedução, tal como advoga a administração tributária, gera uma situação de flagrante injustiça ao impor-se ao Recorrente um encargo tributário que não lhe cabe suportar e, concomitantemente, ao fazer entrar nos cofres do Estado receita tributária a que não tem manifestamente direito;
38.ª Razão pela qual, em face de todo o exposto, é por demais evidente que a liquidação em crise deve ser anulada;
39.ª Não o tendo determinando, a sentença recorrida padece de erro de julgamento, devendo, também com este fundamento, ser anulada.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida, e, nessa medida, a liquidação adicional em crise nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA.».
1.2. A Recorrida (Autoridade Tributária), notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.
1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 276 e ss. do SITAF, em que pugna pela improcedência do recurso, argumentando que, no que tange ao erro de julgamento de facto “(...) carece de todo o fundamento a pretensão do Recorrente quando propende pela revogação da decisão recorrida, por alegada verificação de erro de julgamento, no que tange à valoração da prova produzida e à consequente fixação da matéria fáctica dada como provada.” e, no que tange ao erro de julgamento de direito, “(...) não logrou derrubar a argumentação avançada pelo tribunal a quo quanto à interpretação das normas legais convocadas para a solução do caso vertente. / (...) carece de todo e qualquer fundamento a imputação à douta decisão recorrida da violação da legalidade e, muito especificamente, dos princípios da verdade material e da tributação do lucro real, consagrados no artigo 6.º do RCPIT, 104.º, n.º 2 da CRP e 17.º do Código do IRC”. Concluindo que: “Nos termos e com os fundamentos acima expostos, somos do parecer de que deverá ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se, pois, inteiramente, a douta sentença recorrida.”.
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos, submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa (i) aferir do erro de julgamento de facto (errada valoração da prova) e (ii) do erro de julgamento de direito em que incorreu a sentença recorrida ao não ter relevado da violação do 76º do Código de Processo Tributário (CPT), dos princípios da verdade material e da tributação do lucro real e, bem assim, (iii) em sede de questão prévia, da ocorrência de lapso material evidenciado na redacção do item 2. do probatório.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«Pelos documentos juntos, aos autos com relevância para o caso e não impugnados, considero provados os seguintes factos:
1. A impugnante procedeu à entrega, em 24.05.1991, da declaração de rendimentos modelo 22 respeitante ao exercício de 1990, na qual foi apurado um lucro tributável no montante de € 4.792.235,31 (960.756.920$00) cfr. fls. 13 a 23 do processo de reclamação graciosa apenso (PR);
2. Em 12.12.1991, com referência ao exercício de 1990, a impugnante apresentou a declaração modelo 22 de substituição, corrigindo o montante do lucro tributável para € 1.959.448,59 (392.834.172$00) cfr. fls. 31 a 42 do PR; [alterado conforme determinado em sede de rectificação no ponto 2.2.1. deste acórdão]
3. Como base, modelo 22, apresentado em 24.05.1991, foi a impugnante submetida a uma acção inspectiva interna em 14.07.1995, realizada pelos serviços de inspecção de Lisboa, com referência ao exercício de 1990, onde foram efectuadas correcções aos valores declarados;
4. Em 20.07.1995, serviços de inspecção tributária da DSPIT, foi elaborado DC- 2º na qual foi corrigido lucro tributável no valor de 1 003 953 187$00 (fls. 86 a 88 do PR);
5. Em 06.09.1995, apresentou, reclamação nos termos dos artigos 84º e seguintes e 136º, n.º 1, do Código de Processo Tributário (C.P.T.) para a Comissão Distrital de Revisão da Matéria Tributável, da fixação do lucro tributável do IRC de 1990, cfr. fls. 11 do PR.
6. Em 06.11.1995, apresentou, reclamação graciosa, nos termos do art.º 95º e seguintes do Código de Processo Tributário (C.P.T.), referente à liquidação de IRC de 1990 n.º ............501, na qual pretendia uma alteração ao lucro tributável de 1.003.953.187$00 (€5.007.697,38) para 436.030.439$00 (€2.174.910,66), ou seja, que lhe seja considerada a dedução ao resultado liquido no valor de 567.922.748$00 (€2.832.786,72) que por lapso não mencionou na i a declaração modelo 22 de IRC entregue. (cfr. fls. 2 a 10 do PR);
7. A liquidação n.º..............901, de 24.07.1991, do que produziu reembolso de 41.367,39 €, resultante da entrega da declaração modelo 22 do IRC, de 24.05.1991, tendo sido emitido cheque n.º ...00, em 25.07.1991 e pago em 05.08.1991. (fls. 96 a 99 dos autos).
8. A presente impugnação foi apresentada em 18.06.2006.
Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos constantes dos autos e neles devidamente referenciados.
Não resultam provados ou não provados quaisquer outros factos com interesse para a decisão.»
2.1.2. Ao abrigo dos poderes concedidos a este Tribunal pelo art. 712.º, n.º 1, alínea a), do CPC, aplicável ex vi do art. 2.º, n.º 1, alínea e), do Código de Procedimento e Processo Tributário, aditamos a seguinte factualidade relevante para a decisão a proferir:
9. Na declaração de substituição a que se alude em 2., em sede de observações consta no campo 23, por referência no campo 24, que: “(c) – Reembolso processado por cheque datado de 25.07.91 da DGCI – liquidação n.º ............910, de 24.07.91” (cfr. fls. 31 a 42 do PR).
2.2. De direito
Importa apreciar se a sentença padece dos erros de julgamento que lhe são imputados pelo Recorrente e, previamente, aferir da rectificação demandada.
Antes de mais, para cabal compreensão importa dar nota de que a presente acção foi interposta em 18.01.2006 (cf. item 8., da fundamentação de facto), e de que a sentença recorrida foi proferida em 03.10.2011, ou seja antes da entrada em vigor da Lei n.º 41/2013, que ocorreu em 01.09.2013, tal como resulta do respetivo artigo 8 º, pelo que é de aplicar supletivamente e por força da remissão constante no artigo 281º do CPPT, o regime dos recursos constante no Antigo CPC, ou seja na sua versão anterior à reforma introduzida pela Lei n.º 41/2013 (tal como resulta do disposto no seu artigo 7º, n.º 1 (cf. neste sentido, a contrario sensu, Laurinda Gemas, in O Novo Processo Civil. Contributos da Doutrina para a Compreensão do Novo Código de Processo Civil Caderno I. 2.ª edição. Lisboa: Centro de Estudos Judiciários, 2013., pág. 40).
Em suma, nos presentes autos, todas as considerações e referências reportam-se ao Antigo Código de Processo Civil.
2.2.1. Da questão prévia
A 1ª questão que importa dar resposta, prende-se com o aferir se o julgamento de facto que emerge da decisão recorrida padece ou não de um erro material susceptível de rectificação nesta sede recursiva.
Dispunha o artigo 667º, nº 1, do anterior CPC - tal como dispõe, aliás, o artigo 614º, nº 1, do actual CPC – que “se a sentença omitir o nome das partes, for omissa quanto a custas, ou contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz”.
Não estando em causa nos presentes autos a omissão do nome das partes ou a omissão quanto a custas, o que importa saber é se a sentença proferida contém ou não um qualquer erro material que possa ser rectificado ao abrigo da norma citada.
Refira-se, desde já, que o erro material não pode ser confundido com o erro de julgamento, sendo que apenas o primeiro pode ser corrigido por simples despacho; o erro de julgamento não é susceptível de rectificação ao abrigo da norma supra citada, apenas podendo ser reparado por via de recurso.
A propósito da distinção entre erro material e erro de julgamento, afirma o Prof. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Reimpressão, pág. 130, o seguinte: “O erro material dá-se quando o juiz escreveu coisa diversa do que queria escrever, quando o teor da sentença ou despacho não coincide com o que o juiz tinha em mente exarar, quando, em suma, a vontade declarada diverge da vontade real…O erro de julgamento é espécie completamente diferente. O juiz disse o que queria dizer; mas decidiu mal, decidiu contra lei expressa ou contra os factos apurados. Está errado o julgamento. Ainda que o juiz, logo a seguir, se convença de que errou, não pode socorrer-se do art. 667º para emendar o erro”.
Mas, pressupondo o erro material uma divergência entre a vontade real do juiz e aquela que declarou, como poderemos constatar essa divergência, ou seja, como poderemos saber qual era a vontade real do juiz? Importa notar que, ainda que o juiz chamado a efectuar a rectificação seja o mesmo que proferiu o despacho ou sentença a rectificar (e que, como tal, saberá melhor que ninguém aquilo que pretendia escrever), a existência de um erro material susceptível de rectificação tem que ser apreensível externamente, sob pena de se estar a permitir que, de forma encapotada, o juiz possa emendar um erro de julgamento que tenha cometido com o pretexto de que aquilo que escreveu não era o que pretendia escrever.
É por isso que a lei, ao determinar os erros susceptíveis de rectificação, impõe que eles sejam devidos a omissão ou lapso manifesto e tal significa que o erro tem que se manifestar com alguma clareza a quem leia o despacho ou sentença, de tal forma que possa ser percebido por outrem (e não apenas pelo juiz que os proferiu) que o juiz escreveu coisa diversa daquela que pretendia e que, como tal, o erro em causa não é um erro de julgamento.
Com efeito, e citando mais uma vez o Prof. Alberto dos Reis, ob. Cit., pág. 131, “é necessário que as circunstâncias sejam de molde a fazer admitir, sem sombra de dúvida, que o juiz foi vítima de erro material: quis escrever uma coisa e escreveu outra. Há-de ser o próprio contexto da sentença que há-de fornecer a demonstração clara do erro material”.
Ora, em face do exposto, parece evidente que o eventual erro cometido na sentença proferida nos autos poderá ser qualificado como erro material e como tal susceptível de rectificação, porquanto os autos permitem-nos afirmar que estamos perante um manifesto lapsus calami, ou seja, de que existe divergência entre aquilo que se escreveu e o que se pretendia escrever.
Vejamos.
Sustenta o Recorrente que “(...) a sentença recorrida procede à incorrecta menção de que a declaração modelo 22 de substituição apresentada pelo Recorrente corrigiu o lucro tributável em € 1.959.448,59 (quando, na verdade, a mesma visou corrigir o lucro tributável para € 1.959.448,59), o que consubstancia erro ou lapso material, o qual, nos termos do disposto no artigo 667.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, é susceptível de conduzir à rectificação da sentença, o que se requer para os devidos efeitos legais;” (vide conclusão 5ª das alegações de recurso).
Com efeito, da mera análise da Declaração Modelo 22 de Substituição, junta a fls. 31 a 42 do Processo de Reclamação Graciosa em apenso, mormente de fls. 37, apura-se que a expressão adequada, que reflecte rigorosamente a realidade dos factos, seria “(...) corrigindo o montante do lucro tributável para €1.959.448,59” e não, como daí consta “(...) corrigindo o montante do lucro tributável em €1.959.448,59” (destaque nosso).
Na verdade, trata-se aqui de realidades distintas e incompatíveis, com diversa tradução em termos matemáticos e subsunção jurídica, e já não de um mero e inócuo preciosismo de linguagem. Pelo que se impõem repor a realidade que emerge do confronto da Declaração de rendimentos Modelo 22 respeitante ao exercício de 1990, apresentada em 24.05.1991, no qual foi apurado um lucro tributável no montante de € 4.792.235,31 e, em 12.12.1991, apresentou declaração de substituição daquele Modelo 22 de IRC, em que corrige aquele valor apurado para um lucro tributável de € 1.959.448,59.
Assim sendo, e porque a M.ma Juíza de Direito a quo não procedeu à correcção do lapso de escrita, cumpre a este tribunal ad quem de harmonia com o disposto no artigo 667.º, n.º 2, 1.º segmento, do ACPC, ordenar a rectificação requerida, passando a constar, da redacção do mencionado item 2. do probatório que: “(...) corrigindo o montante do lucro tributável para €1.959.448,59” (sublinhado nosso).

2.2.2. Do erro de julgamento de facto
O Recorrente discorda do decidido (cf. conclusões 6ª a 17ª, das alegações de recurso) aduzindo, em primeiro lugar que andou mal o Tribunal a quo na fixação da matéria fáctica dada como provada, no que tange ao item 7. da respectiva fundamentação de facto.
Por um lado, o Recorrente alega da errada apreciação e valoração em que o Tribunal a quo incorreu sobre os elementos probatórios existentes nos autos, por outro lado, pugna no sentido da sua alteração, alicerçando a sua razão, na ausência de prova documental da efectivação da notificação do acto de liquidação do IRC relativo ao exercício de 1990.
Ora, no que concerne à apreciação da factualidade apurada, mormente a vertida no citado item 7. do probatório, diremos, desde logo, que o Recorrente categoricamente não abala a credibilidade e realidade dos factos subjacentes ao mesmo. Desde logo olvida por certo que tal informação prestada pela AT e print informático em que assenta a sua motivação (juntos aos autos após várias existências nesse sentido pelo Tribunal a quo) lhe foram notificados para efeitos de contraditório e, nada disse. A que acresce, que notificado para apresentar alegações finais, assumiu o fim da instrução dos autos ao apresentar aquelas, sem qualquer menção ou reparo sobre a informação prestada da emissão do cheque no valor de €41.367,39 em 25.07.1991, correspondente ao reembolso apurado em sede de autoliquidação do IRC de 1990, valor esse pago em 05.08.1991.
Mas sempre se dirá, conforme consta do item 9. da matéria de facto aditada oficiosamente, que é o próprio Recorrente que aquando da apresentação da declaração de substituição, em sede de observações fez constar no campo 23, por referência ao campo 24, que: “(c) – Reembolso processado por cheque datado de 25.07.91 da DGCI – liquidação n.º ............910, de 24.07.91”, o que releva a incoerência das afirmações contidas nesta sede recursória ao pôr em causa o constante do item 7. do probatório, a roçar a má fé e o desespero de causa.
Ora, e como refere o Digno Procurador da República no parecer parcialmente transcrito, em sede de erro de julgamento de facto, o Recorrente se subleva quanto àquele facto “pretendendo tão-somente rebater as ilações que o tribunal a quo pretensamente deles teria extraído” e, prosseguindo sendo que de “uma análise minimamente atenta da citada douta sentença recorrida permite-nos concluir que o tribunal a quo apreciou com acerto a prova documental produzida, que serviu de suporte à matéria vazada no item 7. ora em crise e, ademais, que da mesma não retirou consequências jurídicas contra legem.”
Com efeito, se bem interpretamos as alegações e conclusões do recurso, insiste e pugna o Recorrente, nesta sede, pela falta de notificação do acto de liquidação do IRC relativo ao exercício de 1990 e, nessa exacta medida, contrapõe que ao invés do vertido no item 7. do probatório o Tribunal a quo deveria ter levado ao julgamento de facto aquela falta de notificação.
Mas será que assim teria que ser? Que sobre AT, tratando-se de autoliquidação, existia o dever de notificar a “liquidação”?
Vejamos.
O nosso ordenamento prevê uma variedade de tipologias de liquidações de imposto, podendo as mesmas ser emitidas pela AT ou ser elaboradas pelo próprio sujeito passivo. É neste último caso que se fala em autoliquidação.
Assim, e a título meramente ilustrativo, são claramente emitidas pela AT as liquidações adicionais resultantes de correções efectuadas ou as liquidações oficiosas motivadas por ausência de apresentação de declaração por parte do sujeito passivo.
A doutrina e a jurisprudência referem-se à autoliquidação para aludir ao acto cuja iniciativa pertence ao contribuinte, por disposição legal, consubstanciando-se na apresentação de uma declaração, o que pressupõe as imprescindíveis operações de qualificação (identificação do “an debeatur”) e quantificação (aferição do “quantum debeatur”) necessárias para avaliar o montante de imposto a pagar ou a restituir, normalmente acompanhada do respectivo meio de pagamento (cfr. artigo 70º, alínea a), do CIRC – aprovado pelo Decreto lei n.º 442-B/88; vide acórdão do STA, de 07.05.2003, in recurso n.º 316/03; Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.405 e seg.; Manuel M. Pires Fernandes, Glossário de Direito Fiscal, Dislivro, 2007, pág. 48).
Assim, em sede de autoliquidação estamos perante um acto cuja iniciativa pertence ao contribuinte por disposição legal, consubstanciando-se na apresentação de uma declaração, normalmente acompanhada do respectivo meio de pagamento, quando a este haja lugar.
Logo, a autoliquidação é a liquidação de um tributo que não é feita pela Administração Tributária, mas pelo sujeito passivo, por autodeterminação, sendo que a posteriori, de acordo com o disposto nos artigos 16º e 71º do CIRC aplicável (versão vigente em 1991) e 76º do CPT na redacção original, o sujeito passivo que proceda à autoliquidação poderá ter que esclarecer, quando solicitado pela administração tributária, os critérios utilizados e a sua aplicação na determinação dos valores que declarou.
Portanto, a autoliquidação exigirá sempre uma declaração. E, o que decorre do ponto 1 do probatório é que pelo Recorrente foi enviada a respectiva declaração de IRC rendimentos Modelo 22, respeitante ao exercício de 1990, na qual foi apurado pelo sujeito passivo um lucro tributável de € 4.792.235,31, que perante os demais elementos apresentados fixa o quantitativo da prestação após ter determinado os elementos da obrigação tributária, sendo que no caso, não dava lugar a entrega de imposto, com a mesma, mas sim ao respectivo reembolso do imposto a mais.
Em suma, o próprio legislador atribui a competência para liquidar ao próprio sujeito passivo, em regra.
Assim a declaração apresentada pelo Recorrente corresponde, à declaração periódica de rendimentos, a apresentar, então, até ao último dia útil do mês de maio, artigo 96º do então CIRC, a qual sem quaisquer dúvidas configura uma situação de autoliquidação.
Ora, estamos perante um acto sobre o qual é destituído de sentido apelar para a falta de notificação de liquidação.
A notificação a que alude o Recorrente e alega estar em falta, só é obrigatória para os actos tributários emitidos pela administração tributária. Pois só nestes casos é que cumpre acautelar as garantias dos administrados, para que os mesmos tenham conhecimento dos actos praticados pela AT que lhes digam respeito.
Nos casos de autoliquidação, não se pode falar na existência de um acto tributário de liquidação praticado pela AT. Pois que, é o contribuinte quem calcula e liquida o imposto a pagar, mesmo que, como foi o caso e ao contrário do que resulta da disciplina legal aplicável, não proceda ao pagamento de imposto com a apresentação da declaração, porque da mesma configurava o seu direito haver reembolso.
Ora, estando nós perante uma autoliquidação, o contribuinte tem dela conhecimento, pois foi ele próprio quem a elaborou e submeteu. Ainda que a AT tenha atribuído um número à liquidação de imposto e ainda que a tenha evidenciado no print que mais tarde junta, da qual consta como vertido no item 7. “A liquidação n.º..............901, de 24.07.1991, do que produziu reembolso de 41.367,39 €, resultante da entrega da declaração modelo 22 do IRC, de 24.05.1991, tendo sido emitido cheque n.º ...00, em 25.07.1991 e pago em 05.08.1991.”), isso não altera a natureza da liquidação. Só assim não seria se a AT tivesse corrigido o que fora declarado pelo contribuinte e tivesse, nesse seguimento, procedido a nova liquidação, o que não foi o caso, no momento temporal que ora nos importa, pois como resulta ela viria a ocorrer a “liquidação adicional” em 20.07.1995 (vide itens 4. a 6. do probatório).
Assim, nas situações de autoliquidação, a Administração Tributária não está obrigada a notificar o sujeito passivo do montante em falta ou a restituir, uma vez que a notificação conteria o valor apurado pelo próprio contribuinte, que já sabia o ser devido e ou o haver.
Concluindo, não havendo obrigação de notificação, por parte da AT, das autoliquidações de IRC, patente é a desnecessidade de levar ao probatório o facto negativo que ora imporia aditar da falta de notificação da liquidação que “emergiu” da apresentação da declaração de rendimentos IRC de 1990 em 24.05.1991.
Mais se diga, se, atentarmos à fundamentação da sentença sob recurso, que a questão da notificação foi ali desvalorizada pelo tribunal a quo quando, à luz do regime legal que reputa aplicável, decorrente do artigo 151.º do CPT, que propende pela relevância jurídica de duas únicas datas: ou a data do pagamento – 5 de agosto de 1991 – ou a data da declaração – 24 de maio de 1991.
Por todo o exposto, carece de fundamento a pretensão do Recorrente quando propende pela revogação da decisão recorrida, por alegada verificação de erro de julgamento, no que tange à valoração da prova produzida e à consequente fixação da matéria fáctica dada como provada, pelo que improcede o vertido nas conclusões 6ª a 18ª das alegações de recurso.
2.2.3. Do erro de julgamento de direito
Cristalizada a matéria de facto, cumpre apreciar do erro de julgamento de direito, sendo que, quanto a este, que toda a argumentação vagada no recurso que colida com a alegada falta de notificação se mostra prejudicada pelo supra exposto, de que a mesma [notificação da liquidação] não se verifica por a tal não estar AT obrigada nas situações de autoliquidação.
Temos então, que;
- O Banco, ora Recorrente, apresentou em 24 de maio de 1991 a declaração de rendimentos (mod. 22) para efeitos de IRC respeitante ao exercício de 1990. Nessa declaração apurou o lucro tributável de € 4.792.235,31 e propôs-se deduzir prejuízos fiscais nos termos do então artigo 46º do CIRC, solicitando a final reembolso por cheque ou vale postal (vide campo 18 e 24 da referida declaração, item 1 do probatório).
- Em 12 de dezembro de 1991, a mesmo Banco apresentou declaração de substituição relativa ao IRC do exercício de 1991. Desta feita, alterou o lucro tributável, que era de € 4.792.235,31 (960.756.920$00) na declaração inicial, para €1.959.448,59 (392.834.172$00), através do enquadramento do benefício fiscal dos rendimentos dos bilhetes do tesouro – 1989 e 1990, de dedução ao rendimento e não à colecta, mediante as alterações no campo 19, linhas 4.4 e 5. Na mesma declaração em sede de observações deu nota no campo 23 do “(c) – Reembolso processado por cheque datado de 25.07.91 da DGCI – liquidação n.º ............910, de 24.07.91”, ou seja, por via da autoliquidação já havia sido processado e por si recebido o devido reembolso.
- Ulteriormente, em sede de análise interna, em 14.07.1995, com base na declaração apresentada em 24.05.1991, e aos valores nela declarados, com referência ao exercício de 1990, AT efectuou correcções ao lucro tributável daquele exercício e emitiu liquidação em 20.07.1995.
- Em 06.11.1995, o Banco apresentou reclamação graciosa, nos termos do art.º 95º e ss. do CPTA, contra a referida liquidação adicional.
- A AT entendeu não levar em conta os elementos constantes da declaração de substituição que o Recorrente apresentara em 12.12.1991, por considerar que a mesma visava um erro a favor do contribuinte e, como tal, o procedimento adoptado não foi o correcto, sendo que o procedimento para obter essa correcção teria que ser por via da reclamação graciosa, como estabelecia então, o artigo 151º do CPT.
Ora, na sequência do indeferimento da reclamação graciosa apresentada em 1995, o Recorrente apresentou a presente impugnação judicial, em que sustenta que a liquidação adicional de IRC emitida em 20.07.1995, enferma de vício de violação de lei, mormente da violação do artigo 76º do CPT, na medida em que deveria ter sido atendida a declaração de substituição por ela apresentada em 12.12.1991, e dos princípios da verdade material e do princípio da tributação do lucro real.
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto não atendeu a pretensão da ora Recorrente. Em síntese, considerou que não podia a AT atender à declaração de substituição apresentada, porque os factos ocorreram em 1991, pelo que a redacção aplicável é a dos artigos 76º e 151º do CPT, na redacção que decorre do Decreto lei n.º 154/91 de 23 de abril, o qual entrou em vigor em 01.07.1991. Sendo que aquele artigo 151º, norma especial, preceitua que quando haja erro na autoliquidação, será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa para o director distrital de finanças competente, no prazo de 90 dias após o pagamento ou da apresentação da declaração. Nesta conformidade, nunca poderia ser considerada o modelo 22 de substituição, apresentado, em 12.12.1991, fosse suficiente para corrigir a autoliquidação efectuada pela impugnante. E mesmo que assim se considerasse, sempre a mesma teria de ser considerada, apresentada fora de tempo, pois não respeitava o prazo de 90 dias a contar do pagamento (05.08.1991) da apresentação da declaração (24.05.1991).
Vejamos.
Uma primeira nota é que por via da presente impugnação o Recorrente não contesta as correcções que foram determinadas por via da liquidação adicional.
O motivo pelo qual o Recorrente discorda da actuação da AT é porque esta não relevou a declaração de substituição apresentada em 12 de dezembro de 1991, em que corrigiu o lucro tributável anteriormente declarado, não se conformando com afirmação de que não usou o procedimento correcto.
Salvo o devido respeito, não tem razão. Insiste o Recorrente na aplicação do artigo 76.º do CPT, em detrimento do artigo 151º do mesmo diploma assente num único argumento de que in casu nunca ocorreu liquidação e, como tal, só se esta tivesse efectivamente ocorrido é que não poderia usar da faculdade concedida pelo artigo 76º do CPT e, estava compelido a obter a correcção pela via da reclamação graciosa. (vide conclusão 21ª das alegações).
Dispunha o então artigo 151º do CPT, que “1 - Em caso de erro na autoliquidação, a impugnação será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa para o director distrital de finanças competente, no prazo de 90 dias após o pagamento ou da apresentação da declaração, quando àquele não haja lugar.
2 - Em caso de indeferimento expresso ou tácito da reclamação, o contribuinte poderá impugnar, no prazo de 30 dias, a liquidação que efectuou, contados, respectivamente, a partir da notificação do indeferimento ou do termo do prazo referido no artigo 125.º”
É certo, que por sua vez o artigo 76º do CPT preceituava que “1 - O processo de liquidação instaura-se com as declarações dos contribuintes ou, na falta ou vício destas, com base em todos os elementos de que disponha a entidade competente.
2 - O apuramento da matéria tributável far-se-á com base nas declarações dos contribuintes, desde que estas sejam apresentadas nos termos previstos na lei e sejam fornecidos à administração fiscal os elementos indispensáveis à verificação da sua situação tributária.
3- Em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes, podem estas ser substituídas, estas podem ser substituídas até à liquidação, sem prejuízo, da responsabilidade contra-ordenacional que ao caso couber.”.
O que este preceito prevê (o artigo 76º n.º 3 do CPT) é a possibilidade de substituição da declaração de rendimentos já apresentados, por estas conterem erros de facto e de direito, mas a lei fixa um limite temporal, qual seja, o de essa substituição ocorrer até à liquidação.
In casu, conforme decorre do exposto e fundamentado no ponto 2.2.2. em sede de apreciação do erro de julgamento de facto, tal contingência hà muito se tinha verificado, pois como ali discorremos estamos perante uma autoliquidação, em que a liquidação do imposto se dá no momento da apresentação da declaração de rendimentos Modelo 22 pelo próprio contribuinte [em conformidade com o então disposto na alínea a) do art.º 70º do CIRC, a liquidação do IRC é feita, pelo próprio contribuinte nas declarações a que se referem os artigos 96º e 97º do CIRC, quando estas forem apresentadas no prazo legal].
A liquidação, isto é, a autoliquidação de IRC do exercício de 1990 do Banco ora Recorrente, deu-se em 24.05.1991, o que só por si afasta a aplicação do artigo 76º n.º 3 do CPT e, determina a intempestividade da declaração de substituição apresentada em 12.12.1991.
Mais se diga, nem o Recorrente alega, da existência de norma especial no então Código de IRC, que à luz da lei actualmente em vigor, fixasse outro período temporal para apresentação da declaração de substituição.
Ora, manifestamente, a declaração de substituição que o Recorrente apresentou em 12 de dezembro de 1991 foi apresentada para além do termo do prazo legal, que terminou em 24 de maio de 1991, data em que apresentou a autoliquidação.
Sendo certo que, o n.º 1 do artigo 151.º do CPT fixava em 90 dias o prazo para a reclamação graciosa (prévia e necessária à impugnação judicial) em caso de autoliquidação, poderia questionar-se se sobre a entidade que recepcionou a declaração de substituição impedia o dever de convolar aquela em reclamação graciosa.
Como salienta, Jorge Lopes de Sousa, [se bem que no âmbito do CPPT, mas com aderência, o ali doutrinado, aos normativos em apreço], “[e]sta possibilidade de convolação apenas se verifica nos casos em que a declaração de substituição seja apresentada no prazo legal para a reclamação graciosa, o que a reconduz às situações previstas na subalínea II) da alínea b) do n.º 3 deste artigo” ( in Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, II volume, anotação 11 ao artigo 59.º, pág. 507.).
Por isso, bem andou o Tribunal a quo, ao revelar que «(...) nunca poderia ser considerada o modelo 22 de substituição, apresentado, em 12.12.1991, fosse suficiente para corrigir a autoliquidação efectuada pela impugnante. /E mesmo que assim se considerasse, sempre a mesma teria de ser considerada, apresentada fora de tempo, pois não respeitava o prazo de 90 dias a contar do pagamento (05.08.1991) da apresentação da declaração (24.05.1991).
(...)
Não pode a impugnante agarrar-se a pormenores, cujo apuramento se torna difícil, devido ao decurso do tempo, para daí extrair consequências da tempestividade da declaração de substituição do modelo 22, isto é, tentar converte-la em reclamação graciosa, prevista no art.º 151.º do CPT, o que é manifestamente impossível, uma vez, que a lei não o permite.»
Por fim, alega o Recorrente que mal andou o Tribunal a quoquando sustenta que não ocorreu qualquer violação dos princípios da verdade material e da tributação pelo lucro real, consagrados no artigo 6.º do RCPIT, no artigo 104.º, n.º 2, da CRP e no artigo 17.º do Código do IRC, respectivamente, atenta a circunstância de, em suma, o ora Recorrente não ter procedido à apresentação da reclamação graciosa contra a autoliquidação e de não incumbir sobre a administração tributária qualquer dever de realização de correcções oficiosas a favor do contribuinte” (vide conclusões 31ª a 37ª, das alegações de recurso).
A este respeito discreteou a sentença do seguinte modo «(...) Importa agora, verificar se há violação do princípio da verdade material e do princípio da tributação do lucro real.
Alega a impugnante que ao não processar a declaração de substituição apresentada, a liquidação adicional ora impugnada é igualmente ilegal por não reflectir o lucro real declarado pelo impugnante, tal como o impõem os art.º 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa e o art.º 17.º do CIRC e por violar o princípio da verdade material, constante do artigo 6.º do Regime Complementar de Procedimento e de Inspecção Tributária (RCPIT).
Alega que em 6.11.1995 o contribuinte apresentou a presente reclamação, tendo como objectivo a alteração ao lucro tributável de 1.003.953.187$00 (€5.007.697,38) para 436.030.439$00 (€2.174.910,66), ou seja, que lhe seja considerada a dedução ao resultado liquido no valor de 567.922.748$00 (€2.832.786,72) que por lapso não mencionou na 1º declaração modo 22 de IRC entregue.
O n.º 2 art.º 104.º da CRP prevê que a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real.
O art. 17.º do CIRC preceitua que “1 - O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código.”
Porem o art.º 6.º do RCIPT previa que: O procedimento de inspecção visa a descoberta da verdade material, devendo a administração tributária adoptar oficiosamente as iniciativas adequadas a esse objectivo.
Resulta da matéria assente que a impugnante procedeu à entrega, em 24.05.1991, da declaração de rendimentos modelo 22 respeitante ao exercício de 1990, na qual foi apurado um lucro tributável no montante de € 4.792.235,31 (960.756.920$00).
A impugnante se pretendia auferir de benefícios fiscais, tinha a obrigação de proceder atempadamente às respectivas obrigações acessórias para que a Administração as levasse em consideração.
Porem, a impugnante quando se apercebeu do erro, apresentou a declaração de substituição. Como supra se referiu, o recurso que utilizou não era o previsto no CPT, pelo que a administração não o poderia considerar.
Nesta conformidade a administração procedeu á liquidação de acordo com elementos do modelo 22 apresentado em 24.05.1991, logo procedeu à liquidação adicional em conformidade com rendimento real apresentado pela Impugnante e em conformidade com o art.º 104 da CRP e art.º 17.º do CIRC.
No que concerne à violação do princípio da verdade material.
Da actuação da administração fiscal, não se vislumbra qualquer actividade, que mostre que ela não desenvolveu a sua actividade inspectiva, em conformidade da lei.
Pretende a impugnante, retirar, de um erro a si imputável, vantagens para a correcção de uma liquidação oficiosa que ocorreu em data posterior.
Como resulta da matéria assente, como base, modelo 22, apresentado em 27.05.1991, foi a impugnante submetida a uma acção inspectiva interna em 14.07.1995, realizada pelos serviços de inspecção de Lisboa, com referência ao exercício de 1990, onde foram efectuadas correcções aos valores declarados.
Em 20.07.1995, pelos serviços de inspecção tributária da DSPIT, foi elaborado DC- 2º na qual foi corrigido lucro tributável no valor de 1 003 953 187$00.
A reclamação apresentada em 06.11.2005, tem por único fundamento as correcções derivada do benefício fiscal a que tinha direito nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 143/89, de 3 de Maio e que consistia na dedução ao lucro tributável do valor correspondente a 20% dos rendimentos dos Bilhetes de Tesouro, emitidos entre 14.07.1989 e 31.12.1990 e auferidos no exercício de 1990, no montante de € 2.832.786,72 (567.922.748$00).
A impugnante não discordou das correcções efectuadas, pela inspecção, discordou que a Administração não tivesse corrigido oficiosamente, um erro a si imputável.
Nesta conformidade, não se vislumbra, qualquer violação do supra referido princípios pelo que se improcede a pretensão da impugnante.» (fim de transcrição)
A sentença recorrida não nos merece reparo.
O princípio da verdade material, consagrado no artigo 6º, do RCPIT, impõe que a Administração Tributária, no âmbito do procedimento de inspecção, procure recolher os elementos probatórios que possibilitem mais tarde fundamentar o acto tributário que venha a ser praticado. Trata-se de investigar e apurar o correcto cumprimento das obrigações fiscais pelos sujeitos passivos e, com base nessa investigação, recolher elementos que permitam apurar a eventual existência de irregularidades. Em suma, fixa aquele que deve ser o objectivo do procedimento inspectivo - a descoberta da verdade material.
Ora, como disso dá nota a sentença recorrida, no caso sub judice, não vislumbra aquele e este Tribunal ad quem, em que medida é que a actuação da Administração Fiscal que no âmbito de uma acção inspectiva interna - que não passa de uma análise interna da declaração Modelo 22 com base nos valores declarados em 24.05.1991 (autoliquidação), ou seja, um procedimento posterior à liquidação que se limita a proceder às correcções que considera aplicáveis ao lucro tributável - ao não relevar a declaração de substituição apresentada, que visava corrigir um erro a favor do declarante, por não obedecer ao procedimento e momentos temporais exigidos por lei, possa considerar-se violadora do princípio da verdade material e/ ou do princípio da tributação pelo rendimento real, violações estas que igualmente não são concretizadas pelo Recorrente.
Por outro lado, sempre se dirá, que a preclusão do prazo para apresentar declaração de substituição não significa que o Impugnante/Recorrente estivesse impedido de fazer valer o seu direito de reagir contra a liquidação. Se, como afirma, existia um erro quanto ao lucro tributável que apurou na declaração que apresentou para efeitos de IRC do ano de 1991, estamos cientes de que os prazos de reacção contenciosa foram ultrapassados (já estariam a 12.12.1991), mas sempre poderia ter impugnado a liquidação adicional de 04.08.1995.
É que a autoliquidação foi corrigida pela liquidação adicional [a qual, mais não é do que a correcção de uma liquidação deficiente em consequência de erros ou omissões], sendo que nela, porque não foi considerado se manterá em princípio o erro que continha a autoliquidação, no que concerne ao erro que o declarante preconizava na sua declaração de substituição, ou seja, se se mantém esse erro no apuramento do lucro tributável, então a opção seria de impugnar esse acto tributário com fundamento nesse erro, sem necessidade de qualquer reclamação prévia, uma vez que já não estava perante autoliquidação, mas estava antes sim perante uma liquidação adicional, que constitui acto imediato e directamente impugnável.
Mas não foi esse o caminho escolhido pelo ora Recorrente. Na verdade, ao invés de adoptar o procedimento acima descrito, impugnando a liquidação adicional com fundamento nesse alegado erro respeitante ao montante do lucro tributável, entendeu impugnar, na sequência do indeferimento da reclamação graciosa, a liquidação adicional com fundamento exclusivamente em violação de lei por incumprimento do suposto dever de evidência da declaração de substituição em sede, quer do procedimento interno, quer em sede de reclamação graciosa.
Sendo que os vícios imputados pela Impugnante à liquidação adicional se prendem exclusivamente com “admissão” e “reconhecimento” da declaração de substituição apresentada em 12.12.1991, o quais se não verificam, uma vez que, como resulta de todo o exposto, a declaração de substituição era manifestamente intempestiva e a convolação daquela em reclamação graciosa prévia, procedimento que a lei determinava, não podia operar igualmente por intempestividade, é de confirmar a decisão de improcedência da impugnação judicial.
Em face do exposto, o recurso não pode ser provido.
2.3. Conclusões
I. Estamos perante um erro material, susceptível de rectificação, em virtude de se ter escrito coisa diferente daquela que se pretendia, atento o disposto no então artigo 667º, nº 2 do Antigo CPC
II. No que respeita ao IRC, com a apresentação da declaração periódica de rendimentos, estamos perante uma situação de autoliquidação, ou seja, liquidação do imposto directamente pelo contribuinte, sendo que o pagamento deverá ser feito em simultâneo com a autoliquidação, se a ele houver lugar.
III. Nos casos de autoliquidação de imposto, no caso de IRC, não existe obrigação de notificação da liquidação por parte da AT.
IV. Sendo certo que o artigo 76º, n.º 3 do CPT, na versão então aplicável em 1991, permitia a substituição da declaração até à liquidação, pelo que a declaração apresentada após aquele momento é manifestamente intempestiva.
V. Nos termos do artigo 151º do CPT, o termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial do acto de autoliquidação é de 90 dias após a apresentação da declaração, o qual estava manifestamente ultrapassado em 12.12.1991 (data de apresentação da declaração de substituição).
VI. Não tinha a AT de convolar a declaração de substituição apresentada para além do termo do prazo legal em reclamação graciosa e sendo o único fundamento invocado na impugnação judicial da liquidação adicional que substituiu a auto-liquidação do exercício de 1990, a não atendibilidade da declaração de substituição, mormente por violação dos princípios da verdade material e da tributação pelo lucro real, a mesma está condenada ao fracasso.


3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 24 de abril de 2024

Irene Isabel das Neves
Paulo Moura
Virgínia Andrade