Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00745/16.3BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/05/2025
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:VITOR SALAZAR UNAS
Descritores:OPOSIÇÃO;
GERÊNCIA DE FACTO;
Sumário:
I – À luz do regime da responsabilidade subsidiária prevista no art.º 24.º, n.º 1, da LGT, em qualquer das suas duas alíneas, a possibilidade de reversão não se basta com a gerência de direito, exigindo-se o exercício de facto da gerência, incumbindo à AT a sua demonstração.

II - Nos termos do disposto na alínea b), do art.º 24.º, da LGT., a prova do exercício da gerência de facto, recai sobre a Exequente, sendo que a falta dessa demonstração, sempre terá de ser valorada contra esta.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO:
A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, com os demais sinais nos autos, interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente a oposição instaurada por «AA», na qualidade de responsável subsidiário, contra à execução fiscal n.º ...27 e apensos, a correr termos no Serviço de Finanças 1..., por dívidas da sociedade executada originária “[SCom01...], LDA.”, NIPC ...20, respeitante a IVA e juros de mora do período 2014-12T (último trimestre de 2014) e retenções na fonte de IRS do mês de fevereiro de 2015, cujo valor exequendo global ascende a € 144.830,59.
A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
«(…).
I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a oposição deduzida pelo Oponente, e em consequência, determinou a extinção da execução fiscal em relação ao mesmo.
II. O objecto do recurso centra-se em saber se o douto Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, por considerado o Oponente como parte ilegítima no âmbito do processo de execução de fiscal e apensos, contra si revertidos.
III. Sendo assim, a questão decidenda a submeter ao julgamento do Tribunal ad quem consiste em saber se o douto Tribunal “a quo” incorreu no aludido erro de julgamento, por não ter considerado que alguns dos factos que foram dados como provados, apontam para a prática de actos de gerência efetiva por parte do Oponente na sociedade devedora originária, o que permite concluir pela sua legitimidade para a presente execução fiscal.
IV. Discorda a Fazenda Publica, com a ressalva do sempre devido respeito, do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, porquanto entende que se mostravam verificados os pressupostos legais de que depende a reversão da execução contra o Oponente, designadamente, a prática de actos gerência efectiva por parte do Oponente, pelas razões infra expostas.
V. Os pressupostos da responsabilidade subsidiária dos gerentes de sociedades, têm natureza substantiva, sendo definidos pela lei vigente no momento em que ocorreu o facto gerador dessa responsabilidade.
VI. Está em causa a reversão de execução fiscal, contra o Oponente, na qualidade de responsável subsidiário, sendo a dívida revertida, respeitante a IVA do período de 201412T e respectivos juros de mora liquidados e a Retenções na Fonte de IRS, relativo a Fevereiro de 2015, cujas datas limite de pagamento, ocorreram, em 03/03/2015, 30/04/2015 e 20/03/2015.
VII. Atendendo aos períodos em questão, o chamamento do Oponente na qualidade de responsável subsidiário está sujeito ao regime previsto no artigo 24.º da LGT, que estipula o seguinte: “1 – Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparadas são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si: a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação; b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”
VIII. De acordo com o regime legal consagrado na citada disposição legal, constitui requisito constitutivo do direito à reversão da execução contra os responsáveis subsidiários, designadamente dos gerentes das sociedades, a gerência de facto por parte do responsável subsidiário, isto é, o exercício real e efectivo das funções de gerente.
IX. A sociedade devedora originária foi constituída, em 25/02/2008, e tinha como objecto social a “cedência temporária de trabalhadores para utilização de terceiros utilizadores”, conforme resulta do ponto 1) dos factos dados como provados.
X. O Oponente foi gerente de direito, de 05/11/2011 até 14/11/2011 e, novamente a partir de 02/01/2015, conforme resulta do ponto 3) dos factos dados como provados, abrangendo, as datas em que terminou o prazo legal de pagamento das dívidas revertidas.
XI. Não há norma legal que estabeleça uma presunção legal relativa ao exercício da gerência de facto, designadamente, que ela se presume a partir da gerência de direito.
XII. No entanto, o facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência comum.
XIII. E, eventualmente, com base na prova de que o revertido tinha a qualidade de gerente de direito e demais circunstâncias do caso, nomeadamente, a prova documental carreada para os autos e a prova produzida pela Fazenda Pública, o Tribunal que julga a matéria de facto pode concluir que um gerente de direito exerceu a gerência de facto, se entender que nas circunstâncias do caso, há uma probabilidade forte de essa gerência ter ocorrido e não haver razões para duvidar que ela tenha acontecido.
XIV. Na verdade, da nomeação de uma pessoa para gerente (gerente de direito) de uma sociedade resulta uma presunção natural ou judicial, baseada na experiência comum, de que o mesmo exercerá as correspondentes funções, por ser conatural que, quem é nomeado para um cargo, o exerça na realidade.
XV. Embora inexista uma presunção legal, que force o julgador a concluir, que quem assume a qualidade de gerente de direito exerce a gerência de facto, pode aquele no exercício dos seus poderes de cognição para a fixação da matéria de facto, recorrer às aludidas presunções judiciais.
XVI. Deste modo, fundando-se não só na gerência de direito, mas, de igual modo, em outros elementos carreados para os autos pode, com base nas normais regras da experiência, inferir a gerência de facto.
XVII. Sublinhe-se que, a gerência de facto resulta da prática, ainda que limitada, de actos que vinculam a sociedade, quer se consubstanciem na gestão de negócios sociais, quer na realização de actos que digam respeito à representação ou vinculação da sociedade, sendo certo que o exercício de qualquer uma destas funções integra a gestão de facto.
XVIII. A jurisprudência tem entendido que a realização de actos de gestão ou de representação ou vinculação, ainda que sem reiteração ou continuação, constitui gerência real e efectiva.
XIX. Ou seja, basta a prática de quaisquer dos actos citados para gerar responsabilidade subsidiária, uma vez que deles decorre que o seu autor viabilizou a actividade social e se envolveu na vida da sociedade.
XX. Na verdade, estamos em crer que a lei não exige, para a consideração dos gerentes como sendo de facto, uma administração continuada, bastando-se com a prática de actos vinculativos da empresa, além de não estabelecer qualquer exigência quanto à extensão do cargo de gestão, dado que o seu exercício pode abranger:
a. a. a totalidade da capacidade jurídica da empresa – o que sucederá, em regra, nas sociedades com um ou dois gerentes e com uma estrutura organizacional simples,
b. ou apenas uma determinada área da actividade societária – o que tende a ocorrer nas sociedades em que, por força da complexidade do seu objecto ou da existência de uma estrutura produtiva mais extensa (que pode ir desde a compra da matéria-prima até à sua transformação e comercialização,) cada gerente acaba por ter o seu pelouro, sem prejuízo da possibilidade de intercomunicação entre si.
XXI. Salvo o devido respeito, a gerência de facto ocorre quando alguém, ainda que de modo esporádico e apenas em relação a um único pelouro da empresa exterioriza de algum modo a representação da vontade social por meio de actos substantivos e materiais, vinculando a sociedade perante terceiros.
XXII. Nem podia deixar de ser de outro modo, pois tal resulta, desde logo, do facto de, designadamente, as sociedades por quotas, como pessoas colectivas, agirem apenas através dos seus órgãos, devendo os gerentes praticar os actos que forem necessários ou convenientes à realização do objecto social, representando a sociedade, como se alcança do teor dos artigos 259.º e 260.º do CSC.
XXIII. São os gerentes de facto, quem exterioriza a vontade das sociedades nos seus negócios jurídicos, quem manifesta a capacidade de exercício de direitos da sociedade, praticando actos que produzem efeitos na esfera jurídica desta.
XXIV. Os mesmos vinculam a sociedade, em actos escritos, apondo a sua assinatura com indicação dessa qualidade, conforme estipula o artigo 206. º, n. º 4 do CSC.
XXV. Posto isto e voltando ao caso em apreço, os factos indiciadores do exercício da gerência de facto por parte do Oponente, resultam da circunstância de o mesmo ter assinado, em 12/03/2015 e, em 26/03/2015, em representação da sociedade devedora originária, requerimento de pedido de pagamento em 24 prestações de três processos de execução fiscal e requerimento a requerer a passagem de “certidão de não dívida”, respectivamente, conforme resulta dos pontos 5) e 6) dos factos dados como provados.
XXVI. Atenta a regra da experiência comum, fica confirmada a aceitação e o exercício do cargo de gerente para o qual foi nomeado, quando o Oponente, assina documentos em representação da sociedade.
XXVII. Ao fazê-lo na qualidade de representante legal, está a exteriorizar a vontade da sociedade, vinculando-a, e a representá-la perante terceiros, como resulta do n.º 4 do artigo 260.º do CSC, praticando actos de gerência, para efeitos da aplicação do disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b) da LGT, os quais, salvo melhor opinião, não necessitam de ter uma natureza continuada.
XXVIII. A gerência de facto verifica-se quando alguém exterioriza a representação da vontade social através de actos substantivos e materiais, vinculando a sociedade perante terceiros.
XXIX. Verifica-se a vinculação da sociedade (contribuinte) através da intervenção do oponente, pela aposição da respectiva assinatura, perante terceiros, neste caso a AT.
XXX. O Oponente não só estava investido nas funções de gerente, como exerceu efectivamente o cargo de gerente, na medida em que praticou actos de gerência, designadamente, exteriorizando a vontade da sociedade e vinculando-a perante terceiro.
XXXI. O Oponente agiu na qualidade de gerente da executada originária, representando-a e vinculando-a perante terceiros, pelo que, exerceu, com esse título, a gerência de facto da devedora originária.
XXXII. De relevar, outrossim, que a sociedade devedora originária declarou o pagamento de remunerações ao Oponente, subsumíveis na categoria A de IRS, respeitantes aos meses de Agosto de 2014 a Maio de 2015, inclusive, conforme resulta do ponto 2) dos factos dados como provados.
XXXIII. A circunstância de ter recebido rendimentos da categoria A, conjugado com o facto de ter assinado os supraditos requerimentos, são indiciadores da prática de actos de gerência efectiva na sociedade devedora originária.
XXXIV. Pelo exposto, entende a Fazenda Pública que dos referidos pontos da matéria de facto dada como provada nos autos permite concluir, salvo melhor opinião, pela existência de uma presunção judicial da gerência de facto da devedora originária por parte do Oponente.
XXXV. Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que se julgue improcedente, por não provada, a presente oposicao, com as legais consequências.

Termos em que, e nos melhores de Direito, e sempre com o mui douto suprimento de V. Ex.as, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se, a douta sentença de que se recorre, substituindo-se por outra que julgue improcedente o presente processo de oposição à execução fiscal com as devidas consequências legais, como se nos afigura mais conforme com o que consideramos ser a melhor realização do Direito e Justiça».
Não foram apresentadas contra alegações.

O Digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso, do qual se destacam os seguintes termos:
«(…).
Existe a necessidade de serem carreados para os autos prova de atos praticados que consubstanciem a gerência de facto, o efetivo exercício da gerência por parte do responsável subsidiário. Não bastando, a prática de um ou outro ato isolado para que se possa concluir pelo exercício efetivo da gerência de facto. Terá de existir uma continuidade (antes, durante e depois) dos factos tributários em crise, se for o caso.
Concretizando, atos que suportem relações com os clientes, fornecedores, funcionários e com as instituições financeiras e também com as entidades públicas (AT, Segurança Social, etc.), através, nomeadamente: assinatura de cheques; assinatura de letras; assinatura de notas de encomendas; assinatura de contratos (financeiros, de trabalho, de prestação de serviços, de arrendamento, etc.); assinatura de requerimentos perante entidades públicas (AT, Segurança Social, etc.); assinatura de pedidos de financiamento; assinatura de autos de declarações; assinatura de autos de penhora; ordens de pagamento (home banking); utilização de cartões de débito ou de crédito da sociedade.
É possível também recolher provas de gerência, nomeadamente nos processos de inquérito e nos processos de falência/insolvência.
No que à AT respeita, o carreamento destas provas para os autos pode acontecer em sede de procedimento inspetivo, pois existe um contacto direto com os documentos financeiro-contabilísticos da sociedade devedora originária, através de cópia de cheques, de notas de encomendas, de contratos (leasing, de trabalho, de prestação de serviços, de arrendamento e outros).
E ainda no órgão periférico local (Serviço de Finanças), não só em sede de execução fiscal, através de requerimentos, pedidos de pagamento em prestações, pedidos de certidões da situação contributiva, pedido de redução de coima, pedido de averbamento de imóvel na matriz, declarações de início, alterações e de cessação da atividade, entre outros.
Não esquecendo a possibilidade (muitas vezes esquecida por parte da AT) de serem oficiadas entidades, nomeadamente a Segurança Social, a Autoridade para as Condições de Trabalho, o Instituto de Emprego e Formação Profissional (Centro de Emprego), entre outras, com o propósito de aferir quem representa e/ou representou o devedor originário com o propósito de recolher prova do exercício da gerência de facto.
Ora, nada disto, em substância, foi feito por parte da AT.
Daí que – e bem - veio o Meritíssimo Juiz de Direito a quo concluir que:
“…inexistindo nos autos prova demonstrativa da prática de atos de gerência efetiva por parte do Oponente, prova essa que cabia ao órgão de execução fiscal, não se mostra preenchido um dos pressupostos para a efetivação da responsabilidade subsidiária do Oponente, o que determina a sua ilegitimidade para a presente execução fiscal, com a consequente procedência da oposição.”
O que manifestamente no nosso caso é insuficiente para se considerar o Oponente/Recorrido como gerente de facto, pese embora a AT entenda que seja suficiente a prática de um ato ou outro isolado e descontinuado no tempo para desse modo estar demonstrada a gerência de facto, pois que o facto provado de que o Oponente/Recorrido assinou em representação da sociedade devedora originária requerimentos de pedido de pagamento em prestações e requereu certidão de dívidas; e auferiu importâncias pecuniárias, consideradas como categoria A de IRS, pagas pela devedora originária nos períodos em questão, factos estes que não permitem por si só dar por verificada a gerência de facto que a AT invocou no seu despacho de reversão e recurso - e que a sentença recorrida infirmou - o que obviamente não concordamos pelas razões acima expostas.
Assim, tendo presente o circunstancialismo fáctico e o seu enquadramento jurídico acima exposto, também nós entendemos e reiteramos – tal como o Meritíssimo Juiz de Direito a quo - que não se encontra demonstrada cabalmente a gerência de facto efetiva (e não meramente indiciária) do Oponente/Recorrido, sendo este parte ilegítima na execução fiscal, pelo que o recurso merece ser indeferido e consequentemente a sentença recorrida confirmada, e por isso, mantida na Ordem Jurídica onde se corrobore a extinção da execução fiscal acima identificada.
Em resumo, se conclui que são improcedentes os fundamentos invocados, pelo que o recurso não merece provimento.»


*
Com dispensa dos vistos legais, [cfr. 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil], cumpre agora apreciar e decidir o presente recurso.
*
II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR.
Cumpre aferir se o tribunal errou no julgamento empreendido relativamente à não verificação do pressuposto relativo à gerência de facto, o que inviabiliza o chamamento do oponente/recorrido à execução por via da reversão.

*
III – FUNDAMENTAÇÃO:
III.1 – DE FACTO
Na sentença foi fixada matéria de factos nos seguintes termos:
«Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, considero provados os seguintes factos:
1) A sociedade comercial “[SCom01...], Lda.”, NIPC ...20, foi constituída em 25/02/2008, e tinha como objeto social a “cedência temporária de trabalhadores para utilização de terceiros utilizadores” – (cfr. certidão permanente constante do documento n.º 004472107 do SITAF e documento 1 junto com a contestação).
2) A sociedade referida no ponto anterior, declarou o pagamento de remunerações ao aqui Oponente, subsumíveis na categoria A de IRS, respeitantes aos meses de agosto de 2014 a maio de 2015, inclusive – (cfr. teor do documento 3 junto com a contestação, documento do SITAF n.º 004513499).
3) Pela AP...../20150212 – Insc. 9, foi registado na Conservatória do Registo Comercial ..., a designação do Oponente como gerente da sociedade referida em 1 do probatório – (cfr. certidão permanente constante do documento n.º 004472107 do SITAF e documento 1 junto com a contestação).
4) Em 4/03/2015, foi emitida pelo Serviço de Finanças 1..., a certidão de dívida n.º ...32, que originou a instauração do processo de execução fiscal n.º ...27, em que é executada a sociedade referida em 1 do probatório, relativa a dívida de IVA do período de 2014-12T, no montante de € 136.664,04, cuja data limite de pagamento voluntário ocorreu em 03/03/2015 – (cfr. certidão de dívida de fls. 18 e 19 do documento do SITAF n.º 004472090)
5) Em 12/03/2015, o Oponente, em nome da sociedade referida em 1 do probatório, requereu ao Serviço de Finanças 1..., o pagamento em 24 prestações de 3 processos de execução fiscal – (cfr. documento de fls. 12 do documento do SITAF n.º 004472096).
6) Em 26/03/2015, o Oponente, em nome da sociedade referida em 1 do probatório, requereu ao Serviço de Finanças 2..., a passagem de “certidão de não dívida” – (cfr. documento de fls. 13 do documento do SITAF n.º 004472096).
7) Pela AP..../20150406 – Av. ..., foi registado na Conservatória do Registo Comercial ..., a cessação de funções do Oponente como gerente da sociedade referida em 1 do probatório – (cfr. certidão permanente constante do documento n.º 004472107 do SITAF e documento 1 junto com a contestação).
8) Em 10/04/2015, foi emitida pelo Serviço de Finanças 1..., a certidão de dívida n.º ...61, que originou a instauração do processo de execução fiscal n.º ...97, em que é executada a sociedade referida em 1 do probatório, relativa a dívida de retenções na fonte de IRS do mês de fevereiro de 2015, no montante de € 7.859,00, cuja data limite de pagamento voluntário ocorreu em 20/03/2015 – (cfr. certidão de dívida de fls. 20 e 21 do documento do SITAF n.º 004472090).
9) Em 19/05/2015, foi emitida pelo Serviço de Finanças 1..., a certidão de dívida n.º ...86, que originou a instauração do processo de execução fiscal n.º ...68, em que é executada a sociedade referida em 1 do probatório, relativa a dívida de juros de mora da liquidação de IVA do período de 2014-12T, no montante de € 307,55, cuja data limite de pagamento voluntário ocorreu em 30/04/2015 – (cfr. certidão de dívida de fls. 22 e 23 do documento do SITAF n.º 004472090).
10) Em 19/11/2015, pelo Serviço de Finanças 1..., foi determinada a preparação da reversão dos processos de execução fiscal a que se aludem nos pontos 4, 8 e 9 do probatório, contra o aqui Oponente – (facto não controvertido; cfr. fls. 24 a 27 do documento do SITAF n.º 004472090).
11) Notificado para exercer o direito de audição prévia no âmbito da preparação da reversão da execução fiscal a que se alude no ponto anterior, o Oponente apresentou defesa por escrito na qual alegou, entre outros fundamentos, e para o que ora interessa, a ausência da gerência de facto da sociedade devedora originária - (cfr. fls. 1 a 5 do documento do SITAF n.º 004472096).
11) Sobre a defesa apresentada pelo Oponente, foi elaborada informação pelo Serviço de Finanças 1..., datada de 16/12/2015, sobre a qual recaiu o despacho do Chefe do Serviço de Finanças, da mesma data, cujo teor, para o que ora releva, consta do seguinte (cfr. fls. 6 a 8 do documento do SITAF n.º 004472096):
“(…)
Analisada a defesa exercida pelos responsáveis subsidiários «BB» e «AA», bem como a informação prestada a qual faz parte integrante do presente despacho, verifica-se o seguinte:
Relativamente à «BB», exerceu funções de gerência na sociedade „[SCom01...], Lda", desde 14.11.2011 até 01.01.2013. Como tal, respeitando os impostos a períodos posteriores à sua renúncia, não lhe poderão ser imputadas responsabilidades.
Quanto ao responsável subsidiário «AA», apesar de ter iniciado as funções de gerência na sociedade em 05.11.2011 e renunciado em 14.11.2011, certo é que em 02.01.2015, voltou a iniciar as funções de gerência na sociedade “[SCom01...], Lda”. Em 12.03.2015 e 27.03.2015, representou a sociedade, assinando requerimentos, nomeadamente pedido de pagamento em prestações e pedido de certidão de dividas em nome da devedora originária.
Os processos executivos em procedimento de reversão, foram instaurados por divida de IVA do 4° trimestre de 2014 e respetivos juros de mora liquidados, bem como por divida de Retenções na Fonte de Fevereiro de 2015, cujas datas limite de pagamento ocorreram em 2015-03-03; 2015- 04-30 e 2015- 03-20 respetivamente.
Por esse facto e por não ter trazido aos autos, elementos suscetíveis de interromper a reversão que contra si está a ser iniciada, deverá prosseguir a mesma. (…)
As dívidas em causa, como bem pode ser aferido na notificação remetida ao responsável subsidiário, respeitam a impostos e não a coimas. Em parte nenhuma da notificação se faz referência a coimas, pelo que não lhe assiste razão ao invocar que as dividas em causa também respeitam a coimas.
Ora, nos termos do disposto no art.° 153°, n.° 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), o chamamento á execução dos responsáveis subsidiários depende da inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores ou da fundada insuficiência do património do devedor para satisfação da divida exequenda a acrescido. No presente caso, verifica-se, sem margem para dúvidas uma clara inexistência de bens em nome da devedora originária, conforme se pode verificar dos ativos penhoráveis constantes das diversas aplicações Informáticas.
Nos termos do disposto no art.º 23°, n.° 1 da Lei Geral Tributária (LGT), a responsabilidade subsidiária efetiva-se por reversão do processo de execução fiscal.
Face ao exposto e considerando os elementos apresentados, que indiciam o exercício da gerência de facto e a responsabilidade pela divida por este gerente, reverto a execução, nos termos do disposto nos art.°s 23°, n.°s 1 e 2, e 24°, n.° 1, alínea b), ambos da LGT, contra «AA», com os fundamentos supra expressos e que se dão aqui como integralmente reproduzidos.
(…).”
12) Pelo ofício n.º ...74 de 16/12/2015, o Serviço de Finanças 1... remeteu ao Oponente, por via postal registada com aviso de receção, o documento com a designação de “Citação (Reversão)”, cujo teor, para o que ora interessa, consta do seguinte (cfr. fls. 9 a 11 do documento do SITAF n.º 004472096):
“(…)
[imagem no original]
(…)”
13) A petição de oposição foi remetida para o Serviço de Finanças 1..., por via postal registada, em 18/01/2016 – (cfr. fls. 4 do SITAF).
**
Factos não provados
Inexistem factos não provados com relevância para a decisão a proferir.

**
Motivação da decisão de facto
A matéria de facto dada como provada nos presentes autos foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida, e resultou da análise dos documentos constantes dos autos e da cópia do processo de execução fiscal, e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados, também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (cf. artigos 76.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária e 362.º e seguintes do Código Civil), conforme discriminado nos vários pontos do probatório.
Não resultam provados ou não provados quaisquer outros factos com interesse para a decisão.»
*
Densificação do ponto 7 e aditamento oficioso da matéria de facto [art. 662.º, n.º 1, do CPC].
7) Na certidão permanente da CRC da devedora originária consta o seguinte:
«Av AP.../20150406 11:21:00 UTC - CESSAÇÃO DE FUNÇÕES DE MEMBRO(S .1 ) DO(S) ORGÃO(S) SOCIAL(AIS)
GERÊNCIA:
Nome/Firma: «AA» NIF/NIPC: ...65
Causa: renúncia
Data: 2014-06-01
(…).
Insc AP..../20150406 11:21:00 UTC - ALTERAÇÕES AO CONTRATO DE .10 SOCIEDADE E DESIGNAÇÃO DE MEMBRO(S) DE ORGÃO(S) SOCIAL(AIS)
Artigo(s) alterado(s): 10°
ORGÃO(S) DESIGNADO(S):
GERÊNCIA:
Nome/Firma: «CC»
NIF/NIPC: ...67
(…).
Data da deliberação: 2015-02-10
(…).» [cfr. certidão permanente constante do documento n.º 004472107 do SITAF e documento 1 junto com a contestação].
*
IV –DE DIREITO:
A questão que cumpre conhecer prende-se com o indicado erro de julgamento em que supostamente incorreu o tribunal na apreciação da gerência de facto do oponente.


Gerência de facto?
A Recorrente investe contra a sentença por entender que o tribunal a quo errou nas ilações que retirou dos factos provados que permitem, na sua perspetiva, concluir pelo exercício da gerência por parte do oponente.
Vejamos o que a este respeito ficou plasmado na sentença:

«a) Da ilegitimidade (substantiva passiva) do Oponente
Alega o Oponente a sua ilegitimidade para a execução fiscal, porquanto a administração e gerência da executada originária sempre esteve a cargo de outra pessoa, nunca tendo exercido a gerência de facto, pelo que não lhe podem ser imputadas responsabilidades quanto ao giro comercial da sociedade e respetivas opções de gestão.
A Fazenda Pública defende posição contrária, referindo que o Oponente, para além de sócio da sociedade devedora originária, foi gerente de direito, porque nomeado ou designado para tal cargo, de 05/11/2011 até 14/11/2011 e novamente a partir de 02/01/2015, e como indícios demonstrativos de que exercia a gerência de facto, a circunstância de ter assinado em representação da sociedade devedora originária requerimentos de pedido de pagamento em prestações e a requerer certidão de dívidas, conforme resulta do despacho datado de 16/12/2015, e também pelo facto de ter auferido importâncias pecuniárias, consideradas como categoria A de IRS, pagas pela devedora originária nos períodos em questão, conforme resulta da consulta ao histórico da Declaração Anual – Anexo J/Modelo 10, pugnando pela improcedência do presente fundamento da oposição.
O Ministério Público pugna pela improcedência do fundamento da oposição.
Vejamos a quem assiste razão.
Nos termos do disposto no artigo 22.º, n.º 4 da LGT, “a responsabilidade tributária por dívidas de outrem é, salvo determinação em contrário, apenas subsidiária”, efetivando-se por reversão do processo de execução fiscal (cfr. artigo 23.º, n.º 1 da LGT).
O instituto da reversão é exclusivo da execução fiscal, traduzindo-se na modificação subjetiva da instância executiva por forma a que a execução fiscal passe, também, a correr contra alguém que, apesar de não ter sido demandado originariamente, tem legitimidade passiva, por via da responsabilidade subsidiária (cfr. artigo 23.º, n.º 1 da LGT e artigo 9.º, n.º 3 do CPPT).
A citação dos responsáveis subsidiários tem a única função de os chamar à execução, pressupondo que estes são já, antes dela, sujeitos passivos de uma obrigação suscetível de cobrança coerciva, pois tal como preconiza o n.º 3 do artigo 18.º da LGT, considera-se como sujeito passivo da relação tributária, quer o contribuinte direto, quer o responsável, designadamente, o terceiro responsável subsidiário.
Assim, com a citação do oponente, na qualidade de executado por reversão, estabelece-se uma alteração subjetiva da instância em virtude da ausência ou insuficiência de bens penhoráveis pertencentes à devedora originária, tornando-se parte legítima para a execução.
Relativamente à responsabilidade dos membros dos corpos sociais, estatui o n.º 1 do artigo 24.º da LGT que, “Os administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”
À luz destas disposições, e para que se verifique uma tal responsabilidade subsidiária, tem a doutrina e a jurisprudência entendido que não basta a existência de uma mera nomeação para qualquer um dos órgãos representativos da sociedade, antes sendo essencial o exercício efetivo desse cargo societário (neste sentido, por todos, vide o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 08/04/2010, proferido no processo n.º 00351/05.8BEBRG).
Para tanto, “[é] sobre quem pretende efetivar a responsabilidade subsidiária dos gerentes através da reversão da execução que recai o ónus de alegar e provar os factos integradores do efetivo exercício da gerência ou, dito de outra forma, da gerência de facto.” (cfr., por todos, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 18/11/2010, proferido no processo n.º 0286/07.0BEBRG).
Importa salientar que a chamada gerência de facto de uma sociedade comercial passa, nomeadamente, pelas relações com entidades públicas, com os fornecedores, com os clientes, com as instituições de crédito e com os trabalhadores, tudo em nome, no interesse e em representação dessa sociedade, sendo então indispensável que o gerente use, efetivamente, dos respetivos poderes, que seja um órgão atuante da sociedade, tomando as deliberações necessárias, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros (neste sentido, Rúben Anjos de Carvalho e Francisco Rodrigues Pardal, in “Código de Processo das Contribuições e Impostos, Anotado e Comentado”, 2ª Edição, Coimbra, 1969, pág. 139 – citado entre outros, nos Acórdãos do Tribunal Central Administrativo do Norte de 20/12/2011 e de 24/01/2017, processos 00639/04.BEVIS e 00646/07.6BEVIS, respetivamente).
Competindo então à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) o ónus de comprovar o efetivo exercício da gerência da executada originária por parte do Oponente, como pressuposto necessário à responsabilidade subsidiária, o Oponente não necessita de fazer prova do não exercício da gerência, pois não se verifica a inversão do ónus da prova, pelo que, deve contra a AT ser valorada a falta de prova sobre o efetivo exercício da administração/gerência (neste sentido, por todos, vide o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02/03/2011, processo n.º 0944/10).
Vale isto para dizer que a gerência/administração de facto não se presume, sem mais, da gerência/administração de direito, embora o exercício dos poderes de facto, se possa inferir do global conjunto da prova que venha a ser recolhida, mediante o recurso às regras da experiência, recaindo sobre a AT o ónus de demonstrar que o gerente/administrador de direito, contra quem pretende reverter a execução fiscal, exerceu, de facto, tais funções.
Pois bem, tendo isto bem presente cumpre, então, convocar a factualidade dada como provada.
Conforme decorre da factualidade assente (ponto 12 do probatório), no ato de citação em sede de reversão do aqui Oponente, são apresentados como fundamentos da reversão, a “Inexistência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários.”, e “Dos administradores, diretores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art. 24.º/n.º1/b) LGT].”
No despacho de reversão (ponto 11 do probatório), o órgão de execução fiscal fundamentou a gerência de facto do Oponente, nos seguintes termos: “Quanto ao responsável subsidiário «AA», apesar de ter iniciado as funções de gerência na sociedade em 05.11.2011 e renunciado em 14.11.2011, certo é que em 02.01.2015, voltou a iniciar as funções de gerência na sociedade “[SCom01...], Lda”. Em 12.03.2015 e 27.03.2015, representou a sociedade, assinando requerimentos, nomeadamente pedido de pagamento em prestações e pedido de certidão de dividas em nome da devedora originária.”
A Fazenda Pública, para além dos factos apurados pelo órgão de execução fiscal, veio acrescentar o facto de o Oponente ter auferido importâncias pecuniárias, consideradas como categoria A de IRS, pagas pela devedora originária nos períodos em questão, conforme resulta da consulta ao histórico da Declaração Anual – Anexo J/Modelo 10 (ponto 2 do probatório), o que indicia que o Oponente exerceu a gerência de facto da devedora originária.
Ora, analisando os elementos convocados pelo órgão de execução fiscal, temos para nós que inexiste qualquer elemento probatório que revele, objetivamente, que o Oponente praticou quaisquer atos de gestão ou teve qualquer intervenção na direção da executada originária, entendendo-se como tal a prática de atos com caráter de continuidade, efetividade, durabilidade, regularidade, com poder de decisão e com independência das funções exercidas.
Com efeito, relativamente à nomeação para a gerência da sociedade executada originária, dir-se-á, como é entendimento da mais consolidada jurisprudência, que “(…) da nomeação para gerente ou administrador (gerente de direito) de uma sociedade resulta [apenas] uma parte da presunção natural ou judicial, baseada na experiência comum, de que o mesmo exercerá as correspondentes funções, por ser co-natural que quem é nomeado para um cargo o exerça na realidade” (cfr. Acórdão do TCA do Sul de 20/09/2011, processo n.º 04404/10, e demais jurisprudência aí citada), impondo-se a recolha de mais elementos tendo em vista dar consistência, e assim tornar operativa, uma eventual conclusão quanto ao exercício da administração de facto, ainda que por apego às regras da experiência comum.
Relativamente ao facto de o Oponente ter assinado em representação da sociedade devedora originária requerimentos de pedido de pagamento em prestações e a requerer certidão de dívidas, tal não basta para dar como provado o exercício efetivo da gerência.
Com efeito, como acima dissemos, inexiste qualquer prova nos autos que demonstre a prática de quaisquer atos de gestão por parte do Oponente e vinculativos para a executada originária e em sua representação, mormente prova de que contratou ou despediu trabalhadores, negociou com clientes ou fornecedores, recebeu pagamentos em nome da executada originária, sendo certo que tais requerimentos apenas podiam ser subscritos por quem esteja nomeado como gerente no contrato de sociedade, não se podendo retirar daí a prática efetiva de atos de representação da sociedade.
Quanto às remunerações pagas ao Oponente pela executada originária, chama-se aqui à colação o teor do Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 8/03/2018, proferido no processo n.º00761/13.7BECBR, cuja posição aqui se adere sem reservas, onde se refere que “A remuneração como gerente é um elemento “perturbador” neste contexto. Se o sujeito é remunerado parece razoável supor que exerce as respetivas funções. Contudo, trata-se de um elemento meramente indiciador, que não reflete necessariamente qualquer atuação de facto - que carecia de ser demonstrada uma vez que o exercício da gerência não se presume. Não é (apenas) por receber remuneração como gerente que alguém exerce, de facto, as respetivas funções.
Embora seja um elemento fortemente indiciador da gerência efetiva, não constitui prova segura da sua existência, pois como também já foi decidido neste TCA, “...a circunstância de ter ficado demonstrado que o Oponente consta na segurança social como MOE, e que recebeu rendimentos de categoria A nessa qualidade [alínea AA] é, em abstrato, meramente indicador da sua nomeação como gerente e indiciador de, eventual, gerência efetiva.
Por outro lado, daquela circunstância, não poderia, também, extrapolar-se para a conclusão de uma gerência de facto. Na verdade, a inscrição e o respetivo recebimento de rendimentos como MOE, surgem, usualmente, na decorrência de uma nomeação do contribuinte como gerente, sendo que, como vem sendo entendido, não é suficiente, por si só, para sustentar por parte do órgão de execução fiscal o exercício efetivo de tais funções pelos gerentes nomeados. Isto porque, conforme nos ensinam as regras da experiência comum, a inscrição como MOE na segurança social aparece associada à necessidade dos contribuintes fazerem descontos com vista à obtenção dos benefícios respetivos no caso das eventualidades previstas na lei, irrelevando a qualidade em que o fazem.
Por outro lado, o recebimento de rendimentos da categoria A, nessa qualidade, será uma decorrência daquela inscrição. Pelo que não tem a virtualidade de comprovar positivamente a alegada gerência de facto para o período em causa.”
Destarte, inexistindo nos autos prova demonstrativa da prática de atos de gerência efetiva por parte do Oponente, prova essa que cabia ao órgão de execução fiscal, não se mostra preenchido um dos pressupostos para a efetivação da responsabilidade subsidiária do Oponente, o que determina a sua ilegitimidade para a presente execução fiscal, com a consequente procedência da oposição.»
Vejamos, pois se existem razões ponderosas que imponham decisão diversa da recorrida.
Não é controvertido que ao oponente é imputada a responsabilidade subsidiária por ser quem exercia a gerência no período legal de pagamento, nos termos do disposto na alínea b), do n.º 1, do art. 24.º, da LGT. Competindo à exequente a demonstração da factualidade respeitante a este exercício, enquanto constitutiva do direito de operar a reversão [art. 74.º, n.º 1 da LGT e 342.º, n.º 1, do Código Civil].
Também não é questionado que o prazo de pagamento das dívidas ocorreu a 03.03.2015, 20.03.2015 e 30.04.2015.
Daí que importe verificar se, por referência ao período que compreende àquelas datas, existe factualidade que permita, ainda que por apelo a presunção judicial, concluir pelo exercício da gerência de facto por parte do oponente, sendo nosso entendimento que não.
Alega a Recorrente:
· «A circunstância de ter recebido rendimentos da categoria A, conjugado com o facto de ter assinado os supraditos requerimentos, são indiciadores da prática de actos de gerência efectiva na sociedade devedora originária».
Análise:
O Recebimento rendimentos de categoria A, não obstante poder ser indiciador do exercício da gerência em conjugação com demais factualidade, no caso não permite essa ilação.
Na verdade, somente ficou provado que o oponente auferiu rendimentos de categoria A de IRS, respeitantes aos meses de agosto de 2014 a maio de 2015 [facto elencado em 2) da matéria de facto]. Sem que se saiba concretamente donde provinham esses rendimentos, dada a abrangência das situações elencadas no art. 2.º do CIRS [rendimentos de categoria A] para essa proveniência, designadamente de trabalho por conta de outrem [alínea a) do n.º 1] ou efetivamente de remunerações dos membros dos órgãos estatutários [alínea a) do n.º 3].
Para além do mais, os mencionados rendimentos foram auferidos em períodos em que nem sequer consta como gerente nomeado.
Daí que fique afastada, no caso objeto, a possibilidade dos rendimentos auferidos pelo oponente o comprometerem com o exercício da gerência

· «os factos indiciadores do exercício da gerência de facto por parte do Oponente, resultam da circunstância de o mesmo ter assinado, em 12/03/2015 e, em 26/03/2015, em representação da sociedade devedora originária, requerimento de pedido de pagamento em 24 prestações de três processos de execução fiscal e requerimento a requerer a passagem de “certidão de não dívida”, respectivamente, conforme resulta dos pontos 5) e 6) dos factos dados como provado.»
Análise:
Conforme resulta da fundamentação do despacho proferido pelo órgão de execução fiscal, a reversão foi operada por «[q]uanto ao responsável subsidiário «AA», apesar de ter iniciado as funções de gerência na sociedade em 05.11.2011 e renunciado em 14.11.2011, certo é que em 02.01.2015, voltou a iniciar as funções de gerência na sociedade “[SCom01...], Lda”. Em 12.03.2015 e 27.03.2015, representou a sociedade, assinando requerimentos, nomeadamente pedido de pagamento em prestações e pedido de certidão de dividas em nome da devedora originária.» [cfr. ponto 11), da matéria de facto].
Daqui resulta, desde logo, que a exequente tomou como seguro que o oponente, por que reiniciou as funções de gerente a 02.01.2015, à data de pagamento das dívidas era quem exercia a gerência da devedora originária. O que, também, fica demonstrado com a assinatura dos dois documentos que identifica.
A assinatura dos dois requerimentos assinados com diferença de 15 dias, isoladamente, não se mostra idónea para a demonstração da gerência de facto, mesmo que por apelo às regras da experiência comum.
Na verdade, a assinatura daqueles dois requerimentos num curto espaço temporal, apresentado na mesma entidade, não permite extrair a gerência de facto. Posto que, como de forma indefetível se refere na sentença «a chamada gerência de facto de uma sociedade comercial passa, nomeadamente, pelas relações com entidades públicas, com os fornecedores, com os clientes, com as instituições de crédito e com os trabalhadores, tudo em nome, no interesse e em representação dessa sociedade, sendo então indispensável que o gerente use, efetivamente, dos respetivos poderes, que seja um órgão atuante da sociedade, tomando as deliberações necessárias, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros (neste sentido, Rúben Anjos de Carvalho e Francisco Rodrigues Pardal, in “Código de Processo das Contribuições e Impostos, Anotado e Comentado”, 2ª Edição, Coimbra, 1969, pág. 139 – citado entre outros, nos Acórdãos do Tribunal Central Administrativo do Norte de 20/12/2011 e de 24/01/2017, processos 00639/04.BEVIS e 00646/07.6BEVIS, respetivamente)».
E como irrepreensivelmente afirma o Digno Procurador Geral Adjunto no seu parecer, antes mesmo de identificar de forma exemplificativa os mecanismos dos quais pode a ATA lançar mão para recolha de prova da gerência, «[e]xiste a necessidade de serem carreados para os autos prova de atos praticados que consubstanciem a gerência de facto, o efetivo exercício da gerência por parte do responsável subsidiário. Não bastando, a prática de um ou outro ato isolado para que se possa concluir pelo exercício efetivo da gerência de facto. Terá de existir uma continuidade (antes, durante e depois) dos factos tributários em crise, se for o caso».
Para além do mais, irradia a matéria de facto uma circunstância que faz sucumbir a segurança quanto à certeza do reinício da gerência nominal a 02.01.2015 e de que a mesma se mantinha no prazo de pagamento da quantia exequenda.
Na realidade, a 12.02.2015, pela Inscrição 9, foi registada na Conservatória do Registo Comercial ... a designação do Oponente como gerente da sociedade [cfr. ponto 3) da matéria de facto]. Porém, apesar de constar que a 06.05.2015 foi registada a cessação, a verdade é que a causa de cessação consta como tendo sido por renúncia a 01.06.2014 [cfr. ponto 7) reformulado].
Outrossim, extrai-se que a 06.04.2015 foi registada a nomeação como gerente de «CC», por deliberação de 10.02.2015 [ibidem].
Do acabado de expor resulta que na data de vencimento das dívidas [03.03.2015, 20.03.2015 e 40.04.2015], havia sido já nomeado um novo gerente [10.02.2015]. Por outro lado, resulta que a renúncia à gerência por parte do oponente ocorreu a 01.06.2014, ou seja, em data muito anterior à do pagamento da quantia exequenda. E a verdade é que nenhum destes factos, constantes da certidão da CRC, eram desconhecidos da ATA.
Em suma, dos factos apurados, tudo leva a crer que o oponente não era sequer gerente de direito da devedora originária à data de pagamento da quantia exequenda, encontrando-se a gerência atribuída a «CC». Sendo certo que a dúvida quanto aos factos constitutivos dos direitos invocados pela exequente terá que ser contra si valorada [art. 342.º, n.º 3, do Código Civil].
Donde, na situação vertente, nenhuma prova foi oferecida por parte da Autoridade Tributária tendente à demonstração e validação do pressuposto gerência de facto em que se funda a reversão.
Tanto basta, e sem mais, para que se possa concluir pela ilegitimidade do oponente, por não se ter demonstrado todos pressupostos (gerência de facto) de que depende a efetivação da responsabilidade subsidiária prevista no art.º 24.º, n.º 1, da L.G.T., fundamento da oposição, nos termos do disposto no artigo 204.º, n.º 1, alínea b) do CPPT, tal como bem decidiu o tribunal recorrido.
*
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e, nessa sequência, manter a sentença no ordenamento jurídico.
*
Nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC., formula-se o seguinte SUMÁRIO:
I – À luz do regime da responsabilidade subsidiária prevista no art.º 24.º, n.º 1, da LGT, em qualquer das suas duas alíneas, a possibilidade de reversão não se basta com a gerência de direito, exigindo-se o exercício de facto da gerência, incumbindo à AT a sua demonstração.
II - Nos termos do disposto na alínea b), do art.º 24.º, da LGT., a prova do exercício da gerência de facto, recai sobre a Exequente, sendo que a falta dessa demonstração, sempre terá de ser valorada contra esta.
*
V – DECISÃO:
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e, nessa sequência, manter a sentença no ordenamento jurídico.

Custas pela Recorrente.

Porto, 05 de junho de 2025


Vítor Salazar Unas
Ana Patrocínio
Cláudia Almeida