Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00293/08.5BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/30/2025
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:IRENE ISABEL GOMES DAS NEVES
Descritores:CONDENAÇÃO EM MULTA;
RECURSO AUTÔNOMO, IRS;
LIQUIDAÇÃO OFICIOSA; AUDIÇÃO PRÉVIA;
Sumário:
I. De acordo com o disposto nos artigos 644º, nº 2, e), e 638º, nº 2 do CPC, cabe apelação autónoma, a interpor no prazo de 15 dias, da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual.

II. O Regulamento das Custas Processuais (RCP), aprovado pelo DL nº 34/2008, de 26/02, dispõe no nº 6 do seu artº 27º: ‘da condenação em multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional fora dos casos legalmente admissíveis cabe sempre recurso, o qual, quando deduzido autonomamente, é apresentado nos 15 dias após a notificação do despacho que condenou a parte em multa, penalidade ou taxa’.

III. Esta norma não dá a quem é condenado ao seu abrigo a opção de recorrer autonomamente ou não, sendo que lhe confere a possibilidade de recorrer desde que observado o prazo de 15 dias a contar do conhecimento da mesma.

IV. Efectuada liquidação oficiosa ao contribuinte por falta de apresentação da respectiva declaração de rendimentos, o artigo 60.º da Lei Geral Tributária impõe que, neste caso, se faculte ao contribuinte o direito de audição prévia, dado que a sua intervenção no procedimento da liquidação oficiosa pode resultar numa alteração dos termos em que a matéria colectável foi determinada pela administração tributária.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. «AA», (Recorrente), notificado da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 16.12.2016, que julgando improcedente a impugnação, por si intentada, contra liquidação adicional de IRS do ano de 1998 e respetivos juros compensatórios, inconformado veio dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«(…)
A) O Pagamento da MULTA de 25,50 € é indevida já que o requerimento de interposição de recurso estava dentro do prazo legal - apresentado em 23/1/2017 -, atento a que a sentença fora levantada no dia 17 de Janeiro de 2017;
B) ERRO DE JULGAMENTO quanto à Ilegalidade do processamento automático da liquidação à margem do preceituado no artigo 78º do CIRS pois, ao contrário do sustentado pelo tribunal recorrido, face ao que determina o n.º 2 do Artº 74º da LGT o ónus de provar a existência de declaração anterior é da AT e jamais do contribuinte;
C) ERRO DE JULGAMENTO no que concerne à prévia e necessária notificação do necessário acto de fixação do rendimento tributável nos termos, aliás, dos artigos 66º e 67º do CIRS. Preterição de formalidade legal que jamais se poderá degenerar em "mera irregularidade" como considerou o tribunal a quo, suportada numa verdadeira falácia segundo o qual, em qualquer das três hipóteses equacionadas, o resultado seria o mesmo. E não é atenta a natureza dos rendimentos integrantes — categoria A e B do CIRS;
D) ERRO DE JULGAMENTO quanto à restituição do imposto retido e dos pagamentos por conta efectuados, restituição com carácter de oficiosidade tal como o prevê o artigo 89º (nº 1) do CIRS, válido tanto para aquele como para estes;
E) Restituição essa acrescido dos devidos juros compensatórios – nº 2 artigo 89º (nº 1) do CIRS e 100º da Lei geral tributária, desde a data da entrega do tributo nos cofres do Estado, como efeito repristinador da anulação.
NESTES TERMOS, NOS MELHORES DE DIREITO E COM O SEMPRE MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V. EXª; REQUER-SE A REVOGAÇÃO DA SENTENÇA SOB RECURSO E SUBSTITUÍDA POR ACORDAO QUE CONDENE A AT A DEVOLVER TODO O IMPOSTO PAGO PELO RECORRENTE, COM AS DEMAIS CONSEQUENCIAS LEGAIS
1.2. A Recorrida (Autoridade Tributária e Aduaneira), notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.
1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 127 e ss. do SITAF, em que pugna pela improcedência do recurso.
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, cumpre conhecer da questão previa da condenação em multa e, apreciar e decidir do erro de julgamento imputado.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 De facto
2.1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«Com base nos documentos juntos aos autos, no processo administrativo (PA) apenso, considera-se provada a seguinte matéria de facto, com relevância para o conhecimento da exceção:
1. Os agora Impugnantes, que são titulares de rendimentos das categorias A e B do IRS apresentaram a declaração de rendimentos (modelo n.º 2) referente ao exercício de 1997 mas não o fizeram relativamente ao exercício de 1998 - Acordo das partes e fls. 31 do PA;
2. Das declarações modelo 10 apresentadas pelas entidades pagadoras de rendimentos aos agora Impugnantes, relativas ao ano 1998, constavam os seguintes elementos:
3.
Categoria SP Rendimento € Retenção IRS € Fls. PA
A A- «AA» 28.602,14 5.024,65 4
B B- «BB» 7.116,55 711,66 8, 16
B Idem 2.438,72 243,88 9, 16
B Idem 2.485,74 0 16
-fls. 4, 8, 9 e 16 do PA;
4. Em 1998 a impugnante «BB» efetuou os seguintes pagamentos por conta do IRS:
Nº Guia pagamento Mod.41/43 Data pagamento Valor € Fls. PA
...32 20/7/1998 279.33 18
...97 20/10/1998 279,33 19
...82 18/12/1998 279,32 20
- fls.18 a 20 do PA;
5. Em 25/10/2002, com base nos elementos de que dispunha o Serviço de Finanças ... procedeu à elaboração de declaração oficiosa de IRS (Documento de Correção Único) para o ano 1998, tendo fixado rendimentos das categorias A e B no valor global de € 41.184,20, retenções na fonte de ambas as categorias no montante global de € 6.116,85 – fls. 81 a 87 do PA;
6. Em 21/11/2002 a AT emitiu a liquidação oficiosa de IRS referente ao ano de 1998, com o n.º ...99, pelo valor de € 4.207,19, cujo prazo limite para pagamento voluntário era de 17/01/2003 – fls. 11, 23 e 135 do PA;
7. Em 08/04/2003, os agora Impugnantes deduziram reclamação graciosa (n.º ....03/.....7.0) contra a liquidação oficiosa de IRS do ano de 1998, por não terem sido considerados a totalidade dos pagamentos por conta e retenções na fonte efetuados nesse ano e por considerar ter imposto a recuperar no montante de € 19.762,00 – fls. 1 a 11 do PA;
8. Em 25/08/2003, o Serviço de Finanças elaborou uma proposta de decisão para a reclamação graciosa acima indicada, com o seguinte teor:
“ (…) 2.3 – Análise
Dos elementos junto aos autos a fls. 2 a 23, incluindo os prints informáticos, constata-se o seguinte:
1- Relativamente ao ano fiscal de 1998, foi pela Administração fiscal elaborada declaração oficiosa de IRS, na qual consta relativamente ao sujeito passivo A («AA») o rendimento da categoria A de € 29 143,18 a retenção na fonte de € 5161,31 e os descontos para a segurança Social de € 3 201,88. Com referência ao sujeito passivo B («BB») consta o rendimento da categoria B de € 12 041.02 e a retenção na fonte de € 955,54.
2- Do tratamento informático da referida declaração oficiosa resultou o IRS a liquidação ...99, emitida em 2002-11-21, no valor a pagar de € 4 207,19.
3- Das declarações processadas pelas entidades pagadores de rendimentos, junto aos autos pelo sujeito passivo, verifica-se que:
O sujeito passivo A auferiu o rendimento da categoria A de € 28 602,14, foi-lhe retido o IRS de € 5024,64 e descontou para a Segurança Social € 3152,30, valores constantes da declaração supra citada.
Relativamente ao sujeito passivo B auferiu os rendimentos da categoria B a seguir indicados: Da Administração Regional de Saúde do Centro - € 198 772,07 e reteve o IRS de € 19 877,20.
Da ADSE - € 32 540,28 e reteve o IRS de € 3253,81.
Do Ministério da Justiça-Serviços Sociais - € 7 116,55 e reteve o IRS de € 711,66.
De SAMS - € 2 438,72 e reteve o IRS € 243,88.
Dos Serviços Sociais da Banco 1... - € 682,85 e reteve o IRS de € 136,57.
4- Na consulta do anexo J da declaração anual, do ano fiscal de 1998, consta os rendimentos da categoria B, em nome de «BB», a seguir indicados:
De [SCom01...], LDª - € 2485,74 e retido o IRS de € 0,00.
De SAMS - € 2438,72 e retido o IRS de € 243,88.
Do Ministério da Justiça- Serviços Sociais - € 7116,19 e retido o IRS de € 711,66.
5- Analisados todos os documentos junto aos autos constata-se que «BB» somente foi tributada pelos rendimentos constantes do anexo J da declaração anual, ou seja pelo valor de € 12 041.02, e foi-lhe deduzido o IRS retido relativamente a esses rendimentos (€ 955,54).
Constata-se ainda que relativamente à carregaria B a citada contribuinte deveria ter declarado o rendimento de € 244 036,21 e a retenção na fonte de € 24 223,12, assim como os pagamentos por conta no valor de € 837,98, o que originaria o IRS a pagar € 70 797,39 €, conforme simulação de liquidação a fls. 21 dos autos.
No entanto os rendimentos omitidos não podem ser tributados uma vez que já caducou o direito a liquidação.
6- A título informativo e para efeitos de fiscalização informa-se que em nome dos reclamantes não se encontra no sistema informático qualquer declaração de rendimentos a partir do ano de 1998, no entanto consultado o anexo J, verifica-se que para o ano de 1999, o sujeito passivo «BB» auferiu rendimentos da categoria B, constante do print. A fls. 22 dos autos. De salientar que do referido print não consta as duas entidades para as quais o sujeito passivo no ano de 1998 prestou maiores prestações de serviço, ou seja para a Administração Regional de Saúde do Centro e a ADSE.
3 – PROPOSTA
Pelo exposto e dado que as retenções na fonte assim como os pagamentos por conta que o sujeito passivo pretende que lhe sejam considerados correspondem a rendimentos omitidos, sou de opinião que a presente reclamação deve ser totalmente indeferida.
Dado que o valor do reembolso pretendido é superior a € 5 000, a presente reclamação deve ser envia à Divisão de Justiça Tributária da DF ... para informação e despacho.” – fls. 24 e 25 do PA;
9. Remetida a reclamação graciosa à Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças ..., foi-lhe atribuído o n.º de processo: 8.../03, tendo sido posteriormente enviada aos Serviços de Prevenção e Inspeção Tributária (doravante designado SIT) através da Nota Interna n.º 1.../2003 em 07-11-2003 – fls. 30 do PA;
10. Na sequência da reclamação graciosa apresentada pelos ora Impugnantes, foi ordenada a realização de um procedimento inspetivo externo (através da ordem de serviço n.º ....22, datada de 03/09/2003, tendo sido posteriormente autorizada por despacho do Chefe de Divisão emitido em 11/02/2004), de âmbito parcial (em sede de IRS) ao exercício de 1998 – fls. 128 do PA;
11. A dita ordem de serviço foi assinada em 14/04/2004 - fls. 128 do PA;
12. Em 16/05/2004, a AT efetuou uma Informação para a Reclamação Graciosa, constando a seguinte fundamentação com relevância para os Autos:
“II. ABORDAGEM DAS SITUAÇÕES DE FACTO E DE DIREITO
II.1. ELEMENTOS QUE ENVOLVEM A RECLAMAÇÃO GRACIOSA
II.1.1. Identificação da reclamação
Como já se referiu, a presente acção inspectiva teve origem na reclamação graciosa com o processo n.º ....03/.....7.0 apresentada pelo contribuinte contra a liquidação do IRS do ano de 1998, com o n.º ...99 de 2002-11-21, no valor a pagar de 4.207,19 €, cujo prazo limite para pagamento voluntário era de 2003-01-17.
Na origem daquele valor temos o montante de 3.338,21 € referente ao imposto liquidado e ao valor de 868,98 € correspondente a juros compensatórios.
II.1.2. Factos que deram origem à liquidação reclamada
Aquela liquidação para o ano de 1998 teve origem num processo de lançamento (fixação) oficioso, uma vez que o contribuinte, apesar de obrigado a fazê-lo através da apresentação de uma declaração nos termos do artigo 57.º do Código de IRS, não o fez até à data limite de 30 de Abril de 1999 como previa a alínea b) do n.º 1 do artigo 60.º do mesmo código, nem em qualquer momento posterior.
Com o conhecimento de factos tributários que deram origem a uma relação de imposto, instauraram o respectivo processo de lançamento. Este procedimento teve suporte legal no disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 65.º do Código de IRS (antes da renumeração do Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho era o artigo 66.º).
A liquidação foi processada nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 76.º do Código de IRS (antes era o artigo 78.º).
Os elementos que eram conhecidos pela Administração Tributária no momento da fixação, eram aqueles que as entidades pagadoras dos rendimentos ao sujeito passivo B tinham declarado através da declaração modelo 10 a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 119.º do Código de IRS (antes era o artigo 114.º), assim como aqueles que o Ministério das Finanças, através da Direcção Geral dos Impostos, tinha pago ao sujeito passivo A, que exercia funções na Direcção de Finanças ....
Os montantes que desta forma eram conhecidos pela Administração Fiscal, e que foram considerados na liquidação oficiosa reclamada são aqueles que de seguida se apresentam:
Sujeito Passivo Categoria de Rendimentos Entidade pagadora Rendimento Bruto Retenção Contribuições obrigatórias p/ regimes de protecção social
A A Ministério das Finanças – DGSI –
DFA
29.143,18 € 5.161,31 € 3.201,88 €
B B [SCom02...], Lda. 2.485,74 € 0,00 €
SAMS – Sindicato dos Bancários do Norte 2.438,72 € 243,88 €
Serviços Sociais do Ministério da Justiça 7.116,56 € 711,66 €
TOTAIS 41.184,20 € 6.116,85 € 3.201,88 €
II.1.3. Teor da matéria reclamada
Na reclamação foi alegado que na referida liquidação apenas foram consideradas retenções na fonte de 6.116,85 €, quando efectivamente a retenção de que foram alvo os rendimentos auferidos ascendeu a um total de 29.247,76 € (o montante de 5.025,64 € correspondente a rendimentos da categoria A e o valor de 24.222,12 € resultante dos pagamentos de rendimentos da categoria B).
Simultaneamente, alega que não lhe foram considerados os pagamentos por conta que efectuou para aquele ano de 837,98 €.
De seguida apresentam-se os rendimentos que o sujeito passivo identificou na reclamação graciosa e as retenções na fonte que foram efectuadas sobre essas importâncias:
Sujeito
Passivo
Categoria de Rendimentos Entidade pagadora Rendimento Bruto Retenção Contribuições obrigatória p/ regimes de protecção social
A A Ministério das Finanças –
DGCI – DFA
28.602,14 € 5.024,64 € 3.152,30 €
B B ARS do Centro 198.772,07 € 19.877,20 €
ADSE 32.540,28 € 3.253,81 €
Serviços Sociais do Ministério da Justiça 7.116,56 € 711,66 €
SAMS – Sindicato dos Bancários do Norte 2.438,72 € 243,88 €
Serviços Sociais da Banco 1... 682,85 € 136,57 €
TOTAIS 270.152,62 € 29.247,76 € 3.152,30 €
Adicionando àquele valor de 29.247,76 € referente a retenções, o montante de 837,98 € relativo aos pagamentos por conta efectuados pelo sujeito passivo em cumprimento do disposto no artigo 102.º do Código de IRS, temos a totalidade do valor do imposto que o sujeito reclama que lhe seja considerado na reclamação, que é assim de 30.085,74 €.
Como na liquidação foi considerado o montante de 6.116,85 €, reclama que lhe seja considerada a diferença que ascende a 23.968,89 €.
III.1.4. Breve apreciação de legalidade da reclamação apresentada
Com os referidos fundamentos, o sujeito passivo veio apresentar reclamação graciosa nos termos dos artigos 68.º e 99.º, ambos do CPPT, para que seja anulada totalmente a decisão anterior, isto é, o apuramento do imposto a pagar de 4.207,19 €, reclamando, por outro lado, a devolução de IRS no montante de 19.761,70 € [=23.968,89 € - 4.207,19 €]3.
Esta petição deu entrada no Serviço de Finanças ... em 2003-04-08, com o n.º 5.315, pelo que, se considera tempestiva, uma vez que ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 70.º e n.º 1 do artigo 102.º, ambos do CPPT, o sujeito passivo dispunha de 90 dias para a sua apresentação.
II.2. APRECIAÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTAÇÃO DAS MATÉRIAS QUE ESTIVERAM NA ORIGEM DA RECLAMAÇÃO GRACIOSA
II.2.1. Análise dos elementos disponíveis
Analisando os elementos disponíveis conclui-se que:
1. Os rendimentos considerados para efeitos de tributação no ano de 1998 em sede de categoria B (provenientes da actividade de médico analista do sujeito passivo B) correspondem àqueles que se encontram na base de dados destes Serviços, a qual é dotada da informação apresentada pelas entidades pagadoras através da declaração modelo 10 a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 119.º do Código de IRS (antes era o artigo 114.º). Como já apresentámos, daqui resultou a tributação dos rendimentos que ascenderam a 41.184,20 € sobre as quais tinham incidido retenções na fonte de 6.116,85 € também consideradas na liquidação oficiosa.
2. Por outro lado, conjugando os elementos conhecidos da Administração Tributária com aqueles que foram apresentados pelo contribuinte com a reclamação, apurámos que os rendimentos brutos auferidos pelo agregado familiar no ano de 1998 correspondem àqueles que de seguida se sistematizam, juntamente com as respectivas retenções e contribuições para regimes de protecção social:
Sujeito Passivo Categoria de Rendimentos Entidade pagadora Rendimento Bruto Retenção Contribuições obrigatórias p/ regimes de protecção social
A A Ministério das Finanças –
DGCI – DFA
28.602,14 € 5.024,64 € 3.152,30 €
B B ARS do Centro 198.772,07 € 19.877,20 €
ADSE 32.540,28 € 3.253,81 €
Serviços Sociais do Ministério da Justiça 7.116,56 € 711,66 €
SAMS – Sindicato dos Bancários do Norte 2.438,72 € 243,88 €
Serviços Sociais da Banco 1... 682,85 € 136,57 €
[SCom02...], Lda 2.485,74 € 0,00 €
TOTAIS 272.638,36 € 29.247,76 € 3.152,30 €
3. Por outro lado, com a análise aos recibos modelo n.º 6 (recibos “verdes”) que o sujeito passivo B utiliza no exercício da sua actividade, se constatou que, por um lado, algumas entidades que pagaram rendimentos ao sujeito passivo não procederam à entrega da declaração modelo 10, e por outro, o sujeito passivo não apresentou as declarações a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 119.º do Código de IRS (era o artigo 114º) na sua reclamação. Na verdade, concluiu-se que foram obtidos rendimentos que ainda não constam do mapa que acabámos de apresentar, pelo que iremos actualizar os dados nele inscritos, acrescentando os rendimentos obtidos apurados com base nos recibos emitidos. Assim:
Sujeito Passivo Categoria de Rendimentos Entidade pagadora Rendimento Bruto Retenção Contribuições obrigatórias p/ regimes de protecção social
A A Ministério das Finanças –
DGCI – DFA
28.602,14 € 5.024,64 € 3.152,30 €
B B ARS do Centro 198.772,07 € 19.877,20 €
ADSE 32.540,28 € 3.253,81 €
Serviços Sociais do Ministério da Justiça 7.116,56 € 711,66 €
SAMS – Sindicato dos Bancários do Norte 2.438,72 € 243,88 €
Serviços Sociais da Banco 1... 682,85 € 136,57 €
[SCom02...], Lda 2.485,74 € 0,00 €
Serv. Municipalizados –
Serv. Sociais da CM Feira
1.516,41 € 0,00 €
Associação trabalhadores dos Serv. Munic. Da CM... 171,96 € 0,00 €
[SCom03...], SA 119,44 € 0,00 €
Particulares 12.293,69 € 0,00 €
TOTAIS 286.739,86 € 29.247,76 € 3.152,30 €
4. Note-se que se apuraram algumas diferenças entre os valores que se encontram nos recibos e os que aqui apontamos. No entanto, pelo reduzido impacto que têm, e também porque o rigor dos rendimentos auferidos não é muito relevante nos propósitos desta acção, como veremos adiante, consideramos estes valores como aqueles que dão a visão mais aproximada dos rendimentos auferidos no ano de 1998.
5. Desta forma, concluímos que em consequência do procedimento do sujeito passivo (falta de entrega da declaração periódica a que se refere o artigo 57.º do Código de IRS), foram omitidos rendimentos brutos que ascendem a 245.555,66 €, sobre os quais incidiram retenções na fonte no montante de 23.130,91 €. Naturalmente, estes rendimentos não eram do conhecimento da Administração Tributária aquando da fixação dos rendimentos.
II.2.2. Análise do efeito do prazo de caducidade
Apesar de ser evidente o incumprimento por parte do contribuinte, que em resultado do seu comportamento não viu tributado grande parte dos rendimentos auferidos, nesta data, tal como já acontecia no momento em que foi apresentada a reclamação graciosa, o direito à liquidação já caducou. Em resultado, quando a Administração Tributária tomou conhecimento de novos factos tributários relacionados com o agregado familiar em análise deparou-se com a impossibilidade de proceder à correspondente liquidação, uma vez que estava decorrido o prazo de caducidade.
Na verdade, de acordo com o n.º 1 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária, “o direito de liquidar os tributos caduca se liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos”. Por outro lado, este prazo aplica-se aos factos ocorridos a partir de 1 de Janeiro de 1998, conforme o disposto no n.º 5 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro.
Temos assim, que relativamente aos rendimentos tributáveis em IRS referentes ao ano de 1998, cujos factos tributários se completaram em 31 de Dezembro, o prazo de caducidade do direito de liquidação se concluiu em 31 de Dezembro de 2002.
Nesta perspectiva, o prazo de caducidade, vale para qualquer liquidação de IRS, ainda que adicional, ou para sua eventual reforma.
Dado que, desta forma a Administração Tributária se vê inibida de proceder à reforma da anterior liquidação, entendemos que o contribuinte não pode exigir que lhe venham a ser considerados factos tributários que necessariamente deviam constar na liquidação e não constam.
Naturalmente que a Administração Tributária vê os seus direitos coarctados com o decurso prazo de caducidade, mas também o contribuinte perde direito a deduções que dependem dessa liquidação.
II.2.3. Apreciação da natureza das retenções na fonte e pagamentos por conta
Note-se que as retenções consideradas na liquidação correspondem apenas aos rendimentos que estiveram na origem da própria liquidação.
Por outro lado, as retenções reclamadas pelo sujeito passivo incidiram sobre rendimentos que não constam da liquidação.
O n.º 3 do artigo 97.º do Código do IRS (antes era o artigo 90.º) esclarece que as importâncias efectivamente retidas na fonte nos termos dos artigos 98.º a 101.º (antes eram os artigos 91.º a 94.º), assim como pagas por conta, efectuados nos termos do artigo 102.º (antes era o artigo 95.º), são deduzidas ao valor do imposto respeitante ao ano em que ocorreu a retenção ou o pagamento, sem prejuízo da aplicação das regras do reporte de rendimentos. Isto significa que as importâncias retidas ou pagas por conta deverão ser deduzidas ao valor do imposto do ano a que os rendimentos forem imputados.
Pode assim concluir-se que as retenções na fonte e os pagamentos por conta que devem considerar-se no apuramento do imposto a pagar são indissociáveis dos rendimentos que lhe deram origem.
Como veremos, este facto tem maior fundamento a propósito das retenções na fonte. Na verdade, qualquer solução que permitisse a afectação de retenções na fonte à liquidação desacompanhados dos correspondentes rendimentos geraria a grave distorção de permitir deduções à colecta sem qualquer fundamento tributário.
Note-se que as retenções na fonte não estão dissociadas do rendimento. Na verdade, apenas se encontram sujeitos a retenção na fonte pela entidade devedora os rendimentos tipificados na lei aquando do respectivo pagamento. Portanto, não havendo rendimento pago (sujeito a tributação em sede de IRS) não há retenção a deduzir.
O artigo 34.º da Lei Geral Tributária define retenções na fonte como “as entregas pecuniárias efectuadas nos rendimentos pagos ou postos à disposição do titular do substituto tributário”.
A retenção na fonte não liberatória consiste numa antecipação do pagamento do imposto, mediante subtracção ao rendimento, a título de imposto, de certo montante, efectuada pela entidade pagadora do rendimento no momento em que este é posto à disposição do sujeito passivo.
Uma vez que no momento da retenção a dívida de imposto não é certa nem líquida, as importâncias retidas na fonte têm a natureza de deduções à colecta apurada a final, daqui podendo resultar imposto a recuperar, mas também a sua insuficiência para extinguir o pagamento da dívida resultante da liquidação.
Atendendo ao teor do artigo 95.º que em 1998 regulava os pagamentos por conta, temos que, apesar de constituírem uma antecipação do cumprimento do pagamento do imposto que, tal como as retenções na fonte, têm a natureza de dedução à colecta, a sua determinação é efectuada com base na colecta do penúltimo ano.
Temos então que, apesar de alguns limites, basta que num ano haja colecta para que no 2.º seguinte subsista a obrigação de efectuar o pagamento por conta, mesmo que neste ano não haja rendimentos tributáveis.
Temos aqui destacada uma diferença conceptual dos pagamentos por conta relativamente às retenções na fonte. Na verdade, estas apenas se verificam se forem obtidos rendimentos tributáveis, correspondendo a uma percentagem pré-estabelecida dessas importâncias.
Note-se que não é pelo facto de não se admitir a dedução à colecta das retenções na fonte de rendimentos não declarados (mesmo que oficiosamente) que estamos a falar de dupla tributação, ou qualquer outra penalização do contribuinte. Na verdade, apenas falamos de imposto que não teria à partida uma natureza liberatória, mas que por força da sua não consideração no apuramento do IRS passa a constituir um pagamento definitivo que incidiu sobre o rendimento que lhe deu origem.
Esta não seria a natureza das retenções na fonte se tivesse sido apresentada na declaração periódica de rendimentos pelo contribuinte como obriga o Código de IRS ou se ainda não tivesse decorrido o período de caducidade.
Por outro lado, tendo presente que apenas os rendimentos declarados constituem facto tributável e apenas são consideráveis no apuramento do imposto as deduções que com eles estão relacionados, se as retenções na fonte dos rendimentos não declarados fossem deduzidas à colecta como pretende o contribuinte, estaríamos perante uma situação de efeito contrário à dupla tributação, estaríamos perante uma situação de “tributação negativa” dos factos realmente ocorridos. Este conceito não tem cabimento no Código do IRS.
Neste mesmo sentido regula o Ofício-Circulado n.º 6/94, de 18 de Fevereiro da Direcção de Serviços de IRS que trata da “duplicação à colecta”, considerando integradas neste conceito as situações em que, por não ter sido deduzido ao imposto liquidado o imposto total ou parcialmente pago por antecipação, onde se incluem as retenções na fonte, mas apenas aquelas que tenham incidido sobre os rendimentos declarados.
Portanto, havendo rendimentos que não constam da liquidação não são dedutíveis à colecta as retenções a que foram sujeitos.
II.2.4. Outros factos que afectam a decisão
Note-se que não é pelo facto de a Administração Tributária dever ter conhecimento dos rendimentos pagos aos reclamantes, que se vê obrigada a considerar na liquidação oficiosa o montante do IRS retido na fonte. Na verdade, o artigo 65.º do Código do IRS (era o artigo 66.º) diz que o rendimento colectável de IRS pode ser apurado com base noutros elementos de que a Direcção-Geral dos Impostos disponha. No mesmo sentido, o artigo 76.º do mesmo código (antes era o 78.º) diz na alínea c) do n.º 1 que não havendo declaração, ainda que entregue fora do prazo legal, “a liquidação terá por base os elementos de que os serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos (DGCI) disponham”.
Daqui resulta, que o suporte para a liquidação primária oficiosa definitiva são os elementos que a DGCI conheça e não aqueles que deveria conhecer. Na verdade, não é pelo facto de as entidades pagadoras de rendimentos não cumprirem com a obrigação prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 119.º do Código de IRS (antes era o 114.º) que dá direito ao contribuinte de procurar a devolução das retenções na fonte que incidiram sobre rendimentos que não constam da liquidação, e que já não podem constar, pelo facto de já ter decorrido o prazo de caducidade.
Não nos parece legítimo que o sujeito passivo adopte uma atitude de incumprimento declarativo, onde por direito poderia deduzir à colecta as retenções na fonte que legalmente lhe foram efectuadas, mas simultaneamente veria tributados os respectivos rendimentos, para que, depois de confrontado com uma liquidação legalmente processada, venha reclamar o direito a retenções na fonte depois de ultrapassado o período de caducidade, isto é, quando sabe que não é possível rever a liquidação em função dos rendimentos obtidos, e por consequência, das retenções de que foram alvo.
A declaração periódica de rendimentos é o meio por excelência para que a Administração Tributária disponha dos dados relevantes para, no final deste procedimento, efectuar a liquidação, ou seja, o apuramento do imposto devido. Prevalece assim o primado da declaração, qualquer outro método é subsidiário deste, ficando condicionado aos elementos disponíveis e nunca à verdade declarativa ou os factos reais.
Note-se que a não entrega da declaração periódica de rendimentos constitui uma violação do dever de colaboração do sujeito passivo, a qual é punível como contra-ordenação nos termos do artigo 116.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, antes estava previsto no artigo 31.º do Regime Jurídico das Infracções Tributárias não Aduaneiras.
II.3. PROPOSTA DE DECISÃO
Tendo por base os elementos já apresentados parece-nos que o sujeito passivo não tem direito à dedução à colecta das retenções na fonte no montante de 23.968,91 €, que apesar de reconhecidamente lhe terem sido efectuadas, não foram consideradas na liquidação uma vez que também não lhe foram imputados os rendimentos que lhes deram origem.
Já quanto aos pagamentos por conta, por serem efectuados por conta do imposto devido a final, sendo este resultante dos rendimentos da categoria B abstractamente obtidos, somos favoráveis a que o montante pago com esta natureza de 837,98 € ao longo do ano de 1998 seja considerado no apuramento do imposto a pagar no exercício.” – fls. 27 a 41 do PA;
13. Por despacho de 22/02/2005, foi aprovado o projeto de decisão da Reclamação Graciosa, contendo a seguinte fundamentação, com relevância para a discussão nos Autos:
“2.2 Análise
Não tendo os reclamantes entregue a declaração de rendimentos de IRS referente ao ano de 1998, os Serviços emitiram em 21 de Novembro de 2002, uma liquidação oficiosa donde resultou o montante a pagar de 4.207,19€. Esta liquidação encontra-se na situação “certidão relaxe” (fl. 23 dos autos). Em 8 de Abril de 2003, vêm os sujeitos passivos reclamar daquela liquidação alegando que a mesma não considerou:
- qualquer montante a título de pagamentos por conta, quando efectivamente foram efectuados pagamentos no montante total de 168.000$ (837,98€);
- a totalidade das retenções na fonte.
Assim, a matéria de facto constante da reclamação, foi objecto de análise pelos Serviços de Inspecção Tributária que elaboram a Informação constante dos autos, a folhas 27 a 41, tendo-se pronunciado pelo deferimento parcial da mesma, ou seja:
- Relativamente às retenções na fonte, consideram que os reclamantes “não têm direito à dedução à colecta das retenções na fonte no montante de 23.968,91€ que apesar de reconhecidamente lhe terem sido efectuadas, não foram consideradas na liquidação uma vez que também não lhe foram imputados os rendimentos que lhes deram origem”;
- Quanto aos pagamentos por conta, “por serem efectuados por conta do imposto devido a final, sendo este resultante dos rendimentos da categoria B abstractamente obtidos” aceitam que “o montante pago com esta natureza de 837,98 € ao longo do ano 1998 seja considerado no apuramento do imposto a pagar no exercício”.
Deste modo, damos por inteiramente reproduzida a Informação de Reclamação elaborada pelos Serviços de Inspecção, com o qual concordamos, pelo que, para regularização da situação será preenchida declaração modelo 3 oficiosa com o respectivo anexo B, por forma a serem considerados os pagamentos por conta, efectuados no âmbito da actividade geradora de rendimentos da categoria B.” – fls. 42 a 44 do PA;
14. Por ofício n.º 200268, datado de 24/02/2005, foi comunicado aos agora Impugnantes o projeto de decisão da reclamação graciosa, dando-lhes a possibilidade de, querendo, exercer o direito de audição prévia sobre o mesmo – fls. 60 a 61 do PA;
15. Em 14/3/2005 os agora impugnantes exerceram o direito de audição prévia requerendo a final “a reanálise da liquidação do IRS do ano de 1998 com vista a uma decisão no sentido defendido na respectiva reclamação” - fls. 63 a 70 do PA;
16. Em 2/5/2005, o Diretor de Finanças ... deferiu parcialmente a reclamação graciosa com base em informação técnica com o seguinte teor:
“1. Audição Prévia
Em cumprimento do disposto na alínea b) do nº1 do artigo 60º da Lei Geral Tributária, foi o contribuinte notificado para, querendo, se pronunciar sobre o teor do projecto de decisão a fls 42 a 59 dos autos.
No prazo fixado para o efeito apresentou o direito de audição que agora se junta aos autos a fls. 62 a 70, sem que do mesmo constem quaisquer novos elementos relevantes para a apreciação da reclamação. Importa apenas referir que embora o reclamante tenha razão quanto ao facto de, quer as retenções na fonte quer os pagamentos por conta, constituírem técnicas de aproximação da data da percepção dos rendimentos à do pagamento do respectivo imposto, na sua essência são diferentes, pois o seu modo de apuramento também é diferente.
As retenções na fonte são calculadas por aplicação de uma taxa de rendimentos concretos e conhecidos, existindo uma relação de causalidade entre ambos, ou seja, só há retenção porque existem rendimentos. Não é possível reter imposto sobre rendimentos inexistentes, logo são indissociáveis.
Os pagamentos por conta são efectuados “por conta” do imposto devido a final, não estando associados a um determinado rendimento específico, ou seja, podem existir pagamentos por conta e não existirem rendimentos. O simples facto de existirem rendimentos da categoria B, a que estão associados pagamentos por conta, permite que estes lhe sejam imputados, independentemente de terem sido considerados todos os rendimentos enquadráveis naquela categoria, uma vez que os mesmos não estão associados a um rendimento específico, mas genericamente, a todos os rendimentos da categoria B.
Vem o reclamante apresentar um exemplo de modo a comprovar que as retenções são indissociáveis do rendimento. Aponta o caso de um contribuinte com a contabilidade organizada, em que os “Serviços Prestados” são contabilizados independentemente do seu recebimento, podendo verificar-se uma situação em que existem retenções mas os rendimentos são nulos.
Não são os rendimentos que são nulos, são os proveitos, porque já foram declarados no exercício anterior. As retenções continuaram associadas a um rendimento específico, pois só foram efectuadas na data do pagamento deste, através da aplicação da respectiva taxa ao mesmo. Em todo o caso, só haveria direito à retenção se ficasse comprovado que os correspondentes proveitos associados àqueles rendimentos também tivessem sido declarados.
No caso em apreço, não foram declarados os rendimentos (neste caso não se pode falar de proveitos porque não se trata de um contribuinte com contabilidade organizada) associados ao montante das retenções na fonte pretendidas pelo reclamante, pelo que sendo indissociáveis, não poderão ser consideradas retenções sem os correspondentes rendimentos e vice-versa.
2. Proposta de Decisão
Em face do exposto, somos de parecer que será de decidir de harmonia com a proposta acima referida, já notificada ao sujeito passivo, no sentido do deferimento parcial do pedido.” – fls. 71 e 73 do PA;
17. Por ofício n.º 200650, datado de 04/05/2005, e enviado sob registo postal cujo aviso de receção foi assinado em 05/05/2005, foram os agora Impugnantes notificados do deferimento parcial da reclamação graciosa – fls. 74 a 76 do PA;
18. Em 13/05/2005, os agora Impugnantes apresentaram Recurso Hierárquico (n.º 02/2005) do indeferimento da reclamação graciosa, alegando, sumariamente: “A falta de notificação para o exercício do direito de audição; A legalidade da própria liquidação; Por último, a não dedução das retenções na fonte efectuadas, no imposto devido a final” – fls. 100 a 101 do PA;
19. Na sequência do deferimento parcial da reclamação graciosa, em 20/05/2005, a AT reformou a liquidação oficiosa de IRS de 1998, passando o imposto apurado a ter o valor de € 2.500,22, cujos juros compensatórios acrescem a € 610,87, que, após compensação por estorno do valor anterior (€ 4.207,19), permaneceu em dívida o montante de € 1.096,10 – fls. 134 a 136 do PA;
20. No âmbito do recurso hierárquico, em 15/11/2005 a Divisão de Justiça Tributária elaborou a seguinte informação:
“(…) 2. Informação
Em suma, o Recorrente vem alegar a falta da notificação para o exercício do direito de audição, referindo que relativamente ao ano de 1998, não apresentara a respectiva declaração de IRS, tendo a DGI procedido à respectiva liquidação do imposto. E assim, do Sair recebeu a N. Liquidação nº ...99 com data de liquidação de 2002/11/21, com o valor do imposto a pagar – IRS – de € 8.207,19. Tal operação de liquidação não fora antecedida do “Direito de Audição” previsto no artigo 60º da Lei Geral Tributária.
Por outro lado, a dita liquidação fora efectuada ao abrigo da alínea c) do artigo 87.º do CIRS, quando se imponha que o fosse ao abrigo da alínea b) do preceito legal citado já que, relativamente ao ano anterior apresentara declaração de IRS e pagara o correlativo imposto.
Ora, o que se constata, é que o contribuinte vem no presente Recurso Hierárquico com novo pedido, pois as alegações agora apresentadas, em nada se relacionam com as da reclamação graciosa ao tempo apresentada e com os motivos que levaram ao indeferimento da mesma, pelo que concluímos que o mesmo se apresenta intempestivo.
Relativamente à não consideração do valor das retenções na fonte efectuadas por diversas entidades pagadoras de rendimentos, esta matéria já foi sobejamente analisada em fase de Reclamação Graciosa, e considerando que os fundamentos do presente Recurso Hierárquico em nada alteram o sentido da decisão proferida, somos de parecer que não há razões para revogar o acto recorrido, devendo os autos serem remetidos superiormente.” – fls. 104 e 105 do PA;
21. Através do ofício n.º ...747, datado de 22/11/2005, foi remetido pela Divisão de Justiça Tributária – Contencioso à Direção de Serviços do IRS, o Recurso Hierárquico apresentado pelos Impugnantes e a respetiva informação e parecer da Direção de Finanças - fls. 106 do PA;
22. Por despacho de 21/9/2007 A Diretora de Serviços da Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis aprovou o projeto de decisão do Recurso Hierárquico, onde, além do mais, consta a seguinte fundamentação:
APRECIAÇÃO:
1. O presente recurso hierárquico é legal e tempestivo (art. 80º da LGT e art. 66º do CPPT) e o recorrente tem legitimidade para o efeito (art. 65º da LGT e art. 9º do CPPT).
2. O recurso hierárquico tem por objecto o despacho de indeferimento da reclamação graciosa, cujo âmbito é definido na respectiva petição, só podendo abranger todas as questões aí contidas.
3. Assim, as questões relativas à falta de notificação da liquidação e à alegada ilegalidade da liquidação por ter sido realizada de acordo com a al. c) do art. 78º do CIRS, são, como bem se notou na informação prestada pela DF ..., matéria que não foi alegada na p.i. de reclamação graciosa, não fazendo, por isso, parte do objecto dos presentes autos, razão pela qual não será alvo de apreciação em sede de recurso hierárquico.
4. No que tange às alegações objecto de tratamento em sede de Reclamação Graciosa cumpre apreciar a legalidade da não consideração da quantia de € 23.968,91 referente às retenções efectuadas sobre os rendimentos da categoria B auferidos pelo sujeito passivo B.
5. Conforme supra exposto (vide supra, ponto 2 da exposição dos factos), a AT efectuou a liquidação nos termos da al. c) do art. 78º do CIRS, de acordo com os elementos ao seu dispor, porque os sujeitos passivos não cumpriram a obrigação que sobre eles impendia de declarar, dentro do prazo estabelecido no art. 60º, nº 1 al. b) do CIRS, os rendimentos auferidos e as retenções efectuadas.
6. Só em sede de reclamação graciosa, apresentada em 08/04/2003, a AT ficou a conhecer (através das declarações emitidas pelas entidades pagadoras nos termos da al. b) do nº 1 do art. 119º do CIRS, e juntas pelos reclamantes à sua petição, bem como pelas cópias de recibos modelo 6) os rendimentos efectivamente auferidos pelo agregado no ano em causa, que ascendem a € 286.739,86, ficando, portanto, muito além dos apurados pela AT com recurso aos elementos então ao seu dispor.
7. Em consequência do comportamento omissivo dos contribuintes verifica-se que não foi contemplada na liquidação efectuada a quantia de € 245.555,56 resultante de rendimentos obtidos pelo agregado em 1998, e sobre os quais incidiram retenções na fonte no valor de € 23.968,91.
8. Ora, na data em que tais factos vieram ao conhecimento da AT esta deparou-se com a impossibilidade de proceder à respectiva liquidação na medida em que se encontrava já decorrido o prazo de caducidade – art. 45º da LGT. Ou seja, a liquidação do imposto referente ao ano de 1998 terminou em 31/12/2002, sendo certo que este prazo é aplicável aos factos tributários ocorridos a partir de 01 de Janeiro de 1998, nos termos do art. 5º do Decreto-Lei nº 398/98.
9. Acresce que a caducidade é estabelecida com o fim de tornar certa, consolidar e esclarecer a relação jurídica tributária (art. 18º, nºs 1 e 3 da LGT) e, no caso do IRS (imposto periódico), o prazo conta-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (art. 45º, nº 4), valendo para qualquer liquidação de IRS, ainda que adicional, ou para sua eventual reforma, não podendo ser considerada como uma garantia para o contribuinte apenas nela, e nos efeitos dela decorrentes, tenha interesse. Esta figura jurídica, bem como as consequências dela resultantes para a relação jurídicatributária, vale como limitadora quer dos direitos da AT, impedindo-a de liquidar o imposto decorrido que seja certo lapso temporal, quer dos contribuintes que, naturalmente, perderão o direito a deduções que dependam dessa liquidação.
10. Por isso, as retenções tidas em conta na liquidação alvo de reclamação correspondem apenas aos rendimentos que nela são considerados, sendo inaceitável, pela própria ratio da figura “retenção na fonte” (que tem a ver com a agilização da cobrança do imposto, consubstanciando entregas pecuniárias efectuadas nos rendimentos pagos ou postos à disposição do titular pelo substituto tributário – art. 34º da LGT), que se considerem as quantias retidas por rendimentos auferidos que não são considerados na liquidação efectuada.
11. Uma vez que a retenção na fonte consiste numa antecipação do pagamento do imposto, mediante subtracção de uma parcela de um determinado rendimento no momento em que ele é posto à disposição do sujeito passivo, nessa altura, a dívida de imposto não se encontra ainda certa nem líquida, razão pela qual a retenção não tem, à partida, carácter liberatório, já que, efectuada a liquidação a posteriori, pode verificar-se a insuficiência das retenções efectuadas para extinguir a dívida de imposto ou, ao contrário, verificar-se que resulta imposto a recuperar.
12. Assim, parece não ser controverso o facto de as retenções na fonte serem indissociáveis dos rendimentos que lhes deram origem, sendo deduzidas ao valor do imposto respeitante ao ano em que ocorreu a retenção, desde que tais rendimentos se encontrem declarados (cfr. art. 97º, nº 3 do CIRS, anteriormente, art. 90º). De outro modo, se as retenções na fonte de rendimentos não declarados fossem deduzidas à colecta, como pede o contribuinte, veria este premiado o seu comportamento faltoso, razão pela qual, uma vez que não podem já ser considerados os rendimentos não declarados, por se verificar o decurso do prazo de caducidade, também não serão de considerar as correspondentes retenções.
13. Concluindo, andou bem a Administração Tributária ao deferir parcialmente a reclamação graciosa apresentada pelos contribuintes, actuando de acordo com as disposições legais aplicáveis ao caso quando considerou que os sujeitos passivos não têm direito à dedução à colecta das retenções na fonte no montante de € 23.968,91.
Pelo exposto, sou de parecer que deverá ser indeferido o requerimento do recurso hierárquico apresentado.” – fls. 108 a 113 do PA;
23. Através do ofício n.º 20613, datado de 27/09/2007, enviado sob registo postal a AT convidou os agora Impugnantes para o exercício do direito de audição prévia sobre o projeto de decisão do Recurso Hierárquico, tendo a carta sido devolvida ao remetente com a indicação “Não atendeu, Avisado, Não reclamado” – fls. 114 a 121 e 123 do PA;
24. Em 19/10/2007, a Diretora dos Serviços de IRS converteu em definitivo o projeto de despacho de indeferimento do recurso hierárquico com fundamento na informação onde consta, além do mais, que “nos termos do disposto nos artigos 254º e 255º do CPC sobre as formalidades das notificações às partes (com e sem mandatário constituído), a notificação não deixa de produzir os seus efeitos pelo facto de expediente vir devolvido (nº 4 do art. 254º do CPC) – fls. 122 e 123 do PA;
25. Por ofício nº 202138, datado de 23/11/2007, enviado sob registo postal cujo aviso de receção foi assinado em 28/11/2007, a AT notificou os Impugnantes da decisão de improcedência do Recurso Hierárquico - fls. 125 a 127 do PA;
26. Em 08/02/2008, os Impugnantes apresentaram a petição inicial da presente Impugnação Judicial no Serviço de Finanças ... 1 – fls. 3 e ss do processo físico;
*
Matéria de facto dada como não provada:
Com relevância para a boa decisão da questão consideram-se não provados os seguintes factos:
1. Os Impugnantes foram notificados para, ao abrigo do n.º 3 do art.º 66.º do CIRS, apresentar a declaração de rendimentos de 1998 considerada em falta – facto implícito na liquidação impugnada;
2. A AT notificou os agora Impugnante para o exercício de audição prévia à liquidação impugnada – facto implícito na posição da AT;
*
MOTIVAÇÃO DE FACTO
No essencial a convicção do tribunal quanto aos factos assentes teve por base o confronto das posições das partes e a análise global dos documentos juntos no processo administrativo que se dão como integralmente reproduzidos, conforme se indica em cada um dos pontos de 3.1 supra.
Em consequência da falta de entrega da declaração anual de rendimentos dos agora Impugnantes, relativa ao ano 1998, a AT procedeu à fixação do conjunto dos seus rendimentos e subsequentemente à emissão da liquidação oficiosa n.º ...99, apurando o valor a pagar de € 4.207,19 (factos 1 a 5 de 3.1 supra).
Não concordando com a liquidação que lhes foi emitida oficiosamente, os Impugnantes apresentaram reclamação graciosa alegando, em suma, que na liquidação em causa só haviam sido consideradas retenções na fonte no valor de € 6.116,85 quando deveria ter sido considerado o montante global de € 30.085,74, isto é, € 29.247,76 de retenções na fonte e € 838,00 de pagamentos por conta efetuados nesse ano (facto 6 de 3.1 supra).
Na sequência da reclamação graciosa apresentada, foram os ora Impugnantes submetidos a uma ação inspetiva ao ano de 1998, tendo a AT concluído que existiu uma omissão de rendimentos de pelo menos € 245.555,66, sobre os quais incidiram retenções na fonte no valor de € 23.130,91 (diferença reclamada pelos Impugnantes) (factos 9 e 11 de 3.1 supra).
Apesar do conhecimento destes factos, a AT considerou-se impossibilitada de proceder à reforma da anterior liquidação, uma vez que estava já decorrido o prazo de caducidade do direito de liquidação previsto no art.º 45.º da LGT, e por isso, defende que os Impugnantes também “não têm direito à dedução à colecta das retenções na fonte no montante de 23.968,91€, que apesar de reconhecidamente lhe terem sido efectuadas, não foram consideradas na liquidação uma vez que também não lhe foram imputados os rendimentos que lhes deram origem” . Quanto aos pagamentos por conta, “por serem efectuados por conta do imposto devido a final, sendo este resultante dos rendimentos da categoria B abstractamente obtidos” aceitam que “o montante pago com esta natureza de 837,98 € ao longo do ano 1998 seja considerado no apuramento do imposto a pagar no exercício”. (facto 12 de 3.1 supra).
Ou seja, embora a AT reconheça que as retenções na fonte e os pagamentos por conta foram efetivamente efetuados, defende que aquelas são indissociáveis dos rendimentos que lhe deram origem e por isso se caducou o direito de liquidar imposto devido por esses rendimentos também cessa o direito à consideração das retenções na fonte efetuadas sobre esse rendimento.
Não obstante, a AT decidiu considerar os valores relativos aos pagamentos por conta uma vez que defende que “basta que num ano haja colecta para que no 2.º seguinte subsista a obrigação de efectuar o pagamento por conta, mesmo que neste ano não haja rendimentos tributáveis.”.
No fundo, a questão em discussão nos Autos é essencialmente a de saber se os Impugnantes têm direito à dedução dos valores retidos na fonte ao longo do ano de 1998 na parte em que incidiram sobre rendimentos não declarados nem levados em conta na liquidação oficiosa.
Dão-se como não provados os factos descritos em 1 e 2 d e3.2 supra porque não consta dos autos qualquer elemento de prova que leve a crer que tais atos tenham sido efetivamente praticados. Além disso, a posição assumida pelas partes quanto a esses factos, particularmente a da Fazenda Pública, que não contesta nem junta qualquer elemento relativa à prática de tais atos, reforça a convicção de que a AT não notificou os sujeitos passivos para apresentarem voluntariamente a declaração de rendimentos considerada em falta em falta nem para exercerem o direito de audição durante o procedimento interno de inspeção ou em outro momento anterior à liquidação.»
2.2. De direito
In casu, o Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Aveiro datada de 28.12.2016 que julgou improcedente a Impugnação judicial que apresentou contra a liquidação adicional de IRS do ano de 1998 e respetivos juros compensatórios, no valor global de € 4.207,19, invocando para o efeito a ilegalidade do processamento automático da liquidação ao abrigo do art.º 78.º do CIRS, da preterição de formalidades ilegais, da falta de notificação para o exercício do direito de audição antes da emissão da liquidação, do excesso de quantificação da liquidação oficiosa por não terem sido consideradas as retenções na fonte e os pagamentos por conta efectuados, e por último do enriquecimento sem causa do Estado Português por não possuir título bastante para reter o valor das “retenções na fonte” efectuadas.
A este Tribunal ad quem, exige-se a reapreciação das questões que o Recorrente reconduziu as suas alegações, balizadas pelas respectivas conclusões, cientes de que são esta últimas, conclusões, que definem o objecto e delimitam o âmbito do recurso, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontram nos autos os elementos necessários à sua consideração (artigos 608, n.º 2, 639.º e 640, todos do CPC, ex vi art.º 2.º al. e) do CPPT)..
E, a este respeito o Recorrente cingiu-se a formulação de cinco conclusões, as quais exigem da parte deste Tribunal ad quem pronúncia, na exacta medida em que as mesmas coloquem em questão o julgamento operado em 1ª instância.
2.2.1. Do pagamento indevido de multa [conclusão A]
A título de questão suscita o Recorrente que impõe-se corrigir a data de recepção da sentença, pois que a mesma foi levantada nos CTT ... em 17 de janeiro de 2017, e como tal a multa paga por entrega do requerimento de interposição de recurso no 2º dia do prazo, é indevida, se bem que a final, não requeira em concreto que a mesma seja dada sem efeitos e/ou retire qualquer outra consequência do por si afirmado.
Vejamos, o que se nos oferece dizer, sobre esta intitulada questão prévia enxertada no recurso da sentença da decisão final proferida nos autos.
In casu, apesar do Recorrente não especificar, o despacho datado de 02.03.2017 do seguinte teor:
«Em face do que vem informado é indiscutível que é devida multa prevista no artigo 139º, nº5, al. b), do CPC.
O ato foi praticado fora de prazo em processo que não importa a constituição de advogado.
Ora “os requerimentos de interposição de recurso não têm de ser subscritos por advogado, se se tratar de processo em que não é obrigatória a sua constituição na 1ª instância” – Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. I, 6ª edição 2011, comentário 3 ao artigo 6º, pág. 86. Pelo que, ao caso, é de aplicar o disposto no artigo 139º, nº7, do CPC.
Assim, notifique o Impugnante/Recorrente para pagar a multa devida, prevista no artigo 139º, nº5, al. b), do CPC, nos termos do nº 7 do mesmo artigo.»
Na sequência do mesmo, foi o Recorrente notificado para pagamento de multa – artigo 139º, n.º 7 do CPC, paga a mesma, foi o recurso admitido a 22.03.2017 (vide fls. 97 do SITAF) e, pelo Recorrente apresentadas as respectivas alegações em 04.05.2017 (vide fls. 101 e ss. do SITAF).
De acordo com o disposto nos artigos 644º, nº 2, e) e 638º, nº 2, do CPC, cabe apelação autónoma, a interpor no prazo de 15 dias, da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual.
O Regulamento das Custas Processuais (RCP), aprovado pelo DL n.º 34/2008, de 26/02, dispõe no nº 6 do seu artigo 27º: “Da condenação em multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional fora dos casos legalmente admissíveis cabe sempre recurso, o qual, quando deduzido autonomamente, é apresentado nos 15 dias após a notificação do despacho que condenou a parte em multa, penalidade ou taxa.”.
O alcance que se julga ser de atribuir à norma é salvo o devido respeito por outro entendimento, o seguinte:
Em princípio, se a aplicação da multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional é proferida no âmbito de despacho ou de sentença, que, per se, independentemente dessa condenação, é desfavorável ao assim condenado e é recorrível - atentos os restantes pressupostos gerais de recurso, v.g., os do valor da causa e da sucumbência - situação esta em que, sendo efectivamente interposto recurso dessa decisão, a impugnação da referida condenação integra-se no regime do recurso desse despacho ou sentença, não sendo, nessa ocasião, impugnável autonomamente e podendo, por isso, beneficiar de um prazo de recurso mais longo do que o previsto no nº 6 do seu artigo 27º (é o caso, v.g., de a aplicação da multa ou taxa sancionatória excepcional ter lugar em sentença ou despacho que se moldem à previsão do nº 1 do artigo 644º do CPC).
Em sintonia, ao menos em parte, com o ora exposto, embora referindo-se especificamente à alínea e) do nº 2 do citado artigo 644º, diz Abrantes Geraldes [in Recursos No Novo Código de Processo Civil, Almedina, Julho de 2013, pág. 158, nota 226]: “Se a multa for aplicada em decisão que ponha termo ao processo, deixa de fazer sentido a invocação do regime previsto no nº 2, al. e), atenta a prevalência do que se dispõe no nº 1”.
Pode suceder, no entanto, que a condenação em multa ou em taxa sancionatória excepcional seja proferida em despacho avulso, ou que, não obstante ter sido proferida em despacho em que foram decididas outras questões de modo desfavorável ao condenado, este, no que respeita à decisão dessas questões não possa interpor apelação autónoma - ou que não possa mesmo interpor recurso (por estar consagrada a sua irrecorribilidade, ou por faltarem requisitos de recorribilidade, v. g., os relativos ao valor da causa ou à sucumbência), sendo nestas situações, em que a impugnação tem de se restringir à condenação em multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional, que o respectivo recurso é autónomo e que, por isso, deve se interposto no prazo de 15 dias, de acordo com o nº 6 do citado artigo 27º e em consonância com o que preceitua a alínea e) do nº 2 do artigo 644º do CPC. [neste sentido vide acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 07.04.2016, in processo 9/11.9BTCS-D.C1].
Ora, o caso que nos ocupa, recai precisamente neste ultimo circunstancialismo mencionado, aplicação da multa discorre de despacho avulso proferido após a decisão que conheceu do mérito da acção, o que por si atesta a necessidade de interpor recurso autónomo da mesma, o que sucedeu, é que o Recorrente notificado daquele despacho tendo o prazo de 15 dias para recorrer (cfr. artigos 27º, nº 6, do RCP e 638º, nº 3, do CPC), não recorreu autonomamente, e quando, em 04.05.2017, apresentas as alegações do recurso da sentença, nelas inclui à cabeça a impugnação de tal decisão de lhe ser exigida a multa de apresentação no 2º dia após o decurso do prazo para a prática do acto, já esse prazo de 15 dias havia decorrido há muito, sendo, por isso, o recurso, no que a essa matéria respeita, extemporâneo, o que obsta de todo ao seu conhecimento.
2.2.2. Do erro de julgamento
Afastado que se mostra o conhecimento da denominada questão prévia, em face dos termos em que foram enunciadas as restantes quatros conclusões de recurso pelo Recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença, a qual julgou totalmente improcedente a impugnação, padece de erro de julgamento, por ter considerado que, tendo havido lugar a declaração oficiosa e subsequente liquidação oficiosa do IRS de 1998 na sequência de omissão de entrega de declaração por parte dos contribuintes, a mesma não se mostra ferida das ilegalidades que lhe eram imputadas no processamento automático, de preterição de formalidades legais, do excesso de quantificação da liquidação oficiosa e, bem assim, do enriquecimento sem causa.
Vejamos.
A tese do Recorrente assenta nos seguintes vectores:
(i) Quanto à Ilegalidade do processamento automático da liquidação à margem do preceituado no artigo 78º do CIRS pois, ao contrário do sustentado pelo tribunal recorrido, face ao que determina o n.º 2 do Artigo 74º da LGT o ónus de provar a existência de declaração anterior é da AT e jamais do contribuinte;
(ii) No que concerne à prévia e necessária notificação do necessário acto de fixação do rendimento tributável nos termos, aliás, dos artigos 66º e 67º do CIRS. Preterição de formalidade legal que jamais se poderá degenerar em "mera irregularidade" como considerou o tribunal a quo, suportada numa verdadeira falácia segundo o qual, em qualquer das três hipóteses equacionadas, o resultado seria o mesmo. E não é atenta a natureza dos rendimentos integrantes — categoria A e B do CIRS;
(iii) quanto à restituição do imposto retido e dos pagamentos por conta efectuados, restituição com carácter de oficiosidade tal como o prevê o artigo 89º (nº 1) do CIRS, válido tanto para aquele como para estes.
O Ministério Público aprova o ponto de vista da sentença em termos que, desde já se antecipa, não merecem a nossa inteira concordância, como veremos no que respeita a preterição de formalidade legal, mormente violação do princípio da participação, consagrado no então artigo 60º da LGT.
Atentemos ao quanto se expende em sede do seu discurso fundamentador na sentença recorrida, quanto a:
«I – Ilegalidade do processamento automático da liquidação
Os Impugnantes começam por defender que “A liquidação em causa fora processada automaticamente nos termos da alínea c) do artigo 78º do CIRS quando podia (e devia) sê-lo com base na alínea anterior (…) ” (5º p.i.).
O art.º 78.º do CIRS sob epigrafe “Procedimentos e formas de liquidação” dispunha que “1- A liquidação do IRS processar-se-á nos termos seguintes:
a) Tendo sido apresentada a declaração até 30 dias após o termo do prazo legal, a liquidação terá por objecto o rendimento colectável determinado com base nos elementos declarados, sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 66.º;
b) Pela totalidade do rendimento colectável do ano mais próximo que se encontra determinado e em cujo apuramento tenham sido considerados rendimentos das categorias B, C ou D, se, não tendo sido ainda declarada a respectiva cessação de actividade, a declaração a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 60.º não tiver sido apresentada dentro do prazo legal, salvo se for possível efectuar liquidação com base em declaração entretanto apresentada;
c) Nos restantes casos, a liquidação terá por base os elementos de que os serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos disponham, devendo, sempre que possível, tomar-se em consideração os elementos constantes das declarações, ainda que entregues fora do prazo legal.” [sublinhado nosso].
Na alínea a) incluem-se as situações em que exista declaração de rendimentos. De facto, nesses casos a liquidação deve ser feita em prazo curto, de cerca de 30 dias após o termo do prazo legal para a entrega da respetiva liquidação (artigo79º e 60, nº1, do CIRS).
As alíneas b) e c) do nº1 do artigo 68º abrangem as situações em que não haja declaração e distinguem-se do seguinte modo: na alínea b) cabem os casos em que no ano mais próximo cujo rendimento coletável se encontre determinado tenham sido incluídos rendimentos das categorias B, C ou D e não haja ainda sido declarada a cessação dessas atividades; e, por exclusão, na alínea c) incluem-se apenas “os restantes casos”, isto é, casos em que não existindo declaração para esse ano, não exista qualquer declaração anterior ou exista declaração de ano anterior mas o respetivo rendimento coletável não inclui rendimentos das categorias B, C ou D, ou incluindo tais rendimentos já tenha sido apresentada a respetiva declaração de cessação de atividade
No caso dos autos, a AT processou a liquidação ora impugnada com base na alínea c) do art.º 78.º do CIRS, esclarecendo inclusive que “Os elementos que eram conhecidos pela Administração Tributária no momento da fixação, eram aqueles que as entidades pagadoras dos rendimentos ao sujeito passivo B tinham declarado através da declaração modelo 10 a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 119.º do Código de IRS (antes era o artigo 114.º), assim como aqueles que o Ministério das Finanças, através da Direcção Geral dos Impostos, tinha pago ao sujeito passivo A, que exercia funções na Direcção de Finanças ....” (facto 11 de 3.1 supra).
Nos termos do artigo 74º, nº1, da LGT, já aplicável ao caso dos autos, o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos das partes compete àquela que os invoque.
Os agora Impugnantes invocam a ilegalidade da liquidação por errada aplicação da lei, pelo que lhe cabe provar os pressupostos em que alegadamente assenta tal ilegalidade.
Ou seja, cabia aos impugnantes provar que havia declaração de ano anterior contendo matéria coletável já apurada proveniente de rendimentos das categorias B, C ou D do CIRS.
No caso, os Impugnante invocam e dá-se como provado que foi apresentada a declaração de rendimentos do ano 1997 (ano mais próximo anterior ao ano em causa) e que a AT sabia que o rendimento coletável incluía rendimentos da categoria B.
Ora, no artigo 5 da p.i., os Impugnantes alegam que “o contribuinte apresentara declaração de rendimentos das Categorias A e B do CIRS relativamente ao ano de 1997”, mas não indicam a data dessa apresentação nem alegam que o respetivo rendimento coletável já se encontrava “determinado”. A “Determinação da matéria coletável” é o conjunto de operações a que aludem os artigos 21º a 70º do CIRS. O “Rendimento coletável” é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferidas em cada ano, depois de feitas as deduções e os abatimentos previstos no capítulo II do CIRS (artigo 21º do CIRS), nomeadamente, as deduções do artigo 26º e os abatimentos do artigo 55º do CIRS.
Pode dizer-se que, a liquidação do IRS é precedido das seguintes fases: a) declaração espontânea ou oficiosa; b) parte-se do apuramento/quantificação do rendimento ilíquido de cada categoria; c) determinação/quantificação das deduções específicas de cada categoria; d) Cálculo do rendimento líquido de cada categoria (Rendimento bruto de cada categoria – Deduções especificas); e) apura-se rendimento líquido total (soma dos rendimentos líquidos de cada categoria); f) abatimentos; g) calcula-se rendimento coletável (Rendimento liquido total – abatimentos), h) determinação da taxa aplicável; i) cálculo da coleta (rendimento coletável x taxa); j) Deduções à coleta; k) Imposto (coleta – deduções à coleta); l) retenções na fonte e/ou pagamento por conta; m) imposto a pagar ou reembolso.
Portanto, uma coisa é a “declaração”, a cargo dos sujeitos passivos, e outra é a “determinação do rendimento coletável”, a cargo da AT.
Conforme provado no facto 1 de 3.1 supra, os Impugnantes não apresentaram qualquer declaração de rendimentos modelo n.º 2, referente ao exercício de 1998, ficando dessa forma imediatamente excluída a aplicação da al. a) (quando declaração é apresentada até 30 dias após termo do prazo legal). Todavia, os Impugnantes apresentaram a declaração de rendimentos referente ao exercício de 1997 (ano mais próximo em que se incluíram rendimentos das categorias B, C ou D), mas desconhece-se se o respetivo rendimento coletável já se encontrava determinado (caso em que deveria ter sido aplicada a al. b), do art.º 78.º do CIRS) ou não (caso em que deveria ter sido aplicada, como foi, a al. c) do mesmo artigo).
No caso, o incumprimento do ónus de alegação (que não pode ser suprido oficiosamente pelo Tribunal) e prova dos factos resolve-se contra a parte que os invoca.
Pelo que não se reconhece, com tal fundamento, o vício anulatório do ato impugnado.»
Cumpre, atento o afirmado na conclusão B) das alegações de recurso, interromper a transcrição em curso. Ali se afirma que o Tribunal a quo que face ao que determina o n.º 2 do artigo 74º da LGT o ónus de provar a existência de declaração anterior é da AT e jamais do contribuinte, sustentando em sede de alegações que os dados estavam na posse da AT, por se tratar de informações oficiais pelo que o eventual ónus a cargo do sujeito passivo se deve considerar como satisfeito.
Com devido respeito, cremos que a posição do Recorrente não contende com o julgado, pois que é a própria lei que fala de rendimento colectável do ano anterior e em momento algum, nem em sede de recurso, o Recorrente alude ao mesmo para lograr aplicação da alínea b) do n.º 1 do artigo 78º do CIRS (na versão aplicável) em detrimento da recondução da situação ao disposto na alínea c) do citado n.º 1.
Não se olvidando, que é precisamente à luz da faculdade consagrada na alínea c) do n.º 1 do artigo 78º do CIRS “(...) a liquidação terá por base os elementos de que os serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos disponham, devendo, sempre que possível, tomar-se em consideração os elementos constantes das declarações, ainda que entregues fora do prazo legal.”.
Falece o argumento apresentado pela Recorrente.
Cumpre retomar o discurso fundamentador da sentença sob recurso, no que tange à II – Preterição de formalidades legais”. E, quanto a estes, duas situações de preterição são aprofundadas na sentença sob recurso, uma decorrente da falta de notificação para apresentação da declaração em falta e, uma outra, que lhe sucede, da falta de notificação para o exercício do direito de audição prévia à liquidação, e quanto a ambas foi considerado que as mesmas se verificavam, estarmos perante formalidades essenciais, e até aqui o ali vertido é pacifico, mas também, quanto a ambas foi considerada a sua degradação em não essencial e declinada a sua força anulatória.
Repristinemos o expendido sobre as mesmas.
«Os Impugnantes alegam também que a liquidação aqui em discussão “não fora procedida do “Direito de Audição Prévia” e, da notificação para entrega da declaração como preceituava o nº 3 do artigo 66º do CIRS” (3º p.i.).
Pelo que cumpre analisar se os Impugnantes foram, ou não, notificados para apresentar a declaração em falta, e se à data dos factos era, exigível a notificação para o exercício do direito de audição antes da liquidação e, em caso afirmativo, se esse direito se concretizou ou não.
Quanto à notificação para apresentação da declaração em falta, dispunha a al. b), do n.º 2, do art.º 66.º, do CIRS que “A Direcção-Geral dos Impostos procederá à fixação do conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a tributação quando: Não tenha sido apresentada a declaração prevista no artigo 57.º, quando o deva ser”, acrescentando o n.º 3 do mesmo artigo que “No caso previstos na alínea b) do número anterior, o sujeito passivo será previamente notificado para, no prazo de 15 dias, apresentar a declaração em falta, sem prejuízo das sanções aplicáveis.” (sublinhado nosso).
Dos elementos constantes nos Autos não consta que a AT tenha realizado qualquer notificação aos Impugnantes para que apresentassem a declaração de rendimentos do exercício de 1998 (facto 1 de 3.2 supra), pelo que só pode proceder o fundamento sob análise.
A omissão de formalidade prevista na lei constitui vício de procedimento designado “preterição de formalidade legal”. Por tal formalidade, omitida, estar prevista na lei, diz-se “essencial”.
Em regra, a preterição de formalidades legais essenciais conduz à anulabilidade do ato tributário se outra sanção não estiver expressamente prevista na lei (artº 135º e 133º CPA91).
No caso, a falta de notificação a que se vem aludindo determina a anulação do ato sob impugnação, salvo se, ainda assim, o ato puder ser aproveitado por degradação da anulabilidade em mera irregularidade.
(...)
Relativamente à alegada falta de notificação para o exercício do direito de audição prévia à liquidação, cumpre esclarecer que à data do facto tributário (1998), vigorava o CPT (e seu artigo 19º) tal como vigorava o Código do Procedimento Administrativo (CPA91), e seu artigo 100º.
Além disso, na altura da liquidação, em 2002, já vigorava a LGT.
O direito de participação dos cidadãos na formação das decisões que lhes digam respeito encontra-se previsto no artigo 267º, nº 5, da CRP (quanto às contraordenações, artigo 32º, nº 10, da CRP) e, na lei ordinária, nomeadamente nos artigos 100º do CPA91, 60º da LGT, 45º do CPPT e 60º do RCPIT.
Sobre tal direito, o douto acórdão do STA de 10/11/2011, proferido no processo n.º 0671/10, disponível em www.dgsi.pt, explica que “O artigo 100.º do CPA é uma concretização desse direito de participação, estabelecendo que, concluída a instrução, e salvo o disposto no artigo 103.º, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.
Como se afirma no acórdão deste STA de 11/1/2006, proferido no recurso n.º 584/05, «No entanto, a C.R.P. não exige que o direito de participação que assegura seja concretizado precisamente através de uma comunicação prévia do sentido provável da decisão final, sendo a fórmula constitucional compatível com outras formas de participação dos particulares nos procedimentos administrativos, desde que possibilitem a estes influenciar o sentido da decisão final.
O C.P.T. enunciou, na alínea c) do art. 19.º, o direito de audição como uma das garantias dos contribuintes, ao lado dos direitos de reclamação, impugnação e oposição.
Na concretização destes direitos, efectuada no art. 23.º, faz-se referência ao direito de audição apenas relativamente ao processo contra-ordenacional – alínea e) – concretizando-se a forma do exercício desse direito através de uma notificação para exercício do direito de defesa (arts. 199.º e 200.º do C.P.T.).
No entanto, esta referência expressa ao direito de audição para estes processos e não também para os procedimentos de liquidação dos tributos não significa que o C.P.T. e as leis tributárias não assegurassem, através de outras vias, o direito de participação dos cidadãos na formação das decisões.
Na verdade, nos casos em que o processo de liquidação se inicia com base nas declarações dos contribuintes, o que é regra (art. 76.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.T.), essa participação é assegurada imediatamente, não havendo necessidade de qualquer outra intervenção daqueles no procedimento, se a liquidação se vier a efectuar com base nos dados que constam dessas declarações.
Por outro lado, nos casos em que a administração tributária faz alterações ao teor das declarações, são, na maior parte dos casos, asseguradas formas de participação dos cidadãos no procedimento tributário, através da notificação das correcções efectuadas, que conferem aos contribuintes a possibilidade de requererem a revisão ou impugnarem administrativamente tais actos, podendo manifestar aí as suas posições, antes de ser praticado o acto final do procedimento, que é o que concretiza a liquidação do tributo (arts. 84.º do C.P.T., art. 67.º do C.I.R.S. e arts. 53.º, 54.º e 112.º do C.I.R.C., entre outras normas) – neste sentido, pode ver-se o acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 29-11-2000, proferido no recurso n.º 25214).
Para além disso, o C.P.A., publicado após a entrada em vigor do C.P.T., estabelece, no seu art. 2.º, n.º 5, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 6/96, de 31 de Janeiro, que as suas normas que concretizam preceitos constitucionais são aplicáveis a toda e qualquer actuação da Administração Pública, entendimento este que já era defensável à face da redacção inicial – neste sentido, pode ver-se FREITAS DO AMARAL, JOÃO CAUPERS, JOÃO MARTINS CLARO, JOÃO RAPOSO, PEDRO SIZA VIEIRA e VASCO PEREIRA DA SILVA, em Código do Procedimento Administrativo Anotado, 1.ª edição, página 30).
Uma dessas normas que concretizam preceitos constitucionais, é o art. 100.º do C.P.A., pelo que ele terá passado a ser potencialmente aplicável no procedimento tributário.
No entanto, a jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal Administrativo, concretizada em vários arestos da Secção do Contencioso Administrativo, tem sido no sentido de que as suas normas só são aplicáveis quando não há normas procedimentais especiais sobre as matérias nele reguladas – neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Administrativo, relativos à prevalência das normas que asseguram o direito de audição do arguido em procedimento disciplinar sobre o regime previsto no C.P.A.:
– de 28-9-95, proferido no recurso n.º 33172, publicado em Apêndice ao Diário da República de 27-1-98, página 7069;
– de 1-4-98, proferido no recurso n.º 41646; – de 17-3-99, proferido no recurso n.º 41560;
– de 5-4-2000, proferido no recurso n.º 38210).
Assim, conclui-se que, após a entrada em vigor do C.P.A. e até à vigência da L.G.T. (que contém normas especiais sobre a matéria no seu art. 60.º), a participação dos interessados no procedimento tributário não podia deixar de ser assegurada, seja através de formas especiais, seja nos termos do C.P.A., sem prejuízo dos casos de dispensa ou inexistência deste direito previstos no seu art. 103.º e do próprio condicionalismo em que o art. 100.º prevê tal direito de audiência”.
No caso concreto, os agora Impugnantes não entregaram dentro do prazo legal (até final de Abril de 1999), a declaração de rendimentos referente ao exercício de 1998, (facto 1 de 3.1 supra), e por esse motivo a AT procedeu à fixação do conjunto de rendimentos.
Todavia, conforme resulta da matéria assente em 2 de 3.1 supra, os Impugnantes nunca foram notificados pela AT para exercer o direito de audição prévia antes da liquidação.
A al. c), do art.º 19.º do Código de Processo Tributário esclarecia que “São, designadamente, garantias dos contribuintes: Os direitos de reclamação, impugnação, audição e oposição”, por seu turno o n.º 1, do art.º 100.º do Código do Procedimento Administrativo acrescentava que “Concluída a instrução, e salvo o disposto no artigo 103.º, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.
Os artigos 60º do RCPIT e o artigo 60º da LGT também impunham, na altura do procedimento de liquidação (em sentido amplo), que esta (em sentido estrito) não poderia concretizar-se sem que previamente se concedesse aos sujeitos passivos o direito de participação/audição.
Sobre esta questão em concreto, harmonizava o n.º 1, do art.º 67.º do CIRS (na redação à data dos factos) que Os actos de fixação ou alteração previstos no artigo 66.º serão sempre notificados aos sujeitos passivos, com a respectiva fundamentação.” (sublinhado nosso).
Pelo exposto, verifica-se que tal formalidade não foi cumprida e, de acordo com o art.º 135.º do CPA91, a falta de audição prévia do contribuinte é suscetível de conduzir à anulação do ato.»
Do transcrito, a que aqui aderimos, nenhum reparo nos merece, salvo que a questão em apreço cumpre desde logo aplicar o artigo 60º, alínea a) da LGT, na sua versão originária, atenta a sua aplicação imediata e data da liquidação oficiosa de IRS, datada de 21.11.2002.
A questão, prende-se com o julgamento operado em que o Tribunal a quo disserta pela degradação das preterições em formalidades não essenciais assente de que nada daquilo que os Impugnantes trouxeram de novo em sede de reclamação graciosa era susceptível num juízo de prognose póstuma de alterar a liquidação oficiosa operada.
E, é precisamente neste julgado que não nos revemos.
Vejamos.
É certo que estamos perante um acto de liquidação oficiosa, em que, por um lado teria que ser praticado de acordo com as regras que o enformam, e, por outro, que inexiste qualquer garantia nem em sede de um juízo de prognose que permita afirmar com segurança que o conteúdo desse acto seria o mesmo caso tivesse havido lugar à audição prévia dos Impugnantes (e o que aqui se disser serve para qualquer uma das audições em falta, pois que as mesmas se sucedem no tempo sem que tenha havido uma qualquer intervenção dos sujeitos passivos). Pois nada garante que os contribuintes perante a notificação da falta de declaração respeitante a 1998 e, acaso lhe fosse dada oportunidade para o fazer nos termos da aclamada al. b), do n.º 2, do art.º 66.º, do CIRS, não fornecesse elementos úteis à liquidação, designadamente aqueles que viria a fornecer em sede de reclamação graciosa e permitiram AT indagar dos rendimentos efectivamente auferidos e alcançar na sua tese um valor de imposto a pagar da ordem dos € 60.000 [e, só não o fez por já ter operado a caducidade do direito à liquidação dos mesmos], mas para além desses também elementos quanto a deduções, matéria em que a lei não vincula a administração [vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18 de Junho de 2014, proferido no processo nº 1102/13].
Mais se diga, que o facto de os contribuintes terem a possibilidade de reclamar graciosamente e impugnar judicialmente as liquidações não torna não essencial o vício de violação do direito de audiência prévia. Com efeito, o direito que é consagrado no artigo 60º da LGT, com respaldo no artigo 267º, nº 5 da CRP, é um direito de participação na formação das decisões, e não um direito de impugnar, administrativa ou judicialmente, decisões já elaboradas. Trata-se assim de um direito cumulável com o direito de impugnação de actos lesivos, pelo que o facto de este existir não retira operância àquele vício procedimental.
Será que, atentas as circunstâncias particulares e concretas do caso, cumpre aplicar o princípio do aproveitamento do acto, tal como defendido pelo Tribunal a quo [sendo que AT não o avocou, pois não firmou posição nos autos].
Vejamos. Quando estão em causa vícios procedimentais geradores de mera anulabilidade, como é o caso da violação dos artigos 66º do CIRS e do 60º da LGT, admite-se, por força de segurança jurídica e, sobretudo de economia processual, o acto administrativo, apesar de inválido, não deve ser anulado quando, designadamente, o seu conteúdo “(...) não possa ser outro e não haja interesse relevante na anulação” ou “ quando se comprove sem margem para dúvidas que o vício formal não teve qualquer influência na decisão” (Cfr. Vieira de Andrade, in Lições de Direito Administrativo, 2ª ed., Coimbra, 2011, p.179).
Similarmente a jurisprudência assim o entende, veja-se por todos o acórdão do STA de 18.10.2017, proferido no âmbito do processo 095/16 onde se apregoa: ”A doutrina e a jurisprudência têm vindo a acolher o princípio do aproveitamento do acto – princípio que não tem suporte directo em disposição legal alguma, mas que assenta no entendimento de que não se justifica a anulação de um acto administrativo que foi praticado no exercício de poderes vinculados e está de acordo com os pressupostos fixados na lei –, nos termos do qual se admite que a falta de audiência dos interessados, quando obrigatória, possa não conduzir à anulação do acto final do procedimento, que seria a consequência desse vício, de acordo com o previsto no n.º 1 do art. 163.º do CPA («São anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou outras normas jurídicas aplicáveis, para cuja violação se não preveja outra sanção».). Essa omissão nem sempre conduzirá à anulação, «designadamente não a justificando nos casos em que se apure no processo contencioso que, se ela tivesse sido realizada, o interessado não teria possibilidade de apresentar elementos novos nem deixou de pronunciar-se sobre questões relevantes para determinar o conteúdo da decisão final, ou acabou por ter oportunidade de pronunciar-se, em procedimento de segundo grau (reclamação graciosa ou recurso hierárquico), sobre questões sobre as quais foi indevidamente omitida a audiência no procedimento de primeiro grau» (Cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 15 ao art. 60.º, págs. 516 e segs.).
«Com efeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem formado uma sólida orientação no sentido de que os vícios de forma não impõem, necessariamente, a anulação do acto a que respeitam, e que as formalidades procedimentais essenciais se podem degradar em não essenciais se, apesar delas, foi dada satisfação aos interesses que a lei tinha em vista ao prevê-las. Consequentemente, e tendo em conta que a audiência prévia dos interessados não é um mero rito procedimental, a formalidade em causa (essencial) só se podia degradar em não essencial (não invalidante da decisão) se essa audiência não tivesse a mínima probabilidade de influenciar a decisão tomada, e se se impusesse, por isso, o aproveitamento do acto – utile per inutile non viciatur. O que exige um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso» (Cfr. os seguintes acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - de 22 de janeiro de 2014, proferido no processo n.º 441/13, ... de 15 de outubro de 2014, proferido no processo n.º 1374/13, …).
«À luz de tal princípio [do aproveitamento do acto], deverá entender-se que não se justifica a anulação, apesar da preterição do direito de audição, nos casos em que se apure no processo contencioso que, se a audiência tivesse sido realizada, o interessado não teria possibilidade de apresentar elementos novos nem de se pronunciar sobre questões relevantes para determinar o conteúdo da decisão final sobre as quais não tivesse já tido oportunidade de se pronunciar. Mas, apenas nessas situações em que não se possam suscitar quaisquer dúvidas sobre a irrelevância do exercício do direito de audiência sobre o conteúdo decisório do acto pode ser efectuada aplicação daquele princípio» (Cfr. o seguinte acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - de 15 de fevereiro de 2007, proferido no processo n.º 1071/06, ...)” (fim de citação)
In casu, conforme se retira da factualidade provada (cfr. itens 5. e 6. do probatório), foi emitida a liquidação oficiosa de IRS relativa ao ano de 1998, no âmbito de cujo procedimento não houve qualquer notificação para efeitos de exercício do direito de audição por parte dos sujeitos passivos. Esta preterição de formalidade revela-se essencial, porquanto, aqueles podiam, no exercício de tal direito, fornecer elementos úteis quer à elaboração da declaração quer da liquidação (veja-se o conteúdo da reclamação graciosa apresentada e resposta da AT identificadas nos itens 7. e 8. do probatório).
Estavam, portanto, reunidos os pressupostos para a audição dos contribuintes, desde logo, nos precisos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 66º do CIRS (antes da declaração oficiosa, para suprir a declaração de rendimentos em falta) e do artigo 60º, nº.1, al. a), da LGT (previamente a liquidação), nada lhe obstando a actuação vinculada da Administração que, aliás, apenas se reconduzia à "forma de liquidação" consagrada na lei, atenta a omissão dos Impugnantes.
Ora, contrariamente ao julgado sob recurso, estamos convictos que da intervenção dos contribuintes no procedimento da liquidação oficiosa sempre poderia, neste caso, resultar uma alteração dos termos em que a matéria colectável foi determinada pela AT, como expressamente resulta da decisão proferida no âmbito da Reclamação Graciosa, se bem sem consequência expressiva na liquidação, por força da caducidade operante, mas mesmo assim transponível para o deferimento parcial da mesma, como ali ficou determinado quantos aos pagamentos por conta, na consideração de terem sido os mesmos efectuados por conta do imposto devido a final, sendo este resultante dos rendimentos da categoria B abstractamente obtidos, o montante pago com esta natureza de 837,98 € ao longo do ano de 1998 foi levado ao apuramento do imposto a pagar no exercício. (Neste sentido vide jurisprudência do STA de 02.07.2003, rec.684/03; de 16.05.2007, rec.192/07; de 23.04.2008, rec.22/08; de 18.06.2014, rec.1102/13).
Como ficou dito no acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de outubro de 2014, proferido no âmbito do processo n.º 1374/13, “(...) o direito de audiência não tem como única finalidade a possibilidade de participar na fixação da matéria colectável, antes podendo essa participação (que o direito de audiência visa assegurar) assumir muitos outros domínios da formação da decisão final».)”.
Ora, a premissa para a aplicação do princípio do aproveitamento do acto, é a insusceptibilidade da participação do interessado influenciar a decisão final, seja no seu sentido seja nos seus fundamentos.
A audiência prévia destinando-se a assegurar o direito constitucionalmente consagrado do direito à participação, como acima já explicado, deve poder exercer-se não só sobre a quantificação da matéria tributável, mas também sobre todas as outras questões de facto e de direito susceptíveis de influir na decisão do procedimento.
Daqui resulta que a violação do dever de audiência nunca se poderia ter como sanada no caso em apreciação, desde logo, por os elementos em que a tal liquidação se fundou não terem sido elementos apresentados pelos Impugnantes, agora Recorrentes, mas sim em elementos oficiosos da AT.
Como se afirmou no acórdão do STA de 18.10.2017, acima citado, (e note-se, estávamos ali perante uma liquidação adicional, pelo que por maioria de razão é transponível à presente situação, pois que aqui se analisa a preterição do direito de audição numa liquidação oficiosa):
“Note-se ainda que nem sequer pode argumentar-se a favor do aproveitamento do acto com a natureza dos vícios invocados em sede de impugnação judicial ou sequer com a sorte que tal invocação venha a merecer. Como também já disse este Supremo Tribunal Administrativo, «[n]ão será pelos fundamentos invocados em sede de impugnação contenciosa do acto que se poderá aferir da relevância ou não do exercício do direito de audiência sobre o conteúdo decisório do acto, mas antes pela sua susceptibilidade de influir sobre o conteúdo decisório do acto, motivo por que aquele direito não poderá deixar de ser assegurado sempre que não seja de afastar a possibilidade de a decisão do procedimento tributário ser influenciada pela intervenção do interessado» e, se é certo que a aplicação do princípio do aproveitamento do acto implica necessariamente um juízo a posteriori, «este deve ser um juízo de prognose póstuma, pelo que não pode nem deve ser influenciado pela improcedência dos demais vícios (para além da preterição do direito de audiência) invocados no processo em que o acto foi impugnado, sob pena de esvaziamento do direito de participação e de impossibilidade prática de verificação do vício resultante da preterição desse direito» (Cfr. o já citado acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Outubro de 2014, proferido no processo n.º 1374/13.).
A nosso ver, não pode invocar-se com sucesso o princípio do aproveitamento do acto para recusar a anulação das liquidações impugnadas com fundamento em preterição de formalidade legal por não ter sido concedida à sociedade originária devedora a possibilidade de exercer o direito de participação mediante audiência prévia. (…)
Em face de todo o exposto, tendo a sentença errado ao considerar que as formalidades preteridas se degradavam em não essenciais, e aplicado o princípio de aproveitamento do acto, cumpre dar razão ao Recorrente e, revogar a sentença e em substituição considerar procedente a impugnação na exacta medida em que a mesma peticionava anulação da liquidação oficiosa de IRS 1998.
Mais se diga que na procedência da impugnação por violação de formalidade legal e anulação da respectiva liquidação se dá por prejudicado, por o pedido se mostrar directamente relacionado com a manutenção da liquidação, o pedido formulado a título subsidiário sob o ponto D) “Do excesso da liquidação, enriquecimento sem causa e juros indemnizatórios”.
Quanto ao peticionado sob alínea B) e C) a saber, que «Em resultado da anulação da liquidação efectuada impõem-se a restituição do imposto retido e dos pagamentos por conta efectuados, restituição com caracter de oficiosidade tal como prevê o artigo 89º (n.º1) do CIRS» e «Restituição essa acrescida dos devidos juros compensatórios – n.º 2 artigo 89º (n.º1) do CIRS e 100º da Lei Geral tributária, desde a data da entrega do tributo nos cofres do Estado, como efeito repristinador da anulação», diremos:
As retenções na fonte são calculadas por aplicação de uma taxa de rendimentos concretos e conhecidos, existindo uma relação de causalidade entre ambos, ou seja, só há retenção porque existem rendimentos. Não é possível reter imposto sobre rendimentos inexistentes, logo são indissociáveis.
O imposto sobre o rendimento de pessoas singulares é um imposto que, como a sua denominação indica é devido por pessoas singulares, incidindo sobre o valor anual dos rendimentos por estas auferidos ao longo do ano, artº 1º do Código de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares.
A retenção na fonte não é um imposto, mas um mecanismo de cobrança, instituído pelo sistema fiscal português com o objectivo de aumentar a eficácia na cobrança do imposto (IRS). Pela utilização de tal mecanismo, o Estado recebe, mensalmente, por conta do imposto que será devido no final de cada ano pelos trabalhadores por conta de outrem ou trabalhadores que prestem serviços e que não estejam abrangidos pelo regime de isenção uma parte do imposto sobre o rendimento de pessoas singulares que a estas compete pagar.
Para o sujeito passivo de imposto sobre o rendimento de pessoas singulares trata-se de um pagamento antecipado do imposto que é devido no final de cada ano.

Os pagamentos por conta, são efectuados “por conta” do imposto devido a final, não estando associados a um determinado rendimento específico, ou seja, podem existir pagamentos por conta e não existirem rendimentos. O simples facto de existirem rendimentos da categoria B, a que estão associados pagamentos por conta, permite que estes lhe sejam imputados, independentemente de terem sido considerados todos os rendimentos enquadráveis naquela categoria, uma vez que os mesmos não estão associados a um rendimento específico, mas genericamente, a todos os rendimentos da categoria B.
Mas vejamos, o peticionado pelo Recorrente é formado ao abrigo do artigo 89º, n.º 1 do CIRS, ora segundo o mesmo "a diferença entre o imposto devido a final e o que tiver sido entregue nos cofres do Estado em resultado de retenção na fonte ou de pagamento por conta, favorável ao sujeito passivo, deverá ser restituída até ao fim do terceiro mês seguinte ao termo do prazo previsto no n. 1 do artigo 90.º", e no seu nº 2 que "sobre a diferença favorável ao sujeito passivo entre o imposto devido a final liquidado com base em declaração apresentada dentro do prazo legal e o que tiver sido retido ou pago por conta é devida uma remuneração compensatória".
Ora aplicação do preceituado, tem subjacente a liquidação de um imposto, razão pela qual se fasta a sua aplicação de todo na situação dos autos de anulação da liquidação, pois perante a mesma não existe qualquer “imposto” que possa despoletar aplicação do normativo aclamado.
E, quanto ao avocado artigo 100º da LGT, a questão tem sido apreciada inúmeras vezes pela jurisprudência dos tribunais superiores, tendo o Supremo Tribunal Administrativo (veja-se o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência proferido pelo Pleno da SC Tributário do STA de 21.06.2023, proferido no âmbito do processo nº 011/23.8BALSB) reiterando a fundamentação constante no acórdão de 30 de setembro de 2020 (2009/18.9BALSB), sem dissidência, afirmado que: «(…). Com efeito, há muito que o STA sufraga o entendimento, formulado com base na letra do artigo 43.º, n.º 1 da LGT, de que os juros indemnizatórios apenas podem ser atribuídos ao sujeito passivo que tenha satisfeito uma obrigação tributária que venha a ser anulada com fundamento em “erro imputável aos serviços”, designadamente, por erro na aplicação do direito. É só neste caso, segundo a interpretação firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo, que se gera uma efectiva lesão na esfera jurídica do sujeito passivo, decorrente a imposição do cumprimento de uma obrigação tributária que se vem a apurar ser contrária ao direito e que, por isso, deve ser patrimonialmente reparada através do pagamento de juros indemnizatórios.
Já quando os actos tributários são anulados por vícios de forma (incompetência do autor do acto, vício procedimental ou falta de fundamentação, para referir alguns exemplos) não fica demonstrado que tenha sido exigida ao sujeito passivo o cumprimento de uma obrigação materialmente contrária à lei (ou seja, que não era devida), mas apenas que essa obrigação não foi determinada ou calculada em conformidade com as normas legais e, por essa razão, a mera restituição do que foi pago é suficiente para tornar indemne o sujeito passivo. Mais, nos casos em que existam razões atendíveis (fundamentos que suportem a violação de um direito de natureza substantiva) para que o sujeito passivo cujo tributo anulado com fundamento em vício de forma se não deva considerar indemnizado pela mera restituição dos valores que tenha pago, pode sempre utilizar-se a acção de responsabilidade civil para obter a reparação dos respectivos danos.
Lembre-se, por fim, que o Tribunal Constitucional, confrontado com a antes mencionada interpretação do n.º 1 do artigo 43.º da LGT sufragada pela jurisprudência do STA, decidiu, no acórdão n.º 203/2013,“[N]ão julgar inconstitucional a norma extraída dos artigos 43.º e 100.º, ambos da Lei Geral Tributária, segundo a qual não são devidos juros indemnizatórios, em execução de decisão anulatória da liquidação de tributo, quando a anulação do ato tributário se funde em ilegalidade de natureza orgânico-formal”.
É, pois, esta interpretação do n.º 1 do artigo 43.º da LGT que uma vez mais se confirma e reitera. (…)
Razão pela qual, este tribunal se limitará no âmbito dos poderes que lhe estão conferidos, a determinar anulação da liquidação oficiosa de IRS de 1998 e, no mais julgar a impugnação improcedente no peticionado sob as alíneas B) e C) e, prejudicado o conhecimento do peticionado na alínea D).
A repercussão do assim determinado em sede de custas, impões que se considere as custas do recurso pela Recorrida, que não incluem a taxa de justiça nesta instância, uma vez que não contra-alegou, e as custas da 1ª instância em proporção do decaimento atento o valor da acção fixado na sentença sob recurso, o que aqui se determina da responsabilidade em 25% pela AT e em 74º% pelos Impugnantes, atenta a procedência parcial da acção.
2.3. Conclusões
I. De acordo com o disposto nos artigos 644º, nº 2, e), e 638º, nº 2 do CPC, cabe apelação autónoma, a interpor no prazo de 15 dias, da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual.
II. O Regulamento das Custas Processuais (RCP), aprovado pelo DL nº 34/2008, de 26/02, dispõe no nº 6 do seu artº 27º: ‘da condenação em multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional fora dos casos legalmente admissíveis cabe sempre recurso, o qual, quando deduzido autonomamente, é apresentado nos 15 dias após a notificação do despacho que condenou a parte em multa, penalidade ou taxa’.
III. Esta norma não dá a quem é condenado ao seu abrigo a opção de recorrer autonomamente ou não, sendo que lhe confere a possibilidade de recorrer desde que observado o prazo de 15 dias a contar do conhecimento da mesma.
IV. Efectuada liquidação oficiosa ao contribuinte por falta de apresentação da respectiva declaração de rendimentos, o artigo 60.º da Lei Geral Tributária impõe que, neste caso, se faculte ao contribuinte o direito de audição prévia, dado que a sua intervenção no procedimento da liquidação oficiosa pode resultar numa alteração dos termos em que a matéria colectável foi determinada pela administração tributária.
3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, julgar parcialmente procedente a Impugnação e consequentemente determinar a anulação da liquidação oficiosa de IRS referente ao exercício de 1998.
Custas nesta instância a cargo da Recorrida, que não incluem a taxa de justiça nesta instância, uma vez que não contra-alegou, e custas da 1ª instância em proporção do decaimento, atenta a procedência parcial da acção, cuja responsabilidade se determina em 25% pela AT e em 74º% pelos Impugnantes,

Porto, 30 de janeiro de 2025

Irene Isabel das Neves
Graça Valga Martins
Virgínia Andrade