Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00554/20.5BECBR |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 03/21/2025 |
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Tribunal: | TAF de Coimbra |
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Relator: | LUÍS MIGUEIS GARCIA |
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Descritores: | URBANISMO; PARQUE DE ESTACIONAMENTO; |
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Sumário: | I) – É de negar provimento ao recurso quando não triunfa apontado erro de julgamento.* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Acção Administrativa Comum |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Condomínio da rua ..., ... (R. ..., ..., ..., ... ...) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Coimbra, em acção administrativa por si intentada contra Município ... (Praça ..., ... ...), julgada improcedente. Conclui: A) Do despacho recorrido datado de 13/10/2021 (a fls. 850 do SITAF): 1) Em primeiro lugar, o Tribunal a quo não conclui, nem tal se infere do despacho recorrido, que a prova testemunhal requerida é, nos exatos termos do art. 90.º, n.º 3 do CPTA, claramente desnecessária, mas tão somente desnecessária, ou seja, o juízo de desnecessidade que a lei exige para que o Tribunal possa rejeitar meios de prova requeridos pelas Partes é um juízo qualificado quanto à evidência da desnecessidade da prova face aos factos alegados e às soluções de direito possíveis no caso. 2) Não sendo constatada tal evidente, manifesta ou clara desnecessidade, como no caso não é (a prova testemunhal é mesmo indispensável, já o veremos), não podem os meios de prova requeridos ser rejeitados pelo Julgador, ao abrigo do art. 90.º, n.º 3 do CPTA, razão pela qual o despacho recorrido padece de erro de julgamento, afronta aquela norma processual, além do direito à prova do A. e dos princípios da descoberta da verdade material e da justa decisão do litígio, e não pode manter-se na ordem jurídica, devendo ser revogado por este digníssimo Tribunal ad quem. 3) Em segundo lugar, por um lado, invocam-se na pi. as circunstâncias concretas que rodearam a aquisição e o licenciamento da construção do edifício de habitação coletiva e as motivações subjacentes à alteração do projeto, mormente no que diz respeito à alteração do uso das frações do R/C e à alteração dos estacionamentos – cfr. arts. 4.º a 8.º, 37.º a 42.º, 47.º a 52.º, 55.º, todos da pi.; 4) Circunstâncias e motivações essas que não estão vertidas, ou, pelo menos, não estão de forma cabal vertidas em documentos, inclusive no processo administrativo instrutor, sendo antes passíveis de ser aferidas através da inquirição de testemunhas, determinantemente o próprio adquirente do lote, promotor do licenciamento e construtor do prédio, que se arrolou na pi. (Sr. «AA»), tendo-se referido isso mesmo, expressamente, no art. 51.º daquela peça processual. 5) Considerando que está em causa nos autos a interpretação da deliberação camarária n.º 1447/99, de 25/01/1999 (e subsequentes atuações encetadas no âmbito do procedimento urbanístico), impõe-se, a este passo, apreciar o contexto subjacente à prática da deliberação, o que implica a análise das atuações particulares que a rodearam (tendentes à aquisição, licenciamento e alterações ao licenciamento e construção do edifício de habitação coletiva), contexto esse que não colhe expressão cabal nos documentos escritos emanados pela entidade pública e pelo particular, sendo passível de ser adequada e idoneamente aferido através da prova testemunhal. 6) Por outro lado, alegam-se ainda factos referentes às concretas condições e características do espaço em causa e de espaços envolventes (antigo lote 1 contíguo, enorme estacionamento público em frente), inclusive relacionadas com o uso que é dado às frações do R/C e, assim, que se defende que devem ser atendidas e ser determinantes para a decisão administrativa contendente com os lugares de estacionamento – cfr. arts. 36.º, 43.º a 45.º, 58.º a 67.º, todos da pi.; 7) Nomeadamente condições e características não apenas físicas, mas também relativas ao tipo de estabelecimentos que estão instalados e podem ser instalados naquelas frações e ao concreto funcionamento dos mesmos (incluindo tipo de clientela, horários, etc.), que não constam de documentos, inclusive do processo administrativo instrutor, sendo antes passível de ser aferidas através da inquirição de testemunhas, mormente de Condóminos que habitam o prédio, que para esse efeito se arrolaram – cfr. pi. a fls… 8) O acervo factológico que vimos de enunciar alicerça expressa e claramente alguns dos vícios assacados ao ato impugnado nos autos – vejam-se o erro quanto aos pressupostos de facto e afronta à deliberação camarária anterior, invocados no art. 56.º da pi., o redobrado erro quanto aos pressupostos de facto e a violação dos princípios da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos, da igualdade e da proporcionalidade, no art. 73.º da pi.; 9) Além de que falamos uma vez mais de circunstâncias a atender na interpretação da atuação administrativa (da deliberação camarária n.º 1447/99 e atuações subsequentes) que se pretende alcançar, por determinante da (i)legalidade do ato impugnado nos autos, que nele se alicerça, tratando-se ademais de factos controvertidos nos autos – veja-se a contestação do R., designadamente os arts. 3.º, 6.º, 41.º e 48.º da mesma. 10) Aliás, como se alegou na pi., a redação dos vários documentos administrativos que corporizam aquela atuação administrativa encetada em 1999 não são sequer consonantes entre si ou, pelo menos, não são inequívocos no sentido da disciplina a dar aos estacionamentos em crise. 11) Portanto, decorre de tudo quanto vimos de expor que os factos que se pretendem sujeitar a prova testemunhal não só não decorrem (cabal ou plenamente) da prova documental constante dos autos, como é antes idónea, adequada e pertinente a inquirição de testemunhas para os comprovar, como ainda os mesmos, sendo controvertidos, são essenciais para a aferição e julgamento das ilegalidades ou causas de pedir invocadas na pi., logo, a prova testemunhal é indispensável, no caso, para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa e a justa composição do litígio. 12) Em suma, o despacho recorrido padece de erro de julgamento, mormente por afronta do direito à prova ínsito ao direito à tutela jurisdicional efetiva do A. (arts. 20.º e 268.º, n.º 4 da CRP) e dos princípios da descoberta da verdade material e da justa decisão do litígio, pelo que não pode manter-se na ordem jurídica, devendo ser revogado por este digníssimo Tribunal ad quem. Sem jamais conceder quanto ao que vimos de expor, ainda que assim se não entenda: B) Do saneador-sentença: 13) Como decorre do que vimos de expor no capítulo precedente, o que está verdadeiramente em causa nos autos, no que diz respeito à (i)legalidade interna do ato impugnado, é a interpretação da deliberação camarária n.º 1447/99, de 25/01/1999 (e subsequentes atuações camarárias que a pressupõem, no âmbito do procedimento urbanístico), no sentido de se apurar quais os efeitos que daí decorrem e, assim, se a mesma, na interpretação que dela se entenda devida, é passível de alicerçar o ato impugnado; 14) Tarefa esta a que procedeu a sentença recorrida, de forma explícita ou implícita, contudo, fê-lo em erro de julgamento, a vários passos, pois: 15) Em primeiro lugar: dizer-se que os estacionamentos em questão são públicos (tout court) é diferente de dizer-se que os mesmos são privados mas destinados ao uso público, qualificação esta que vem feita pelo Digno Tribunal a quo, como pretensa condição de deferimento do pedido de alteração do uso das frações do R/C, mas que não tem a mínima correspondência no texto da deliberação que deferiu esse pedido nem em qualquer outra decisão ou atuação administrativa praticada no âmbito do procedimento de alteração – basta ver o teor da deliberação n.º 1447/99, de 25/01/1999, constante do ponto 7) dos factos provados, e o teor vertido no alvará de licença de utilização n.º 312/2001, emitido em 29/05/2001, constante do ponto 12) dos factos provados. 16) Portanto, se das atuações camarárias jamais resulta, como ostensivamente não resulta, que os estacionamentos são privados mas destinados ao uso público, jamais pode entender-se, como entende a sentença recorrida, que uma tal condição foi aceite pelo requerente da alteração. Não foi nem podia ser, porque a condição nunca existiu nem existe. 17) Note-se que, como alegámos na pi., a criação de ónus de utilização pública sobre espaços privados implicaria, face à compressão do direito de propriedade, legitimação formal (a lei atual fala de acordo do proprietário e regulação da utilização mediante regulamento e contrato) e material (a lei fala hoje de decisão fundamentada e juízo de comprovada maior adequação do ponto de vista urbanístico), que no caso e nos termos pretendidos pela Autarquia (acesso irrestrito aos lugares de estacionamento), inexiste – veja-se, neste exato sentido, o art. 22.º, n.ºs 1, 2 e 3 da atual Lei de Bases Gerais da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo, aprovada pela Lei n.º 31/2014, de 30 de maio 18) Tudo isto a pugnar no sentido que defendemos na pi. e reiteramos: o que o construtor requereu a propósito da alteração do uso das frações do R/C foi que os lugares de estacionamento a tardoz do prédio ficassem abertos aos clientes ou utilizadores dos espaços comerciais, não ao uso irrestrito do público em geral, utilização esta que é mesmo ostensivamente desadequada no caso (mormente por questões de segurança), atentas as características do espaço em questão (tudo como explicitámos na pi.); 19) E foi isto que a Autarquia assentiu, ponderando as circunstâncias que entreteceram o loteamento, ou seja, mais do que qualificações, o que o Recorrente pretende é ver reconhecido o regime de utilização do espaço que se pretendeu especialmente implementar – o acesso aos estacionamentos é devido (apenas) ao público que frequenta os estabelecimentos existentes, podendo essa afetação exclusiva ser disciplinada e controlada pelo Condomínio, mormente (e sem prejuízo de outra forma ser acordada entre as partes) através de placa que indique a existência dos lugares de estacionamento adstritos aos clientes e cancela a abrir por meios eletromecânicos, mediante solicitação daqueles via intercomunicador. 20) Em segundo lugar: a referência ao cumprimento do PDM, no âmbito das atuações camarárias constantes dos factos provados, é perfeitamente pontual e absolutamente genérica (veja-se o ponto 8 dos factos provados, a final), sendo assim que a subsunção da norma citada na sentença recorrida (art. 37.º, n.º 1 do RPDMC vigente à data) ao caso concreto, no sentido de que a alteração do uso das frações do R/C para comércio implicava a previsão de 10 estacionamentos públicos, jamais daí resulta e, acrescente-se, jamais podia daí resultar; 21) É que, de acordo com o quadro consignado no art. 37.º, n.º 1, a que nos referimos, está prevista a existência de 1 lugar de estacionamento por cada 25m2 de área destinada a comércio e serviços, dos quais 80% deveriam ser públicos, o que, subsumido ao caso concreto e considerando que cada fração do R/C destinada a comércio tinha (e tem) 114m2 (cfr. designadamente ponto 2.2 da Informação n.º 1902/2019, de 13/05/2019, ponto 18 dos factos provados na sentença), portanto, são 228m2 no total, significa 9,12 lugares de estacionamento no total, dos quais apenas 7,2 teriam que ser públicos… 22) Deste modo, jamais pode achar-se uma vinculação regulamentar a determinar o sentido interpretativo propugnado na sentença recorrida, jamais pode entender-se que “foi com base no PDM que o Município decidiu o número de estacionamentos públicos obrigatórios face à existência de frações destinadas a comércio”, o que não está administrativamente decidido em lado algum, nem poderia, com base do dito RPDMC, estar. 23) Em terceiro lugar: conforme referimos supra, o requerente da licença e construtor do prédio não requereu o que se diz que requereu, pelo que nunca aceitou o sentido das atuações camarárias (mormente da deliberação n.º 1447/99, de 25/01/1999) que o Tribunal a quo entende conceder-lhes. 24) Neste sentido, basta atentar nos seguintes pontos dos factos provados da sentença recorrida: a) No ponto 5), onde se pode ler que, em 05/06/1998, a [SCom01...], Lda., apresentou um aditamento ao processo de licenciamento requerendo a alteração do projeto aprovado, passando as frações do R/C de habitação para comércio, com a criação de “sete lugares de estacionamento, afetos aos espaços comerciais” (destaques nossos), sendo que igual menção surge na planta do R/C junta nesta sede; b) No ponto 9), onde se consigna que, em 12/04/1999, a [SCom01...], Lda., apresentou segundo aditamento ao processo de licenciamento, referindo, em memória descritiva, que “No logradouro do edifício foi constituído um parque de estacionamento público, com capacidade para 12 veículos automóveis, como apoio aos dois estabelecimentos comerciais agora instalados” (destaques nossos), sendo que a menção à afetação dos lugares de estacionamento aos estabelecimentos comerciais surge também na planta apresentada nesta sede. 25) Portanto, o dono do prédio nunca propôs o que se diz que propôs, antes propôs a afetação dos lugares de estacionamento aos estabelecimentos comerciais que se defende na ação (cfr. o que dissemos já supra), não lhe podendo ser cometido o ónus de reagir contra qualquer atuação camarária que, no seu entendimento, não tinha nem tem o sentido que lhe vem dado pela decisão recorrida. 26) Seguindo até o excurso argumentativo percorrido pela sentença quanto às servidões administrativas (muito embora nada conclua ou subsuma a esse respeito no caso concreto), a entender-se que está aqui em causa uma servidão administrativa, não tendo o dono do prédio requerido ou acordado na utilização do espaço conforme pretendida agora pela Autarquia, a que o Tribunal a quo adere, então temos uma afetação do direito de propriedade constituída à margem das garantias basilares do proprietário, desde logo, sem ter sido concedida audiência prévia, e em afronta à principiologia (veja-se tudo quanto alegámos na pi. acerca desta matéria), suscetível de determinar a respetiva nulidade, o que não pode deixar de relevar na interpretação que se faz da atuação camarária (que supostamente a instituiu). 27) Em suma, a sentença recorrida, ao julgar nos termos que da mesma constam, pelos fundamentos que vimos de contraditar, incorre em erro de julgamento por violação da própria atuação administrativa que se interpreta e que é pressuposto do ato impugnado (deliberação camarária n.º 1447/99 e atuações subsequentes), bem como por violação dos princípios jurídicos da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos, da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé (arts. 4.º, 5.º, 6.º, 7.º e 10.º do CPA e arts. 2.º, 13.º e 266.º, n.º 2 da CRP), do próprio direito fundamental de propriedade consagrado no art. 62.º da CRP, e do princípio da mínima ingerência, conforme alegados na pi., impondo-se a respetiva revogação por este Digníssimo Tribunal ad quem. 28) A sentença recorrida julga ainda que “tendo ocorrido, in casu, vício de forma por falta de audiência prévia, quanto ao ato impugnado, esse vício é inoperante, porquanto, segundo o princípio do aproveitamento do ato, o seu conteúdo não poderia ter sido outro.”, sendo que subjacente a este julgamento está o entendimento de que o Município estava vinculado ao projeto aprovado, isto é, ao projeto aprovado pela deliberação camarária n.º 1447/1999, na interpretação que dela vem feita na sentença e que vimos de impugnar nas conclusões precedentes. 29) Logo, sendo errónea essa interpretação, como entendemos que é, fica necessariamente afastada a inoperância do vício de forma por força do aproveitamento do ato administrativo, impondo-se também a revogação desse segmento da decisão recorrida. Contra-alegou o recorrido, rematando que “deve o recurso interposto ser julgado totalmente não provado e improcedente, com todas as legais consequências, confirmando-se a douta sentença recorrida”. * O Exm.º Procurador-Geral Adjunto foi notificado nos termos do art.º 146º, nº 1, do CPTA, não emitindo parecer. * Dispensando vistos, cumpre decidir. * Factos, fixados como provados pelo tribunal “a quo”: 1) Em 03.07.1995, através da deliberação n.º 2586/95, a Câmara Municipal ... decidiu o seguinte: “...VI.4. Lotes Municipais na Rua ... – Estudo Prévio de Arquitetura pela Divisão de Projetos foi elaborado o estudo conjunto para dois lotes municipais sitos na Rua ..., com o qual se pretende definir com rigor os parâmetros urbanísticos (áreas de construção, tipologias, alinhamentos, cérceas, fachadas, cotas de soleira, etc) que determinam a sua ocupação edificada. O Executivo deliberou: DELIBERAÇÃO N.º 2586/95: Aprovar o estudo prévio de arquitetura para os lotes municipais na Rua ..., o qual dada a sua extensão fica apenso à presente ata fazendo parte integrante da mesma. Deliberação tomada por unanimidade e em minuta...”. (facto provado por documento, p. 667, a fls 744 a 835 dos autos – paginação eletrónica); 2) Por requerimento datado de 19.03.1997, a sociedade [SCom01...], Lda requereu ao presidente da Câmara Municipal o seguinte: “...Tendo esta firma adquirido a essa Câmara o Lote n.º 2 na Rua ... em ..., a 20 de dezembro de 1995, para nele iniciar de imediato o projeto e construção de um bloco de habitação; tal condição verificou-se irrealizável uma vez que foi impugnado o ato de venda do lote n.º 1, o qual fazia parte do estudo de conjunto. Ora, após uma longa fase à espera de solução para o problema por parte dessa Exma. Câmara, verifica-se que não obstante a boa vontade manifesta por parte do executivo na resolução do mesmo, a situação se mantém. Assim e porque se torna difícil manter por mais tempo esta situação, apresentamos uma solução alternativa, que pelo seu estudo e enquadramento paisagístico julgamos ser uma ótima solução. Pelo que, vimos junto de V. Exa. Pedir a sua rápida aprovação e consequentemente autorização para podermos fazer o desaterro do referido lote a fim de podermos colocar o estaleiro de obras que impreterivelmente temos de transferir de outro local. Na expectativa de uma análise rápida e favorável pedimos deferimento”; (facto provado por documento, p. 656, a fls 744 a 835 dos autos – paginação eletrónica); 3) Em 29.04.1997, por deliberação da Câmara Municipal, foi aprovada a alteração ao estudo urbanístico conjunto para os dois lotes municipais, na Rua ..., que articulava as duas edificações inicialmente previstas (Lote 1 e Lote 2); (facto provado por documento, p. 654, a fls 744 a 835 dos autos – paginação eletrónica); 4) Por deliberação n.º 7415/97, de 10 de novembro, a Câmara Municipal deferiu o projeto de arquitetura referente ao pedido de construção de um imóvel de habitação coletiva, na Rua ..., apresentado por [SCom01...], Lda para o Lote 2, nos termos seguintes: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (facto provado por documento, p. 596 e seguintes do processo administrativo – a fls 690 a 741 – paginação eletrónica); 5) Em 05.06.1998, a [SCom01...], Lda deu entrada de um aditamento ao processo n.º 24006/97 com vista a alteração do projeto aprovado pretendendo “(…) alterar a função prevista para a área do rés-do-chão, ou seja a instalação da habitação (dois fogos), propondo que a referida área seja ocupada por dois estabelecimentos comerciais com acessos independentes a partir de um plano de nível situado paralelamente à Rua .... Nesta alteração não será alterada a estrutura resistente do edifício, e serão criados sete lugares de estacionamento, afetos aos espaços comerciais. Argumenta-se a favor desta proposta, que existem grandes dificuldades na comercialização dos apartamentos localizados ao nível do rés-do-chão (situação esta demonstrada pela prática da firma requerente, as pessoas temem a invasão da sua privacidade e território). Por outro lado, existe uma forte procura de espaços comerciais naquela rua, pelo que entende esta empresa, em face do que acima fica exposto, solicitar a esta câmara que lhe seja concedida esta alteração, para posterior apresentação de processo de alterações. (…)”; (Facto provado por documento, p. 335 e seguintes do processo administrativo – a fls 423 a 472 – paginação eletrónica); 6) Em 28.08.1998, a Divisão de Projectos Urbanísticos Estratégicos (DPE) informou, através na informação n.º 73, o seguinte: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (Facto provado por documento, p. 332 e 333 do processo administrativo – a fls 423 a 472 – paginação eletrónica); 7) Em 25.01.1999, a Câmara Municipal ... deliberou (deliberação n.º 1447/99) o seguinte: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (Facto provado por documento, p. 305 a 307 do processo administrativo – a fls 423 a 472 – paginação eletrónica); 8) Na deliberação identificada no número anterior consta o seguinte: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (Facto provado por documento, p. 305 a 307 do processo administrativo – a fls 423 a 472 – paginação eletrónica); 9) Em 12.04.1999, é apresentada a memória descritiva, acompanhada de plantas, da alteração ao projeto aprovado em 10.11.1997 (Deliberação Municipal n.º 7415/07) como segundo aditamento do referido processo, após a aprovação por Deliberação Municipal n.º 1447/99, de 25 de janeiro de 1999 onde consta: “(…) Neste sentido, no rés-do-chão, os dois espaços habitacionais foram abolidos, sendo naquela área organizados dois estabelecimentos comerciais, com acesso independente e a partir da rua, estando cada um destes equipado com um núcleo de instalações sanitárias, divididas por sexo. (…) No logradouro do edifício foi constituído um parque de estacionamento público, com capacidade para 12 veículos automóveis, com apoio aos dois estabelecimentos comerciais agora instalados (…)” (facto provado por documento, p. 277 e seguintes do processo administrativo – a fls 342 a 420 – paginação eletrónica); 10) Por escritura pública outorgada em 24.10.2000, foi constituído no prédio urbano designado “Lote 2”, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º 3941, omisso na matriz, da freguesia ..., o regime de propriedade horizontal, com as seguintes frações: duas frações A e B destinadas a comércio (rés-do-chão direito e rés-do-chão esquerdo) e oito frações destinadas a habitação – frações C, D, E, F, G, H, I e J; (facto provado por documento – escritura pública de constituição de propriedade horizontal – p. 70 e seguintes do processo administrativo – a fls 174 a 232 – paginação eletrónica); 11) Resulta da escritura referida no ponto anterior, o seguinte: “...Para além das partes comuns do edifício determinadas por lei, são ainda comuns: A garagem na cave, designada por número onze, sendo a primeira do lado esquerdo, no sentido nascente/poente, arrumo para serviços de limpeza situado na cave, debaixo do patim das escadas, logradouro para estacionamento dos condóminos na parte de trás do edifício e toda a parte restante de área descoberta. Fica desde já autorizada a colocação de reclamos luminosos ou não, na fachada frontal dos estabelecimentos que correspondem às frações “A” e “B”...”; (facto provado por documento – escritura pública de constituição de propriedade horizontal – p. 70 e seguintes do processo administrativo – a fls 174 a 232 – paginação eletrónica); 12) Em 29.05.2001 é emitido o alvará de licença de utilização n.º 312/2001 através da qual foi autorizada a seguinte utilização: “...8 (oito) fogos, 11 (onze) ocupações que se destinem a garagens, 2 (dois) estabelecimentos comerciais e 10 (dez) estacionamentos públicos...”; (facto provado por documento, p. 90 do processo administrativo – a fls 174 a 232 – paginação eletrónica); 13) Em 10.09.2012 foi feita uma ação de fiscalização pela Divisão de Fiscalização Urbanística, ao lote 2, na Rua ..., tendo-se verificado o seguinte: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (facto provado por documento, p. 82 do processo administrativo – a fls 174 a 232 – paginação eletrónica); 14) Em 15.10.2012, por ofício n.º 38054, foi notificada a Administração do Condomínio do Prédio sito na Rua ..., ..., em ... para “(…) no prazo de 30 dias repor o projeto aprovado em 24.05.2001, procedendo à remoção das floreiras e do portão/cancela impedindo o livro acesso aos lugares de estacionamento públicos (10 lugares) localizados no logradouro posterior do edifício, ou no mesmo prazo pronunciar-se sobre o que tiver conveniente a respeito deste assunto (…)”; (facto provado por documento, p. 81 do processo administrativo – a fls 174 a 232 – paginação eletrónica); 15) Em 01.04.2013, a Administração do Condomínio apresentou uma exposição na sequência da notificação identificada no ponto anterior onde pede “(…) ao invés da decisão proferida, seja tomada uma outra menos gravosa e que atinja o fim da afetação, impondo ao Condomínio, que a isso se dispõe, que mantenha o portão e as floreiras (que não impendem em absoluto o acesso aos estacionamentos), mas que forneça um comando aos ocupantes dos espaços comerciais, no sentido destes franquearem o acesso ao espaço de estacionamento público quando alguém o pretender, apondo ademais, e a suas expensas, sinal nesse sentido”. (…) “Termos em que, não deve ser proferido o ato com conteúdo que o mesmo detém, comprometendo-se o condomínio a agir pela forma descrita ou por outra que, depois de conhecida ou acetada, razoavelmente fixe o conteúdo do encargo em causa ou (como se admitiu a contra-gosto) bem interprete o ato de licenciamento do edifício de habitação coletiva em questão, com todas as legais consequências”; (facto provado por documento, p. 54 e seguintes do processo administrativo – a fls 174 a 232 – paginação eletrónica); 16) Em 07.05.2013, por ofício n.º 18268, a Câmara Municipal ... respondeu ao requerimento n.º 15797, de 20.03.2013 de «BB», o seguinte: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (facto provado por documento, p. 41 e seguintes do processo administrativo – a fls 95 a 173 – paginação eletrónica); 17) Em 23.02.2019, foi efetuada uma nova ação de fiscalização tendo sido verificado “...que as floreiras e o portão/cancela se mantêm no local impedindo o livre acesso aos lugares de estacionamento públicos (10 lugares) localizados no logradouro posterior do edifício“ e ainda “consultado o processo de obras n.º 01/1997/24006, verifica-se que: 5.1. O edifício possui Alvará de Licença de Utilização n.º 312/2001 para 8 fogos, 11 ocupações que se destinam a garagens, 2 estabelecimentos comerciais e 10 estacionamentos públicos; 5.2. Se encontram representados na peça desenhada da Planta de arranjos exteriores que integra o projeto de alterações, deferido por despacho de Ex.mo Vereador, em 24.05.2001, 10 lugares de estacionamentos públicos, sitos no logradouro posterior do edifício (anexo cópia planta de arranjos exteriores) (…)”; (facto provado por documento, p. 51 e seguintes do processo administrativo – a fls 174 a 232 – paginação eletrónica); 18) Em 13.05.2019, foi emitida, pela Divisão de Gestão Urbanística a informação n.º 1902/2019, onde se destaca o seguinte: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (facto provado por documento, p. 49 e seguintes do processo administrativo – a fls 95 a 173 – paginação eletrónica); 19) Em 19.07.2019, o autor foi notificado, por ofício n.º 21877, para no prazo de 15 dias, se pronunciar sobre a proposta de reposição do projeto aprovado pela deliberação n.º 1447/1999, mais especificamente floreira e portão/cancela, nos termos do n.º 1 do art.º 106, do DL n.º 555/99, de 16 de dezembro, na atual redação (RJUE): [Imagem que aqui se dá por reproduzida] [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (facto provado por documento, p. 45 e seguintes do processo administrativo – a fls 95 a 173 – paginação eletrónica); 20) Em 16.09.2019 o autor pronunciou-se em sede de audiência prévia relativamente à notificação do ponto anterior; (facto provado por documento, p. 35 e seguintes do processo administrativo – a fls 95 a 173 – paginação eletrónica); 21) Em 07.09.2020, através do ofício n.º 21284, foi notificado o autor da decisão final proferida pelo Sr. Vereador, Dr. «CC», exarado em 31.07.2020 nos termos do ponto 4 da informação n.º 1597/2020/DGUN: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (facto provado por documento, p. 10 e seguintes do processo administrativo – a fls 95 a 173 – paginação eletrónica); 22) Por comunicação de 07.09.2020, o autor, não constando da notificação identificada no ponto anterior a informação com os fundamentos do ato, requereu cópia da referida informação; (facto provado por documento, p. 6 e 7 do processo administrativo – a fls 95 a 173 – paginação eletrónica); 23) Não tendo obtido resposta da Câmara Municipal no decurso do prazo legal, a autora intentou neste Tribunal Administrativo de Fiscal, uma intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões que correu termos sob o n.º 505/20.7BECBR, cuja instância foi extinta por inutilidade superveniente da lide por a entidade requerida ter disponibilizado as informações solicitadas após a propositura da ação; (facto provado por acordo e por consulta do referido processo no SITAF); 24) Em 06.11.2020, através do ofício n.º 26512, foi a autora notificada dos fundamentos da decisão constantes da informação n.º 1597/2020/DGUN: “... Por despacho do Exmo. Sr. Vereador, com competência subdelegada (pelo despacho n.º 52/Pr/2017), Dr. «CC», exarado em 06/11/2020 e no âmbito do solicitado pelo registo n.º 46692/2020, remeto a V. Exa. os fundamentos da decisão, constantes da informação n.º 1597/2020/DGUN, que a seguir se transcreve: 1. “Pedido Refere-se o registo n.º 50182/2019 à apresentação de nova exposição na qual é questionada a notificação expressa no oficio n.º 21877/2019, no sentido de, em sede de audiência prévia, se pronunciar sobre a proposta de reposição do projeto aprovado, isto é, permitir o acesso aos 10 estacionamentos privados de utilização pública implantados a tardoz do edifício construído na Rua ..., ... - .... 2.Antecedentes 2.1. Por deliberação de Câmara n.º 1447/1999, de 25 de janeiro, foi aprovado o projeto de arquitetura de alterações da edificação (registo n.º 15136/1999), prevendo a implantação de 10 lugares de estacionamento de utilização pública atardoz do edifício para suprir as necessidades de estacionamento decorrentes da alteração de uso das frações do r/c de habitação (2 fogos) para comércio (2 unidades, com exclusão do uso de restauração e bebidas). 2.2. Foi emitido o alvará de licença de utilização n.º 312/2001 para oito fogos (tipologia T3), onze ocupações destinadas a garagens, dois estabelecimentos comerciais (114m2+114m2) e dez estacionamentos públicos. 2.3. Por despacho de 08/07/2019 foi efetuada a audiência prévia, nos termos do artigo 121º do Código de Procedimento Administrativo, no sentido de ser dado cumprimento ao projeto aprovado por deliberação de Câmara n.º 1447/1999, de 25 de janeiro, repondo o acesso irrestrito aos lugares de estacionamento privados de utilização pública existentes no logradouro do edifício (ofício n.º 21877/2019). 3. Análise 1.1. No registo n.º 17625/2013 o Condomínio do edifício da rua ..., ... questiona a CMC da possibilidade prática manutenção de floreiras e portão que impedem o livre acesso aos lugares de estacionamento de utilização pública, em desconformidade com as condições do licenciamento da edificação, apresentando como alterativa o fornecimento de sistema eletromecânico de abertura do portão a gerir pelos proprietários dos espaços comerciais em momento de estrita necessidade de acesso àqueles estabelecimentos por parte dos clientes. 1.2. No âmbito da análise ao registo n.º 17625/2013 concluiu-se: 1.2.1. Que a necessidade dos estacionamentos de utilização pública implantados a tardoz do edifício resultou exclusivamente da intenção (aprovada pela deliberação de Câmara n.º 1447/99) de alteração do uso das unidades habitacionais originalmente existentes para usos comerciais (2 unidades). 1.2.2. Que a possibilidade de adoção de soluções de estacionamento privado de utilização pública (vulgarizada com a introdução das grandes unidades comerciais) constitui, do ponto de vista da gestão urbana, a conjugação dos interesses dos privados (no sentido da facilitação dos acessos aos espaços comerciais) e da administração (no sentido da desresponsabilização sobre a gestão funcional e material desses espaços). 1.2.3. Que é dentro deste espírito que se processa a gestão funcional dos estabelecimentos das grandes e médias superfícies comerciais, que encerram os seus lugares privados de utilização pública (pedonal e viária) fora dos horários de funcionamento comercial, e mantêm sempre disponíveis esses mesmos espaços dentro dos horários de funcionamento comercial do edifício. 1.2.4 Que, no caso em análise, a solicitação por parte da requerente de, alternativamente à solução do livre acesso, efetuar-se o fornecimento de sistema eletromecânico de abertura do portão, a gerir pelos proprietários dos espaços comerciais em momento de estrita necessidade de acesso àqueles estabelecimentos por parte dos clientes, consubstancia, em si mesmo, uma solução insólita e não funcional, que desvirtua o princípio regulamentar que sustentou a deliberação de Câmara n.º 1447/99 baseado no cumprimento das normas regulamentares do PDM em vigor à data da referida deliberação. 1.3. Foi promovida a consulta ao Departamento Jurídico, tendo sido emitido parecer no sentido de que: 1.3.1. "Constatado o incumprimento do projeto aprovado e verificando-se que as justificações dadas pelo Condomínio para o efeito não sanam a ilegalidade nem legitima que esta se perpetue, a situação deverá ser resolvida por uma de duas vias possíveis: reposição do projeto aprovado ou apresentação de um projeto de alterações; 1.3.2. (...) sem prejuízo de o Regulamento do PDMC não referir expressamente a existência de estacionamentos privados de uso público, o ponto 2.2 do anexo I do Regulamento Municipal da Urbanização e da Edificação (Regulamento n.º 381/2017) prevê que a CMC pode autorizar a sua materialização em outros locais funcionalmente próximos da operação urbanística. 1.4. Foi elaborado parecer por parte da Divisão de Mobilidade, Transportes e Trânsito (informação n.º 14592/2020, de 18/03/2020) segundo o qual deverá ser reposto o acesso irrestrito aos 10 lugares de estacionamento privados de utilização pública existentes no logradouro do edifício, e garantir, para futuro, a mobilidade e acessibilidade indiscriminada aos mesmos, por qualquer utilizador do público em geral. 2. Proposta de decisão Em face do exposto propõe-se notificar o Condomínio do edifício do n.º 100 da Rua ..., no sentido de, no prazo de 15 dias, proceder à remoção das floreiras e do portão nos acessos aos lugares de estacionamento de utilização pública existentes a tardoz do edifício, dando cumprimento ao projeto aprovado por deliberação de Câmara n.º 1447/1999, de 25 de janeiro, de modo a ser reposto o acesso irrestrito aos 10 lugares de estacionamento privados de utilização pública existentes no logradouro do edifício, e garantir, para futuro, a mobilidade e acessibilidade indiscriminada aos mesmos, por qualquer utilizador do público em geral.". Aproveito a oportunidade para apresentar as mais sinceras desculpas pela demora da resposta à sua solicitação expressa no registo n.º 46692/2020. Com os melhores cumprimentos,”. (facto provado por documento junto com a petição inicial a fls 37 a 40 doas autos – paginação eletrónica). * A apelação. O tribunal “a quo” julgou improcedente o peticionado pelo Autor, a saber: a) declarado nulo ou anulado o ato impugnado, o despacho proferido pelo Vereador da Câmara Municipal ..., datado de 31.07.2020, que determinou que o autor, no prazo de 15 dias, repusesse o acesso irrestrito aos 10 lugares de estacionamento existentes no logradouro do edifício, procedendo à remoção de floreiras e de portão de acesso aos lugares de estacionamento; e b) condenado o Município a reconhecer que a utilização dos estacionamentos só é devida a terceiros clientes ou utilizadores dos estabelecimentos existentes no R/C do edifício, e não ao público em geral, podendo, caso o autor assim o decida, ser disciplinado esse acesso aos lugares de estacionamento por meios eletromecânicos ou outros que garantam a afetação desses espaços de parqueamento à utilização exclusiva daqueles estabelecimentos. Ø O recurso «A) Do despacho recorrido datado de 13/10/2021 (a fls. 850 do SITAF)». O seu teor: «Entende este Tribunal que os elementos essenciais para a boa decisão da causa se encontram já reunidos nos autos, e que a questão decidenda se reconduz, essencialmente, à apreciação de matéria de direito que não pode ser questionada a testemunhas em sede de audiência e à análise de prova documental constante dos autos. Assim, dispensa-se, por desnecessária, a produção da prova testemunhal requerida (cf. artigo 90.º, n.º 3 do CPTA), e a realização de audiência prévia, já que esta teria apenas as finalidades previstas no artigo 87.º-A, n.º 1, al. b) e d) do CPTA (cf. artigo 87.º-B, n.ºs 2 e 3 do CPTA). Notifique.». O recorrente convoca que, “nos exatos termos do art. 90.º, n.º 3 do CPTA”, o juiz só poderá decidir pelo indeferimento de “requerimentos dirigidos à produção de prova sobre certos factos ou recusar a utilização de certos meios de prova, quando o considere claramente desnecessário.”, do que não se reconhecerá afirmação no despacho recorrido. Mas perde de vista que isso só assim aconteceria «No âmbito da instrução» (art.º 90, n.º 3, do CPTA), «Proferido despacho saneador, quando a ação deva prosseguir» (art.º 89º-A, n.º 1, de CPTA); como não toma em atenção o que, com autoridade que agora há que respeitar, foi já antes assinalado por este TCAN, em anterior recurso, quanto a despacho que “que indefira os requerimemos de prova (o que pressupõe a prévia abertura de instrução)”. O que não é o caso. Tem também como necessária a produção de prova testemunhal para apuramento das “circunstâncias concretas que rodearam a aquisição e o licenciamento da construção do edifício de habitação coletiva e as motivações subjacentes à alteração do projeto, mormente no que diz respeito à alteração do uso das frações do R/C e à alteração dos estacionamentos – cfr. arts. 4.º a 8.º, 37.º a 42.º, 47.º a 52.º, 55.º, todos da pi.”. Mas não se vê tal necessidade, quando o que são essas circunstâncias concretas decorrem do que documentalmente há a considerar e se pode ter como adquirido, suficientemente plasmado na matéria de facto fixada (de onde também o próprio Autor também faz o seu périplo interpretativo), vinculando, no caso, que não seria idónea prova testemunhal para proporcionar sentido díspar do dado por um declaratário normal, sem um mínimo de correspondência no texto do respetivo documento. Ø O recurso «B) Do saneador-sentença». Na tese do Autor os lugares de estacionamento que agora estão em causa ficaram no licenciamento destinados a servir tão só os estabelecimentos a instalar no r/c do prédio, podendo essa afetação exclusiva ser disciplinada e controlada pelo Condomínio, e não servir, irrestritamente, para o público em geral. A decisão recorrida, após um inicial enquadramento quanto ao regime de gestão territorial e urbanístico e à figura das servidões, debruçou-se sobre o caso concreto em mãos, com o seguinte juízo: «(…) Resulta do requerimento datado de 19.03.1997 que a sociedade [SCom01...], Lda adquiriu o Lote 2, na Rua ..., a 20.12.1995, e iniciou a construção de um “bloco de habitação”, após a Câmara Municipal ... ter deliberado a aprovação da alteração ao estudo urbanístico conjunto para os dois lotes municipais na referida rua (factos provados 2. e 3.), bem como a aprovação do projeto de arquitetura (facto provado 4.). Em 05.06.1998, a sociedade [SCom01...], Lda deu entrada de um aditamento ao processo de licenciamento com vista a alteração do projeto aprovado pretendendo alterar o uso previsto para a área do rés-do-chão, propondo a alteração dos dois fogos de habitação para comércio e criação de sete lugares de estacionamentos, afetos aos espaços comerciais (facto provado 5.). Nessa altura, o Município reconhecia que a Rua ... era uma via já com muito comércio instalado, resultando da informação n.º 73, de 28.08.1998, relativamente ao pedido de alteração do uso das duas frações, que “...a instalação desta atividade implica um acréscimo de estacionamento público. Neste caso, como não havia possibilidade de aumentar este tipo de estacionamento (entendido como parqueamento junto à via), optou-se pela utilização residencial do r/c). A opção proposta pelo requerente e aceite pelo D.A.U., de colocação de estacionamento público no logradouro posterior evidencia uma interpretação mais lata do conceito “estacionamento público (…)” tendo sido solicitada a verificação da viabilidade jurídica do pedido (facto provado 6.). Em 25.01.1999, a Câmara Municipal ... deliberou aprovar o uso do rés-do-chão do edifício, a implantar no Lote 2, dos lotes Municipais na Rua ..., de habitação para comércio (com exclusão de estabelecimentos de restauração ou de bebidas), com uma alteração ao projeto de arquitetura - aprovado em 10.11.1997 - deliberação Municipal n.º 7415/97 – facto provado 4.), com a condição de apresentar, no prazo de 45 dias, o projeto de arranjos exteriores do logradouro, prevendo a modelação do terreno e o acabamento dos muros de suporte, o rampeamento do lancil do passeio e a colocação da placa “P x lugares de estacionamento público” no respetivo acesso (na zona adjacente ao limite anterior do passeio) (facto provado 7.). Resulta dos indicados factos provados, a preocupação do Município relativamente aos lugares de estacionamento, face às dificuldades de estacionamento existentes na rua em causa. Na deliberação de 25.01.1999 – n.º 1447/99 – que aprovou a alteração do uso do rés-do-chão, o Presidente fez consta o seguinte “… historial de todo o processo da venda de dois lotes em hasta pública, aprovado pela Câmara Municipal e Assembleia Municipal em 1995 e que face a uma questão interposta pelo proprietário de um lote confinante, originou a que apenas fosse vendido o lote número dois, Disse ainda o Sr. Presidente que o lote foi vendido ao requerente com “lay out” de arquitetura aprovado e que teve que ser alterado face ao impedimento jurídico da venda do lote número um. Em seu entendimento, a situação para o requerente resultou num prejuízo temporal pelo que o Executivo terá de adotar uma postura de compreensão. Assim, considerando que o promotor tem condições de cumprir os níveis de estacionamento público e privado que o Regulamento do Plano Diretor Municipal exige (…)” (facto provado 8.). Após a aprovação da alteração do uso, o requerente, [SCom01...], Lda, apresenta a memória descritiva, com plantas, com indicação de que no logradouro do edifício foi constituído um parque de estacionamento público, com capacidade para 12 veículos automóveis, com apoio aos dois estabelecimentos comerciais (facto provado 9.). Porém, em sede de alteração do uso das duas frações do rés-do-chão, a Câmara Municipal impôs como condição de deferimento do pedido na parte respeitante ao parque de estacionamento, que o mesmo estivesse disponível para o uso público, embora mantivesse o seu estatuto privado, condição essa que foi aceite pelo requerente da alteração. Está provado que foi afeto ao uso público de modo a dar cumprimento ao artigo 37.º, n.º 1, do PDM ..., em vigor à data da deliberação da aprovação do uso das frações habitacionais para comércio. Nos termos do indicado artigo 37.º do Regulamento do Plano Diretor Municipal de ..., Resolução do Conselho de Ministros n.º 24/94, aplicável à data do pedido de alteração do uso, o número de lugares de estacionamento a prover nas zonas residenciais e industriais da cidade ... não podia ser inferior ao definido no seguinte quadro: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] Estabelecia o n.º 2 que sempre que as condições urbanísticas não permitissem a aplicação daqueles valores, deveriam as soluções a encontrar aproximarem-se o mais possível dos parâmetros indicados, mediante adequada justificada. O Plano Diretor Municipal, abreviadamente PDM, é o instrumento de planeamento territorial que estabelece a estratégia de desenvolvimento e o modelo territorial pretendido para o território municipal, devendo integrar e articular as orientações estabelecidas nos programas de âmbito nacional, regional e intermunicipal. O PDM, que constitui o referencial dos demais planos municipais (o plano de urbanização e o plano de pormenor) é constituído, no que respeita ao seu conteúdo documental, por um regulamento, planta de ordenamento, planta de condicionante, bem como por outra documentação (diversos relatórios e plantas, etc) – art.º 97º do RJIGT. É no PDM que é estabelecida a estratégia de desenvolvimento territorial municipal bem como a política municipal de solos, de ordenamento do território e de urbanismo. O PDM é de cumprimento obrigatório e é com base nele que a Administração toma as decisões em matéria de urbanismo, nomeadamente no que diz respeito ao ius aedificandi. Nos presentes autos, verifica-se que foi com base no PDM que o Município decidiu o número de estacionamento públicos obrigatórios face à existência de frações destinadas a comércio. Apesar de constar na escritura de propriedade horizontal outorgada em 24.10.2000 que “são ainda comuns: (…) logradouro para estacionamento dos condóminos na parte de trás do edifício e toda a parte restante de área descoberta” (facto provado 11.), declaração feita pelo proprietário do Lote 2, em 2001, a Câmara Municipal emite o alvará de licença de utilização n.º 312/2001, pelo qual foi autorizada a utilização para oito fogos, onze ocupações, que se destinam a garagens, dois estabelecimentos comerciais e dez estacionamentos públicos (facto provado 12.). A Câmara Municipal emitiu o alvará de licença de utilização de acordo com o requerimento do proprietário do Lote 2 e de acordo com a legislação em vigor à data dos factos. A utilização que pode ser dada a um prédio tem de estar de acordo com a licença respetiva e como todos os elementos que instruem o procedimento e foram considerados no ato do licenciamento. A sociedade [SCom01...], Lda poderia ter reagido quando foi emitido o alvará de licença de utilização com a previsão de dez estacionamentos públicos, mas nada fez. E nada fez pois bem sabia que tinha sido essa a condição para a Câmara Municipal lhe deferir a utilização do uso de duas frações dos rés-do-chão (que nunca impugnou) e, de resto, até foi essa a solução que ele próprio propôs quando apresentou a memória descritiva de alteração do licenciamento (facto provado 9.). Por isso, se a utilização dada a um prédio não se processa nos termos definidos, a Câmara Municipal tem competência para impedir uma utilização desconforme e para obrigar a que no local seja dado o destino consonante com o alvará de licença de utilização. Face ao exposto e de acordo com o licenciamento do prédio, designadamente da condição de estacionamentos públicos (10), imposta e aceite pelo proprietário do Lote 2, a Câmara Municipal tem o poder de impedir a vedação do estacionamento público e de ordenar a sua remoção. Por tudo o que aqui se fundamentou, a decisão impugnada não padece do vício de erro nos pressupostos de facto. Sobre uma situação semelhante à dos autos já se pronunciou o Tribunal Central Administrativo Norte, no processo 00085/09.4BEBRG, de 16.01.2015, disponível em www.dgsi.pt onde se lê no sumário “…A propriedade horizontal submete-se aos condicionamentos urbanísticos do licenciamento (nomeadamente prevendo um parque de estacionamento afecto ao uso público), ditando até a própria lei civil que a não coincidência entre o fim levado à letra da propriedade horizontal e o que foi fixado no projeto aprovado pela entidade pública competente determina a nulidade do título constitutivo (art.º 1418º, nº 3, do Código Civil)…”. Lê-se ainda na fundamentação “…Ora, conforme nos dão conta os factos levados ao probatório, tendo o licenciamento sofrido alteração, sujeita ao condicionamento imposto de que o parque de estacionamento tivesse acesso público, foi assim nessa medida (e não outra menor) que ficou consolidado o aproveitamento urbanístico. Não surte diferente conclusão a chamada de atenção para o que foi levado à constituição a propriedade horizontal, de previsão no logradouro de “espaço destinado a parqueamento dos proprietários das frações, assim como a clientes e utentes do comércio e escritórios.” Na ótica jus-publicista, enquanto se coloca questão de aferição de respeito para com os condicionamentos urbanísticos estabelecidos, subalterniza-se o que ficou definido em propriedade horizontal, de forma tal que “releva tão só no domínio das relações de direito civil entre os interessados.” (Ac. do STA, de 17-04-2007, proc. nº 061/07). E é a própria lei civil que confirma essa submissão, quando determina que a não coincidência entre o fim levado à letra da propriedade horizontal e o que foi fixado no projeto aprovado pela entidade pública competente determina “a nulidade do título constitutivo” – art.º 1418º, nº 3, do Código Civil. No que toca ao excurso argumentativo relativo às despesas com manutenção o parque de estacionamento, que, não sendo o objecto da providência judiciária requerida nos autos, ainda se poderá ter como contributiva na discussão quanto à afetação do núcleo essencial do direito de propriedade, apenas se observará: - que os direitos reais podem comportar ónus, encargos e despesas, é pacífico; - não reverte qualquer afetação do núcleo essencial do direito de propriedade, quando também nenhum amparo de violação de proporcionalidade resulta. Assim, e sem qualquer cobertura de violação do art.º 62º da CRP, ou art.º 133º, nº 2, d), do CPA, bem decidiu o aresto sob censura…”.». O Autor censura o apoio encontrado no PDM para se poderem ter justificados os 10 lugares de estacionamento aqui em causa, quando, por aí, “apenas 7,2 teriam que ser públicos…”. Contudo, da exigência regulamentar apenas resulta um mínimo, que não poderia ser inferior ao indicado; e não tem qualquer dúvida, pelo que o próprio Autor alega, que o número que acabou por ficar determinado o respeitou, e até ultrapassou, sem colocar em crise. Objecta o recorrente que “dizer-se que os estacionamentos em questão são públicos (tout court) é diferente de dizer-se que os mesmos são privados mas destinados ao uso público”. Certamente que ocorre diferença, na especificação de que se trata de uso público em coisa privada, e não de um uso de/em coisa de raiz pública. Percebe-se que o recorrente queira vincar tal diferença, aproximando a um exercício de faculdades comummente em domínio da esfera privada. Mas, na economia do que está em causa, e não se duvidando que se trata de uma afectação em coisa privada (logradouro), o que faz a diferença é o que determina essa afectação, vingando no “ius aedificandi” a disciplina que resulta da relação pública urbanística. Uma “afetação do direito de propriedade” que não está eivada de nulidade por não ter “o dono do prédio requerido ou acordado na utilização do espaço conforme pretendida agora pela Autarquia”. Pode até verbalizar-se que, efectivamente, assim não sucedeu de início, conquanto a alteração ao uso do r/ch foi acompanhada, na proposta do promotor, da criação de lugares de estacionamento (7) “afectos aos espaços comerciais”, não para estacionamento público. Mas a narrativa factual mostra bem que não foi isso que foi acolhido e anuído. O Autor recolhe sentido do procedimento sem atentar nos posteriores passos e no que deles deve ter-se de sentido dado por um declaratário normal, não sendo admissível, no caso, que ele não tenha um mínimo de correspondência no texto do respetivo documento. Da deliberação n.º 1447/99, tomada depois do que em antecedente foi equacionado no procedimento quanto à necessidade de observar as exigências de estacionamento público, resulta claramente que foi na suposição de observância dessas exigências de estacionamento público que a alteração foi admitida; e não tal e qual como integralmente foi requerida a alteração, antes sempre condicionada a essa conformidade. Ao que, em subsequente segundo aditamento, a memória descritiva verteu que “No logradouro do edifício foi constituído um parque de estacionamento público, com capacidade para 12 veículos automóveis, com apoio aos dois estabelecimentos comerciais agora instalados (…)” (cfr. 9º)). Bem que necessidade criada em razão de “dois estabelecimentos comerciais agora instalados”, e também que lhes sirva de “apoio”, inequivocamente aí se assumindo ser “um parque de estacionamento público”, com esta última alteração, por vontade do particular, satisfazendo e indo de encontro à primária exigência de lugares de estacionamento - como coisa pública - imposta no instrumento regulamentar. Havendo notícia de que projecto de alterações, assinalando 10 lugares de estacionamento público, foi deferido por despacho de 24/05/2001 (cfr. 13º)). Não é legítimo entendimento contrário. Longe se ver “uma afetação do direito de propriedade constituída à margem das garantias basilares do proprietário”, recai a oneração constituída à luz do procedimento urbanístico, em alcançado caso resolvido. Não emergindo desse/nesse primeiro procedimento que por aí definiu estatuto à coisa imóvel administrada pelo Autor qualquer “afronta à principiologia”, à “audiência prévia”, ou a “princípios jurídicos da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos, da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé (arts. 4.º, 5.º, 6.º, 7.º e 10.º do CPA e arts. 2.º, 13.º e 266.º, n.º 2 da CRP), do próprio direito fundamental de propriedade consagrado no art. 62.º da CRP, e do princípio da mínima ingerência”. Já no que é o procedimento que agora o opõe ao réu, o tribunal “a quo” reconheceu e ressalvou que “tendo ocorrido, in casu, vício de forma por falta de audiência prévia, quanto ao ato impugnado, esse vício é inoperante, porquanto, segundo o princípio do aproveitamento do ato, o seu conteúo não poderia ter sido outro.” O recorrente censura aplicação do princípio por erro de premissa. Mas, como supra decorre, o erro não se verifica. * Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso. Custas: pelo recorrente. Porto, 21 de Março de 2025. Luís Migueis Garcia Catarina Vasconcelos Conceição Silvestre |