Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00525/17.9BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/26/2018
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:ERRO DE JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO; IMPUGNAÇÃO MOTIVADA; PROVIDÊNCIA CAUTELAR; NULIDADE DO ACTO; VIOLAÇÃO DA AUTORIDADE DO CASO JULGADO;
APARÊNCIA DO BOM DIREITO; ARTIGO 120º DO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS NA REDACÇÃO DADA PELO DECRETO-LEI N.º 214-G/2015, DE 02.10;
PONDERAÇÃO DE INTERESSES; I) DO N.º 2 DO ARTIGO 161º DO CÓDIGO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO (DE 2015).
Sumário:
1. Invocando-se erro no julgamento da matéria de facto, por se defender que, ao contrário do que foi dado como provado, uma área de terreno objecto de destaque administrativo não coincide com a área de terreno objecto de outro pedido de destaque, a impugnação deve ser motivada, ou seja, referindo em concreto a que outra área de terreno diz respeito a primeira e a segunda, pois só a impugnação motivada, neste caso, faz sentido, é perceptível.
2. Não é nula, antes válida e acertada, a sentença que, em providência cautelar, aprecia a excepção de caducidade do direito de acção como questão de mérito na apreciação do requisito da aparência do bom direito – n.º1 do artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (de 2015, aplicável ao caso) – e não como matéria de excepção da própria providência cautelar.
3. Com a alteração dada ao artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 02.10, o juízo sobre o êxito da acção principal, ainda sumário, não é mais intenso ou aprofundado agora para as providências cautelares conservatórias, apenas distinto. A maior exigência, agora, para as providências cautelares conservatórias, está na arguição de fundamentos para a procedência da acção principal e não na análise desses fundamentos.
4. A autorização, pelo acto suspendendo, do destaque de uma parcela de terreno que constituiu o objecto de uma providência cautelar julgada procedente por decisão transitada em julgado que visava, no essencial, manter inalterada a situação jurídica do prédio onde se integra tal parcela, viola a autoridade de caso julgado dessa decisão judicial, sendo, por isso nula, face ao disposto no alínea i) do n.º 2 do artigo 161º do Código de Procedimento Administrativo (de 2015).
5. Deve ser suspenso o acto que autorizou o destaque da referida parcela de terreno se, sendo esta nula, o único interesse público relevante que se apresenta é o do respeito pela autoridade de caso julgado da decisão judicial que decretou a providência cautelar incompatível com o destaque. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Município da Trofa
Recorrido 1:IP – SPITA, L.da
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO
Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

O Município da Trofa veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, de 06.10.2017, pela qual foi julgada procedente a providência cautelar intentada pela IP – SPITA, L.da, para a suspensão da deliberação de 29.09.2016 do Município ora Recorrente que autorizou o destaque de uma parcela do terreno da Contra-Interessada CV- IT, S.A..

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida é nula por ter omitido a pronúncia sobre excepção suscitada pelos Requeridos, a saber, a excepção de caducidade do direito de acção; invocou ainda que, de todo o modo, a decisão recorrida ao deferir o pedido de suspensão, em vez de o indeferir, como devia, violou, por erro de interpretação e aplicação ao caso concreto, o disposto nos artigos 8º, nºs 1 e 3, e 120º, nºs 1 e 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, artigo 3º do Código de Procedimento Administrativo, e artigo 6.º, n.º 6, e 11.º, n.º 7 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.

A CV- IT, S.A., por seu turno, interpôs também RECURSO JURISDICIONAL da mesma decisão invocado, em suma, que a decisão recorrida é nula por se substituir à parte na consideração de factos não invocados, por excesso de pronúncia, por conhecer de questão que não foi suscitada, uma nulidade do acto suspendendo, e sem assegurar o contraditório; invoca ainda que, de todo o modo, a decisão recorrida padece de erro e insuficiência no julgamento da matéria de facto e de erro de Direito, pois deveria ter julgado improcedente o pedido cautelar, por não se verificarem os requisitos plasmados no artigo 120º, n.ºs 1 e 2, do Novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos, pelo que no presente recurso deve ser aditada a matéria de facto e julgado improcedente o requerimento cautelar, revogando-se assim a decisão recorrida.

A Recorrida contra-alegou em ambos os recursos, defendendo a sua improcedência e, consequentemente, a manutenção da decisão recorrida.

Foi proferido despacho de sustentação, a defender a inexistência de qualquer nulidade da decisão recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.
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Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
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I.I. - São estas as conclusões das alegações do recurso do Município da Trofa que definem o objecto do primeiro recurso jurisdicional:
1. O Recorrente invocou a caducidade do exercício do Direito, nos artigos 17º a 21º da contestação que em conformidade com o artigo 58º do Código do Procedimento dos Tribunais Administrativos, a impugnação de actos administrativos anuláveis só tem lugar, no prazo de três meses, após a sua deliberação.
2. E alegou que a deliberação tomada em sede de reunião ordinária pública da Câmara Municipal da Trofa, teve lugar no dia 29.09.2016, tendo decorridos os três meses, que legitimavam o alegado direito da Requerente, já tinham se tinham, há muito, esgotado.
3. Todavia o tribunal a quo não se pronunciou sobre essa invocada caducidade, incorrendo em omissão de pronúncia, determinante de sua nulidade – artigo 615º nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil.
4. A não suspensão do acto em causa não é susceptível de poder, razoavelmente, originar uma situação de facto consumado ou prejuízos dificilmente reparáveis.
5. A autorização do destaque não é passível de causar qualquer facto consumado, já que, em caso de procedência da acção, é possível retroceder, quer em termos registrais quer em termos de processo administrativo camarário, à situação anterior à operação de destaque.
6. O destaque não vai permitir à contra-interessada materializar no terreno operações urbanísticas, mediante licenciamento ou outro acto urbanístico, pelo facto de existir pendência de processo judicial cível entre as partes relativamente ao imóvel em apreço.
7. A operação de destaque ocorrerá e beneficiará a requerente do mesmo relativamente à tramitação do procedimento, em termos cronológicos, ganhando, assim, algum tempo.
8. Ocorre a presunção da legalidade dos actos administrativos praticados e, mesmo, o dever de praticar esses actos administrativos.
9. A apreciação da eventual ilegalidade do acto administrativo de deferimento da pretensão de destaque – ilegalidade essa que constitui um dos pressupostos do deferimento da suspensão de eficácia do acto -, deve ser totalmente alheia quanto aos actos materiais.
10. O eventual receio da autora não pode ser real e fundado quanto à suspensão de eficácia, mas sim, no que respeita à acção cível pendente entre as partes e na qual o aqui recorrente não é parte e que desconhece os respectivos contornos (causa de pedir e pedido).
11. A fundamentação da sentença recorrida viola o princípio da legalidade ínsito no artigo 3º do Código de Procedimento Administrativo.
12. Ao Recorrente, enquanto entidade administrativa, é indiferente a venda ou não de um imóvel pertença de uma das partes, devendo obediência ao dever de isenção e imparcialidade – artigo 9º do Código de Procedimento Administrativo – pelo que não pode tomar partido por uma das partes da contenda privada.
13. A decisão recorrida não imputa qualquer ilegalidade ao acto suspendido, mas decretou a respectiva suspensão tendo em conta as questões de direito privado que estão sendo dirimidas na jurisdição comum.
14. Não há, na lei, nenhuma norma que plasme a nulidade do acto administrativo com base no que foi alegado pela Requerente na providência cautelar de suspensão da eficácia de acto administrativo e na factualidade apurada pelo Tribunal a quo.
15. À míngua de mínima evidência de ilegalidade que afecte o acto suspendido, a sentença fez incorrectas interpretação e aplicação dos artigos 8º, nºs 1 e 3, e 120º, nºs 1 e 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, artigo 3º do Código de Procedimento Administrativo, e artigo 6.º, n.º 6 , e 11.º, n.º 7 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.
Termos em que deve merecer provimento o recurso e, decretando-se a nulidade da mesma, deverá ser, revogada a douta sentença com ulterior improcedência do procedimento cautela.
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I.II. - São estas as conclusões das alegações do recurso da CV- IT, S.A e que definem o objecto do segundo recurso jurisdicional:
1 - Começa a sentença recorrida por transcrever o basilar artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos na sua nova redacção. Porém, as observações e interpretações que dele retira e, nomeadamente, as citações doutrinárias e jurisprudenciais que a propósito faz, são totalmente alheias à nova redacção e às novidades por esta introduzidas, o que é dizer, estão manifestamente desactualizadas, o que redunda em inelutável erro de julgamento. Veja-se que os acórdãos que cita e em que a decisão se estriba, do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Central Administrativo Norte são de 2007 e de 2013, ou seja, muito anteriores à publicação e início de vigência deste normativo na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 214-G/2015 de 02.10.
2 - Este preceito, na versão actual, não distingue, quanto ao primeiro requisito, da aparência do bom direito, as providências conservatórias - como é o presente pedido de suspensão da eficácia de um acto - das providências antecipatórias, tendo o legislador adoptado para ambas a mesma redacção que antes adoptou para as providências antecipatórias, tornando assim mais exigente o requisito da aparência do bom direito para as providências conservatórias pois antes apenas exigia que não fosse "manifesta a falta de fundamento da pretensão".
3 - Nestes termos, entende a mais actualizada jurisprudência que, para que se possa concluir pela manifesta procedência da pretensão é necessário, num juízo sumário, que os fundamentos invocados pelo Requerente se superiorizem, aos do Requerido pois só nessa situação é possível concluir pela provável procedência da acção principal, o que implica necessariamente que, para esse juízo perfunctório, se alinhem os fundamentos e argumentos de Requerente e Requerido.
4 - Ora, a sentença recorrida não faz essa aprofundada e intensa cognição, limitando-se a aderir aos fundamentos apresentados no requerimento inicial da providência, sem fazer o necessário contraponto dos mesmos com os argumentos contrários, apresentados pelo Requerido e Contra-Interessada.
5 - Veja-se que não apreciou em detalhe e com a mínima profundidade, sequer, a questão da caducidade do direito de acção, questão de primordial importância, e que deveria preceder as demais, na medida em que a sua verificação constituiria obstáculo ao próprio conhecimento de mérito da causa.
6 - Nesse âmbito, incumbia em primeiro lugar ao Tribunal recorrido, atentar à data em que a Requerente IP tomou conhecimento do acto administrativo suspendendo, data essa que a Requerente confessa no seu requerimento inicial [vide artigos 1º e 17º, onde afirma que teve conhecimento do acto no dia 08.11.2016] e confirma na sua resposta [artigo 29º].
7 - Porém, por razões que não se consegue descortinar, o Tribunal recorrido nem sequer verteu essa data de 08.11.2016 para os factos provados, como deles também não fez constar a data da entrada da providência em juízo [e que se constata do SITAF ser o dia 11.07.2017], factos imprescindíveis para efeitos de contagem do prazo de exercício do direito de acção, com relevância para uma das soluções possíveis e plausíveis de direito - estarem em causa actos meramente anuláveis, regime-regra das invalidades em direito administrativo - questão essa tanto mais pertinente quanto oportunamente levantada em sede de Oposição, quer pela Contra-Interessada, quer pelo Requerido Município.
8 - Efectivamente, Requerido e Contra-Interessada excepcionam com a caducidade do direito de acção, pelo decurso do prazo de impugnação de 3 meses, previsto no artigo 58º, nº 1, alínea b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, motivos pelos quais estes factos tinham que integrar a matéria provada, para depois serem objecto da cuidada e aprofundada análise que se impunha desta matéria, a qual não sucedeu.
9 - Pelo exposto, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, por omissão de factos provados com interesse para a decisão, considerando todas as possíveis e plausíveis soluções de direito, e não só, a adoptada pelo Tribunal, devendo ser aditados os seguintes:
- A Requerente tomou conhecimento do acto administrativo suspendendo em 08.11.2016.
- A presente providência deu entrada em juízo no dia 11.07.2017.
10 - Mais se censura a ligeireza com que foi tratada esta primordial questão pelo Tribunal recorrido, que se limitou a concluir pela inexistência da caducidade, pela simples adesão à tese da Requerente de que estariam em causa nulidades e sem rebater ou sopesar qualquer dos argumentos aduzidos pelo Requerido e Contra-Interessada, no sentido de se tratarem sempre de anulabilidades, os quais constam dos artigos 32º, 34º, 35º a 38º, 39º e 40º e 49º a 55º da Oposição, para que por economia remetemos, e que damos por reproduzidos.
11 - Nada consta, porém, da sentença em crise, quanto a estes argumentos pela ora recorrente humildemente despendidos, sendo que, por mais fracos ou débeis que sejam ou fossem - e não são - eram sempre merecedores da análise e apreciação crítica do julgador, pelo menos, de forma a termos a certeza que assim não teria entendido o Tribunal a quo, e porque razão assim não teria entendido.
12 - Principalmente, atento o novo pressuposto de deferimento das providências de suspensão de eficácia, que é o fummus bonni iuris na sua formulação positiva, o qual, como refere Isabel Celeste Fonseca, "obriga a um juízo positivo de probabilidade através da "intensificação da cognição cautelar", ou seja, duma "apreciação mais profunda e intensa da causa".
13 - A cuidada ponderação entre argumentos de uma parte e outra era, portanto, indispensável. Tal como conclui e ensina o recente acórdão desse Tribunal superior de 07.07.2017 acima citado, «para que se possa concluir pela manifesta procedência da pretensão é necessário, num juízo sumário, que os fundamentos invocados pelo Requerente se superiorizem aos do Requerido, pois só nessa situação é possível concluir pela provável procedência da acção principal.»
14 - Todavia, não foi isso o que fez a sentença recorrida, que se limitou a aderir aos argumentos da Requerente, sem tecer o mínimo comentário crítico acerca dos argumentos em contrário aduzidos nos autos, fracos ou fortes, não interessa, sempre merecedores de uma apreciação, assim forçosamente se concluindo que o Tribunal recorrido violou o disposto no artigo 120º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, ao não ter levado a cabo a análise profunda e intensa que o juízo de prognose sobre a probabilidade de procedência da pretensão implicava.
15 - Refira-se, ademais, que a questão colocada à apreciação do julgador é tudo menos linear, fundando-se a invocada ilegalidade do acto em vícios cuja apreciação implica raciocínios manifestamente complexos através dos quais se transite de um inicial estado de dúvida para a certeza de que o vício afinal exista, não se compadecendo com a análise algo aligeirada como a que deles faz a sentença em crise, apenas olhando para os argumentos de uma das partes.
16 - Efectivamente, facilmente se constata que se tivessem sido devidamente ponderados todos os fundamentos opostos peia Contra-Interessada, chegaria o Tribunal «a quo» à conclusão de não verificação dos pressupostos legais para a adopção da providência previstos no artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
17 - Quanto ao requisito do periculum in mora, vemos da leitura da sentença que todo o raciocínio do julgador gira à volta da ideia de que a parcela objecto do destaque corresponde ao mesmo terreno da parcela alegadamente prometida vender à Requerente, que ela visa defender.
18 - Mal, porque isso não foi demonstrado, isso não resultou provado, motivo pelo qual se impugna os pontos 9 e 10 da matéria provada constante da sentença, que corresponde a matéria alegada pela Requerente nos itens 6º, 29º, 30º e 35º do requerimento inicial, e que foi expressamente impugnada pela Contra-Interessada na sua Oposição, pelo que era controvertida, donde nunca poderia ter sido dado como provada sem que sobre a mesma fosse produzida competente prova, o que não ocorreu, nem ela resulta dos documentos para que esses pontos 9 e 10 remete.
19 – Impugna-se assim, parcialmente, essas alíneas 9 e 10 da matéria provada, as quais devem ser expurgadas da afirmação «e na mesma área de terreno de onde foi feito o destaque de 3.847,60m2», além do mais, por ser ambígua.
20 - Sendo certo que, mesmo que estivesse demonstrado ter a Requerente pedido destaque para parcela sobreposta, sempre faltaria aferir - e isso não foi sequer alegado - se a Requerente pediu destaque para a exacta parcela objecto do contrato que celebrara com a Contra-Interessada.
21 - Falece, portanto, a fundamentação da sentença quanto à verificação do requisito do periculum in mora, a qual, de todo o modo, sempre faleceria por outras razões. E de monta.
22 - Afirma a sentença no 42 parágrafo da sua página nona, no excerto que infra citamos e subscrevemos, que de um ponto de vista jurídico e formal «a autorização de destaque não é passível de causar qualquer facto consumado, já que, em caso de procedência da acção, é possível retroceder, em termos registrais, à situação anterior ao destaque.»
23 - Desta afirmação, com que se concorda inteiramente, se retira que nada haverá a acautelar através da providência requerida.
24 - Se, em termos registrais que é onde se esgota o efeito externo do destaque - é possível, em caso de procedência da acção, retroceder à situação anterior ao destaque, então, mesmo indeferida a providência, nunca estaríamos na situação de irreversível estabilidade inerente ao que já está terminado ou acabado (vide acórdão de 31.10.2007 do Supremo Tribunal Administrativo citado).
25 - Salvo o devido respeito, nesse circunstancialismo nunca estaríamos perante a prolação de uma sentença que viesse a ser inútil, por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela.
26 - Mal andou, portanto, a sentença recorrida ao não ter retirado daquela afirmação a conclusão lógica de que, por isso, in casu, do não decretamento da providência não decorreria a constituição de uma situação de facto consumado.
27 - Acresce que o Destaque se esgota com a sua emissão e registo. A partir daí, desse acto em si, não surtem mais quaisquer efeitos, sendo totalmente descabida a divagação em que se enreda a sentença, em jeito de futurologia, daquilo que poderia acontecer, ou deixar de acontecer, entre a Contra-Interessada e outras partes, a propósito de intenções ou negócios que não estão em causa nos presentes autos e, bem assim, acerca do que eventualmente poderia ser «materializado» no terreno, tudo - repete-se - sem assento em qualquer alegação ou prova.
28 - A sentença em crise deixou-se levar, de forma apaixonada, no esforço de imaginar/ficcionar os prejuízos que, porventura, a Requerente poderia vir a sofrer, do ponto de vista material com o não deferimento da providência. Isto, sem que a Requerente tivesse alegado, sequer, que com o não decretamento da providência poderia vir a sofrer prejuízos de difícil reparação; quanto mais concretizado, e muito menos demonstrado, apesar de recair sobre si o respectivo ónus.
29 - Porém, "Continua a recair sobre o Requerente o ónus de fazer prova sumária dos requisitos do periculum in mora, enquanto receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o Requerente; e, se for caso disso, do fumus boni iuris, enquanto sumária avaliação da probabilidade de existência do direito invocado” - acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 24.02.2017, processo n.º 01003/16.9 PNF.
30 - Do que se vem de dizer, há que retirar a ilação de que a sentença enferma de nulidade, porquanto não pode o Tribunal se substituir à parte e apreciar eventuais prejuízos que não foram invocados, nos quais, aliás, a Requerente não estribou o seu pedido.
31- A sentença proferida é, por conseguinte NULA, por ter apreciado questões de que não podia tomar conhecimento, o que se invoca nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, d) do Código de Processo Civil.
32 -Também por outros motivos se encontra a sentença recorrida inquinada de nulidade: - é que, para além de apreciar os vícios invocados pela Requerente da providência, voluntariosa, a sentença vai mais longe e identifica até - pasme-se! - sem notificação para contraditório, um vício que não tinha sequer sido invocado (o previsto na alínea c) do nº 2 do artigo 161º do Código de Processo Administrativo), em gritante violação do disposto no nº 3 do artigo 95º do Novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
33 - Assim, tendo manifestamente excedido o seu objecto, a sentença é nula, o que se invoca nos termos do disposto no artigo 615º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil aplicável «ex vi» do artigo 1º do Novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
34 - Ainda a propósito do periculum in mora, errou o Tribunal recorrido na apreciação feita, na medida em que não vemos que a suspensão da eficácia do destaque tenha efeitos sobre qualquer licenciamento a que haja lugar no prédio que resultou do destaque.
35 - Na verdade, o destaque esgota todos os seus efeitos com a sua emissão e registo. Qualquer materialização ou prática de actos no prédio nenhuma relação tem a ver com o destaque em si.
36 - Por todo o exposto, e uma vez que, tal como bem considera a sentença, a autorização de destaque não é passível de causar qualquer facto consumado, já que, em caso de procedência da acção, é possível retroceder, em termos registrais, à situação anterior ao destaque, é forçoso de concluir pela não verificação do requisito do periculum in mora.
37 - Também, se o Tribunal «a quo» tivesse cuidado de sopesar os argumentos de Requerente e Requerido, haveria de concluir pela não verificação do requisito do "fummus bonni iuris".
38 - Desde logo, pela caducidade do direito de impugnação, resultante do facto a aditar as factos provados - da Requerente ter tido conhecimento do acto de destaque em 8 de Novembro de 2016 e de ter dado entrada da providência em 14 de Julho de 2017, de onde decorre já então se encontrar esgotado o prazo de 3 meses para a impugnação do acto, atento o regime regra das invalidades, que é o da anulabilidade.
39 - Acresce que, tal como alegado na oposição, não se verifica nenhuma das nulidades invocadas pela Requerente.
40 - Veja-se que o vício invocado pela Requerente a título principal, a que se refere a alínea a) do artigo 161º, nº 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos alegado, tanto não tem qualquer pertinência que não foi sequer aplicado pela sentença recorrida.
41 - Quanto ao segundo vício invocado quase subsidiariamente, pela Requerente, referente à alínea c) do ditado normativo, da impossibilidade do objecto, salvo o devido respeito, deveria ter merecido o mesmo exacto tratamento, atenta a sua manifesta falta de cabimento.
42 - Observe-se que, para a operação urbanística de destaque ter lugar, basta que tenha por objecto um prédio que não tenha sido objecto de operação de destaque nos dez anos anteriores, como decorre do disposto no nº 6 do artigo 6º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, o que era o caso do prédio da Contra-Interessada em causa nos autos. Por isso, o seu objecto é, como era, possível.
43 - Estamos perante uma operação isenta de controlo prévio, conforme decorre do artigo 6º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, o que quer dizer que a mesma não dá lugar a procedimento de licenciamento para prévia verificação da conformidade desta operação com as normas em vigor, limitando-se a câmara municipal a atestar que se verificam os requisitos do destaque através da emissão da certidão de destaque. A implicação prática disto é que, como é por demais evidente, não cumpre à Câmara Municipal indagar nada mais do que isso.
44 - Salvo o devido respeito, não há lugar, no caso de operações isentas de controle prévio, ao saneamento do processo, pelo que, contrariamente ao afirmado na sentença, não tinha o município que dar cumprimento ao disposto no nº 7 do artigo 11º, que só tem lugar nos casos de procedimentos de comunicação prévia ou licenciamento. A emissão de um destaque é algo muito singelo que se consubstancia na emissão da certidão certificativa do cumprimento dos requisitos do destaque, e que por isso não está sujeito às mesmas exigências procedimentais dos demais procedimentos urbanísticos.
45 - Isto posto, temos que cai por terra o fundamento da sentença em crise, de que o município, por força daquele artigo 11º, n.º 3, do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação tinha que aguardar que a questão prévia fosse dirimida pelos tribunais.
46 - Acresce que a construção jurídica em que a sentença se baseia é demasiado complexa para ser alicerçada numa prova sumária, no âmbito da providência, tanto mais quanto, maxime, poderemos porventura, com o registo do destaque, estar perante um acto ineficaz, o que tem uma disciplina jurídica própria, distinta da do acto impossível.
47 - Refira-se ainda que andou mal o Tribunal «a quo» ao pretender tirar mais consequências do averbamento registrai feito em 21.06.2016 da pendência de uma providência cautelar entre a IP e a CV, do que aquelas que, rigorosamente se podem tirar. É que o que foi registado foi a propositura de uma, providência cautelar com determinado pedido, o que é algo distinto do registo de uma decisão judicial.
48 - Daí decorre que, efectivamente, a única coisa que o município podia percepcionar desse registo, era a existência de um dissídio entre as partes referente a um contrato-promessa e a inerente pretensão, por parte da Requerente IP, a que a outra obrigada contratual se abstivesse de praticar os concretos actos e negócios jurídicos enunciados no pedido registado.
49 - Ora, da leitura desse pedido, e tão só, nada mais se podia retirar senão que a Requerente da providência tinha peticionado judicialmente o decretamento de uma providência que intimasse a Contra-Interessada a se abster de celebrar outros contratos-promessa, de compra e venda com eficácia real ou obrigacional, arrendamentos ou outros contratos que possam onerar o prédio, de constituir hipotecas ou outras garantias, ou dispor do prédio.
50 - Assim, é por demais evidente que da leitura do registo, nada mais poderia o município retirar, pelo que não tem cabimento as considerações tecidas na sentença acerca da decisão tomada na providência cautelar cível, e referida nos pontos 4 e 5 da matéria assente - com que, ademais, se discorda - uma vez que o município não sabia, nem tinha obrigação de saber, de conhecer, o teor dessas decisões, tomadas num processo judicial ao qual era totalmente alheio.
51 - Mesmo que, porém assim não fosse - e demonstramos que é - refira-se ainda que, ao contrário do que entendeu a sentença, vigorando o princípio da auto-responsabilização das partes, a providência cautelar a que se refere o registo não impedia a modificação do prédio, pois isso não foi peticionado no Pedido formulado na providência e decretado, não tendo a interpretação defendida pela Requerente o mínimo suporte no texto do pedido que formulou. Efectivamente do pedido formulado pela Requerente, na providência cautelar a que alude o registo, não consta, na sua taxativa enunciação, a abstenção de prática de actos de destaque.
52 - Mal andou, também por isso, o Tribunal «a quo», na interpretação que faz do decidido naquela sentença cautelar e seu alcance, uma vez que nunca estaria em causa o vício previsto na alínea 1) do 161º do Código de Procedimento Administrativo que, sem observância do contraditório [como supra invocámos] a sentença entendeu poder se verificar.
53 - Resulta assim que, não verificando provável a existência de qualquer vício sancionado com a nulidade, imp8e-se inelutavelmente a conclusão da CADUCIDADE do direito de impugnação, por parte da Requerente, tendo a sentença, violado, por isso, o disposto no artigo 58º nº 1 al. b) do CPTA e ainda o artigo 161º, alínea c) do Código de Procedimento Administrativo.
54 -Assim, não demonstrado o requisito do “fummus bonni iuris", deveria, também e sempre a providência requerida ser indeferida.
55 - Por último, quanto ao critério enunciado no nº 2 do artigo 120º do Novo Código de Procedimento Administrativo, da ponderação dos interesses públicos e privados em presença, temos para nós que, de igual forma, mal andou o Tribunal a quo na ponderação que faz.
56 - No contraponto entre os interesses público e privados em presença, não atentou, por exemplo, que a entidade com a qual a Contra-Interessada celebrou o contrato-promessa da parcela objecto do destaque, o destina à edificação e instalação de um centro de inspecções de veículos automóveis, no âmbito de candidatura junto do IMTT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres), visando a prossecução, através do mesmo, de interesse público relevante, a saber, assegurar melhor cobertura do território nacional de centros de inspecção automóvel, para maior segurança na circulação rodoviária.
57 - É um dado objectivo, que consta da cláusula quarta do contrato-promessa dado como provado em 15 (documento 3 junto com a oposição) e que, atentando ao destino da parcela de terreno, como faz a sentença em crise, então, por via do princípio do dispositivo, deveria também ser considerado.
58 - Trata-se, por conseguinte e afinal de contas, de um relevante interesse público, que está em causa e que a sentença, ao suspender o acto, e com isso pretender que nada seja legalizado ou construído no terreno destacado, desacautela completamente, permitindo que durante os (previsíveis) longos anos da pendência dos autos, fique toda uma população sem a devida cobertura de centros de inspecção automóvel.
59 - Trata-se, para mais, já não de um interesse de índole local, mas nacional e numa área particularmente sensível, como a da segurança rodoviária.
60 - Assim, ponderados os interesses em jogo, e contrabalançando este aos interesses particulares em presença, é evidente dever prevalecer o Interesse Público, pois os danos que resultariam da sua concessão para o interesse público seriam muito superiores aos que podem resultar da sua recusa, o que sempre haveria de justificar o não decretamento da providência.
61 - Também, por isso, a sentença deve ser revogada, pela violação do disposto no artigo 120º nº 1 e 2 do Novo Código de Procedimento Administrativo.
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II – Matéria de facto.
1. O erro no julgamento da matéria de facto - alíneas 9 e 10 da matéria indiciariamente provada.
Defende a Recorrente CV que deve ser expurgada a afirmação, contante da matéria de facto provada sob as alíneas 9 e 10, «e na mesma área de terreno de onde foi feito o destaque de 3.847,60m2», por ter sido impugnada e, além do mais, por ser ambígua.
Argumenta que os pontos 9 e 10 da matéria provada constante da sentença, que corresponde a matéria alegada pela Requerente nos itens 6º, 29º, 30º e 35º do requerimento inicial, e que foi expressamente impugnada pela Contra-Interessada na sua Oposição; pelo que era controvertida, donde nunca poderia ter sido dado como provada sem que sobre a mesma fosse produzida competente prova, o que não ocorreu, nem ela resulta dos documentos para que esses pontos 9 e 10 remetem.
Mas sem razão nesta parte.
Embora tenha, por mera referência aos artigos 6º, 30º e 35º - que disse não corresponder à verdade (artigo 2º da sua oposição) – e ao artigo 9º do requerimento inicial – que disse não ser do seu conhecimento (artigo 4º da sua oposição) – impugnou a matéria em causa sem especificamente dizer quais os factos que negava.
Ora os factos em concreto dados como, sumariamente, provados, resultam dos documentos juntos com o requerimento inicial como n.ºs 3,9 e 10 cuja genuinidade e autenticidade não foram postos em causa.
Quanto à dedução dos requerimentos, data e conteúdo, não há qualquer razão para os pôr em causa, face ao teor dos documentos apresentados.
O que, de resto, a Requerente pretende pôr em causa é que os pedidos de destaque, formulados num e noutro dos requerimentos tenham objectos coincidentes, a mesma parcela de terreno.
Invoca que não ficou provado que os pedidos de destaque dados entrada pela Requerente da providência na Câmara Municipal da Trofa, em 20.01.2017 e 30.01.2017, o primeiro em nome da Contra-Interessada e o segundo em seu nome, se referem ao destaque de parcela de terreno com a área de 4.000m2 sobre o prédio em causa e na mesma área de terreno onde foi feito o destaque de 3.847,60m2.
Mas não diz sobre que terreno, sendo diferente, foi feito o segundo pedido de destaque.
Na verdade apenas se vê neste caso a possibilidade de negar o facto afirmado, de que coincidem num e noutro pedido as parcelas de terreno a destacar, fazendo a afirmação de uma realidade diferente, ou seja, uma impugnação motivada. O que não foi feito.
E, no artigo 66º da oposição acaba por reconhecer que os dois pedidos de destaque têm como objecto a mesma parcela de terreno: “… na medida em que sobre a parcela destacada ficou a impender o registo da providência cautelar feito através da Ap. S da Ap.2991 de 2016/06/21, sendo julgada procedente, com trânsito em julgado, a acção de execução específica a intentar pela requerente contra a contra-interessada, serão automaticamente cancelados os registos subsequentes, nomeadamente o destaque da parcela”.
Sobreposição de objecto do destaque que serviu, de resto, ao indeferimento do pedido de emissão de certidão de destaque a favor da Requerente, como ficou provado sob o n.º 13. Sem qualquer reparo.
Termos em que, nesta parte, não se impõe alterar, antes se impõe manter, a matéria de facto dada como sumariamente provada.
Pretende ainda esta Recorrente, que sejam aditados os seguintes factos, com relevo para a decisão da excepção da caducidade que invocou:
× A Requerente tomou conhecimento do acto administrativo suspendendo em 08.11.2016.
× A presente providência deu entrada em juízo no dia 11.07.2017.
Na verdade, embora a excepção da caducidade tenha sido invocada em relação à acção principal e, portanto, relativamente à providência cautelar assuma a natureza de questão de mérito (a existência ou não de fumus boni iuris, ser ou não provável o êxito da acção principal), certo é que tem interesse para a decisão da providência, precisamente por se prender com o mérito desta, segundo uma das soluções plausíveis, a pugnada pelos Recorrentes.
Factos que se devem ter por assentes, face ao teor do próprio processo (data de entrada em juízo), bem como dos artigos 1º e 17º do requerimento inicial, do artigo 29º da resposta à matéria de excepção suscitada pela CV, e da conclusão 34ª das contra-alegações ao recurso da CV.
Daí que devesse ser matéria de facto considerada no elenco dos factos indiciariamente provados.

Deveremos assim ter por sumariamente provados os seguintes factos:
1) A Requerente e a Contra-Interessada celebraram, a 13.11.2013, contrato de arrendamento com opção de compra, cujo objecto é uma parcela de terreno de 4000 m2 a destacar sobre o prédio rústico da Contra-Interessada sito no lugar de ….., Trofa, inscrito na matriz predial sob o artigo ….. e descrito na Conservatória do Registo Predial da Trofa sob o n.º …...
- Documento 3 junto com o requerimento inicial.
2) A Requerente fez registar sobre o prédio rústico da Contra-Interessada, sito no lugar de ….., na União das freguesias de Bougado (S. Martinho e Santiago) do concelho da Trofa, descrito na Conservatória do Registo Predial, Comercial e Automóveis da Trofa sob o n.º ….. e inscrito na matriz predial rústica sob o n.º ….., desde 21.06.2016, a existência de procedimento cautelar não especificado, bem como procedimento cautelar de arresto.
- Documento 5 junto com o requerimento inicial.
3) Constando da certidão de registo do referido prédio a seguinte descrição:
“Seja ordenada a intimação da Requerida (ora sujeito passivo) para que esta se abstenha de vender a terceiro o prédio, bem assim para se abster de celebrar quaisquer outros contratos promessa, de compra e venda, com eficácia real ou meramente obrigacional, arrendamentos ou contratos de qualquer outra natureza, que possam onerar o prédio, devendo ainda abster-se de constituir hipotecas ou outras garantias, reais ou pessoais, ou, por qualquer outra forma, dispor do prédio.
(…)
Seja decretado o arresto do prédio”.
- Documento 5 junto com o requerimento inicial.
4) O procedimento cautelar correu termos na 2.ª Secção Cível, Instância Central, J5 do Tribunal da Trofa, sob o n.º 644/16.9TBPVZ, tendo sido proferida a 15.06.2016 sentença que indeferiu o decretamento da providência, a qual (sentença) veio a ser revogada por acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13.09.2016 que determinou o decretamento da providência requerida.
- Documentos 6 e 7 juntos com o requerimento inicial.
5) A Contra-Interessada deduziu oposição à providência decretada, tendo sido proferida sentença a 02.06.2017 que a julgou totalmente improcedente mantendo a providência cautelar requerida.
- Documento 8 junto com o requerimento inicial.
6) A Contra-Interessada apresentou, a 12.09.2016, ao Município requerido um pedido de destaque de parcela de terreno com a área de 3847,60 m2 a desanexar do prédio referido em 2).
- Documento 1 junto com o requerimento inicial.
7) O pedido de destaque foi instruído com certidão de registo predial onde constava já as descrições referidas em 2) e 3).
- Documento 1 junto com o requerimento inicial.
8) O supra referido pedido de destaque de parcela de terreno foi autorizado por deliberação tomada em sede de reunião ordinária pública da Câmara Municipal da Trofa de 29.09.2016, com base na informação prestada pela Divisão de Planeamento, Urbanismo e Obras Particulares constantes do processo n.° 132/16-A/1889/2016.
- Documento 2 junto com o requerimento inicial.
9) Em 20.01.2017 a Requerente, em nome da Contra-Interessada, deu entrada de um pedido de destaque de parcela de terreno com área de 4.0002 sobre o prédio em causa e na mesma área do terreno de onde foi feito o destaque de 3.847,60m2;
- Documentos 3 e 9 juntos com o requerimento inicial.
10) E, em 30.01.2017, a Requerente, agora em seu nome, e em substituição do pedido anteriormente apresentado, deu entrada de novo pedido de destaque de parcela de terreno com área de 4.000m2 sobre o prédio em causa e, na mesma área do terreno de onde foi feito o destaque de 3847,60m2;
- Documento 10 junto com o requerimento inicial.
11) A 09.01.2017 foi registado no prédio em causa o destaque da parcela de 3847,60 m2, através da Apresentação n.° 2050, tendo também ficado registado o ónus de não fraccionamento, tendo sido atribuído ao destaque a descrição …/…;
- Documentos 11 e 12 juntos com o requerimento inicial.
12) A Requerente instaurou acção judicial contra os registos referidos supra.
- Documentos 11 e 12 juntos com o requerimento inicial.
13) Em 16.05.2017 em resposta à notificação feita pelo Tribunal da Trofa no âmbito da acção cautelar que corre termos sob o n.º 644/16.9T8PVZ, o requerido Município informou que não emitia a certidão de destaque de 4000 m2 sobre o terreno em causa, com fundamento na existência da certidão de destaque n.° CE/84/2016 para uma parcela de 3847,60m2 datada de 07.10.2016, e não ter decorrido o prazo de 10 anos sobre a emissão desta certidão.
- Documento 13 junto com o requerimento inicial.
14) A Contra-Interessada iniciou pedido de licenciamento tem por objecto o terreno destacado, procedimento que corre termos no Município requerido sob o n.º 66/17.
15) A Contra-Interessada celebrou a 04.04.2016 contrato promessa de compra e venda que versa sobre a parcela destacada, sendo comprador a sociedade ODE, Gestão e Organização de Empresas e Imobiliária.
- Documento 3 junto com a oposição da Contra-Interessada.
16) O pedido de arresto apresentado no Tribunal Judicial pela Requerente foi indeferido por acórdão transitado em julgado a 04.10.2016.
- Documento 5 junto com a oposição.
17) A Requerente tomou conhecimento do acto administrativo suspendendo em 08.11.2016.
18) A presente providência deu entrada em juízo no dia 11.07.2017.
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III - Enquadramento jurídico.
1. Nulidade da sentença.
Determina a alínea d) do n.º1, do artigo 615º, do Código de Processo Civil (de 2013), aplicável por força do disposto no artigo 1º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que a sentença é nula quando “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Este preceito deve ser compaginado com a primeira parte do n.º2, do artigo 608º, do mesmo diploma (com sublinhado nosso): “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.
Conforme é entendimento pacífico na nossa jurisprudência e na doutrina, só se verifica nulidade da sentença por omissão de pronúncia quando o juiz se absteve de conhecer de questão suscitada pelas partes e de que devesse conhecer (cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão), p.140; e acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09).
O erro de direito não se integra no conceito de falta de fundamentação ou omissão de pronúncia.
O erro no enquadramento jurídico leva à revogação da sentença e não à declaração de nulidade, nos termos da invocada norma da alínea b), do n.º1 do artigo 615º do actual Código de Processo Civil.
A nulidade só ocorre quando a sentença ou acórdão não aprecie questões suscitadas e não argumentos apresentados no âmbito de cada questão, face ao disposto nos artigos 697º e 608º do Código de Processo Civil de 2013 (artigos 659º e 660º do Código de Processo Civil de 1995).
Efectivamente, o tribunal não tem de se pronunciar sobre todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes, mas apenas fundamentar suficientemente em termos de facto e de direito a solução do litígio.
Questões para este efeito são todas as pretensões processuais formuladas pelas partes, que requerem a decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer acto especial, quando realmente debatidos entre as partes (Antunes Varela, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 122º, página 112), não podendo confundir-se as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões, argumentos e pressupostos em que fundam a respectiva posição na questão (Alberto dos Reis, obra citada, 143, e Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, volume III, 1972, página 228).
No mesmo sentido se orientou a jurisprudência conhecida, em particular os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 09.10.2003, processo n.º 03B1816, e de 12.05.2005, processo n.º 05B840; os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 21.02.2002, processo n.º 034852 (Pleno), de 02.06.2004, processo n.º 046570, e de 10.03.2005, processo n.º 046862.
O excesso de pronúncia é o vício inverso, tomar conhecimento de questões de que não se podia conhecer, por não terem sido suscitadas nem serem de conhecimento oficioso.
Feitas estas considerações genéricas, vejamos as nulidades da sentença invocadas em concreto.

1.1. O não conhecimento da excepção da caducidade do direito de acção (conclusões 1ª a 3ª do Município).
Diz o Recorrente Município que a decisão recorrida não se pronunciou sobre a excepção de caducidade “do exercício do Direito”.
Mas sem razão.
A caducidade que foi suscitada foi a do direito de acção, ou seja, da acção principal, de impugnação, e não a caducidade do direito a intentar a própria providência cautelar.
A invocada caducidade não assume, portanto, a natureza de excepção no contexto da providência cautelar, antes se situando na apreciação do respectivo mérito.
Trata-se de determinar se existe fumus boni iuris em relação ao processo principal, se será “provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente - parte final do n.º1 do artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Sendo provável a procedência da excepção, não será provável ou êxito da acção.
Sobre esta matéria é dito na decisão recorrida:
“Embora o Município requerido nos artigos 10º e ss. faça referência ao que aparentam ser duas exceções (ilegitimidade e caducidade), por se reportarem ambas ao direito que a requerente pretende fazer valer e não autónoma ou propriamente à pretensão cautelar, a alegação constante dos artigos 10º a 21º da oposição do Município serão apreciadas a propósito do fumus boni iuris. A este propósito veja-se a oposição da contrainteressada em que esta mesma matéria vem alegada a propósito desse requisito legal.”
E, a propósito do requisito fumus boni iuris:
“… conforme refere a requerente, afigura-se provável a procedência da invocação da nulidade do ato suspendendo no processo principal, já que a decisão tomada, ignorando a pendência de um processo cautelar registado na própria certidão predial e cuja existência não podia, portanto, passar por desconhecida, autoriza um destaque impossível de realizar por a parcela de terreno não permitir, por decisão judicial, oneração ou fragmentação, devendo manter-se no estado em que se encontra até que caduque a providência cautelar decretada (artigo 161.º, n.º 2, al. c) do CPA).
“Assim, também não se afigura que exista caducidade do direito que a requerente pretende fazer valer.
Na verdade, decorre do próprio artigo 58.º, n.º 1 do CPTA que o atos nulos não estão sujeitos a prazo. Assim, sendo provável a procedência da ação principal e que o ato se encontre viciado com ilegalidade de reconduzir ao regime da nulidade, então não haverá prazo e, consequentemente, não se verifica caducidade do direito que a requerente pretende fazer valer no processo principal.
A isto acresce que, face à complexidade da situação, e o envolvimento de várias jurisdições, e não sendo a requerente parte do procedimento conducente ao destaque, sempre se afigura provável a aplicação do artigo 58.º, n.º 3, al. c) do CPTA”.
Ao contrário do invocado, a decisão recorrida pronunciou-se, e em sede própria, sobre a invocada caducidade.
Improcede, pois, esta arguição de nulidade.

1.2. A consideração de factos e de vícios não invocados; preterição do contraditório (conclusões 27º a 33º da CV).
A consideração de factos não invocados e a preterição do contraditório não é tomar conhecimento de questão de que não se deva ter conhecimento.
A sentença recorrida, bem ou mal, melhor ou pior fundamentada, apreciou todas as questões que lhe competia conhecer e cingiu-se ao objecto da providência: a verificação – ou não – dos requisitos a que alude o artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, tendo concluído, pela positiva, que se verificava a aparência do bom direito, a possibilidade de se verificar facto consumado e a ocorrência de prejuízos de difícil reparação para o Requerente, cujos interesses, finalmente, entendeu que deviam prevalecer sobre os demais aqui em causa.
A consideração de factos não invocados, sem assegurar o contraditório, poderia constituir uma irregularidade processual, com repercussões na validade da sentença, se não se tratassem de factos instrumentais, pois neste caso o juiz pode tê-los em conta oficiosamente – artigos 5º, n.º2, e 607º, n.º4, do Código de Processo Civil.
De todo o modo, a sentença, no julgamento, sumário, da matéria de facto não alinhou qualquer facto que não tivesse sido invocado.
A própria Recorrente CV de essencial sobre este ponto diz, nas suas conclusões:
“27 - Acresce que o Destaque se esgota com a sua emissão e registo. A partir daí, desse acto em si, não surtem mais quaisquer efeitos, sendo totalmente descabida a divagação em que se enreda a sentença, em jeito de futurologia, daquilo que poderia acontecer, ou deixar de acontecer, entre a Contra-Interessada e outras partes, a propósito de intenções ou negócios que não estão em causa nos presentes autos e, bem assim, acerca do que eventualmente poderia ser «materializado» no terreno, tudo - repete-se - sem assento em qualquer alegação ou prova.
28 - A sentença em crise deixou-se levar, de forma apaixonada, no esforço de imaginar/ficcionar os prejuízos que, porventura, a Requerente poderia vir a sofrer, do ponto de vista material com o não deferimento da providência. Isto, sem que a Requerente tivesse alegado, sequer, que com o não decretamento da providência poderia vir a sofrer prejuízos de difícil reparação; quanto mais concretizado, e muito menos demonstrado, apesar de recair sobre si o respectivo ónus.”
Ou seja, a própria Recorrente admite que não se tratam de factos julgados como sumariamente provados mas de conjecturas.
O que o Tribunal recorrido fez, sempre contido no tema sob juízo, foi conjecturar sobre factos futuros previsíveis, prejudiciais para a Requerente, de difícil reparação e resultantes, na sua óptica, do acto suspendendo.
Certa ou errada esta conjectura, de factos futuros previsíveis – que se insere na análise jurídica da causa e não no julgamento da matéria de facto -, contém-se dentro de uma das questões que importava abordar: a existência - ou não – de uma situação de facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação resultantes do acto suspendendo.
É uma conjectura redundante e desnecessária, como veremos, mas não extravasa o objecto da decisão cautelar.
Por outro lado, cingindo-se os factos sumariamente provados aos factos invocados, a análise e consideração de vícios, ainda que não expressamente invocados, a partir de tais factos, é legal e não constituiu excesso de pronúncia.
Como se dispõe no artigo 95º, n.º2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos:
“Nos processos impugnatórios, o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas contra o ato impugnado, excepto quando não possa dispor dos elementos indispensáveis para o efeito, assim como deve identificar a existência de causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas, ouvidas as partes para alegações complementares pelo prazo comum de 10 dias, quando o exija o respeito pelo princípio do contraditório”.
No caso, a verificação dos vícios do acto suspendendo, referidos na sentença, não constituem questões novas, dado que tais vícios não são analisados no âmbito da acção principal, como questões autónomas, mas apenas, perfunctoriamente, no âmbito de uma questão que se impunha apreciar na providência cautelar, a da existência – ou não – de bonus fumus iuris, pelo que não se impunha assegurar o contraditório.
Também esta arguição de nulidade, em suma, improcede.

2. Os pressupostos da suspensão da eficácia do acto impugnado.
2.1. O perigo de criação de um facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação.
Determina a primeira parte do n.º 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2015 (aplicável no tempo ao caso):
“Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adoptadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal…” .
Quanto ao requisito do periculum in mora, refere Mário Aroso de Almeida O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 2005, 4ª edição revista e actualizada, página 260: “se não falharem os demais pressupostos, a providência deve ser concedida se dos factos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade”.
Continua este autor a referir que a providência deve também ser concedida, “sempre pressupondo que não falhem os demais pressupostos (...) quando os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que se a providência for recusada, essa reintegração no plano os factos será difícil (…), ou seja, nesta segunda hipótese, trata-se de aferir da possibilidade de se produzirem “prejuízos de difícil reparação”.
Por seu lado quanto a esta questão, refere Vieira de Andrade, in “A Justiça Administrativa” 4º edição página 298, que:
“O juiz deve, pois, fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil, por se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por entretanto se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstem à reintegração específica da sua esfera jurídica”.
Analisando a nossa situação concreta, conclui-se que da imediata execução do acto resultará uma situação de facto consumado, com consta do requerimento inicial (artigos 79º e 80º) e da decisão recorrida, e tanto basta, sem mais considerandos, para se dar como verificado este requisito, do periculum in mora.
Isto sendo certo que a existência da partícula “ou” na primeira parte do n.º 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, entre o requisito “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado” e o requisito “produção de prejuízos de difícil reparação” deixa claro que os mesmos são alternativos e não cumulativos.
Ora, na verdade, é incontornável que o acto impugnado esvazia de sentido útil a providência cautelar requerida pela ora Recorrida e que foi deferida por acórdão da Relação do Porto de 13.09.2016 - factos provados sob os números 3 a 5.
Consta desse acórdão, além do conteúdo decisório, transcrito nos factos provados, o seguinte, transcrito no ponto 33 da oposição do Município: “… é válido o contrato-promessa de compra e venda que tenha por objecto uma parcela a destacar de um prédio rústico”, e “enquanto o destaque não tiver sido efectuado, não é lícito recurso à acção de execução específica”, acrescentando-se que “tal circunstância não obsta, porém, que seja instaurado procedimento cautelar como preliminar de uma ação de execução específica daquele contrato”, e que “o destaque da parcela apenas tem que estar efectuado quando for instaurada a acção de execução específica”.
A emissão de certidão de destaque a favor da Contra-Interessada impede a emissão de idêntica certidão, sob a mesma parcela de terreno, a favor da Requerente no prazo de dez anos – facto provado sob o n.º 14.
E a impossibilidade temporária de obter o destaque da parcela de terreno em causa a favor da Requerente, impede, nesse período, a execução específica do contrato, nos termos do citado acórdão.
Possibilidade que, precisamente, se visou acautelar com o decretamento da providência.
Diz a Contra-Interessada no já citado artigo 66º da sua oposição: “… na medida em que sobre a parcela destacada ficou a impender o registo da providência cautelar feito através da Ap. S da Ap.2991 de 2016/06/21, sendo julgada procedente, com trânsito em julgado, a acção de execução específica a intentar pela requerente contra a contra-interessada, serão automaticamente cancelados os registos subsequentes, nomeadamente o destaque da parcela”.
Só que, não referiu a Contra-Interessada, a execução específica não será possível enquanto se mantiver o destaque a seu favor, autorizado pelo acto suspendendo.
Termos em que se considera verificado o requisito do periculum in mora, tal como decidido na decisão recorrida, com outros argumentos acrescidos mas que no caso se mostram redundantes.

2.2. O êxito da acção principal; a caducidade do direito de acção.
A segunda parte do n.º 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (de 2015) determina:
“ … e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.”
Face ao teor deste preceito - que não distingue agora entre providências conservatórias, como o pedido de suspensão da eficácia de um acto, e providências antecipatórias - é necessário, além do mais, que seja “provável que a pretensão formulada ou a formular no processos principal venha a ser julgada procedente para que uma providência antecipatória possa ser concedida. Como, neste domínio, o requerente pretende, ainda que a título provisório, que as coisas mudem a seu favor, sobre ele impende o encargo de fazer prova sumária do bem fundado da sua pretensão deduzida no processo principal” – Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005, página 609.
Não se trata aqui da exigência de uma prova mais profunda e intensa da causa. Exige-se agora para as providências conservatórias e para as providências antecipatórias o mesmo juízo perfunctório e sumário que antes se exigia apenas para as providências conservatórias no contencioso administrativo.
O mesmo juízo perfunctório que se exigem, de resto, para as providências cautelares do processo civil, pois o requerente também aí deve demonstrar, sumariamente, a “probabilidade séria da existência do direito” – artigo 368º, n.º1, do Código de Processo Civil.
Sob pena de se aproximar, se não de se confundir, o processo cautelar ao processo principal.
O juízo sobre o êxito da acção principal, ainda sumário, não é mais intenso ou aprofundado agora para as providências cautelares conservatórias, apenas distinto: exige-se, como antes para as providências antecipatórias, não apenas que não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular no processo principal ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito, passando agora a exigir-se, em todo o tipo de providências, que seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
A diferença não está na profundidade ou intensidade do juízo sobre o êxito da acção principal, sempre sumário, mas antes no tipo de juízo sobre a probabilidade de êxito: o êxito da acção deve agora ser provável, numa formulação positiva, e não apenas não ser improvável, numa formulação negativa.
Ou seja: o êxito da acção principal deve ser mais provável para que a providência - conservatória ou antecipatória – seja julgada procedente e não se exige que o juízo sobre o êxito seja mais intenso ou profundo.
A maior exigência, agora, para as providências cautelares conservatórias, está na arguição de fundamentos para a procedência da acção principal e não na análise desses fundamentos.
O procedimento cautelar caracteriza-se pela sua instrumentalidade, (dependência da acção principal), provisoriedade (não está em causa a resolução definitiva de um litígio) e sumariedade (summaria cognitio do caso através de um procedimento simplificado e rápido (Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, Lex, 1997, paginas 228 a 231).
Feitas estas considerações genéricas, debrucemo-nos sobre o caso concreto.
A questão da presunção da legalidade dos actos (conclusão 8ª do Município) não tem aqui relevo, porque o acto suspendendo é manifestamente nulo como veremos.
O acto suspendendo viola frontalmente a autoridade de caso julgado formado pelo acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 13.09.2016, a que alude o ponto 4 dos factos provados, sendo nulo face ao disposto na alínea i) do n.º 2 do artigo 161º do Código de Procedimento Administrativo (de 2015, aplicável ao caso).
A validade deste fundamento – adiantado nos artigos 4º, 55º e 98º do requerimento inicial - é forte e não necessita de profundas indagações.
Tal como acima já se consignou, a deliberação de 29.09.2016 de autorização do destaque a favor da Contra-Interessada, aqui suspendenda, esvazia todo o efeito útil da decisão final, transitada em julgado, na acção cautelar interposta e registada, o acórdão da Relação do Porto, de 13.09.2016.
A autoridade de caso julgado não exige para se impor que haja a tríplice identidade de sujeitos, de objecto e de decisão que se exige para a excepção de caso julgado (ver neste sentido o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 06.09.2011, processo 816/09.2TBAGD.C1 – ponto 6 do sumário).
“Ainda que se não verifique o concurso dos requisitos ou pressupostos para que exista a excepção de caso julgado (exceptio rei judicatae), pode estar em causa o prestígio dos tribunais ou a certeza ou segurança jurídica das decisões judiciais se uma decisão, mesmo que proferida em outro processo, com outras partes, vier dispor em sentido diverso sobre o mesmo objecto da decisão anterior transitada em julgado, abalando assim a autoridade desta” – ponto III do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21.03.2013, processo 3210/07.6TCLRS.L1.S1.
Quanto à autoridade do caso julgado do referido acórdão do Tribunal da Relação do Porto relativamente ao Município da Trofa apesar de não ter sido parte na referida providência cautelar cível, é também indiscutível, face ao imposto na Constituição da República Portuguesa.
A Administração Pública está não só obrigada a respeitar as decisões dos Tribunais, sejam ou não parte nos pleitos, como devem coadjuvar os Tribunais na implementação das suas decisões – artigos 202º e 205º da Constituição da República Portuguesa.
O que se compreende: estando a Administração Pública sujeita à legalidade, está também sujeita á legalidade definida pelo Tribunais, dado que a lei não distingue - artigo 266º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, e artigo 3º do Código de Procedimento Administrativo.
Não se trata aqui de uma questão de direito privado. Trata-se do interesse público em respeitar e fazer respeitar as decisões dos Tribunais.
Basta este fundamento para declarar nulo o acto.
Verifica-se, também, o requisito fumus boni iuris, tal como decidido mas sem necessidade de outros argumentos, porque redundantes.

2.3 A ponderação de interesses.
Não existe qualquer interesse público na imediata execução do acto suspendendo.
Pelo contrário, existe o interesse público no respeito por uma decisão judicial que o acto impugnado seja suspenso na sua execução.
Quanto aos demais interesses em jogo, apenas os da Requerente, porque os únicos compatíveis com o julgado da Relação do Porto, são dignos se de tutela jurídica e de serem aqui atendidos.
Isto sem perder de vista o invocado pela própria Contra-Interessada, ora Recorrente, na conclusão 27ª das suas alegações:
“Acresce que o Destaque se esgota com a sua emissão e registo. A partir daí, desse acto em si, não surtem mais quaisquer efeitos, sendo totalmente descabida a divagação em que se enreda a sentença, em jeito de futurologia, daquilo que poderia acontecer, ou deixar de acontecer, entre a Contra-Interessada e outras partes, a propósito de intenções ou negócios que não estão em causa nos presentes autos e, bem assim, acerca do que eventualmente poderia ser «materializado» no terreno, tudo - repete-se - sem assento em qualquer alegação ou prova”.
Conclui-se, em suma, que também este requisito se verifica, impondo-se o deferimento da providência cautelar, tal como decidido.
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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantém a decisão recorrida.
Custas por cada um dos Recorrentes em cada recurso.
Porto, 26.01.2017
Ass. Rogério Martins
Ass. Luís Garcia
Ass. Alexandra Alendouro