Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02201/16.0BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/11/2022
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:IFADAP, APOIO PROGRAMA - EIXO PRIORITÁRIO PROMAR, MEDIDA “DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DAS ZONAS DE PESCA”:
ILEGALIDADE APOIO - REVOGAÇÃO - PRAZO.
Sumário:1 . O acto de aprovação da candidatura ao Programa PROMAR constitui um verdadeiro acto constitutivo de direitos, à luz da art.º 167.º, n.º3 do CPA/2015.

2 . Este acto constitutivo de direitos pode ser revogado por ilegalidade - revogação anulatória, à luz do art.º 141.º do CPA 1991 - correspondente ao art.º 168 do CPA/2015 - anulação administrativa - diploma aplicável ao caso dos autos, atento o princípio tempus regit actum -, concretamente pela circunstância de se ter considerado que o projecto não se enquadrava no Eixo prioritário em causa.

3 . Tendo-se concluído que a entidade administrativa revogou implicitamente um anterior acto constitutivo de direitos - aprovação da candidatura - afastada a aplicação do prazo de revogação de um ano permitido pelo art.º 141.º do CPA1991, em nome do primado da legislação europeia, mostra-se aplicável o prazo de 4 anos, previsto no Reg. CEE 2988/95 (arts. 2.º e 4.º), ainda não decorrido à data da decisão, que apenas finalizaria em 2016.*
* Sumário elaborado pelo relator
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:

I
RELATÓRIO

1 . "V., SA", com sede na Av. (…), inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto, datada de 31 de Maio de 2021, que julgou improcedente a acção administrativa instaurada contra “INSTITUTO de FINANCIAMENTO da AGRICULTURA e PESCAS, IP – IFAP, IP”, por inverificação das diversas invalidades suscitadas e onde peticionava o seguinte:
"a) Decretar-se que não se verificam preenchidos os fundamentos de facto e de Direito alegados na decisão final do Réu e, consequentemente, que a Autora não incumpriu a legislação aplicável ao Programa "PROMAR", e, por isso, a operação é elegível e a comparticipação financeira do valor de € 123.192,05 não deve ser devolvida;
b) Declarar-se a decisão final proferida pelo Réu nula e de nenhum efeito, por manifesta impossibilidade de revogação desse mesmo acto administrativo produzido anteriormente e consolidado na ordem jurídica, assim como por usurpação de poder do órgão decisor;
c) Sentenciar-se que o acto administrativo se encontra ainda eivado dos vícios de forma, por omissão da formalidade da falta de fundamentação, e vício de violação de lei, geradores da respectiva anulabilidade, declarando-se afectado por tais invalidades;
d) Mais deverá considerar-se reprinstinado o acto primário emitido pelo Réu, válido, e assim vinculativo para Autora e Réu, ou, assim não sendo, deverá condenar-se o Réu a emitir o acto administrativo devido, que satisfaça a pretensão da Autora, considerando-se elegível a operação e a consequente atribuição do co-financiamento do valor de € 123.192,05".
*
Nas suas alegações, a recorrente formulou as seguintes conclusões (renumerando-se as mesmas a partir da 56.º por esta numeração se encontrar repetida):
"1 – Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nestes autos que julga a presente ação administrativa totalmente improcedente e, em consequência, absolve a entidade demandada dos pedidos formulados pela autora.
2 - Nos presentes autos de ação administrativa, colocam-se ao conhecimento do tribunal as seguintes questões:
c) Ilegalidade da decisão proferida pelo IFAP, no sentido de resolver o contrato de financiamento firmado com a autora;
d) Condenação do réu a, por via de repristinação do ato primário ou prática de novo ato administrativo, considerar elegível a atribuição do financiamento de € 123.192,05.
3 - A fundamentação da pretensão da recorrente assenta de facto nos seguintes aspetos:
i - Ilegalidade da revogação da prévia de decisão que aprovou a candidatura, que tem ínsito o respetivo enquadramento no programa PROMAR, e respetivo Eixo prioritário;
ii - Errada interpretação e aplicação do Direito, no que respeita ao enquadramento do projeto e do promotor, bem como pela irrelevância do facto de o espaço em que o projeto foi executado se encontrar cedido na sua exploração a entidade terceira;
iii- Falta de fundamentação;
iiii- Violação do direito de audiência prévia e usurpação de poder.
4 - Na interpretação do ato administrativo deve ter-se em conta as circunstâncias em que foi proferido e o seu fim legal, atendendo-se primacialmente aos termos da declaração do órgão administrativo, elemento textual, ao tipo legal de ato, aos seus antecedentes procedimentais e às demais circunstâncias em que foi emitido, elemento histórico, aos motivos que levaram o órgão a atuar e ao fim ou interesse que procurou alcançar, elemento racional e às praxes administrativas, sem prejuízo da eventual consideração de elementos posteriores à prática do ato, desde que suscetíveis de revelar o sentido com que o ato foi adotado pela Administração.
5 - Resulta dos factos provados a autora apresentou uma candidatura ao abrigo do PROMAR, programa que, ao nível europeu, obedecia ao disposto no Regulamento (CE) n.º 1198/2006, de Conselho, de 27.07.2006, relativo ao Fundo Europeu das Pescas, diploma que foi revogado pelo Regulamento (UE) n.º 508/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15.05.2014. Este Regulamento n.º 1198/2006 tinha como finalidade a definição do quadro do apoio comunitário a favor do desenvolvimento sustentável do sector das pescas, das zonas de pesca e da pesca interior, sendo certo que os objetivos concretamente visados eram expostos no art.º 4.º do diploma.
6 - No art.º 44.º deste mesmo Regulamento encontram-se elencadas as medidas elegíveis.
7 – Um dos objetivos visados pelo PROMAR consiste em assegurar o desenvolvimento sustentado das zonas costeiras cf. alínea d) do n.º 2 do art.º 2.º do DL n.º 81/2008.
8 - Além disso, o diploma em análise também fixa as condições gerais de acesso dos promotores, bem como as condições gerais de admissibilidade dos projetos (cf. artigos 4.º e 5.º), e ainda elenca - artº 6º - o conjunto de despesas que são consideradas como não elegíveis.
9 – Interessa-nos aqui apreciar a interpretação e aplicação do disposto no artº 12º do citado DL. Nº 81/2008 que estabelece o regime relativo à resolução e modificação do contrato;
10 - Na formulação da sua pretensão a recorrente começa por salientar que a decisão administrativa constitui uma revogação ilegal da decisão que aprovou a candidatura, considerando-a enquadrada no Eixo do PROMAR em apreço. Além disso, frisa que o projeto foi também escrutinado aquando da análise dos pedidos de pagamento, no âmbito dos quais nunca se questionou a elegibilidade das despesas, bem como sempre colaborou com o que lhe foi solicitado no âmbito do controlo de qualidade realizado antes dos pagamentos.
11 – Por conseguinte, a decisão administrativa que aprovou a candidatura é constitutiva de direitos da recorrente. Aliás, não fosse a aprovação da candidatura a recorrente não teria procedido á execução do respetivo projeto.
12 - Subscrevendo-se aqui o que consta a este respeito na sentença recorrida “Com efeito, o IFAP está certo quando diz que o ato de aprovação leva à celebração de um contrato de financiamento, e que a execução deste contrato é depois controlada; e só com a verificação do cumprimento das obrigações contratualmente assumidos pelo beneficiário este terá direito ao apoio, ou à sua consolidação (nos casos em que já o recebeu).”
“O problema é que essa não é a questão que se coloca nos autos, no que à parte do enquadramento do projeto no Eixo em causa diz respeito. Neste particular, a decisão administrativa versa sobre o enquadramento do próprio projeto, e não somente sobre o cumprimento das obrigações contratuais. Ou seja, vem agora dizer-se que o projeto, afinal, não se enquadra no Eixo em questão; só que essa aferição tem de ser feita aquando da aprovação da candidatura/projeto, sendo certo que, se a mesma não respeitar ao Eixo indicado, não pode sequer ser aprovada.
Basicamente, falamos aqui da aprovação da candidatura, que é prévia à execução do
contrato, e não desta última. E daí que o argumento se nos apresente como falacioso, por misturar problemas que não se confundem.”
Na verdade, o ato de aprovação da candidatura tem de ser considerado como ato constitutivo de direitos; não do direito a receber os fundos (porque tal depende da celebração do contrato e, dependendo do programa em causa, da sua execução, podendo haver adiantamentos, pagamentos parciais, mas pelo menos do direito a celebrar o contrato; ou seja, a decisão de aprovação, constitui na esfera jurídica do interessado o direito a que a mesma se enquadre no programa em causa, e respetivo Eixo e medida.”
13 – Discorda-se, contudo, da decisão recorrida na medida em que admite como válida a decisão de revogação que designa com “revogação anulatória implícita”, por confronto na interpretação e aplicação do Direito Europeu sobre o Direito nacional.
14 – Desde logo, porque a referida revogação não se encontra fundamentada e não se verificam os pressupostos legais para o efeito, designadamente nenhuma ilegalidade se verifica na aprovação da candidatura/projeto, que permita sequer uma interpretação de supremacia legislativa.
15 - Ainda que se pretenda aplicar a legislação europeia em supremacia à lei nacional é forçoso existir fundamentação de facto, o que no caso sob apreciação não se verifica.
16 – Ainda que estivéssemos perante um erro na aprovação da candidatura/projeto, o que não se admite, por este respeitar todos os parâmetros legais, não basta socorrer-se da legislação europeia para justificar o injustificável.
17 – O alegado prazo de 4 anos a que se alude na sentença recorrida, que o IFAP dispunha para a revogação da decisão de aprovação do financiamento encontrasse ultrapassado.
18 – Sendo certo que, o que está em causa já não é apenas a revogação da aprovação do financiamento, mas da própria execução do projeto. Pois, não podemos olvidar que, por força da aprovação do projeto, a recorrente executou-o.
19 – Por conseguinte, a recorrente discorda frontalmente da fundamentação encontrada na sentença recorrida para sustentar a revogação da decisão administrativa sob apreciação nesta ação.
20 - Pela aplicação do art.º 141.º, n.º 1, do CPA de 1991, estamos perante uma revogação anulatória ilegal;
21- E, não é possível fazer-se aplicar uma disposição comunitária ou europeia que verse em específico sobre a matéria, com prejuízo para o regime do CPA, sem se se verifique fundamentação adequada para o efeito.
22 - Aliás, a fundamentação do ato administrativo constitui exigência que se encontra plasmada no nº 3 do artº 268º Constituição da República Portuguesa e que não é suscetível de qualquer sobreposição legislativa europeia.
23 - A fundamentação de toda e qualquer decisão administrativa, fundamentação maior ou menor conforme o caso concreto, simples ou complexa consoante o caso concreto, implica sempre, naturalmente, um discurso justificativo assente em raciocínios fundamentadores e explicativos, o que não se verifica na decisão da recorrida.
24 - Do “Erro na aplicação do direito quanto ao enquadramento do projeto no eixo em causa, ao incumprimento dos objetivos visados e ainda quanto à relevância da cessão de exploração.”
25 - Discorda-se também do entendimento acolhido na sentença recorrida no que respeita ao enquadramento do projeto em causa. Com efeito, em causa está necessariamente o fim que é previsto na alínea b) do n.º 1 do art.º 44.º do reestruturação e reorientação das atividades económicas, nomeadamente através da promoção do ecoturismo, desde que essas atividades não resultem num aumento do esforço de pesca 2.º do Anexo III da Portaria n.º 828-A/2008, de 08.08.
26 - Como se explana detalhadamente na petição inicial, argumentos estes que não foram devidamente ponderados para o enquadramento respetivo, projeto em causa não tem enquadramento nas citadas disposições;
reestruturação e reorientação das atividades económicas, nomeadamente através da promoção do ecoturismo, desde que essas atividades não resultem num aumento do esforço de pesca.”
27 - A al. a) do n.º 1 do art.º 44.º do Regulamento permite projetos que reforcem a competitividade das zonas de pesca; resultando claro que a candidatura ocorre também neste âmbito, como se pode perceber da justificação para a mesma.
28 - Sendo assim de censurar a interpretação da entidade administrativa ao excluir a atividade em cusa, classificando-se a talassoterapia como ecoturismo, no sentido de atividade turística que promove a observação e a apreciação direta da natureza, de forma sustentável. Sendo certo que não resulta da decisão administrativa a exclusão da talassoterapia como ecoturismo.
29 – Podendo não se afigurar da maior relevância para a apreciação do assunto sobre que versa o presente recurso, não pode a recorrente deixar de se referir à questão da cedência da exploração do centro de talassoterapia. Pois, sendo a cessão de exploração uma forma de pareceria empresarial, a recorrente nunca deixa de contribuir diretamente para os objetivos a que se propôs no projeto. Registando-se, contudo, que, de facto, nunca a recorrida colocou em causa que pudessem ser atingidos os objetivos propostos, por ser verificar a cessão.
30 - Da “Violação do dever de fundamentação
31 - Além dos vícios materiais anteriormente analisados, a recorrente alega ainda a violação do dever de fundamentação, por considerar que a entidade demandada não enquadra juridicamente, de modo algum, o comportamento que lhe é assacado.
32 – A decisão impugnada não possui a fundamentação exigível nos termos legais, uma vez que não expõe nem concretiza em que medida o comportamento descrito na decisão administrativa constitui uma violação legal que determine a rescisão contratual e restituição do valor comparticipado pelo recorrido e recebido pela recorrente.
33 - Os artigos 124.º e 125.º do CPA, em concretização do nº 3 do artigo 268.º da CRP consagram, respetivamente, o dever geral de fundamentação dos atos administrativos e os respetivos requisitos, que consiste “na enunciação explicita das razões que levaram o seu autor a praticar o ato e a dotá-lo de certo conteúdo”.
34 - Impõe-se assim aos órgãos administrativos o dever de exteriorizarem as razões de facto e de direito que estão na base das respetivas decisões, de molde a permitir, entre o demais, ao destinatário normal reconstituir o itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela Administração e dessa forma conhecer as razões pelas quais decidiu em determinado sentido e não noutro.
Neste sentido Acórdãos do STA de 07.03.95, P. n.º 34024., de 29.05.2001. P. n.º 46950), do TCAN, de 11/02/2011, P. n.º 00920/06.9BECBR; de 27/05/2011, P. n.º 00090/09.0BEBRG.
35 - Estes normativos correspondem ao cumprimento do postulado no atual artigo 268.º, n.º3 da C.R.P., no qual se consagra o dever de fundamentação e correspondente direito subjetivo do administrado à fundamentação, sendo que, com a consagração de tal dever, se visa harmonizar o direito fundamental dos cidadãos a conhecerem os fundamentos factuais e as razões legais que permitem a uma autoridade administrativa conformar-lhes negativamente a esfera jurídica com as exigências que a lei impõe à administração de atuar, na realização do interesse público, com presteza, eficácia e racionalidade.
36 – Para que cumpra as suas funções deverá permitir que um destinatário médio consiga reconstituir o iter cognoscitivo, bem como as razões, de facto e de direito, que determinaram a adoção de um ato com determinado conteúdo.
Vd. Acórdão STA de 10/09/08, processo nº 65/08, publicado em www.dgsi.pt
37 - A fundamentação tem de ser suficiente e congruente.
38 – Contrariamente ao sustentado pelo recorrido e acolhido na sentença recorrida, o ato sob apreciação nesta ação, aferido segundo os critérios de experiência comum e da lógica do homem médio (do bónus pater familias), não se encontra devidamente fundamentado, dado que não contém os elementos e pressupostos de direito necessários e suficientes para esclarecê-la sobre as razões determinantes da decisão tomada, mais propriamente, qual a norma que determina ou legitima a revogação da decisão de aprovação da candidatura/projeto, quando este já se encontra executado.
39 - Importa analisar a dimensão da exposição dos fundamentos de direito no ato impugnado e, nessa medida, a factualidade apurada não permite concluir que o ato se encontra devida e suficientemente fundamentado quanto ao enquadramento legal que o motivou.
40 - O que se comprova pelo facto de a decisão final proferida pelo recorrido apenas identificar os factos, sem cuidar de analisar e externalizar a sua conformidade à luz das normas legais relativas à elegibilidade, bem assim as que habilitam legalmente a entidade a rescindir o contrato.
41- O ato em causa é omisso quanto ao elemento de juridicidade em que se suporta a decisão, sendo que estatui o n.º 1 do artigo 125.º do CPA que têm que ser expostos os fundamentos de direito da decisão.
42 - A decisão tomada pelo recorrido, após identificar cada um dos factos apurados, não explica de que forma os mesmos – e se é que entende que viola – se mostram desconformes com as regras nacionais e comunitárias que regulam os critérios de elegibilidade dos pedidos de apoio e de pagamento
43 - Na pretensão deduzida sob a forma de impugnação de um ato administrativo - cfr. artigos 37.º, n.º 1, alínea a), e 51.º ambos do CPTA -, estamos diante de um contencioso de mera legalidade, devendo o Tribunal forçosamente formular o juízo sobre a legalidade do ato sindicado em função da fundamentação contextual integrante de facto e de direito, estando vedado ao tribunal valorar razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação, sobretudo as eleitas posteriormente na pendência do meio impugnatório.
44 – Analisado o ato ora impugnado, falha qualquer veleidade do recorrido procurar apenas em sede contencioso apresentar os fundamentos jurídicos que alegadamente suportam a decisão em crise. A fundamentação tem que ser coeva do ato emitido, não se apresentando a contestação como meio idóneo para a incluir a fundamentação omitida.
45 – Nesta medida, discorda-se ainda da sentença recorrida, na medida em que considera que o ato administrativo sob apreciação se encontra fundamentado, acolhendo a tese do recorrido, que “chama a atenção para a circunstância de ser necessário atender a todo o procedimento administrativo, e não apenas ao texto comunicado à autora, nomeadamente no que respeita ao relatório da Inspeção-geral de Finanças ali referido.”
46 – Salientando-se ainda as contradições da própria decisão recorrida que, ora valoriza ora desvaloriza determinadas circunstâncias, como é o caso de “ seja porque a autora não explora diretamente as instalações nas quais foi realizado o investimento, seja porque não cumpriu o objetivo de valorizar os produtos da pesca, ou ainda de reforço da competitividade das zonas de pesca ou de restruturação e reorientação das atividades económicas.”
47 – Contradição reiterada a fls. 31 da sentença recorrida que cita o seguinte “a simples existência da cessão de exploração do espaço no qual foi executado o projeto nunca foi fundamento para a decisão; pelo contrário, o que se diz na decisão administrativa é que nem direta, nem indiretamente (pelo cessionário) se constatou o cumprimento dos objetivos propostos.”
48 – Devendo a fundamentação encontrar-se expressa na própria decisão, o que, como já se referiu, não ocorre no caso sob apreciação, por falta de exposição dos fundamentos de direito do ato impugnado, conclui-se pela verificação do vício de falta de fundamentação.
49 - Deste modo, em face de tudo quanto se expendeu, deve julgar-se procedente, por provado, o vício de falta de fundamentação do ato impugnado, o que gera a anulação da decisão impugnada.
50 - Da “violação do direito de audiência prévia”
51 - A este respeito alega a recorrente a violação do direito de audiência prévia, por entender que a decisão ocorreu em “flagrante omissão de pronúncia ... das razões plasmadas … no … direito de audiência prévia.
52 - É incontornável que a audiência de interessados, como figura geral do procedimento administrativo de primeiro grau, constitui um afloramento da diretiva constitucional de “participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito”, proclamada no artigo 267.º nº5 da CRP, impondo ao órgão administrativo competente a obrigação de associar o administrado à tarefa de preparar a decisão final.
53 – Imperativo se torna concluir que a audiência prévia dos interessados, no procedimento administrativo, configura um princípio estruturante da atividade administrativa, portanto, uma formalidade legal essencial, cuja inobservância fere o ato de anulabilidade por vício de procedimento, exceto quando não haja lugar a diligências instrutórias prévias cfr. art.º 100.º nº 1, 1.º segmento, a contrario sensu, do CPA e/ou nos casos de dispensa dessa audiência, expressamente previstos no artigo 103.º do CPA.
54 - Assim sendo, afigura-se que o Tribunal a quo não fez uma correta interpretação dos factos e do direito aplicável, porquanto o recorrido não considerou a pronúncia apresentada pela recorrente. Sendo manifestamente insuficiente fazer-se constar da decisão que não acolhe a argumentação da recorrente por forma a sustentar a projetada decisão.
55 – Pelo que, também se deve concluir pela procedência deste vício.
56 - Não pode a recorrente conformar-se com a decisão recorrida, uma vez que, desde a apresentação da candidatura/projeto até à sua execução manteve sempre uma atitude séria e transparente e cumpriu todas as disposições legais aplicáveis.
57 – Não se tendo verificado qualquer desvio nos fundamentos, pressupostos e organização do projeto que foi devidamente aprovado.
58 – Por isso, não se verificou qualquer motivo que permitisse a revogação da candidatura/projeto.
59 – Sendo certo que, se não podia ser revogada a decisão de aprovação da candidatura/projeto pelas razões atras explanadas, o facto de ter sido executado em conformidade com a respetiva aprovação, impede definitivamente a sua revogação.
60 – Se a candidatura/projeto não tivesse sido aprovado a recorrente não o teria executado o investimento nos termos em que o fez.
61 – Por isso, se algum erro nos pressupostos ocorreu, o que não é invocado para a revogação do ato administrativo sob apreciação, só o recorrido terá de assumir a responsabilidade. Tendo inclusive precludido o prazo para tal invocação".
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Notificadas as alegações, apresentadas pela recorrente, supra referidas, nada disse a entidade recorrida - IFAP,IP.
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A Digna Magistrada do M.º P.º, notificada nos termos do art.º 146.º, n.º1 do CPTA, não emitiu Parecer.
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Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Ex.mos Juízes Desembargadores adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
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2 . Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.

II
FUNDAMENTAÇÃO
1 . MATÉRIA de FACTO
São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida, cuja fidelidade e completude não são questionados neste recurso:
1. A autora dedica-se à atividade hoteleira, no âmbito da qual explora, na localidade costeira da Praia Norte, cidade de Viana do Castelo, uma unidade hoteleira de quatro estrelas, com restaurante, denominada “Hotel (...)” – facto não controvertido.
2. Em 30.03.2012, a autora apresentou candidatura à obtenção de um incentivo financeiro no âmbito do “PROMAR – Programa Operacional Pesca/Eixo 4/Desenvolvimento Sustentável das Zonas de Pesca”, o qual recebeu o número 31-04-01-FEP-168, referente à operação designada “Banhos Quentes da Praia Norte” – cf. documento n.º 1 junto com a petição inicial, e documento de fls. 385 a 415 do processo administrativo apenso.
3. Com essa candidatura, a autora propunha-se a criar um centro de talassoterapia e SPA, ascendendo o montante total de investimento a € 284.471,94 – cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial, e documento de fls. 394 a 415 do processo administrativo apenso aos autos.
4. No formulário de candidatura pode ler-se nomeadamente o seguinte:
(…)
Secção II
Parte B – Caracterização do Projeto
1 – Pedido de Apoio
1.1 – Caracterização do Pedido de Apoio
Ações Portaria n.º 828-A/2008 Ação 2) – Diversificação e reestruturação das actividades económicas e sociais
Tipologia Portaria n.º 828-A/2008 i) Integração das actividades do setor com outra actidades económicas
(…)
2 – Caracterização do Projeto
Descrição do projeto, fundamentação (razões que justificam a apresentação da candidatura) e atividades a desenvolver no âmbito do projeto. Deverá ainda identificar a metodologia associada à sua conceção e montagem, circuito comercial, novidade no negócio/tipo de projeto e inovação na forma de gestão do projeto.
O projecto visa a criação de uma oferta única na região de um Centro de Talassoterapia e SPA (Sanitas Per Aqua), que proporcionará tratamentos fisioterapêuticos pela água do Mar, com adequada captação da água, filtragens de ar e dosagens convenientes às terapias.
Para o efeito será necessário a realização de investimentos em infra-estruturas e equipamentos que possibilitem uma verdadeira oferta de SPA/Talassoterapia, até agora inexistente.
Esta nova valência constituirá um importante instrumento de diferenciação da oferta na região contribuindo como elemento agregador da identidade do Hotel (...), muito ligada ao mar, invocando as características endógenas de proximidade com o Mar e de utilização da água do mar para os respectivos tratamentos.
Ver mais informação no Estudo de Viabilidade Económico-Financeiro.
3 – Objetivos do Projeto
Na perspectiva da região onde se insere, são objectivos do projecto:
- Valorização económica dos produtos endógenos de proximidade, pelo estímulo ao fornecimento de materiais derivados do mar a utilizar nos tratamentos, em particular produtos frescos e algas desidratadas;
- Valorização dos produtos frescos derivados da pesca pela ligação estreitado Centro de Talassoterapia e SPA à ementa do restaurante do Hotel (...), que terá destaques temáticos diários relacionados com produtos frescos do Mar em complemento aos Programas oferecidos no “novo” Centro de Talassoterapia e SPA;
- Melhoria da oferta turística na região pelo reforço da complementaridade entre Centro de Talassoterapia e SPA, Hotel e Restaurante temático;
Ver mais informação no Estudo de Viabilidade Económico-Financeiro.
(…)” - Cf. documento n.º 1 junto com a petição inicial, e documento de fls. 394 e 415 do processo administrativo apenso aos autos.
5. Com a candidatura, a autora apresentou ainda um estudo de viabilidade do projeto a implementar, em que se pode ler o seguinte:
(…)
O Hotel (...) dispõe igualmente de um Health and Fitness Club & SPA com 2 mil metros quadrados explorado pela empresa S. onde o cliente do Hotel pode encontrar um centro de fitness, 1 piscina interior de água salgada aquecida, sauna, banho turco, solário, duche escocês, duche Vichy, massagem subaquática, tratamentos de estética, rosto e corpo, fisioterapia e uma piscina exterior coberta de água salgada aquecida com circuito de jactos- cascata, torre de massagem, circuito de contra corrente com pedras e jactos bem como um jacuzzi.
(…)” - Cf. documento de fls. 177 a 231 do processo administrativo apenso aos autos.
6. Os referidos centros de talassoterapia e SPA, segundo a candidatura apresentada, ficariam instalados no edifício do hotel gerido pela autora, e já existente – cf. documento de fls. 177 a 231 do processo administrativo apenso aos autos.
7. Já nessa data, o espaço existente no referido hotel destinado a “Health and Fitness Club & SPA”, no qual seria executado o projeto candidatado, encontrava-se a ser explorado por outra entidade, designada S., mediante cedência feita pela autora a esta – facto não controvertido.
8. Após a respetiva análise técnica, em 20.04.2012 esta candidatura foi aprovada por decisão do grupo de acção costeira do litoral norte – GAC alto Minho, e, em seguida, a 07.09.2012, pela respetiva Unidade de Gestão do PROMAR 2007-2013 – cf. documentos de fls. 500 a 538 do processo administrativo apenso aos autos.
9. Na sequência desta aprovação, entre a autora e o IFAP foi firmado, em 15.11.2012, documento escrito intitulado “contrato de financiamento”, identificado pelo número 31002056/0, em que se pode ler o seguinte:
(…)
1 – Cláusulas Específicas
Cláusula 1.ª – Identificação da Operação
O presente contrato respeita ao pedido de apoio apresentado pelo beneficiário no âmbito da operação abaixo identificada.
Nº da Operação: 31-04-01-FEP-168
Designação da operação: Banhos Quentes da Praia Norte
Eixo: Desenvolvimento Sustentável das Zonas de Pesca
Programa: Promar – Continente
Sub-Programa: ---
Medida: Desenvolvimento Sustentável das Zonas de Pesca
Acção: Grupo de Acção Costeira Litoral Norte
Sub-Acção: Diversidade e reestruturação das actividades económicas
Tiplogia: Diversidade e reestruturação das actividades económicas
Componente: ---
(…)
Diploma de enquadramento Tipo: PORT Número: 828-A/2008 Data: 2008-08-08
(…)
3. Condições Gerais
(…)
B – Obrigações Gerais
Sem prejuízo de outras, designadamente de natureza legal ou regulamentar, e sempre que aplicável, constituem obrigações do Beneficiário:
B.1. Aplicar integralmente o apoio para os fins para que foi concedido, cumprindo pontualmente os compromissos e as obrigações previstas neste contrato, no regulamento específico e na demais legislação aplicável;
B.2. Assegurar os demais recursos financeiros necessários, cumprindo pontualmente as obrigações para o efeito contraídas junto de terceiros de forma a não perturbar a cabal realização dos objectivos previstos;
B.3. Manter integralmente os requisitos de concessão do apoio objecto deste contrato, bem como as condicionantes que forem estabelecidas;
B.4. Comunicar à Autoridade de Gestão, por escrito, no prazo de dez dias sobre a sua ocorrência, todos os factos susceptíveís de interferir na normal execução da operação nos termos aprovados;
B.5. Manter toda a documentação relativa ao projecto organizada até três anos após a data de encerramento do PROMAR, incluindo nomeadamente, documentos susceptíveis de comprovar as informações prestadas aquando da candidatura, bem como todos os documentos comprovativos da realização das despesas e respectivos pagamentos;
B.6. Não afectar, não alienar, ou por qualquer outro modo onerar, no todo ou em parte, os bens e serviços adquiridos no âmbito dos projectos de investimento apoiados, sem prévia autorização da Autoridade de Gestão, no prazo de cinco anos após a conclusão do projecto, considerando-se para esse efeito a data de pagamento da factura correspondente à última despesa do projecto, ou até ao final do prazo de reembolso do subsídio reembolsável, caso este seja superior;
B.7. Solicitar, por escrito, à Autoridade de Gestão, prévia e fundamentadamente, com o devido suporte documental e obter desta autorização expressa para todas as alterações aos investimentos ou à operação;
B.8. Publicitar, quando seja devido, o co-financiamento do projecto no local da sua realização, a partir da data da celebração deste contrato;
B.9. Cumprir os preceitos legais a que se encontra obrigado no que respeita à realização da despesa e sempre que aplicável, comprovando-a com documentos fiscalmente aceites e sem prejuízo do cumprimento das regras relativas à contratação pública;
B.10. Efectuar todos os movimentos financeiros relativos ao projecto (pagamentos e recebimentos) exclusivamente através da conta indicada neste contrato, mediante transferência bancária ou cheque;
B.11. Apresentar um relatório final, decorrido um ano após a conclusão material do investimento, de acordo com o modelo a fixar pela Autoridade de Gestão;
B.12. Cumprir as obrigações fiscais a que está sujeito, designadamente, declarando e contabilizando os apoios auferidos pelo presente contrato;
B.13. Manter as condições legais necessárias ao exercício da respectiva actividade, nomeadamente quanto à sua situação em matéria de licenciamento ou autorização de instalação do estabelecimento;
B.14. Por si, ou através dos seus representantes legais ou institucionais, permitir o acesso aos locais de realização das operações e àqueles onde se encontrem os elementos e os documentos necessários, nomeadamente os de despesa, assim como proporcionar as condições adequadas para os fins de acompanhamento, de fiscalização e de controlo da operação, nas suas componentes material financeira e contabilística;
B.15. Fornecer todos os elementos necessários à caracterização e à quantificação dos indicadores de realização e de resultado quando exigíveis, das operações apoiadas;
B.16. Respeitar as disposições relativas à perenidade das operações de investimento;
B.17. Proceder à reposição dos montantes objecto de correcção financeira decididos pelas entidades competentes, nos termos definidos pelas mesmas e que constarão, discriminadamente. da notificação formal da constituição de dívida.
(…)
D. Resolução e Modificação do Contrato
D.1. No caso de incumprimento pelo Beneficiário de qualquer das suas obrigações, ou da inexistência ou desaparecimento, que lhe seja imputável, de qualquer dos requisitos da concessão do apoio ou da prestação de falsas informações sobre a situação do projecto ou de viciação dos documentos fornecidos nas fases de candidatura ou acompanhamento do projecto, o IFAP pode rescindir unilateralmente o contrato;
D.2. Pode o IFAP, no caso de incumprimento de que derive a impossibilidade de execução parcial dos projectos, proceder apenas à modificação unilateral do contrato, nomeadamente quanto à redução do montante dos apoios.
(…)”;
Cf. documento n.º 3 junto com a petição inicial, e documento de fls. 558 a 564 do processo administrativo apenso aos autos.
10. Por missiva de 22.11.2013, a aqui autora comunicou à CIM Alto Minho, enquanto parceiro gestor que acompanhava o desenvolvimento do projeto, o seguinte:
(…)
Em abril de 2012 deu entrada nesses serviços a candidatura identificada em epígrafe tendo merecido a respectiva aprovação do GAC em 13 de setembro de 2012 (V/ref. 271/2012SF).
Em 5 de novembro de 2012 fomos notificados pelo IFAP (ref 126286/DAI/UNCQ/NCTR/2012) da decisão final de aprovação da candidatura em carta assinada pelo seu Presidente do Conselho Directivo.
Em 19 de novembro de 2012 recebemos o Contrato de Financiamento n° 31002056/0.
Decorrido mais de um ano sobre a sua assinatura que julgávamos vinculativa dos dois outorgantes, esta sociedade promoveu, realizou e pagou o investimento contratualizado com um nível de execução superior a 80%.
Contrariamente ao estabelecido pelas boas regras do procedimento administrativo, às diversas interpelações oriundas de diversas fontes, em tempo útil foi dada a devida resposta às questões apresentadas quer pelo IFAP quer pela CIM.
Com o devido respeito, o resultado das sucessivas dilatações traduziram-se exclusivamente no incumprimento dos pressupostos iniciais por parte da entidade financiadora, leia-se reembolso dos investimentos contratualizados.
A sociedade V., SA não incorpora no seu código de conduta e ética empresarial este tipo de procedimentos, razão que a leva a denunciar, com efeitos imediatos, o contrato em epígrafe.
Nessa mesma conformidade, pretende-se a imediata devolução de todos os documentos entregues no âmbito deste procedimento.
(…)” - Cf. documento n.º 4 junto com a petição inicial, e documento de fls. 578/579 do processo administrativo apenso aos autos.

11. A referida CIM respondeu à aqui autora por missiva datada de 04.12.2013, em que se pode ler o seguinte:
(…)
Na sequência do V. ofício, datado de 23 de novembro de 2013, referente ao processo de Controlo de Qualidade ao Pedido de Pagamento ao projeto em epígrafe que está a ser efetuado pelo Instituto de Financiamento da Agricultura e das Pescas (IFAP), vimos pelo presente colocar à V. consideração o seguinte:
Não obstante compreendermos a posição de V. Exas, fruto das diversas questões que têm vindo a ser colocadas pelo IFAP no âmbito do processo de Controlo de Qualidade (por circunstâncias alheias, como se sabe, à vontade desta Comunidade Intermunicipal), cujo pleno esclarecimento é condição necessária para assegurar o pagamento da comparticipação pública das despesas apresentadas, a CIM Alto Minho, enquanto organismo intermédio responsável pela análise e acompanhamento do projetos, gostaria de ver este processo resolvido de forma rápida e positiva para todas as partes.
Neste contexto, estamos a ultimar uma 3ª resposta à análise efetuada pelo IFAP que pretende dar um contributo decisivo para a - assim o esperamos - rápida e definitiva resolução das questões ainda por sanar.
Para vos podermos apresentar a nossa posição, vimos, assim, por este meio, solicitar o agendamento de reunião com V. Exas. em data a articular com essa entidade.
(…)- Cf. documento n.º 4 junto com a petição inicial, e documento de fls. 580 do processo administrativo apenso aos autos.
12. Entretanto, a autora solicitou a alteração do termo do prazo de execução do projeto para 14.11.2014, o que foi aceite – cf. documentos de fls. 581 a 586 do processo administrativo apenso aos autos.
13. Por missiva de 08.01.2015, a entidade demandada comunicou à autora que, em face da determinação da autoridade de gestão do PROMAR, lhe concede o apoio financeiro de € 123.192,05 – cf. documento n.º 6 junto com a petição inicial.

14. Tendo a mesma entidade procedido ao pagamento à autora daquela quantia de € 123.192,05 – facto não controvertido.
15. Entretanto, a Inspeção-Geral de Finanças realizou auditoria ao sistema de gestão e controlo do GAC alto Minho, tendo sido analisado, além de outros, o projeto da ora autora; neste sentido, por missiva datada de 28.10.2015, a entidade demandada comunica à autora a sua intenção de retirar o financiamento concedido; esse ofício foi acompanhado de excerto do relatório elaborado por aquela Inspeção-Geral, em que se pode ler o seguinte:
(…)
"Operação n.º 31-04-01-FEP-168, designada «Banhos Quentes da Praia Norte», enquadrada na Ação “Diversificação e reestruturação das atividades económicas e sociais", do promotor V., SA, detentor do Hotel (...), onde está instalado o investimento cofinanciado pelo FEP.
Conforme consta do Formulário de Candidatura, o investimento consiste, essencialmente, na «criação de um Centro de Talassoterapia e SPA, que proporcionará tratamentos fisioterapêuticos pela água do mar».
A candidatura foi enquadrada nos termos do Anexo III, da Portaria n.º 828-A/2008, de 8 de agosto, na tipologia prevista na subalínea i), da alínea b), do art.º 2.º, «Integração das atividades do setor com outras atividades económicas, nomeadamente através da promoção do ecoturismo, desde que dessas atividades não resulte aumento do esforço de pesca».
A referida tipologia corresponde à medida elegível prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 44.º do Regulamento (CE) nº 1198/2006, que prevê a concessão de apoio ao desenvolvimento sustentável das zonas de pesca para fins de «reestruturação e reorientação das atividades económicas, nomeadamente através da promoção do ecoturismo, desde que essas atividades não resultem num aumento do esforço de pesca». O n.º 4 do mesmo artigo estatui ainda que «os beneficiários do apoio previsto nas alíneas b) e c) do n.º 1 e no n.º 2 deverão ser trabalhadores do sector das pescas ou pessoas que exerçam uma atividade ligada a este sector.
A Portaria n.º 828-A/2008, anteriormente referida, de acordo com o n.º 1 do art.º 3.º, do Anexo III, restringe a concessão dos apoios, ao estabelecer que «os destinatários, diretos ou indiretos, dos projetos previstos neste regime são os profissionais do sector das pescas, suas famílias e as comunidades piscatórias em geral».
Nestes termos, observámos que nem o projeto tem enquadramento nas medidas elegíveis do programa, nem o beneficiário está associado à atividade de pesca (n.º 4 do art.º 44.º do Reg. n.º 1198/2006), nem os destinatários são profissionais do setor das pescas (nº 1, do artº 3º, do Anexo III, da Portaria n.º 828-A/2008).
Com efeito, o investimento que beneficiou da aplicação de fundos comunitários provenientes do FEP, a que se refere o Contrato de Financiamento celebrado entre o IFAP e o Beneficiário em 15/nov/2012, consistiu essencialmente na restruturação do edifício designado por Health Club, cuja exploração foi cedida pela V., SA à S., SA, através de um Contrato de Cessão de Exploração, celebrado entre as partes em 30/mai/2005. Salientamos que, nos termos do n.º 1 da Cláusula Terceira do Contrato, a cessão de exploração teve início no dia 01/jan/2005 e tem a duração de quinze anos.
Pese embora a circunstância de o projeto ter merecido a aprovação do GAC, trata-se de uma operação que não concorre para o desenvolvimento sustentável das zonas de pesca nos termos do Capítulo IV do Regulamento (CE) nº 1198/2006, conforme já foi referido anteriormente.
Concretamente, e de acordo com a documentação consultada, os trabalhos cofinanciados reportam-se a obras de «reparação e requalificação de uma zona de massagens e tratamentos, de uma piscina de lazer e de uma piscina de manutenção». A par disso verificou-se igualmente a aquisição de diversos equipamentos e mobiliário, essenciais ao funcionamento das instalações em causa.
Esta realidade está muito distante do conceito de «reforço da competitividade das zonas de pesca» através da «reestruturação e reorientação das atividades económicas, nomeadamente, através da promoção do ecoturismo», que beneficiem «trabalhadores do setor das pescas ou pessoas que exerçam uma atividade ligada a este setor», conforme enquadramento previsto no n.º 1 alínea b) e n.º 4 do art.º 44.º do Reg. 1198/2006.
Contrariamente, e conforme referido anteriormente, as instalações onde foi efetuado o investimento, que beneficiou de ajudas FEP, são propriedade do Hotel Flor de Sal detido pela empresa V., SA e «são geridas em regime de outsorcing em contrato de cessão de exploração pela empresa S.».
Quanto ao objetivo «valorizar os produtos da pesca», o Promotor não podia contribuir para este desiderato uma vez que não é ele quem explora o objeto da operação, «Banhos Quentes da Praia Norte» nem «promove a valorização económica das algas» como é enfatizado no Parecer que aprova a candidatura.
Quanto ao cumprimento dos indicadores de realização material do projeto, aprovados em candidatura, nomeadamente, «reforçar a competitividade das zonas de pesca» e «reestruturar e reorientar as atividades económicas», constatámos que o pescado adquirido (pelo Hotel V.) tem a sua origem em outros países (incluindo países terceiros) e não foi apresentada evidência da aquisição das algas.(...)
Nestes termos, em consonância com as circunstâncias em que decorreu o investimento, as despesas do projeto no valor de €284.471,94 devem ser consideradas não elegíveis e consequentemente ser retiradas do financiamento (negrito nosso).”
(…)” - Cf. documento n.º 7 junto com a petição inicial, e documento de fls. 673 a 679 do processo administrativo apenso aos autos.
16. A autora apresentou requerimento escrito, destinado a pronunciar-se acerca desta projetada decisão de não conceder o financiamento anteriormente aprovado – cf. documento n.º 8 junto com a petição inicial, e documento de fls. 680 a 696 do processo administrativo apenso aos autos.
17. Após o que o IFAP remeteu à autora ofício com o assunto “Audiência Prévia nos termos dos art. 121º e 122º do Código de Procedimento Administrativo PROMAR/Eixo 4 – Desenvolvimento Sustentável das Zonas de Pesca Operação Nº 31-04-01-FEP-168”, do seguinte teor:
(…)
1. A operação identificada em assunto, à qual é aplicável a legislação relativa ao regime de apoio ao "Desenvolvimento Sustentável das Zonas de Pesca", do PROMAR - Programa Operacional Pesca, Portaria nº 828-A/2008, de 8 de agosto, reporta-se a um incentivo de 123.192,05 €, atribuído para a criação de um centro de talassoterapia e SPA, tendo sido celebrado o contrato de financiamento nº 31002056/0, em 15/11/2012.
2. Esta operação foi auditada pela Inspeção Geral de Finanças (IGF), no âmbito da "Auditoria aos Sistemas de Gestão e Controlo dos Organismos Intermédios do PROMAR - FEP, DRAP-Norte e GAC Litoral Norte", tendo-se concluído pela não elegibilidade da operação, com a consequente retirada da despesa aprovada do financiamento do PROMAR.
3. Com efeito, nos termos do nº 1, do artigo 3.º, do anexo III da Portaria nº 828-A/2008, os destinatários, diretos ou indiretos, dos projetos previstos neste regime são os profissionais do setor das pescas, suas famílias e as comunidades piscatórias em geral.
4. Foi entendimento da IGF, após o contraditório, que nem o projeto tem enquadramento nas medidas elegíveis do Programa, nem o beneficiário está associado à atividade da pesca (conforme estabelecido no n° 4, do artigo 44°, do Regulamento n° 1198/2006 do Conselho, de 27 de julho, que define o quadro do apoio comunitário a favor do desenvolvimento sustentável do setor da pesca, das zonas de pesca e da pesca interior), nem os destinatários são trabalhadores do setor das pescas ou pessoas que exerçam uma atividade ligada a este setor.
5. O investimento que beneficiou da aplicação de fundos comunitários provenientes do FEP, consistiu essencialmente na restruturação do edifício designado Health Club, cuja exploração foi cedida pela V., S.A., através de um contrato de cessão de exploração à S., S.A., com início no dia 01/01/2005 e duração de 15 (quinze) anos tendo as suas eventuais renovações a duração de 5 (cinco) anos cada.
6. Embora o projeto tenha merecido a aprovação do GAC litoral Norte, trata-se de um investimento que não concorre para o desenvolvimento sustentável das zonas de pesca conforme previsto no Regulamento nº 1198/2006 acima mencionado, e o promotor não pode contribuir para o desenvolvimento sustentável do setor das pescas uma vez que não é ele quem explora o objeto da operação, nem "(...) «promove a valorização económica das algas» conforme é enfatizado no Parecer que aprova a candidatura".
7. Concretamente de acordo com a documentação consultada pela IGF, os trabalhos cofinanciados reportam-se a "(...) a obras de «reparação e requalificação de uma zona de massagens e tratamentos, de uma piscina de lazer e de uma piscina de manutenção»
8. Verificou-se igualmente a aquisição de diversos equipamentos e mobiliário, essenciais ao funcionamento das instalações em causa.
9. Nesta conformidade, nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 121º e 122º do Código do Procedimento Administrativo, ficam notificados da intenção deste Instituto de determinar a rescisão contratual e devolução do valor recebido, no montante de 123.192,05 €, podendo informar por escrito sobre o que se lhe oferecer, no prazo máximo de dez dias úteis, contados a partir da data da receção do presente oficio ou, supletivamente, contados a partir do terceiro dia após a data constante no carimbo de expedição dos CTT.
(…)” - cf. documento n.º 9 junto com a petição inicial, e documento de fls. 697 a 699 do processo administrativo apenso aos autos.
18. A autora respondeu a este ofício, apresentando requerimento escrito destinado a pronunciar-se sobre a projetada decisão, aí invocando nomeadamente o seguinte: errada interpretação quanto ao enquadramento da operação e do próprio promotor, assentando a elegibilidade das despesas em decisão irrevogável; mesmo encontrando-se cedida a exploração do espaço objeto do projeto, tal não impede que se alcancem os objetivos por este visados, sendo um equívoco dizer-se que o promotor não poderá contribuir para tais objetivos; procede à promoção e valorização das zonas de pesca mediante a promoção e dinamização económica da zona piscatória, designadamente pelo reencaminhamento dos clientes para restaurantes da região; não foi possível valorizar as algas locais porque o produto não existe; procede à captação direta de água salgada, proveniente do oceano Atlântico – cf. documento n.º 10 junto com a petição inicial, e documento de fls. 700 a 716 do processo administrativo apenso aos autos.

19. Após o que, por ofício de referência 008567/2016 DAI-UREC, o IFAP comunicou à aqui autora a decisão final, nos seguintes termos:
(…)
Finda a fase de instrução no procedimento administrativo relativo ao assunto supra identificado, cumpre tomar a decisão final, o que se faz, nos termos e com os fundamentos seguintes:
1. Através do ofício 007809/2016, de 22/07/2016, foi essa Sociedade notificada, nos termos e para os efeitos dos arts. 121º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, da intenção deste Instituto de determinar a rescisão contratual e solicitar a devolução dos valores indevidamente auferidos, no âmbito do Programa em assunto.
2 Tal intenção encontrou fundamento nas conclusões do relatório de auditoria da Inspeção Geral de Finanças, o qual permitiu apurar uma situação de incumprimento da legislação aplicável ao Programa acima identificado, tendo concluído pela não elegibilidade da operação, com a consequente retirada da despesa aprovada do financiamento do PROMAR.
3. Em sede de audiência prévia, através de carta datada de 09/08/2016, que se dá aqui como integralmente reproduzida, vieram apresentar contestação, considerando “que o projeto em apreço assegura, inabalavelmente, o cumprimento de todos os requisitos de elegibilidade previstos, nomeadamente ao nível do enquadramento dos beneficiários e dos destinatários".
4. Analisada a resposta apresentada a mesma não pode ser acolhida, dado que:
4.1. A operação não tem enquadramento na tipologia prevista na subalínea i), da alínea b), do art.º 2.º, “Integração das atividades do setor com outras atividades económicas, nomeadamente através da promoção do ecoturismo, desde que dessas atividades não resulte aumento do esforço de pesca», do Anexo III, da Portaria n.º 828-A/2008, de 8 de agosto;
4.2. Apesar das instalações onde foi efetuado o investimento, que beneficiou de ajuda FEP, serem propriedade do Hotel (...), detido pela empresa V., SA, promotor do projeto, as mesmas «são geridas em regime de outsorting em contrato de cessão de exploração pela empresa S.»;
4.3. Quanto ao objetivo «valorizar os produtos da pesca», o Promotor não podia contribuir para este desiderato uma vez que não é ele quem explora o objeto da operação, «Banhos Quentes da Praia do Norte» nem «promove a valorização económica das algas» como é enfatizado no Parecer que aprova a candidatura;
4.4. Quanto ao cumprimento dos indicadores de realização material do projeto, aprovados em candidatura, nomeadamente, «reforçar a competitividade das zonas de pesca» e «reestruturar e reorientar as atividades económicas», constatou-se que o pescado adquirido (pelo Hotel V.) tem a sua origem em outros países (incluindo países terceiros) e não foi apresentada evidência da aquisição das algas.
5. Pelo exposto, determina-se a rescisão do contrato de financiamento n° 31002056/0, ficando essa Sociedade obrigada a devolver as verbas indevidamente recebidas, no valor de 123.192, 05€.
6. Nesta conformidade e para efeitos de reposição voluntária da quantia acima referida, a mesma poderá ser efetuada utilizando uma das modalidades abaixo indicadas, no prazo de trinta dias a contar da data da receção do presente oficio.
(…)” - Cf. documento n.º 11 junto com a petição inicial, e documento de fls. 718 a 720 do processo administrativo apenso aos autos.


2 . MATÉRIA de DIREITO

Tendo em consideração, por um lado, a sentença recorrida, e, por outro, as alegações apresentadas pela recorrente, sintetizadas nas supra transcritas conclusões, verificamos que a recorrente reincide nas invalidades suscitadas na petição inicial, apenas abandonando o vício/invalidade usurpação de poderes.
Assim, alinharemos a nossa decisão, seguindo de perto a decisão judicial recorrida --- aliás, bem estruturada sequencial e fundamentadamente, sem olvidar os argumentos propendidos pela A. na sua petição inicial --- com a qual se concorda, acrescendo que, em bom rigor, como se disse, a recorrente, além de não trazer argumentação consequente à sentença da 1.ª instância, mais não faz que reafirmar/repetir o que havia antes alegado, sem que assim questione, nos seus fundamentos, a decisão recorrida, antes se limitando a referir que dela discorda, ao decidir pela inverificação das invalidades suscitas.
Feito este breve, mas necessário, intróito, vejamos da assertividade da sentença recorrida.
Esta, depois de objectivar os temas de que deve tratar, enuncia o regime legal aplicável ao caso dos autos --- candidatura ao abrigo do PROMAR - Programa Operacional Pesca - Desenvolvimento Sustentável das Zonas de Pesca, aprovado pelo Regulamento (CE) n.º 1198/2006, de Conselho, de 27/7, relativo ao Fundo Europeu das Pescas _- FEC, que tinha por finalidade nota a definição do quadro do apoio comunitário a favor do desenvolvimento sustentável do sector das pescas, das zonas de pesca e da pesca interior, sendo ainda que os objectivos concretamente visados eram expostos no seu art.º 4.º, sendo mesmo que, no art.º 44.º são elencadas as medidas elegíveis, complementado, a nível nacional, pelo Dec. lei n.º 80/2008, de 16/5 - diploma que estabelece o modelo de governação do programa operacional Pesca 2007-2013 designado por PROMAR e, em particular, o Dec. Lei n.º 81/2008, de 16/505, que, por sua vez, fixa o enquadramento nacional dos apoios a conceder ao sector da pesca, fixando o seu art.º 3.º os 4 eixos prioritários, em especial o disposto no art.º 3.º, n.º 1, al. d), que se refere ao eixo prioritário n.º 4 - "Desenvolvimento sustentável das Zonas de pescas" -, concretamente aquele ao abrigo do qual foi apresentada a candidatura por parte da A./Recorrente.
Seguidamente, salienta que "... um dos objetivos visados pelo PROMAR consiste em assegurar o desenvolvimento sustentado das zonas costeiras [cf. alínea d) do n.º 2 do art.º 2.º do DL n.º 81/2008]".
E prossegue .... "... Além disso, o diploma em análise também fixa as condições gerais de acesso dos promotores, bem como as condições gerais de admissibilidade dos projetos (cf. artigos 4.º e 5.º), e ainda elenca o conjunto de despesas que são consideradas como não elegíveis (art.º 6.º)".
Depois de fazer ainda alusão ao facto de que, nos termos do art.º 9.º do Dec. lei 81/2008, a concessão do apoio é formalizada através de contrato, pressupondo uma prévia decisão de aprovação da candidatura e ainda ao art.º 10.º onde são elencadas as obrigações dos promotores, faz alusão, a nível regulamentar, à Portaria n.º 828-A/2008, de 8/8, que define as regras de aplicação da medida "Desenvolvimento sustentável das zonas de pesca" do eixo prioritário n.º 4 do PROMAR, salientando - transcrevendo mesmo parte do seu Anexo III onde se fixa o regulamento do regime de apoio das acções previstas na medida “desenvolvimento sustentável das zonas costeiras”, atentando ainda no art.º 1.º deste anexo, que define o âmbito e o objecto da medida, dizendo que está em causa "o apoio aos investimentos que visem o desenvolvimento sustentável e a melhoria da qualidade de vida das zonas e comunidades piscatórias mais dependentes da pesca, objecto de estratégias de desenvolvimento das zonas costeiras propostas por grupos de acção costeira e aprovadas pela autoridade de gestão nos termos do anexo ii da presente portaria".
Com interesse ainda para o caso dos autos a alusão ao art.º 2.º, al. b), do Anexo III, que versa sobre a medida de diversificação e reestruturação das actividades económicas e sociais, fixando como admissíveis as seguintes tipologias de projectos:
i) Integração das actividades do sector com outras actividades económicas, nomeadamente através da promoção do ecoturismo, desde que dessas actividades não resulte aumento do esforço de pesca;
ii) Diversificação das actividades através da promoção da pluriactividade por meio da criação de empregos;
iii) Promoção e melhoria das competências profissionais, da capacidade de adaptação dos trabalhadores e do acesso ao emprego, designadamente em benefício das mulheres;”.
Destaca-se ainda, sob a epígrafe “destinatários”, o art.º 3.º do Anexo em apreço que diz o seguinte:
1 - Os destinatários, directos ou indirectos, dos projectos previstos neste regime são os profissionais do sector das pescas, suas famílias e as comunidades piscatórias em geral.
2 - No caso dos projectos previstos na alínea c) do artigo 2.º os destinatários devem ser trabalhadores do sector da pesca ou outras pessoas que exerçam uma actividade ligada a este sector” .
*
Seguidamente, apreciando das invalidades suscitadas pela A./Recorrente, tendo por base a argumentação da entidade recorrida - que afasta assertivamente em alguns dos seus argumentos - seja a inexistência e nulidade jurídica da decisão de aprovação - conclui também --- contrariando uma vez mais a tese do IPAF-IP - com acerto --- que o acto de aprovação da candidatura constitui um verdadeiro acto constitutivo de direitos, à luz da art.º 167.º, n.º3 do CPA/2015.
Este acto constitutivo de direitos pode ser revogado por ilegalidade - revogação anulatória, à luz do art.º 141.º do CPA 1991 Correspondente ao art.º 168 do CPA/2015 - anulação administrativa. - diploma aplicável ao caso dos autos, atento o princípio tempus regit actum -, concretamente pela circunstância de se ter considerado que o projecto não se enquadrava no Eixo prioritário em causa, sendo certo que, como se diz na decisão recorrida que se está perante uma decisão da Administração em sentido diametralmente oposto a uma outra anterior, e que gera a destruição dos seus efeitos. Ou seja, com esta decisão, o IFAP está a destruir os efeitos da aprovação da candidatura, mediante a completa divergência dos efeitos das decisões em causa, o que significa que se está perante uma revogação implícita, que ocorre sempre que a Administração toma uma decisão com efeitos totalmente opostos à de uma outra anterior, levando a que esta seja excluída do ordenamento jurídico.
Tendo-se concluído que a entidade administrativa revogou implicitamente um anterior acto constitutivo de direitos - aprovação da candidatura - importa verificar se essa revogação era tempestiva, por um lado e, por outro, se existia efectivamente razão para tal - ilegalidade na aprovação dessa mesma candidatura.
Neste conspecto, o TAF de Braga, afastando correctamente a aplicação do prazo de revogação de um ano permitido pelo art.º 141.º do CPA1991 - o aplicável ao caso dos autos - em nome do primado da legislação europeia - socorreu-se do prazo de 4 anos, previsto no Reg. CEE 2988/95 (arts. 2.º e 4.º), ainda não decorrido à data da decisão - que finalizaria em 2016 -, na medida em que se verifica a interrupção desse prazo, no seguimento da notificação à A., em 2015, da auditoria da IGF onde já se considerava ilegal/indevida a atribuição da comparticipação por parte do IFAP-IP, dando aplicação prática ao art.º 3.º, n.º1 do referido Reg. 2988/95 que prevê expressamente essa causa de interrupção Que dispõe "A prescrição do procedimento é interrompida por qualquer acto, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade. O prazo de prescrição corre de novo a contar de cada interrupção"..
Sendo tempestiva a revogação do acto constitutivo de direitos de aprovação da candidatura, existia fundamento para a mesma? Foi aprovada base legal/enquadramento no Programa em causa, quanto ao enquadramento do projecto no eixo em causa, ao incumprimento dos objectivos visados e ainda quanto à relevância da cessão de exploração.
Também, nesta parte, carece de razão a recorrente.
Na verdade, atentos os pressupostos do Programa - Eixo Prioritário n.º 4 do PROMAR -, no âmbito da medida “Desenvolvimento sustentável das zonas de pesca”, Acção “diversificação e reestruturação das actividades económicas e sociais”, tipologia de projecto “integração das actividades do sector com outras actividades económicas, nomeadamente através da promoção do ecoturismo, desde que dessas actividades não resulte aumento do esforço de pesca” – art.º 2.º, al. b), subalínea i), do Anexo III à Portaria n.º 828-A/2008, de 8/8, entendeu-se igualmente com toda a correcção que o projecto em causa não tinha enquadramento nas citadas disposições.
Na verdade, transcrevendo aqui parte do essencial da sentença recorrida "... em causa está necessariamente o fim que é previsto na alínea b) do n.º 1 do art.º 44.º do Regulamento n.º 1198/2006, ou seja, a “reestruturação e reorientação das atividades económicas, nomeadamente através da promoção do ecoturismo, desde que essas atividades não resultem num aumento do esforço de pesca”; de tal forma assim é que o texto é praticamente replicado pela alínea b), subalínea i), do art.º 2.º do Anexo III da Portaria n.º 828-A/2008, de 08.08.
Todavia, como se assinala no relatório da auditoria, nos termos do n.º 4 do art.º 44.º daquele Regulamento n.º 1198/2006, os beneficiários do apoio previsto nas alíneas b) e c) do n.º 1 e no n.º 2 deveriam ser trabalhadores do setor das pescas ou pessoas que exerçam uma atividade ligada a esse setor.” Ora, como a própria autora enfatiza, a sua atividade consiste na hotelaria, pelo que não se trata de uma pessoa coletiva que trabalhe no setor da pesca ou que exerça uma atividade ligada a esse setor. E já por aqui, até porque o Regulamento comunitário tem aplicação direta e primacial em relação às disposições nacionais, se pode concluir que, como dito na decisão administrativa, subjetivamente a autora não se enquadra neste tipo de apoio. É certo que, como diz a autora, a al. a) do n.º 1 do art.º 44.º do Regulamento permite projetos que reforcem a competitividade das zonas de pesca; mas, como a mesma bem saberá, não se candidatou nesse âmbito, porque essa era uma ação a que respeitam os tipos de projeto da al. a) do art.º 2.º do Anexo III à Portaria n.º 828-A/2008, de 08.08 (e no caso dos autos aplica-se a alínea b) desse Anexo, como exposto).
E também não nos parece que a autora se possa enquadrar no conceito de destinatário a que se refere o n.º 1 do art.º 3.º deste mesmo Anexo III, dado que não é profissional do setor, nem pode ser considerada parte da comunidade piscatória em geral (de resto, esta norma está, como teria de estar, em consonância com o n.º 4 do art.º 44.º do Regulamento n.º 1198/2006). Adiante voltaremos a este assunto.
Mesmo objetivamente, não podemos censurar a interpretação da entidade administrativa ao excluir a atividade em causa; desde logo porque, apesar de isso nem se colocar em causa, não se afigura que a talassoterapia se possa qualificar como ecoturismo, no sentido de atividade turística que promove a observação e a apreciação direta da natureza, de forma sustentável. A atividade em causa é muito mais semelhante ao turismo termal, por exemplo. Seja como for, repete-se que, não obstante a argumentação da autora neste sentido, nada resulta da decisão administrativa no sentido de não considerar a talassoterapia como ecoturismo (pelo contrário, nem sequer há pronúncia sobre isso, seja na decisão do IFAP seja no relatório de auditoria para o qual remete).
Diga-se, igualmente, que apesar de a autora também versar sobre a localização do projeto, essa questão também nem sequer se coloca, nunca sendo falada na decisão administrativa. Ainda assim, segundo se compreende, este motivo é invocado para justificar a inclusão da autora numa comunidade piscatória, ou que pelo menos esta seria beneficiária indireta dos apoios, nomeadamente porque o investimento realizado se insere “plenamente no esforço de valorização socioeconómica da comunidade piscatória em que se integra”, seguindo-se depois alguns considerandos sobre o conceito de “comunidade”. Mas o certo é que, não obstante o esforço argumentativo levado a cabo pela autora, o projeto que desenvolve era suscetível de ser integrado em qualquer local próximo do mar. Não deixando de ser curioso que a própria autora identifique outros projetos, esses sim ligados efetivamente ao mar e à comunidade local (cf. art.º 111.º da PI).
Além do mais, a autora diz que emprega no hotel familiares de pescadores e pescadores não profissionais; todavia, a questão não é se trabalham no hotel, mas sim no projeto que efetivamente foi financiado, ou seja, o centro de talassoterapia. Sobre isso, nada de concreto se diz.
Saliente-se, neste sentido, que lida a petição inicial a autora parece confundir o hotel com o centro de talassoterapia, quando apenas este tem relevo (o projeto não era para todo o hotel). E da leitura que se faça resulta que a autora não identifica sequer o número de pessoas que acederam ao centro de talassoterapia, ou se essas mesmas pessoas são as que reencaminha para restaurantes locais.
Seguidamente, passa a autora a analisar o incumprimento dos impactos esperados com o projeto, dizendo que na sua candidatura não garantiu a aquisição de produtos frescos do mar, como algas desidratadas locais, referindo apenas que a criação desta atividade tem potencial catalisador de desenvolvimento de atividades ligadas ao mar.
Todavia, basta ler a candidatura [ponto 4 dos factos provados] para retirar conclusão diversa. Assim, no campo “objetivos do projeto”, a autora afirma como primeiro objetivo a “valorização económica dos produtos endógenos de proximidade, pelo estímulo ao fornecimento de materiais derivados do mar a utilizar nos tratamentos, em particular produtos frescos e algas desidratadas”.
Ora, se a autora pretendia, com o projeto, estimular o fornecimento de materiais derivados do mar, incluindo algas desidratadas, que considera ser um produto endógeno, não se vê outra forma de cumprir esse desiderato senão pela aquisição desses produtos, ou pelo menos pela tentativa de o fazer. Não basta, para afastar este objetivo, um lacónico “a autora não pode adquirir o que não existe”, até porque, se assim foi, então o projeto foi mal gizado, por prever a utilização de produtos que não existiam. Sendo certo que, também neste caso, nada é dito sobre a forma como, ativamente, se procurou desenvolver a valorização do produto em causa.
Da mesma forma, no que diz respeito ao peixe fresco, ao contrário do que é dito, a autora comprometeu-se com esse objetivo na sua candidatura. Uma vez mais, pode aí ler-se como objetivo a “valorização dos produtos frescos derivados da pesca pela ligação estreita do Centro de Talassoterapia e SPA à ementa do restaurante do Hotel (...), que terá destaques temáticos diários relacionados com produtos frescos do Mar em complemento aos Programas oferecidos no “novo” Centro de Talassoterapia e SPA.” Diga-se que a autora nunca nega o que é referido na decisão administrativa (no sentido de o peixe consumido no hotel ter origem em outros países), procurando afastar o compromisso que assumiu em candidatura pela consideração de que “promove e valoriza os produtos da pesca através da promoção e dinamização económica da zona piscatória (…) nomeadamente pelo reencaminhamento dos seus clientes para restaurantes de peixe da região”. Podendo ou não ser relevante esta afirmação, não foi, no entanto, esse o compromisso assumido em candidatura, na qual a autora se propôs até criar destaques temáticos diários no restaurante do seu hotel. Além disso, a autora também não pode afastar o seu incumprimento alegando que firmou um protocolo com a V1, e que esta entidade seguramente também comercializa peixe local; aquilo com que a autora se comprometeu foi o que está escrito na sua candidatura, não podendo simplesmente eximir-se a isso pela remessa da responsabilidade para entidades terceiras.
Torna-se, assim, forçoso concluir que o projeto falhou os objetivos a que se propôs.
Versa ainda a questão sobre a circunstância de o centro de talassoterapia se encontrar cedido (por via da cedência do Health Club) a uma entidade terceira, considerando-se na decisão que, assim sendo, a autora nunca poderia contribuir para os objetivos em causa, dado que nem sequer executa o projeto.
Segundo a autora, que confirma a cedência (aliás, já conhecida aquando da decisão de aprovação da candidatura, dado que nunca o ocultou), isso não impede que o projeto alcance os seus objetivos, desde logo porque as instalações continuam a ser pertença do hotel que lhe pertence, mas também porque “tal não obsta ao efetivo e rigoroso controlo pela cedente da exploração (…) do regular desenvolvimento da atividade, até sob pena de o desvio das suas condições contratuais poder implicar a revogação ou resolução do contrato de concessão de exploração”.
Na perspetiva do IFAP, a circunstância de existir esta cessão de exploração não exime a autora da responsabilidade assumida com a assinatura do contrato, designadamente quanto aos objetivos assumidos, e nunca a autora demonstrou que, mesmo através de terceira entidade, garantiu o cumprimento dos objetivos assumidos com a candidatura, e necessariamente incluídos no contrato de financiamento.
Ora, lendo os termos da decisão administrativa que se impugna, julgamos que esta questão não tem o alcance que se lhe pretende conferir.
Com efeito, é verdade que logo no relatório da Inspeção-Geral de Finanças se assinala que o espaço se encontra cedido a uma outra sociedade, que assim o explorava. Da mesma forma, vem referido na decisão final do IFAP que “apesar das instalações onde foi efetuado o investimento, que beneficiou de ajuda FEP, serem propriedade do Hotel (...), detido pela empresa V., S. A., promotor do projeto, as mesmas são «geridas em regime de outsourcing em contrato de cessão de exploração”, acrescentando-se que “quanto ao objetivo «valorizar os produtos da pesca», o Promotor não podia contribuir para este desiderato uma vez que não é ele quem explora o objeto da operação «Banhos Quentes da Praia Norte» nem «promove a valorização económica das algas» como é enfatizado no Parecer que aprova a candidatura”.
O que daqui resulta é, desde logo, que a decisão não foi baseada na existência da cessão da exploração (que aliás constava dos documentos que instruíram a candidatura); com efeito, o que aqui se constata é apenas a realidade óbvia de que, assim sendo, nunca seria a autora a diretamente contribuir para aqueles desideratos, dado que não se encontrava a executar o projeto. Nunca se afirma, por outro lado, que os objetivos do projeto não pudessem ser atingidos dessa forma; o que apenas se diz é que, atendendo à cessão, a autora não podia, diretamente, contribuir para os objetivos propostos.
Todavia, sucede que a acrescentar a essa impossibilidade de contribuição direta para a realização dos objetivos do projeto, se constatou que mesmo indiretamente tal não ocorreu, ou seja, não foram detetadas evidências que permitissem aferir o atingir dos objetivos concretamente propostos. Portanto, o que está em causa é somente constatar que nem diretamente (porque as instalações estavam cedidas), nem indiretamente (v.g., através do seu cessionário) se pôde constatar o cumprimento dos objetivos descritos em candidatura.
Neste sentido, e em suma, a simples existência da cessão de exploração do espaço no qual foi executado o projeto nunca foi fundamento para a decisão; pelo contrário, o que se diz na decisão administrativa é que nem direta, nem indiretamente (pelo cessionário) se constatou o cumprimento dos objetivos propostos. Sendo certo que, cumpre dizê-lo, a autora não alega sequer nestes autos que o seu cessionário tenha cumprido qualquer dos objetivos propostos.
Assim sendo, impõe-se concluir pela improcedência deste conjunto de vícios".
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Quanto à reiterada alegação de violação do dever de fundamentação e do direito de audiência prévia - vícios formais ou procedimentais - porque, manifestamente inexistem, como a sentença exaustivamente o evidencia e ainda porque, efectivamente, a recorrente nada mais adianta, em sede recursiva, que contradite aquela decisão judicial do TAF de Braga, que imponha argumentação acrescida, temos apenas de concluir também pela improcedência desta parte.
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Impõe-se, deste modo, concluir pela total improcedência do recurso.

III
DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
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Custas pela recorrente.
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Notifique-se.
DN.

Porto, 11 de Fevereiro de 2022

Antero Salvador
Helena Ribeiro
Nuno Coutinho
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i) Correspondente ao art.º 168 do CPA/2015 - anulação administrativa.

ii) Que dispõe "A prescrição do procedimento é interrompida por qualquer acto, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade. O prazo de prescrição corre de novo a contar de cada interrupção".