Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00204/11.0BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/02/2020
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:PROCESSO DISCIPLINAR; MUNICÍPIO; URBANISMO; MULTA.
Recorrente:A.
Recorrido 1:Município de (...)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
A., com domicílio na Rua (…), instaurou acção administrativa especial contra o Município de (...), com sede no Parque (…), impugnando a deliberação do executivo municipal de 16/11/2010, que, concordando com os termos do relatório final de processo disciplinar que contra si decorreu, lhe aplicou uma pena de multa correspondente ao valor de duas remunerações base diárias, no valor total de € 162,48.
Por decisão proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada improcedente a acção e absolvido o Réu do pedido.
Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões:
a. Na presente acção, o A., ora recorrente, veio impugnar o processo disciplinar que lhe foi movido pela sua entidade empregadora pública – o Município de (...) – e que lhe aplicou uma pena de multa, correspondente ao valor de duas remunerações base diárias (€168,48).

b. O Tribunal julgou a acção totalmente improcedente e absolveu o R. do pedido, discordando-se do julgamento da matéria de facto e de direito.

c. No que toca à decisão sobre a matéria de facto, o recorrente entende que deveria constar como facto provado (por acordo das partes) o seguinte:
“Não foram extraídas as certidões enumeradas em O)”.

d. Este facto é relevante, na medida em que são retiradas consequências de direito à não junção dessas mesmas certidões, em virtude da invocação pelo A. de nulidade insuprível, por omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade.

e. Relativamente à matéria de direito, o recorrente discorda globalmente do enquadramento jurídico feito na sentença recorrida.

f. O recorrente arguiu a nulidade do despacho de abertura do processo disciplinar, por falta de fundamentação e de objecto.

g. Do despacho não consta o objecto da decisão, pois manda-se instaurar processo disciplinar, sem se dizer a quem, sendo certo que o objecto tem de estar determinado, para que se possa identificá-lo e delimitá-lo.

h. Do despacho de abertura do processo não consta que há indícios da prática de infracção disciplinar por parte do A. e que contra ele deverá ser aberto processo disciplinar.

i. Nos termos do n.º 1 do art. 40º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro (doravante, ED), a participação ou queixa faz-se quando se tenha conhecimento de que um trabalhador em particular praticou uma infracção.

j. Apesar de o Exmo. Senhor Vereador ser sempre tratado no processo disciplinar como o participante, nunca refere, no seu ofício ao Sr. Presidente da Câmara, que sabe do cometimento de qualquer infracção disciplinar por qualquer trabalhador.

k. Nos autos de processo disciplinar a informação do Exmo. Senhor Vereador não reveste a natureza de participação ou queixa tal como ela vem definida na Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro.

l. A própria informação do Exmo. Senhor Director do DFM diz que existem alguns atrasos nas respostas às informações e/ou processos vindos do DPU, nomeadamente dos encaminhados ao aqui A., sem nunca dizer que só há atrasos nos processos do A. nem que a responsabilidade desses lhe é imputável.

m. O despacho de abertura do processo disciplinar carece de fundamentação, nos termos dos artigos 124º n.º 1 a) e 125º do CPA e de objecto, nos termos do art. 123º do CPA e é, por conseguinte, nulo, por ser essa a cominação imposta pelo art. 133º n.º 1 do CPA.

n. O Tribunal a quo considerou improcedente esta nulidade, por a decisão de instauração dum processo disciplinar se bastar com um despacho liminar, nos termos do art. 42º do ED e que, no caso dos autos, este contém a informação mínima legalmente exigida.

o. A Mma. Juiz a quo diz que o Vereador responsável pelo Departamento de Fomento Municipal procedeu à identificação dos processos em atraso e à identificação do técnico a quem os mesmos estavam confiados, mas labora em erro.

p. O Sr. Director de Fomento Municipal usou o advérbio “nomeadamente”, pelo que não se pode concluir por essa informação que tenha designado de forma exaustiva e taxativa os processos atrasados e respectivos técnicos.

q. Ao contrário do decidido na sentença recorrida, o despacho limitar não cumpriu as determinações decorrentes dos artigos 40º e seguintes do ED, pois decorre textualmente da lei que para existir participação ou queixa tem de existir o conhecimento da prática duma infracção disciplinar e da sua autoria.

r. Ora, nem a informação do Sr. Vereador nem a do Sr. Director preenchem os requisitos de uma participação, nos termos do n.º 1 do art. 40º do ED. Sem esses elementos, não pode considerar-se bastante o despacho liminar proferido pelo Sr. Presidente da Câmara.

s. A Mma. Juiz a quo ainda rejeita a aplicação dos artigos 123º e seguintes do CPA, porque, sendo subsidiariamente aplicáveis, são afastados pela aplicação de normas especiais.

t. Salvo melhor opinião, pese embora a existência dos artigos 40º e 41º do ED, o n.º 5 do art. 2º do CPA impõe a aplicação das normas que concretizam preceitos constitucionais a toda e qualquer actuação da Administração pública.

u. Ora, o dever de fundamentação, consagrado no Código do Procedimento Administrativo concretiza um preceito constitucional, vertido no art. 268º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, pelo que é aplicável a toda e qualquer actuação da Administração Pública, nos termos do disposto no n.º 5 do art. 2º do CPA.

v. Ante o exposto, o Tribunal a quo deveria ter dado provimento ao apontado vício de nulidade do despacho de abertura.

w. O recorrente invocou a ilegalidade da acusação, por não se encontrar verificado o prejuízo para o interesse público, que é condição necessária à verificação da infracção disciplinar, nos termos do art. 271º n.º 1 da CRP, à luz do qual deve ser interpretado o art. 3º do ED.

x. Entende o Tribunal a quo que resultaram prejuízos efectivos para os serviços municipais, quando o Réu não os menciona.

y. Bem pelo contrário, o relatório final, a fls. 147 do processo administrativo, refere que o comportamento do A. não produziu consequências graves, nem para os titulares dos processos, nem para o Município.

z. O A. alegou e provou na sua defesa e nos documentos a ela juntos que muitos atrasos havia no DFM e na própria Câmara Municipal de (...), sem que se tenha instaurado processos disciplinares semelhantes – situação que até foi admitida no relatório final – vide al. U) da matéria de facto dada como provada.

aa. O A. alegou e provou que não foi alvo de avaliação de desempenho, sem a consequente definição de objectivos e monitorização de resultados.

bb. Como professa Paulo Veiga e Moura, “os únicos conhecimentos e capacidades que podem ser exigidas são aquelas que no início de cada ciclo anual da avaliação de desempenho tenham sido consideradas como adequadas para a prossecução dos objectivos de serviço, pelo que não pode ser punido por violação do dever de zelo o trabalhador que não cumpriu objectivos que nunca lhe foram transmitidos ou que não revelou competências que não tenham sido fixadas nem registadas na ficha anual de avaliação do desempenho.

cc. Poe outro lado, não foram definidos prazos para o cumprimento das informações técnicas a que se refere este processo disciplinar.

dd. O Tribunal a quo desvalorizou os argumentos do A., dizendo que decorre do interesse público o dever de decidir, bem como a imposição dum plano de celeridade razoável.

ee. Mais afirmou a Mma. Juiz que foram provados os atrasos do recorrente, contudo não resulta de documento algum do processo disciplinar qual era o prazo fixado ou, na sua falta, qual o prazo razoável para produzir o trabalho distribuído ao recorrente.

ff. O recorrido nunca o fez, pelo que, sem se saber qual o prazo adequado, não pode aferir-se se houve ou não atrasos.

gg. E nem se pode dizer, como se diz na sentença recorrida, que o recorrente não pôs em causa que “incorreu em inadequada instrução de processos, atrasos e ausência de resposta final oportuna relativamente aos mesmos”, quando contradizem esta afirmação os artigos 51, 52, 54 e 55 da petição inicial.

hh. O recorrente ainda alegou na sua petição inicial que a 28 Junho de 2010, em pleno decurso do processo disciplinar, o Exmo. Senhor Presidente da Câmara mandou afectar o A. à Divisão de Projectos Municipais, “com o intuito de tirar maior rendimento das capacidades técnicas que detém”, passando assim a acumular as tarefas que já lhe estavam destinadas com a elaboração de projectos de especialidade.

ii. Mal se compreendia, pois, que distribuíssem uma tarefa acrescida ao A. da envergadura da elaboração de projectos de especialidade, se o A. não estivesse a assegurar e a cumprir as demais tarefas que lhe estavam, ao tempo, adstritas.

jj. Era ao R. que incumbia fazer prova dos factos integradores da infracção, porquanto o ónus da prova cabe ao titular do poder disciplinar.

kk. Ao não o fazer de forma cabal o réu, não deve o Tribunal acrescentar argumentos não utilizados na acusação nem no relatório final, sob pena de violação do princípio de presunção de inocência do arguido, consagrado no art. 32º n.º 2 da CRP.

ll. Na sua defesa, o A. requereu a audição de sete testemunhas, tendo o Sr. Instrutor prescindido de uma delas.

mm. Mais requereu a extracção de certidão dos seguintes documentos: Proc. 426/2003, Proc. 1011/97 P, Proc. 366/04, Proc. 512/2002, Proc. 180/04, Req. 2250/2010 e Req. 2245/2010, Proc. 6/08 L, Req. 48136/09 e Inf. da Polícia Municipal n.º 175/PM/2009, Processos 3189/09 e 6858/09, para prova da toda a matéria da defesa.

nn. Essa junção nunca foi efectuada, nem sequer foi proferido despacho que indeferisse este meio de prova.

oo. Os processos cuja certidão se requereu correspondem à listagem fornecida pelo Exmo. Senhor Director do DFM como o rol de processos não informados ou com informações atrasadas, alegadamente da responsabilidade do A..

pp. O Tribunal aderiu à posição do recorrido que, em sede de contestação, afirmou que os processos cuja extracção de certidão se requereu estavam directa e pessoalmente na disponibilidade do autor.

qq. Mais disse que bem andou o réu ao indeferir a diligência probatória.

rr. Sucede que não houve despacho que indeferisse o requerimento da diligência probatória, como resulta do n.º 3 do art. 37º e do n.º 1 do art. 53º, ambos do ED.

ss. Em todo o caso, os processos não estavam na disponibilidade do A., até porque na fase de defesa este encontrava-se com baixa médica.

tt. A defesa foi feita com base em apontamentos pessoais, o que não substitui de modo algum a cópia de cada um dos processos.

uu. Estas cópias elucidariam dados tão importantes, como a complexidade de cada um dos processos, a tramitação a que obrigavam, a existência ou não de prazo ou menção de urgência, etc..

vv. A diligência de prova era essencial à descoberta da verdade, saindo assim violado o art. 37º n.º 1 do ED.

ww. O A. apontou na sua petição inicial o vício de nulidade da deliberação que determinou a pena do ora recorrente, por carecer em absoluto de forma legal, nos termos do Dec. Lei n.º 169/99, de 18 de Dezembro (Lei das Autarquias Locais – LAL) e 122º n.º 2 in fine do CPA.

xx. O Tribunal a quo julgou improcedente também esta alegação, por a deliberação notificada ao recorrente não ser a acta da reunião ordinária, nem dela ter de constar fundamentação.

yy. Continua, todavia a entender o recorrente que, pelo menos, o quórum da reunião deveria constar da deliberação, sendo a simples menção da existência de sete votos a favor manifestamente insuficiente para aferir da legitimação do órgão para aplicação da pena.

zz. Recorda-se que são nulas as deliberações dos órgãos colegiais que sejam tomadas com inobservância do quórum ou da maioria legalmente exigidos, nos termos do art. 133º n.º 2 g) do CPA, pelo que não é displicente a necessidade de notificação da acta ao recorrente.

aaa. Com a sentença recorrida, foram mal aplicados os seguintes preceitos legais: artigos 2º n.º 5, 123, 124º n.º 1 a), 125º e 133º n.º 2 g) do CPA, artigos 37º n.º1 e n.º 3, 40º n.º 1, 41º, 42º e 53º n.º 1 do ED e ainda os artigos 32º n.º 2, 268º n.º 3 e 271º n.º 1 da CRP.


Nestes termos e nos mais de direito que se dignarão suprir, requer-se que seja revogada a sentença recorrida, condenando-se, a final, o R. na totalidade do pedido, com o que se fará justiça.

O Réu juntou contra-alegações e concluiu:

A O Autor na presente ação veio impugnar o processo disciplinar que lhe foi movido pelo Município de (...), enquanto entidade empregadora pública, que lhe aplicou uma pena de multa correspondente a duas renumerações base diárias;

II- O Autor invocou nulidade do despacho de abertura do processo disciplinar, por falta fundamentação e objeto;

III – O Autor arguiu omissão de diligenciais essenciais para a descoberta da verdade;

VI – o Autor apontou o vício de nulidade da deliberação;

V – A participação e o despacho da abertura do processo disciplinar, não contêm quaisquer ilegalidades ou irregularidades pois advêm de pessoa legítima, estão devidamente fundamentadas e o respetivo teor é completamente percetível, objetivo e claro;

VI- Aliás, é suficiente que a decisão de instauração de um processo disciplinar cumpra com o despacho liminar nos termos do artigo 42.º do ED.

VII - Não foram omitidas diligenciais essenciais para a descoberta da verdade já que, os processos cuja extração de certidão requerida pelo Autor, estavam direta e pessoalmente na disponibilidade deste e como tal o recorrente tinha pleno conhecimento desses processos sendo que, a respetiva junção como elementos instrutórios do processo disciplinar, era inútil;

VIII- Além disso, o Autor não impugnou a situação supramencionada no relatório final quando o poderia ter feito nessa altura;

IX - O Instrutor do processo disciplinar, prescindiu da audição de uma testemunha, mas fê-lo tão só porque, a lei assim o permite e porque, o mesmo veio dar como assentes e provados os factos que essa testemunha propunha provar, vide n.º 3 do artigo 53.º da ED, portanto, também aqui não houve omissão de diligencias essenciais para a descoberta da verdade;

XI - A conduta do Autor foi demonstrativa de que este atuou de forma negligente e que violou de forma expressa e inequívoca vários deveres funcionais, comprometendo a prossecução do interesse público que é um dever geral do trabalhador em funções públicas;

XII -A postura negligente do trabalhador resultou prejuízo efetivo para os serviços municipais já que se verificarem atrasos na tramitação dos processos da responsabilidade do Autor;

XIII - o facto de não terem sido determinados prazos de resposta para os processos que o Autor estava incumbido de informar, não desobriga o arguido a proceder com empenho e celeridade no tratamento dos assuntos que lhe estavam destinados;

XIV – Também não contém nenhum vício formal a decisão final do processo disciplinar (deliberação que determinou a pena do ora recorrente) uma vez que, não é legalmente exigível o envio do registo de tal decisão, na forma de ata.

Por tudo o exposto, e sem necessidade de mais amplas considerações, deverá a presente apelação ser julgada improcedente, por não provada e, consequentemente, confirmar a decisão proferida pelo Tribunal a Quo com todos efeitos legais, justamente porque não violou quaisquer preceitos legais, “máxime” os mencionados pelo recorrente.

O MP, notificado ao abrigo do disposto no artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO

Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
A) A 05/05/2010, o Vereador do Réu encarregue do Pelouro de Desenvolvimento Urbano (doravante PDU) enviou ao Presidente da Câmara Municipal uma informação da qual consta o seguinte: “(…) Nos últimos meses tem-se verificado atrasos significativos na apreciação dos processos de obras particulares por parte dos técnicos afetos ao Departamento de Fomento Municipal, o que tem causado situações desagradáveis para os munícipes, que como compreenderá não devem ser prejudicados pela morosidade na apreciação dos processos em causa. Acresce ainda que devido aos atrasos verificados, pode esta câmara ficar sujeita a deferir pedidos tácitos. Assim, solicito que sejam tomadas as medidas necessárias no sentido de estas situações não se verificarem mais.”;
B) A 06/05/2010, o Presidente da Câmara Municipal do Réu proferiu despacho, pelo qual solicita ao Departamento de Fomento Municipal (doravante DFM) a identificação dos funcionários responsáveis pelos atrasos;
C) A 04/06/2010, e com a referência NIPG 31057/10, o DFM prestou à seguinte informação: “(…) Em resposta à informação do Exmo. Sr. Vereador Dr. M., relativamente aos atrasos verificados nas respostas às informações/processos provenientes do DPU, tenho a comunicar que efetivamente se tem verificado alguns atrasos nas respostas nomeadamente dos processos que são encaminhados para o Sr. Eng. D. conforme se pode verificar no mapa anexo. (…)”, identificando os processos nºs 426/2003, 1011/97 P, 366/04, 512/2002, 180/04, Req. 2250/2010 e Req. 2245/2010, Processo nº 6/08 L, Req. 48136/09 e Inf. da P. Municipal nº 175/PM/2009;
D) A 07/06/2010, o Presidente da Câmara Municipal de (...) proferiu o seguinte despacho: “À DAJ, para abertura de processo disciplinar, nomeio instrutor do Dr. P..”;
E) O referido instrutor, da Divisão de Assuntos Jurídicos (DAJ), tomou conhecimento do despacho indicado em D) a 16/06/2010;
F) A 21/06/2010, o instrutor designado deu início à instrução do processo, dando disso conhecimento, entre outros, ao aqui Autor;
G) A 24/06/2010, o Vereador do PDU prestou declarações no âmbito do processo disciplinar;
H) A 25/06/2010, o diretor do DFM prestou declarações no âmbito do processo disciplinar;
I) A 05/08/2010, a Secção de Gestão de Recursos Humanos do Réu remeteu ao processo disciplinar tabela com o registo de assiduidade do Autor desde o dia 01/12/2009 até ao dia 05/08/2010;
J) Na mesma data, e pela informação com o NIPG 42879/10, o diretor do DFM prestou os seguintes esclarecimentos ao processo disciplinar: “Conforme solicitado pelo instrutor do processo disciplinar (…), sou a comunicar que já foram prestadas informações aos processos abaixo descritos: Processo 366/04 – informação datada de 24.06.2010; Rep. 2250/10 e Req. 2245/10 – informação datada de 23.06.2010; Req. 48136/09 e Inf. P.Municipal nº 175/PM/2009 – informação datada de 23.06.2010. Mais se informa que requerimentos nº 3189 datado de 09.03.2009, despacho para o Sr. Eng. D. em 11.03.2009, tendo sido prestada informação em 23.03.2009; e nº 6858 datado de 25.05.2009, despachado em 26.06.2009 tendo sido prestada informação em 23.06.2010, com nº informação 163/DVM. Informo que tive conhecimento que o DPU, levantou o processo de obras 6/08L do gabinete do Sr. Eng. D. no dia 07.07.2010 e que o mesmo ainda se encontra na referida Divisão.”;
K) A 08/07/2010, foi designado pelo instrutor do processo o dia 23/07/2010 para vir o Autor prestar declarações, mostrando-se tal diligência impossível, por se encontrar este doente;
L) A 23/07/2010, foi designada pelo instrutor nova data, a 04/08/2010, para vir o Autor prestar declarações, não tendo este comparecido atento o facto de se encontrar de baixa médica;
M) A 13/08/2010, foi deduzida acusação, da qual consta, nomeadamente, o seguinte: “(…) Da Responsabilidade. 14. Como vimos invoca a participação a existência de um conjunto de processos há demasiado tempo no DFM para informação técnica, cumprindo esta responsabilidade ao arguido; 15. Dos processos referenciados apenas um deles tinha já merecido resposta por parte do aqui arguido, ou seja, o processo 426/2003 (despacho datado de 2010.01.28, resposta emitida em 2010.05.05), enquanto os restantes se encontravam todos por informar e maioritariamente á desde o ano de 2009 (com exceção de três requerimentos – 2250/10, 2245/10 e 48136/09 - e da informação da polícia municipal - 175/PM/2009 - que lhe foram despachados no presente ano); 16. Ora considerando o volume de serviço adstrito ao arguido nada justificava a verificação de tamanho atraso na emissão da informação técnica aos mesmos, fazendo crer existir um inusitado desleixo por parte dele no cumprimento das suas responsabilidades; 17.Aliás o seu responsável hierárquico, Diretor do DFM, expressou não vislumbrar razões justificativas do atraso na informação dos processos em causa pois para além da sua intervenção como elemento de duas comissões de vistoria que não lhe são absorventes em termos de ocupação de tempo - exigem ao arguido não mais que 1/4 do seu tempo/horário semanal de trabalho -, o arguido apenas desenvolve mais estas responsabilidades; 18.Com efeito tendo a informação NIPG 31057/10 do DFM reportado taxativamente os processos "na posse" do arguido (com exceção de um não relatado por ter sido transitoriamente reenviado ao DPU, e de mais dois não referenciados ao tempo por lapso mas entretanto considerados), a verdade é que apenas também um tinha merecido resposta sua e mesmo assim mais de três meses depois de o ter recebido (um outro - 6/08 L -, apesar de não informado, encontra-se desde 2010.07.07 no DPU, como resulta da informação entretanto produzida pelo DFM - NIPG 42879/10 -, a solicitação nossa); (fls. 47 dos autos). 19. Excluindo os excecionados no anterior artigo 15°, todos os restantes processos se encontravam por informar já desde 2009, dois deles com despacho para o arguido emitido no primeiro semestre, e sem que tivesse o arguido algo neles informado, fosse o que fosse; 20. Como igualmente verificamos e se pode constatar pelo documento a folhas 41 e seguintes dos autos, o arguido esteve sempre ao serviço (com algumas faltas seja por atestados médicos, seja meios-dias para tratamento ambulatório) no período em causa, isto é de Dezembro último até à data da instauração do presente procedimento (considerando tratarem-se de apenas dois processos prescindimos de solicitar informação sobre a assiduidade do arguido no período anterior a Dezembro de 2009);21. Assim sendo e sabendo que o arguido, excluindo as suas responsabilidades com as vistorias, apenas detinha estes processos para informar, questionamo-nos sobre o que efetivamente andou a fazer durante as horas de expediente para que não tivesse tido tempo para promover a devida instrução dos processos que lhe estavam adstritos para informar, tendo informado unicamente um; 22. Durante todo este período - pelo menos Dezembro de 2009 e data da participação -, o arguido para além da sua participação em vistorias, desempenhou que tarefas no seu local de trabalho? Ocupou no seu local de trabalho o tempo que tinha disponível, a fazer efetivamente o quê? 23. A nosso ver considerando os factos, as declarações do participante, as declarações do Diretor do DFM, o desconhecimento de qualquer razão determinante e justificativa da manifesta falta de produtividade do arguido, os atrasos constatados ter-se-ão fundado no seu comportamento negligente e com falta de zelo, demonstrativo de um indevido desinteresse pelo serviço, inequivocamente atentatório da dignidade e prestigio que, as funções que exerce, lhe deviam exigir; 24. Aliás indício sintomático de que o arguido terá negligenciado as suas obrigações funcionais é o facto de entretanto e já depois de lhe ter sido dado conhecimento da instauração do presente processo e da sua qualidade de arguido, ter o mesmo emitido as esperadas informações técnicas reportadas com alguns dos processos antes referenciados, ou seja e conforme informação do DFM que solicitamos e que foi produzida em 2010.08.05 - NIPG 42879/10 -, o arguido no dia 2010.06.23, informou os requerimentos 2250/10, 2245/10 e 48136/09, a Informação da Policia Municipal 175/PM/2009, como ainda os requerimentos 3189/09 e 6858/09, tendo no dia seguinte, dia 24 de Junho último, informado o processo 366/04; 25. Como se vê a displicência do arguido no cumprimento das suas responsabilidades funcionais, tão patente nos últimos meses, foi ultrapassada com a emissão num só dia das informações técnicas de grande parte do expediente que detinha para informar, e logo que teve o mesmo conhecimento da sua condição de arguido no presente processo, facto acontecido em 2010.Junho.21; 26. Num só dia - 2010.Junho.23 -, o arguido informou mais de metade dos processos que lhe haviam sido de há meses despachados (na sua maioria), sendo que se considerarmos também a informação prestada no dia seguinte - 2010.Junho.24 -, constatamos que 2/3 dos mesmos processos ficaram informados em dois dias apenas; 27. Coincidência? Questionamos nós. Cremos que não, percecionamos também. A nosso ver o arguido reassumiu o necessário assomo de responsabilidade exigível para um desempenho aceitável das suas tarefas funcionais, logo que conhecedor da instauração do presente procedimento e das eventuais consequências emergentes da decisão que no mesmo viesse a recair (apesar de não conhecer o objeto do processo); 28. Tanto quanto nos foi dado a conhecer pelos depoimentos dos intervenientes do processo, o comportamento do arguido não terá tido contudo consequências efetivas gravosas para o município facto que, a nosso ver, não afastando a responsabilidade que lhe deve ser assacada por esse comportamento infrator, relativiza contudo a gravidade da infração praticada; 29. Da mesma forma entendemos que o facto de entretanto ter promovido a informação técnica dos processos identificados no anterior artigo 24° atenua, sem o desresponsabilizar, a gravidade do seu comportamento; 30. Por ser assim, isto é, do conjunto destes diferentes elementos devidamente consubstanciados nos autos, resultam claros e inequívocos os indícios de que o arguido violou deveres funcionais relativamente aos quais se encontrava (e encontra) vinculado; Dos deveres violados 31. Os factos praticados pelo arguido e confirmados pelo teor dos precedentes artigos, integram o conceito legal de infração disciplinar por terem implicado a violação de vários deveres inerentes á função que exerce, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 3° do ED; 32. De facto, com tais comportamentos secundarizou o arguido absolutamente a obrigação a que estava sujeito de ter que cumprir com todos os seus deveres de funcionário desta autarquia violando, pelo menos, dois desses deveres; 33. O arguido infringiu, pelo menos e de forma expressa e sem justificação atendível, o dever de PROSSECUÇÃO DO INTERESSE PÚBLICO e o dever de ZELO a que estava, e está, adstrito, enquanto funcionário desta edilidade, previstos nas alíneas a) e e) do n.º 2 e definidos nos nºs 3 e 7 do artigo 3° do ED; Circunstâncias Atenuantes Especiais e dirimentes 34. Considerando os factos não entendemos verificarem-se, no caso, quaisquer circunstâncias atenuantes especiais ou dirimentes, previstas respetivamente nos artigos 22º e 21º do ED; Circunstâncias Agravantes Especiais 35. Não existem circunstâncias agravantes especiais; PENA APLICÁVEL 36.Considerando os factos integrantes da participação bem como as provas já existentes nos autos, resulta suficientemente indiciada a prática pelo arguido de infração disciplinar punível pelo ED aplicável; 37. A infração praticada corresponde, no presente caso, à postura negligente e com manifesta falta de zelo do arguido, relativamente ao conjunto do expediente que tinha para informar, e não à contabilização individualizada, processo a processo, da falta de resposta a cada um destes que lhe foram despachados e detinha para informar; 38. Na verdade o comportamento do arguido, refletido no conteúdo dos precedentes artigos integrantes da presente acusação, é revelador uma atuação negligente por demonstrar uma manifesta falta de zelo pelo serviço, comportamento esse suscetível de aplicação da pena de MULTA, prevista na al. b) do n.º 1 do artigo 9° e caracterizada no n.º 2 do artigo 10° ambos do ED, por integrarem, pelo menos, a abrangência das alíneas a) e d) do art.16° do mesmo Estatuto; 39.A multa aplicável será fixada em quantia certa, não podendo exceder, no entanto, seis remunerações base diárias, ou seja, sendo a remuneração base diária do arguido de € 81,24 a pena não poderá ultrapassar os € 487,44. (…)”;
N) A 13/08/2010, com a referência 150/DAJ/PMO/8484, foi a acusação referida em M) comunicada ao Autor, por carta registada com aviso de receção, assinado a 19/08/2010, e esclarecendo que o processo disciplinar se encontrava disponível para consulta na Divisão de Assuntos Jurídicos do Réu, durante o horário de expediente;
O) A 08/09/2010, a mandatária do Autor apresentou defesa à nota de culpa, juntando 4 documentos e requerendo extração de certidões dos processos 426/2003, 1011/97P, 366/04, 512/2002, 180/04, Req. 2250/2010 e 2245/2010, processo 6/08 L, Req. 48136/09 e Inf. Polícia Municipal nº 175/PM/2009, processos 3189/09 e 6858/09;
P) No exercício do direito de defesa, requereu ainda o Autor a produção de prova testemunhal, nos seguintes moldes: F., para depor sobre os artigos 37, 46, 52, 53 e 69; J., para depor sobre os artigos 37, 46, 52, 53, 76 a 80; J., para depor sobre os artigos 37, 46, 47 e 69; F., para depor sobre os artigos 19 a 32, 36, 40 e 94; M., para depor sobre os artigos 19 a 32, 36, 41, 43, 50, 51, 54 a 68, 70, 71, 81, 82 e 94; C., para depor sobre os artigos 19 a 32, 36, 41, 43, 50, 51, 54 a 68, 70, 71, 81, 82 e 94; e P., para depor sobre os artigos 76 a 80;
Q) A 14/09/2010, o instrutor do processo disciplinar comunicou, via fax, à mandatária do Autor a data de inquirição das testemunhas por si arroladas;
R) A 01/10/2010, o Autor foi ouvido no âmbito do identificado processo disciplinar;
S) A 18/10/2010, pela informação nº 139/10, o instrutor do processo disciplinar comunicou ao Presidente da Câmara Municipal do Réu o relatório final;
T) Por despacho de 18/10/10, o Presidente da Câmara Municipal remeteu a decisão de eventual aplicação de pena a reunião do executivo camarário;
U) No indicado relatório final pode ler-se, nomeadamente, o seguinte: “(…) Da defesa e sua aferição 8. Na fase da defesa do arguido, foram ouvidas/inquiridas as testemunhas pelo mesmo indicadas, não tendo sido tomadas demarches acrescidas, seja por iniciativa do instrutor seja por iniciativa da defesa, 9. Ora tomava-se assim importante fazer uma abordagem reportada com o mérito das razões invocadas pelo arguido nesta sua defesa bem como do teor das declarações das testemunhas inquiridas, a fim de poder ser aferida a real responsabilidade, ou falta dela, do mesmo arguido, relativamente aos factos participados e integrantes da acusação efetivada; 10. Neste sentido começando pelas testemunhas e abordando as respostas aduzidas por estas quanto ao teor dos artigos da defesa relativamente aos quais foram instadas a se pronunciarem, cumpre-nos expressar o que de essencial disseram: a) Em geral as testemunhas expressaram não terem conhecimento concreto sobre as eventuais demarches tomadas pelo arguido nos diferentes processos que lhe haviam sido despachados; b) Em geral mostraram também desconhecer se os processos despachados ao arguido o foram com determinação de prazo para resposta, ou não, sendo que normalmente tais despachos não referem prazos de resposta (F., J.); c) De uma forma específica confirmaram (Eng.º A. e Carlos Sousa, Arqt.º F.) que ao arguido não terão sido fornecidas inicialmente as necessárias condições materiais (falta de computador e impressora) para o normal desempenho das suas funções, situação que, com o decurso do tempo, veio a ser ultrapassada; d) Igualmente esclareceram (Eng.º A. e C.) que enquanto elementos integrantes de algumas Comissões de Vistorias do município se deslocaram por vezes a determinados locais do Concelho - freguesia de Lordelo, duas vezes, rua da Costa Verde e rua dos Combatentes; freguesia de Beire, duas vezes; freguesias de Astromil e Mouriz, a solicitação do arguido (também elemento dessas Comissões), que lhes dizia tal ser necessário para colher elementos que melhor possibilitassem a efetivação das informações técnicas dos processos que lhe tinham sido despachados; e) Os três técnicos inquiridos (Eng.º A., Eng.º C. e Arqt.° F.) confirmaram reconhecer ser o arguido, um técnico profissionalmente competente e capaz; 11. A nosso ver as testemunhas limitaram-se a responder a artigos da defesa que se prendem com questões gerais, não tendo diretamente esclarecido o que seja sobre os factos cuja indiciação determinou a acusação feita ao arguido (com exceção da testemunha J. que se pronunciou diretamente sobre o processo 6/08 L); 12 Pelo que, em nosso entender, de muito pouco valeu, sob o ponto de vista prático, a audição de tais testemunhas porque, em geral, nada de novo ou relevante trouxeram ao processo, nomeadamente em prol da defesa; 13. Importa esclarecer que optamos por não ouvir a testemunha Arqt.ª P., por considerarmos desnecessário fazê-lo nos autos em função da confirmação resultante das declarações da testemunha J. no referente aos artigos 76° a 80º da defesa apresentada; 14. Fazendo agora uma abordagem mais direta do teor da defesa apresentada abordagem essa que incluirá o complemento à mesma, na correspondente matéria, emergente das declarações que o arguido acabou por prestar nos autos, temos que: (folhas 65 e seguintes dos autos) A) 1. Nos artigos 1° a 18°, parte I da defesa, invocou o arguido a nulidade do processo com base nos argumentos integrantes destes artigos dizendo basicamente que o despacho de instauração de procedimento disciplinar não é inequívoco, nem claro, nem preciso nem completo; 2. Ora não comungamos minimamente de tal entendimento pois, a nosso ver, tal despacho do Sr. Presidente da Câmara contém todos os requisitos legais exigíveis na medida em que não deixa margem para quaisquer dúvidas quanto ao respetivo objeto bem como quanto à identidade do funcionário contra quem o procedimento é instaurado; 3. Aliás a informação onde foi emitido o despacho aqui em tratamento e referida no anterior artigo 4°, visou exclusivamente identificar o responsável pelos atrasos alegados, tendo o seu autor, Diretor do DFM, identificado de forma taxativa o aqui arguido, pelo que não podem restar dúvidas de que aquele despacho o pressupor como visado; B) 1. Na parte II.I, artigos 19° a 32° da defesa, o arguido invoca factos reportados com o período do seu regresso ao exercício de funções na autarquia ocorrido em 2008, factos esses que, e independentemente da sua veracidade, em nada influem (pelo menos de forma objetiva e/ou minimamente ponderosa) para a verificação dos fundamentos da participação; C) 1. Na parte II.II, artigos 33° a 97°, o arguido aduz uma concertação de razões que a partir do artigo 49° reporta direta e concretamente aos processos participados, pelo que nos pronunciamos primeiramente sobre o teor dos artigos 33° a 48°; 2. Nestes artigos o arguido estranha a invocação de atrasos na produção das informações reportadas com os processos participados alegando que em nenhum deles foi determinado prazo de resposta nem jamais foi advertido ou questionado superiormente sobre tal eventualidade; 3. Ora não nos parece razoável que o arguido produza tais razões como justificativo para a falta de apresentação de resultados relativamente aos processos que lhe estavam adstritos; 4. O facto de não terem sido determinados prazos de resposta não desobrigava o arguido de proceder com denodo, empenho e celeridade, no tratamento dos assuntos que lhe estavam destinados, de forma a salvaguardar as condições de oportunidade e eficácia da informação a prestar em cada caso, tanto mais que dispunha de tempo, em função do volume de serviço que lhe estava determinado, para o fazer; 5. Por outro lado nenhum funcionário pode, nem deve, determinar a sua produção laboral em função de ser mais ou menos instado superiormente, na medida em que conhecendo os seus deveres funcionais apenas tem que os procurar cumprir o melhor possível; D) 1. No restante articulado da parte II.II, isto é, artigos 50° a 97°, o arguido refere as demarches que terá tomado em cada um dos processos elencados no artigo 2° da acusação, reforçando ou completando tal referência com o teor das declarações que prestou nos autos igualmente com reporte a cada um dos mesmos processos; 2. Independentemente de não termos procurado confirmar as invocações feitas pelo arguido, damos aqui como boas tais invocações de demarches cumpridas naqueles processos aceitando, portanto, que as tenha promovido; 3. Sucintamente e com relevância para o objeto do presente procedimento, aduziu o arguido sobre cada um dos processos integrantes do artigo 2° da acusação: a) Processo 426/2003: Visita ao local, análise da legislação, ponderação e emissão de informação; b) Processo 1011/97 P: Incumbência de demolição de muro. Procurou contactar interessado, sem êxito. Quis demolir o muro, deslocou-se ao local com Sr. A. (Encarregado-Geral no DFM). Não o fez por falta de equipamento e pessoal, tendo o Sr. A. referido só ser possível ano e meio depois (nas suas declarações o arguido expressa," ... antes pelo menos meio ano"); c) Processo 366/04 P: Obras ilegais na via pública. Conversou com o queixoso após várias tentativas. Acertaram esperar por decisão judicial sobre o caso. Depois desta, conversou com visado na queixa que lhe forneceu documentação oportuna à produção da informação, realizada em Junho último; d) Processo 512/2002: Habitação social (Parteira, Lordelo). Tentou marcar vistorias às frações (mais de vinte) com Dra. S.. Necessidade de harmonizar data com condóminos. Vistoria realizada em Fevereiro último (exceção de três frações). Em Março/Abril foram realizadas as restantes três vistorias. Em Junho teria pronta a informação do processo que não remeteu por entretanto ter entrado em situação de baixa médica; e) Processo 180/2004: Realizou alguns contactos telefónicos com um dos interessados. Trocou impressões técnicas com colegas; f) Requerimentos 2250 e 2245/2010: Deslocou-se ao local pelo menos duas vezes, infrutiferamente. Entretanto interessado deslocou-se ao município (Abril último) reunindo com arguido. Maio último deslocou-se ao local com requerente tendo daí resultado as informações produzidas nos processos; g) Processo 6/2008 L: Contactou técnica da entidade requerente - Arqt.ª P.. Reuniu depois com a mesma. Após insistência sua deram entrada no município elementos em falta e já em fase em que o arguido se encontrava de baixa médica. Foi tirando apontamentos que se encontravam junto da capa principal do processo; h) Requerimento 48136/2009 e Inf. PM n.º 175/PM/2009: Tentou contactar infrutiferamente o requerente. Deslocou-se ao local sem o requerente. Entretanto este deslocou-se ao município tendo reunido com arguido e daí resultado que iria coligir documentação para melhor possibilitar uma informação no processo, o que aconteceu em Junho último; i) Requerimentos 3189 e 6858/2009: Tratam da mesma matéria. Req. 3189 foi informado em 2009.03.23. Necessitou de parecer da junta de freguesia (corresponde ao req. 6858). Após alguns meses processo volta ao seu gabinete tendo sido emitida a informação final em Junho último. Invocou prescrição, em geral, do direito de instauração do procedimento disciplinar. 15. Em função dos diferentes justificativos aduzidos e antes resumidos, para o comportamento que manteve relativamente aos processos que lhe estavam despachados, podemos perceber que, contrariamente ao que resulta da acusação, o arguido chegou, de facto, a promover diferentes demarches reportadas com os diferentes processos que tinha em mãos, apesar de só muito residualmente ter feito menção das mesmas naqueles; 16. Portanto admitimos que tenha produzido algum trabalho preparatório das informações que tinha que promover nos diferentes processos e que, por assim ser, o facto de não ter produzido as informações finais concernentes não pode significar que nada tenha feito; 17. Contudo o este entendimento não pode significar que tenha cumprido com aquelas que eram e são as suas responsabilidades funcionais, tanto mais que estamos perante um funcionário com larga experiencia técnica e autárquica, e com anteriores responsabilidades de chefia designadamente no município, experiência e responsabilidades estas que lhe exigem um acrescido conhecimento dos seus deveres enquanto funcionário daquele; 18. Na verdade apesar de ter desenvolvido algum trabalho referente aos processos que lhe estavam destinados, o que é facto é que não só não reportou essas demarches nesses processos como não demonstrou ter mantido uma conduta suficientemente diligente relativamente a cada um deles, pois objetivamente apenas informou um processo no período entre Dezembro último e início de Junho do presente ano; 19. Porventura alguns dos processos em causa implicavam um conhecimento preciso e concreto da realidade a que respeitavam exigindo um estudo e esforço técnico especiais, podendo-se aceitar, em tese, o decurso de um tempo amplo para a emissão da informação requerida; 20. Mas se assim fosse, e o arguido invoca assim ter sido em alguns daqueles, não deveria ter informado o respetivo superior hierárquico das demarches tomadas ou a tomar no respetivo processo de forma a salvaguardar a sua posição correlativa? Pois, não o fez. 21. Apesar das alegadas dificuldades em reunir os elementos necessários à emissão da decisão final, terá o arguido tomado todas as atempadas condutas no sentido de as obter utilmente? O volume de serviço e o tempo disponível para o cumprir bem como os justificativos aduzidos, convencem-nos que não; 22. O arguido não almejou afastar a convicção advinda da acusação, de que manteve uma postura negligente e com relevante falta de zelo demonstrativos de um indevido desinteresse pelo serviço e pelas consequências de assim ser; 23. A par das responsabilidades que detinha nas Comissões de Vistoria de que fazia e faz parte e que lhe ocuparam, em média, 25% do seu tempo, o arguido desenvolveu alguma atividade reportada com os processos que lhe haviam sido despachados e aqui em referência, mas que com toda a certeza, considerando o relato da mesma (atividade) que fez nos autos (sua qualidade e quantidade), não significou uma suficiente preocupação com a necessidade de os dotar das informações determinantes da respetiva remessa ao seu gabinete; 24. De outra forma teria tido tempo e oportunidade de lhes produzir a informação de que careciam; 25. Designadamente e apenas a título de exemplo, referiu quanto ao processo 1011/97 P, que o encarregado do DFM lhe deu uma moratória de pelo menos meio ano (ou ano e meio) para a realização dos trabalhos necessários à demolição do muro em causa; 26. Então, assim sendo, não teria o arguido que superiormente relatar tal desfecho, salvaguardando, por um lado, a sua posição, e por outro potenciando a tomada de qualquer eventual nova decisão pelo município que obviasse à impossibilidade aludida pelo encarregado? 27. Então, e com o devido respeito, é ao invocado encarregado que cabe decidir o timing do cumprimento da decisão de demolição? 28. O arguido demonstrou no exemplo acabado de transcrever como relativamente aos restantes processos que tinha em seu poder, uma inusitada displicência na concernente gestão mas, mais importante ainda, uma ausência de reporte em cada um dos mesmos que permitisse a perceção objetiva de um mínimo de trabalho instrutório realizado tendente à possibilidade de produção da informação técnica em falta (segundo o próprio apenas terá aposto junto à capa do processo 6/08 L, alguns apontamentos, não o tendo feito em qualquer outro processo); 29. Efetivamente o arguido procedeu como se fosse o único responsável pelo bom destino dos processos e como se não tivesse que prestar superiormente esclarecimentos sobre o trabalho desempenhado nas suas horas de expediente, cuja materialização deveria ter e designadamente, sido processada mediante o averbamento do esforço realizado em informações intermédias nos processos; 30. Portanto não foi nem funcionalmente irresponsável ao ponto de se desinteressar pelo bom resultado dos processos que tinha em mãos, nem suficientemente diligente ao ponto de afastar da sua jurisdição responsabilidades pela inadequada instrução e ausência de resposta final oportuna relativamente a eles; 31. Na verdade a emissão das informações finais em falta relativamente a 2/3 dos processos em apenas dois dias, dias 23 e 24 de Junho, conforme expressa o artigo 26 da acusação, isto é, logo depois de no dia 21 ter tido conhecimento do presente procedimento, demonstra por um lado que se encontrava já munido dos necessários elementos correlativos, mas por outro, que poderia ter também já informado esses processos anteriormente; 32 Pelo que, tendo os elementos carreados aos autos na presente fase processual sido importantes, no sentido de atenuar a culpa do arguido em função das imputações que lhe foram dirigidas aquando da acusação formulada, não são contudo excludentes dessas mesmas imputações e culpa, havendo pois motivos, porque confirmados, para que lhe sejam assacadas responsabilidades funcionais relativas; 33 Desde, pelo menos, Dezembro de 2009 até à instauração do presente procedimento datada de 7 de Junho último, o arguido informou unicamente um processo - 426/2003, despachado para o arguido em 2010.01.28, e informado em 2010.05.05 -, não tendo a sua defesa demonstrado suficientes e/ou adequadas razões que tivessem justificado a sua absoluta exculpação pela não informação dos restantes processos; 34. O arguido foi formal (na ausência de reporte processual do trabalho desenvolvido como na comunicação superior das vicissitudes dos processos) e materialmente (na manifesta ausência de uma cadência definida e aceitável quanto às demarches a tomar em cada processo) insuficiente, no cumprimento das suas responsabilidades funcionais; 35. Tal conclusão não resulta apenas de uma aferição taxativa, processo a processo, mas também de uma ambiência de "laisser faire" em que o arguido se deixou enredar e que o conjunto de processos que inusitadamente deixaram de ser informados, nos ajudaram a interiorizar; 36. O município não afere “a peso” ou “a metro”, isto é, não tem por critério pressionar, controlar por desconfiança, o trabalho dos seus funcionários que antecipadamente interiorizou como responsáveis, mas tal critério não pode ser sinónimo de permissão de displicência, ou de violação grosseira dos inerentes deveres funcionais, sob pena de se ver também enredado num "clima" de irresponsabilidade funcional com as esperadas consequências nefastas para os seus munícipes, que deve servir; Qualificação e Gravidade dos factos provados 37. Com o comportamento que manteve e que os artigos anteriores, em especial artigos 29º e seguintes, aqui comprovaram, o arguido violou de forma expressa e inequívoca, em cada um deles, vários deveres funcionais a que estava obrigado cumprir; 38. De facto, com tal comportamento, secundarizou de forma relevante a obrigação a que estava sujeito de ter que cumprir com todos os seus deveres de funcionário desta autarquia violando, pelo menos, dois desses deveres; 39. 40. O arguido infringiu, pelo menos e de forma expressa e relevante, o dever de PROSSECUÇÃO DO INTERESSE PÚBLICO, e o dever de ZELO, a que estava, e está, adstrito, enquanto funcionário desta edilidade, previstos nas alíneas a) e e) do n.º 2 e definidos nos nºs 3 e 7 do artigo 3° do ED; 41. Os factos provados integram individualmente as abrangências das alíneas a) e d) do art.16° do mesmo Estatuto; 42. Os mesmos factos são demonstrativos de que o arguido atuou de forma negligente, sem que contudo tenha esse seu comportamento tido ou produzido consequências graves, seja para os titulares dos processos seja para o município; 43. No caso a negligência deve ser considerada relevante para efeitos disciplinares, considerando não só a violação dos antes invocados deveres funcionais mas ainda as habilitações académicas, a experiência profissional e a competência técnica que o arguido invocou nos autos e que nos mesmos não questionamos, pressupostos estes determinantes de uma postura adequada e consentânea, mas que o arguido não quis defender; 44. Mais que querer aqui compensar prejuízos eventuais, o município pretende, com a confirmação da infração praticada, porque esta existiu, transmitir a todos os funcionários a exigibilidade de rigor mínimo e de aplicação perante os deveres funcionais invocáveis; 45. O arguido não é exemplo inopinado mas poderá servir de fundado exemplo, para si no futuro e para os seus colegas trabalhadores do município, no sentido de que todos percebam a ingencia de cumprimento das regras funcionais em aplicação; Circunstâncias Atenuantes Especiais e dirimentes 46. Considerando os factos não entendemos verificarem-se, no caso, quaisquer circunstâncias atenuantes especiais ou dirimentes, previstas respetivamente nos artigos 22 ° e 21° do ED; Circunstâncias Agravantes Especiais 47. Não existem circunstâncias agravantes especiais; PENA APLICÁVEL 41. Considerando os factos integrantes da participação bem como as provas já existentes nos autos, resulta suficientemente provada a prática pelo arguido de infração disciplinar punível pelo ED aplicável; 42. A infração praticada corresponde, no presente caso, a uma postura negligente e com acentuada falta de zelo do arguido, relativamente ao conjunto do expediente que tinha para informar, comportamento esse suscetível de aplicação da pena de MULTA, prevista na al. b) do n.º 1 do artigo 9° e caracterizada no n.º 2 do artigo 10º ambos do ED, por integrarem, pelo menos, a abrangência das alíneas a) e d) do art.16° do mesmo Estatuto; 43. A multa a aplicar deverá ser fixada em quantia certa, não podendo exceder, no entanto, seis remunerações base diárias, ou seja, sendo a remuneração base diária do arguido de € 81,24 a pena não poderá ultrapassar os € 487,44; 44. Importa aqui esclarecer que entendemos constituírem os factos a prática de uma única infração emergente do comportamento que globalmente manteve o arguido relativamente ao conjunto do expediente que lhe estava destinado; Pena Proposta Aplicar 48. Os factos infratores caracterizados nos artigos precedentes, considerando portanto as provas existentes nos autos, a ausência de circunstâncias atenuantes especiais e dirimentes, a inexistência de circunstâncias agravantes especiais, a efetiva tomada de algumas demarches nos processos, a inserção do arguido numa carreira técnica superior bem como a sua larga experiência profissional, determinam como justificada A APLICAÇAO DE UMA PENA DE MULTA CORRESPONDENTE AO VALOR DE DUAS REMUNERAÇÕES BASE DIÁRIAS, ISTO É, A APLICAÇÃO DA PENA DE MULTA DE € 162,48, em conformidade com as normas legais aplicáveis, e já invocadas no seu essencial, no anterior artigo 42°. É o que propomos. (…)”;
V) A 18/10/2010, e pela informação nº 139/10, o instrutor do processo remeteu ao Presidente da Câmara Municipal o relatório final referido supra;
W) No mesmo dia, o Presidente Câmara Municipal proferiu um despacho, que apôs à informação identificada supra, do seguinte teor: “À reunião da Câmara”;
X) A 03/11/2010, a Câmara Municipal do Réu levou a cabo uma reunião ordinária, proferindo a seguinte informação quanto ao processo disciplinar ora em análise: “Foi presente à reunião, uma informação proveniente da Divisão de Assuntos Jurídicos com o número cento e trinta e nove barra dez, datada de dezoito de Outubro do corrente ano, referente a um processo disciplinar em curso, em que é arguido o funcionário A.. Após apreciação, a Câmara deliberou, por escrutínio secreto, com sete votos a favor, aprovar a aplicação da pena de multa proposta, no valor de cento e sessenta e dois euros e quarenta e oito cêntimos, correspondente ao valor de duas remunerações base diárias, conforme documento que se junta, por fotocópia, à presente deliberação.”;
Y) A 18/11/2010, e pelo Ofício nº 5055/11943, o Réu comunicou ao Autor o seguinte: “Serve o presente para comunicar a V. Exa. que por deliberação do Executivo Municipal tomada em sua reunião ordinária no passado dia 2010/11.16, deliberou o Executivo Municipal concordar com os termos do relatório final integrante do processo disciplinar que decorreu no município tendo V. Exa. como arguido. Assim e em conformidade com o que havia sido proposto no mesmo relatório o Executivo Municipal deliberou aplicar a V. Exa., enquanto arguido no citado processo, e em conformidade com os justificativos inclusos no mesmo, a pena de UMA PENA DE MULTA, CORRESPONDENTE AO VALOR DE DUAS REMUNERAÇÕES BASE DIÁRIAS, ISTO É, A APLICAÇÃO DA PENA DE MULTA DE € 162,48, prevista na al. b) do n.º 1 do artigo 9º e caracterizada no n.º 2 do artigo 10.º, por integrarem, pelo menos, a abrangência das alíneas a) e d) do art. 16º, todos do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, ou seja, Decreto-Lei n.º 58/2008 de 9 de Setembro. Em conformidade com o disposto no artigo 58º do Estatuto aplicável aquela pena produz efeitos imediatos, isto é, a partir do dia seguinte ao do conhecimento da presente notificação, devendo a multa aplicada ser paga no prazo de 30 (trinta) dias, em conformidade com o estipulado no artigo 81º do invocado Estatuto. Mais somos a comunicar que o concernente processo disciplinar se encontra disponível para consulta na Divisão de Assuntos Jurídicos do Município, nos dias úteis e durante o horário de expediente. Anexamos: A deliberação referenciada (inclui relatório final). (…)”;
Z) A petição inicial foi apresentada neste Tribunal a 25/02/2011.

O Tribunal fez constar:
Nenhum outro facto com relevância para a decisão da causa resultou provado.
A convicção do Tribunal sobre a matéria de facto provada baseou-se na prova documental oferecida pelas partes. A convicção do Tribunal baseou-se essencialmente numa apreciação livre e à luz das regras de experiência comum.
Concretamente, em sede de resposta positiva, a convicção do Tribunal no tocante à factualidade vertida nos pontos A) a H) resultou formada atenta a análise feita ao teor de fls. 1 e seguintes do PD, advindo aquela formada quanto à factualidade vertida nos pontos I) e J) do teor de fls. 41 a 47 do indicado processo. Os factos dados como provados nos pontos K) a L) resultaram da análise do constante de, respetivamente, fls. 26 e 34 e seguintes do PD, resultando aqueles dados como provados nos pontos M) a P) da análise ao teor de fls. 50 e seguintes desse mesmo processo.
Por outro lado, a matéria de facto dada como assente no ponto Q) adveio do constante de fls. 94 e seguintes do PD, sendo que a matéria de facto dada como assente nos pontos R) a U) adveio antes do teor de fls. 94 e seguintes desse processo. Já a factualidade vertida nos pontos V) e W) foi dada como provada atento o constante de fls. 155 e seguintes do PD.
Por fim, os factos dados como provados nos pontos X) e Y) resultaram da análise efetuada ao teor de fls. 150 e seguintes do PD, resultando já o facto dado como assente no ponto Z) do constante de fls. 2 dos presentes autos.

DE DIREITO
Está posta em causa a sentença que acolheu a leitura da Entidade Demandada e que ostenta este discurso fundamentador:
I – Da alegada invalidade do despacho de abertura do processo disciplinar:
Começa o Autor por invocar que está o despacho que determinou a abertura do processo disciplinar ora em análise ferido de nulidade, nos termos do disposto no artigo 133º do Código de Procedimento Administrativo (doravante CPA; na redação à data aplicável), conjugado com o artigo 123º do mesmo diploma, alegando para o efeito que não existe um despacho claro e inequívoco de que se abre um processo disciplinar contra si, porquê e em que termos, assim considerando que é omisso nas suas menções obrigatórias e que carece totalmente de fundamentação.
Em sede de contestação, vem o Réu defender-se por impugnação, considerando que quer a participação quer o despacho referente à abertura do processo disciplinar advêm de pessoas com legitimidade para o efeito, são suficientes, claros e legais, cumprindo com os normativos aplicáveis, ou seja, com o disposto no Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem a Função Pública, aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de setembro (na redação em vigor à data; doravante ED). Pugna, assim, pela sua plena validade.
Desde já pode afirmar o Tribunal que soçobra o presente argumento aduzido pelo Autor.
De facto, e como desde sempre vem sendo referido, seja pela jurisprudência dos tribunais superiores, seja pela doutrina, o direito punitivo do Estado é classificado como tendo a natureza de direito administrativo especial, por oposição ao direito administrativo geral, nos moldes do previsto no CPA, sendo este subsidiariamente aplicável desde que não diminua as garantias do arguido (neste sentido, e a título meramente exemplificativo, pode ler-se o Acórdão do STA de 22/06/2010, P. 01091/08, disponível em www.dgsi.pt, bem como toda a jurisprudência e doutrinas citadas no indicado aresto).
Tal aplicação supletiva não pode, por outro lado, ser dissociada de um alargamento sucessivo, operado por legislação bem como pela interpretação jurisprudencial que tem sido feita (vide, neste sentido, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 10/05/2012, no P. 01958/08.7BEPRT, também disponível em www.dgsi.pt) das garantias estabelecidas no direito penal ao direito disciplinar público, atento o caráter sancionatório público que este último corporiza.
Posto isto, e para averiguar da validade do despacho que determinou a abertura do processo disciplinar ao arguido, ora Autor, cumpre lançar mão, em primeiro lugar, às normas previstas no ED e, só caso se verifique uma omissão, apelar ao direito subsidiário legalmente aplicável, ou seja, o CPA, na sua redação em vigor à data dos factos.
Assim, estabelecia o artigo 14º do ED, quanto à competência para aplicação das penas, que:
“1 - A aplicação da pena prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º é da competência de todos os superiores hierárquicos em relação aos seus subordinados.
2 - A aplicação das restantes penas previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 9.º é da competência do dirigente máximo do órgão ou serviço.
3 - Compete ao membro do Governo respetivo a aplicação de qualquer pena aos dirigentes máximos dos órgãos ou serviços.
4 - Nas autarquias locais, associações e federações de municípios, bem como nos serviços municipalizados, a aplicação das penas previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 9.º é da competência, respetivamente, dos correspondentes órgãos executivos, bem como dos conselhos de administração.
5 - Nas assembleias distritais, a aplicação das penas previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 9.º é da competência do respetivo plenário.
6 - A competência prevista nos n.ºs 1, 2, 4 e 5 é indelegável.”
Por outro lado, dispunha o artigo 29º do mesmo diploma que a competência para instaurar o procedimento disciplinar incumbe a qualquer superior hierárquico, ainda que não seja o competente para punir.
Quanto à participação ou queixa, rege o artigo 40º do ED, determinando:
“1 - Todos os que tenham conhecimento de que um trabalhador praticou infração disciplinar podem participá-la a qualquer superior hierárquico daquele.
2 - Quando se verifique que a entidade que recebeu a participação ou queixa não tem competência para instaurar procedimento disciplinar, aquelas são imediatamente remetidas à entidade competente para o efeito.
3 - Para os efeitos do disposto no número seguinte, quando um trabalhador deixe de comparecer ao serviço, sem justificação, durante 5 dias seguidos ou 10 interpolados, o respetivo superior hierárquico participa o facto, de imediato, ao dirigente máximo do órgão ou serviço.
4 - O dirigente máximo do órgão ou serviço pode considerar, do ponto de vista disciplinar, justificada a ausência, determinando o imediato arquivamento da participação quando o trabalhador faça prova de motivos que considere atendíveis.
5 - As participações ou queixas verbais são sempre reduzidas a escrito por quem as receba.
6 - Quando conclua que a participação é infundada e dolosamente apresentada no intuito de prejudicar o trabalhador ou que contém matéria difamatória ou injuriosa, a entidade competente para punir participa o facto criminalmente, sem prejuízo de instauração de procedimento disciplinar quando o participante seja trabalhador a que o presente Estatuto é aplicável.”
Por fim, e para a matéria de direito aqui em análise, importa atender ao disposto no artigo 41º do referido diploma. De acordo com este normativo, assim que seja recebida a participação ou queixa, a entidade competente para instaurar o procedimento disciplinar decide se a ele deve ou não haver lugar. E, nos termos do nº 3 da referida norma, caso considere dever haver lugar a procedimento disciplinar, determina que o mesmo se instaure, por despacho liminar, devendo desde logo, e conforme o previsto no artigo 42º do ED, designar o respetivo instrutor.
Consequentemente, retira-se da análise das referidas normas que a decisão de instaurar um processo disciplinar se basta com um mero despacho liminar, ou seja, e como o nome indica, breve e com a informação mínima legalmente exigida, desde logo nomeando o instrutor, num espírito de incutir celeridade a tal processo punitivo.
Vejamos então se foram tais normas observadas na presente lide. Conforme resulta da matéria de facto dada como provada, especificamente, nos pontos A) e C), apresentou o Vereador responsável pelo Pelouro do Desenvolvimento Urbanístico uma participação quanto ao atraso na apreciação de certos processos. Solicitado que foi ao Vereador responsável pelo Departamento do Fomento Municipal, procedeu este à identificação dos processos em atraso bem como à identificação do técnico ao cargo de quem estavam os mesmos confiados. Por outro lado, como resulta do facto dado como provado no ponto D), foi o Presidente da Câmara Municipal do Réu, ou seja, o órgão máximo do executivo, quem proferiu despacho determinando abertura de processo disciplinar, aposto sobre a informação identificada supra, e ordenando a sua remessa à Divisão de Assessoria Jurídica, com imediata designação do instrutor.
Ora, o facto de ser liminar, impondo a necessária síntese e celeridade, em nada afeta uma plena compreensão do conteúdo, objeto e alcance da decisão, já que da sua leitura de imediato se infere que foi determinado instaurar processo disciplinar contra o Autor, atentos os atrasos verificados nos processos indicados pelo Vereador responsável pelo DFM, e que foi nomeado um instrutor.
Desde logo se infere que foram observados todos os ditames legais impostos pelo ED, tendo o despacho cumprido com as determinações decorrentes dos artigos 40º e seguintes e tendo sido praticado por pessoa com legitimidade para o efeito, o superior hierárquico máximo do Autor.
Consequentemente, não são aplicáveis à decisão sob escrutínio as disposições previstas nos artigos 123º e seguintes do CPA, já que tais normativos são subsidiariamente aplicáveis, saindo afastados caso outras normas especiais se apliquem (nos termos do disposto no artigo 3º do Código Civil), não padecendo a mesma dos vícios que lhe são imputados pelo Autor.
Nestes termos, é o despacho que determinou a abertura do processo disciplinar válido e eficaz, soçobrando o aduzido pelo Autor, o que desde já se declara.
Continuando,
*
II – Da alegada invalidade e improcedência da acusação:
Invoca ainda o Autor que não se verificam todos os requisitos da existência de uma ilicitude disciplinar, porquanto não se verificou efetivo prejuízo para os serviços, o que é exigível à luz do disposto no artigo 3º do ED bem como artigo 271º da Constituição da República Portuguesa. Mais invocou que não foi o mesmo alvo de avaliação de desempenho, sem a consequente definição de objetivos e monitorização de resultados, pelo que a sua atuação nunca poderia configurar a violação do dever de zelo, na medida em que não lhe foram definidos tais objetivos nem prazos para o cumprimento das informações técnicas a que se refere o processo disciplinar.
Alega ainda que acumulou tarefas na Divisão de Projetos Municipais, sem que se tenha entregue à inércia, tendo o Réu olvidado que levou a cabo, nos processos em análise, a uma série de diligências, e que nunca lhe foi transmitida qualquer ordem para imprimir maior celeridade às informações, pelo que não podem dar-se como verificados “atrasos”.
Além do mais, invoca que incorreu o Réu em omissão de diligências essenciais à descoberta da verdade, porquanto não procedeu aquele à extração de certidão dos processos identificados no ponto C) da matéria de facto dada como provada nem à inquirição de uma das testemunhas por si arroladas, assim violando o artigo 37º do ED.
Por fim, invoca que incorre a deliberação de aplicação de pena disciplinar em nulidade, por carecer em absoluto de forma legal, nos termos do disposto na Lei das Autarquias Locais (doravante LAL), já que a ata da deliberação do Executivo Municipal não cumpre com o disposto no artigo 92º desta lei.
Na sua contestação, defende-se o Réu por impugnação, alegando que a não inquirição da testemunha arrolada pelo Autor na sua defesa, e de que o instrutor prescindiu, ficou a dever-se ao facto de o instrutor já ter dado por assentes os factos que aquela se propunha provar, sendo que os processos cujas certidões se requereu fossem extraídas estiveram sempre e diretamente na disponibilidade do arguido. Mais invoca que é a deliberação camarária válida e lícita, pugnando, a final, pela improcedência da ação.
Cumpre apreciar e decidir.
Em primeiro, atente-se à alegada inexistência de qualquer prejuízo para o interesse público. Nos termos do artigo 3º do ED, é dever geral do trabalhador em funções públicas, entre outros, o da prossecução do interesse público. Nos termos do disposto no nº 3 dessa norma, “O dever de prossecução do interesse público consiste na sua defesa, no respeito pela Constituição, pelas leis e pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.”
Ora, e como resulta da leitura do relatório final, contrariamente ao afirmado pelo Autor no seu petitório, resultaram prejuízos efetivos para os serviços municipais, porquanto se verificaram atrasos na tramitação dos processos da responsabilidade do Autor, encontrando-se em falta informações que a este incumbia prestar, parecendo este confundir o que sejam prejuízos “efetivos” junto dos administrados, nos interesses por si defendidos em cada um dos referidos processos, do que seja prejuízo para o interesse público, da Administração Pública, aqui, um Município.
Tratando-se o “interesse público” de um conceito indeterminado, cabendo em princípio à Administração alguma discricionariedade no seu preenchimento, é-lhe contudo aplicável um padrão finalístico, no sentido de sujeição aos interesses sociais qualificados como públicos pelo legislador, interesses aos quais (para além dos direitos e interesses dos administrados legalmente protegidos) aquela deve obediência na sua atividade.
Nessa mesma definição finalística, cabem no âmbito do conceito de prossecução de interesse público as imposições do dever de decidir, bem como a imposição deste dever num plano de celeridade razoável, como aliás taxativamente decorre do disposto nos artigos 9º e 10º do CPA (ainda na redação em vigor à data).
Resultando provados os factos constantes da acusação, como se pode ler no relatório final, e que não foram postos em causa pelo Autor nos presentes autos, como sejam os de ficar um dos processos a aguardar por mais de três meses por uma informação, ou ainda que ao longo de 6 meses o Autor apenas prestou informação num processo, resulta claro que não cumpriu este com os dispositivos que advêm da lei, nomeadamente, o CPA, ou com outras normas, como sejam as constantes no Regime Jurídico das Urbanizações e Edificações (que estipula prazos para efeitos de procedimentos urbanísticos).
Por outro lado, e no que ao dever de zelo respeita, especifica o nº 7 do artigo 3º do ED que “O dever de zelo consiste em conhecer e aplicar as normas legais e regulamentares e as ordens e instruções dos superiores hierárquicos, bem como exercer as funções de acordo com os objetivos que tenham sido fixados e utilizando as competências que tenham sido consideradas adequadas.”
Ora, não basta ao Autor afirmar, como o fez, que não poderia ocorrer qualquer violação do dever de zelo pelo facto de não ter o mesmo sido sujeito a avaliação de desempenho nem, consequentemente, lhe terem sido fixados objetivos ou resultados.
Na verdade, impõe tal dever, como decorre taxativamente da norma transcrita, a aplicação das normas legais e regulamentares que definem as suas funções, independentemente da existência de qualquer fixação de objetivos.
Tampouco a prévia existência de atrasos na tramitação de processos que entretanto lhe foram confiados é causa de exculpação da sua atuação.
Como decorre da leitura do relatório final, e que não é posto em causa pelo Autor no seu petitório, resultou provado que incorreu este em inadequada instrução de processos, atrasos e ausência de resposta final oportuna relativamente aos mesmos. Na verdade, e apesar de ter o Autor, quanto a certos processos, efetuado certas démarches instrutórias, não cuidou de dar informação formal das mesmas junto de tais processos, nem tampouco lhes deu o seguimento expectável, o que lhe era manifestamente exigível, enquanto técnico superior experimentado.
Tanto assim é que logo nos dias posteriores à notificação ao Autor da instauração do processo disciplinar ora em análise, procedeu aquele à emissão das informações em falta em 2/3 dos processos que se encontravam em atraso, facto este que é evidenciador do exercício displicente das funções que lhe foram adstritas.
Por fim, afirme-se que a falta de prévia definição de “limites de tempo” não permite a afirmação de que não se poderiam verificar atrasos nos processos. Como se viu, resultou provado que não houve resposta final naqueles confiados ao Autor reputada de oportuna, tempestiva. Mais se afirme, e como se viu antes, a impressão de celeridade no cumprimento dos deveres funcionais a que o Autor estava obrigado decorre da lei geral, não sendo necessária uma ordem prévia de um superior hierárquico para o efeito.
Assim, os factos imputados ao Autor são reveladores de desinteresse pelo cumprimento dos deveres funcionais, e de um menor rigor, cuidado e responsabilidade, não tendo o mesmo agido com a diligência que lhe era exigida para que não se tivessem verificado, conduta esta que não deixar de se enquadrar numa violação do dever de zelo.
Já quanto à alegada omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade, afirme-se tampouco não existir razão ao Autor.
Na verdade, e como bem afirmado pelo Réu na sua contestação, os processos cuja extração de certidão se requereu estavam direta e pessoalmente na disponibilidade do Autor, tendo este pleno conhecimento dos mesmos, sendo que a sua junção como elementos instrutórios do processo disciplinar era inútil, em nada contribuindo para a descoberta da verdade material. Mais se afirme que esta convicção do Tribunal sai reforçada pelo facto de não ter o Autor, ao longo do seu petitório, impugnado os factos que resultaram provados no relatório final do processo disciplinador, o que não deixa de ser esclarecedor quanto à desnecessidade de tais elementos instrutórios para a descoberta da verdade, pelo que bem andou o Réu ao indeferir tal diligência probatória requerida pelo Autor.
No respeitante à inquirição de uma das testemunhas arroladas pelo Autora em sede de direito de defesa, invocou o Réu, como aliás já constava do relatório final, que a mesma se afigurava desnecessária uma vez que a matéria de facto, indicada no exercício da defesa, e que aquela se propunha responder, já tinha resultado provada atenta a inquirição de outras testemunhas por aquele primeiro arroladas.
Ora, é certo que a defesa é uma garantia máxima do arguido em sede de processo disciplinar, legal e constitucionalmente tutelada, sendo que a violação de tal direito configura uma nulidade insuprível do processado.
Contudo, só configurará uma violação de tal garantia a omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade, que não mera diligências dilatórias, que mais não serviriam do que para corroborar o que, em sede de defesa, já tinha ficado abundantemente provado, não logrando o Tribunal descortinar, nem tampouco o tendo provado o Autor, ou sequer alegado, que mais factos haveria a provar.
Resultando do Relatório Final que matéria é que a referida testemunha se propunha provar, mais resultando que os factos para cuja prova foi a mesma arrolada já tinham sido dados como provados pelo instrutor, falece o alegado pelo Autor, inexistindo qualquer nulidade insuprível, nos termos do previsto no artigo 37º do ED.
Finalmente, e no concernente à alegada falta absoluta de forma legal da decisão final do processo disciplinar, cumpre desde já afirmar que falecem também as razões do Autor.
Na verdade, parece o Autor confundir o que seja a ata do Executivo Camarário com o que seja a deliberação propriamente dita. Nos termos do artigo 92º da Lei das Autarquias Locais (aprovada pela Lei nº 169/99, de 18 de setembro; na redação em vigor à data), de cada reunião do executivo deve ser lavrada uma ata, ata esta que deve obedecer às formalidades constantes do referido normativo.
Todavia, e como resulta do próprio termo, uma “ata” mais não é do que o registo escrito dos factos ocorridos e das decisões tomadas numa certa reunião, envolvendo uma coletividade de pessoas, não se confundindo com a decisão em si.
Ora, o que foi notificado ao Autor, como resulta do probatório supra, foi a decisão, que não o registo de toda a reunião camarária, com certeza que com outros pontos da ordem de trabalhos que em nada respeitavam àquele.
De acordo com o previsto no artigo 55º do ED, não podendo olvidar-se que estamos aqui perante um ramo de direito administrativo especial, a decisão final do procedimento disciplinar (neste caso, da competência do Executivo Municipal), só carece de fundamentação caso não seja concordante com o constante do relatório final, devendo ser notificada ao arguido, conforme o disposto no artigo 57º do referido estatuto.
Daqui se depreende que deve ser comunicada ao arguido, ora Autor, a decisão final do processo disciplinar, não sendo exigível o envio do registo de tal decisão, na forma de ata.
Assim, não são menções obrigatórias daquela decisão as pretendidas pelo Autor em sede de articulado inicial. Sendo verdade que se deteta uma irregularidade na data, constando da decisão a informação de que a reunião do executivo teve lugar no dia 03/11/2010, ao passo que da notificação dessa decisão é indicada a data de 16/11/2010, sendo esta última a correta, trata-se de uma mera irregularidade formal, insuscetível, como aliás decorre da instauração da presente ação, de ferir de qualquer invalidade a referida decisão, já que em momento algum põe em causa os direitos de defesa do arguido.
Nestes termos, e face ao supra exposto, impõe-se a conclusão de que estão votados à improcedência os argumentos esgrimidos pelo Autor, sendo válida a decisão final proferida no âmbito do processo disciplinar, que deverá manter-se na ordem jurídica, o que desde já se declara.
X
Constitui entendimento unívoco da doutrina e obteve consagração legal o de que o objecto do recurso jurisdicional se encontra delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, por parte do recorrente, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria que nelas não tiver sido versada, com ressalva óbvia, dos casos que imponham o seu conhecimento oficioso.
Assim, de acordo com o alegado, o Recorrente sufraga, fundamentalmente, o seguinte:
-no que respeita à decisão sobre a matéria de facto, entende que deveria constar como facto provado o seguinte: “não foram extraídas as certidões enumeradas em o);
-diz o Recorrente que, esse facto é relevante, na medida em que são retiradas consequências de direito à não junção dessas certidões, em virtude da invocação pelo Autor de nulidade insuprível, por omissão de diligencias essenciais para a descoberta da verdade.
Em relação à matéria de Direito, o Recorrente discorda por completo do enquadramento jurídico feito na sentença recorrida.
Na sua óptica esta aplicou mal os seguintes preceitos: artigos 2º n.º 5, 123º, 124º n.º 1 a), 125º e 133º n.º 2 g) do CPA, artigos 37º n.º 1 e n.º 3, 40º n.º 1, 41º, 42º e 53º n.º 1 do ED e ainda os artigos 32º n.º 2, 268º n.º 3 e 271º n.º 1 da CRP.
Não cremos que lhe assista razão.
O Recorrente arguiu a nulidade do despacho de abertura do processo disciplinar por falta de fundamentação e de objeto.
Alega que o despacho de abertura do processo disciplinar carece de fundamentação e é nulo.

Entende que a Senhora Juíza diz que o Vereador responsável pelo Departamento de Fomento Municipal procedeu à identificação dos processos em atraso e à identificação do técnico a quem os mesmos estavam confiados, mas, a magistrada fez uma suposição errada uma vez que o Diretor de Fomento Municipal utilizou o advérbio “nomeadamente”.
Adianta o Recorrente que, ao contrário do decidido na sentença recorrida, o despacho liminar não cumpriu com as determinações decorrentes do artigo 40.º e seguintes do ED.
Entende o Recorrente que, o Tribunal a quo deveria ter dado provimento ao invocado vício de nulidade do despacho de abertura.
O Recorrente invocou a ilegalidade da acusação por não se verificar o prejuízo do interesse público, que é condição necessária à verificação da infração disciplinar. E invocou o vício de nulidade da deliberação que determinou a pena e o Tribunal julgou improcedente.
Sucede que o Recorrente vem insistir na argumentação empregue em sede de acção e afastada, e bem, pelo Tribunal a quo.
Os argumentos utilizados pelo Recorrente são contrários aos factos provados e são desprovidos de fundamentação idónea, o que denota a falta de suporte do presente recurso.
Vejamos:
Da matéria de facto -
Alega o Recorrente, no que toca à decisão sobre a matéria de facto, que deveria constar como facto provado a situação de, não terem sido extraídas as certidões dos processos, elencados em O), já que tal, se afigura relevante para a demanda porque a não junção dessas certidões constitui uma nulidade insuprível, por omissão de diligencias essenciais para a descoberta da verdade.
Ora, como bem observa a sentença, os processos cuja extração de certidão requerida pelo Autor, estavam direta e pessoalmente na disponibilidade deste e como tal o Recorrente tinha pleno conhecimento desses processos sendo que a respetiva junção como elementos instrutórios do processo disciplinar era inútil e portanto, em nada contribuía para a descoberta da verdade material. Além disso, o Autor não impugnou essa situação no relatório final.
Posto isto, conclui-se que o Apelante acabou por reconhecer a desnecessidade dos citados elementos instrutórios nomeadamente para a descoberta da verdade.
Da Matéria de Direito -
Defende o Apelante a nulidade do despacho de abertura do processo disciplinar, por falta de fundamentação e de objeto. O Recorrente dá enfase ao facto de não existir um despacho fundamentado, claro e inequívoco, para abertura do processo disciplinar e nessa medida resultar violado o disposto nos artigos 123.º a 124.º do CPA (à data em vigor).
Sucede que sucumbe este vício apontado ao despacho de abertura do processo disciplinar em apreço, pois de facto, o despacho foi exarado por pessoas com legitimidade para o efeito, contém as menções legais obrigatórias e está devidamente fundamentado.
Além disso, a posição do Tribunal a quo, relativamente à aplicação supletiva dos artigos 123.º a 124.º do CPA é absolutamente lúcida, não merecendo qualquer reparo.
Nesse sentido, esteve mais uma vez bem o Tribunal a quo ao considerar improcedente a nulidade arguida pelo Recorrente já que a decisão de instauração de um processo disciplinar se basta com o despacho liminar nos termos do artigo 42.º do ED.
No entendimento do Tribunal a aplicação dos artigos 123.º e ss. do CPA é arredada porque sendo subsidiariamente aplicáveis, são afastados pela aplicação de normas especiais, designadamente pelos artigos 40.º e 41.º do ED.
O Recorrente invocou a ilegalidade da acusação, por não se encontrar verificado o prejuízo para o interesse público, o qual é condição necessária à verificação da infração disciplinar.
Ora, o Relatório Final é claro quando menciona que, ficou provado que, a conduta do Autor foi demonstrativa de que atuou de forma negligente e como tal violou de forma expressa e inequívoca vários deveres funcionais, comprometendo a prossecução do interesse público que é um dever geral do trabalhador em funções públicas. Efetivamente, da postura negligente do trabalhador resultou prejuízo efetivo para os serviços municipais, porquanto se verificaram atrasos na tramitação dos processos da responsabilidade do Autor. Além disso, o facto de não terem sido determinados prazos de resposta não desobriga o arguido de proceder com empenho e celeridade no tratamento dos assuntos que lhe estavam destinados.
Assim, o Tribunal fez novamente uma correta análise da situação ao concluir pela existência de prejuízo para o interesse público.
Invoca também o Recorrente a invalidade da decisão, por vício de nulidade da deliberação que determinou a pena.
O Tribunal a quo, julgou improcedente a supramencionada alegação do Autor por entender que, deve ser comunicada ao arguido, ora Autor, a decisão final do processo disciplinar, não sendo exigível o envio do registo de tal decisão, na forma de ata.
Em suma:
-o Recorrente limita-se a reiterar os vícios imputados ao acto impugnado como se a sentença não os tivesse escalpelizado e afastado na totalidade;
-como sentenciado retira-se da análise das referidas normas que a decisão de instaurar um processo disciplinar se basta com um mero despacho liminar, ou seja, e como o nome indica, breve e com a informação mínima legalmente exigida, desde logo nomeando o instrutor, num espírito de incutir celeridade a tal processo punitivo.
-no caso concreto conforme resulta da matéria de facto dada como provada, especificamente, nos pontos A) e C), apresentou o Vereador responsável pelo Pelouro do Desenvolvimento Urbanístico uma participação quanto ao atraso na apreciação de certos processos. Solicitado que foi ao Vereador responsável pelo Departamento do Fomento Municipal, procedeu este à identificação dos processos em atraso bem como à identificação do técnico ao cargo de quem estavam os mesmos confiados. Por outro lado, como resulta do facto dado como provado no ponto D), foi o Presidente da Câmara Municipal do Réu, ou seja, o órgão máximo do executivo, quem proferiu despacho determinando abertura de processo disciplinar, aposto sobre a informação identificada supra, e ordenando a sua remessa à Divisão de Assessoria Jurídica, com imediata designação do instrutor.
Ora, o facto de ser liminar, impondo a necessária síntese e celeridade, em nada afeta uma plena compreensão do conteúdo, objeto e alcance da decisão, já que da sua leitura de imediato se infere que foi determinado instaurar processo disciplinar contra o Autor, atentos os atrasos verificados nos processos indicados pelo Vereador responsável pelo DFM, e que foi nomeado um instrutor.
Desde logo se infere que foram observados todos os ditames legais impostos pelo ED, tendo o despacho cumprido com as determinações decorrentes dos artigos 40º e seguintes e tendo sido praticado por pessoa com legitimidade para o efeito, o superior hierárquico máximo do Autor.
Consequentemente, não são aplicáveis à decisão sob escrutínio as disposições previstas nos artigos 123º e seguintes do CPA, já que tais normativos são subsidiariamente aplicáveis, saindo afastados caso outras normas especiais se apliquem (nos termos do disposto no artigo 3º do Código Civil), não padecendo a mesma dos vícios que lhe são imputados pelo Autor.
Nestes termos, é o despacho que determinou a abertura do processo disciplinar válido e eficaz, soçobrando o aduzido pelo Autor,
Da alegada invalidade e improcedência da acusação:
Como resulta da leitura do relatório final, contrariamente ao afirmado pelo Autor no seu petitório, resultaram prejuízos efetivos para os serviços municipais, porquanto se verificaram atrasos na tramitação dos processos da responsabilidade do Autor, encontrando-se em falta informações que a este incumbia prestar, parecendo este confundir o que sejam prejuízos “efetivos” junto dos administrados, nos interesses por si defendidos em cada um dos referidos processos, do que seja prejuízo para o interesse público, da Administração Pública, aqui, um Município.
Tratando-se o “interesse público” de um conceito indeterminado, cabendo em princípio à Administração alguma discricionariedade no seu preenchimento, é-lhe contudo aplicável um padrão finalístico, no sentido de sujeição aos interesses sociais qualificados como públicos pelo legislador, interesses aos quais (para além dos direitos e interesses dos administrados legalmente protegidos) aquela deve obediência na sua atividade.
Nessa mesma definição finalística, cabem no âmbito do conceito de prossecução de interesse público as imposições do dever de decidir, bem como a imposição deste dever num plano de celeridade razoável, como aliás taxativamente decorre do disposto nos artigos 9º e 10º do CPA (ainda na redação em vigor à data).
Resultando provados os factos constantes da acusação, como se pode ler no relatório final, e que não foram postos em causa pelo Autor nos presentes autos, como sejam os de ficar um dos processos a aguardar por mais de três meses por uma informação, ou ainda que ao longo de 6 meses o Autor apenas prestou informação num processo, resulta claro que não cumpriu este com os dispositivos que advêm da lei, nomeadamente, o CPA, ou com outras normas, como sejam as constantes no Regime Jurídico das Urbanizações e Edificações (que estipula prazos para efeitos de procedimentos urbanísticos).
Por outro lado, e no que ao dever de zelo respeita, (…) não basta ao Autor afirmar, como o fez, que não poderia ocorrer qualquer violação do dever de zelo pelo facto de não ter o mesmo sido sujeito a avaliação de desempenho nem, consequentemente, lhe terem sido fixados objetivos ou resultados.
Na verdade, impõe tal dever, como decorre taxativamente da norma transcrita, a aplicação das normas legais e regulamentares que definem as suas funções, independentemente da existência de qualquer fixação de objetivos.
Tampouco a prévia existência de atrasos na tramitação de processos que entretanto lhe foram confiados é causa de exculpação da sua atuação.
Como decorre da leitura do relatório final, e que não é posto em causa pelo Autor no seu petitório, resultou provado que incorreu este em inadequada instrução de processos, atrasos e ausência de resposta final oportuna relativamente aos mesmos. Na verdade, e apesar de ter o Autor, quanto a certos processos, efetuado certas démarches instrutórias, não cuidou de dar informação formal das mesmas junto de tais processos, nem tampouco lhes deu o seguimento expectável, o que lhe era manifestamente exigível, enquanto técnico superior experimentado.
Tanto assim é que logo nos dias posteriores à notificação ao Autor da instauração do processo disciplinar ora em análise, procedeu aquele à emissão das informações em falta em 2/3 dos processos que se encontravam em atraso, facto este que é evidenciador do exercício displicente das funções que lhe foram adstritas.
Por fim, afirme-se que a falta de prévia definição de “limites de tempo” não permite a afirmação de que não se poderiam verificar atrasos nos processos. Como se viu, resultou provado que não houve resposta final naqueles confiados ao Autor reputada de oportuna, tempestiva. Mais se afirme, e como se viu antes, a impressão de celeridade no cumprimento dos deveres funcionais a que o Autor estava obrigado decorre da lei geral, não sendo necessária uma ordem prévia de um superior hierárquico para o efeito.
Assim, os factos imputados ao Autor são reveladores de desinteresse pelo cumprimento dos deveres funcionais, e de um menor rigor, cuidado e responsabilidade, não tendo o mesmo agido com a diligência que lhe era exigida para que não se tivessem verificado, conduta esta que não deixar de se enquadrar numa violação do dever de zelo.
Já quanto à alegada omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade, afirme-se tampouco não existir razão ao Autor.
Na verdade, e como bem afirmado pelo Réu na sua contestação, os processos cuja extração de certidão se requereu estavam direta e pessoalmente na disponibilidade do Autor, tendo este pleno conhecimento dos mesmos, sendo que a sua junção como elementos instrutórios do processo disciplinar era inútil, em nada contribuindo para a descoberta da verdade material. Mais se afirme que esta convicção do Tribunal sai reforçada pelo facto de não ter o Autor, ao longo do seu petitório, impugnado os factos que resultaram provados no relatório final do processo disciplinador, o que não deixa de ser esclarecedor quanto à desnecessidade de tais elementos instrutórios para a descoberta da verdade, pelo que bem andou o Réu ao indeferir tal diligência probatória requerida pelo Autor.
No respeitante à inquirição de uma das testemunhas arroladas pelo Autora em sede de direito de defesa, invocou o Réu, como aliás já constava do relatório final, que a mesma se afigurava desnecessária uma vez que a matéria de facto, indicada no exercício da defesa, e que aquela se propunha responder, já tinha resultado provada atenta a inquirição de outras testemunhas por aquele primeiro arroladas.
Ora, é certo que a defesa é uma garantia máxima do arguido em sede de processo disciplinar, legal e constitucionalmente tutelada, sendo que a violação de tal direito configura uma nulidade insuprível do processado.
Contudo, só configurará uma violação de tal garantia a omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade, que não mera diligências dilatórias, que mais não serviriam do que para corroborar o que, em sede de defesa, já tinha ficado abundantemente provado, não logrando o Tribunal descortinar, nem tampouco o tendo provado o Autor, ou sequer alegado, que mais factos haveria a provar.
Resultando do Relatório Final que matéria é que a referida testemunha se propunha provar, mais resultando que os factos para cuja prova foi a mesma arrolada já tinham sido dados como provados pelo instrutor, falece o alegado pelo Autor, inexistindo qualquer nulidade insuprível, nos termos do previsto no artigo 37º do ED.
Finalmente, e no concernente à alegada falta absoluta de forma legal da decisão final do processo disciplinar, cumpre desde já afirmar que falecem também as razões do Autor.
Na verdade, parece o Autor confundir o que seja a ata do Executivo Camarário com o que seja a deliberação propriamente dita. Nos termos do artigo 92º da Lei das Autarquias Locais (aprovada pela Lei nº 169/99, de 18 de setembro, na redação em vigor à data), de cada reunião do executivo deve ser lavrada uma ata, ata esta que deve obedecer às formalidades constantes do referido normativo.
Todavia, e como resulta do próprio termo, uma “ata” mais não é do que o registo escrito dos factos ocorridos e das decisões tomadas numa certa reunião, envolvendo uma coletividade de pessoas, não se confundindo com a decisão em si.
Ora, o que foi notificado ao Autor, como resulta do probatório supra, foi a decisão, que não o registo de toda a reunião camarária, com certeza que com outros pontos da ordem de trabalhos que em nada respeitavam àquele.
De acordo com o previsto no artigo 55º do ED, não podendo olvidar-se que estamos aqui perante um ramo de direito administrativo especial, a decisão final do procedimento disciplinar (neste caso, da competência do Executivo Municipal), só carece de fundamentação caso não seja concordante com o constante do relatório final, devendo ser notificada ao arguido, conforme o disposto no artigo 57º do referido estatuto.
Daqui se depreende que deve ser comunicada ao arguido, ora Autor, a decisão final do processo disciplinar, não sendo exigível o envio do registo de tal decisão, na forma de ata.
Assim, não são menções obrigatórias daquela decisão as pretendidas pelo Autor em sede de articulado inicial. Sendo verdade que se deteta uma irregularidade na data, constando da decisão a informação de que a reunião do executivo teve lugar no dia 03/11/2010, ao passo que da notificação dessa decisão é indicada a data de 16/11/2010, sendo esta última a correta, trata-se de uma mera irregularidade formal, insuscetível, como aliás decorre da instauração da presente ação, de ferir de qualquer invalidade a referida decisão, já que em momento algum põe em causa os direitos de defesa do arguido.
Nestes termos, e face ao supra exposto, impõe-se a conclusão de que estão votados à improcedência os argumentos esgrimidos pelo Autor, sendo válida a decisão final proferida no âmbito do processo disciplinar, que deverá manter-se na ordem jurídica, o que desde já se declara.
Improcedem todas as conclusões da peça processual do Recorrente, com a consequente manutenção do julgado na ordem jurídica, que, como se viu, rebateu um a um os vícios apontados, sendo de sublinhar que o Recorrente se centrou numa defesa formal, ao invés de tentar rebater a factualidade subjacente à violação dos deveres funcionais que lhe foi atribuída.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
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Custas pelo Recorrente.
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Notifique e DN.
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Porto, 02/10/2020


Fernanda Brandão
Hélder Vieira
Helena Canelas