Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00740/19.0BEPRT |
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Secção: | ![]() |
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Data do Acordão: | 09/27/2019 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
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Descritores: | INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS, IMPOSSIBILIDADE DE CONVOLAÇÃO PROCESSUAL, ORDEM DOS NUTRICIONISTAS |
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Sumário: | I-O processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias não se satisfaz com a circunstância de a tutela do direito fundamental exigir a prática de um acto administrativo ilegalmente recusado ou omitido, pois que terá que ser preenchido, para além de outros, o pressuposto da urgência de que depende a sua utilização, o que não sucede no caso posto; I.1-Atentas as circunstâncias enumeradas pelo Tribunal a quo e cuja leitura se acolhe, a pretensão do ora Recorrente está votada ao insucesso; I.2-Não só se não mostra possível através deste meio a concessão da tutela visada, como é impossível convolá-lo em processo cautelar, por razões que se prendem com a inimpugnabilidade dos actos em crise decorrente, quer da caducidade do direito de acção quer da natureza meramente confirmativa do acto mais recente praticado pela aqui Recorrida.* * Sumário elaborado pelo relator |
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Recorrente: | P. J. D. M. |
Recorrido 1: | Ordem dos Nutricionistas |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Impugnação Urgente - Intimação Protecção Direitos, Liberdades e Garantias (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Não emitiu parecer. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO P. J. D. M. instaurou processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias contra a Ordem dos Nutricionistas, ambos melhor identificados nos autos, pedindo que esta seja intimada a permitir a sua inscrição como membro efectivo da Ordem dos Nutricionistas, e, caso se entenda, retroactivamente, que se tornem inválidos todos os actos praticados pela mesma, que sejam considerados nulos ou anuláveis, nomeadamente, os respeitantes ao indeferimento da inscrição do Requerente na ordem dos nutricionistas e os inerentes às queixas apresentadas pelo crime de usurpação de funções. Subsidiariamente, para o caso de ser entendido não estarem preenchidos os pressupostos para o uso da intimação para defesa de direitos, liberdades e garantias, requereu a convolação da intimação numa providência cautelar, nos termos do disposto no artigo 11º- A do CPTA, na qual solicita que a Requerida, seja condenada no mesmo pedido, embora a título provisório, feito no âmbito da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, ou noutras medidas que o tribunal entenda mais adequadas. Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a intimação e absolvida a Entidade Requerida dos pedidos. Desta vem interposto recurso. Alegando o Requerente concluiu: 1) O Tribunal a quo, não notificou o Requerente do despacho liminar, desta forma, deverá, nos termos do artigo 195.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, a omissão de tal despacho liminar deverá ser declarada nula, nos termos do n.º 2 do referido artigo. 2) O Tribunal a quo, não se pronunciou sobre os requerimentos, que o Requerente deu entrada; 3) O Tribunal na sentença proferida, decidiu absolver a presente intimação para defesa de direitos, liberdades e garantias, por considerar que não estão preenchidos os requisitos, porém, a mesma deveria ter sido indeferida, no prazo de 48 horas, por despacho liminar, já que a Requerida não acrescentou nada aos autos, na sua Contestação, que levasse o Tribunal a quo a tomar posição distinta; 4) O Tribunal a quo na sentença extravasa ao pronunciar-se sobre mais do que foi pedido, dando origem à situação de pronúncia ultra petítum; 5) O Tribunal a quo não deu a possibilidade ao Requerente de exercer o seu direito ao contraditório; 6) Em momento algum, a aqui Requerida invoca excepção do acto confirmativo, nem na sua própria Contestação, tendo a plena consciência que não se trata de um acto confirmativo, já que é possuidora dos elementos e documentos que comprovam que não estamos perante um acto confirmativo. 7) Tendo em conta as nulidades suscitadas, determine-se a procedência das mesmas, com as devidas consequências legais, aproveitando-se o aduzido nos respetivos articulados, dando a possibilidade da realização da audiência de julgamento correspondente ao formalismo inerente à presente ação e a concretização de outras diligências adequadas para alcançar a verdade material dos factos, para a procedência do pedido do Requerente. 8) Caso assim não se entenda, requer-se a respetiva convolação para providência cautelar. Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, com as legais consequências, fazendo-se assim Justiça! A Requerida juntou contra-alegações, concluindo: A) O Recorrente interpôs recurso de apelação, nos termos do artigo 144.º do CPTA, para o Tribunal Central Administrativo Sul, mas sendo a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto é, nos termos do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de Dezembro, competente para conhecer do presente recurso o Tribunal Central Administrativo Norte. B) Com efeito, deverá o Tribunal a quo remeter o processo para o tribunal competente, i.e, para o Tribunal Central Administrativo Norte. C) Não se descortina o interesse processual do Recorrente ao invocar a não notificação do despacho de admissão liminar, dado que tal omissão, nunca a prejudicaria, mas antes a beneficiaria – improcedendo assim a conclusão 1) das alegações; D) De qualquer modo, a Recorrente confunde a admissibilidade do pedido com a procedência do pedido; no despacho liminar a proferir nas primeiras 48 horas, o juiz deve assegurar-se que se trata de um pedido que caiba neste meio processual e que tem subjacente uma questão de grande urgência. Esse despacho não se pronuncia sobre o mérito! E) De resto, a inimpugnabilidade de um ato administrativo é uma exceção dilatória, a qual, nos termos do artigo 89.º, n.º 2, do CPTA, é de conhecimento oficioso. F) O argumento do Recorrente relativamente ao não exercício do contraditório relativamente às questões prévias não procede, uma vez que o Tribunal notificou o Recorrente da resposta para esse efeito, tendo tal prazo sido precludido – improcedendo assim a conclusão 2) das alegações. G) Tendo até o Recorrente tido intervenção no processo posteriormente a tal despacho, não poderia ter o Tribunal chegado a outra conclusão, senão a de que o Recorrente tinha prescindido o seu direito de exercer o contraditório. H) Ademais, o Recorrente afirma que existe uma omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615.º do CPC, por o Tribunal não se ter pronunciado sobre os requerimentos por si apresentados, mas da consulta ao processo através da plataforma SITAF pode verificar-se que os requerimentos apresentados têm data posterior ao da elaboração da sentença – para além de terem um conteúdo que não se prende com questões que caberia serem respondidas na Sentença. I) Alega ainda o Recorrente que a Recorrida, na sua resposta à intimação, não invocou a exceção do ato confirmativo, mas, uma vez mais, tal não corresponde à verdade, já que a Recorrida dedicou o capítulo II da sua resposta a tal questão, concretamente entre os artigos 6 a 14 – improcedendo assim as conclusões 3) e 4) das alegações. J) Seja como for, não corresponde à verdade que não foi dada possibilidade de contraditório ao Recorrente, pois o mesmo foi notificado da resposta da Recorrida e tendo já uma intervenção no processo em data posterior à referida notificação, o Tribunal a quo só poderia ter concluído aquando da elaboração da sentença que o Recorrente tinha prescindido do seu direito ao contraditório – improcedendo assim a conclusão 5) das alegações. K) O ato praticado a 12 de fevereiro de 2019, tendo-se limitado a reiterar com os mesmos fundamentos a decisão tomada em 2016 é um ato meramente confirmativo e, por isso, inimpugnável nos termos do artigo 53.º do CPTA, conforme alegado na contestação – improcedendo assim a conclusão 6) das alegações. L) As conclusões 5) e 6) do recurso são, além de improcedentes, absolutamente contraditórias entre si: se a então Requerida nada referiu quanto ao ato afirmativo (o que não é verdade, como se viu) então não poderia haver violação do contraditório: se a ora Recorrida não deduziu exceções, então o Recorrente nada tinha para se pronunciar. M) As conclusões 7) e 8) não estão alicerçadas em nenhum argumento formulado no restante corpo das alegações. Nestes termos e nos mais de Direito: Deve a questão prévia ser julgada procedente e, consequentemente, o processo ser remetido ao Tribunal Central Administrativo Norte e não ao Tribunal Central Administrativo Sul. Em qualquer caso, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, por não provado e, em consequência, ser mantida a sentença de 3 de junho de 2019, que julgou a intimação para a defesa de direitos, liberdades e garantias improcedente. O Ministério Público não emitiu parecer. Cumpre apreciar e decidir. FUNDAMENTOS DE FACTO - Na sentença foi fixada a seguinte factualidade: 1. O Requerente é licenciado em Nutrição Humana, Social e Escolar, e exerce a actividade profissional de nutricionista há vinte anos no Hospital Distrital da F… da F… e e em diversas Clínicas – cf. doc. 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11 a 46. 2. O Requerente, em 30 de Março de 2012, requereu a sua inscrição na Ordem dos Nutricionistas, ao abrigo do disposto no Estatuto da Ordem dos Nutricionistas, aprovado pela Lei n° 51/2010, de 14 de Dezembro e do Regulamento Provisório de Inscrição (Regulamento n° 606/2011, de 21 de Novembro) – cf. doc. 49 junto com a p.i.; 3. A Entidade requerida indeferiu a sua pretensão em 27/04/2012, com fundamento em que, a Licenciatura em Nutrição Humana, Social e Escolar apenas confere 180 ECTS e o Regulamento de Inscrição exige pelo menos 240 ECTS - artigo 2°, n° 3, alínea a) do regulamento de inscrição – cf. doc. 50 da p.i. 4. Em 10 de Maio de 2012, o Requerente recorreu da decisão de indeferimento proferida pela Requerida - cf. doc. 51 da p.i. 5. Em 11 de Junho de 2012, a Requerida respondeu reiterando o proferido anteriormente, invocando ainda, que para o acesso à profissão de nutricionista a licenciatura deve ser ministrada por estabelecimento de ensino superior universitário, sendo a licenciatura em Nutrição Humana Social e escolar, a qual o requerente é detentor, ministrada em estabelecimento de ensino superior politécnico – cf. doc. 52 junto com a p.i.. 6. O Requerente, em 15 de Junho de 2012, remeteu nova carta a pedir a reapreciação do seu pedido de inscrição e a Requerida em 2 de Julho de 2012, vem reiterar a sua decisão anterior – cf. doc. 53 e 54 juntos com a p.i.. 7. Em 2 de Março de 2016, já na vigência da Lei n° 126/2015, de 3/9, que procedeu à primeira alteração ao Estatuto da Ordem dos Nutricionistas, conformando-o com a Lei n° 2/2013, de 10/1, que estabelecera o regime jurídico da criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais, o requerente representado pela sua mandatária, solicitou novamente a sua inscrição, não tendo obtido qualquer resposta – cf doc. 55 junto com a p.i. 8. A mandatária do requerente faz uma exposição à Requerida em 29 de Abril de 2016, da qual obteve resposta em 23 de agosto de 2016, mantendo o indeferimento pelos mesmos argumentos – cf. doc. juntos com a p.i.. 9. Por ofício datado de 12 de Outubro de 2018, a requerida comunicou ao requerente que havia comunicado a diversas entidades a situação que considerava de “usurpações de funções”, uma vez que, apesar dos pedidos de inscrição na Ordem terem sido indeferidos, continuava a exercer funções. 10. O Requerente, após notificação da Requerida, remeteu, em 2 de Novembro de 2018, uma nova exposição à Requerida para reapreciação da sua inscrição – doc. 58 e 59 - a qual veio a ser novamente indeferida pela Requerida, por o Requerente não ser detentor do devido título académico habilitante, por carta datada de 12 de Fevereiro de 2019 - cf. doc. 60, 61 e 62 juntos com o PA. DE DIREITO - Está posta em crise a decisão que ostenta este discurso fundamentador: O requerente lançou mão do presente meio processual principal urgente por entender que deve assegurar-se, em tempo útil, o direito de manter a sua actividade laboral de nutricionista que exerce há vinte anos, sob pena de violação dos direitos, liberdades e garantias, consagrados nos artigos 12°, 13°, 26°, 47°, 53°, 58° e 59° e o artigo 266 n° 2 da CRP. Considera o requerente que há a possibilidade de lesão irreversível do seu direito, porquanto, está em risco iminente de perda do seu posto de trabalho e do exercício de funções como nutricionista e para as quais considera ter as habilitações necessárias. Mais considera o requerente que resulta evidente que a Requerida negou ao Requerente, a sua inscrição na ordem dos nutricionistas, violando a liberdade de acesso a uma actividade profissional, os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade, da boa-fé, o princípio do Estado de Direito, de segurança jurídica, da protecção da confiança dos cidadãos, da liberdade de escolha da profissão, da segurança no trabalho e do direito ao trabalho, tendo proferido decisão de indeferimento sem qualquer fundamento e fundamentação. A situação descrita pelo requerente como lesiva, de ameaça grave e violação do direito fundamental de liberdade de escolha do exercício de uma profissão, reporta-se, pois, à aplicação do Estatuto da Ordem dos Nutricionistas - Lei 126/2015 de 3 de Setembro, isto é, a aplicação da legislação relativa às condições exigidas para quem se quer inscrever na referida Ordem Profissional. O requerente pretende com a presente intimação que o Tribunal, face ao quadro legal aplicável, reconheça o seu direito a inscrever-se como membro efectivo da Ordem dos Nutricionista, declarando inválidos todos os actos praticados pela referida Ordem, que indeferiram os pedidos de inscrição por si formulados bem assim como os relativos às queixas apresentadas pela Ordem relativamente à prática de crime de usurpação de funções. Decorre do art.º 109. °, n.° 1 do CPTA que: “A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar, segundo o disposto no artigo 131°.” Este meio processual de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, regulado nos artigos 109° a 111° do CPTA, constitui um processo autónomo que implica a emissão duma decisão definitiva e destina-se a dar cumprimento à exigência ditada pelo art. 20°, n.° 5 da CRP, quando nele se estatui que para “(...) defesa dos direitos liberdades e garantais pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter a tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos”. Como se sustentou, a propósito do art. 109° do CPTA no Acórdão do STA de 18-11-2004 - Proc. n.° 0978/04, pretendeu-se “(...) consagrar uma tutela jurisdicional reforçada nas situações tipificadas no já mencionado preceito, deste modo vincando a posição do cidadão como sujeito de direitos e liberdades, dando a tais direitos, liberdades e garantias um estatuto de “prefered position” (...).Podemos, assim, encarar o regime acolhido nos já referidos artigos 109° a 111° do CPTA como uma clara manifestação da incidência e projecção de uma parcela nuclear do Direito Constitucional sobre institutos de Direito Processual Administrativo, assumindo-se, por isso, o contencioso administrativo como um dos elementos de garantia dos direitos fundamentais. Os mencionados preceitos concedem ao juiz administrativo um poder de injunção, ainda que limitado às situações em que esteja em causa a protecção de direitos, liberdades e garantias, habilitando-o a adoptar todas as medidas necessárias a salvaguardar o exercício em tempo útil, dos direitos, liberdades e garantias, deste modo o dotando dos meios de acção indispensáveis a assegurar a defesa das “liberdades” dos “Particulares. (...) O Legislador ordinário, dando cumprimento à imposição veiculada no n.° 5, do artigo 20.° do CBP, procedeu à revalorização fundamental do papel do juiz administrativo no campo da protecção dos direitos, liberdades e garantias, dando-lhe meios para obviar, rápida e eficazmente, às ameaças aos direitos, liberdades e garantias. O interessado que pretenda aceder à via contenciosa mediante o pedido de intimação deverá invocar a lesão, ou ameaça de lesão, dos seus direitos, liberdades ou garantias, devendo formular o seu pedido contra o ente público de que proceda o acto ou omissão que ponha em risco ou atente contra os direitos, liberdades e garantias, podendo, também, formular o pedido contra particulares, designadamente concessionários, quando vise suprir a omissão por parte da Administração das providências adequadas a prevenir ou reprimir condutas lesivas dos direitos, liberdades e garantias do Interessado (n.° 2 do artigo 109° do C.P.T.A.).Temos, assim, que a pretensão terá de fundar-se na lesão ou ameaça de lesão de um direito, liberdade ou garantia, o que, de resto, deve ser devidamente referenciado pelo interessado na sua petição.” Os pressupostos do pedido de intimação são, pois, os seguintes: - Necessidade de emissão urgente de uma decisão de fundo do processo que seja indispensável para protecção de um direito, liberdade ou garantia; - Que o pedido se refira à imposição dum conduta positiva ou negativa à Administração ou a particulares; - Que não seja possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar, no âmbito de uma acção administrativa normal (comum ou especial). Quanto ao primeiro requisito ou pressuposto e para a sua análise importa ter presente, tal como sustenta o Prof. J. C. Vieira de Andrade in “A Justiça Administrativa (Lições)”, 8ª edição, pág. 276, o “(...) carácter relativo ou gradativo da urgência, que depende das circunstâncias do caso concreto, avaliadas de acordo com um critério composto, que, nas espécies radicais de «especial urgência», associa apreciações temporais de iminência a juízos de valor, num ponderação própria das situações de necessidade. Em regra, bastará que haja perigo de uma lesão séria para os direitos do particular, mas, quando essa lesão seja iminente e irreversível, o juiz poderá acelerar o processo (...)“. Quanto ao segundo requisito temos que o conteúdo do pedido do requerente a deduzir no âmbito deste meio contencioso será a condenação do requerido na adopção de uma conduta positiva ou negativa, que poderá, inclusivamente, traduzir-se na prática de um acto administrativo tal como resulta do disposto no art. 109° n.°s 1 e 3 do CPTA como numa mera operação material (Prof. J. Carlos Vieira de Andrade in: ob. cit., pág. 279), pelo que este pedido tanto pode servir para reprimir como apenas para prevenir a lesão dum direito, liberdade e garantia. Por fim, quanto ao último requisito temos que importa ter presente, como tem sido aceite uniformemente na doutrina, que o meio normal de defesa ou de tutela dos direitos fundamentais reside no recurso às acções administrativas comuns ou especiais (nestas com predominância para as acções de condenação à prática do acto devido). Nessa medida, a regra é o recurso ou o lançar mão daquelas formas de tutela principal não urgente para efectivação e defesa de direitos, liberdades e garantias, ficando a tutela principal prevista, enquanto forma de impugnação urgente, nos artºs. 109° e ss do CPTA reservada apenas para as situações em que aquela via normal não é possível ou suficiente para assegurar o exercício em tempo útil e a título principal do direito, liberdade ou garantia que esteja em causa e cuja defesa reclame uma intervenção jurisdicional. A este propósito referem o Prof. M. Aroso de Almeida e o Cons. C.A. Fernandes Cadilha, in “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, págs. 538 e 539 “(...) O processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é, assim, instituído como um meio subsidiário de tutela, vocacionado para intervir como uma válvula de segurança do sistema de garantias contenciosas, nas situações – e apenas nessas - em que as outras formas de processo no contencioso administrativo não se revelam aptas a assegurar a protecção efectiva de direitos, liberdades e garantias. A opção afigura-se compreensível, não parecendo, na verdade, que o âmbito de intervenção desta forma de processo esteja configurado em moldes excessivamente restritivos. (...) Afigura-se, pois, justificado recorrer, por norma, aos processos não urgentes, devidamente complementados por um sistema eficaz de atribuição providências cautelares, efectivamente apto a evitar a constituição de situações irreversíveis ou a emergência de danos de difícil reparação (...), e reservar os processos urgentes para situações de verdadeira urgência na obtenção de uma decisão sobre o mérito da causa, que são aquelas para as quais, (...), não é suficiente a utilização de um processo não urgente, ainda que complementado pelo decretamento - se as circunstâncias o justificarem, provisório (... cfr. artigo 131.°) - de providências cautelares (...)“. E na ligação da impugnação urgente na modalidade de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias com o art. 131.° do CPTA referem os citados autores a págs. 539 a 541 da citada obra que “(...) Cumpre, notar que o sentido do preceito é o de afirmar a existência, .., de uma relação genérica de subsidiariedade entre este processo e os processos não urgentes ( acção administrativa comum e acção administrativa especial ). A referência específica ao decretamento provisório de providências cautelares, previsto no artigo 131.°, compreende-se, entretanto, porque a relação de subsidiariedade em relação aos processos não urgentes se estende, como não poderia deixar de ser, ao recurso à tutela cautelar - e, dentro desta, à mais incisiva das possibilidades que o regime da tutela cautelar oferece, a do decretamento provisório de providências cautelares, previsto no artigo131.°, quando as circunstâncias o justifiquem. (...) Quando, .., se afirma que o processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias só deve intervir quando os processos não urgentes capazes de assegurar uma protecção adequada, esta afirmação tem necessariamente em vista os processos não urgentes, devidamente complementadas pelo sistema de tutela cautelar, com todas as possibilidades que ele comporta - com natural destaque para a mais efectiva de todas, que é a do decretamento provisório de providências cautelares (...) o decretamento provisório de providências cautelares, tal como previsto no art. 131.°, consiste na possibilidade que, em situações de extrema urgência - e, em especial, quando esteja, ..., em causa o exercício em tempo útil de direitos, liberdades e garantias -, é dada ao autor que desencadeie ou se proponha desencadear um processo não urgente, de obter, em ordem a assegurar a utilidade da decisão que pretende alcançar nesse processo, a adopção imediata de uma providência cautelar, ainda durante a própria pendência do processo cautelar. (...). O decretamento provisório de providências cautelares permite, assim, obter, num prazo que, em situações de extrema urgência, pode ser, tal como na intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias (...), de 48 horas (...), a adopção de providências cautelares dirigidas a impedir a lesão iminente e irreversível de direitos, liberdades e garantias. (...) o decretamento provisório de providências cautelares pode e deve intervir em todos os domínios em que faça sentido a concessão de providências cautelares, sem prejuízo da decisão que venha a ser proferida no processo principal e até sem prejuízo da decisão definitiva que, a propósito da manutenção ou não da providência provisoriamente decretada, venha a ser proferida no próprio processo cautelar. (...).Pelo contrário, o processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias há-de ser chamado a intervir em situações que não possam ser acauteladas deste modo, porque é urgente a obtenção de uma pronúncia definitiva sobre o mérito da causa. (...) O que em situações deste tipo é necessário, é obter, em tempo útil e, por isso, com carácter de urgência, uma decisão definitiva sobre a questão de fundo: a questão tem de ser definitivamente decidida de imediato, não se compadecendo com uma definição cautelar. O processo principal urgente de intimação existe precisamente para suprir as insuficiências próprias da tutela cautelar, que resultam do facto de ela ser isso mesmo, cautelar. (...)“. Caracterizados os requisitos importa sublinhar que não nos encontramos no domínio da tutela cautelar ou provisória visto que o pedido de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias proporciona uma tutela principal e que visa a obtenção pelo requerente, em tempo útil e por isso com carácter de urgência, de uma pronúncia definitiva sobre a relação jurídico-administrativa em questão, formando-se sobre aquela pretensão/pedido caso julgado material (Prof. J. C. Vieira de Andrade, ob. cit., pág. 277). Todavia, importa ter presente que se trata de meio contencioso que se caracteriza pela sumariedade e urgência, de molde a que se obtenha o seu desiderato, ou seja, “uma protecção rápida e contundente ao legítimo exercício de um direito, liberdade ou garantia frente a qualquer tipo de ameaças, restrições, lesões ou violações, provenientes, designadamente, da actuação ou omissão da Administração” (citado Ac. do STA de 18/11/2004 - Proc. n.° 0978/04). Impõe-se, no entanto, que o requerente ofereça, logo com o articulado inicial, prova sumária que sustente ou permita fundar os requisitos ou pressupostos necessários quer para a admissibilidade do pedido de intimação quer, depois, para a sua procedência. No que tange à necessidade de emissão urgente de uma decisão de fundo que seja indispensável para protecção de um direito, liberdade ou garantia, veja-se o Acórdão do TCA do Norte, de 13/08/2007, proferido no âmbito do processo n.º 02837/06.8BEPRT, segundo o qual “(...) a regra é o recurso ou o lançar mão daquelas formas de tutela principal não urgente para efectivação e defesa de direitos, liberdades e garantias, ficando a tutela principal prevista, enquanto forma de impugnação urgente, nos arts. 109.° e segs. do CPTA reservada apenas para as situações em que aquela via normal não é possível ou suficiente para assegurar o exercício em tempo útil e a título principal do direito, liberdade ou garantia que esteja em causa e cuja defesa reclame uma intervenção jurisdicional.(...) Nesta matéria não podemos ainda deixar de ter em atenção os ensinamentos colhidos da doutrina expendida pela Dr.ª Isabel Celeste Fonseca quando sustenta que da “... interpretação e da valoração dos conceitos imprecisos previstos no art. 109.° parece que fica clara a natureza subsidiária da intimação. (...), a necessidade da intimação urgente, sob a forma de decisão de fundo, afere-se pela impossibilidade ou insuficiência da intimação urgentíssima provisória, sob a forma de decisão cautelar, para assegurar uma protecção eficaz destes direitos. (...) A intimação será absolutamente necessária quando não puder ser dispensada, ou seja quando, para proteger direitos fundamentais, a intensidade da necessidade de protecção imediata impeça, por não ser possível em tempo útil, o recurso a um outro meio processual (por exemplo a acção administrativa comum) que seria o meio adequado ou o meio próprio para resolver definitivamente a questão existente...” (in: “Dos Novos Processos Urgentes no Contencioso Administrativo (Função e estrutura)”, págs. 76 e 77).E continua a citada autora “...para compreender o conceito de subsidiariedade estabelecido no art. 109.º, o que conta é a capacidade ou incapacidade da medida cautelar para regular definitivamente uma situação e não a urgência. (...) de acordo com a letra da lei, subjacente à necessidade da intimação urgente definitiva existe uma situação de urgência, mas para a qual não servem as vias processuais comuns, porque são lentas demais, nem presta a medida cautelar urgentíssima. E esta não serve por uma razão: porque é uma medida cautelar e, por isso, porque é caracterizada pela provisoriedade. E, não satisfazendo no caso concreto o regulamento provisório, ela deve ser preterida perante o processo urgente que julgue definitivamente o mérito da causa. (...) A forma como o factor tempo interfere com o direito que é objecto do processo e de como este só se realiza se a decisão do juiz for imediata são condições que obrigam à emissão de uma decisão que não pode ser provisória, porquanto qualquer que seja a decisão formal que o juiz emita, ao pronunciar-se sobre o pedido cautelar, ele decide sobre o objecto do processo principal (que vier a ser proposto, se entretanto o não foi), já que, nestes casos, o objecto medito dos processos se identifica com a referência à situação substancial a acautelar. E esta não se compadece com uma decisão provisória. (...) Contudo, nem todas as situações de urgência se satisfazem sem que as decisões antecipatórias ultrapassem os limites da técnica da antecipação. São estas que cumpre identificar caso a caso. E sempre no caso concreto, através dum juízo de prognose, que estas se identificam: i) são de natureza improrrogável, que reivindica uma composição jurisdicional inadiável; ii) têm uma natureza que não se compadece com a provisoriedade jurisdicional e que obriga o juiz a pronunciar-se de modo definitivo. Definitivo, no sentido de solução fatal, já que ela matará a utilidade posterior de qualquer sentença de mérito que vier a ser emitida no âmbito de um processo principal que conheça sobre essa situação, de modo mais profundo...” (in: ob. cit., págs. 78 a 83). Concluindo a referida autora sustenta que existem “...situações claras de urgência que são propícias a exigir decisões de fundo. De uma forma generalista, podemos dizer que a situação de urgência pode manifestar-se pela sua configuração em função do tempo: situações sujeitas a um período de tempo curto, ou que digam respeito a direitos que devam ser exercitados num prazo ou em datas fixas – questões conexas com uma eleição, incluindo campanhas eleitorais, situações decorrentes de limitações ao exercício de direitos num certo dia ou numa data próxima, actos ou comportamentos que devam ser realizados numa data fixa próxima ou num período de tempo determinado, como exames escolares ou uma frequência do ano lectivo. Podem configurar igualmente casos de urgência situações de carência pessoal ou familiar, em que esteja em causa a própria sobrevivência pessoal de alguém. Casos relativos à situação civil ou profissional de uma pessoa podem constituir igualmente uma situação de urgência. (...) Este processo de intimação urgente definitiva permite ao juiz, no domínio de direitos, liberdades e garantias, decidir legitimamente a questão de fundo de modo definitivo, nos casos em que as situações concretas de urgência verdadeiramente o mereçam e o exijam. Para compreender os pressupostos de admissibilidade da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, deve partir-se da consideração da absoluta necessidade de emissão de uma decisão de mérito pelo facto de uma medida cautelar se revelar, num certo caso, como impossível ou insuficiente. Já o caso oposto, quando se deva entender que a questão subjacente, ainda que seja relativa a direitos, liberdades e garantias, possa provisoriamente ser composta por via cautelar, esta deve ser a escolha preferida em detrimento da intimação definitiva, podendo actuar cumulativamente com um outro instrumento de tutela principal...” (in: ob. cit., págs. 84 e 85). (...) Impõe-se, no entanto, que o requerente ofereça, logo com o articulado inicial, prova sumária que sustente ou permita fundar os requisitos ou pressupostos necessários quer para a admissibilidade do pedido de intimação quer, depois, para a sua procedência. Como última nota importa ter presente que o legislador não restringiu este meio processual aos direitos, liberdades e garantias pessoais como estabelece o art. 20.°, n.° 5 da CRP visto que o seu âmbito abarca os direitos, liberdades e garantias do Título II, da Parte I da CRP, incluindo os de natureza análoga (art. 17.° da CRP), pelo que se consideram abarcados no seu âmbito os direitos de natureza análoga dispersos na CRP e fora do catálogo (cfr. nesta matéria, Dr.ª Maria Fernanda Maçãs in: loc. cit., pág. 50; Prof. J. C. Vieira de Andrade in: ob. cit., pág. 275 e nota 605; Dr.ª Sofia David in: “Das Intimações ....”pág. 121; Prof. M. Aroso de Almeida e Juiz Cons. C. A. Fernandes Cadilha in: ob. cit., págs. 629 e 630, nota 1; Dr.ª Isabel Celeste Fonseca in: ob. cit., pág. 76) (...) o que se pretende com o presente meio processual é salvaguardar o exercício de um direito, liberdade ou garantia em tempo útil e de forma definitiva”. Voltando ao caso em apreço, não há dúvida que o requerente, assumindo a titularidade de um direito que afirma estar a ser violado, pretende que o Tribunal se debruce sobre a validade dos actos praticados e declarando-os inválidos, condene a entidade requerida na realização da prestação a que considera ter direito – inscrição na Ordem dos Nutricionistas-, destinada à reintegração ou reparação do direito pretensamente violado. Acontece que o requerente, através do presente meio processual não pode almejar alcançar a sua tutela judicial quando, é notório, que a sua pretensão não foi, como devia, exercida dentro dos prazos legais fixados para o efeito. O requerente visa obter com a presente acção o efeito que resultaria da impugnação dos actos praticados pela Ordem dos Nutricionistas, ou seja, como decorre dos autos, pretende o requerente obter por esta via o efeito que resultaria da oportuna impugnação dos actos administrativos de indeferimento e a subsequente condenação à prática dos acto devidos, consubstanciada na efectiva inscrição do requerente na Ordem dos Nutricionistas, com consequências nas alegadas queixas feitas por esta Ordem ao nível da alegada usurpação de funções. In casu o requerente, após diversas tentativas de inscrição na Ordem dos Nutricionistas (no ano de 2012) e já na vigência da Lei nº 126/2015, de 3 de Setembro, que alterou o Estatuto da Ordem dos Nutricionistas, requereu a sua inscrição na Ordem dos Nutricionistas em 2 de Março de 2016, que não obteve qualquer resposta, tendo formulado novamente o pedido de inscrição em 29 de Abril de 2016 que foi indeferido em 23 de agosto de 2016. Mais, em 2 de Novembro de 2018, requereu a reapreciação do seu pedido de inscrição na Ordem, que terá sido indeferida por despacho de 25 de Janeiro de 2019 da Direcção da Ordem, comunicado através de ofício de 12 de Fevereiro de 2019. O artigo 69.°/1 do CPTA dispõe o seguinte: «Em situações de inércia da Administração, o direito de acção caduca no prazo de um ano contado desde o termo do prazo legal estabelecido para a emissão do acto ilegalmente omitido.» E o n° 2 do mesmo artigo prescreve que: «Tendo havido indeferimento, o prazo de propositura da acção é de três meses». Como se vê, a lei distingue entre situações de inércia absoluta da Administração, correspondentes a uma total ausência de acto (artigo 69..°/1), e situações em que tenha havido uma pronúncia expressa sobre a pretensão do interessado (artigo 69..°/2). Nas primeiras, o direito de acção caduca no prazo de um ano, e nas segundas a acção deverá ser interposta no prazo de três meses. No caso concreto, verifica-se que, na sequência de um requerimento dirigido à Ordem dos Nutricionistas em 2 de Março de 2016 com vista à sua inscrição, não foi alcançada qualquer resposta. Por isso, o requerente, em 29 de Abril de 2016 fez novo pedido de inscrição na Ordem, pedido que foi indeferido em 23 de Agosto de 2016, pelo que, esta situação se enquadra claramente no quadro da previsão do artigo 69.°/2 do CPTA, o que significa que o prazo de propositura da acção impugnatória/condenatória) era de três meses, prazo esse que se encontra há muito tempo esgotado. Mas, ainda que fosse considerado o prazo mais longo fixado no n°3 do art° 69° do CPTA, também esse se encontrava integralmente esgotado para atacar o acto que indeferiu o pedido de inscrição na Ordem dos Nutricionistas ao ora requerente. É certo que o requerente, em 2 de Novembro de 2018, requereu a reapreciação do seu pedido de inscrição na Ordem, pedido que foi indeferido por despacho de 25 de Janeiro de 2019 da Direcção da Ordem, referindo a impossibilidade de inscrição do requerente em virtude de não ser detentor do título académico habilitante considerado necessário para esse efeito, decisão que lhe foi comunicada por ofício de 12/2/2019. Ora, tendo presentes os termos em que foi decidido indeferir o pedido de inscrição na Ordem em 2016 bem assim como em 2019, temos que, pese embora o requerente tenha renovado a sua pretensão, cujo objectivo é o reconhecimento do invocado direito à inscrição na Ordem dos Nutricionistas, certo é que as circunstâncias em que fez foram as mesmas, isto é, sem que tenha ocorrido alguma alteração ao nível dos factos e dos fundamentos do pedido, pelo que, não pode deixar de se considerar que a decisão proferida em 2019 e que motiva o recurso à presente acção judicial, é meramente confirmativa da decisão anterior e como tal não lesiva e contenciosamente inimpugnável. O regime da impugnação de acto meramente confirmativo decorre do disposto no artigo 53.º do CPTA que, sob a epígrafe “ Impugnação de actos confirmativos e de execução” estabelece que: “1. Não são impugnáveis os actos confirmativos, entendendo-se como tal os actos que se limitem a reiterar, com os mesmos fundamentos, decisões contidas em actos administrativos anteriores. 2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior os casos em que o interessado não tenha tido o ónus de impugnar o ato confirmado, por não se ter verificado, em relação a este ato, qualquer dos factos previstos nos n°s 2 e 3 do artigo 59.° 3 - Os actos jurídicos de execução de actos administrativos só são impugnáveis por vícios próprios, na medida em que tenham um conteúdo decisório de carácter inovador. 4 - Quando seja admitida a impugnação do ato confirmativo, nos termos do n.° 2, os efeitos da sentença que conheça do objecto do processo são extensivos ao ato confirmado”. Considera-se que estamos em presença de um acto confirmativo quando o mesmo repete, perante os mesmos pressupostos de facto e de direito, o conteúdo e a fundamentação do acto anterior, sem nada acrescentar ou retirar ao conteúdo deste. Para sabermos se existe uma relação de confirmatividade entre a as duas decisões da Ordem dos Nutricionistas (de 2016 e 2019) que indeferiram a pretensão do requerente, impõe-se saber se há identidade de decisão, na vertente de identidade de resolução dada ao caso concreto e também identidade da fundamentação da decisão e identidade das circunstâncias ou pressupostos da decisão numa e noutra comunicação. Na verdade, o acto meramente confirmativo é proferido na sequência de acto administrativo contenciosamente impugnável, em idêntico sentido, pela mesma entidade e subsistindo os sujeitos e as circunstâncias legais, e factuais, do acto confirmado, constituindo um acto contenciosamente inimpugnável, porque não tem eficácia externa própria, e nem possui, autonomamente, natureza de acto lesivo de direitos ou de interesses protegidos. In casu, o requerente pretende obter por via da presente acção uma decisão judicial que intime a requerida a inscrevê-lo na Ordem dos Nutricionistas e considere inválidos os actos praticados que indeferiram a sua pretensão, o que significa que pretende, agora, obter a declaração de invalidade de actos que se consolidaram na ordem jurídica, porque não foram impugnados no tempo próprio, sendo que, o acto proferido em 2019, em nada altera a situação jurídica já definida, pois a situação fáctico-jurídica é a mesma, o destinatário do acto é o mesmo e os pressupostos de facto e de direito são os mesmos, existindo uma mera confirmação do acto anterior. A inimpugnabilidade desse acto confirmativo é, pois, manifesta à luz do artigo 53º, nºs 1, 2 e 3 do CPTA, ou seja, porque o acto confirmado foi comunicado ao ora requerente, mostrando-se-lhe oponível e, ainda, porque não são apontados vícios próprios ao acto confirmativo. Nestes termos, o referido acto confirmativo - porque se limita a manter, sem alteração, a situação jurídica já definida pelo acto confirmado e porque não introduz qualquer modificação naquela situação - não se traduz em qualquer ofensa ao direitos ou interesses legalmente protegidos do requerente e, por isso, não sendo lesivo, não é recorrível contenciosamente, sendo inimpugnável. Para além disso, é exigível que exista uma adequação da pretensão material deduzida ao meio processual utilizado, o que ora de todo não se verifica, reafirmando-se não ser legalmente possível no âmbito da presente intimação emitir uma pronúncia quanto à validade da actuação da requerida, por não ser a via própria para a impugnação de actos administrativos. Se assim não fosse, permitir-se-ia no âmbito de acção destinada à tutela de direitos e interesses violados ou séria e gravemente ameaçados que exijam a célere emissão de uma decisão de mérito, contornar os prazos de impugnação das decisões administrativas proferidas e já consolidadas na ordem jurídica, efeito de forma alguma admissível à luz do quadro legal aplicável. Pelas razões supra referidas, não se mostra possível através da presente intimação a concessão da tutela pretendida, não sendo possível, convolar o presente meio processual principal em processo cautelar, pelas mesmas razões já sobejamente explanadas e que se prendem com a inimpugnabilidade dos actos em crise, desde logo, decorrente da caducidade do direito de acção e bem assim como da natureza confirmativa do acto mais recente praticado pela requerida. Em face do explanado, é forçoso concluir que in casu ocorrem obstáculos intransponíveis à pretendida emissão urgente de uma decisão de mérito, tida pelo requerente como indispensável para protecção de direitos, liberdades ou garantias, pelo que, a presente intimação não pode proceder. X Uma vez que o processo se encontra no Tribunal Central Administrativo Norte (e não no Tribunal Central Administrativo Sul) não faz sentido a questão prévia suscitada pela ora Recorrida.Do mérito da causa - Nas suas alegações de recurso, o Recorrente vem levantar questões absolutamente estranhas ao processo, desgarradas dos elementos nele contidos e relacionadas com a notificação e não notificação de despachos e das respectivas datas em que recebeu tais decisões. Estranhas pelos contornos que alegadamente assumiram: repetidas falhas dos CTT, avisos que são deixados em terceiros, doenças que impedem o levantamento de correio registado. Todavia, nos termos do artigo 3º da Portaria nº 380/2007, de 19 de dezembro, “A apresentação de peças processuais, documentos e processo instrutor por transmissão eletrónica de dados por mandatários e representantes em juízo é efetuada através do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais administrativos e fiscais, acessível, através de certificado digital emitido por entidade certificadora credenciada ou por recurso ao Sistema de Certificação de Atributos Profissionais associado ao Cartão do Cidadão e à Chave Móvel Digital, no endereço https://www.taf.mj.pt, de acordo com os procedimentos e instruções aí constantes”. Assim, tratando-se de um processo cuja entrada data de 26 de março de 2019, nem sequer se descortina a razão para o processo não ter sido inteiramente tramitado via SITAF, fazendo com que as notificações, sempre tão difíceis segundo o Recorrente, fossem feitas em devido tempo. Tal equivale a dizer que, se problemas houve, e os que vêm alegados estão por provar, como bem anota a Recorrida, a imputação tem de ser feita por inteiro ao Recorrente. Da pretensa nulidade da sentença - A ora Recorrida, na sua oposição à intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, invocou, entre outras excepções, a nulidade da notificação, com fundamento na aparente inexistência do despacho liminar previsto no artigo 110º do CPTA. E na Conclusão 1) das suas alegações o Recorrente vem requerer a nulidade da omissão do despacho liminar. A verdade é que esse despacho, a ser omitido, beneficiaria o aqui Recorrente. Ou seja, o tribunal, em vez de analisar a petição e poder recusá-la ou admiti-la, nada terá feito, mas deu-se a citação da ora Recorrida. Neste contexto, qual foi mesmo o prejuízo que resultou para o Recorrente? Interroga-se, e bem, a Recorrida. Nenhum. Tal significa que, apesar das alegações não serem claras a este respeito, o Recorrente se limita a arguir uma nulidade que, a ter existido, apenas o beneficiou a ele. Ainda quanto a este tema do despacho liminar, na sua Conclusão 3) o Recorrente vem dizer que o Tribunal só podia indeferir a intimação no prazo de 48 horas e que nada tendo a Recorrida acrescentado na sua oposição, não há razões para o tribunal ter posição diferente. Sucede que este argumento radica em vários equívocos. Primeiro, confunde a admissibilidade do pedido com a procedência do pedido. No despacho liminar a proferir nas primeiras 48 horas o juiz deve assegurar-se que se trata de um pedido que caiba neste meio processual e que tem subjacente uma questão de grande urgência. Esse despacho não se pronuncia sobre o mérito, nem podia, dado que ainda não foi produzida prova nem oferecido à contraparte o exercício do contraditório. Segundo, porque tem uma visão do processo muito estrita: se uma parte não levanta uma questão, o juiz não a pode apreciar. Ora, a inimpugnabilidade de um acto administrativo é uma excepção dilatória, que, nos termos do artigo 89º/2 e 4/i do CPTA, é de conhecimento oficioso. Mas nem sequer foi o caso pois o Tribunal nem sequer suscitou a questão oficiosamente; apreciou-a na sequência da oposição da aqui Recorrida. Alega ainda o Recorrente que o Tribunal não se pronunciou sobre requerimentos a que deu entrada. Vejamos. O Tribunal a quo notificou o Recorrente do despacho datado de 11 de abril de 2019 convidando o mesmo a pronunciar-se sobre as excepções arguidas pela Requerida. Ora, após ter sido notificado da resposta desta e do despacho do Tribunal a quo, o Recorrente teve intervenção no processo, nomeadamente, quando requereu a intervenção do Ministério Público (requerimento datado de 6 de maio de 2019). Considerando esta cronologia, não poderia ter sido outra a conclusão do Tribunal senão a de que o Recorrente se tinha abstido de se pronunciar sobre as excepções, pois, por um lado, (i) já tinha decorrido o prazo de dez dias para apresentar a pronúncia e, por outro, (ii) já tinha tido intervenção no processo em data posterior ao despacho que lhe havia concedido prazo para pronúncia quanto às aludidas excepções. Assim, desatende-se a argumentação atinente à falta de oportunidade para o exercício do contraditório. Até porque dos autos resulta que os requerimentos a que o Recorrente se refere nas suas alegações datam de 1 de julho de 2019, isto é, já depois de ter sido proferida sentença e em nada se prendem com a resposta à excepção invocada, uma vez que é requerido que “se considere justo impedimento, pronunciando-se sobre o requerimento que deu entrada no dia 04 de junho do corrente ano”. No referido requerimento de 4 de junho de 2019, o ora Recorrente requereu ao Tribunal a quo a intervenção do Ministério Público, sobre o mérito do peticionado na p.i. da acção de intimação para a defesa de direitos, liberdades e garantias. Assim, à data da prolação da sentença - 3 de junho de 2019 - o Tribunal só poderia ter concluído que o Recorrente não se tinha pronunciado porque não o tinha desejado. Relativamente à nulidade da sentença, o Recorrente invoca que existe uma omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615º/1/d) do CPC, por o Tribunal não “se pronunciar sobre uma questão que deveria apreciar”. Porém, a questão a que o Recorrente se refere prende-se com o conteúdo dos requerimentos referidos supra. Como se disse, o conteúdo dos mesmos não tem que ver com questões a que caberia na sentença debruçar-se. Para além disso, a data dos requerimentos é posterior à da data da redação da sentença. E ainda mais relevante, o Recorrente não fez prova das dificuldades tardiamente invocadas. Assim, inexiste qualquer omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615º/1/d) do CPC. Da excepção do acto confirmativo - A este respeito alega o Recorrente que a Recorrida, na sua resposta, não levantou a questão do acto confirmativo, estranhando que na sentença tal tenha sido feito. Para além disso, invoca que não lhe foi dada possibilidade de se pronunciar sobre tal excepção o que, no seu entender, viola o princípio do contraditório. Carece de razão o Apelante. Repete-se que, na sua oposição à intimação, a Requerida, no âmbito das questões prévias, dedicou um capítulo específico (artigos 6. a 14.) à improcedência da intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias por causa deste fundamento. Ali se referiu: “6. Se não se aceitar o anteriormente exposto, o que só por dever de patrocínio se aceita, também se deve referir que os pressupostos da intimação para a proteção de direitos, liberdades e garantias não estão verificados, já que a mesma tem como objeto um ato administrativo que, ainda que fosse ilegal (mas não é!), já se consolidou no ordenamento jurídico. 7. Não se verificando nenhuma das causas de nulidade previstas no artigo 161.º do Código do Procedimento Administrativo, o ato, se ilegal, seria apenas anulável, podendo apenas ser impugnado no prazo de um ano para o Ministério Público, contado a partir da prática do ato devido, ou de três meses nos restantes casos. 8. Com efeito, o Requerente pediu por diversas vezes a inscrição na Requerida como refere. 9. Porém, com a alteração legal trazida pela revisão do Estatuto da Requerida em 2015, o quadro legal em que foram tomadas as decisões da Requerida foi alterado. 10. Ainda que, em face das duas versões do Estatuto, a solução fosse a mesma (ou seja, o indeferimento da inscrição), a verdade é que a fundamentação jurídica quanto ao despacho proferido em 2016 se deu já no âmbito de um quadro legal modificado. 11. Seja como for, a verdade é que não tendo o Requerente impugnado o ato administrativo praticado em 2016, o mesmo consolidou-se na ordem jurídica ainda nesse ano. 12. Apesar de o último ato administrativo da Requerida ter sido praticado em janeiro de 2019, tendo sido comunicado ao Requerente em fevereiro de 2019, o Requerente apenas aparentemente está em prazo para proceder à sua impugnação. 13. Contudo, o ato administrativo praticado em 2019 é um ato meramente confirmativo, não podendo ser impugnado nos termos do artigo 53.º do CPTA. 14. Deste modo, o Requerente, tendo já deixado passar todos os prazos de impugnação que os diferentes atos da Requerida lhe proporcionaram, lança agora mão do presente processo de intimação como forma de contornar a sua inépcia processual.” Ou seja, como bem contrapõe a Recorrida, foi dito, clara e expressamente, que “não tendo o Requerente impugnado o ato administrativo praticado em 2016, o mesmo consolidou-se na ordem jurídica ainda nesse ano (…)”, nos termos do artigo 69.º, n.º 2 do CPTA, isto é, “o ato administrativo praticado em 2019 é um ato meramente confirmativo, não podendo ser impugnado nos termos do artigo 53.º do CPTA”. Com efeito, a 2 de novembro de 2018, o Recorrente pediu a reapreciação do seu pedido, tendo sido notificado a 12 de fevereiro de 2019 do despacho de indeferimento. Apesar de aparentar estar em prazo para impugnar o referido ato, o mesmo, por se limitar a reiterar com os mesmos fundamentos a decisão contida em 2016, é um ato meramente confirmativo, inimpugnável nos termos do artigo 53.º do CPTA, tal como consta da resposta, pelo que a questão de o tribunal a quo ter considerado a matéria ultra petitum não faz sentido. Deste modo, não poderia ser outra a decisão do Tribunal recorrido, senão a de considerar que o acto já se tinha consolidado no ordenamento jurídico e, consequentemente julgar improcedente a intimação. Ademais, não faz sentido a alegação de que não foi dada possibilidade de contraditório ao Requerente, pois como se referiu supra, o ora Recorrente foi notificado da resposta da ora Recorrida e tendo já intervenção no processo em dada posterior à referida notificação, o Tribunal a quo só poderia entender que o mesmo prescindiu de exercer o seu direito ao contraditório relativamente às questões prévias assinaladas pela parte contrária. Aliás, as conclusões 5) e 6) são absolutamente contraditórias entre si: é que, se a então Requerida nada referiu quanto ao acto afirmativo (o que se viu não ser assim) então que violação do contraditório ocorreu? Se a ora Recorrida não deduziu excepções, então o aqui Recorrente nada tinha para se pronunciar. Estas duas conclusões não podem conviver como bem se advoga nas contra-alegações. Em suma: -só é admissível o uso do processo de intimação previsto no artigo 109º e segs. do CPTA quando esteja em causa a lesão, ou a ameaça de lesão, de um direito, liberdade e garantia ou de um direito fundamental de natureza análoga, cuja protecção careça da emissão urgente de uma decisão de fundo (indispensabilidade) e não se verifique uma impossibilidade ou insuficiência do decretamento provisório de uma providência cautelar, instrumental de uma acção administrativa comum ou especial (subsidiariedade); -dito de outro modo, o processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias não se satisfaz com a circunstância de a tutela do direito fundamental exigir a prática de um acto administrativo ilegalmente recusado ou omitido, pois que terá que ser preenchido, para além de outros, o pressuposto da urgência de que depende a sua utilização, o que não sucede no caso posto; |