Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00240/18.6BEMDL |
![]() | ![]() |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 10/31/2024 |
![]() | ![]() |
Tribunal: | TAF de Mirandela |
![]() | ![]() |
Relator: | ANA PATROCÍNIO |
![]() | ![]() |
Descritores: | ERRO NA FORMA DO PROCESSO; NULIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO; OPOSIÇÃO; |
![]() | ![]() |
Sumário: | I - A falta de requisitos essenciais do título executivo, que, quando não puder ser suprida por prova documental, constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal – artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT –, não constitui fundamento de oposição, não sendo enquadrável na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do mesmo Código. II - Ocorrendo erro na forma de processo, a aferir pela adequação do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer, deve operar-se a convolação para a forma de processo legalmente adequada, se a tanto nada obstar.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Votação: | Unanimidade |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Decisão: | Conceder parcial provimento ao recurso. |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório A Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em 03/12/2019, que julgou a oposição procedente, deduzida por [SCom01...], Lda., contribuinte fiscal n.º ...94, com sede na Rua ...., em ..., contra os processos de execução fiscal n.º ...07, ...40, ...11 e ...31, relativos a dívidas de taxas de portagem, de coimas e outros encargos com processos de contra-ordenação, decorrentes da falta de pagamento de taxas de portagem e custos administrativos associados, bem como coimas por falta de pagamentos por conta de IRC e IUC, no montante de €5.884,74. A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “1.ª - Para a Administração Tributária - e Ministério Público, conforme Douto Parecer junto aos autos, nos termos do artigo 121º do Código do Procedimento e Processo Tributário - a oponente foi validamente citada no processo de execução fiscal. 2.ª - Porém, na Douta Sentença, agora em crise, decidiu-se que os documentos de citação e certidões de dívida - reproduzidos nos factos provados n.1 a 2, páginas 2 e 10 da sentença - não identificam a natureza e proveniência da dívida em falta. O que veementemente se repudia. Pois, nas minutas de citação, integralmente reproduzidas na Douta Sentença, são identificadas as dívidas - coimas de taxas de portagem. 3ª- Também a certidão de dívida - por exemplo, a reproduzida na página 4 da Douta Sentença - na identificação da natureza da dívida, é indicada a proveniência da mesma - “Coimas e encargos de processos de contra-ordenação. E o documento, anexo à certidão de dívida, - igualmente reproduzido na página 4 da Douta Sentença - procede à identificação com maior rigor de: documentos de origem; Datas limites de pagamento; Datas de inícios de juros de mora; Ano da dívida - 2018; Período de tributação - mês de fevereiro de 2018; Tributo - coima; Valores da dívida, com soma total, neste caso, de 362,0 euros. 4ª Acresce que - como muito bem refere o Digno Magistrado do Ministério Público, no Douto Parecer, penúltimo paragrafo da página 2 (a seguir transcrito:” Ora, conforme se infere desde logo da descrição da causa de pedir formulada pelo Oponente, o mesmo consegue identificar de forma precisa, relativamente a cada um dos processos executivos, a natureza da dívida quanto à sua exacta proveniência e razão de ser, nuns casos, apenas por falta de pagamento de portagens, e noutros, por falta de pagamento de portagens e falta de pagamento de coimas aplicadas por tal falta de pagamento de portagens, o valor respectivo a cada um dos títulos executivos, a entidade responsável que emitiu tal certidão de dívida para a instauração da execução.” 5ª - Pelo que, informação constante dos documentos de citação e respetivos anexos é suficientemente apreensível por qualquer contribuinte médio comum. Pois, a identificação/uso do nome comercial da ASCENDI, conjugado com o recurso às siglas/abreviaturas de, por exemplo: “port., coima tx portagem, C.Tx. port,” permite o conhecimento simples, acessível e universal da natureza e proveniência da dívida - taxas de portagem de vias rodoviárias e coimas devidas pelo incumprimento do pagamento das mesmas. 6ª - E, ainda que por hipótese meramente académica se entendesse que a esta citação faltou a perfeição legal exigível, a oposição deveria - sempre com devido respeito - improceder. Pois, para a Representação da Fazenda Pública e Ministério Público, a eventual nulidade de citação por falta de elementos essenciais, como é julgado neste caso, não constitui meio adequado/fundamento de oposição judicial. Não parece que, esta interpretação e aplicação do direito efetuada pelo Tribunal de primeira instância seja a mais adequada e consentânea com a jurisprudência vigente. 7ª - Pois, a nulidade por falta de requisitos essenciais do título executivo - nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT - não é fundamento de oposição à execução fiscal por não ser enquadrável na sua alínea i) do n.º 1 do art. 204º do CPPT, conforme resulta da melhor interpretação da Lei, efetuada em diversos arestos como por exemplo nos acs do STA n.º 01373/12 26-06-2013 e n.º 0345/13 de 27-11-2013; e, em situação muito idêntica à dos autos, no Acórdão de 8 de Fevereiro de 2018, no processo 00460/15.5BEMDL do Tribunal Central Administrativo Norte em sede recurso de decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela (acórdãos disponíveis em www.dgsi.pt). Pelo que, a presente oposição sempre improcederia por falta de fundamentos previstos no art. 204º do CPPT. 8ª e última conclusão - Acresce que, na douta sentença, aqui em crise, também não se discrimina a matéria de facto não provada, o que, só por si, também configura uma nulidade da sentença - conforme o Ac. do TCAN n.º 0329/05.1BEMDL de 0803-2012 - por violação das normas previstas no artigos 123º nº. 2 e 125º n. º 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário. Nestes termos, e nos melhores de Direito, que serão por V. Exas Doutamente supridos, deve o presente recurso ser julgado procedente, e em consequência, revogada a Douta Sentença, com todas as consequências legais.” Não houve contra-alegações. **** O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de o recurso merecer provimento. **** Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; submete-se o processo à Conferência para julgamento. II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa apreciar se a sentença recorrida enferma de nulidade, por falta de discriminação dos factos não provados e se incorreu em erro de julgamento, nomeadamente, quanto à excepção de nulidade, por erro na forma do processo, uma vez que o tribunal recorrido declarou a nulidade insanável dos processos de execução fiscal [artigo 165.º, n.º 1, alínea b) do CPPT], por verificação de nulidade dos títulos executivos, na medida do desconhecimento da natureza e da proveniência das dívidas em cobrança coerciva. **** III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença recorrida foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “1. A Oponente foi citada para pagar os montantes de 2.688,71€, 1.649,81€, 857,33€ e 688,89€, respectivamente quantos aos processos de execução fiscal n.º ...40, ...11, ...31 e ...07, de acordo com os ofícios de citação que constam de fls. 7 a 10 dos autos, que aqui se reproduzem, com o seguinte destaque: “(…) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] 2. Dão-se aqui por reproduzidas as certidões de divida que constam do PA, e que se reportam aos processos de execução fiscal n.ºs ...07, ...40, ...11 e ...31 (Cfr. fls. 1, 2, 3, 4 e 5; 1, 2 e 3; 1, 2, 3, 4, e 5; e 1, 2, 3 respectivamente), com o seguinte destaque: a. (Processo de execução fiscal n.º ...07) (…) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] b. (Processo de execução fiscal n.º ...40) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…) c. (Processo de execução fiscal n.º ...11) [Imagem que aqui se dá por reproduzida] d. Processo de execução fiscal n.º ...31 [Imagem que aqui se dá por reproduzida] (…)” 3. As certidões de dívida enunciadas não acompanharam os ofícios de citação. Apesar do Oponente não ser explicito quanto a esta questão, é certo que apenas juntou os ofícios de citação que apelidou de certidão(ões) de divida(s). Quanto a esta matéria a AT não o contradiz.” 2. O Direito O tribunal recorrido julgou procedente a presente oposição, tendo considerado o meio processual utilizado – oposição judicial – o próprio para conhecer a nulidade decorrente da falta de requisitos essenciais do título executivo, declarando a nulidade insanável dos processos de execução fiscal [artigo 165.º, n.º 1, alínea b) do CPPT], por verificação de nulidade dos títulos executivos, na medida do desconhecimento da natureza e da proveniência das dívidas em cobrança coerciva. Para afastar a excepção invocada, na sentença recorrida ponderou-se o seguinte: “(…) A nulidade decorrente da falta de requisitos essenciais do título executivo, previstos no art.º 163.º do CPPT, é susceptível de alicerçar a oposição à execução nos termos do art.º 204.º, n.º 1, al. i) do CPPT (Neste sentido cfr. Jorge de Sousa in CPPT anotado, 42 edição, pág. 743, e também, os Acds. do STA citados por aquele Autor, designadamente, os de 22/1/92, proferido no rec. 13528, 20/4/94, proferido no recurso 16152, 26/10/94, proferido no recurso 14382 e o de 18/2/98 proferido no recurso 21699). Portanto, inexiste erro na forma de processo. (…)” A questão de saber se a nulidade do título executivo, decorrente da falta de requisitos essenciais [artigo 165.º, n.º 1, alínea b) do CPPT], poderá ser invocada como fundamento de oposição à execução, nem sempre foi tratada de forma uniforme pela jurisprudência dos tribunais superiores, designadamente, pelo STA. No entanto, actualmente, a corrente jurisprudencial contrária à adoptada pelo tribunal recorrido mostra-se perfeitamente consolidada, sendo, por isso, e por concordarmos com a motivação para afastar tal fundamento dos possíveis para deduzir oposição judicial, que não poderemos acompanhar o julgamento realizado pela primeira instância. Já há cerca vinte anos que se mostra consolidado o seguinte: “A nulidade de falta de requisitos essenciais do título executivo não consubstancia o fundamento de oposição previsto na alínea i) do nº 1 do artigo 204º do CPPT, podendo ser invocada no processo executivo” – cfr. Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 23/02/2005, proferido no âmbito do processo n.º 0574/04. De facto, encontra-se actualmente pacificada a jurisprudência dos nossos tribunais superiores no sentido de que a falta de requisitos essenciais do título executivo, que, quando não puder ser suprida por prova documental, constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal – cfr. artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT –, não constitui fundamento de oposição, não sendo enquadrável na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do mesmo Código - cfr. Acórdão do Pleno da Seção de Contencioso Tributário do STA, de 16/11/2016, proferido no processo n.º 0715/16, assim como toda a jurisprudência ali citada, e, posteriormente ao mesmo, os Acórdãos proferidos pelo STA em 22/11/2017, no processo n.º 0833/17, em 11/07/2019, no processo n.º 0860/08.7BEPRT 0349/18, e em 06/10/2021, no processo n.º 0351/14.7BECBR, revendo-se este Tribunal integralmente na jurisprudência emanada dos citados acórdãos, à qual se adere sem qualquer reserva. Compulsando o teor da petição inicial da presente oposição, constata-se que a Oponente, ora Recorrida, invoca como único fundamento da mesma a nulidade do título executivo, por falta de requisitos essenciais deste. Terminando da seguinte forma: “Termos que deverá a presente oposição ser julgada procedente, declarando-se que ocorre nulidade insanável nos processos de execução por os títulos executivos não conterem os requisitos essenciais, declarando-se extintas as execuções fiscais à margem referenciadas”. Como já adiantámos, a nulidade insanável do processo de execução fiscal, por alegada falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental, não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, não sendo enquadrável na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do mesmo CPPT, como o efectuou o tribunal recorrido; deve, antes, ser arguida perante o órgão da execução fiscal, com a possibilidade de reclamação para o Tribunal Tributário de eventual decisão desfavorável (cfr. a alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º e o artigo 276.º, ambos do CPPT, bem como a reiterada jurisprudência mais recentemente firmada). Esta questão não foi isenta de dificuldades, existindo bons argumentos num e noutro sentido, daí a longa controvérsia jurisprudencial e o elevado número de acórdãos prolatados pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA. A título de exemplo, vejamos, entre muitos outros, o que ficou salientado no Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 19/11/2008, proferido no âmbito do processo n.º 430/08: «(…) há que reconhecer que tal fundamento cabe na literalidade da referida norma pois que patentemente não envolve a apreciação da legalidade da liquidação – desde logo, é-lhe posterior – nem interfere em matéria da exclusiva competência da entidade que emitiu o título. Por outro lado, tal nulidade conduz à extinção da execução pelo que, sendo esta o fim primacial da oposição, não haverá, por aí, obstáculo à predita resposta afirmativa. Cfr. JORGE DE SOUSA, CPPT anotado, 2.º volume, nota 16 ao artigo 165.º. Todavia, outros parâmetros há a considerar. Dispõe o artigo 2.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, que “a todo o direito (…) corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo”. E, em termos semelhantes, preceitua o artigo 97.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária, que “a todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo”. Assim, a cada direito corresponde uma só acção: unidade, que não pluralidade. Cfr. o acórdão do STJ, de 28 de Janeiro de 2003, in Colectânea, 166, p. 61. Ora, o artigo 165.º do CPPT considera nulidade insanável em processo de execução fiscal “a falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental”. E estabelece o respectivo regime, e efeitos: a anulação dos termos subsequentes do processo que do acto anulado dependam absolutamente, sendo (a nulidade) de conhecimento oficioso e podendo ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão. A lei elegeu, pois, tipicamente, o respectivo regime legal: trata-se de uma nulidade. E, como tal, estabelece-se igualmente o seu regime de arguição. Assim sendo, foi propósito legal desconsiderá-la como fundamento de oposição, ainda que seja a mesma, substancialmente, a consequência resultante: a extinção da execução consubstanciada na nulidade do próprio título. Por outro lado, a tutela jurídica concedida à nulidade é, até, mais consistente do que a resultante da oposição, na medida em que pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final, que não apenas no prazo de 30 dias contados da citação – cfr. artigo 203.º, n.º 1, do CPPT. Aliás, a entender-se dever ser conhecida pelo Chefe do Serviço de Finanças (ou, porventura, pelo juiz – cfr. o artigo 151.º, n.º 1, do CPPT), sempre o respectivo processo seria urgente – artigo 278.º, n.º 5 – o que é mais consentâneo com a celeridade querida para o processo de execução fiscal, atenta essencialmente a sua finalidade de cobrança de impostos que visam “a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas” e a promoção da justiça social, da igualdade de oportunidades e das necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento – artigo 5.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária. Nada, pois, parece justificar a apontada dualidade – em termos de nulidade processual da execução fiscal e de fundamento de oposição à mesma –, aliás proibida nos termos do referido artigo 2.º do Código de Processo Civil. Conclui-se, assim, que a nulidade da falta de requisitos essenciais do título executivo – nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT – não é fundamento de oposição à execução fiscal por não enquadrável no seu artigo 204.º, n.º 1, alínea i) (…)». É certo que a solução adoptada por esta jurisprudência tem merecido críticas (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Áreas Editora, 2011, 6.ª edição, III volume, anotação 13 ao art. 165.º, págs. 144 a 146.). Essencialmente, motivadas pelo facto de a nulidade insanável por falta de requisitos do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental, determinar a extinção da execução fiscal (finalidade típica da oposição à execução fiscal), implicar a inexequibilidade do título executivo (fundamento típico da oposição à execução) e caber na previsão da alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, pois é a provar por documento, não contende com a legalidade da liquidação subjacente à dívida exequenda e não representa matéria da exclusiva competência do órgão da entidade que emitiu o título; mas também alicerçadas nos princípios da economia processual e do anti-formalismo. Reconhecemos a pertinência de algumas das objecções à tese que fez vencimento na jurisprudência, maxime a do prejuízo para a economia processual e a do excessivo formalismo. Mas, salvo o devido respeito, fica por rebater aquele que será o argumento mais convincente da tese adoptada pelos sucessivos acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA e em muitos outros acórdãos da mesma Secção, qual seja o de que a lei para cada pretensão susceptível de ser deduzida em juízo faz corresponder um e um único meio processual adequado. Por outro lado, como bem salienta JORGE LOPES DE SOUSA, é «aconselhável o acatamento desta última jurisprudência uniforme mais recente para evitar mais tergiversações jurisprudenciais sobre esta matéria, por a estabilidade jurisprudencial e a confiança que ela gera nos cidadãos serem valores a prosseguir pelos tribunais que, quando não estão em causa reflexos substantivos, se devem sobrepor à adequação dos meios processuais» (Ibidem.). Recorde-se que o n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil (CC) impõe aos tribunais que tenham em «consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, obter uma interpretação e aplicação uniforme do direito». Acresce que a tese que ora subscrevemos não constitui restrição alguma do direito de acesso dos executados ao tribunal para garantia da defesa dos seus direitos e interesses legítimos ou controlo dos órgãos da Administração (designadamente do órgão da execução fiscal), em eventual violação do disposto no n.º 4 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa (CRP). Na verdade, esse direito não fica prejudicado pelo facto de a lei ordinária impor ao executado uma determinada forma processual, com exclusão de outras. Tal só sucederia se, proibida a aplicação de determinada forma processual – no caso a oposição à execução fiscal – lhe ficasse vedado o acesso a qualquer outra. Não é o caso, pois o executado que entenda que o título executivo enferma de nulidade insanável por falta de requisitos essenciais do título executivo, não susceptível de ser suprida por prova documental, poderá argui-la até ao trânsito em julgado da decisão final (n.º 4 do artigo 165.º do CPPT) junto do órgão da execução fiscal, com reclamação para o tribunal tributário de eventual decisão desfavorável (artigo 276.º do CPPT). É este o entendimento vertido no Acórdão do STA, de 06/10/2021, proferido no processo n.º 0351/14.7BECBR, que aqui, concordantemente, se reitera. Razão pela qual deve proceder a alegação da Recorrente no sentido de não constituir fundamento de oposição, enquadrável na alínea i) do n.º 1 do artigo 204º do CPPT, a nulidade do título executivo, por falta dos requisitos essenciais. Verifica-se, portanto, erro na forma de processo, impondo-se averiguar se o tribunal recorrido deveria ter mandado seguir a forma processual adequada. Vejamos. Como é sabido, ocorrendo erro na forma de processo, erro que se afere pela adequação do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer – cfr. artigo 193.º do CPC, deve operar-se a convolação para a forma de processo legalmente adequada, pois que a convolação materializa o princípio da tutela judicial efectiva, com expressão na correspondência entre direito e acção adequada (n.º 2 do artigo 2.º do CPC), além de que a convolação também se justifica por razões de economia processual, devendo anular-se apenas os actos processuais que não possam ser aproveitados - cfr. o citado artigo 193.º do CPC. In casu, atento o pedido formulado pela Oponente, poderá aproveitar-se a petição de oposição, convolando-a em requerimento de arguição de nulidade dirigido aos respectivos processos de execução fiscal, uma vez que a pretensão é tempestiva. Face ao exposto, mal andou o Tribunal a quo, ao avançar para o conhecimento da oposição, quando se verifica erro na forma do processo, sendo a petição de oposição susceptível de convolação em requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal - cfr. artigo 98.º, n.º 4 do CPPT e artigo 97.º, n.º 3 da LGT - importando, pois, revogar a decisão recorrida. Ficando, por isso, prejudicado o conhecimento das restantes questões colocadas no recurso. Logo, sendo determinada a convolação da presente petição em requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal, a Recorrida não se mostra prejudicada, na medida em que a sua pretensão será conhecida por este, podendo, perante decisão desfavorável, lançar mão da reclamação prevista nos artigos 276.º e seguintes do CPPT, em cumprimento da lei fundamental e do princípio da tutela jurisdicional efectiva. Em suma, urge conceder parcial provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e determinar a remessa dos autos à primeira instância a fim prosseguirem os ulteriores termos processuais aplicáveis, designadamente, proceder à convolação da oposição em incidente de arguição de nulidade do processo de execução fiscal, se a tal nada mais obstar. Conclusões/Sumário I - A falta de requisitos essenciais do título executivo, que, quando não puder ser suprida por prova documental, constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal – artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT –, não constitui fundamento de oposição, não sendo enquadrável na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do mesmo Código. II - Ocorrendo erro na forma de processo, a aferir pela adequação do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer, deve operar-se a convolação para a forma de processo legalmente adequada, se a tanto nada obstar. IV. Decisão Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder parcial provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e determinar a remessa dos autos à primeira instância a fim prosseguirem os ulteriores termos processuais aplicáveis, designadamente, proceder à convolação da oposição em incidente de arguição de nulidade do processo de execução fiscal, se a tal nada mais obstar. Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento, que se fixa em 50% a cargo da Recorrente; não incluindo as custas a cargo do Recorrido a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou. Porto, 31 de Outubro de 2024 [Ana Patrocínio] [Cristina Travassos Bento] [Vítor Salazar Unas] |