Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01125/06.4BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/21/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:PAULO MOURA
Descritores:IMPOSTOS ESPECIAIS;
ISP;
Sumário:

Nos impostos especiais existem formalidades diferentes das exigidas quanto aos impostos gerais.
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


«[SCom01...], S.A.», interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação oficiosa de Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP) e juros compensatórios.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença, DO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DO PORTO que julgou improcedente, a impugnação da liquidação adicional nº........182, de 23/01/2006, relativa a Imposto de Produtos Petrolíferos (I.S.P.), no montante de 23.366,12 € e juros compensatórios de 540,30 €.
2. Vem o presente recurso interposto, da douta sentença recorrida, com base em erro de julgamento, face à factualidade dada como provada e àquela que o deveria ter sido, à luz do direito.
3. Assim, relativamente ao vício de violação de lei por utilização de avaliação indireta sem possibilidade de contestar em sede de comissão de Revisão, refere a Sentença recorrida:
“A impugnante alega que a A.T. fez cálculos, deduções e presunções, utilizando uma avaliação indireta, sem que tenha concedido o direito legal de contestar em sede de comissão de revisão, nos termos dos artºs 91 e 92º da L.G.T..
Não lhe assiste razão, uma vez que os métodos indiretos apenas podem ser aplicados nos casos e condições taxativamente previstos na Lei.
Ora, enquanto que o C.I.R.C., o C.I.R.S. e o C.I.V.A prevêem a aplicação dos métodos indiretos (nos seus artigos 57º, 39º e 90º, respetivamente), remetendo expressamente para os artigos da L.G.T., relativos à realização da avaliação indireta, o C.I.E.C. não o faz.
Conclui-se, assim, que os métodos indiretos, assim como o procedimento de revisão previsto nos artigos 91º e 92º da L.G.T., são inaplicáveis no caso dos impostos especiais sobre o consumo, improcedendo, assim, o vício alegado pela impugnante.”
4. Ora, é precisamente este o cerne da questão. Ao analisar-se o relatório de inspeção e a sua fundamentação, constata-se que a Inspeção começou logo por colocar em causa a contabilidade da impugnante/recorrente, sem sequer efetuar uma prévia análise à mesma, o que não se pode consentir.
5. Quando o objetivo fundamental da avaliação direta, consiste na determinação do valor real efetivo dos bens ou rendimentos sujeitos a tributação. Sendo o valor real efetivo, o valor que a avaliação direta pode determinar com exatidão.
6. Assim, tendo a impugnante/recorrente, uma contabilidade devidamente organizada, deveria a inspeção ter começado por solicitar esses elementos contabilísticos, lançados e registados no período de tempo pretendido, para após a sua análise e caso não correspondesse à verdade, efetuarem as correções devidas. Deste modo por corresponder ao concreto, teria um maior grau de certeza e permitiria à impugnante/recorrente contestar de acordo com o seu modus operandi.
7. Ora, dispõe o nº 4 do artº 71º do Código IECs Dl 566/99 de 22 de dezembro:
...
“4 – as isenções previstas no nº 1 serão efetivadas através do reembolso do imposto pago, ou mediante declaração par introdução no consumo com isenção de imposto, desde que o sujeito passivo disponha de elementos contabilísticos que permitam o efetivo controlo da utilização dada aos produtos.” (sublinhado nosso)
8. Por sua vez o artº 10º do mesmo diploma legal, à altura dos factos e sob a epígrafe liquidação oficiosa refere:
“Artigo 10.º Liquidação oficiosa
Na falta ou atraso de liquidação imputável ao sujeito passivo ou no caso de erro, omissão, falta ou qualquer outra irregularidade que prejudique a cobrança do imposto, a estância aduaneira competente liquidá-lo-á, notificando o sujeito passivo de que tem 15 dias para proceder ao pagamento do respectivo imposto.” (sublinhado nosso)
9. Veja-se que em momento algum, o Srº inspetor solicitou os registos contabilísticos, que permitiriam averiguar se estariam em conformidade com o pedido de isenção de imposto. E acrescente-se caso não estivessem, aí sim, teria legitimidade para efetuar as suas correções, de acordo com os critérios da produção.
10. Demonstrativo desta veracidade, veja-se que para corroborar os artºs 10º e 71º nº 4 do CIECs, foi publicada em 2008 a Portaria 117-A/2008 de 8 de fevereiro, que no Capítulo I, relativo à Isenção do ISP para utilização como matéria-prima, no ponto 22ª refere:
“22º Os beneficiários da isenção que utilizem, transformem, incorporem e procedam ao embalamento dos produtos têm de instituir um modelo de registo contabilístico das existências adequado, de onde conste o seguinte:
e) As designações comerciais e as quantidades de produtos adquiridas, individualizados pelo respetivo código NC, com indicação dos números e datas das faturas ou documentos comerciais equivalentes que titulem as aquisições dos mesmos;
f) As quantidades de produtos utilizadas no processo produtivo, individualizadas pelo respetivo código NC e as datas de utilização;
g) C) O saldo de existências dos produtos, individualizado pelo respetivo código NC, apurado em sistema de inventário permanente;
h) As eventuais perdas de produto ocorridas.”
11. Inequivocamente, o mail deve ser interpretado como: as fórmulas são as ativas á data, mas “verbalmente” (como mencionado na alíneaF)) seria impossível dar a informação da % correta de incorporação em cada momento do tempo.
12. Quando na verdade, essa informação detalhada estava disponível nos registos contabilísticos da empresa, (CD-ROM fornecido aquando do exercício do Direito de audição, após notificação do projeto de inspeção) mas que a inspeção não quis considerar, antes preferindo colocar em causa a veracidade dos mesmos – ponto 4.2.4 e 4.2.5 do Relatório da ação inspetiva, não se dando sequer ao trabalho de o cruzar com os registos contabilísticos onde poderia apurar a veracidade do mesmo.
13. Veja-se que na alínea E) é mencionado que são produzidos 400 produtos, e que por simplificação, que ardilosamente foi mencionado “fórmula do produto mais vendido” foram analisadas apenas 194 fórmulas. Claramente, é assumido que foi usado um método indireto na questão 15 e 16 onde é mencionado que foi efetuada “uma simplificação”, e onde a inspeção admite de forma genérica, sem ter procedido ao seu cálculo
efetivo “os desvios de incorporação relativamente à certeza matemática derivada da aplicação de todas as fórmulas a todas as cores é muito pequeno (não o mensurando nem evidenciando o seu cálculo) não justificando assim o enorme trabalho adicional que teria de ser desenvolvido para se chegar á determinação de cerca de 400 fórmulas de incorporação”.
14. Veja-se ainda que na ação nº 5 do relatório da inspeção, é referido que foi pedido o ficheiro com a faturação dos produtos, no entanto o ficheiro com o detalhe exato dos consumos, que a empresa impugnante/recorrente possuía e cuja entrega foi efetuada aquando da audiência prévia, não foi solicitada ou analisada durante a inspeção. Tendo mais tarde sido desconsiderada.
15. Tais factos são claramente demonstrativos da exigência/necessidade efetuada em 2008 através da Portaria 117A/ 2008, de as empresas disporem de mapas em tudo semelhantes aos que a [SCom01...] facultou em CDROM e que foram ignorados pelos serviços inspetivos, e não a obrigatoriedade de as empresas facultarem as fórmulas, procedendo a simplificações como as que os serviços inspetivos efetuaram.
16. Por todo o exposto, facilmente se conclui, que os cálculos efetuados pela At, não permitem concluir com segurança pela legalidade e legitimidade do imposto liquidado oficiosamente pelo que o mesmo não deverá permanecer na Ordem jurídica.
17. II – Do vício de errónea quantificação da matéria coletável e de erro sobre os pressupostos de facto, Considerou a Sentença recorrida:
“nesta situação, considerou a A.T. que “...não foi dado cumprimento ao estipulado no artº 71º nº 5 do Código dos IECs, não tendo a [SCom01...], SA disponibilizado elementos contabilísticos que permitiriam verificar o efetivo controlo da utilização da totalidade dos produtos sujeitos a ISP por ela adquiridos”
18. Ora, não pode a impugnante/recorrente, estar mais em desacordo com tal afirmação, por não corresponder à verdade.
19. Na verdade, em momento algum, durante a inspeção o Srº inspetor solicitou à impugnante/recorrente os elementos contabilísticos que permitiriam verificar o efetivo controlo da utilização da totalidade dos produtos sujeitos a ISP adquiridos.
20. Não pode assim aceitar-se nos facto dados como provados que o email do Srº «AA» sirva justificar a retidão das fórmulas aplicadas ao longo de ano e meio, quando foi efetuada uma ressalva das alterações de formulação e que são expressamente mencionadas no mail.
21. Quando toda a informação detalhada está disponível nos registos contabilísticos da empresa, (CD-ROM fornecido).
22. Veja-se que na alínea E) dos factos provados é mencionado que são produzidos 400 produtos, e que por simplificação, que ardilosamente foi mencionado “fórmula do produto mais vendido” foram analisadas apenas 194 fórmulas.
23. No caso da MP 261102 os serviços inspetivos concluem que a empresa impugnante/recorrente incorporou mais do que o que comprou. Contudo, não conseguem identificar que quantidade, a quem e quando.
24. O ponto 9 que é dado como não provado infere diretamente do registo do varejo: no registo do varejo surgem como contadas apenas as matérias primas em causa, pelo que os produtos semi-acabados que são mencionados e admitidos em todo o relatório da inspeção não foram efetivamente contados, pelo que claramente este ponto deveria ter sido dado como provado. Aliás, a Ação Nº2 do Relatório de Inspeção é
inequívoco ao mencionar “Este varejo incidiu exclusivamente sobre as matérias primas sujeitas a ISP (...) Relativamente aos acabados e semi-acabados em existência á data do varejo considerou-se suficiente a listagem informática”
Ou seja, da lista do Srº Inspetor consta a lista concedida informaticamente. Contudo dessa lista não consta os produtos que estavam na linha de produção e que terão o seu peso.
Por todo o exposto, facilmente se conclui que o procedimento da A.T. não foi o correto, podendo afirmar-se que a inspeção começou ao contrário, porquanto nunca solicitou a prova completa do direito à isenção do imposto.
25. Todos esses elementos contabilísticos necessários a uma boa análise da incorporação pretendida, constam no CD fornecido aquando do direito de audição e que acabou por ser ignorada pela A.T, pois já tinham o relatório elaborado.
26. Relativamente aos Juros Indemnizatórios, ao revogar-se a douta sentença recorrida, deverão nos termos conjugados dos artigos 53.º da LGT e 171.º do CPPT, a Impugnante desde já requer que lhe seja reconhecido o direito a ser devidamente indemnizada pelo montante global dos custos com a prestação indevida da garantia bancária.
27. Ao manter-se na Ordem Jurídica a liquidação impugnada, o Tribunal a quo violou, entre outros, o art. 99.º do C.P.P.T., nº 4 do artº 71º do Código IECs, artºs 10º e 71º nº 4 do CIECs, foi publicada em 2008 a Portaria 117-A/2008 de 8 de fevereiro.
Nestes termos e nos mais de direito, que Vossas Excelências mui Doutamente Suprirão no provimento do presente recurso, deve ser proferido acórdão que revogue a sentença recorrida, ordenando a anulação da liquidação oficiosa em causa nos autos, assim se fazendo
JUSTIÇA

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância do Exmo. Desembargador Adjunto e da Exma. Desembargadora Adjunta, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e
Fiscais).
**
Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se a sentença incorre em erro nos pressupostos de facto e se foi realizada uma avaliação indireta, sem possibilidade de recurso à comissão de revisão.

**

Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
III. Fundamentação de facto
Factos provados
A) Em 23/06/2005 foi efectuada uma acção de inspecção à Impugnante, pela Divisão Operacional Norte da Direção de Serviços Antifraude da Direção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo.
Cfr. P.A. junto aos autos.
B) No âmbito da acção de inspecção foi elaborado, em 23/06/2005, “Termo de varejo”, com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Fls 81 a 83.
C) O “Termo de varejo” foi assinado pelo inspector, por «AA», Director de operações da Impugnante e por «BB», directora de logística da Impugnante.
Fls 83.
D) «AA», Director de operações da Impugnante, disponibilizou à A.T.
as fórmulas de produção dos produtos acabados e semi acabados que incorporavam as matérias primas isentas de I.S.P..
Depoimento da testemunha «CC».
E) Foram identificados 400 produtos que incorporavam as matérias primas, mas em algumas famílias de produtos a A.T. utilizou a fórmula do produto mais vendido, chegando, assim, à utilização de 194 fórmulas.
Depoimento da testemunha «CC».
F) No âmbito da acção de inspecção foi entregue à Impugnante um pedido datado de 11/08/2005, e por ela recebido na mesma data, com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Fls 50 do P.A.
G) Ao pedido foram juntas “Fórmulas de incorporações de produtos sujeitos
a ISP”.
Fls 51 a 86 do P.A.
H) No âmbito da acção de inspecção foi remetido à A.T. e-mail de 16/09/2005, de «AA», Director de operações da Impugnante, com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Fls 85.
I) Em 25/11/2005, foi elaborado “Projecto de conclusões”.
Fls 89 a 100 do P.A.
J) Em 09/12/2005, a Impugnante apresentou requerimento com direito de audição.
Fls 102 a 110 do P.A.
K) Em 20/12/2005, foi elaborado “Relatório Final da Acção Inspectiva” com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Fls 4 a 18 do P.A.
L) Em 20/12/2005, foi elaborado “Relatório Anexo ao Relatório final” com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

Fls 19 a 48 do P.A.
M) Por sugestão da Impugnante, foi fixada uma percentagem de perdas de
2%.
Depoimento da testemunha «CC».
N) Em 20/12/2005, foi elaborada “Participação” com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

Fls 111 a 119 do P.A.
O) Em 19/01/2006, foi proferido “Parecer” com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

Fls 126 a 130 do P.A.
P) Em 20/01/2006, foi proferido “Parecer” com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

Fls 131 do P.A.
Q) Em 20/01/2006, foi proferido “Despacho” com o seguinte teor:
“Concordo. Execute-se como proposto.” Fls 131 do P.A.
R) Foi emitida a liquidação oficiosa n.º ........182, de 23/01/2006, relativa a I.S.P., no montante de € 23.366,12 e juros compensatórios no valor de € 540,30.
Fls 17.
S) Foi remetido e recebido pela Impugnante, o ofício n.º ...95 de 25/01/2006, com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida][Imagem que aqui se dá por reproduzida][Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Fls 18 e ss dos autos e fls 132 e 133 do P.A.
T) Foi instaurado o P.E.F. n.º....................841, no Serviço de Finanças ..., para cobrança da dívida relativa à liquidação impugnada.
Fls 162 do P.A. e fls 122 e 123 dos autos.
Factos não provados
1. No período em análise a Impugnante utilizou diversas fórmulas de produção para o mesmo produto, mantendo a mesma especificação técnica.
Facto alegado no artigo 35.º da P.I.
2. A cada produto pode corresponder uma ou várias fórmulas, designadas por BOM – Bill of Material.
Facto alegado no artigo 45.º da P.I.
3. A alteração das fórmulas de produção dos produtos é comum quer por substituição de matérias primas, quer por alteração das quantidades das diferentes matérias primas incorporadas nos mesmos.
Facto alegado no artigo 47.º da P.I.
4. Em cada momento o sistema apenas permite que uma fórmula se encontre activa, guardando histórico de todas as fórmulas que foram criadas no sistema Axapta ou carregadas aquando da passagem do sistema AS 400 para o sistema informático actual.
Facto alegado no artigo 45.º da P.I.
5. O Departamento de Investigação e Desenvolvimento da empresa encontra-se permanentemente a analisar as fórmulas e processos de fabrico utilizados, introduzindo alterações nas mesmas, quer para reduzir custos de produção, optimizar o processo produtivo e melhorar, não só a prestação do produto, como a envolvente ambiental, sem alterar a especificação técnica do mesmo.
Facto alegado nos artigos 36.º e 46.º da P.I.
6. Em algumas situações pode haver a substituição de um solvente por outro na fórmula do produto.
Facto alegado no artigo 37.º da P.I.
7. Existem fórmulas de reaproveitamento de alguns produtos.
Facto alegado no artigo 38.º da P.I.
8. Na data do varejo – 23/06/2005 – a produção encontrava-se em actividade havendo movimento de produtos no armazém, sendo crível que parte destes movimentos apenas sejam introduzidos no sistema no dia seguinte.
Facto alegado no artigo 40.º da P.I.
9. No trabalho de inspecção não foram considerados os stocks de produtos semi-acabados à data do varejo.
Facto alegado no artigo 41.º da P.I.
10. Na inspecção foram considerados coeficientes de incorporação diferentes para produtos iguais mas em situações diferentes: vendas, existência inicial e existência final.
Facto alegado no artigo 43.º da P.I.
11. A mercadoria 101000000000 Sikafloor proseal UK 200 LT é importada e vendida ao cliente, sem ser submetida a qualquer processo produtivo, não incorporando a matéria prima MP 261102.
Facto alegado nos artigos 43.º, 56.º e 57.º da P.I.
Motivação da decisão da matéria de facto
O acervo de factos provados baseou-se no exame do teor dos documentos constantes dos autos e do P.A. que não foram impugnados e na prova testemunhal, conforme referido, em concreto, em cada uma das alíneas do probatório.
No que concerne à prova testemunhal, foi ouvido «CC», que prestou um depoimento sério, objectivo e com conhecimento directo dos factos.
A testemunha exerceu funções na Direcção Geral das Alfândegas, tendo efectuado a inspecção à Impugnante.
Afirmou que «AA», director de operações da empresa, forneceu-lhe as fórmulas de incorporação das matérias primas nos produtos, que constavam do sistema informático da empresa, identificando-se cerca de 400 produtos que incorporavam as matérias primas, mas em algumas famílias de produtos foi utilizada a fórmula do produto mais vendido, chegando, assim, à utilização de 194 fórmulas.
Declarou ainda que, por sugestão da Impugnante, foi estipulada uma perda de 2%, o que até revela tolerância e “alguma bondade” por parte da A.T. pois com base em informação constante de um dos CDs fornecidos pela empresa, conseguiu apurar uma percentagem de 0,6%.
No mais, prestou esclarecimentos sobre a metodologia adoptada na acção de inspecção, as diligências executadas (nomeadamente o varejo), os cálculos efectuados, a legislação aplicada e as correcções apuradas que deram lugar à liquidação do imposto considerado em falta.
Os factos não provados 9 e 10 estão em contradição com o teor dos Relatórios da inspecção, que, nos termos do n.º 1 do artigo 76.º da L.G.T., faz fé em juízo ..., não tendo a impetrante apresentado prova que coloque em causa o teor do mesmo.
3 Neste sentido: Acórdão do T.C.A. Norte de 12/01/2017, proferido no processo n.º 00250/15.3BEPRT
De facto, não queda provado que na acção de inspecção não tenham sido considerados os stocks de produtos semi-acabados à data do varejo (23/06/2005), uma vez que na página 3 do Relatório Final vem referido que
“Relativamente aos produtos acabados e semi acabados em existência na data do varejo, considerou-se suficiente a listagem informática dos stocks fornecida pelo director de operações Sr.
«AA».” e do Relatório Anexo consta nos “suportes documentais” que a
empresa forneceu um CD em 23/06/2005 “onde se descrevem as existências de todas as matérias primas, produtos semi acabados e produtos acabados naquela data.”
Também não resultou provado que na inspecção tenham sido considerados coeficientes de incorporação diferentes para produtos iguais mas em situações diferentes (vendas, existência inicial e existência final) pois do Relatório consta que, para apurar as percentagens de incorporação de cada matéria nos produtos acabados e semi acabados, foram utilizadas as fórmulas de produção de cada produto/fórmulas de incorporação das matérias primas disponibilizadas pela Impugnante, não se depreendendo que nas mesmas constem diferenças de incorporações consoante se trate de produtos vendidos ou em stock.
Os factos não provados 1 a 8 e 11 resultaram da ausência de produção de prova pela impetrante, quer documental, quer testemunhal (não tendo a
Impugnante sequer arrolado testemunhas nos presentes autos).

** Apreciação jurídica do recurso.

Alega a Recorrente que a sentença devia ter considerado como factos provados, o alegado em sede de impugnação, face à apreciação critica de documentos e ficheiro junto ao Processo Administrativo.
Assevera a Recorrente que foi realizada uma avaliação indireta, sem possibilidade de contestar em sede de comissão de revisão, tendo a sentença entendido que tal avaliação não é permitida em sede de CIEC, sendo este o cerne da questão, uma vez que a Inspeção coloca em causa a contabilidade, sem efetuar uma prévia análise à mesma, quando o objetivo fundamental da avaliação direta consiste da determinação do valor real e efetivo dos bens ou rendimentos sujeitos a tributação.
Diz, ainda, a Recorrente que a sentença afirma não terem sido disponibilizados elementos contabilísticos que permitiriam verificar o efetivo controlo da utilização da totalidade dos produtos sujeitos a ISP adquiridos pela Impugnante, o que não é correto, uma vez que não foram solicitados tais elementos, por isso não pode aceitar-se nos factos dados como provados, que o e-mail enviado pela empresa, sirva para justificar a retidão das fórmulas aplicadas ao longo de ano e meio, quanto foi efetuada uma ressalva das alterações de formulação, que estão expressamente mencionadas no e-mail.
Alega, igualmente, a Recorrente que o ponto 9 dado como não provado, devia ter sido dado como provado, na medida em que no registo do varejo surgem como contadas apenas as matérias prima em causa, pelo que os produtos semiacabados que são mencionados e admitidos em todo o relatório da inspeção não foram efetivamente contados, não constando os produtos que estavam na linha de produção.
Diz, também, a Impugnante que a liquidação enferma do vício de errónea quantificação da matéria coletável e de erro sobre os pressupostos de facto, por entender que as correções efetuadas não estão corretas e não correspondem à realidade, uma vez que a percentagem de 2% de tolerância para as perdas admitidas pela AT, é desadequada, as especificações técnicas dos produtos podem ser alcançadas com diferentes fórmulas/formulações de produção, há erros nos coeficientes/taxas de incorporação e nos tempos de comparação e não foi tido em conta o stock de produtos semiacabados à data do varejo.

A sentença recorrida entendeu que não foram aplicados métodos indiretos, uma vez que não podem ser usados nos impostos especiais sobre o consumo, assim como considerou não ter existido errónea quantificação da matéria coletável ou erro nos pressupostos de facto.
Apreciando.
Está em causa a retirada da isenção de ISP, sobre produtos ou sobre matérias-primas isentas deste imposto, desde que incorporadas no produto final. No caso concreto, a Inspeção considerou que estes produtos intermédios não foram incorporados no produto final, pelo que deixaram de estar isentos de ISP, como consequência foi retirada a isenção que a Impugnante havia beneficiado na compra de tais produtos, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 71.º do CIEC (Código dos Impostos Especiais do Consumo, na versão do Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de dezembro).
Por outro lado, está, ainda, em causa a liquidação de ISP, referente à produção de determinados produtos, cuja produção foi considerada superior à disponibilidade de matérias-primas, liquidando-se imposto por se considerar que a Impugnante não efetuou a sua introdução no consumo.

No que concerne à alegada realização de avaliação indireta, por não ter sido efetuada uma análise prévia à contabilidade da Impugnante, compete referir que a Inspeção Tributária analisou diversa documentação contabilística, conforme decorre do que consta no Relatório de Inspeção, sendo que, está em causa uma inspeção generalizada à Impugnante, mas apenas uma verificação dos pressupostos de isenção de produtos sujeitos a ISP. E para esse efeito, a Inspeção analisou diversa documentação contabilística, quer fornecida pela Impugnante, quer contas correntes facultadas por fornecedores.
Para além disso, na motivação da matéria de facto da sentença, menciona-se o único depoimento prestado em tribunal, que foi o do inspetor que elaborou o Relatório, o qual afirmou que analisou a informação constante nos CD’s fornecidos pela empresa. Nessa medida, refere que que estipulou a perda de 2%, que considera ser tolerante, uma vez que na informação constante de um dos CD’s, conseguiu apurar uma percentagem de 0,6%. Por sua vez, resulta do Relatório de Inspeção que – vide alínea K) do probatório, na parte que consta na pág. 7 da sentença -, que a empresa disponibilizou um CD com toda a faturação e que esta informação conjugada com as fórmulas de incorporação referidas na ação n.º 4, permitiu avaliar de modo bastante exato as quantidades de cada matéria prima sujeita a ISP que foram incorporadas nos vários produtos acabados e semiacabados.
Refere-se, ainda, na mesma alínea K) da matéria de facto (pág. 11 da sentença), que foi analisado um CD, contendo 12 ficheiros, cada um relativo a cada matéria prima, onde constam todas as incorporações e que estes ficheiros já se se encontram devidamente corrigidos em função das observações efetuadas pela empresa, em resposta ao projeto de conclusões. No Relatório de inspeção, refere-se,
igualmente, que foram analisados dois CD’s fornecidos pela empresa (vide pág. 14 da sentença), contendo um, as existências de todas as matérias primas, produtos semiacabados e produtos acabados; e outro, onde constam todas as vendas realizadas pela empresa.
No Relatório de inspeção (pág. 12 da sentença), refere-se, ainda, que foram analisadas faturas de venda, faturas de compra, contas correntes e balancete. Portanto, não é correto que a inspeção tributária não tenha usado elementos contabilísticos e a informação que consta dos CD’s fornecidos pela Impugnante. Para além disso, verifica-se pela leitura do Relatório de Inspeção, que foram analisados diversos suportes contabilísticos, como a análise de contas correntes de fornecedores.
Portanto, para o efeito pretendido, ou seja, para efeitos de sujeição de determinados produtos a ISP, foram solicitados os elementos tidos por suficientes para a pretensão que estava em causa.
No que concerne à alegada aplicação de métodos indiretos, diga-se que o regime dos impostos especiais, obriga a formalismos e exigências que não ocorrem noutro tipo de impostos. Nessa medida, o sujeito passivo é obrigado a ter uma formalidade nos seus procedimentos, de modo a que se possa apurar se existe ou não algum desvio ao pagamento do imposto especial. Desta forma, a inspeção analisou os elementos formais que foram fornecidos, sendo que é a Impugnante quem domina a atividade que exerce, pelo que é quem está em melhores condições de, através de elementos formais, como a elaboração de documentação durante o processo de fabrico, poder confirmar que se encontra a satisfazer os requisitos e pressupostos da isenção de imposto especial, nos produtos que utiliza. Não é suficiente, limitar-se a argumentar que poderiam ter sido pedidos outros elementos contabilísticos, na medida em que, esses elementos devem estar à disposição da Administração Tributária, de modo a aquilatar os pressupostos da isenção de ISP.
É à Impugnante que compete comprovar que determinados produtos se encontram isentos de ISP, pelo que levantar eventual dúvida sobre a não solicitação de algum elemento de contabilidade, é como que pretender inverter o ónus da prova.
Conforme referido, obrigando os impostos especiais a formalidades diferentes das exigidas quanto aos impostos gerais, não é possível haver avaliação indireta, pelo que a alegação neste sentido deduzida pela Recorrente, não é de acolher.

Alega a Recorrente que as correções efetuadas não estão corretas e não correspondem à realidade, uma vez que a percentagem de 2% de tolerância para as perdas admitidas pela AT, é desadequada, as especificações técnicas dos produtos podem ser alcançadas com diferentes fórmulas/formulações de produção, há erros nos coeficientes/taxas de incorporação e nos tempos de comparação e não foi tido em conta o stock de produtos semiacabados à data do varejo. Mais refere que não pode aceitar-se nos factos dados como provados, que o e-mail enviado pela empresa, sirva para justificar a retidão das fórmulas aplicadas ao longo de ano e meio, quanto foi efetuada uma ressalva das alterações de formulação, que estão expressamente mencionadas no e-mail.
Ora, o facto provado em apreço, consta da alínea H) do probatório e transcreve uma comunicação efetuada por e-mail pela empresa à inspeção tributária. Nessa comunicação, a empresa considera corretas as fórmulas de incorporação das matérias sujeitas a ISP, sem prejuízo de pontualmente analisar com mais pormenor eventuais desvios que venham s a ser detetados.
Portanto, como regra, a comunicação da empresa considera corretas as formulações efetuadas, sendo que apenas admite que pontualmente eventuais desvios venham a ser detetados.
Portanto, deve entender-se que a empresa aceita a regra, mas que se detetar algum desvio, seria analisado, sendo que a Recorrente não diz se efetivamente ocorreu ou não algum desvio.
A Recorrente limita-se a afirmar existir uma ressalva na comunicação, mas não concretiza se efetivamente ocorreu ou não algum desvio. Não tendo a empresa comunicado nenhum desvio, nem agora alegando ocorrer algum desvio, deve entender-se que deu o seu consentimento às fórmulas de incorporação das matérias sujeitas a ISP.
No que concerne à percentagem de perdas de 2%, diga-se que, conforme consta do relatório de inspeção, segundo transcrição de pág. 9 da sentença (Questão n.º 17), foi a própria empresa que sugeriu a percentagem de 2%.
Para além disso, conforme já acima ficou referido, no depoimento prestado em Tribunal pelo Inspetor, foi dito que pela análise de um CD, apurou uma percentagem de 0,6% de perdas, mas que teve em consideração um valor superior, precisamente o de 2%, sugerido pela empresa. Portanto, se é a própria empresa que sugere 2% e se documentação que a Impugnante fornece demonstra perdas na ordem dos 0,6% e a inspeção leva em consideração 2%, não é de colher a alegação de que esta percentagem não está correta.

Alega, a Impugnante que o ponto 9 dos factos não provados da sentença, devia ter sido dado como provado tal facto.
Recorde-se que o ponto 9 dos factos não provados (pág. 35 da sentença) diz o seguinte: «No trabalho de inspecção não foram considerados os stocks de produtos semi-acabados à data do varejo.».
Na motivação a este facto não provado a sentença na pág. 36, refere:
«Os factos não provados 9 e 10 estão em contradição com o teor dos Relatórios da inspecção, que, nos termos do n.º 1 do artigo 76.º da L.G.T., faz fé em juízo ..., não tendo a impetrante apresentado prova que coloque em causa o teor do mesmo.
De facto, não queda provado que na acção de inspecção não tenham sido considerados os stocks de produtos semi-acabados à data do varejo (23/06/2005), uma vez que na página 3 do Relatório Final vem referido que “Relativamente aos produtos acabados e semi acabados em existência na data do varejo, considerou-se suficiente a listagem informática dos stocks fornecida pelo director de operações Sr. «AA».” e do Relatório Anexo consta nos “suportes documentais” que a empresa forneceu um CD em 23/06/2005 “onde se
descrevem as existências de todas as matérias primas, produtos semi acabados e produtos acabados naquela data.”
Também não resultou provado que na inspecção tenham sido
considerados coeficientes de incorporação diferentes para produtos iguais mas em situações diferentes (vendas, existência inicial e existência final) pois do Relatório consta que, para apurar as percentagens de incorporação de cada matéria nos produtos acabados e semi acabados, foram utilizadas as fórmulas de produção de cada produto/fórmulas de incorporação das matérias primas disponibilizadas pela Impugnante, não se depreendendo que nas mesmas constem diferenças de incorporações consoante se trate de produtos vendidos ou em stock.».
Se bem interpretamos a intenção da Recorrente, é que o ponto 9 está relacionado com o varejo, alegando que não foi realizado varejo aos stocks. Efetivamente não foi efetuado varejo aos stocks, mas o ponto 9, refere que os stocks foram tidos em consideração no trabalho de inspeção, não diz que foi efetuado varejo aos stocks. No que concerne aos stocks, a inspeção aceitou a listagem fornecida pelo diretor de operações da empresa. Portanto, se aceitou essa listagem, é porque a teve em conta na realização do trabalho de inspeção.
Desta forma, não se concede na eliminação do ponto 9 dos factos não provados.
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Face ao exposto, o recurso não merece provimento.
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No concerne a custas, atenta a improcedência total do recurso, é a Recorrente a responsável pelas custas do recurso – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:

Nos impostos especiais existem formalidades diferentes das exigidas quanto aos impostos gerais.
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Decisão
Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Subsecção Tributária Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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* Custas a cargo da Recorrente.
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* Porto, 21 de março de 2024.

Paulo Moura
Carlos de Castro Fernandes
Graça Martins