Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00003/21.1BEMDL
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/06/2025
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:PAULO FERREIRA DE MAGALHÃES
Descritores:LEI N.º 60/2005, DE 29 DE DEZEMBRO;
DIREITO DE INSCRIÇÃO NA CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES;
Sumário:
1 – Como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.

2 - O cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que vem a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo 22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, IP [devidamente identificada nos autos], Co-Ré na acção que contra si foi intentada pela Autora «AA» [também devidamente identificada nos autos], inconformada com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, pela qual [a acção] foi julgada totalmente procedente, e em consequência, reconhecido o direito da Autora à reinscrição na Caixa Geral de Aposentações com efeitos a partir de 01/01/2014; assim como, condenadas as Entidades Demandadas Caixa Geral de Aposentações, I.P. e Instituto da Segurança Social, I.P. à prática dos actos materiais conducentes à reinscrição do Autor na Caixa Geral de Aposentações, com efeitos a partir de 01/01/2014, veio interpor recurso de Apelação.

*

No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

“[…]
CONCLUSÕES:
A - Para que possa “reativar” a sua inscrição no Regime Previdencial gerido pela CGA não é suficiente ter existido um vínculo à função pública, que conferiu esse direito, antes de 31 de dezembro de 2005. É necessário existir uma continuidade temporal entre vínculos com a administração pública!
B - É isto que resulta da maioria da jurisprudência dos Tribunais superiores Nacionais! Veja-se, por exemplo, o acórdão 889/13, de 2014-03-06, oriundo do Supremo Tribunal Administrativo, ao qual muitos outros foram buscar, parte, da sua fundamentação para condenar a CGA a proceder à reinscrição de ex-subscritores em situação semelhante à da aqui recorrida, esquecendo-se, todavia da tão importante necessidade de continuidade temporal entre vínculos públicos.
C - Da leitura do referido acórdão resulta claro que o critério a seguir não poderá ser unicamente o de saber se se trata de uma situação em que já tinha existido exercício em funções públicas, com inscrição, antes de janeiro de 2006 ou, se se trata de uma situação em que o funcionário ou agente público nunca havia sido detentor da qualidade de subscritor da CGA.
D - Deverá, igualmente, ter-se em conta se se encontra verificado o critério da continuidade temporal.
E - É o que resulta a contrario do referido acórdão, o qual não deixa margem para dúvidas ao afirmar que não cai no âmbito do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, em conjugação com o disposto no artigo 22.º n.º1 do Estatuto da Aposentação, a situação de um professor que rescinde o contrato administrativo de provimento que o liga a uma instituição de ensino e celebra com outra instituição um novo contrato com efeitos a partir do dia seguinte – ou seja, em termos formais há descontinuidade do vínculo jurídico mas não há descontinuidade temporal.
F - Ora, no caso da aqui recorrida resulta da leitura do própria petição inicial que no ano letivo de 2013/14, concretamente em 01 de janeiro de 2014, obteve colocação no Agrupamento de Escolas ..., no âmbito do concurso nacional de colocação de professores e foi inscrita no Regime Geral da Segurança Social.
G - Trata-se de uma um contrato individual de trabalho em funções públicas a termo resolutivo, celebrado ao abrigo da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, que nada tem a ver com o vínculo contratual anteriormente existente entre a Autora/Recorrida e a Administração Pública.


H - O mesmo é dizer que no seu caso existiu uma descontinuidade do vínculo jurídico em termos formais, pelo estabelecimento de um novo vínculo contratual em janeiro de 2014, e descontinuidade temporal entre vínculos – entre agosto de 2013 e janeiro de 2014.
I - Ou seja, por ter cessado o vínculo contratual que lhe permitia a manutenção de inscrição na CGA em agosto de 2013 e ter estabelecido, em janeiro de 2014, um novo vínculo contratual ao abrigo de um Contrato Individual de Trabalho em Funções Públicas, a Autora/Recorrida perdeu a qualidade de subscritora da CGA.
J - Razão pela qual o Agrupamento de Escolas para onde a Autora foi lecionar cumprindo, rigorosamente, o disposto na Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, promoveu a sua inscrição no Regime Geral da Segurança Social, encontrando-se, aquela, a descontar quotas para o RGSS desde então!
K – A tudo isto acresce que a sentença de que se recorre, ao reconhecer o Direito da Autora/recorrida com efeitos retroativos à data em que foi inscrita no RGSS viola o disposto no artigo 38.º, n.º 2 do Código do Procedimento dos Tribunais Administrativos, pondo em causa o princípio da certeza e segurança jurídicas.
L - De todo o exposto, com o devido respeito, conclui-se que o Tribunal “ a quo” não andou bem ao julgar a ação totalmente procedente e condenando os réus à manutenção da inscrição da Autora na CGA com efeitos a janeiro de 2014.
M - Não apreciou nem aplicou corretamente a Lei, devendo a sentença ora recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente e absolva os réus de todos os pedidos.
Termos em que, e nos mais de direito, deverá a douta sentença, de que se recorre, ser revogada e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente, com as necessárias consequências.
[…]”

**

A Recorrida apresentou Contra Alegações, das quais para aqui se extraem as respectivas conclusões, como segue:

“[…]
CONCLUSÕES
1 - No seu recurso, o Recorrente alega que o Tribunal "a quo" incorreu em erro de julgamento ao não interpretar, nem aplicar corretamente o disposto no artigo 2º n.º 2 da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, e o artigo 22º do Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de dezembro. Contudo, não lhe assiste razão.
2 - Estando em causa o reconhecimento do direito à manutenção da inscrição e vínculo da Autora/Recorrida na CGA e, consequentemente, no regime de proteção social convergente, está em causa o reconhecimento de situações jurídicas subjetivas diretamente decorrentes de normas jurídico-administrativas (cfr. artigo 37º, n.º 1, alínea f) do CPTA) e a condenação da Administração ao cumprimento de deveres de prestar que igualmente decorrem de normas jurídico-administrativas.
3 - A Autora/Recorrida ao longo da sua carreira contributiva efetuou descontos mensais para a CGA ao abrigo de contratos de trabalho sucessivos e anuais celebrados com o Ministério da Educação, tendo em janeiro/2014 sido inscrita, erradamente, no regime geral da segurança social.
4 - O art. 2º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro impõe, portanto, um limite na inscrição de novos subscritores, a partir de 1 de janeiro de 2006, vedando o acesso ao regime social convergente de trabalhadores ou agentes que exerçam funções públicas e se inscrevam após esta data, e, consequentemente, a obrigatoriedade da inscrição destes trabalhadores no regime geral da segurança social.
Neste sentido, a Caixa Geral de Aposentações está impedida de inscrever trabalhadores que, pela primeira vez, estejam a exercer funções públicas após o limite temporal estabelecido por aquela norma
5 - A jurisprudência das três instâncias administrativas tem sido unânime em considerar que a norma do n.º 2 do art. 2º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, apenas proíbe a inscrição de novos subscritores que, efetivamente, iniciem ex novo funções públicas, independentemente, de terem ocorrido ou não hiatos temporais entre contratos celebrados com o Ministério da Educação para o exercício de funções docentes. A interpretação seguida é a de que a norma em causa visa impedir a entrada de novos subscritores no sistema e não eliminar os subscritores que permanecem no mesmo.
6 - O acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, de 06/03/2014, no Proc. n.º 0889/13, sumaria que:
“l - Considerando a letra do art 2 0 da Lei n o 60/2005, de 29 de dezembro, que se refere apenas ao pessoal que "inicie funções" e a sua razão de ser (proibir a entrada de novos subscritores), afigura-se claro poder retirar-se que o mesmo deve ser interpretado no sentido de a Caixa Geral de Aposentações estar impedida de inscrever como subscritor aquele funcionário/agente que pela primeira vez venha a ser titular de relação jurídica pública.
II - Assim sendo, tendo em conta a letra do preceito e visando o mesmo cancelar novas entradas no sistema e não eliminar os subscritores que permanecem no mesmo, temos de concluir não haver quebra do estatuto de subscritor quando o funcionário ou agente se limita a transitar de uma entidade administrativa para outra sem qualquer descontinuidade temporal, nos termos do estatuído no art. 22 0 n o 1, do Estatuto da Aposentação, devendo apenas o inciso "direito de inscrição" ser objeto de interpretação corretiva de modo a harmonizar-se com a letra e a teologia intrínseca do art. 2 0 da Lei n o 60/2005.
III - Se o Associado do Recorrente (professor do ensino superior politécnico) rescinde o contrato administrativo de provimento que o liga a uma instituição de ensino e celebra com outra instituição novo contrato, com efeitos a partir do dia seguinte, embora em termos formais haja descontinuidade do vinculo jurídico, não havendo descontinuidade temporal, a situação não cai no âmbito do art. 2 0 da Lei n o 60/2005, de 29 de Dezembro, em conjugação com o disposto no art. 22 0 n o 7, do Estatuto de Aposentação".
7 - As interrupções entre contratos não impediram que a Autora/Recorrida voltasse a exercer funções (que atualmente ainda exerce) e às quais correspondia e o direito de manter a inscrição na CGA. O Supremo Tribunal Administrativo nos acórdãos proferidos em 09/06/2022, no Proc. n.º 099/21.6BEBRG; em 22/09/2022, nos Procs. n.ºs 877/21.6BEBRG e 1974/20.0BEBRG, não admitiu os recursos interpostos pela CGA e pelo Ministério da Educação em processos de docentes que tiveram hiatos temporais entre contratos, tendo confirmado o mérito das decisões judicias que reconheceram o direito daqueles docentes em manter o direito de inscrição na CGA, com efeitos retroativos.
8 - O artigo 22.º do Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 09 de dezembro prevê as situações em que se verifica a "eliminação do subscritor", com o respetivo cancelamento da sua inscrição:
“1. Será eliminado o subscritor que, a título definitivo, cesse o exercício do seu cargo, salvo se for investido noutro a que corresponda igualmente direito de inscrição.
2. O antigo subscritor será de novo inscrito se for readmitido em quaisquer funções públicas previstas nos artigos 7.º e 2.º e satisfizer o disposto no artigo 4.º"
9 - Determina-se neste preceito que assiste ao ex subscritor o direito de ser de novo inscrito, caso pretenda voltar a ingressar em funções públicas, resultando que, o cancelamento da inscrição do subscritor ocorre caso exista cessação definitiva do exercício do cargo, assistindo-lhe, porém, o direito de ser de novo inscrito, se voltar a ingressar no exercício de funções públicas.
10 - Esta norma não põe em causa a ratio legis da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, uma vez que, a mesma visa a proibição de entrada de novos subscritores e não a eliminação daqueles que já integravam a CGA.
11 - Não assiste, por isso, qualquer razão à Ré/Recorrente ao afirmar que a Autora/Recorrida cessou funções públicas passando à situação de ex-subscritora, nos termos do disposto no art. 22.º do Estatuto de Aposentação, ignorando, que se trataria com esta disposição normativa, de uma cessação definitiva de um cargo público.
12 - Bem andou a decisão proferida pelo Tribunal a quo, que condenou as Entidades Demandadas a reconhecerem o direito da Autora/Recorrida como subscritora da CGA e a praticarem todos os atos materiais necessários a repor a inscrição com efeitos a setembro de 2009, em conformidade com a posição da jurisprudência e da doutrina maioritária.
13 - E prefigura-se ser, assim, de concluir que só poderão improceder as alegações e o que foi por si peticionado em sede de recurso e ser dados como conformes e legais os fundamentos e a decisão proferida na douta sentença recorrida.
Nestes termos e nos demais de direito, que muito doutamente Vossas Exas suprirão, deverá ser julgado improcedente, o recurso interposto pela Recorrente e, em consequência, ser confirmada a sentença recorrida, como é de JUSTIÇA. […]”

*
O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso interposto, fixando os seus efeitos.

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O Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.

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Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.

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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], e que passam por saber se o Tribunal a quo errou no julgamento por si prosseguido em matéria de interpretação e aplicação do direito.

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III - FUNDAMENTOS IIIi - DE FACTO

Para efeitos da prolação da Sentença recorrida, apreciou e decidiu o Tribunal a quo, nos termos que, por facilidade, para aqui se extraem como segue:

“[…]
Factos provados:
Com relevância para a pronúncia a emitir nos presentes autos dão como provados os seguintes factos:
1. A Autora é habilitada com a licenciatura em Matemática– cfr. doc. 1 junto com a petição inicial e fls. 1 e 2 do processo administrativo junto aos presentes autos pelo Ministério da Educação.
2. No ano lectivo de 2003/2004 a Autora obteve colocação, como professora, na Escola ... – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial e fls. 1 e 2 do processo administrativo junto aos presentes autos pelo Ministério da Educação.
3. Entre os anos lectivos 2004/2005 a 2011/2012 a Autora esteve colocada como professora no Agrupamento de Escolas ..., Escola Secundária ..., Agrupamento de Escolas .../..., Agrupamento de Escolas ..., Agrupamento de Escolas ..., e no Agrupamento de Escolas ... – cfr. fls. 1 e 2 do processo administrativo junto aos presentes autos pelo Ministério da Educação.
4. A Autora foi inscrita na Caixa Geral de Aposentações a 01/09/2003, como professora, tendo-lhe sido atribuído o n.º de subscritor ...26 – cfr. fls. 1 e 2 do processo administrativo junto aos presentes autos pelo Ministério da Educação.
5. Durante o período de 01/09/2003 até 01/01/2014, a Autora foi subscritora da Caixa Geral de Aposentações – cfr. docs. 1 a 3 juntos com a petição inicial.
6. Nos anos lectivos de 2013/2014, desde 23/12/2013 até ao presente a Autora obteve colocação como professora sucessivamente no Agrupamento de Escolas ..., entre 23/12 a 18/07; Agrupamento de Escolas ..., entre 17/10 a 19/12; Agrupamento de Escolas ..., entre 30/12 a 31/08; Agrupamento de Escolas ... entre 25/09 a 31/08; Agrupamento de Escolas ..., entre 1/09 a 31/08; Escola Secundária ..., entre 1/09 a 31/08; Agrupamento de Escolas ..., desde 01/09/2019 – cfr. fls. 1 e 2 do processo administrativo junto aos presentes autos pelo Ministério da Educação.
7. Na decorrência da primeira colocação referida em 6, a Autora foi inscrita no regime geral da Segurança Social – cfr. doc. 3 junto com a petição inicial.


Factos Não Provados.
Com relevância para a pronúncia a emitir no presente processo, inexistem factos que importe dar como não provados.
Motivação da Decisão sobre a Matéria de Facto
A decisão da matéria de facto provada, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes do processo, referidos em cada uma das alíneas do elenco dos factos provados, os quais não foram impugnados e que, dada a sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do tribunal, em conjugação com o princípio da livre apreciação da prova. […]”

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IIIii - DE DIREITO

Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela que com referência ao pedido formulado a final da Petição inicial, deduzido contra a Caixa Geral de Aposentações, o Ministério da Educação, e o Instituto da Segurança Social, veio a julgar a acção totalmente procedente, e mais concretamente, a reconhecer o direito da Autora à reinscrição na Caixa Geral de Aposentações com efeitos a partir de 01 de janeiro de 2014, e a condenar as entidades demandadas Caixa Geral de Aposentações, I.P. e Instituto da Segurança Social, I.P., à prática dos actos materiais conducentes à reinscrição da Autora na Caixa Geral de Aposentações, com efeitos a partir daquela mesma data.

Com o assim julgado não se conforma a Recorrente CGA, que no âmbito das conclusões das suas Alegações de recurso sustentou, por um lado [Cfr. conclusões A) a J), L) e M) das Alegações de recurso], que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento em matéria de direito, por não ter existido continuidade do vínculo jurídico da Autora, nem continuidade temporal [pois que a Recorrida interrompeu o vínculo que lhe permitia manter-se ligada à CGA em agosto de 2013, só tendo retomado a actividade lectiva em janeiro de 2014], o que no seu entender é requisito essencial para a reinscrição na Caixa Geral de Aposentações, e que assim tendo sucedido, que a Autora ora Recorrida foi inscrita no regime da Segurança Social a partir de 01 de janeiro de 2014, em cumprimento do disposto no artigo 2.º, n.º 2 da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, e mais ainda, sustentou a Recorrente [Cfr. conclusão K) das Alegações de recurso], que ao ter o Tribunal a quo reconhecido o direito da Autora com efeitos reportados à data em que foi inscrita na Segurança Social, foi violado o disposto no artigo 38.º, n.º 2 do Código do Procedimento dos Tribunais Administrativos, por ter sido colocado em causa o principio da certeza e segurança jurídicas, e desta forma, que a Sentença recorrida deve assim ser revogada e substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente e absolva os Réus de todos os pedidos.

Por seu turno, no âmbito das Contra alegações por si apresentadas, a Recorrida contrariou a argumentação expendida pela Recorrente, tendo a final e em suma pugnado pela manutenção da Sentença recorrida, com fundamento em que por via do referido artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, o que pretendeu o legislador foi apenas e só proibir novas entradas na CGA e não eliminar aquela, como é o seu caso, que já era existente.

Cumpre apreciar e decidir.

Como assim deflui da Sentença recorrida, o Tribunal a quo efectuou o saneamento dos autos, visando para além da suscitada matéria integrativa de excepção [que apreciou e decidiu], decidir de mérito [o que passava pela questão de saber se, em face da redacção do artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, a Autora deve ser admitida a reinscrever-se na Caixa Geral de Aposentações, ou, pelo contrário, deve considerar-se que, pelo facto, de não ter exercido funções públicas no período entre 06/08/2013 e 23/12/2013, deve ser inscrito no regime geral da segurança social.].

Para tanto, fixou a factualidade que entendeu por relevante [por provada, e que o foi, essencialmente, a partir do acervo documental constante dos autos e do Processo Administrativo], tendo depois prosseguido pela sua submissão ao direito que julgou por convocável, e que passava por saber, essencialmente, se em face do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, se a Autora tinha ou não o direito de manter a sua inscrição na CGA [que se tinha iniciado em 01/09/2003], pese embora a existência de hiatos temporais entre a data em que findavam os contratos de trabalho que ía celebrando com o Ministério da Educação, e a data em que torna a celebrar novo contrato, mais concretamente por referência a 31 de agosto de 2013, por apenas ter vindo a celebrar um novo contrato em 23 de dezembro de 2013, e bem assim, se a inscrição da Autora no regime da Segurança Social e não no regime previdencial da CGA, com efeitos reportados à data de 01 de janeiro de 2014, se é ou não violadora do invocado direito da Autora.

E a essa questão, ainda que a sua inscrição na Segurança Social tenha ocorrido já em data posterior à prevista no artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, ou seja, após 01 de janeiro de 2006, o Tribunal a quo julgou pela procedência da pretensão da Autora, com amparo em jurisprudência dos Tribunais Superiores desta jurisdição administrativa.

Efectivamente, quanto a essa questão fundamental, o Tribunal a quo ancorou a fundamentação aportada na Sentença recorrida, tendo presente para tanto que a Autora já esteve inscrita na CGA, e que por essa razão não se tratava de inscrição neste regime de previdência de um novo subscritor, e também, porque antes da entrada em vigor da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, já a mesma tinha sido subscritora, o que julgamos tratar-se de um julgamento em conformidade com os normativos que a Recorrente, ao invés, fundada em erro de erro de interpretação, vem a apresentar nesta sua pretensão recursiva como tendo sido violados.

O Tribunal a quo alinhou o seu julgamento em conformidade com jurisprudência de Tribunais Superiores desta jurisdição administrativa [designadamente, o Acórdão do STA datado de 06 de março de 2014, proferido no Processo n.º 0889/13, e o Acórdão deste TCA Norte, datado de 14 de fevereiro de 2020, proferido no Processo n.º 01771/17.0BEPRT].

Por julgarmos com relevância para a decisão a proferir, para aqui extractamos o sumário do Acórdão deste TCA Norte, datado de 14 de fevereiro de 2020, proferido no Processo n.º 01771/17.0BEPRT, como segue:

Início da transcrição
“I - Os nº. 1 e 2 do artigo 2º da Lei nº. 60/2005, de 29 de dezembro, preconizam a inadmissibilidade de novas inscrições na Caixa Geral de Aposentações, e, bem assim, a obrigatoriedade de inscrição no regime geral de segurança social de todo o pessoal que “inicie funções” a partir 1 de janeiro de 2006, ao qual, nos termos da legislação vigente, fosse aplicável o regime de proteção social da função pública em matéria de aposentação, em razão da natureza da instituição a que venha a estar vinculado, do tipo de relação jurídica de emprego de que venha a ser titular ou de norma especial que lhe conferisse esse direito.
II - Na determinação do que se deve entender relativamente à previsão “iniciem funções” contida nos nº. 2 do artigo 2º da Lei nº. 60/2005, dever-se-á atender ao teor da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, espraiada seu aresto de 06.03.2014, no processo nº. 0889/13, que, quanto a este conspecto, considerou que o disposto no nºs.1 e 2 do artigo da Lei nº. 60/2005 visa apenas abranger o pessoal que inicie absolutamente funções.
III - Por razões atinentes a uma interpretação harmoniosa com a letra e a teleologia intrínseca do art. 2º da Lei nº 60/2005, a eliminação da subscrição do trabalhador em funções públicas decorrente da cessação do exercício do seu cargo prevista no nº.1 do artigo 22º do EA só ocorrerá se este não for investido noutro cargo a que antes de 01.01.2006 correspondesse direito de inscrição.”
Fim da transcrição

Ora, desde já referimos que nos revemos nesta jurisprudência [de entre outra prolatada por este TCA Norte, de que destacamos o Acórdão datado de 28 de janeiro de 2022, proferido no Processo n.º 496/20.4BEPNF, o Acórdão datado de 28 de janeiro de 2022, proferido no Processo n.º 1100/20.6BEBRG, o Acórdão datado de 11 de fevereiro de 2022, proferido no Processo n.º 99/21.6BEBRG, o Acórdão datado de 10 de março de 2022, proferido no Processo n.º 1974/20.0BEBRG, o Acórdão datado de 08 de abril de 2022, proferido no Processo n.º 307/19.3BEBRG, o Acórdão datado de 30 de setembro de 2022, proferido no Processo n.º 708/20.4BEPRT - todos disponíveis em www.itij.pt], e o recente Acórdão deste TCA, datado de 22 de novembro de 2024, proferido no Processo n.º 148/24.6BEPNF, em que o ora Relator interveio na sua formação em julgamento, como 2.º Adjunto], e cuja fundamentação aqui damos por enunciada [com as adaptações que se mostrem devidas, designadamente em torno da matéria de facto], a fim ser prosseguida e obtida, em consonância com o disposto no artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil, uma interpretação e aplicação uniformes do direito.

Salientamos ainda que em formação de admissão preliminar, o STA negou a admissão de recurso de revista no Acórdão datado de 09 de junho 2022, proferido no Processo n.º 099/21.6BEBRG, de 14 de julho de 2022, proferido no Processo n.º 0496/20.4BEPNF, de 22 de setembro de 2022, proferido no processo
1974/20.0BEBRG, e de 06 de outubro de 2022, proferido no Processo n.º 307/19.3BEBRG, em situações cuja matéria de facto é similar à que ora está em causa nestes autos, e que na essência do que vinha sustentado pelos aí Recorrentes, a argumentação apresentada na instância superior não foi de molde a abalar a jurisprudência que vinha sendo firmada neste domínio.

Neste patamar, julgamos assim que a interpretação do direito prosseguida pelo Tribunal a quo em torno do referido artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, assim como do artigo 22.º do EA, e a final, aquela que conduziu à solução jurídica por si alcançada, no sentido de que só haverá cancelamento da inscrição do subscritor na CGA que, tendo cessado o exercício de anterior cargo, não venha a ingressar no exercício futuro de outras funções públicas, é aquela se mostra mais consentânea com a Lei e o Direito, sendo assim de salientar que a argumentação de que se vale a Recorrente está desprovida de qualquer indício de conformidade legal.

Ou seja, a Recorrente empreende uma sustentação do seu entendimento e assim, a revogação da Sentença recorrida, tendo por base uma interpretação que não podemos acolher, por não assentar em qualquer amparo legal ou hermenêutico, pois que o que assim quis disciplinar o legislador foi a convergência progressiva do sistema previdencial, impedindo a entrada de novos subscritores para a CGA, sendo que a Autora não pode ser qualificada como nova subscritora, pois que já o era desde 01 de setembro de 2003, não podendo assim dar-se o cancelamento da sua inscrição enquanto subscritora, pelo facto de ter vindo a ser investida no exercício de funções públicas a que se reportava o artigo 1.º do EA.

Há que ter presente que quando o legislador regula sobre determinada matéria, procura sempre as melhores soluções para a questão que quer tratar, e não resulta do espírito do referido diploma legal [e na sua confrontação com o disposto, entre o mais, nos artigos 1.º, 2.º, 4.º, n.º 1 e 22.º do Estatuto da Aposentação], que o mesmo tenha querido, de forma expressa ou implícita, não admitir como subscritores da Caixa Geral de Aposentações, quem tenha deixado de exercer funções públicas mas tenha após o dia 01 de janeiro de 2006 vindo a assumir funções públicas, ainda que numa qualquer outra instituição, quando essas funções, até à entrada em vigor desse diploma legal, eram por si determinantes do direito de inscrição na CGA.

Como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.

Ou seja, o cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que torna a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo
22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].


Atenta a factualidade constante do probatório, em particular o vertido sob os pontos 2, 4 e 5, julgamos ser cristalino que assiste à Autora ora Recorrida o direito a ver-se reinscrita sob o regime da CGA e não sob o regime da Segurança Social, pelo facto de desde o dia 01 de setembro de 2003 que é beneficiária da CGA, inscrita sob o n.º ...26, estatuto que sempre teria de lhe ser garantido face à posterior [à sucessiva] outorga de contrato de trabalho com o Ministério da Educação para o exercício das mesmas funções de docência [Cfr. ponto 6 do probatório].

E contrariamente ao sustentado pela Recorrente sob a conclusão K) das suas Alegações de recurso, não divisamos por que termos é que o Tribunal a quo incorreu na violação do disposto no artigo 38.º, n.º 2 do CPTA, porquanto, e como assim emerge da fundamentação aportada na Sentença recorrida, o que está em causa é o pedido de reconhecimento de um direito, o que assim resulta assaz fundamentado.

Ou seja, a CGA não poderia ter deixado de ter e manter a inscrição da Autora como beneficiária, e sempre e de todo o modo, caso assim tivesse prosseguido, sempre deveria ter prolatado acto administrativo nesse sentido, o que assim não resulta do probatório.

De maneira que, tem assim, forçosamente, de improceder a pretensão recursiva da Recorrente, e de ser confirmada a Sentença recorrida.

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E assim, formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro; Direito de inscrição na Caixa Geral de Aposentações.

1 – Como resulta da letra da lei [Cfr. artigo 2.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de dezembro, conjugado com o Estatuto da Aposentação], o legislador dispôs que o cancelamento da inscrição de subscritor só ocorre quando venha a cessar, de forma definitiva, o exercício do cargo que vinha exercendo e que por si era determinante da inscrição do trabalhador na CGA, sendo que, assiste-lhe o direito de tornar a ser inscrito, quando venha a ser investido em cargo ou em função a que correspondia, à data da entrada daquele normativo, o direito de inscrição.

2 - O cancelamento da inscrição de um subscritor só ocorre, e com a sua consequente eliminação do sistema previdencial da CGA, em conformidade com o disposto no artigo 22.º, n.º 1 – primeira parte - do EA, quando o trabalhador/beneficiário deixe de exercer funções, a título definitivo, sendo que, já não será eliminado o subscritor – o que é o caso da Autora -, que vem a ser investido noutro cargo, a que também correspondia o direito de inscrição [cfr. artigo 22.º, n.º 1 – 2.ª parte – do mesmo EA].

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IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Subsecção Administrativa Social da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pela Recorrente Caixa Geral de Aposentações, IP, confirmando assim a Sentença recorrida.

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Custas a cargo da Recorrente CGA, IP – Cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

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Notifique.



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Porto, 06 de junho de 2025.

Paulo Ferreira de Magalhães, relator
Isabel Costa
Rogério Martins