Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00204/07.5BEVIS |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 03/21/2024 |
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Tribunal: | TAF de Viseu |
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Relator: | IRENE ISABEL GOMES DAS NEVES |
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Descritores: | NULIDADES DA SENTENÇA; FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO; AMBIGUIDADE E OBSCURIDADE; ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO; |
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Sumário: | I. A nulidade da sentença por falta de fundamentação nos termos do disposto no n.º 1 do citado artigo 125º do CPPT e 615º n. º1 al. b) do CPC abrange quer a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo artigo 123º, n.º 2 do CPPT, quer a falta do exame crítico das provas, previsto no artigo 607º, n. º4 do CPC. II. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia a nulidade por falta de fundamentação é necessário que a mesma seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. III. A ambiguidade ou obscuridade que possam ocorrer na sentença só integrarão a nulidade decisória prevista, na alínea c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, se algum desses vícios tornarem a decisão incompreensível, por inacessível intelectualmente, impedindo a compreensão da decisão judicial por fundadas dúvidas ou incertezas. IV. A ambiguidade só relevará se vier a redundar em obscuridade, ou seja, se for tal que do respetivo texto ou contexto não se torne possível alcançar o sentido a atribuir ao passo da decisão que se reclama de ambíguo, no caso o julgamento de facto. V. Impugnada a decisão da matéria de facto com base em meios de prova sujeitos à livre apreciação, com cumprimento dos requisitos previstos no artigo 640º do CPC, cabe ao tribunal de recurso reapreciar esses meios de prova e ponderar na decisão da matéria de facto a convicção que formar, nos termos do artigo 662º do CPC.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A «Associação .............» (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 03.10.2016, na presente impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação adicional nº ........408 referente a tributação autónoma de IRC do ano de 2000 e respetivos juros compensatórios, no montante global de € 36.069,90, a julgou parcialmente procedente, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional. Alegou, formulando, após convite à apresentação das mesmas numa enunciação sintética das alegações, as seguintes conclusões: « A. Nos termos alegado no artº 3º e 4º destas alegações a DS no que se refere aos factos essenciais que servem de fundamentou à mesma, salvo o devido respeito, a) é omissa já que em momento algum na parte 3.1. Matéria de facto dada como provada esses factos são identificados, Efetivamente e nos termos alegados nunca em momento algum da parte 3.1. a DS identifica quais os factos relevantes para a decisão da causa a tomar que dá como provados. b) e por outro lado a DS em sede da parte dispositiva da DS no que refere aos factos dados como provados inclui vários pontos que consubstanciam contradições entre o conteúdo dos vários pontos dados como provados – V. pontos 12, 14, 18 em total contradição com o teor do ponto 22 – que determinam que a DS aqui recorrida padeça de ambiguidade e se tome obscura em relação aos factos dados como provados E nestes termos entende a aqui Apelante que a DS aqui recorrida é nula por violação dos artºs 154º, 195, 615V1 b) e c) do CPC, já que efetivamente a DS aqui recorrida não especifica os fundamentos de facto em que se baseia para nesta sede tomar a decisão que tomou nulidade que aqui se suscita e será objecto da Vossa apreciação, B. Mais uma vez sem prescindir e nos termos alegados no artº 6º destas alegações Entende a aqui recorrente que elaborando uma adequada análise da prova produzida não se pode dar como não provado que! Em 2000, a «Associação .............» já tinha instituído totalmente a prática de adiantamentos de valores aos seus colaboradores para fazer face às despesas – facto implícito no depoimento da 1º e 2º testemunha e nos artigos 15º, 24º, 26º da p.i.; A assim nos termos dos artºs. 100º, 281º do CPPT, 640º e 662º do CPC, ao contrário do decidido na DS aqui recorrida não deve ser dado como não provado Mas antes como provado que, Em 2000, a «Associação .............» já tinha instituído totalmente a prática de adiantamentos de valores aos seus colaboradores para fazer face às despesas - facto implícito no depoimento da 1º e 2º testemunha e nos artigos 15º 24º, 26º da p.i.; E assim sendo o acto impugnado é nestes temos ilegal por falta de fundamentação de facto em violação dos artº. 99º do CPPT C. Mais uma vez sem prescindir e nos termos alegados no artº 7º destas alegações Tendo em conta que não resulta de qualquer preceito legal nem o mesmo é citado, que o saldo de caixa não possa ser subdividido em vários saldos de caixa geridos por vários gerentes/directores. Assim sendo não tem qualquer base factual ou jurídica a conclusão tirada na DS que o saldo contabilizado não era verdadeiro e que o saldo real era saldo referente à sub-caixa gerida pela funcionária «AA», Assim nos termos dos artºs. 100º, 281º do CPPT, 640º e 662º do CPC, ao contrário do decidido na DS aqui recorrida não deve ser dado como provado que “Apesar das dificuldades financeiras evidenciadas, a Impugnante contabilizava em 31/12/2000 um saldo de “caixa” de € 42.682,00, que não correspondia ao saldo efetivo (facto 30 de 3. 1 supra). – o facto 30 não existe na parte 3.1 da DS e que o saldo efetivo era de € 1.355,11. Mas antes deve ser dado como provado que, em 31 de Dezembro do ano de 2000, a «Associação .............» tem contabilizados como saldo de caixa o valor de 644.037,40 que corresponde ao saldo efetivo Valor proveniente de subsídios, propinas e donativos, que constituindo os proveitos da «Associação .............», a sua existência e proveniência não foi aliás, posta em causa. E que esse valor era movimentado pelos membros da direcção da «Associação .............» e pelos seccionistas da mesma e afectos aos fins por eles definidos dentro dos objectivos e fins a prosseguir pela mesma. E assim sendo o acto impugnado é nestes termos ilegal por falta de fundamentação, de facto em violação dos artº. 99º do CPPT D. Mais uma vez sem prescindir e nos termos alegados no artº 8º destas alegações Entende a aqui recorrente que elaborando uma adequada análise da prova produzida nos presentes autos, nos termos alegados no ponto 8º destas alegações e ao abrigo do regime dos arts. 100º e arte. 281º do CPPT, 640º e 662º do CPC, ao contrário do decidido na DS aqui recorrida não deve assim ser dado como não provado Mas antes corno provado que, “Os adiantamentos aos colaboradores da associação configuraram despesas dos anos seguintes - facto implícito nos artigos 16º, 32º da p.i. E assim sendo o acto impugnado é nestes termos ilegal por falta de fundamentação de facto em violação dos artº. 99º do CPPT, E. Mais uma vez sem prescindir e nos termos alegados no artº 9º destas alegações Entende a aqui recorrente que elaborando uma adequada análise da prova produzida nos presentes autos, nos termos alegados no ponto 9º destas alegações e ao abrigo do regime dos artºs. 100º e artº. 281º do CPPT, 640º e 662º do CPC, ao contrário do decidido na DS aqui recorrida não deve assim ser dado como provado parte sublinhada Tendo sido demonstrada, no ponto anterior, a inviabilidade do saldo de Caixa em 31/12/2000 ser relativo a adiantamentos consideramos que o mesmo se refere a saídas de dinheiro sem existência de qualquer documento de suporte e como tal sujeito a tributação autónoma Por tudo isto a AT formou a convicção de que o saldo de caixa apresentado em 31/12/2000 seria somente contabilístico, uma vez que o saldo de caixa efetivo nesta data seria de € 1.355,11. Neste seguimento, considerou a diferença (642.682,00) entre o saldo contabilístico (€ 44.037,40) e o saldo efetivo (€ 1.355,11), como “saída de caixa” não justificada documentalmente com tratamento fiscal idêntico ao das “despesas não documentadas” do ano de 2000 e, por isso, sujeita a tributação autónoma” A fls 16 da DS E assim sendo o acto impugnado é nestes termos ilegal por falta de fundamentação de facto em violação dos artº. 99º do CPPT F. Deve assim nos termos do exposto nos pontos B, C, D e E destas conclusões a sentença aqui recorrida ser revogada, artºs. 2810 do CPPT, 640º e 662º do CPC, E ser substituída por Acordão que dando provimento ao presente recurso, julgue procedente o pedido formulado na impugnação judicial em sede de ausência de fundamentação de facto do acto impugnado em violação do artº 99º do CPPT. Anulando o acto aqui impugnado na parte remanescente ainda não anulada na DS. H. Partindo assim desta nova base factual e efectuando o correcto enquadramento jurídico dos factos relevantes na presente acção à luz do artº 4º/2 do Dec-lei 192/90 de 9 Junho com a redacção da Lei 3-B12000 Como, nos termos aqui alegados O valor de € 44.037,40 identificado na contabilidade da «Associação .............» no ano de 2000 como saldo de caixa no dia 31.12.2000 Corresponde ao saldo de caixa real e efetivo da «Associação .............» nos finais do ano de 2000 e não corresponde a despesas não documentadas da «Associação .............» do ano de 2000, não há assim lugar a qualquer liquidação autónoma ao abrigo do artº artº 4º/2 do Dec-lei 192/90 de 9 Junho com a redacção da Lei 3-B/2000 ou de qualquer outro preceito legal Devendo assim e mais vez e sem conceder nos termos dos artºs. 2810, 282 do CPPT artºs. 639 e 665 do CPC a Sentença aqui recorrida ser revogada e ser substituída por Acórdão que efetuando o correto enquadramento jurídico dos factos relevantes na presente ação, dê provimento ao recurso dando como provado e deferido o pedido formulado na impugnação judicial anulando acto de liq. Impugnado na parte remanescente ainda não anulada na DS I. Em consequência do supra alegado as liquidações de juros compensatórios, e de juros de mora são assim ilegais já que nos termos expostos não houve lugar a qualquer atraso na liquidação imputável ao contribuinte arr. 35º da LGT, nem atraso no pagamento do IRC artº 44º da LGT não havendo assim lugar à liquidação de juros compensatórios e de mora exigidos pela AT na sequência dos actos de liquidação aqui impugnados.. Devendo assim e mais vez e sem conceder nos termos dos artºs. 281º, do CPPT, 640º e 662º do CPC, a Sentença aqui recorrida ser revogada e ser substituída por Acórdão que efetuando o correto enquadramento jurídico dos factos relevantes na presente ação, dê provimento ao recurso dando como provado e deferido ao pedido formulado na impugnação judicial anulando os atos de liquidação de juros compensatórios e de mora impugnados. Termos em que com o Douto Suprimento de Vossas Excelências deve ser revogada a referida sentença e a final ser substituída por Acórdão que julgue provada e procedente a impugnação judicial, na parte remanescente ainda não procedente na DS Pois só dando provimento ao recurso, nos termos propostos, se fará a habitual, Justiça!» 1.2. A Recorrida (Autoridade Tributária e Aduaneira), notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações. 1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 191 do SITAF, pugnando pela improcedência do recurso. 1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 707º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC 1961), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. Questões a decidir: Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida enferma [se bem interpretamos as conclusões apresentadas atenta a complexidade e a má técnica jurídica evidenciada na sua apresentação], de (i) nulidade por ambiguidade e obscuridade em relação aos factos dados como provados e de falta de fundamentação de facto (conclusão A); (ii) se errou no julgamento de facto (conclusão B, C, D e E) e, subsequente, erro de direito, pois que a nova base factual é determinante da falta de pressupostos de facto da liquidação à luz do artº 4º/2 do Dec-lei 192/90 de 9 Junho com a redacção da Lei 3-B12000, extensível as liquidações de juros. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto 2.1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância em sede de saneador sentença, considerada como relevante para a decisão da excepção invocada e por nós enumerada: «Com base nos documentos juntos aos autos e no processo administrativo (PA) apenso, e da prova testemunhal, considera-se provada a seguinte matéria de facto, com relevância para a decisão: 1. A «Associação .............», com identificação fiscal n.º ...96, e com sede nas ..., Apartado ..., ..., ..., ..., foi fundada em Dezembro de 1969, e “tem por fim a promoção do ensino artístico, da cultura, do desporto e recreio dos associados” – de acordo com publicação no Diário da República – III série nº. ... e fls. 3, 10 e 65 do PA; 2. A Impugnante é reconhecida como pessoa coletiva de utilidade pública desde 1998, (conforme despacho publicado no Diário da República II Série, ...), estando desde essa data isenta em sede de IRC e de IVA – fls. 3, 10 e 164 a 166 do PA e artigo 1º da p.i.; 3. A «Associação .............» possui contabilidade organizada desde 1999, que, no ano 2000, estaria a cargo do Técnico oficial de contas «BB» – no art.º 2º da p.i. e fls. 11, 45, 123, 128, 129 do PA; 4. Em Março de 2003, pelos Serviços de Inspeção-Geral da Educação (delegação regional do centro) foi realizada uma ação inspetiva no Conservatório de Música da «Associação .............», em que foram identificadas várias irregularidades, nomeadamente: “(...) há a registar que os comprovativos das remunerações pagas a 9 (nove) dos 15 (quinze) docentes considerados pelo Conservatório em regime de prestação de serviços não são idóneos, tendo sido apresentadas simples declarações, algumas das quais não estando sequer assinadas, o que poderá indiciar falta de regularização com o Ministério das Finanças” – fls. 101 do PA; 5. Em resultado da ação inspetiva a que alude o ponto anterior foi instaurado o processo disciplinar n.º ..../...6-2003/GAJ contra a agora Impugnante – fls. 100 a 122 do PA; 6. Em 30/03/2004, a Inspeção-Geral da Educação (doravante designado IGE) remeteu uma informação ao Diretor-Geral do Tesouro relativamente ao processo disciplinar n.º ..../...6-2003/GAJ instaurado à Impugnante «Associação .............», contendo fotocópias da informação nº IGE-...9/2004, o relatório final do processo disciplinar e cópias dos comprovativos de remuneração pagas a nove docentes por este estabelecimento de ensino – fls. 115 a 122 do PA; 7. Em 12/05/2004, a Direção-Geral do Tesouro remeteu a informação recebida pelo IGE, a que alude o ponto anterior, ao Diretor-Geral dos Impostos, que por sua vez a enviou à Direção de Finanças ... – fls. 113 e 114 do PA; 8. Em cumprimento da ordem de serviço nº ...44, datada de 13/08/2003, foi ordenada a realização de uma ação inspetiva externa de âmbito parcial (IRS, IRC, IVA) aos exercícios de 2000 e 2001 da aqui Impugnante, tendo esta sido assinada pelo TOC da empresa em 12/03/2004 – fls. 95 e 125 do PA; 9. “O motivo da emissão da ordem de serviço para o sujeito passivo prende-se com a informação prestada pela Inspeção Geral da Educação, constante do relatório enviado à DGCI no sentido de analisar a situação tributária de alguns docentes a prestarem serviços na «Associação .............» nos exercícios de 2000 e 2001” – fls. 10 do PA; 10. Em 15/06/2004, a ora Impugnante enviou à Direção de Finanças ... as cópias dos cheques (frente e verso) anteriormente solicitadas – fls. 129 do PA; 11. Dos cheques emitidos pela «Associação .............», verifica-se que alguns deles foram levantados pela sua funcionária «AA», sendo estes: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] – Fls. 49 a 51, 57 e 58 do PA; 12. Em 28/06/2004, quando questionada relativamente aos cheques nº ...73, ...72, ...04, ...05, ...06, a funcionária «AA», em Auto de Declarações, referiu que: “1) Procedeu ao levantamento do mesmo junto das instituições bancárias por ordem de dois dos membros da Direcção da «Associação .............», Sr. «CC» e Sr. «DD». 2) Em relação ao destino dado ao dinheiro levantado nos Bancos diz que o desconhecia. Entregou-o aos membros da Direcção anteriormente identificados. 3) Referiu que todos os pagamentos e recebimentos eram da sua responsabilidade, com excepção dos pagamentos feitos pela secção de Andebol que eram da responsabilidade do Sr. «EE». Os pagamentos que a «Associação .............» fazia eram normalmente em cheque nunca em dinheiro. 4) Questionada sobre a existência física de um cofre nas instalações da «Associação .............» referiu que o mesmo não existia. O que existia para guardar os valores monetários era uma caixa para as moedas e um porta-moedas para as notas e cheques, que no final do dia levava consigo. As importâncias recebidas poderiam no máximo ascender a 300 ou 400 contos no espaço de um mês. Esporadicamente recebia donativos de valor elevado que tentava depositar de imediato. 5) Durante o tempo que trabalhou na «Associação .............», cerca de 4 anos, que se lembre o levantamento de cheques de valor tão elevado como os que lhe foram exibidos teria ocorrido mais uma vez. Estranhou esta situação mas não a questionou apenas fez o que lhe mandaram.” – Fls. 59 e 60 do PA; 13. Em 09/07/2004, a Inspetora Tributária notificou a ora Impugnante, na pessoa do seu Presidente «DD», para que no dia 22/07/2004 apresentasse resposta às seguintes questões: “1) Tendo sido confirmado pelos membros da Direção Sr. «DD» e Sr. «CC» que os cheques (...) levantados ao balcão das instituições bancárias pela funcionária «AA», lhes foi entregue, queira justificar qual o destino dado a todo este dinheiro levantado. 2) Caso tenha sido entregue parte ou a totalidade deste dinheiro a outras pessoas indicar os seus nomes e quais as funções que desempenham na “«Associação .............»” 3) Na eventualidade de tal dinheiro ter sido utilizado para pagamento de despesas incorridas por conta da “«Associação .............»” devem ser exibidos todos os documentos que justifiquem essas despesas. 4) Em 31/12/2000, foram efectuados lançamentos suportados em documentos internos, que constam como anexo 1, a esta notificação, que evidenciam saídas de “caixa” nos montantes de 2.850.000$00 e 1.900.000$00. Solicita-se que sejam identificados os beneficiários de tais reembolsos e a data em que estes adiantaram dinheiro à «Associação .............». Devem ser exibidos os documentos comprovativos desta situação. 4) Tendo sido constatado que um dos cheques, o nº ...62 da Banco 1.... datado de 29/09/2000 no montante de 2.180.000$00, foi movimentado como “reforço de Caixa” e posteriormente foi depositado na conta bancária particular de um dos membros da Associação, Sr. «EE», existindo a indicação que este cheque foi para pagar despesas efectuadas pelo Sr. «EE», solicita-se que sejam exibidos os documentos relativos a tais despesas.” – fls. 61 e 62 do PA; 14. Em resposta à notificação a que alude o ponto anterior a Impugnante explicou que: “Ponto 1: Não é verdade que os membros da Direcção, Sr. «DD» e Dr. «CC», tenham confirmado que os cheques, nos montantes de 5.030.000$00 e 1.000.000$00 (quatro cheques) lhes tenham sido entregues directamente. Os cheques foram entregues, de facto, à Direcção da Associação e respectivos seccionistas, como um todo, tendo sido utilizados do seguinte modo: a) Levantamento de quatro cheques no valor de 1.000.000$00, sendo distribuídos por seccionistas e atletas, quer para pagamento de despesas efectivamente suportadas até à data de emissão dos referidos cheques, cujos comprovativos estão arquivados na contabilidade da associação respeitante ao exercício de 2000, quer a título de “fundo fixo de caixa” ou “vale de caixa”, sendo entregues os respectivos comprovativos “a posteriori” e devidamente contabilizados em períodos subsequentes. b) O levantamento do cheque no montante de 5.030.000$00 destinou-se essencialmente à amortização de empréstimos no montante de 4.750.000$00 (ver ponto 4), sendo o diferencial utilizado para reforçar o saldo de caixa da associação e liquidar despesas efectivamente suportadas no período. Face ao exposto anteriormente, compete-nos reiterar que o saldo existente à data de 31 de Dezembro de 2000 não resultou do pagamento de despesas não documentadas nem de qualquer outra situação menos lícita, mas tão só do atraso na entrega de alguns comprovantes, bem como da alteração do modo de funcionamento da associação. Anteriormente eram os atletas e seccionistas que, para além da sua dedicação e esforço, tinham que “custear” do próprio bolso as despesas inerentes às actividades da associação, e aguardar vários meses para que fossem ressarcidos desses montantes. Durante o ano de 2000 decidiu-se inverter esta tendência, em função das disponibilidades monetárias da associação, sendo colocado à disposição de atletas e seccionistas os meios monetários necessários para fazer face, em qualquer momento, às despesas da associação. Relembramos que a associação movimenta centenas de pessoas, sendo o dinheiro distribuído com base nas necessidades das secções e de acordo com as disponibilidades da associação. Ponto 2: A totalidade do dinheiro foi entregue aos atletas e seccionistas da associação. Os respectivos comprovantes foram sendo entregues, no decurso das actividades normais da associação, sendo posteriormente lançados na contabilidade. Ponto 3: O dinheiro foi efectivamente utilizado para pagamento de despesas inerentes à actividade da «Associação .............», estando os documentos arquivados na contabilidade nos respectivos diários de Caixa, quer em 2000, quer nos anos seguintes. (Ver, por favor, resumo das despesas suportadas por caixa) Ponto 4: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] Ponto 4’: O Sr. «EE» foi um dos seccionistas que, para além de exercer a sua função graciosamente, “custeou” do seu bolso inúmeras despesas inerentes à associação. Apenas no final do ano 2000 foi possível amortizar os empréstimos por si concedidos. O cheque, no montante de 2.180.000$00, foi contabilizado como reforço de caixa em virtude dos comprovativos de despesas terem sido lançados na contabilidade como saídas de caixa. Conclusão O saldo de caixa apresentava um valor efectivamente elevado, contudo a contabilidade reflectia a realidade. O dinheiro foi, na altura, entregue às secções, e não mantido no banco, por uma necessidade de “agilizar”, e mesmo desburocratizar, a acção das secções. Estamos a falar de dezenas de colaboradores e centenas de atletas, os quais tem necessidade de efectuar constantes pagamentos, no âmbito da sua actividade, sendo os documentos posteriormente entregues na contabilidade. Esta descentralização foi efectuada numa base de confiança devido à incompatibilidade de horários entre as diversas pessoas (convém relembrar que a maior parte das actividades são exercidas em horário pós-laboral e ao fim-de-semana). Contudo tal prática não impedia que existisse um controlo constante e rigoroso quer pela direcção, quer pela globalidade dos associados. Relembramos que nos últimos anos, a associação abandonou esta prática, que na altura foi considerada a mais adequada. Com o aumento da dimensão da associação, e face á necessidade de uma maior transparência e controlo interno, foram limitados os pagamentos por caixa, sendo a quase globalidade das despesas liquidadas através de cheque após entrega dos respectivos comprovativos, contudo esta crescente “profissionalização” da estrutura administrativa da associação é bastante onerosa e só agora foi possível. (...)” – fls. 65 e 66 do PA; 15. Por carta registada simples (RO...........01PT), datada de 03/08/2004, os SIT notificaram a Impugnante para prestar os seguintes esclarecimentos: “na sequência da notificação pessoal efectuada em 09/07/2004 e depois de analisados os elementos e esclarecimentos então solicitados, nomeadamente, não foram identificados os seccionistas e/ou atletas a quem foi entregue o dinheiro que em 31/12/2000 se encontrava em Caixa. Assim, solicita-se: 1) a identificação (nome, NIF e morada) e funções desempenhadas na «Associação .............» dos seccionistas e/ou atletas que em 31/12/2000 tinham na sua posse dinheiro, a título de adiantamentos por conta de despesas relativas à «Associação .............», que no seu conjunto devem totalizar o montante de 8.828.707$00 (9.989.957$00 – 1.161.250$00); 2) Envio dos recibos e/ou outros documentos de quitação emitidos, e devidamente rubricados, pelos seccionistas ou atletas, aquando do recebimento do referido adiantamento por conta de despesas; 3) Identificação do responsável pelo controlo interno dos documentos comprovativos das despesas justificativos dos “adiantamentos por conta de despesas” entregues aos seccionistas e/ou atletas; 4) Indicar qual a natureza dos rendimentos pagos aos colaboradores a seguir indicados: «FF»; «GG» «HH» «II» «JJ» «KK» «LL» «MM» «NN» 5) Envio de fotocópia dos meios de pagamento utilizados nos rendimentos referidos no ponto 3.” – fls. 42 e 43 do PA; 16. Em 17/08/2004, o TOC da empresa informou a Direção de Finanças ... que “devido à ausência de alguns membros da Direcção, actualmente em gozo do período normal de férias, não poderemos proceder ao envio da resposta à notificação no prazo de 10 dias úteis, pelo que solicitamos autorização para que o prazo de resposta seja prorrogado para o início do mês de Setembro” – fls. 128 do PA; 17. Em 06/09/2004, o Diretor de Finanças Adjunto proferiu despacho de alteração do âmbito da inspeção de parcial para geral, e prorrogou o prazo da ação inspetiva por mais 90 dias, tendo o presente sido notificado à Impugnante na pessoa do seu TOC através de notificação pessoal em 07/09/2005 – fls. 125 a 127 do PA; 18. Em 22/09/2004, a Impugnante em resposta à notificação identificada no ponto anterior, esclareceu o seguinte: “Enquadramento Compreendemos que os serviços de fiscalização estranhem que o saldo de caixa apresentasse um valor tão elevado. Contudo é necessário conhecer a realidade deste tipo de associações, não podendo limitar-se a comparar com o que sucede nas empresas, nomeadamente porque o saldo existente era resultante, quer do atraso na entrega, e consequente contabilização, de alguns comprovativos de despesas, quer da distribuição do dinheiro por dirigentes e seccionistas, a qual era efectuada atendendo às necessidades previstas das várias secções e de acordo com as disponibilidades da associação. Relembramos que a «Associação .............» abrange centenas de participantes, a actuar em regime amador, os quais têm necessidade de custear despesas, no âmbito da actividade das diversas secções, movimentando actualmente cerca de 700 pessoas, com um orçamento anual de aproximadamente 300.000€. (...) Ponto 1: Como foi referido, aquando da resposta à primeira notificação, o dinheiro estava controlado pela Direcção e seccionistas, para custear as despesas das actividades desenvolvidas, sendo os comprovativos entregues “a posterior” e devidamente contabilizados em períodos subsequentes. Os elementos da Direcção e seccionistas em exercício à data de 31 de Dezembro de 2000 eram os seguintes: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] Lembramos que as actividades da «Associação .............», maioritariamente realizadas fora do concelho, abrangem centenas de participantes (atletas, coralistas, alunos do conservatório, associados, ...). Salientamos que, conforme foi referido por diversas vezes, não possuímos registos, contabilísticos ou outros, que nos permitam identificar os valores que cada um dos colaboradores possuía, a título individual, em 31 de Dezembro de 2000. Ponto 2: Aquando da entrega do dinheiro, a título de adiantamento por conta de despesas, eram apresentados “documentos” internos elaborados, pelos principais seccionistas, de uma forma algo amadora, devido a uma manifesta falta de tempo, mas rigorosa. Após a concretização dos pagamentos, esses documentos eram restituídos, e eventualmente destruídos, sendo substituídos pelos respectivos comprovantes, os quais foram sendo entregues, no decurso das actividades normais de associação e posteriormente lançados na contabilidade. Quanto aos recibos e outros documentos justificativos da saída do dinheiro, relembramos que os mesmos estão nas pastas da contabilidade, quer em 2000, quer nos anos seguintes. Ponto 3: O controlo interno era efectuado, quer pela direcção, quer pelos diversos seccionistas. Ponto 4: Os colaboradores indicados no ponto 4 davam o seu apoio, a título gracioso, nas actividades pedagógicas da associação, sendo-lhes pagas as despesas suportados no desempenho das suas funções (refeições, portagens, combustível, ...). Não existindo qualquer vínculo laboral com a associação, o pagamento dessas despesas era obviamente resultante do apoio prestado, o qual podendo ser considerado rendimento seria tributado em sede de IRS na categoria B. Relembramos que os comprovantes dessas despesas estão arquivados nas pastas da contabilidade. Ponto 5: Presumindo a existência de um ligeiro lapso na notificação (os meios de pagamento referem-se ao ponto 4 e não ao ponto 3), relembramos que não é possível enviar fotocópia dos meios de pagamento visto que os referidos colaboradores recebiam em dinheiro. Conclusão Voltamos a insistir que, apesar de algumas dificuldades iniciais na consciencialização de alguns colaboradores, que devido à sua menor disponibilidade de tempo não entregavam, por vezes, em devido tempo os comprovativos das despesas realizadas ao serviço da «Associação .............», sempre foi intuito dos membros da Direcção da «Associação .............» aliar aos seus méritos, enquanto promotora de actividades de índole cultural, social e desportivo, a apresentação de contas rigorosas e transparentes. Sintomático dessa preocupação foi a opção por uma contabilidade devidamente organizada de acordo com as normas do POC e da legislação fiscal em vigor, postura essa que sabemos não ser seguida pela maioria das associações devido a ser bastante oneroso e exigente. Se a «Associação .............» não tivesse optado por Contabilidade Organizada, como tantas outras associações que recebem dinheiros públicos, não existiriam evidências de saldo de caixa tão elevado!” – fls. 44 e 45 do PA; 19. A ação inspetiva teve início em 12/03/2004 e foi dada por terminada em 18/10/2004 – fls. 94 e 125 do PA; 20. Por ofício n.º ...95, datado de 18/10/2004, e enviado sob registo postal simples de 20/10/2004, foi a agora Impugnante notificada para exercer o direito de audição sobre o projeto de relatório da Inspeção Tributária datado de 18/10/2004 no qual a AT considera que o valor da diferença (€ 42.682,00) entre o saldo contabilizado na conta caixa (€ 44.037,40) e o valor efetivo dessa conta (€ 1.355,11), alegadamente saída de caixa em numerário e atribuído a seccionistas e a atletas, deve ser qualificada como “despesas não documentadas” por não existir qualquer documento comprovativo da saída desse dinheiro e projeta fazer as respetivas “correções técnicas” – fls. 130 do PA; 21. Em 03/11/2004, a aqui impugnante exerceu o direito de audição sobre o projeto de relatório da Inspeção Tributária – fls. 26 a30 do PA; 22. Em 12/11/2004 a AT elaborou o Relatório final da inspeção, que foi homologado por despacho de 15/11/2004, do qual consta, além do mais, o seguinte: “II/. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL II/.1 EXERCÍCIO DE 2000 Tendo sido demonstrada, no ponto anterior, a inviabilidade do saldo de Caixa em 31/12/2000 ser relativo a adiantamentos consideramos que o mesmo se refere a saídas de dinheiro sem existência de qualquer documento de suporte e como tal sujeito a tributação autónoma nos termos do nº 1 e 2 do artº 81 º do CIRC. Não obstante ter sido frequentemente referido pelos membros da Direcção da Associação o rigoroso controlo interno por parte não só da Direcção como também pela generalidade dos associados, aos nossos pedidos de fazer corresponder documentos a pagamentos efectuados, foi sistematicamente referido pelos membros da Direcção que:”(...) Quanto aos recibos e outros documentos justificativos da saída de dinheiro, relembramos que os mesmos estão nas pastas da contabilidade, quer em 2000, quer nos anos seguintes. (...)” Efectivamente as pastas da contabilidade contêm muitos documentos de despesas nomeadamente de combustíveis e deslocações, onde consta a identificação da «Associação .............» e o seu nº de contribuinte. No entanto existem despesas que foram efectuadas por colaboradores da Associação, fora do âmbito da actividade desta, e que lhe foram apresentados como forma de pagamento de serviços que deviam ser titulados por recibos. Ou seja é impossível fazer a distinção entre os documentos relativos a despesas reais da «Associação .............» e os que lhe são entregues em substituição de recibos. Assim sendo com a resposta que sistematicamente nos deram de que “os documentos estão nas pastas da contabilidade” os membros da Direcção resolvem todas as nossas dúvidas, quaisquer que elas sejam. Fica à consideração da Administração fiscal escolher aleatoriamente (adivinhar) quais os documentos justificativos daquilo que se pretende ver esclarecido. Alguns dos fundamentos em que assenta esta correcção meramente aritmética foram expostos no ponto II.3.2 e de forma resumida são: _ divergência entre as declarações da funcionária administrativa quanto ao funcionamento e gestão dos meios financeiros e os esclarecimentos dados pelos membros da Direcção. A funcionária «AA» declarou que enquanto esteve na Associação, com excepção do Sr. «EE» da secção de andebol, era ela a responsável por todos os pagamentos e recebimentos. Referiu também que o saldo de Caixa era sempre diminuto, daí que quando tinha que fazer pagamentos normalmente fazia-o por meio de cheque. Os membros da Direcção como forma de explicarem o saldo elevado de Caixa referem que a Associação fazia adiantamentos; _ não identificam no entanto os beneficiários desses adiantamentos; – não fazem a sua quantificação por beneficiário; _ não existe qualquer prova documental(recibo ou outro documento de quitação) de que os mesmos receberam tais valores; – foi demonstrado ser impossível existirem adiantamentos de valor semelhante ao saldo de caixa; – falta de evidência na contabilidade da existência de valores adiantados a terceiros. III. 3 IMPOSTOS EM FALTA III.3.2 IRC A justificação por parte da Direcção da «Associação .............» para o levantamento em dinheiro de um cheque de 5.030.000$00, em 29/12/2000, foi a de que o mesmo se destinou a amortizar empréstimos que tinham sido efectuados pelo seccionistas «EE» e outros não identificados, donde se depreende que o Caixa não possuía dinheiro nesta data. Foi também referido que o diferencial entre este valor e o montante dos empréstimos se destinou a reforçar o saldo de caixa. Este diferencial ascende a 1.355,11€ (271.675$00). De acordo com as declarações da funcionária administrativa ao serviço da «Associação .............» nessa data, o valor em caixa nunca ultrapassou os 300 ou 400 contos, razão pela qual consideramos que o diferencial de1.355,11€ seria o saldo de caixa efectivo em 31/12/2000. Assim, a correcção efectuada em sede de IRC, ao exercício de 2000, consiste em considerar como despesas não documentadas o saldo contabilístico de Caixa no montante 42.682,OO€ (8.557.000$00 = 8.828.707$00– 271.675$00), já que este saldo é somente contabilístico. Nos termos do nº 1 e 2 do artº 81º do CIRC estas despesas são tributadas autonomamente à taxa de 70%, sendo pois o imposto em falta de 29.877,50€ (42.682,00€ x 70%) (...) VIII. DIREITO DE AUDIÇÃO – FUNDAMENTAÇÃO (...) C. Da Qualificação Nos pontos 18º ao 32º é posta em causa a qualificação do saldo de Caixa. Nestes pontos é dito que o saldo existia em 31/1212000 mas que não estava depositado num cofre mas sim entregue aos seccionistas e membros da Direcção. O Plano Oficial de Contabilidade em relação à conta Caixa refere: “(..) inclui os meios de pagamento, tais como notas de banco e moedas metálicas de curso legal, cheques e vales postais, nacionais ou estrangeiros (..)” Como facilmente se depreende desta definição o “Caixa” não inclui o dinheiro que se encontra distribuído a membros da Direcção ou seccionistas. Este deve ser contabilizado numa conta da classe 2 – Terceiros (26 ...) como adiantamento. Convém relembrar que a execução da contabilidade estava (está) a cargo de um gabinete de contabilidade possuindo o Técnico de Contas formação superior na área de contabilidade. Para além disso existem membros da Direcção e seccionistas também com formação académica superior em contabilidade. Ainda que actuem com “carolice”, porque não são remunerados, sabem quais os procedimentos correctos por forma a que as contas sejam mais transparentes e claras. Em relação à qualificação do saldo de caixa foi feita alguma confusão porque no projecto de relatório este saldo não foi apelidado de “custos mal documentados” (ponto 22º), mas sim de “despesas não documentadas”, que é diferente. O raciocínio seguido foi o seguinte: se o saldo de caixa em termos físicos não está em caixa porque se encontra distribuído pelos seccionistas e/ou membros da Direcção e não foi feita prova documental, através da identificação dos documentos que suportam os custos nos exercícios seguintes, ficamos sem saber em que despesas foi gasto o montante antes distribuído. É que concluímos que existem muitos documentos de despesas de refeições e combustível que foram contabilizados como saídas de caixa que serviram para pagar honorários a vários colaboradores. Então, o sujeito passivo deve identificar uns e outros, isto é, os que foram apresentados pelos seccionistas e/ou membros da Direcção que justificam os adiantamentos, os que foram apresentados pelos prestadores de serviços (professores), e eventualmente outros caso existam. A informação é um dos objectivos da contabilidade e deve ser clara e credível. A resposta sistemática de que os documentos estão todos arquivados no Caixa sem qualquer identificação prévia não chega para justificar o valor adiantado. D .Do ónus da prova Contrariamente ao referido no ponto 33º do direito de audição os serviços de inspecção tributária não qualificaram o saldo de caixa à data de 31/12/2000 em custos do ano de 2000. O que foi referido é que este saldo constitui “despesa não documentada”. Não foi também invertido o ónus da prova. De acordo com o referido no artº 75º nº 1 a prova compete à DGCI mas a contabilidade deve estar organizada de acordo com a legislação comercial e fiscal, veja-se o referido no citado artigo: “(..) Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal ( . .)”. Não é o que acontece na «Associação .............» em 2000, este contribuinte embora, do ponto de vista formal, possua contabilidade organizada, a sua execução não foi a mais correcta tendo sido violados alguns dos princípios contabilísticos, não se encontrando por isso a sua organização em total acordo com a legislação comercial e fiscal. Ainda assim, a administração tributária fez um esforço por chegar à verdade, e a prova disso é que notificou duas vezes o sujeito passivo para este prestar esclarecimentos, do qual não recebeu respostas claras e objectivas com vista a esclarecer o valor anormal contabilizado em caixa. Quanto ao facto do saldo de caixa nos anos subsequentes ter valores menores tem a ver com a diminuição da receita na rubrica dos donativos da empresa acompanhada com um aumento substancial dos custos.” – fls. 15 a 18 do PA; 23. Em 16/11/2004 os inspetores tributários deslocaram-se à sede da «Associação .............» a fim de notificarem o “Relatório Final (...), elaborado pelo Serviço de Inspecção Tributária (SIT), com data de 12/11/2004 composto por 70 fls.”, uma vez que “O acto notificador emerge por no seio do Processo ter ocorrido: Correcções meramente aritméticas”, tendo esta notificação sido feita na pessoa do membro da direção «DD» – fls. 19 a 22 do PA; 24. Em 26/11/2004, e na sequência da ação inspetiva em causa nos autos, a AT procedeu à emissão da nota de cobrança da Liquidação n.º ...08, relativa a IRC (tributação autónoma) e juros compensatórios e moratórios, no montante global de € 36.069,36, a pagar voluntariamente até 5/1/2005 – fls. 2 do processo físico e fls. 378 do PA; 25. Em 01/04/2005, a ora Impugnante deduziu reclamação graciosa contra a liquidação acima aludida – fls. 372 a 377 do PA; 26. Por ofício n.º ...49, datado de 13/12/2006, foi comunicado à agora Impugnante para, querendo, exercer o direito de audição sobre o projeto de decisão que recaiu sobre a reclamação graciosa, no entanto esta não o exerceu – fls. 395 e 396 do PA; 27. Por ofício n.º ...11, datado de 17/01/2007, enviado sob registo postal cujo aviso de receção foi assinado em 19/01/2007, foi comunicado à agora Impugnante o indeferimento da reclamação graciosa – fls. 253 a 256 do PA; 28. Em 02/02/2007 deu entrada no Serviço de Finanças ... a petição inicial da presente Impugnação – fls. 2 e ss. do processo físico; * 3.2. Matéria de facto dada como não provada: 1. Em 2000, a «Associação .............» já tinha instituído totalmente a prática de adiantamentos de valores aos seus colaboradores para fazer face às despesas – facto implícito no depoimento da 1ª e 2ª testemunha e nos artigos 15º, 24º, 26º da p.i.; 2. Os adiantamentos aos colaboradores da associação configuraram despesas dos anos seguintes – facto implícito nos artigos 16º, 32º da p.i.; * 4. Motivação de facto A convicção do tribunal quanto aos factos assentes teve por base o confronto das posições das partes assumidas nos respetivos articulados, a análise global dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo que, por não estarem impugnados, se dão como integralmente reproduzidos, conforme se indica em cada um dos pontos de 3.1 supra. Para a formação dessa convicção também se atendeu aos depoimentos testemunhais. A «Associação .............», foi fundada em 1969, e desde essa data que se dedica à promoção do ensino artístico, da cultura e do desporto e recreio dos associados; além disso, em 1998 foi reconhecida como pessoa de utilidade pública e consequentemente isenta em sede de IRC e de IVA (factos 1 e 2 de 3.1 supra). Em 2003, o Conservatório ... foi submetido a uma ação inspetiva por parte da Inspeção Geral da Educação, tendo sido detetadas irregularidades diversas, designadamente a desconformidade com a situação tributária de alguns docentes que prestaram serviço nos anos de 2000 e 2001 (facto 3 de 3.1 supra). Desta inspeção resultou uma comunicação da irregularidade para a Direcção-Geral dos Impostos, e a instauração de um processo disciplinar, o que levou ao início de uma inspeção tributária à atividade da agora impugnante (factos 6 a 22 de 3.1supra). Apesar das dificuldades financeiras evidenciadas, a Impugnante contabilizava em 31/12/2000 um saldo de “caixa” de € 42.682,00, que não correspondia ao saldo efetivo (facto 30 de 3.1 supra). De facto, as testemunhas inquiridas e a própria impugnante (artigos 15º a 19º p.i.) admitem que os membros da Direção levantaram dinheiro que se encontrava depositado em contas da Associação (que dizem ter sido entregue aos seccionistas para estes fazerem face às despesas inerentes ao desenvolvimento das atividades da «Associação .............») e que em finais de 2000 contabilizaram essas verbas como saldo da conta “caixa” (esperando que os seccionistas fossem apresentando nos anos seguintes os comprovativos das despesas realizadas) A AT começou por verificar os movimentos da conta caixa e constatou que ao longo do ano de 2000, foram efetuados vários reforços nessa conta de montante elevado. Por isso, solicitou à agora Impugnante as fotocópias frente e verso dos cheques emitidos para o reforço do Caixa e apercebeu-se que a maioria destes cheques tinha sido levantada ao balcão do banco por uma das suas funcionárias, «AA» (factos 11e 12 de 3.1 supra). Em Auto de Declarações, esta funcionária esclareceu que procedeu ao levantamento de tais cheques por ordem de membros da direção da «Associação .............», e que desconhecia qual o destino dado a este dinheiro uma vez que o entregava aos ditos membros da direção. Para além disso clarificou que todos os “pagamentos e recebimentos” eram da sua responsabilidade, à exceção dos pagamentos da secção de Andebol, e que normalmente os pagamentos eram feitos através de cheque. Relativamente ao valor do caixa referiu que as importâncias recebidas num mês nunca ascendiam os “300 ou 400 contos”, e que se recebesse eventualmente donativos de valor elevado, tinha o cuidado de fazer o seu depósito de imediato, até porque a Associação não tinha cofre (facto 12 de 3.1 supra). Para averiguação da verdade material, a AT notificou a agora Impugnante para esclarecer: (1) qual o destino dado ao dinheiro levantado no banco; (2 e 3) a quem foram adiantadas verbas, com os respetivos documentos justificativos; (4) quais os beneficiários de algumas das saídas do caixa em dinheiro (facto 13 de 3.1 supra). Quanto aos montantes levantados ao balcão das instituições bancárias, a «Associação .............» explicou que o distribuiu por “seccionistas e atletas, quer para pagamento de despesas efectivamente suportadas até à data de emissão dos referidos cheques, (...) quer a título de “fundo fixo de caixa” ou “vale de caixa”, bem como para “amortização de empréstimos”, e anexou um mapa das despesas suportadas pelo caixa (facto 14 de 3.1 supra). No que concerne às saídas do caixa, a Impugnante refere que estes se tratam de reembolsos a membros da direção ou seccionistas, tanto a título de amortização de empréstimos que estes haviam concedido, como de pagamento de despesas da associação por eles assumidas inicialmente. Apesar da resposta apresentada, a Direção da «Associação .............» não identificou quais os seccionistas e/ou atletas que possuíam o dinheiro, nomeadamente a título de adiantamentos, nem apresentou documentos justificativos desta situação, pelo que a AT insistiu com a Associação para que esclarecesse novamente o destino do dinheiro registado na conta “Caixa” (facto 15 de 3.1 supra). Em resposta, a «Associação .............» volta a referir que “o dinheiro estava controlado pela Direcção e seccionistas, para custear as despesas das actividades desenvolvidas, sendo os comprovativos entregues “a posterior” e devidamente contabilizados em períodos subsequentes. Os elementos da Direcção e seccionistas em exercício à data de 31 de Dezembro de 2000 eram os seguintes: [Imagem que aqui se dá por reproduzida] Salientamos que, conforme foi referido por diversas vezes, não possuímos registos, contabásticos ou outros, que nos permitam identificar os valores que cada um dos colaboradores possuía, a título individual, em 31 de Dezembro de 2000. (...) Quanto aos recibos e outros documentos justificativos da saída do dinheiro, relembramos que os mesmos estão nas pastas da contabilidade, quer em 2000, quer nos anos seguintes.” (facto 18 de 3.1 supra). Esta resposta, sobretudo a parte final, revela sem margem para dúvida que a Impugnante não tem documentos comprovativos da saída de caixa (parte a “negrito” nosso) e que os “recibos e outros documentos justificativos da saída do dinheiro”, que alegadamente se encontrariam nas pastas da contabilidade de 2000 e dos anos seguintes, não serão propriamente comprovativos da “saída de caixa” mas de realização de despesas, desconhecendo-se se os respetivos meios de pagamento utilizados resultam exatamente da mobilização do saldo em falta da conta “caixa” ou de saldos da conta caixa de outros anos ou de meios da conta “bancos”. Concorda-se que se a agora Impugnante não conseguia estabelecer a devida relação entre os ditos documentos, que alegadamente se encontravam nas pastas da contabilidade de 2000 e dos anos seguintes, e as referidas “saídas de caixa” do ano 2000 não seria de esperar que a AT o (tivesse ou) pudesse fazer. Por tudo isso, acompanha-se o entendimento de que a AT comprovou que o saldo contabilístico da conta “caixa” não revelava o saldo verdadeiro dessa conta em 31/12/2000, que era muito menor, e que a agora Impugnante não possui documentos comprovativos da “saída de caixa” correspondentes à diferença entre o saldo contabilístico e o saldo real dessa conta. Por isso, a contabilidade da «Associação .............» perdeu a presunção de verdade de que gozava inicialmente, pelo que agora lhe passou a si o ónus de fazer prova dos factos em que assenta o direito que pretende exercer (artigos 75º e 74º da LGT). Por tudo isto a AT formou a convicção de que o saldo de caixa apresentado em 31/12/2000 seria somente contabilístico, uma vez que o saldo de caixa efetivo nesta data seria de € 1.355,11. Neste seguimento, considerou a diferença (€ 42.682,00) entre o saldo contabilístico (€ 44.037,40) e o saldo efetivo (€ 1.355,11), como “saída de caixa” não justificada documentalmente com tratamento fiscal idêntico ao das “despesas não documentadas” e, por isso, sujeita a tributação autónoma à taxa de 70%. A Impugnante não concorda com aplicação da taxa de tributação autónoma ao saldo de caixa, porque defende que não se pode transformar, como faz a AT, o saldo da conta “caixa” em “custo/despesa”, considerando que este saldo não espelha despesas não documentadas mas sim adiantamentos aos seus colaboradores para fazer face a despesas futuras. Mas será efetivamente assim? Será que em 2000 a «Associação .............» já adiantava valores monetários às respetivas secções? A Impugnante defende-se elucidando que “anteriormente eram os atletas e seccionistas que (...) tinham que “custear” do próprio bolso as despesas inerentes às actividades da associação e aguardar vários meses para que fossem ressarcidos desses montantes. Durante o ano de 2000 decidiu-se inverter esta tendência, em função das disponibilidades monetárias da associação, sendo colocado à disposição de atletas e seccionistas os meios monetários necessários para fazer face, em qualquer momento, às despesas da associação.” (facto 14 de 3.1 supra). A primeira testemunha, «EE» (ex-colaborador da «Associação .............» na secção de Andebol), explicou que muitas das despesas da secção de andebol eram suportadas por si, adiantando do “seu próprio bolso” valores significativos. No entanto, entre 2000/2002, houve uma restruturação nesta associação e uma das mudanças impostas foi a entrega do dinheiro adiantado aos seccionistas para fazerem face às despesas que iam surgindo. Esclareceu ainda que supunha que também houvesse adiantamentos para as restantes secções. A segunda testemunha, «OO», (colaborador da «Associação .............» na secção de Atletismo), prestou depoimento no mesmo sentido referindo que também adiantou dinheiro muitas vezes para as despesas que iam surgindo, mas que em 2000 a «Associação .............» “de um modo geral adiantava o dinheiro”, sendo o tratamento igual para todas as secções, apesar da secção de andebol movimentar muito mais dinheiro. No entanto, a terceira testemunha, «PP» (coordenadora do grupo coral), contraditou os anteriores depoimentos, quando referiu que à data não havia adiantamentos de dinheiro por parte da «Associação .............» ao grupo coral, até porque se por exemplo tivesse que tirar fotocópias, ela própria tomava a iniciativa. Ainda sobre isto, a funcionária «AA» mencionou em auto de declarações (facto 12 de 3.1 supra) que todos os “pagamentos e recebimentos” eram da sua responsabilidade, à exceção da secção de andebol, e que quando efetuava pagamentos, o fazia através de cheque. Por causa da indicada contradição, o depoimento das testemunhas acima mencionadas não faz prova cabal dos factos sobre os quais incidiram, nem conduz à certeza de que no ano de 2000 a «Associação .............» passou a adiantar dinheiro aos seus colaboradores para fazerem face às suas despesas. Sem prejuízo, apesar de contraditórios os depoimentos das testemunhas afiguram-se credíveis porque são coerentes com a explicação dada pela agora Impugnante segundo a qual, nesse ano, a associação estava a passar por uma fase de transição; pelo que seria normal que se encontrasse ainda em adaptação do mesmo modelo de gestão às várias secções e que entre estas ainda subsistisse alguma diferença de tratamento em situações idênticas (até porque o tipo e volume de despesas referidas à secção de andebol/atletismo é radicalmente diferente das despesas da secção de Canto coral). Ao longo desse ano, a «Associação .............» terá tentado alterar a sua forma de gestão, nomeadamente a forma de atuar dos seus colaboradores, e por isso, é perfeitamente admissível que as suas normas e procedimentos ainda não estivessem totalmente assimilados, ocasionando em algumas situações, adiantamentos aos colaboradores por parte da associação, bem como a situação inversa, os colaboradores substituírem a «Associação .............», sendo ressarcidos posteriormente. O que fica dito não significa que se aceite como justificação para a Impugnante atenuar os seus erros contabilísticos (considera-se que a autorização de “saídas de caixa” sem contrapartida documental imediata constitui um erro grosseiro, inadmissível em qualquer cenário mas absolutamente criticável numa Direcção em que alguns membros possuem formação académica especializada que tornam esse procedimento incompreensível e indesculpável). No entanto, é convicção deste Tribunal que, de facto, a forma de atuação da «Associação .............» ainda não estaria normalizada. Por isso se julga não provado que a «Associação .............», no ano de 2000, já tinha instituído plenamente a prática de adiantamento de valores aos seus colaboradores para fazerem face às despesas (facto 1 de 3.2 supra). Para além disso, a Impugnante defende ainda que os valores que foram adiantados aos colaboradores durante o ano 2000 não se referem a despesas não documentadas, mas sim a adiantamento para despesas contabilizadas nesse ano e nos anos seguintes. Quanto confrontada pela AT com esta questão a «Associação .............» limitou-se a referir que os documentos comprovativos estavam “arquivados na contabilidade nos respectivos diários de Caixa, quer em 2000, quer nos anos seguintes” (facto 15 e 19 de 3.1 supra), sem nunca ter feito um esforço para demonstrar que assim era através da conciliação das despesas incorridas pelos colaboradores nos anos em que estas foram contabilizadas e os valores que compõem o saldo da conta “caixa” em 31/12/2000. Dos Autos também não consta qualquer prova documental que ateste que estas despesas foram contabilizadas nos anos seguintes, e, como se viu, seria para a Impugnante muito fácil fazer tal prova (pois trata-se de provar um “facto positivo”). Deste modo, também não se dá como provado que os reputados “adiantamentos” aos colaboradores em 2000 configuraram despesas desse e dos anos seguintes (facto 2 de 3.2 supra).» 2.2. De direito Notificada da sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação apresentada contra o indeferimento da reclamação por sua vez apresentada contra a liquidação adicional de IRC do exercício de 2000 e respectiva liquidação de juros, a Impugnante e ora Recorrente veio apresentar o presente recurso restrito às questões em que decaiu e que sinteticamente dizem respeito a correções efetuadas à matéria tributável declarada e relativa a despesas tidas como não documentadas e tributadas em sede de tributação autónoma. In casu, no decorrer da ação inspetiva à atividade da ora Recorrente, a AT verificou que o saldo da conta caixa, contabilizado em 31.12.2000, não coincidia com o saldo efetivo dessa conta, após diligências e insistências junto do sujeito passivo conclui pela inexistência de documentos comprovativos das “saídas de caixa” e não ser possível estabelecer qualquer nexo entre os documentos comprovativos de despesas suportadas no ano 2000 e nos anos seguintes (2002, 2002 e 2003) com aquelas “saídas de caixa”. A AT concluiu que, nessas circunstâncias, se tratava de saídas de dinheiro para despesas não documentadas e, como tal, sujeitas a tributação autónoma. A Impugnante, no que ora importa, discorda da qualificação feita, alegando que “Efectivamente foram levantados pelos membros da direcção, algumas quantias necessárias ao desenvolvimento da actividade da mesma, que depois os entregaram a vários responsáveis pelas várias secções para estes fazerem face às despesas inerentes ao desenvolvimento das actividades da «Associação .............» (...)”, estando “devidamente documentadas como despesas/custos suportados nos anos de 2001, 2002, 2003” Conhecendo, o Tribunal a quo, julgou em parte procedente a impugnação quanto à questão da inconstitucionalidade do acto de liquidação. Alegava o Impugnante aquela inconstitucionalidade assente na constatação de não existir no ordenamento jurídico português, à data dos factos, a tributação autónoma em sede de IRC, tendo em conta que tal regime só foi introduzido pela Lei n.º 20-G/2000 de 29 de Dezembro, entrada em vigor em 01.01.2001. Na decisão sob recurso, atentando que apesar do artigo 69.º-A só ter sido aditado ao Código de IRC com a entrada em vigor da Lei n.º 30-G/2000, a verdade é que a norma de incidência semelhante já existia anteriormente, pelo que não ocorre a aclamada inconstitucionalidade. No entanto, ponderando a que AT errou na quantificação da taxa de tributação autónoma, uma vez que aplicou ao caso dos autos a taxa prevista no artigo 81.º do CIRC, na redação dada pela revisão do Decreto-Lei n.º 198/01, de 3 de Julho, quando à data dos factos estava em vigor o nº 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 192/90, de 9 de Junho, com a redação dada pela Lei 3-B/2000, de 4 de Abril, entrada em vigor em 01.01.2000, considerou que “foi aplicada uma taxa diversa da vigente ao tempo dos factos mais gravosa do que vigente naquela altura, de tal forma que a impugnação procede parcialmente com o fundamento sob análise, na medida em que a taxa aplicada (70%) excedeu a taxa que deveria ter sido aplicada (60%)”. Cumpre atentar que nesta parte, a Recorrente se conforme com o assim julgado. Prosseguindo, conheceu a sentença sob recurso do erro nos pressupostos em que assentou a qualificação do saldo de caixa em 31/12/2000 como “despesas não documentadas” e, dos juros compensatórios e dos juros de mora, julgando nesta parte acção improcedente ao considerar que: “(...) a AT satisfez validamente o ónus da prova que lhe competia (art.º 74.º, nº1 da LGT), cabendo agora à Impugnante fazer prova dos factos que alega e do direito que invoca.” para neste sede estribar que “(...) nunca concretizou as suas afirmações, nunca identificou os beneficiários diretos e respetivo valor adiantado, nem demonstrou que os custos foram realizados em anos posteriores, pelo que não logrou provar tais argumentos (factos 1 e 2 de 3.2 supra)./ Nada disso foi feito pela Impugnante, nem em sede de reclamação graciosa nem na presente impugnação./Além disso, resulta dos factos que a Impugnante, possuía contabilidade organizada desde 1999, estando a cargo do Técnico oficial de contas «BB» (facto 3 de 3.1 supra), pelo que, com grande probabilidade, a «Associação .............» sabia ou tinha obrigação de saber que todas as entradas e saídas do caixa tinham que estar documentadas, sob pena de ser tributado autonomamente. As saídas de caixa não precisam de ser documentadas (exclusivamente) com os documentos de despesas, comprovativos de aquisições e bens ou serviços./No caso de “adiantamentos” aos seccionistas (e destes para outros responsáveis) a saída de dinheiro do caixa deve ter necessariamente como contrapartida imediata algum documento de valor equivalente, nomeadamente um “recibo” (documento externo ou interno contendo uma declaração de recebimento e com data, valor e identificação do beneficiário) subscrito pela entidade que “recebeu”./Na realidade, poderia não existir qualquer documento de “despesa” (faturas ou outro documento comprovativo de aquisições de bens ou serviços) e mesmo assim considerar-se justificada a “saída de caixa”: bastaria que existissem recibos dos adiantamentos aos seccionistas subscritos por cada um desses “recebedores” dos meios de pagamento. No caso, não existem tais recibos nem é possível ter a certeza da existência dos comprovativos das aquisições efetuadas com esses adiantamentos.” Concluindo que as saídas da conta caixa ocorridas no ano 2000 estão “não documentadas”, será de manter a liquidação adicional de IRC sob impugnação, cujo atraso no pagamento é imputável à agora Recorrente, pelo que estarão preenchidos os requisitos do art.º 35.º da LGT para que sejam devidos juros compensatórios e, bem assim, juros de mora. Inconformada, a Recorrente veio interpor o presente recurso jurisdicional. Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr. artigo 639º, do CPC, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artigo 282º, do CPPT). Munidos de elevado espírito de compreensão e destreza este Tribunal ad quem propõem-se desvendar e contextualizar as nulidades que a Recorrente desfere contra a sentença, bem como o manancial de erros de facto e contradições elencadas que se pautam por uma incorrecta técnica na sua apresentação e elaboração. Assim, se bem interpretamos e sintetizamos as alegações de recurso apresentadas a Recorrente apresenta os seus argumentos sob três grupos: (i) das nulidade da sentença por ambiguidade e obscuridade em relação aos factos dados como provados e de falta de fundamentação de facto (conclusão A); (ii) do erro no julgamento de facto (conclusão B, C, D e E) e, subsequente (iii) do erro de direito, pois que a nova base factual é determinante da verificação de falta de pressupostos de facto da liquidação, mormente da parte não provida à luz do artigo 4º/2 do Dec-lei 192/90 de 9 Junho com a redacção da Lei 3-B12000, extensível as liquidações de juros. 2.2.1. Das nulidades, artigos 154º, 195º, 615º, n.º 1 b) e c) do CPC: Da falta de fundamentação Cumpre, antes de mais, determinar se a decisão posta em crise padece da assacada nulidade consubstanciada na falta de fundamentação, enunciando os preceitos normativos relevantes. No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125º, nº 1, do CPPT (Código de Procedimento e de Processo Tributário), norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida em processo judicial tributário [cf. Jorge Lopes de Sousa, C.P.P. Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª edição, 2011, pág.357 e seg.; ac.S.T.A-2a.Secção, 24/2/2011, rec.871/10; acórdão do STA – 2ª Secção, de 13.10.2010, in rec. n.º 218/10; acórdãos do TCA Sul, de 28.05.2013 e 15.05.2014, in proc. n.º 6406/13 e proc. n.º 7508/14]. A exigência de fundamentação é justificada pela necessidade de permitir que as partes conheçam as razões em que se apoiou o veredicto do tribunal a fim de as poderem impugnar e bem assim, para que o tribunal, superior exerça sobre elas a censura que se impuser. Dito de forma diversa, a fundamentação, para além de visar convencer os interessados sobre a correcção da solução legal encontrada pelo julgador, tem como finalidade elucidar as partes sobre as razões por que não obtiveram ganho de causa, para, assim, as poderem impugnar perante o tribunal superior, e este, poder apreciar essas razões no momento do julgamento. No âmbito desta exigência, o julgamento da matéria de facto releva um momento essencial da realização da justiça constitucionalmente cometida aos tribunais. Pois que, de e acordo com o disposto no artigo 205º da Constituição da República Portuguesa (CRP), as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei. O juiz tem, por isso, o dever de se pronunciar sobre a factualidade alegada, sobre a que lhe seja lícito conhecer oficiosamente, e que se apresentem relevantes para a decisão, discriminando também a matéria provada da não provada e fundamentando as suas decisões, procedendo à apreciação critica dos elementos de prova e especificando os fundamentos decisivos para a convicção formada - cf. artigo 123º, n.º 2, do CPPT. Nos termos do artigo 125º do CPPT "Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.” Por sua vez, dispõe o artigo 123º, n.º 2 do CPPT que na sentença "[o] juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões", sendo que a não especificação dos fundamentos de facto de direito constitui nulidade da sentença nos termos do disposto no n.º 1 do citado artigo 125º do CPPT e 615º n. º1 al. b) do CPC. Ora, tal nulidade abrange quer a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo artigo 123º, n.º 2 do CPPT, quer a falta do exame crítico das provas, previsto no artigo 607º, n. º4 do CPC. Com efeito, decorre do disposto nos artigos 123º, nº 2 do CPPT e 607º, nº 3 do CPC, aplicáveis, com as devidas adaptações, ex vi do artigo 2°, alínea e) do CPTT, que sobre o juiz impende o dever de declarar quais os factos que o tribunal julga provados e não provados, fundamentando a decisão sobre a matéria de facto, devendo especificar os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, analisando criticamente as provas. Exige-se assim, por um lado, a análise crítica dos meios de prova produzidos e, por outro, a especificação dos fundamentos que foram decisivos para alicerçar a convicção do juiz, expressa na resposta positiva ou negativa dada à matéria de facto relevante e/ou controvertida. Nas palavras de Pereira Baptista, in Reforma do Processo Civil; 1997, págs. 90 e seguintes, "Não se trata, por conseguinte, de um mero juízo arbitrário ou de intuição sobre a realidade ou não de um facto, mas de uma convicção adquirida através de um processo racional; alicerçado - e, de certa maneira, objectivado e transparente - na análise criticamente comparativa dos diversos dados trazidos através das provas e na ponderação e maturação dos fundamentos e motivações essencialmente determinantes da opção feita e cuja enunciação, por exigência legal, representa o assumir das responsabilidades do julgador inerentes ao carácter público da administração da Justiça". O exame critico da prova consiste, pois, na indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz e na sua apreciação crítica, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido decidido e não noutro. Ou seja, a fundamentação de facto não se deve limitar à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre os pontos da matéria de facto pertinentes. Deste modo, quando subjacente à matéria provada estão meios de prova, cujo valor é objectivo, como sucede maioritariamente com a prova documental, será suficiente a indicação dos respectivos documentos, todavia "sem prejuízo da necessidade de fazer uma apreciação crítica, quando for questionável o valor probatório de algum ou alguns documentos ou existirem documentos que apontam em sentidos contraditórios" (cf. Jorge Lopes de Sousa, in ob cit., pág. 321). No que concerne ao núcleo essencial da arguição da Recorrente, urge ter presente que só se verifica a nulidade em apreço quando ocorre a falta absoluta de fundamentação — neste sentido e sobre esta questão vide entre outros o acórdão do STA de 16.11.2011, proferido no Proc. nº 0802/10, sendo que, tal como alude o Prof. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 140 "há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.". Para dilucidar a questão em apreço fazemos, ainda, apelo, entre outros, ao acórdão do TCA Sul, de 04.12.2012, proferido no Recurso nº 06134/12, que por adesão à sua idónea fundamentação, aqui se transcreve: “(..) Nos termos do preceituado no citado art. 668, al. b), do C. P. Civil, é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.art"659, n".3, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação. (...)”. Impende, assim, sobre o juiz, relativamente à factualidade julgada pertinente o dever de discriminar na sentença os factos provados e os não provados, assim como os elementos de prova com base nos quais formou a sua convicção. Ora, a indicação dos elementos de prova consiste na exteriorização das razões pelas quais o julgador se decidiu num sentido e não noutro, sendo que, a maior ou menor exigência dessa indicação depende, sobretudo, dos meios de prova que estejam em causa. In casu, brande a Recorrente em defesa da sua posição a alegação em suma de que a sentença “(...) é omissa já que em momento algum na parte 3.1. Matéria de facto dada como provada esses factos são identificados, Efetivamente e nos termos alegados nunca em momento algum da parte 3.1. a DS identifica quais os factos relevantes para a decisão da causa a tomar que dá como provados.” e, mais alude que, a sentença “(...) não especifica os fundamentos de facto em que se baseia para nesta sede tomar a decisão que tomou”, pois que a mesma “limita-se a descrever as incidências da presente acção e das posições formuladas pelas partes correspondendo aquilo que corresponde ao relatório da DS e não aos facto dados como provados”. Neste conspecto e se bem lemos a sentença recorrida, nomeadamente no que concerne ao julgamento de facto, não só constatamos que o Juiz a quo iniciou a peça em sindicância pelo seu relatório, fixando o objecto, e de forma clara e perceptível, obedecendo aos cânones sobre a elaboração da sentença, passou a consignar na matéria assente os factos julgados provado e não provados, bem como identificou os elementos de prova de que se socorreu para formar a sua convicção, a que se sucedeu uma profícua e extensa motivação daquele julgamento de facto, pelo que somos de entendimento de que não padece a decisão a quo de nulidade por falta de fundamentação de facto que lhe é imputada. Questão diversa é determinar se os factos levados ao probatório são adequados e/ou suficientes para a decisão proferida nos autos, o que nos reconduz a um eventual erro de julgamento. Sem curar, por ora, do acerto ou desacerto da fundamentação em que atraca a decisão, certo é que a sentença recorrida tem nela plasmada a respectiva fundamentação. Assim sendo, cumpre considerar que o tribunal a quo satisfez a exigência ínsita n.º 1 do artigo 125º do CPPT (154º, 195º e 615º n.º 1 al. b) do CPC – na tese da Recorrente), e nessa medida, não se verifica a arguida nulidade, uma vez que, na decisão recorrida, o julgador a quo especifica os fundamentos de facto da decisão, fazendo o exame crítico da prova documental e testemunhal carreada para os autos. Improcede, pois, a nulidade assacada em apreço. Da obscuridade e ambiguidade Alega, outrossim, a Recorrente que a sentença é nula por obscuridade e ambiguidade – artigo 615º, n.º 1 al. c) do CPC, afiançando que “(...) em sede da parte dispositiva da DS no que refere aos factos dados como provados inclui vários pontos que consubstanciam contradições entre o conteúdo dos vários pontos dados como provados – V. pontos 12, 14, 18 em total contradição com o teor do ponto 22 – que determinam que a DS aqui recorrida padeça de ambiguidade e se tome obscura em relação aos factos dados como provados.” Vejamos. Nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, “é nula a sentença quando: (…) ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.”. De acordo com a jurisprudência reiterada do Supremo Tribunal de Justiça, e nas palavras do acórdão de 31.03.2022 (proc. n.º 812/06.1TBAMT.P1.S1), “não é qualquer ambiguidade ou obscuridade que provoca a nulidade da sentença, mas apenas aquela que torna a decisão ininteligível.”, sendo que “a ininteligibilidade relevante para efeito do art. 615.º do CPC é a da decisão da causa e não a mera ininteligibilidade de um argumento utilizado no percurso decisório.”. Por outro lado, “a ambiguidade ou a obscuridade prevista na al. c) do n.º 1 do art. 615.º só releva quando torne a parte decisória ininteligível e só torna a parte decisória ininteligível quando um declaratário normal, nos termos dos arts. 236.º, n.º 1, e 238.º, n.º 1, do CC, não possa retirar da decisão um sentido unívoco, mesmo depois de recorrer à fundamentação para a interpretar” (acórdão do STJ de 20.05.2021, proc. n.º 69/11.2TBPPS.C1.S1). No caso dos autos, não se verifica qualquer ambiguidade, obscuridade da decisão. Numa tentativa de alcançarmos alguma ambiguidade, estamos cientes que a Recorrente confunde a nulidade invocada com um eventual erro de julgamento. Pois, no fundo, atendendo ao recurso no seu todo, a mesma discorda da apreciação dos factos realizada pelo Tribunal a quo, considerando que o mesmo não deveria ter considerado provada o teor do RIT enquanto facto, ou por outro lado, que não deviam ter sido conduzidos ao probatório elementos determinantes constantes do processo administrativo e que corresponde a diligências probatórias realizadas no âmbito do procedimento inspectivo, como é a transcrição das declarações da testemunha inquirida naquela sede, vide item 12. do probatório. Mais não se compreende nem se descortina qualquer ambiguidade ou obscuridade nos factos que mais não são do que as respostas apresentadas pela aqui Recorrente no âmbito do procedimento inspectivo e que, nos seus exactos termos, assim são transcritos. E, por último o item 18 do probatório que transcreve a fundamentação constante do RIT, que permite a sindicância da correcção e, consequentemente, da liquidação impugnada. Ora, tal vício, a verificar-se, só o conseguimos conceber em sede de erro de julgamento e não enquanto nulidade como arguida, pois lidos os itens do probatório em apreço, não se identifica na transcrição que os mesmos comportam qualquer ininteligibilidade ou obscuridade entre si. Conclui-se, assim, pela não verificação da invocada nulidade por ambiguidade ou obscuridade do julgamento de facto. 2.2.2. Do erro de julgamento de facto Da leitura conjugada a alegação de recurso e respectivas conclusões, alcançamos depreender que a Recorrente imputa à sentença recorrida erro de julgamento de facto. Se bem interpretamos, na óptica da Recorrente, o Tribunal a quo procedeu a uma errónea valoração da prova produzida nos autos, designadamente da prova testemunhal, porquanto dessa prova produzida resultou demonstrado que já no ano de 2000 a Recorrente já tinha instituído a prática de adiantar valores aos seus colaboradores para fazer face às despesas e que, bem assim, “em 31 de Dezembro do ano de 2000, a «Associação .............» tem contabilizados como saldo de caixa o valor de 644.037,40 que corresponde ao saldo efetivo (...)” Defende a Recorrente, que os depoimentos das testemunhas ouvidas nos autos, cujo excerto transcreveu nas suas alegações, em conjugação com os demais elementos constantes dos autos, contrariam a conclusão extraída pela AT, sufragada pela sentença, pelo que os factos dados como não provados 1. e 2. devem ser eliminados e transpostos nos termos e com a redacção que propõem para os facto provados, nos seguintes termos: a) Em 2000, a «Associação .............» já tinha instituído totalmente a prática de adiantamentos de valores aos seus colaboradores para fazer face às despesas - facto implícito no depoimento da 1º e 2º testemunha e nos artigos 15º 24º, 26º da p.i.; b) Em 31 de Dezembro do ano de 2000, a «Associação .............» tem contabilizados como saldo de caixa o valor de 644.037,40 que corresponde ao saldo efetivo c) Valor proveniente de subsídios, propinas e donativos, que constituindo os proveitos da «Associação .............», a sua existência e proveniência não foi aliás, posta em causa. d) E que esse valor era movimentado pelos membros da direcção da «Associação .............» e pelos seccionistas da mesma e afectos aos fins por eles definidos dentro dos objectivos e fins a prosseguir pela mesma. e) Os adiantamentos aos colaboradores da associação configuraram despesas dos anos seguintes - facto implícito nos artigos 16º, 32º da p.i. Apenas um esclarecimento quanto ao alegado no ponto E. das conclusões, a qual não pode ser atendido, pois confunde a Recorrente matéria de facto com a motivação que sucede à mesma, ao pretender que seja eliminado do “probatório” o excerto que transcreve de fls. 16 da sentença que se insere, como já referimos, à densa motivação. A modificação quanto à valoração da prova, tal como foi captada a apreendida pela 1ª instância, só se justificará se, feita a reapreciação, for evidente a grosseira análise e valoração que foi efectuada na instância recorrida, importando, porém, não desprezar que o julgamento pelo tribunal a quo dispõe de um universo de elementos não apreensíveis em sede de recurso e que, naturalmente, são decisivos para o processo intimo de formulação da convicção do julgador, devendo o tribunal de recurso usar com cautela os seus poderes substitutivos de apreciação da prova livre como é a prova testemunhal. De acordo com o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no nosso sistema processual, o juiz forma a sua íntima convicção acerca de cada facto, a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova disponíveis no processo e de acordo com as regras da experiência da vida e da lógica comum; apenas quando a lei exija para prova de determinado facto uma formalidade especial, um especifico meio de prova, é que não vigora o princípio da live apreciação [cf. Prof. Alberto dos Reis, in ob cit, IV, pág. 566 e ss.; Antunes Varela e outros, in Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, 1985, pág. 660 e ss.] Daí que, de acordo com o entendimento jurisprudencial prevalecente, “o controle da Relação [leia-se, Tribunal Central Administrativo] sobre a convicção alcançada pelo tribunal da 1ª instância deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, sendo certo que a prova testemunhal é, notoriamente, mais fiável do que qualquer outra, e na avaliação da respectiva credibilidade tem que reconhecer-se que o tribunal a quo, pelas razões já enunciadas, está em melhor posição”, in acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04.11.2013, proferido no âmbito do processo n.º 866/11.9TVPRT.P1. Atento o que vimos de dizer, a verdade é que este Tribunal ad quem não encontra razões bastantes para a alterar a factualidade dada como provada e não provada pelo Tribunal a quo. Estando em causa os depoimentos das testemunhas, que a Recorrente sustenta não terem sido valorizados pelo tribunal a quo e que contrariam a posição da AT, procedemos à reapreciação da prova testemunhal referida pela Recorrente e cujos excertos foram devidamente transcritos nas alegações de recurso. Ora, quanto aos factos dados como não provados pelo Tribunal a quo, e que a Recorrente defende ter ficado provado com base no depoimento das testemunhas «EE» e «OO», afigurasse-nos que, a tese avançada pelos mesmos sem qualquer contextualização e precisão e demais elementos que sustentem as afirmações vagas e genéricas sobre os adiantamentos aos seccionistas de despesas e de que já no ano de 2000 era provável que aqueles ocorressem para cobrirem despesas vindouras, é muito pouco sustentada e convincente, sendo tais depoimentos, por si só, e no contexto em causa, manifestamente insuficientes para suportar essa tese e a pretensão da Recorrente. No mais, como ficou afirmado na motivação da decisão de facto, para a qual se remete atenta a sua consistência e clareza de exposição, apesar dos depoimentos das testemunhas «EE», «OO» terem sido consideradas credíveis, certo é que o Tribunal a quo dá nota da existência de contradições que abalam a coerência dos mesmos para atestarem a tese proclamada pela Recorrente, mormente reportando-se o ao depoimentos de «PP» e da funcionária «AA» conforme auto de declarações no âmbito do procedimento inspectivo (vide item 12. do probatório), para concluir que “(...) o depoimento das testemunhas acima mencionadas não faz prova cabal dos factos sobre os quais incidiram, nem conduz à certeza de que no ano de 2000 a «Associação .............» passou a adiantar dinheiro aos seus colaboradores para fazerem face às suas despesas.” e que apesar de se puder considerar que a Recorrente “terá tentado alterar a sua forma de gestão” a mesma não estava instituída de pleno no ano de 2000. Em suma, face ao teor da prova produzida nos autos, concorda-se com a valoração da matéria de facto provada e não provada feita na sentença recorrida, acolhendo-se o respectivo probatório. Mais acresce que na presente situação a prova testemunhal seria relevante para sedimentar um eventual procedimento que adviesse da correlação das despesas alegadas com determinados documentos que as suportassem, o que de todo não foi objecto de inquirição, aliás saliente-se a ausência de concretização temporal das menções a que se aludem as considerações avançadas pelas testemunhas. Assim sendo, o Tribunal de 1ªinstância não incorreu em qualquer erro na apreciação e valoração da prova produzida nos autos quando, nos termos que vimos de referir, não deu como provados os factos pretendidos pela Recorrente, improcedendo, consequentemente, o alegado erro de julgamento de facto. 2.2.3. Do erro de direito Estabilizada a matéria de facto, prossegue o Recorrente insurgindo-se contra o decidido, ancorado na alegação em síntese, que “(...) Partindo assim desta nova base factual e efectuando o correcto enquadramento jurídico dos factos relevantes na presente acção à luz do artº 4º/2 do Dec-lei 192/90 de 9 Junho com a redacção da Lei 3-B12000. O valor de € 44.037,40 identificado na contabilidade da «Associação .............» no ano de 2000 como saldo de caixa no dia 31.12.2000. Corresponde ao saldo de caixa real e efetivo da «Associação .............» nos finais do ano de 2000 e não corresponde a despesas não documentadas da «Associação .............» do ano de 2000, não há assim lugar a qualquer liquidação autónoma (...)”. Na medida em que a decisão da matéria de facto se mantém, estabilizada, não tendo sido alterada a matéria vertida nos factos não provados, nenhuma outra questão se mostra suscitada à apreciação deste Tribunal. A questão de direito, incluído a questão sobre os juros, está colocada de forma conclusiva e totalmente dependente da alteração da matéria de facto, que não ocorreu, por improcedência do recurso nessa parte. Nesta conformidade, restará negar provimento ao recurso e manter na ordem jurídica a sentença recorrida. 2.3 Conclusões I. A nulidade da sentença por falta de fundamentação nos termos do disposto no n.º 1 do citado artigo 125º do CPPT e 615º n. º1 al. b) do CPC abrange quer a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo artigo 123º, n.º 2 do CPPT, quer a falta do exame crítico das provas, previsto no artigo 607º, n. º4 do CPC. II. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia a nulidade por falta de fundamentação é necessário que a mesma seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. III. A ambiguidade ou obscuridade que possam ocorrer na sentença só integrarão a nulidade decisória prevista, na alínea c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, se algum desses vícios tornarem a decisão incompreensível, por inacessível intelectualmente, impedindo a compreensão da decisão judicial por fundadas dúvidas ou incertezas. IV. A ambiguidade só relevará se vier a redundar em obscuridade, ou seja, se for tal que do respetivo texto ou contexto não se torne possível alcançar o sentido a atribuir ao passo da decisão que se reclama de ambíguo, no caso o julgamento de facto. V. Impugnada a decisão da matéria de facto com base em meios de prova sujeitos à livre apreciação, com cumprimento dos requisitos previstos no artigo 640º do CPC, cabe ao tribunal de recurso reapreciar esses meios de prova e ponderar na decisão da matéria de facto a convicção que formar, nos termos do artigo 662º do CPC 3. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso. Custas a cargo da Recorrente. Porto, 21 de março de 2024 Irene Isabel das Neves Carlos de Castro Fernandes Margarida Reis |