Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00796/13.0BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/15/2025
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:IRENE ISABEL GOMES DAS NEVES
Descritores:INEPTIDÃO DA PETIÇÃO;
QUESTÃO NOVA; VALOR DA CAUSA;
ARTIGO 97º - A, AL. B) DO CPPT;
Sumário:
I. A ineptidão da petição inicial não pode ser suscitada como questão nova em sede de recurso, pois, embora se trate de questão de conhecimento oficioso, esse conhecimento só pode ter lugar até ao despacho saneador, ou, se não houver tal despacho, até à sentença final.

II. Quando não tenha havido liquidação (no sentido de imposto a pagar) ou o imposto liquidado não seja impugnado, o valor da causa é igual ao valor contestado da fixação da matéria tributável.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1. RELATÓRIO
1.1. A [SCom01...] ACE, (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, datada de 19.10.2020, que julgou verificada a exceção dilatória de inimpugnabilidade do acto de liquidação adicional de IRC referente ao período de tributação de 2011, e, em consequência, absolveu a Fazenda Pública da instância, inconformada veio dela recorrer.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«(…)
i) De acordo com o disposto no art.º 186.º/1 do C. P. Civil é nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial, considerando-se esta inepta “Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir – alínea a) do seu n.º 2. Sendo também inepta a petição “quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir” – alínea b) da citada disposição legal.
ii) Quanto ao acto impugnado o que se verifica é uma completa ausência de causa de pedir face ao apuramento e liquidação das tributações autónomas, pelo que, a PI deveria ter sido julgada inepta e, consequentemente nulo o processo nos termos do art.º 186º, n.º 1 do CPC.
iii) O acto de liquidação em causa tem o valor de 168.88€, correspondendo este à utilidade económica do pedido e o mesmo é dizer ao montante de imposto impugnado e já liquidado, ou seja, a quantia certa e líquida que na procedência da impugnação o impugnante deixará de pagar ou lhe será devolvida e não.
iv) A impugnante não impugnou o valor das correcções à matéria colectável e por consequência, o valor da causa, não equivale ao montante de imposto que poderá hipoteticamente deixar de pagar com a procedência da impugnação, porque tal montante apenas representa uma utilidade económica futura e hipotética, dado que a posterior utilização, para efeitos fiscais, dos montantes corrigidos está dependente da produção de factos e circunstâncias contingentes, imprevisíveis e incertas por natureza.
Termos em que e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogar-se a sentença recorrida, considerando-se inepta a petição inicial e nulo o processo nos termos do art.º 186º, n.º 1 do CPC e bem assim fixar-se como valor do mesmo a quantia de 168.88€, com as legais consequências.»
1.2. A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira, notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.
1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 754 e ss. do SITAF, pugnando pela improcedência do recurso.
1.4. Na sequência do convite que lhe foi dirigido, a Recorrente veio apresentar correção às conclusões transcritas no ponto 1.1., nos termos seguintes que aqui se deixam:
«(...) v) Mostra-se violado o art.° 97°-A, n.° 1, al. a) do CPPT.»
1.5. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
1.6. Delimitação do objecto do recurso - Questões a decidir:
As questões suscitadas pela recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões (vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT) são as de saber se a sentença recorrida incorreu errou ao fixar o valor da acção em € 354.972,01.
Quanto ao mais alegado e que corresponde às conclusões i) e ii), da invocação da nulidade de todo o processado por ineptidão da petição inicial, não pode este Tribunal ad quem conhecer, senão vejamos.
O objecto do recurso é delimitado pelas suas conclusões (cfr. artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC), sem prejuízo da apreciação por parte do tribunal ad quem de eventuais questões que se coloquem de conhecimento oficioso.
Os recursos ordinários “destinam-se a permitir que o tribunal hierarquicamente superior proceda à reponderação das decisões recorridas”, estando em causa questões que já foram “objecto de decisão, tratando-se apenas de apreciar a sua manutenção, anulação, alteração ou revogação”.
Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando (…) estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis”.
Portanto, porque o recurso é um “meio de impugnação de uma anterior decisão judicial”, o mesmo “apenas pode incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas”.
Estas “não podem ser apreciadas no recurso, quer em homenagem ao princípio da preclusão, quer por desvirtuarem a finalidade dos recursos, pois estes destinam-se a reapreciar questões, e não a decidir questões novas, por tal apreciação equivaler a suprimir um ou mais órgãos de jurisdição”.
Excepcionam-se, como já se referiu, as questões que sejam de conhecimento oficioso, “desde que a sua decisão não esteja coberta pelo caso julgado”, como o serão, por exemplo, a inconstitucionalidade, a existência de excepções dilatórias, a nulidade ou a caducidade em caso de direitos indisponíveis (cfr. Recursos em Processo Civil, António Santos Abrantes Geraldes, Almedina, 2022, 7ª edição actualizada, págs. 30 e 139 a 142).
No caso, a Recorrente levanta no seu recurso uma questão que não foi apreciada na primeira instância, não tendo sido sequer aí levantada, nomeadamente pela AT na sua contestação e/ou em qualquer momento posterior: a ineptidão do requerimento inicial por falta de causa de pedir. Aliás nem se vislumbra, como tal podia ocorrer, pois estaríamos perante um venire contra factum proprium, mas ainda assim, se diga, que em sede de alegações pré sentenciais tal hipótese não foi avançada pela Recorrente, mesmo após ter sido notificada da eventual ocorrência de inimpugnabilidade do acto
Apesar de se tratar de uma questão nova, poder-se-ia pensar que a mesma poderia ser conhecida por este tribunal de recurso, por se tratar de questão de conhecimento oficioso, nos termos dos artigos 186º e 196º do CPC.
Sucede, porém, que, no caso, já se mostra ultrapassado o momento em que poderia haver lugar a tal conhecimento oficioso.
Com efeito, dispõe o artigo 200º do CPC., sob a epígrafe “Quando deve o tribunal conhecer das nulidades”:
“1 - O juiz conhece das nulidades previstas no artigo 187.º, na segunda parte do n.º 2 do artigo 191.º e no artigo 194.º logo que delas se aperceba, podendo suscitá-las em qualquer estado do processo, enquanto não devam considerar-se sanadas.
2 - As nulidades a que se referem o artigo 186.º e o n.º 1 do artigo 193.º são apreciadas no despacho saneador, se antes o juiz as não houver apreciado; se não houver despacho saneador, pode conhecer-se delas até à sentença final.
3 - As outras nulidades devem ser apreciadas logo que sejam reclamadas.”
Desta norma resulta que a nulidade decorrente da ineptidão da petição inicial, ainda que de conhecimento oficioso, não pode ser conhecida pelo tribunal a todo o tempo, mas apenas no despacho saneador, quando a forma processual o comporte, ou, não havendo lugar a despacho saneador, até à sentença final.
No caso, portanto, a questão em causa só poderia ter sido conhecida até à sentença final (visto que não houve lugar a despacho saneador), e já não em sede de recurso.
Donde, estando em causa uma questão nova e tendo já passado o momento em que a mesma poderia ser conhecida oficiosamente, tal questão não pode ser conhecida por este Tribunal de recurso.
Ainda assim, sempre se dirá que a arguição da referida ineptidão não poderia proceder, atento o disposto no artigo 186º, nº 3, do CPC, segundo o qual a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial, o que sucedeu no caso, como discorre da contestação da AT.
Como quer que seja, atento o supra referido, vedado está o conhecimento desta questão em sede de recurso.
Pelo que, nesta parte, como já se vaticinou, não se conhece do objecto do recurso.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 De facto
2.1.1 Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«1) A Impugnante é um agrupamento complementar de empresas com sede no Parque 1..., Avenida ..., ..., em ..., que tem como objeto principal “a utilização e exploração de estabelecimentos de restauração ou afins, bem como a manutenção, limpeza e segurança no Parque 1... em ...” (cf. estatutos do ACE junto a fls. 49 a 55 do processo administrativo tributário – doravante PAT – em apenso);
2) Os encargos do ACE são fruto da contribuição das suas sociedades agrupadas [SCom02...], Lda., na proporção de 25%, [SCom03...] Unipessoal, Lda., na proporção de 50% e [SCom04...], Lda., na proporção de 25%, sendo os resultados obtidos no apuramento das contas suportados por as referidas sociedades de acordo com as também referidas percentagens (cf. estatutos do ACE junto a fls. 49 a 55 do PAT em apenso);
3) Em cumprimento da ordem de serviço n.º ...41, foi a escrita do [SCom01...], ACE objeto de inspeção externa, de âmbito geral, pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças ..., abrangendo os exercícios de 2009 a 2012 (cf. ordem de serviço junta a fls. 56 do PAT em apenso e relatório final de inspeção junto a fls. 161 a 190 do mesmo suporte);
4) Em resultado da ordem de serviço melhor identificada no ponto precedente, foi elaborado Relatório Final de Inspeção em que se propunham correções meramente aritméticas, em sede de IRC, nos valores de € 353.375,25, € 368.860,80 e € 354.972,01, relativamente, respetivamente, aos exercícios de 2009 a 2011, e correções, em sede de IVA, do ano de 2009, no montante de € 42.151,91, o qual mereceu a concordância da Diretora de Finanças Adjunta ..., por despacho de 12 de abril de 2013, e de cujo teor se destaca, além do mais, o seguinte (cf. relatório final de inspeção junto a fls. 161 a 190 do PAT):
“(…) I.3. Descrição Sucinta das Conclusões da Ação de Inspeção
(…) I.3.2. - IRC - Correções à matéria coletável
Também foram detetadas omissões de proveitos em infração ao art.º 20.º do CIRC, cujos valores foram apurados por recurso a métodos indiretos, nos termos do art.º 57° do mesmo diploma, conforme exposto no capítulo V do presente relatório, e ainda a falta de correção de custos não aceites nos termos do art.º 45° do CIRC (correspondente ao art.º 42° na redação do CIRC em vigor em 2009), conforme exposto no ponto III.1 (correções técnicas), que resultaram nas seguintes correções ao resultado fiscal:
Descrição200920102011Totais
Resultado fiscal declarado30.650,22-49.645,345.368,97-13.626,15
Correções técnicas2.109,116.875,993.282,0212.267,12
Correções por métodos indiretos351.266,14361.984,81351.689,991.064.940,94
Correções totais353.375,25368.860,80354.972,011.077.208,06
Resultado fiscal corrigido384.025,47319.215,46360.340,981.063.581,81
O lucro tributável apurado é imputável aos membros do agrupamento, nos termos do art.º 6.º do CIRC, dos Estatutos do ACE e das atas de assembleias gerais, nos seguintes montantes:
NIFDenominação200920102011
%Valor%Valor%Valor
...80[SCom02...], Lda.25%88.343,8125%92,215,2025%88.743,00
...01 [SCom03...], Unip. Lda.25%88.343,81 50%184.430,4050%177.486,01
...18 [SCom05...], SA 25%88.343,81 25%92.215,20 25%88.743,00
...74 [SCom06...], Lda 25%88.343,810%0,000%0,00
Totais100%353.375,25100%368.860,80100%354.972,01
II. Objetivos, âmbito e extensão da ação inspetiva
II.I. Credencial e período em que decorreu a ação
Ação realizada em cumprimento da ordem de serviço número ...41, iniciada em 2012/04/18 e terminada em 2013/03/08.
Foi notificada em 2012/09/17 a ampliação do prazo de conclusão da ação por 3 meses, quando se aguardavam dados do sujeito passivo. Em 2012/12/07, foi notificada nova ampliação de 3 meses, motivada pela complexidade e demora na análise dos dados Informáticos.
II.2. Motivo, âmbito a incidência temporal
Desencadeada por despacho da Direção de Finanças ..., teve âmbito geral relativamente aos exercícios de 2009 a 2011 e abrangeu IVA dos períodos de 200901 a 201209.
II.3. Empresa
A firma tem a natureza jurídica de Agrupamento Complementar de Empresas (ACE), com o capital próprio de 50.000 euros, com a participação dos agrupados:
[SCom02...], NIF ...80 - 25%;
[SCom03...] UNIPESSOAL, LDA, NIF ...01 - 50%;
[SCom04...], LDA, NIF ...18 - 25%.
Até 2010/02/09, também fazia parte do Agrupamento a sociedade [SCom06...], LDA - NIF ...74, sendo então as participações no capital de 25% cada agrupado.
O objeto principal inscrito nos estatutos é a utilização e exploração de estabelecimentos de restauração ou afins, bem como a manutenção, limpeza e segurança do Parque 1... em ....
Na realidade explora 4 estabelecimentos de alimentação e bebidas, todos localizados no referido Parque 1... em ..., que são:
- Café "estabelecimento 1" que designamos abreviadamente por estabelecimento 1;
- Bar "estabelecimento 2" que designamos abreviadamente por estabelecimento 2;
- Restaurante "estabelecimento 3" que designamos abreviadamente por estabelecimento 3;
- estabelecimento 4 "estabelecimento 4" que designamos abreviadamente por estabelecimento 4.
O café já funcionou com o nome "A..." e o restaurante também já teve o nome de B....
Os serviços prestados são documentados por talões e vendas a dinheiro (VDs) emitidos por computador.
Segundo as informações que obtivemos, o controlo de receitas e de caixa é feito pela gerência, sem nos ter sido facultada qualquer evidência documental desse controlo. As vendas/serviços são contabilizadas apenas com base em resumos mensais.
II.4 Acção
A ação foi iniciada com conferência de caixa na estabelecimento 3, em dia e hora de pouco movimento, sem se constatarem divergências.
A maior parte do trabalho de inspeção envolveu a análise de ficheiros informáticos, apenas parcial, pois a empresa só facultou dados a partir de junho de 2010, tendo declarado perda dos anteriores. Desta análise, e especialmente do confronto entre consumos e registos de vendas, resultaram evidências de omissões que, entre outros fundamentos, sustentam as propostas de correção.
(…) IV. Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indiretos
IV.1 Contabilidade não reflete movimentos e saldos de caixa
Durante a ação verificámos que o controlo de caixa efetuado diariamente nos 4 estabelecimentos não fica evidenciado na contabilidade: não há qualquer folha de caixa, ou outro meio, com registos de saldos inicial e final e de fluxos de entradas e saídas.
A contabilização dos proveitos é efetuada com base num resumo mensal informático, sem qualquer possibilidade de podermos aferir a sua concordância com os valores efetivamente recebidos.
Quando verificamos os extratos da conta caixa, constatamos que chega a apresentar valores impossíveis (negativos) e que geralmente apresenta montantes demasiado elevados para a realidade verificada.
Saldos em caixa
DataValor
Abertura 200931.897,71
2009 - 01 - 3126.227,99
2009 - 02 - 2845.947,78
2009 - 03 - 3126.731,7 7
2009 - 04 - 30 29.853,67
2009·05 - 3155.703,34
2009 - 06 - 3061.196,20
2009 - 07 - 3160.689,40
2009 - 08 - 3178.849,64
2009 - 09 - 3057.823,05
2009 - 10 - 3160.666,91
2009 - 11 - 3061.034,59
2009 - 12 - 3132.653,62
2010 - 01 - 3125.544,87
2010 - 02 - 2818.984,22
2010 - 03 - 3113.703,73
2010 - 04 - 3044.441,39
2010 - 05 - 3168.762,18
2010 - 06 - 3047.124,63
2010 - 07 - 3160.670,21
2010 - 08 - 3143.624,92
2010 - 09 - 3021.218,80
2010 - 10 - 319.958,46
2010 - 11 - 3021.460,01
2010 - 12 - 3111.674,78
2011 - 01 - 31- 7.886,56
2011 - 02 - 284.935,85
2011 - 03 - 31- 3.910,31
2011 - 04 - 3013.281,19
2011 - 05 - 3117.540,35
2011 - 06 - 3017.951,49
2011 - 07 - 3142.041,02
2011 - 08 - 3118.460,24
2011 - 09 - 3046.369,68
2011 - 10 - 3147.904,34
2011 - 11 - 3024.739,62
2011 - 12 - 3123.141,47
Como todos os lançamentos contabilísticos são feitos com data de final de mês, é só no último dia de cada mês que podemos verificar o saldo contabilístico. Os saldos evidenciados no final de cada mês são:
Refira-se que a acção foi iniciada com controlo de caixa no restaurante “estabelecimento 3", em que se verificou que o saldo em caixa que transita de um dia para o seguinte é € 115,00. Nos restantes estabelecimentos fomos informados que os saldos efectivos de caixa são: estabelecimento 4 € 300,00; o estabelecimento 2 tem duas caixas com o saldo de € 200,00 cada e o estabelecimento 1 também tem 2 caixas com o saldo de € 200,00 cada.
Portanto, pelas informações que obtivemos, após o fecho de cada dia, só fica em caixa o montante de € 1.015,00 no conjunto dos 4 estabelecimentos, o que é um valor muito diferente dos saldos evidenciados na contabilidade e expostos na relação supra.
IV.2 Falta de conservação de registos informáticos e documentos
Ao procurarmos o registo de duas consultas de mesa - anexo I - não pudemos confirmar se as mesmas integram os proveitos contabilizados, porque não constam nos ficheiros que nos foram facultados - registos a partir de junho/2010 - e antes desta data não há registos informáticos nem cópias dos documentos emitidos.
Os ficheiros informáticos facultados apenas abrangem o período a partir de junho/2010, com a justificação de que nessa data foi instalado novo sistema informático, por avaria e obsolescência do anterior. Ora o sujeito passivo é obrigado a conservar os registos por 10 anos, conforme art.º 123° do CIRC, e, se o sistema informático foi substituído, teria de conservar as respetivas cópias de segurança, o que não nos foi facultado.
A empresa não nos facultou ficheiros completos das vendas: nem os duplicados dos documentos emitidos.
Portanto, não foi possível comprovar que o valor das referidas consultas de mesa estejam contabilizados.
IV.3 – Alterações nos registos informáticos/omissão de documentos
No início da acção foram solicitados ficheiros informáticos, designadamente o SAFT e a base de dados da faturação. O S.p. facultou primeiro o SAFT, extraído a 21 de abril de 2012, mas, como vinha separado em ficheiros mensais, pedimos que nos fosse facultado em ficheiros anuais.
Assim, em 3 de maio, foram-nos facultados a base de dados da faturação e os ficheiros SAFT, (tendo falta dos movimentos até junho de 2010, conforme já referido).
Na análise efetuada a tais ficheiros, suscitou dúvidas quanto aos últimos dias que os mesmos contemplavam. Perante estas dúvidas, foram solicitados novos ficheiros SAFT de 2012, que nos foram entregues em 2 de agosto.
Na análise aos ficheiros informáticos foram detetadas faltas de alguns documentos de forma que os valores constantes dos ficheiros SAFT e da contabilidade são inferiores aos documentos de venda efetivos, constantes das bases de dados.
Dos ficheiros, dias e estabelecimentos em que foi possível efetuar o controlo entre as vendas constantes da base de dados e as que foram exportadas para o SAFT, fizemos o seguinte resumo das divergências:
EstabelecimentoDataBase DadosSAFTDiferença% SAFT
estabelecimento 426 - 04 - 201282,0039,1042,90109,7%
estabelecimento 326 - 04 - 20121.237,90 1.152,6985,217,4% .
estabelecimento 327 - 04 - 20123.169,26 3.005,65- 163,615,4%
estabelecimento 328 - 04 - 20122.174,721.648,08- 526,6432,0%
estabelecimento 329 - 04 - 2012283,50283,50283,500,0%
estabelecimento 330 - 04 - 20121.016,00780,80- 235,2030,1%
estabelecimento 301 - 05 - 20121.178,841.074,54- 104,309,7%
estabelecimento 227 - 04 - 20122.516,501.982,3226,9%
estabelecimento 228 - 04 - 20122.192,001.651,19- 540,8132,8%
estabelecimento 229 - 04 - 20121.191,201.191,200,000,0%
estabelecimento 230 - 04 - 20121.608,40 982,40-626,0063,7%
Tais divergências foram dadas a conhecer ao s.p. em setembro.
Na apresentação das divergências, foram-nos dadas explicações de perda de dados e "reposição parcial da base de dados a partir do backup online" pedida ao fabricante do software “Zone Soft”.
Essas explicações foram formalizadas numa carta do fornecedor "[SCom07...]-Unipessoal, Lda. - NIF ...89", recebida em 2012/10/10 (anexo II), e que contém incongruências, tais como no penúltimo parágrafo, quando afirma que "apenas as séries de documentos do tipo VD (venda a dinheiro) foram repostas", quando verificámos que também foram repostos “talões de venda”.
Para exemplificar o que afirmamos, pode-se constatar que o estabelecimento 2:
Faltam no SAFT, 85 talões de série 1L12042802 no dia 28/04/2012;
Estão todos os talões e VDs do dia 29;
Faltam todos os talões do dia 30 (26 da série 1L2043001 e 57 da série 1L12043002).
Estas divergências estão sintetizadas no quadro anterior.
Os artigos 40.º, 45.º, 46.º e art.º 52.º do CIVA obrigam à existência do duplicado dos documentos com base nos duplicados dos documentos emitidos.
Para além das justificações já referidas, e pretendendo explicar melhor as divergências apontadas, o s.p. entregou-nos, em outubro, informação da base de dados e do SAFT-PT, mas selecionou apenas os registos dos dias apontados com divergências, tanto num caso como noutro.
Estes ficheiros selecionados do SAFT e extratos da base de dados, logicamente não continham quaisquer divergências.
Como a auditoria contabilístico-fiscal é uma análise dinâmica, não pode assentar apenas em períodos de tempo ocasionais, mas sim em períodos definidos por lei - ano económico completo (ou em curso, até à data da extração), no caso do SAFT. Quanto à base de dados, deve ser integral (backup) e não alguns dos seus registos selecionados.
Por isso, notificámos em 24 de outubro para nos serem facultados novos ficheiros, tendo chegado a esta Direção de Finanças em 2012/11/09 um DVD contendo as bases de dados e novos ficheiros SAFT de 2012.
A análise destes últimos dados e a comparação entre os vários ficheiros facultados, foi aprofundada pelo Serviço de Planeamento, Gestão e Apoio à Inspeção (SPGAI), desta Direção de Finanças, cujas conclusões constam de informação que se anexa (anexo III), e que chegou à seguinte conclusão:
"As divergências encontradas entre os vários ficheiros de dados - Base de dados e SAFT ­extraídos em momentos diferentes, evidenciam divergências na base de dados, o que implica falha grave de coerência e integridade, impossibilitando resultados fiáveis e consequentemente detalhes igualmente fiáveis".
Por último destacamos que as divergências detetadas e reconhecidas pelo s.p., de haver dados na base de dados superiores aos do SAFT e consequentemente à contabilidade e às declarações, foi objeto de promessa, na nossa presença, de que seriam regularizadas, contudo, até final da ação, não nos foi dado conhecimento de qualquer regularização e as declarações periódicas do IVA de Abril e maio de 2012 não foram corrigidas.
IV.4 Omissões em vendas de vários produtos
Havendo fundadas dúvidas quanto à exaustividade de registo dos proveitos (consultas de mesa não confirmadas nos ficheiros, alteração de linhas de documentos, eliminação de documentos e ainda saldos de caixa negativos), efetuámos testes em alguns dos produtos em que é possível realizar o controlo entre consumos e vendas.
Esses testes foram efetuados abrangendo o exercício de 2011, pois é o único em que nos foram facultados os ficheiros informáticos das vendas do ano completo (SAFT), pelo que podemos ter em conta as existências iniciais e finais, sendo os cálculos apresentados nas alíneas a seguir.
IV.4.1 – Quantidades vendidas em “menus”
Sabe-se que parte das vendas dos artigos controlados nos itens seguintes é efetuada em "menus", termo que atribuímos aos casos em que o cliente adquire a refeição completa, sem discriminação dos componentes.
Nestas refeições completas pode estar incluído café e/ou cerveja a copo (exceto na estabelecimento 4) pelo que relacionamos a seguir as referências em que tal pode acontecer (estes dados são extraídos do SAFT 2011): (…)
Sabe-se que na prática nem todos os “menus”, ou refeições com tudo incluído, contêm café e também nem todos estes clientes pedem cerveja, por exemplo. Contudo, vamos considerar que os consumos destes produtos em tais menus é proporcional ao seu valor relativo dos serviços prestados em 2011 e que é:
EstabelecimentoData%
estabelecimento 43.481,09 0, 2 %
estabelecimento 375.735,084,3%
estabelecimento 26.847,220,4%
estabelecimento 18.847,650,5%
Total94.911,045,4%
Serviços Prestados 20111.767.286,32100%
É, portanto, de 5,4% do total a proporção incluída em menus, que vamos ter em conta para apurar divergências no controlo dos produtos (café e cerveja) nos pontos seguintes.
IV.4.2 Cerveja a copo
A cerveja vendida a copo é adquirida, em grande parte, em barris de 50 litros, mas também há aquisições em barris de 30 e de 20 litros e ainda a granel, consoante as qualidades.
Em 2011 apurámos um consumo total de 53.550 litros, o que representa o consumo médio diário de cerca de 146 litros, conforme números do quadro seguinte:
Consumo de cerveja em 2011
DescriçãoExistências IniciaisComprasExistências FinaisUnidades ConsumidasLitros por UnidadeLitros Consumidos
Sagres Barril 30L Branca11861330390,00
Sagres Barril 50L Branca79657636735033.650,00
Sagres Granel (hl)0930931009.300,00
Sagres Barril 30L Preta13911292302.760,00
Bohemía Barril 20L1210810110202.200,00
Heineken Barril 30L536041301.230,00
Guiness Barril 30L1013511134304.020,00
Totais1201.1381021.15653.550,00
As compras indicadas resultam de dados facultados pelos fornecedores, complementados por consultas à contabilidade, constando no anexo IV a relação das compras de 2011.
As vendas de cerveja constam dos quadros a seguir, distinguidos por qualidades e marcas e com indicação dos estabelecimentos e das quantidades em litros.
Vendas Sagres Barril Branca constantes do SAFT/2011
CódigoDescriçãoEstabelecimentoLitro / UnLitros
estabelecimento 2estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
162Sagres 0,202.689,942.689,940,20537,99
163Sagres 0,40873,86873,860,40349,54
187Sagres 0,2562.507,6144.915,54107.423,150,2526.855,79
188Sagres 0,504.424,544.424,540,502.212,27
909Sagres 0,401508,641.508,640,40603,46
956PINT SAGRES BRANCA10,0010,000,505,00
Totais66.932,153.563,8046.434,18116.930,1330.564,05

Vendas Sagres Preta constantes do SAFT/2011
CódigoDescriçãoEstabelecimentoLitro / UnLitros
estabelecimento 2estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
189Sagres PRT 0,252.934,712.706,865.641,570,251.410,39
190Sagres PRT 0,50130,00130,000,5065,00
910Sagres PRT 0,4097,9297,920,4039,17
955PINT SAGRES PRETA4,004,000,502,00
Totais3.064,710,002.808,785.873,491.516,56

Vendas Sagres Bohemia constantes do SAFT/2011
CódigoDescriçãoEstabelecimentoLitro / UnLitros
estabelecimento 2estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
166Sagres Bohemia 0,252.717,532.000,854.718,380,251.179,60
167Sagres Bohemia 0,50256,00256,000,50128,00
912Sagres Bohemia 0,40207,00207,000,4082,80
Totais2.973,530,002.207,855.181,381.390,40

Vendas Sagres Heineken constantes do SAFT/2011
CódigoDescriçãoEstabelecimentoLitro / UnLitros
estabelecimento 2estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
201Heineken 0,25854,961.354,002.208,960,25552,24
202Heineken 0,50149,98149,980,5074,99
911Heineken 0,4057,0057,000,4022,80
Totais1.004,90,001.411,002.415,94650,03

Vendas Sagres Guiness constantes do SAFT/2011
CódigoDescriçãoEstabelecimentoLitro / UnLitros
estabelecimento 2estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
191Guiness 0,254.877,514.877,510,251.219,38
192Guiness 0,503.089,023.089,020,501.544,51
Totais7.966,530,000,007.966,532.763,89
A cerveja a copo vendida, que apurámos nos quadros supra, soma o valor de €265.896,45, que representa 15% do valor declarado em serviços prestados em 2011 (€1.767.286,32).
Resumimos a seguir as quantidades que apurámos nos quadros acima, mas vamos acrescentar a percentagem calculada no ponto IV.4.1 de cerveja incluída em “menus”:
Consumos e vendas de cerveja a copo (em litros)
DescriçãoConsumosVendasDiferençasDif. %
ExplícitasMenusTotais
Sagres Branca43.340,0030.564,052.340,3632.904,4110.435,5931,17%
Sagres Preta2.760,001.516,56149.041.665,601.094,4065,7%
Sagres Bohemía2.200,001.390,40118,801.509,20690,8145,8%
Heineken1.230,00650,0366,42716,45513,5571,7%
Guiness4.020,002.763,89217,082.980,971.039,0334,9%
Totais53.550,0036.884,922.891,7039.776,6213.773,3834,6%
Portanto, considerando a cerveja a copo vendida com designação própria mais a percentagem de 5,4% (calculada no ponto IV.4.1) que atribuímos a consumos em “menus”, resulta uma falta de 34,6% relativamente ao consumo (existências iniciais + compras – existências finais).
V.4.3 Café
Pela análise das aquisições e dos inventários, apurámos o consumo de 1.286 quilos de café em 2011, que se resume no seguinte quadro:
Consumo de café 2011 (kg)
Exercícioestabelecimento 3[SCom08...]estabelecimento 4estabelecimento 1Totais
Exist. iniciais15381548116
Compras1895782123081.287
Exist. Finais15423030117
Consumo1895741973261.286
A relação das compras de 2011 consta no anexo V.
Partindo do princípio que um café vendido utiliza 7 gramas, conforme é indicado pela (Segafredo) na sua página da internet, cada kg dá 142,857 cafés. Assim, os 1,286 kg de café consumido deviam resultar em 183.71 4 cafés:
Cafés Possíveis (unid/kg): 142.857,14
Exercícioestabelecimento 3[SCom08...]estabelecimento 4estabelecimento 1Totais
201127.00082.00028.14346.571183.714
Todavia, pela análise das vendas no SAFT 2011, e acrescendo a percentagem incluída em menus, calculada no ponto IV.3.1, e aplicada sobre os "cafés possíveis" do quadro anterior, verificamos que apenas constam nas vendas 126.428 cafés:
Cafés Vendidos (SAFT)
Obtenção dos dadosestabelecimento 3[SCom08...]estabelecimento 4estabelecimento 1Totais
Explícito na designação9.753,6342.685,7035.268,0028.800,34116.507,67
Incluído em "Menus"1.458,004.428,001.519,712.514,869.920,57
Totais11.211,6347.113,7036.787,7131.315,20126.428,24
Para apurar as quantidades no quadro supra, foram consideradas as quantidades nas designações: 84 - Cappuccino, 100 - lrish coffee, 101 - Café refeição, 110 - Café, 111 - Café c/leite, 117 - Café c/natas, 135 - Café c/natas Grd e 157 - Café + nata. Às quantidades incluídas em menus foi aplicada a percentagem de 5,4%, calculada no ponto IV.4.1.
Assim, apura - se uma omissão de 57.286 cafés, correspondente a 45,3% dos cafés contabilizados, conforme quadros a seguir:
Diferença em números de cafés
Exercícioestabelecimento 3[SCom08...]estabelecimento 4estabelecimento 1Média
201115.78834.886-8.64515.25657.286
Diferença em números de cafés
Exercícioestabelecimento 3[SCom08...]estabelecimento 4estabelecimento 1média
2011140,8%74,00%-23,5%48,7%45,3%
Resta referir o peso do café no total dos serviços prestados: os cafés vendidos com designações explícitas, nas quantidades acima apuradas, segundo o SAFT, somam o valor de € 106.454,06, o que representa 6% dos serviços de 2011 (Serviços = € 1.767.286,32).
Contudo, tendo em conta o número de cafés incluídos em menus, os valores são superiores aos descritos, de acordo com o seguinte:
Valor dos cafés vendidos SAFT
Obtenção dos dadosOperaçãoestabelecimento 3[SCom08...]estabelecimento 4estabelecimento 1Totais
Valor explicito na designaçãoA8.651,2439.909,2929.037,2128.856,32106.454,06
Nº de cafés explícitosB9.753,6342.685,7035.268,0028.800,34116.507,67
Valor médio cafés explícitosC=A/B0,890,930,821,00
Nº Cafés incluídos em “Menus”D1.458,004.428,001.519,712.514,869.920,57
Valor incluído em “menus”E=CxD1.293,214.139,991.251,232.519,759.204,18
Totais valor CaféA+E9.944,4544.049,2830.288,4431.376,07115.658,24
Assim, considerando os cafés dos menus, o valor de vendas de café calculado acima (€ 115.658,24), já representa 6,5% dos serviços prestados (€1.767.286,32).
IV.4.4 - Pastelaria
De igual forma procedemos ao controlo de duas referências de pastéis, selecionadas por serem de relativamente fácil controlo e não sofrerem transformação, que, embora com peso insignificante sobre o total de serviços, vem confirmar omissões relevantes nos proveitos. Nos pastéis de nata, cujos registos no SAFT constam vendas isoladas e em conjunto "café + nata”, revela divergência de 54% sobre as vendas contabilizadas:
Pastéis de nata
Descrição 2011
Existências iniciais 192
Compras 3.120
Existências finais 288
Total consumido 3.024
Vendas 1.964
Diferença 1.060
% s/Vendas 54,0%
Refira-se que os pastéis de nata são adquiridos congelados, pelo que dificilmente haverá desperdícios por deterioração ou validade.
Nos bolos de arroz apura-se uma divergência que corresponde a 55,7% das vendas deste produto contabilizadas:
Bolo de arroz
Descrição 2011
Existências iniciais 45
Compras 825
Existências finais 62
Total consumido 808
Vendas 519
Diferença 289
% s/Vendas 55,7%
No conjunto, as duas qualidades de bolos têm contabilizado o valor de € 2.947,35, que representa 0,17% do total de serviços declarados.
IV.4.5 – Peixe
Procurámos, por último, testar o peixe confecionado, apresentando a seguir as quantidades de cherne, por ser um peixe de valor elevado e que é vendido a peso. Em 2011 foram adquiridos 153 kg de cherne e vendidos 80,42 kg. Não há registos de existências iniciais nem finais, pelo que há uma divergência de 72,58 kg, correspondente a 47,4 % das vendas contabilizadas.
IV.5. Resumo
A discrepância entre os valores em caixa constatados durante a ação e os que estão evidenciados na contabilidade motivaram o pedido dos documentos e/ou outros meios de controlo interno dos fluxos de caixa, para verificação. Nada nos foi facultado e não existe qualquer ligação entre o controlo diário das vendas e saldos de caixa com a contabilidade, pois as vendas são contabilizadas com base num resumo mensal.
Estando patentes na contabilidade saldos de caixa impossíveis (negativos) e irrazoáveis (demasiado elevados), não foi possível efetuar qualquer verificação, por falta de elementos (ponto IV.1).
A inexistência de ficheiros informáticos ou dos documentos de venda de 2009 até junho/2010, também não nos permitiram fazer o controlo dos proveitos destes exercícios.
Relativamente a 2011, foi possível apurar nos pontos IVA.1 a IVA.5 faltas nas vendas de produtos constantes dos ficheiros SAFT (que têm valores idênticos à contabilidade) relativamente às quantidades consumidas.
Ainda no ponto IV.3 ficou evidente a alteração dos ficheiros informáticos que possibilitou a omissão na contabilidade de parte das vendas.
Em suma, não nos foi possível apurar o valor dos proveitos relativos às omissões detetadas nem sequer apurar com rigor essas omissões, por falhas do controlo interno e ausência de registos informáticos e de documentos de venda.
Pelo exposto, verifica-se a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável por inexistência e insuficiência de elementos de contabilidade relativos aos proveitos, por falta de exibição de documentos e registos, bem como por discrepância entre os valores declarados e a quantidade de bens ou serviços transacionados, pelo que nos resta o recurso a métodos indiretos, conforme alínea b) do n.º 1 do art.º 87º e alíneas a), b) e d) do art.º 88º da Lei Geral Tributária (LGT).
V – Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indiretos
V.I. Escolha do critério
No seguimento dos cálculos efetuados no ponto anterior para demonstrar a existência de omissões nos proveitos contabilizados, foram apuradas percentagens de omissão nos vários artigos analisados (em quantidades), de que apresentamos o seguinte resumo:
Percentagem de omissão sobre as vendas
Descrição Quantidade s % Omissão
Unidades Vendas SAFT Consumo Diferença s/Vendas
Cerveja a copo Litro 39.776,62 53.550,00 13.773,38 34,6%
Café Café/bebidaa 126.428,24 183.714,29 57.286,04 45,3%
Pasteis nata Unidade
1.964,00 3.024,00 1.060,00 54,0%
Bolos arroz Unidade 519,00 808,00 289,00 55,7%
Cherne Kq 80,42 153,00 72,58 90,3%
Média aritmética 56,0%
Na amostragem efetuada, verificam-se omissões de vendas entre 34,6% e 90,3% (percentagens calculadas sobre as quantidades declaradas em vendas).
A partir desses cálculos, temos como critérios possíveis para determinação da matéria tributável por métodos indiretos os coeficientes técnicos de consumos ou utilização e matérias-primas, o valor de mercado dos bens e serviços tributados e uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte, conforme alíneas c), h) e i) do n.º 1 do art.º 90° da LGT.
Relativamente ao exposto, importa, portanto, realçar o peso que cada artigo tem na atividade do sujeito passivo, comparando as vendas de cada item com o total de serviços declarados:
Peso relativo dos artigos controlados
Descrição Valores Proporção
Cerveja a coco 265.896,45 15,0%
Café 106.454,06 6,0%
Pasteis nata 2.223,17 0,1%
Bolos arroz 724,18 0,0%
Cherne 4.233,85 0,2%
Total 379.531,71 21,5%
Serviços prestados 2011 1.767.286,32 100,0%
Da leitura do quadro supra, conclui-se que a cerveja a copo representa 15% do volume de negócios e o café 6%, somando ambos 21 %. Realcemos, entretanto, que esta percentagem está abaixo da realidade, pois as proporções referidas têm em conta apenas as vendas em que cada produto está explícito, sem ter em conta as vendas incluídas em menus, atrás analisadas no cálculo das quantidades. Tal ficou demonstrado na parte final do ponto IV.4.3., relativamente ao café.
Na nossa análise, somos de parecer que, sendo a cerveja a copo e o café os produtos mais representativos no volume de negócios, utilizar as percentagens de omissão detetadas no controlo dos mesmos, é o critério que se nos afigura mais adequado e consistente, com a vantagem de ser o que apresenta menor risco de prejudicar o contribuinte, por estes artigos apresentarem as percentagens de omissão mais baixas (34,6% na cerveja e 45,3% no café, no quadro apresentado no início do presente capítulo).
Para além disso, a cerveja é um artigo em que podemos contemplar outras atenuantes da percentagem de omissão calculada, tais como sobredosagens e consumos internos, e tanto na cerveja como no café temos que ponderar os desperdícios considerados normais. Estes aspetos fazem baixar significativamente os rácios de omissão calculados atrás, conforme se demonstra nos pontos seguintes.
V.2. Recálculo das vendas de cerveja, considerando sobredosagens
Nas reuniões com o s.p., em que apresentámos as divergências encontradas e cálculos efetuados, foram-nos realçados alguns aspetos que justificam parte das diferenças e que temos que considerar nos cálculos das omissões.
Quanto à cerveja vendida a copo, constatou-se que, normalmente é excedida a linha indicadora da medida de cada copo, pelo que a quantidade é ligeiramente superior à da medida nominal do copo. Isto é: os copos vêm calibrados com a respetiva medida indicada por um risco, mas é servida cerveja até ligeiramente acima dessa marca.
Pelos testes efetuados ao volume dos copos de cerveja em uso nos estabelecimentos e ainda por observações no local, verificámos:
1 - Nos copos de 0,20 litros não detetámos que sejam servidas quantidades de cerveja superiores à marca nos copos; a quantidade servida corresponde sensivelmente à aferida;
2 - Nos copos de 0,25, 0,40 e 0,50, verifica-se ser servido cerca de 0,025L para além da marcação, pois a restante parte do copo até à superfície é preenchida com espuma.
Fazemos no quadro a seguir o resumo e quantificação das sobredosagens servidas nos copos cerveja, partindo dos dados de 2011:
Capacidade do Copo (Litros)Unidades Vendidas 2011ProporçãoQuantidade Realmente ServidaQuantidade Excedente %Ponderação
ABCDE=D/A-1F=CxE
0,2002.689,942%0,2000,0%0,0%
0,250124.869,5790%0,27510,0%9,0%
0,4002.744,422%0,4256,3%0,1%
0,5008.063,546%0,5255,0%0,3%
Totais138.367,47100%9,4%
Apesar de, na nossa ponderação a sobredosagem representar 9,4%, vamos recalcular os valores relativos ao consumo de cerveja, constantes do ponto IV.4.2, arredondando as sobredosagens para 10% em cada copo (exemplo: na "Sagres 0,20, consideramos 0,22 L), conforme a seguir se demonstra:
Vendas Sagres barril Branca constantes do SAFT/2011
CódigoDescriçãoEstabelecimentoLitro/UnLitros
[SCom08...]estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
162Sagres 0.202.689,942.689,940,220591,79
163Sagres 0.40873,86873,860,440384,50
187Sagres 0.2562.507,6144.915,54107.423,150,27529.541,37
188Sagres 0.50
~
4.424,544.424,540,5502.433,50
909Sagres 0.401.508,641.508,640,440663,80
956PINT SAGRES BRANCA10,0010,000,5505,50
Totais66.932,153.563,8046.434,18116.930,1333.620,45

Vendas Sagres Preta constantes do SAFT/2011
CódigoDescrição:EstabelecimentoLitro/UnLitros
estabelecimento 2estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
189Sagres PRT 0.25
I
2.934,712.706,865.641,570,2751.551,43
190Sagres PRT 0.50130,00130,000,55071,50
910Sagres PRT 0.4097,9297,920,44043,08
955PINT SAGRES PRETA4,004,000,5502,20
Totais3.064,710,002.808,785.873,491.668,22

Vendas Sagres Bohemia constantes do SAFT/2011
CódigoDescriçãoEstabelecimentoLitro/UnLitros
estabelecimento 2estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
166Sagres Bohemia 0.252.717,532.000,854.718,380,2751.297,55
167Sagres Bohemia 0.50256,00256,000,550140,80
912Sagres Bohernía 0.40207,00207,000,44091,08
Totais2.973,530,002.207,855.181,381.529,43

Vendas Heineken constantes do SAFT/2011
CódigoDescriçãoEstabelecimentoLitro/UnLitros
[SCom08...]estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
201Heineken 0.25854,961.354,002.208,960,275607,46
202Heineken 0.50149,98149,980,55082,49
911Heineken 0,4057,0057,000,44025,08
Totais1.004,940,001.411,002.415,94715,03

Vendas Guiness constantes do SAFT/2011
CódigoDescriçãoEstabelecimento.Litro/UnLitros
estabelecimento 2estabelecimento 3estabelecimento 1Totais
191Guiness 0.254.877,514.877,510,2751.341,32
192Guiness 0.503.089,023.089,020,5501.698,96
Totais3.040,28
Com base nestes cálculos, os litros de cerveja cujas vendas estão declaradas (SAFT) somam 43.465,11, conforme o seguinte resumo:
Vendas de cerveja a copo (em litros)
DescriçãoConsumosVendas
ExplícitasMenusTotais
Sacres branca43.340,0033.620,452.340,3635.960,81
Sagres preta2.760,001.668,22149,041.817,26
Sagres Bohemia2.200,001.529,43118,801.648,23
Heineken1.23000715,0366,42781,45
Guinness4.020,003.040,28217,083.257,36
Totais53.550,0040.573,412.891,7043.465,11
V.3. Apuramento do índice de omissão da cerveja, tendo em conta desperdícios e consumos internos
Sabe-se que nem toda a cerveja adquirida no barril é vendida, pois há pequenos desperdícios especialmente na ligação da vasilha à máquina, consumos culinários e derrames ocasionais. Pelo que nos foi possível observar em estabelecimentos similares, essas perdas tendem a ser insignificantes quando há muito consumo (máximo de 1 ou 2 litros/barril) e mais relevantes quando um barril está muitos dias a uso, pois a cerveja que fica na mangueira de ligação perde qualidade.
Este desperdício é essencialmente constituído por perda de cerca de meio litro na abertura de cada barril e alguns derrames ocasionais, mais frequentes quando há pouca experiência. Contudo, no caso em apreço, há bastante consumo e, consequentemente, os operadores das torneiras de cerveja são experientes.
Para aferir que: há bastante consumo, realçamos, como já foi demonstrado, que a média diária de 2011 foi de cerca de 146 litros, correspondente a quase 3 barris de 50 litros.
Pelo exposto, vamos considerar perdas médias de 2 litros em cada barril de 50, ou seja: 4%.
Também se constatou que é utilizada alguma cerveja na confeção culinária. Esta usa-se em alguns pratos, especialmente em fritos e nalguns refogados e cozinhados, não nos tendo sido possível calcular com rigor tais consumos.
Para esta utilização estimamos um gasto médio de 3 litros/dia, que nos parece adequado face aos estabelecimentos em causa.
Abatendo agora à quantidade total consumida, às quantidades desperdiçadas (4%) consumidas internamente (3 litros/dia), calculamos as vendas presumidas e, comparando com as vendas registadas (calculadas no ponto anterior = 43.465,11 litros), calculamos as omissões nas vendas de cerveja:
Cerveja - Índice de omissões
DescriçãoLitros
Consumo verificado53.550,00
Desperdícios calculados (4%)2.142,00
Consumos culinários (3 litrosx365 dias)1.095,00
Vendas calculadas50.313,00
Vendas contabilizadas (SAFT)43.465,11
Diferença nas vendas (omissões)6.847,89
% (diferença/vendas contabilizadas)15,8%
É, portanto, de 15,8% a percentagem de omissão apurada na cerveja a copo, medida em litros, obtida pela quantidade em falta sobre a quantidade das vendas contabilizadas colhidas no SAFT e compreendendo a proporção incluída em "menus", (calculada no ponto IV.4.1 em 5,4% do volume de negócios e valorizada no final do ponto IV.4.2 em 2.891,7 litros).
V.4. Apuramento do índice de omissão do café, tendo em conta os desperdícios
Embora a marca fornecedora indique que cada bebida de café consome 7 gramas, o que significa que cada kg de grão produz em média 142,857 cafés, conforme cálculos no ponto IV.4.3, sabemos que nem sempre se consegue tal produtividade.
Há pequenos desperdícios e falhas que provocam algumas perdas e principalmente consumos do pessoal, mas há também algumas referências das vendas, em que a quantidade de café por unidade poderá ser inferior a 7 gramas, como em galão ou café com leite, que poderá ter apenas vestígios de café.
Assim, pela análise e pelo nosso conhecimento em outros casos investigados, achamos que dificilmente se atingem 10% de perdas, mas é esta percentagem que vamos usar para calcular a percentagem de omissão deste artigo.
Portanto, 90% de 142,857 cafés por quilo de grão, dá 128,57 cafés. Vamos arredondar para o valor inteiro: 128 e recalcular o índice de omissão, refazendo as contas dos últimos 4 quadros do ponto IV.4.3.:
DescriçãoLinhaQuant.Valor
Quilos de café consumidosA1.286,0
Quantidade de bebidas por Kg a 7qr e com 10% de perdasB128,0
Quantidade de bebidas possívelC164.608,0
Quantidade das vendas apurada no SAFT (inclui menus}D126.428,0
Quantidade em falta nas vendasE=C-D38.180,0
Percentagem de omissãoF=E/D30,2%
É, portanto, de 30,2% a percentagem de omissão detetada no café.
V.5. Cálculo do índice de omissão ponderado
Achados os índices de omissão específicos da cerveja a copo e do café, importa agora ponderar ambos de acordo com a proporção que tais artigos têm no volume de negócios, conforme quadro exposto no ponto V.1, para encontrar o índice de omissão ponderada a aplicar à generalidade dos valores declarados.
Cálculo da percentagem de omissão
ArtigosProporção do V.N.Ponderação% Omissão específicaOmissão ponderada
Cerveja15,0%71,4%15,8%11,3%
Café6,0%28,6%30,2%8,6%
Somas21,1%100,00%19,9%
Em resumo, foi possível determinar uma percentagem de omissão de vendas de 19,9% no conjunto da cerveja a copo e cafés, cujas vendas de 2011 (só em referências explícitas) representam 21 % dos serviços prestados.
V.6. Cálculo das correções
Conforme já foi referido, fizemos o controlo de consumos/vendas do exercício de 2011, porque é o único exercício em que nos foram facultados registos de todo o ano.
Não há elementos para calcular as omissões nos outros exercícios analisados, mas é evidente a existência de omissões de forma continuada, pois as margens brutas de comercialização declaradas até são superiores em 2008 e 2011, relativamente a 2009 e 2010 e a atividade não teve alterações dignas de registo. Assim, consideramos lógico e adequado que a percentagem de omissão calculada em 2011 seja, no mínimo, idêntica à dos exercícios anteriores e posterior.
No quadro a seguir mostra-se a evolução das margens declaradas:
Descrição 2008 2009 2010 2011
Serviços prestados 1.631.307,51 1.765.156,52 1.819,019,20 1.767.466,32
Custo existências consumidas 549.641,02 662.526,11 683.049,52 625.412,81
Margem bruta
.
1.081.666,49 1.102.630,41 1.135,969,68 1.142.053,51
Margem bruta %196,8% 166,4% 166,3% 182,6%
Assim, aplicando a referida percentagem de omissão calculada para o exercício de 2011 aos valores declarados, obtemos as correções a efetuar em sede de IVA e base tributável:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

A base tributável do IVA calculada no quadro anterior, corresponde às correções de proveitos, por métodos indiretos, nos exercícios de 2009 a 2011, que se resumem a seguir:
Exercício Valor
2009 351.266,14
2010 361.984,81
2011 351.689,99
Total 1.064.940,94
(…) IX. Direito de Audição - Fundamentação
IX.1. Introdução
Nos termos do art.º 60º da LGT e do art.º 69º do RCPIT, procedemos à notificação do projeto de relatório.
Foi enviado em 13 de março, mas o s.p. apenas procedeu à sua receção no dia 22 seguinte, apesar de possuir apartado postal. Assim, aguardámos os 15 dias previstos na referida notificação, de 23 de março até 8 de abril.
Só no dia 9 de abril foi recebido nesta Direção um envelope remetido por «AA», advogado, contendo uma procuração assinada pelos administradores «BB» e «CC», que constitui procuradores o Sr. Dr. «AA» e a Sra. Dr.ª «DD», seguido de um texto de 64 páginas relativo ao direito de audição, assinado pelo Procurador referido.
Esta comunicação relativa ao direito de audição foi registada nas entradas desta Direção Finanças com o n.º ...49.
O texto do direito de audição é, na maior parte, um conjunto de extensas divagações e citações sobre os pressupostos e os critérios dos métodos indiretos, bem como transcrições de legislação, contendo pouca substância para o caso em análise.
IX.2. Análise do texto recebido
1 - Na página 2 do texto do direito de audição é afirmado que a Administração Fiscal (AF.) não conseguiu provar "inequivocamente" os pressupostos para a avaliação indireta, e isto é várias vezes reafirmado nas páginas seguintes e ainda na página 52. Contudo, não é apresentado qualquer elemento ou prova que altere ou diminua a importância dos pressupostos elencados no capítulo IV do relatório.
2 - Na página 10 é afirmado que "foram facultados dados da faturação anteriores a 2010, mas em formato de papel...". Tal não corresponde à verdade, só existem os resumos mensais contabilizados, que contêm valores totais diários, não nos tendo sido facultadas quaisquer duplicados dos documentos emitidos, fosse em papel, ou qualquer outro suporte.
3 - Na página 12 afirma-se que o "controlo de caixa é aferido diariamente". Disto não temos qualquer dúvida de que a administração faz controlo diário de caixa, pois é necessário controlar os colaboradores. Contudo, tal controlo não está evidenciado na contabilidade nem nos foi facultado, verificando-se na contabilidade saldos de caixa inverosímeis e sem evidência de algum dia terem sido aferidos com base nos dados reais - ver ponto IV.1.
4 - Ainda na página 12 está escrito que "A contabilização dos proveitos é efetuada diariamente" - isto também não corresponde a realidade, pois os proveitos são lançados na contabilidade num único movimento mensal por cada um dos 4 estabelecimentos, tal como está referido no ponto IV.1.
5 - Na página 13 há uma confusão entre meios financeiros de caixa e as dívidas de clientes, subentendendo-se que os saldos de caixa elevados podem conter os débitos de clientes. Ora, se o cliente não paga, é emitida fatura, cujo valor a débito é contabilizado em clientes e mais tarde a conta do cliente é creditada pelo pagamento que entra em caixa ou bancos. O saldo que cada cliente deve não é "caixa".
6 - Na página 14 é afirmado que o saldo de caixa de € 23.141,17 é "um saldo de caixa perfeitamente normal" e que foram feitos pagamentos aos músicos antes de estes emitirem documento. Tal valor em caixa não é credível, dados os riscos de assaltos ou outros e, se houver entrega de dinheiro sem documento comprovativo, tal procedimento não é normal em empresa com tantos colaboradores, em que o controlo interno por parte da administração tem que ser rigoroso.
Ainda sobre os saldos de caixa, verifica-se uma contradição na página 20 entre a afirmação de que "os valores em caixa verificados na ação estavam corretos, conforme foi constatado em cada caixa" e "os saldos de caixa facultados pela contabilidade são...perfeitamente normais e explicados pela contabilidade", sobre isto, reafirmamos o exposto no ponto IV.1, em que se indicam os valores em caixa verificados na ação e os da contabilidade.
7 - A referência, na página 15, às consultas de mesa que não conseguimos localizar nos ficheiros por não terem data e porque os números das mesmas não foram encontrados nos ficheiros, refere que "seguramente encontravam-se em sistema e como tal contabilizadas". Reafirmamos que tal não foi possível conferir, porque até junho/2010 não nos foram facultados ficheiros nem duplicados dos documentos e nos ficheiros facultados (posteriores), não foram localizadas, conforme explicámos no ponto IV.2.
8 - Na página 16 afirma-se que o TOC se prontificou a corrigir as DPs do IVA com os valores das diferenças entre as bases de dados e o SAFT/contabilidade que detetámos em abril/maio de 2012. Tal é correto, pela nossa parte aconselhámos a corrigir as irregularidades voluntariamente de uma única vez, este aconselhamento vinha no seguimento das diversas conversas tidas com os representantes da empresa, que desde o início mostraram uma disposição em corrigir voluntariamente as faltas, contudo, na última reunião o Administrador presente recusou fazer qualquer regularização.
9 - O alegado "problema informático" também referido na página 16 e noutros pontos do direito de audição, foi detetado porque, após nos ser facultada uma base de dados com registos posteriores aos ficheiros SAFT fornecidos nos mesmos dias, quisemos verificar mais tarde se tais registos da base de dados sofreriam alguma alteração para a contabilidade – conforme explicado no ponto IV.3.
Não se obtiveram provas da forma como foram alterados os ficheiros, mas é um facto que foram omitidos no SAFT e na contabilidade registos de alguns talões - ver ponto IV.3 - e que tais diferenças só podem ser objeto da alegada correção, por ter sido por nós detetada.
Numa empresa com contabilidade organizada, qualquer falta de contabilização de documentos de vendas a dinheiro e talões é detetada facilmente pelo controlo do saldo de caixa ou de numeração de documentos, não é necessário chegar à análise da inspeção tributária para tal irregularidade ser detetada.
Veja-se o quadro IV.3. em que as percentagens de omissão detetadas nas alterações de ficheiros se situam entre 0% e 109,7%, variando por dias e por estabelecimento.
Ainda sobre a alegada regularização das diferenças já efetuada pelo TOC, nas consultas efetuadas até esta data, designadamente hoje às 14h30, não encontrámos qualquer declaração de substituição ou "declarações de alteração" em conformidade com o afirmado nas páginas 16 e 21, conforme relação do anexo VI.
10 - As sobredosagens e os desperdícios de cerveja referidos nas páginas 17 e 57, estão adequadamente mensurados nos pontos V.2 e V.3, não havendo novos dados que ponham em causa os cálculos efetuados. Referimo-nos, designadamente, ao serviço de mais de uma bebida por refeição, que se alega agora estar incluída no menu, ao comprimento das tubagens, à espuma servida nos copos e aos consumos internos.
11 - As alegações sobre a gramagem por café e o n.º de cafés por quilo de grão, expostas na página 18, nada têm de consistente que ponha em causa os nossos cálculos. Não são apresentadas provas de que a gramagem usada seja de 8,5g nem que os desperdícios e consumos ultrapassem os valores considerados no ponto V.4.
12 - As justificações para as divergências calculadas no peixe e bolos (itens IV.4.4. e IV.4.5), expostas nas páginas 19 e 20 são apenas vagas e, quanto a nós, não justificam as elevadas percentagens de omissão detetadas (47,4% no peixe e mais de 50% nos bolos). Contudo, essas divergências por nós calculadas, não foram utilizadas nos critérios do capítulo V, dada a fraca representatividade no volume de negócios.
13 - Na página 22, bem como noutros pontos do direito de audição, somos acusados de vício de violação da lei quanto ao método de quantificação do art.º 90° da LGT. No final do capítulo IV e no ponto V.1, está exposto que, face à impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável, são utilizados os coeficientes técnicos de consumos ou utilização de matérias-primas, o valor de mercado dos bens e serviços tributados e uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte, conforme alíneas c), h) e i) do n° 1 do art.º 90° da LGT.
Estes critérios consubstanciam-se nas percentagens de omissão das vendas calculadas para os principais artigos controlados, tendo em conta vários fatores como sobredosagens e desperdícios, de acordo com os dados facultados pelo sujeito passivo.
No final do ponto V.1, justificamos a escolha do critério e os artigos contemplados, que consideramos adequados e consistentes.
14 - Na página 34 somos acusados de não identificar outros casos que referimos. Sobre isto, fazemos menção a situações observadas em estabelecimentos similares, apenas para realçar a nossa convicção da razoabilidade dos critérios utilizados, face aos nossos conhecimentos de outros casos. Não são usados valores de outros estabelecimentos.
15 - Na página 53 há uma chamada de atenção para o que afirmamos no ponto 5.2, quando afirmamos "Nos copos de 0,25, 0,40 e 0,50, verifica-se ser servido cerca de 0,05L para além da marcação". Efetivamente trata-se de um erro no texto, que lamentamos e que já se encontra corrigido. O que se pretende dizer no referido ponto 5.2 é "Nos copos de 0,25, 0,40 e 0,50, verifica-se ser servido cerca de 0,025L para além da marcação" faltou-nos, portanto, colocar o algarismo "2". Esta falta está apenas no texto; os quadros com os cálculos estão corretos.
Tal lapso, agora ressalvado, não altera os cálculos efetuados, pois foram feitos com a sobredosagem média de 10%, nem as altera as conclusões propostas.
16 - Na página 58 afirma-se que a inspeção errou ao corrigir por avaliação direta apenas os proveitos, sem corrigir os custos. Como se pode observar, o critério é a percentagem de omissão de cerveja e café sobre as vendas calculadas, mas partindo das compras e inventários contabilizados - portanto os custos estão na contabilidade, não carecem de correção.
17 - Na página 63, segundo o nosso entendimento, em conclusão do texto das páginas anteriores, é sugerida a falta de recolha de informações junto dos fornecedores, "mormente da cerveja e do café". As quantidades das aquisições dos produtos foram obtidas junto dos fornecedores e na contabilidade; foi consultado o fornecedor de cerveja sobre quantidades fornecidas e capacidades dos copos e foi consultada a informação que o fornecedor de café expôs na Internet, especialmente acerca das dosagens, tal como referido no ponto IV.4.3.
Quanto às perdas da cerveja e dimensões das respetivas tubagens referidas em vários pontos do direito de audição, reafirmamos que em estabelecimentos de elevado consumo, como é o caso, tais desperdícios são pouco significativos. As perdas de qualidade nas tubagens ocorrem principalmente quando há longos períodos sem extração de cerveja, o que manifestamente não é o caso, uma vez que estão abertos os sete dias da semana.
IX.3. Conclusões da análise ao direito de audição
A falta de concretização das múltiplas afirmações feitas está espelhada no 1° parágrafo da página 57, onde se afirma que" ... sem que outros factos sejam invocados, mas que existem e que serão alegados e provados em ulterior fase ... ". Caso o s.p. pretendesse efetivamente demonstrar que a quantificação está exagerada, para que pudéssemos apreciar as suas razões, estas deveriam constar no direito de audição, o que não aconteceu.
Ou seja: no direito de audição, são apresentadas críticas genéricas a tudo: aos fundamentos, aos critérios e à quantificação, mas sem qualquer concretização ou prova. E sobre isto é afirmado que há factos "que existem e que serão alegados e provados em ulterior fase" - ora, se existem factos que podem motivar alteração das propostas e nos são ocultados esses alegados factos, como é possível tê-los em conta para manter, reformular ou corrigir as nossas propostas? Porque razão não são revelados?
Como epílogo, acrescente-se, que no final da página 63 consta "Indica como seu Perito o Sr. Dr. «AA» ... " - pelo que sabemos, o perito é designado para a fase de pedido de revisão da matéria coletável nos termos do artigo 91° da LGT e não nesta fase.
Realçamos um dos aspetos mais focados no direito de audição, que é a alteração dos ficheiros da base de dados dos dias 2012/04/26 a 2012/05/01. Ficou provada a contabilização de valores inferiores aos reais, por eliminação de documentos nos ficheiros informáticos, cujas justificações não são convincentes, conforme exposto no ponto IV.3 e cuja regularização por declarações corretivas, apesar de alegada no direito de audição, não nos foi possível confirmar.
O referido período de 26/04 a 01/05, foi o único em que nos foram inicialmente facultados registos da Base de dados posteriores aos registos do SAFT, obtido na mesma data. Foi para verificarmos se haveria alterações posteriores nos ficheiros base que pedimos três meses depois o SAFT de 2012, que englobava aqueles dias e a sua análise resultou na deteção das referidas divergências.
Em conclusão à análise do direito de audição, nada de relevante detetámos que ponha em causa qualquer dos pressupostos para a aplicação dos métodos indiretos, nem são apresentados dados que nos levem a considerar que a quantificação das correções constante do capítulo V esteja exagerada.
Assim, mantemos as propostas de correção». (…)”.
6) Por ofício de 12 de abril de 2013, foi a ora Impugnante notificada, na pessoa dos seus mandatários, do Relatório de Inspeção Tributária melhor identificado no ponto precedente (cf. ofício n.º ...09 junto a fls. 193 do PAT em apenso);
7) Em 9 de maio de 2013, a ora Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria tributável, tendo o debate contraditório, no âmbito do referido procedimento de revisão, sido concluído em 3 de junho de 2013, não tendo sido possível o acordo entre os Senhores Peritos ali intervenientes (cf. requerimento e vinheta aposta em envelope juntos a fls. 196 a 229 do PAT em apenso e ata n.º 009-A/LGT a fls. 234 a 243 do mesmo suporte);
8) Em 9 de julho de 2013, a Diretora de Finanças Adjunta ... proferiu despacho de fixação da matéria tributável, de cujo teor se destaca (cf. despacho n.º 11/2013 junto a fls. 246 a 255 do PAT em apenso):
“(…) Justificada a determinação da matéria tributária por métodos indiretos, cabe, por sua vez, ao contribuinte, o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação, de acordo com o disposto no n.º 3, do artigo 74.º da LGT.
Contudo, tal não se apresenta conseguido, pois os factos descritos no relatório, não foram rebatidos ou justificados, ao longo do procedimento de revisão, nem pelo sujeito passivo na petição do pedido de revisão, nem pelo perito por si nomeado, como determina a parte final do n.º 1 do artigo 90.º da LGT.
Efetivamente, no decurso dos debates contraditórios entre o perito da administração tributaria e do contribuinte, o perito da administração tributária procurou o estabelecimento de um acordo, no entanto, tal não foi possível concretizar pelos motivos que se encontram explanados na ata n.º 009-A/LGT.
Da leitura da ata, verifica-se que o perito do sujeito passivo se limitou a expor as ideias e conceitos que já se encontravam reproduzidos no pedido de procedimento de revisão e que já tinham sido objeto de análise aquando da resposta ao direito de audição ao projeto de relatório e que consta no capítulo IX do relatório (folhas 24 a 28), tendo-se limitado o perito do sujeito passivo a apresentar no ponto 5 da ata (folhas 7) um numero de cafés que seriam consumidos pelos funcionários e colaboradores do sujeito passivo.
Assim, manteve o perito do sujeito passivo, partes do texto anteriormente apresentado, nomeadamente reafirma a folhas 3 da ata que “0 TOC já assumiu a responsabilidade pelo facto, mas neste momento já procedeu a entrega das declarações de substituição", no entanto, da consulta ao sistema informático verifica-se que não foram apresentadas declarações de substituição, mantendo-se verdadeiro 0 ponto 8 do capítulo IX.2 do relatório, onde é informado pela inspeção tributária, que:
«Na página 16 afirma-se que o TOC se prontificou a corrigir as DPs do IVA com os valores das diferenças entre as bases de dados e 0 SAFT/contabilidade que deletámos em abril/maio de 2012. Tal é correto, pela nossa parte aconselhámos a corrigir as irregularidades voluntariamente de uma única vez, este aconselhamento vinha no seguimento das diversas conversas tidas com os representantes da empresa, que desde o início mostraram uma disposição em corrigir voluntariamente as faltas, contudo, na última reunião o Administrador presente recusou fazer qualquer regularização. " (folhas 26 do relatório).
Pelo que não faz qualquer sentido, o perito do sujeito passivo, manter tal afirmação na ata.
O perito da administração tributária, tal como se encontra espelhado de folhas 7 a 10 da ata, contestou convenientemente as afirmações apresentadas pelo perito do sujeito passivo, sendo da opinião “que a prova de verificação dos pressupostos, facto e de direito, para a aplicação dos métodos indiretos explanada no capítulo IV do relatório, nos Relatórios da Inspeção são claramente suficientes para a aplicação dos referidos métodos" (folha 7 da ata).
Nomeadamente, afirma o perito da administração, que:
“Foram efetuadas notificações, apresentadas explicações, obtidos novos elementos informáticos e nem assim foi possível reparar as anomalias encontradas atendendo à gravidade, conforme informação prestada pelo Serviço de planeamento, Gestão e Apoio à Inspeção (SPAGAI), referenciado no relatório da Inspeção atrás mencionado e que não foi objeto de contestação pelo Perito do contribuinte. Importa ainda acrescentar que conforme ponto IV.3 do RI na pg 10, relativamente a perda de dados e reposição parcial dos mesmos, seria suficiente se o contribuinte tivesse observado o disposto nos artigos 400, 450 60 e art.º 52.º do CIVA, que obrigam à existência do duplicado dos documentos de venda emitidos, independentemente do tipo de suporte utilizado, permitindo neste caso como em outros de natureza similar, a recuperação e reconstrução da base de dados relativamente aos períodos danificados. Não sendo por isso relevante a argumentação aduzida pelo Perito do contribuinte, sobre a imputação da responsabilidade a terceiros pela corrupção da base de dados”. (folhas 7 e 8 da Ata n.º 009-A/LGT. De referir que onde aparece "artigos 40.º., 45.º,6” se pretendia ter escrito "artigos 400, 450, 46.º”).
Conclui, o perito da administração, que as considerações apresentadas no ponto 2.11 da ata “carecem de validação, não tendo o Perito do contribuinte consubstanciado a sua argumentação em qualquer prova que ateste a veracidade das mesmas" (fls 9 da ata), reforçando, quanto à argumentação produzida no ponto 2.12 da ata, "que as mesmas não são válidas, uma vez que é um facto terem sido omitidos no SAFT e à, contabilidade registos de alguns talões conforme se detalha no ponto IV.3 do relatório da inspeção, que claramente põe em causa 0 rigor e a veracidade da contabilidade. Quanto à questão de o contribuinte ter assumido o erro pelo qual se terá responsabilizado não é significativo, uma vez que não foi este que deletou OS erros, mas sim a inspeção na sequência de diversos testes efetuados. Importa ainda referir o que consta da resposta ao direito de audição — “Numa empresa com contabilidade organizada, qualquer falta de contabilização de documentos de vendas a dinheiro e talões é deletada facilmente pelo controlo do saldo de caixa ou de numeração de documentos, não é necessário chegar à análise da inspeção tributária para tal irregularidade ser deletada” (fls 9 da ata).
Assim, verifica-se na ata que 0 perito da administração confirmou a existência dos pressupostos para a tributação com recurso a métodos indiretos, tendo atestado que foi correta a aplicação das alíneas a), b) e d) do art.º 88.0 da LGT, não tendo 0 perito do sujeito passivo afastado os referidos fundamentos.
Quanto ao critério utilizado na quantificação defende o perito da administração que "a tese sustentada pelo Perito do contribuinte, não tem razão de ser, no que respeita à taxatividade da lista de critérios prevista no artigo 90.0 da Lei Geral Tributária. Com efeito, não obstante a reconhecida relevância das posições doutrinárias transcritas no requerimento, afigura-se-nos que não serão merecedoras de acolhimento no caso em apreço", não aceitando 0 recalculo das vendas de cerveja, formuladas pelo perito do sujeito passivo sem qualquer sustentação ou justificação.
Por outro lado, e quanto ao argumento apresentado pelo perito do contribuinte que a inspeção tributária errou ao corrigir por avaliação indireta apenas os proveitos, argumenta o perito da administração que o critério utilizado na quantificação "foi a percentagem de omissão de cerveja e café sobre as vendas calculadas, mas partindo das compras e inventários contabilizados - portanto os cus/os estão na contabilidade, não Carecem de correção" (fls 10 da ata), esclarecendo que "no caso da cerveja foi consultado 0 fornecedor da mesma, sobre quantidades fornecidas e capacidades dos copos NO caso do café foi consultada a informação disponibilizada por este na Internet, especialmente acerca das dosagens, tal como expressamente é referido no ponto IV.4.3." (fls 10 da ata).
Quanto ao argumento apresentado pelo perito do contribuinte no ponto 5 da ata, que "o contribuinte em causa tem 57 trabalhadores contratados e 41 trabalhadores a recibo verde e que no relatório da inspeção não atendeu aos auto consumos, importaria por isso fazer tal correção. Partindo do pressuposto que cada empregado contratado bebe dois cafés por ,dia, o que se admite no mínimo, num ano totaliza 41.610 cafés, número superior àquele que afinal foi considerado no ponto V.4 no qual a quantidade em falta nas vendas é de 38.180, sendo deste modo tal valor excedido pelo cálculo simplista supra efetuado, tornando-se desta forma evidente que quer o pressuposto para aplicação dos métodos indiretos, quer a própria metodologia depois de utilizada está inegavelmente viciada com a falta de consideração desta situação que indubitavelmente se verifica." (folhas 7 da ata), entende o perito da administração que "as mesmas não têm razão de ser, dado que relativamente aos auto consumos os mesmos estão consideradas no relatório da inspeção, no ponto V.'/ do relatório, tendo sido estimado uma verba de 10% para esta rubrica que inclui também desperdícios e falhas. Relativamente ao valor proposto para auto consumos pelo Perito do Contribuinte, considero que o mesmo nü0 é realista, porque representaria cerca de 25,3% dos consumos de café e como tal não seria economicamente sustentável.” (fls. 10 da ata). Efetivamente, se assim fosse, em 4 cafés produzidos I era consumido pelos trabalhadores/colaboradores o que não nos parece credível e, como afirma o perito da administração não é economicamente sustentável. E quanto a esta questão, manteve o perito do contribuinte na parte final do ponto 2.9, o argumento que já constava a folhas 1 8 quer do direito de audição quer no pedido de procedimento, onde é referido que os cafés fazem parte das refeições diárias dos colaboradores/funcionários pelo que já se encontram esses custos refletidos na contabilidade. Por outro lado, e quanto a esta questão, na análise ao direito de audição é confirmado pela inspeção tributária, na parte final do ponto I I, do capítulo IX.2, do relatório, que não são apresentadas provas ' 'que os desperdícios e consumos ultrapassem os valores que foram considerados no ponto V .4" (a folhas 26 do relatório).
Assim, confirma o perito da administração a existência de fundamentos para a aplicação de métodos indiretos, concluindo que se devem manter as correções efetuadas por recurso a métodos indiretos que "0 reclamante não provou os erros que invoca, nem tão pouco demonstrou que a quantificação da correção se encontrava efetuada por excesso" (fls 10 da ata).
Do pedido de procedimento, bem como da argumentação apresentada pelo perito do contribuinte verifica-se que, praticamente, se limitam a tecer considerações de direito e a fazer afirmações alegando carência de fundamentação da administração fiscal, assim como defendem que os critérios do artigo 90.0 da LG T são de aplicação taxativa e não exemplificativa. No entanto, esta problemática não se aplica ao caso concreto, como confirma o perito da administração, já que os fundamentos se encontram previstos na al. b) do n.º 1 do art.º 87.º e als a), b) e d) do artigo 88.º ambos da LGT (folhas 17 do relatório) e os critérios utilizados na avaliação indireta estão previstos nas al.s c), h) e i) do n.0 1 do art.º 90.º da LGT (folhas 18 do relatório), como já aqui se referiu é se encontra devidamente explicado e quantificado ao longo dos capitulo IV e V do relatório, não tendo agora, o perito do sujeito passivo, afastado os pressupostos nem contestado nenhum dos valores quantificados pela inspeção tributária com recurso à aplicação de métodos indiretos.
Efetivamente, se o sujeito passivo considerava os valores que lhe foram fixados demasiado exagerados, deveria ter disponibilizado ao perito por si nomeado todos os elementos que se mostrassem pertinentes para discussão da matéria de facto e que pusessem em causa o apuramento da matéria tributável elou imposto cm falta, no sentido de os retificar de alguma incorreção ou apresentar uma proposta alternativa credível à que foi utilizada no relatório, dado ser o procedimento de revisão o local próprio para discutir essa problemática, competindo ao perito do contribuinte demonstrar o exagero da quantificação da matéria tributável no relatório de inspeção, se fosse o caso, conforme obriga o n.0 3 do art.º 74.º da LGT. No entanto, tal não feito tendo-se desperdiçado assim o fórum próprio para o aperfeiçoamento da quantificação dos impostos em causa, que é o debate contraditório entre os dois peritos (do sujeito passivo e da administração tributária).
Ora, é estipulado por lei que os órgãos competentes podem desenvolver todas as diligencias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes (artigo 63º da LGT), nomeadamente, podem examinar os livros e registos da contabilidade ou escrituração, bem como todos os elementos suscetíveis de esclarecer a situação tributária do contribuinte assim como podem aceder, consultar e testar o sistema informático do contribuinte, incluindo a documentação sobre a sua análise, programação e execução (al c) do n.º 1 do art.º 63.º da LGT), competindo, nos termos do art.0 28.0 do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT), à entidade inspecionada facultar à inspeção tributária os elementos para “…” (al. c) do n.0 2 do art.º 28.º do RCPIT), devendo o sujeito passivo, garantir à administração tributária a disponibilidade, acessibilidade e legibilidade de toda a documentação técnica relevante para a aferição da integridade operacional CIOS sistemas informático que utilizam (como já estipulava o n.º 5 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 198/90 de ditado pelo artigo 45.0 n.º 2 da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro).
A inspeção tributária, tal como consta no ponto IV.2 do relatório, confirmou que os ficheiros informáticos facultados apenas abrangem o período a partir de junho/2012, não tendo a empresa facultado os ficheiros completos das vendas nem os duplicados dos documentos emitidos. No entanto, e como é afirmado pela inspeção tributária, "o sujeito passivo é obrigado a conservar os registos por IO anos, conforme art.º 123º do CIRC, e, se o sistema informático foi substituído, teria de conservar as respetivas cópias de segurança, 0 que não nos foi facultado” (ponto IV.2, folhas 9 do relatório).
Efetivamente, e como se encontra informado no ponto IV.3 do relatório, no início da ação foram solicitados ficheiros informáticos, designadamente o SAFT e a base de dados da faturação, tendo sido detetadas várias divergências nos elementos fornecidos, as quais foram dadas a conhecer ao sujeito passivo.
Assim, para uma análise pormenorizada dos dados informáticos, foi 'solicitado ao Serviço de Planeamento, Gestão e Apoio à Inspeção (SPGAI), desta Direção de Finanças a análise e comparação d0s vários ficheiros facultados pelo sujeito passivo, tendo sido elaborada a informação que se encontra em Anexo III ao relatório, onde se chegou à conclusão, tal como se encontra reproduzido a folhas II do relatório, que:
“As divergências encontradas entre os vários ficheiros de dados — Base de dados e SAFT— extraídos em momentos diferentes, evidenciam divergências na base de dados, o que implica falha grave de coerência e integridade, impossibilitando resultados fiáveis e consequentemente detalhes igualmente fiáveis".
Ficando devidamente demonstrado ao longo do capítulo IV do relatório a impossibilidade de “apurar o valor dos proveitos relativos às omissões deletadas nem sequer apurar com rigor essas omissões, por falhas do controlo interno e ausência de registos informáticos e de documentos de venda" (ponto IV.5 a folhas 17 do relatório).
(…) Do exposto se conclui que não foram trazidos ao presente processo, nem pelo sujeito passivo nem pelo seu perito, elementos que permitissem concluir pela existência de dúvida fundada quanto aos montantes apurados pela inspeção tributária, sendo que a possível incerteza da quantificação da matéria tributável mais não é do que a normal consequência do próprio método presuntivo ou indiciário desta quantificação, que lhe é inerente, surgindo como única forma de apuramento da matéria tributável, que por responsabilidade do contribuinte não foi apurada através da forma normal, que é a sua escrita comercial, mercê das deficiências que apresentada. A inspeção tributária apurou os valores que considera reais podendo o contribuinte provar o contrário. No entanto, nem no direito de audição, nem ao longo do procedimento de revisão, apresentou elementos que levassem à quantificação de outros valores.
É certo que a Administração Fiscal deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias ao interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido conforme de resto estipula o art.º 58.º da LGT. Só que isso foi feito pela inspeção tributária que, mercê das falhas detetadas nos elementos facultados pelo contribuinte, se viu obrigada a fazer a tributação por métodos indiretos não tendo sido possível apurar todas as operações realizadas e os resultados efetivamente alcançados, nos exercícios inspecionados, e bem assim, necessariamente, apurar a sua real situação patrimonial, de harmonia com o art.º 29º do Código Comercial. Não tendo sido possível apurar com exatidão quais os valores reais das atividades desenvolvidas pelo sujeito passivo, resta só à administração fiscal retirar ilações, que constam do relatório aqui já referido e respetivos anexos, tiradas de factos conhecidos para firmar um facto desconhecido, tal como estipula o art.º 349.º do Código Civil.
Deste modo
Determina, o acima exposto, a nossa total adesão aos fundamentos e quantificação constantes do relatório da inspeção tributável e seus anexos — cujos cálculos e fundamentos aqui damos por integralmente reproduzidos — e ás alegações expendidas pelo perito da administração tributária - que também damos aqui por reproduzidas — o que vale por não aceitarmos a pretensão do contribuinte, por não provado, o excesso na quantificação da matéria tributável, mantendo-se os pressupostos para tributação por métodos indiretos, tal como determina a alínea b) do n.º 1 do art.º 87.º e as als. a) b) e d) do art.º 88.º da LGT.
Pela ilegalidade do uso dos critérios operados na quantificação, porquanto, se baseiam nas als. c), h) e i) do n.º 1 do art.º 90º da LGT.
Pelo que:
Mantenho os valores inicialmente fixados para efeitos de IRC, de € 384.025,47 (trezentos e oitenta e quatro mil e vinte e cinco euros e quarenta e sete cêntimos), para o exercício de 2009, de € 319.215,46 (trezentos e dezanove mil duzentos e quinze euros e quarenta e seis cêntimos), para o exercício de 2010 e de € 360.340,98 (trezentos e sessenta mil trezentos e quarenta euros e cêntimos) para o exercício de 2011; (…)”.
9) Por ofício de 11 de julho de 2013, da Diretora de Finanças Adjunta ..., foi a ora Impugnante notificada, na pessoa dos seus mandatários, do teor do despacho melhor identificado no ponto precedente (cf. ofício n.º ...80 junto a fls. 256 do PAT em apenso);
10) Em 22 de julho de 2013, foi emitida, em nome da ora Impugnante e no que ora releva, a seguinte liquidação de IRC, da qual se destaca os subsequentes elementos (cf. Prints do Sistema de Documentos de Cobrança, do Sistema de Demonstração de Liquidação de IRC e do Sistema de Demonstração de Compensação, todos da ATA, juntos a fls. 368 a 385 do PAT em apenso; e ainda Demonstração de Acerto de Contas e Demonstração de Liquidação juntas como documento n.º 1 à petição inicial a fls. 98 do processo físico):
PeríodoLiquidação de impostoValor a pagarN.º da CompensaçãoData CompensaçãoSaldo apurado
2011...06168,88...8529.8.20130,00
11) Em 4 de novembro de 2013, foi remetida a este Tribunal, por correio registado, a petição inicial que deu origem aos presentes autos (cf. vinheta aposta em envelope junto a fls. 99 do processo físico e petição inicial junta a fls. 3 a 93 do mesmo suporte).
*
Não existem factos alegados a dar como não provados e a considerar com interesse para o conhecimento da exceção em análise.»

2.2. De direito
In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Coimbra invocando erro de fixação no valor da causa, sucumbido que se mostra a questão nova suscitada de ineptidão da petição inicial.
Para tanto, alega que o Tribunal a quo errou, porquanto “O acto de liquidação em causa tem o valor de 168.88€, correspondendo este à utilidade económica do pedido e o mesmo é dizer ao montante de imposto impugnado e já liquidado, ou seja, a quantia certa e líquida que na procedência da impugnação o impugnante deixará de pagar ou lhe será devolvida e não. / A impugnante não impugnou o valor das correcções à matéria colectável e por consequência, o valor da causa, não equivale ao montante de imposto que poderá hipoteticamente deixar de pagar com a procedência da impugnação, porque tal montante apenas representa uma utilidade económica futura e hipotética, dado que a posterior utilização, para efeitos fiscais, dos montantes corrigidos está dependente da produção de factos e circunstâncias contingentes, imprevisíveis e incertas por natureza.” razão pela qual se mostra “violado o art.° 97°-A, n.° 1, al. a) do CPPT.”.
No caso vertente, o valor da causa foi fixado convocando a seguinte base legal e fundamentação jurídica:
«Resulta do disposto no n.º 1 do artigo 296.º do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do artigo 2.º do CPPT, que a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido. Para o efeito, incumbe ao autor indicar esse valor na petição inicial e compete ao réu impugná-lo, querendo, na contestação ou resposta que venha a oferecer (cf. artigos 305.º, n.º 1 do CPC e 306.º, n.º 1, 2ª parte do CPC, aplicáveis ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT).
A Impugnante indicou como valor da ação o valor de € 5.000,01, sem que tenha sido oferecida qualquer oposição pela Fazenda Pública.
Ora, quando é impugnada uma liquidação, o valor atendível para efeitos de custas corresponde, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, “[a]o da importância cuja anulação se pretende”. Todavia, quando está em causa a impugnação da matéria coletável em que não há imposto a pagar, como é o caso dos autos, ou em que a liquidação (do imposto) não é impugnada, deve aplicar-se, ao invés, a alínea b) do citado preceito legal.
Neste sentido, fixa-se o valor da presente ação em € 354.972,01 (trezentos e cinquenta e quatro mil, novecentos e setenta e dois euros e um cêntimo), montante correspondente ao valor contestado da fixação da matéria coletável (cf. artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC ex vi da alínea e) do artigo 2.º, do CPPT).»
Vejamos.
Diz-nos o nº 1 do artigo 97-A do Código de Procedimento e Processo Tributário:
“Artigo 97.º-A
Valor da causa
1 - Os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as acções que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes:
a) Quando seja impugnada a liquidação, o da importância cuja anulação se pretende;
b) Quando se impugne o acto de fixação da matéria colectável, o valor contestado;
c) Quando se impugne o acto de fixação dos valores patrimoniais, o valor contestado;
d) No recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, o do valor da isenção ou benefício.
e) No contencioso associado à execução fiscal, o valor correspondente ao montante da dívida exequenda ou da parte restante, quando haja anulação parcial, exceto nos casos de compensação, penhora ou venda de bens ou direitos, em que corresponde ao valor dos mesmos, se inferior.”
Temos assim que nos processos em que é impugnado um acto de liquidação, o valor do processo é o da importância cuja anulação se pretende, que será o da liquidação cuja anulação foi pedida.
Desde já diremos que como decorre do trecho supratranscrito, na petição inicial foi expressamente pedida “a anulação dos actos tributários impugnados, com todas as legais consequências”, tendo sido indicado como valor da causa € 5.000,01. Mais como disso deu nota a sentença recorrida, que assim concretizou e a Recorrente não se insurge, a liquidação que releva é a respeitante ao exercício de 2011, aliás único documento junto com a petição.
Ora se bem interpretamos a pretensão da Recorrente é de que o valor da causa deveria ter sido exclusivamente atribuído por referência ao disposto na alínea a) do n.º1 do artigo 97º A do CPPT, pois que da liquidação adicional emitida apenas resulta o valor a pagar de imposto de €168,88, decorrente da correcção operada em sede de tributações autónomas (vide liquidação de fls. 99 do processo físico, único documento junto com a petição inicial), isto apesar de nessa mesma liquidação constar uma correcção à matéria tributável de €360.340,98.
Conforme decidido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no acórdão proferido em 17.01.2019, no processo n.º 62/18.4BCLSB, que acompanhamos, ali se aclara;
Primeira hipótese:
Nos casos em que a causa de pedir é construída em torno da alegada ilegalidade de uma liquidação, o valor da causa corresponderá, por directa aplicação desta norma, ao valor da liquidação ou ao valor da parte impugnada, consoante se peça, respectivamente, a sua anulação total ou parcial.
E ainda que sejam cumulados pedidos que traduzam uma utilidade económica diversa daquela que resulta da mera anulação da liquidação (por exemplo, o pedido de pagamento de juros indemnizatórios), o valor da causa será sempre o valor da liquidação na parte impugnada. Nesta situação (da cumulação de pedidos), não há uma correspondência exacta entre a utilidade económica imediata do pedido e o valor da causa.
O que, aliás, sucede noutros casos em que se cumulam outros pedidos com expressão monetária com a impugnação da liquidação, designadamente pedidos de impugnação do acto de fixação da matéria colectável ou de impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais.

Todavia, para que a alínea a) possa ser aplicável é necessário que estejam reunidas duas condições: (i) que haja liquidação que determine um montante de imposto a pagar superior a zero e que (ii) essa liquidação seja impugnada.
É que a norma apela a um conceito restrito de liquidação, isto é, refere-se ao resultado positivo da operação aritmética de aplicação de uma determinada taxa de imposto à matéria colectável e não propriamente a essa operação aritmética. Caso contrário cair-se-ia no absurdo de em situações em que não se apura imposto a pagar se admitir que o valor da causa pudesse ser igual a zero.
Dito de outro modo, no sentido em que o termo liquidação é usado na norma ele só pode ter como escopo a exigência do pagamento de um imposto; por conseguinte, a norma é imprestável para resolver os casos em que não existindo imposto a pagar, ou existindo não é impugnado, apenas se pretende atacar a fixação da matéria colectável, como sucede no caso presente e mais adiante se demonstrará.
Em todo o caso, esta norma é a que mais se aproxima do conceito de utilidade económica imediata do pedido, porque nas normas seguintes [alíneas b) e c)], o valor da causa pode não ter equivalência com o valor da vantagem económica fiscal que o interessado pode obter com a procedência da acção.
Segunda hipótese: a alínea b) do n.º 1 do artigo 97.º-A.
Esta norma aplica-se, somente, aos casos em que são impugnados actos de fixação da matéria tributável tout court. Nos casos em que essa fixação é acompanhada da liquidação de um tributo, o valor da causa é determinado nos termos da alínea a), como já se referiu.
Assim, a aplicação residual da alínea b) aos casos de fixação de matéria tributável sem liquidação de imposto determina um valor da causa que não tem correspondência com a utilidade económica do pedido, sendo muito superior a esta. Na verdade, a utilidade económica corresponde apenas ao valor do imposto que o contribuinte poderá deixar de pagar com a correcção da matéria tributável; não corresponde ao montante corrigido.
Contudo, a conclusão inevitável que resulta da interpretação desta norma é de que o valor da causa corresponde ao valor contestado da matéria tributável, apesar de, como observa Jorge Lopes de Sousa, a sua redacção poder gerar potenciais casos de desigualdade no tratamento dado a situações aparentemente semelhantes, consoante haja ou não lugar a liquidação de imposto a pagar.”.

Isto posto, volvendo ao caso concreto, o problema a resolver no tocante à determinação da norma aplicável circunscreve-se às alíneas do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, a saber, alínea a) ou a alínea b).
Ora, atenta a causa de pedir vertida na petição inicial, constatamos que não está em causa a tributação autónoma, aliás cujo valor foi aceite, inexistindo diferença entre a importância ali constante da liquidação anterior (apresentada pela Recorrente em sede de autoliquidação) e importância corrigida. Efetivamente em causa está o valor corrigido em sede de “matéria colectável – regime geral” que na liquidação anterior consta a importância de € 5.368,97€ e conforme consta da liquidação aquela importância foi corrigida para €360.340,98. O que nos permite concluir desde logo, que in casu não está a discussão sobre um qualquer montante concreto de IRC a pagar pela Recorrente, caso em que o valor da causa corresponderia a esse montante, pois que na liquidação apresentada o valor de imposto a pagar corresponde aquele que decorria da autoliquidação apresentada pela Recorrente decorrente de tributações autónomas por si declaradas no valor de € 168,88 a que corresponde um imposto a pagar do mesmo valor.
Com efeito, neste processo, o que a Recorrente visou atacar foi a correcção à matéria tributável, determinada em sede de procedimento de revisão da matéria colectável por despacho da Directora de Finanças adjunta da DF ..., na sequência do pedido de revisão apresentada das correcções realizadas com recurso aos métodos indirectos dos exercícios de 2009, 2010 e 2011 [vide item 8 do probatório e restante matéria de facto dada como provada], assente na tese que propugna na petição de que aquela padece de: erro nos pressupostos de avaliação indireta da matéria tributável, não tendo a Administração Tributária cumprido o ónus da prova que lhe competia; por violação do princípio do inquisitório e da busca de verdade material ao longo do procedimento inspectivo; do erro no critério utilizado e erro na quantificação da matéria tributável; da falta de fundamentação.
Em suma, olhando para a causa de pedir plasmada na longa petição inicial apresentada, constata-se que por via da mesma o Recorrente nunca pretendeu discutir o quantum do valor do imposto a pagar de € 168,88 [aliás nem poderia, porque o mesmo não foi objecto de qualquer correção como já adiantamos], situação em que o valor da causa corresponderia a esse montante. O que manifestamente e exclusivamente a Recorrente pretende atacar foram as correções [tentativa de obviar à fixação da matéria tributável por métodos indirectos] levadas a cabo pela AT, independentemente, como disso dá nota o Tribunal a quo de alteração da matéria colectável não se reflectir directamente no apuramento do imposto em sede de IRC da Recorrente por se tratar de uma ACE.
Manifesto que esta interpretação dos autos é a única plausível, discorre ainda do pedido formulado a final que não se dirige anulação da liquidação propriamente dita, mas aos actos tributários.
Portanto, o que a Recorrente pretendeu com a instauração dos presentes autos foi apenas que o Tribunal lhe reconhecesse que as correcções à matéria tributável eram indevidas e, por conseguinte, ilegais. Ou seja, está a referir-se ao acto que fixou a matéria tributável em €360.340,98, o que em contraposição com o valor apresentado por si em sede de autoliquidação de € 5.368,97, dá precisamente uma utilidade económica de €354.972,01.
Donde, a utilidade económica imediata só poder ser aferida pelo valor das correcções impugnadas.
Concluiu-se, portanto, pela completa imprestabilidade da alínea a) para determinar o valor da causa no caso sub judice.
Resta, portanto, a alínea b) do n.º 1 do artigo 97.º-A, do CPPT, pelo que bem andou o tribunal a quo.
Mais se diga, voltando ao acórdão do TCA Sul citado que:
No que concerne à alínea b), embora se reconheça, como já se disse, que a sua redacção pode gerar potenciais situações de desigualdade no tratamento dado a situações aparentemente semelhantes, consoante haja ou não liquidação de imposto a pagar, a letra da lei não deixa margem para dúvidas: quando não tenha havido liquidação (no sentido de imposto a pagar) ou o imposto liquidado não seja impugnado, o valor da causa é igual ao valor contestado da fixação da matéria tributável.
Esta nossa interpretação da alínea b) do n.º 1 do artigo 97.º-A, do CPPT afigura-se-nos ser a única que se compatibiliza com cânone hermenêutico do artigo 9.º, n.º 2, do Código Civil, segundo o qual não pode ser tida em consideração uma interpretação que não tenha um mínimo de correspondência verbal com a letra da lei, ainda que imperfeitamente expressado, interpretação que corresponde à visão doutrinal, de que a letra da lei é o ponto de partida, mas também o ponto de chegada, de toda a interpretação da norma jurídica.
É certo que a letra da lei é, por vezes, incerta, hipotética, equívoca, o que obriga, quando o elemento gramatical não fornece uma resposta clara e unívoca, a buscar a interpretação teleológica através dos restantes elementos lógicos de interpretação, designadamente o sistemático, tendo por pano de fundo a presunção de acerto do legislador (art.º 9º, n.º 3), visando obter uma interpretação de acordo com os fins cognoscíveis e as ideias fundamentais da regulação normativa, visto que “por trás de uma determinada intenção reguladora, estão valorações, aspirações e reflexões substantivas, que nela acharam expressão mais ou menos clara”.
Aliás, tarefa que a LGT impõe no n.º 1 do artigo 11.º, ao prescrever que “Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e os princípios gerais de interpretação e aplicação das leis”.
Mas, porque “toda a disposição de direito tem um escopo a realizar, quer cumprir certa função e finalidade, para cujo conseguimento foi criada” e nenhum princípio jurídico existe isoladamente, antes “está ligado por nexos íntimos com outros princípios”, que “são membros de um grande todo”, então o intérprete deve socorrer-se de vários elementos interpretativos lógicos, de índole sistemática, histórica e racional ou teleológica, a fim de apurar o resultado da interpretação, que pode ser então declarativa (com um sentido consagrado no texto), restritiva (com um sentido que fica aquém do texto) ou extensiva, quando acaba por concluir que a letra do texto fica aquém do espírito da lei, pecando por defeito, ou seja, que o legislador quis dizer mais do que aquilo que efectivamente disse.
E porque as várias parcelas da lei não surgem de supetão mas antes fazendo parte do “desenrolar lógico de um plano”, a interpretação sistemática é incontornável, como justamente observa Saldanha Sanches.
Ora, basta compararmos a teleologia associada à alínea a) e à alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º-A, do CPPT, para imediatamente se concluir que o legislador deste diploma disse na alínea b) o que efectivamente queria dizer.
Se na alínea a) não há dúvidas de que a utilidade económica do pedido corresponde ao montante de imposto impugnado e já liquidado, ou seja, a quantia certa e líquida que na procedência da impugnação o impugnante deixará de pagar ou lhe será devolvida, já na alínea c) não é o montante do imposto que representa o valor da causa mas antes o valor patrimonial contestado, que servirá para o cálculo desse imposto.
(...)
Também na alínea b) se constata que este pretendeu consagrar um critério objectivo de determinação do valor da causa, baseado numa realidade com expressão monetária: o valor contestado da matéria tributável.”
Por todo o exposto improcede o recurso.
2.2.2. Da dispensa do remanescente
A circunstância da menor complexidade na solução jurídica das questões decidendas, a postura das partes, conjugada com o facto de o montante da taxa de justiça devida (nos termos da tabela I-B anexa ao Regulamento das Custas Processuais) ser manifestamente desproporcionado em face do concreto serviço prestado, quebrando a relação sinalagmática inculcada no pagamento da taxa, justifica a dispensa total do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nesta instância (artigo 6.º n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais), nos termos requeridos.

2.3. Conclusões
I. A ineptidão da petição inicial não pode ser suscitada como questão nova em sede de recurso, pois, embora se trate de questão de conhecimento oficioso, esse conhecimento só pode ter lugar até ao despacho saneador, ou, se não houver tal despacho, até à sentença final.
II. Quando não tenha havido liquidação (no sentido de imposto a pagar) ou o imposto liquidado não seja impugnado, o valor da causa é igual ao valor contestado da fixação da matéria tributável.
3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da Recorrente, com dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Porto, 15 de maio de 2025
Irene Isabel das Neves
(Relatora)
Carlos de Castro Fernandes
(1.º Adjunto)
Rui Esteves
(2.º Adjunto)