Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 02280/16.0BEPRT |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 11/17/2017 |
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Tribunal: | TAF de Penafiel |
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Relator: | Alexandra Alendouro |
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Descritores: | SUSPENSÃO DE EFICÁCIA DE ACTO; FALTA DE INSTAURAÇÃO DO MEIO PROCESSUAL PRINCIPAL |
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Sumário: | I – Um processo cautelar depende sempre de uma acção principal a intentar previamente, durante, ou após a instauração daquele processo. II – A impugnação de actos anuláveis tem lugar no prazo de 3 meses a contar, em regra, da notificação do acto – artigos 58.º/2/b) e 59.º/2.º do NCPTA. III – Subsumindo-se as causas de invalidade imputadas ao acto suspendendo de afastamento coercivo do Recorrente do território nacional e de interdição de nele entrar pelo período de três anos, ao regime regra da anulabilidade dos actos administrativos previsto no artigo 163º do NCPA, e não tendo sido instaurada a acção principal de que depende a presente providência cautelar, dentro do prazo legal de três meses, ocorre intempestividade da prática de acto processual prevista na alínea k) do nº4 do art. 89º do NCPTA, o que obsta à adopção da requerida providência. * *Sumário elaborado pelo relator |
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Recorrente: | JCQS |
Recorrido 1: | MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
Decisão: | Negar provimento ao recurso |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO JCQS veio interpor recurso da sentença proferida pelo TAF do Porto que julgou improcedente, por falta de verificação do requisito do fumus boni iuris previsto no art.º 120.º, n.º 1 CPTA, a providência cautelar intentada contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA, de suspensão da eficácia do despacho proferido pelo Director Nacional Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), de 29.07.2016, nos termos do qual foi determinado o afastamento coercivo do Recorrente do território nacional e a interdição de nele entrar pelo período de três anos, bem assim como a sua inscrição na lista de pessoas não admissíveis no território nacional pelo período referido e a sua inscrição na lista comum de pessoas não admissíveis no Espaço Schengen, e que lhe foi notificado em 25.08.2016. * O Recorrente alegou e formulou as seguintes conclusões:“I – Erradamente decidiu o juiz a quo julgar a providência cautelar de suspensão de eficácia improcedente, por não provada; II – E erradamente dizemos porque, se se decide pelo preenchimento do requisito do periculum in mora, dever-se-ia também decidir pelo preenchimento do requisito do fumus boni iuris. III – Isto porque o fundamento usado para afastar o fumus boni iuris prende-se tão só com o facto de não ter sido intentada a acção de impugnação respectiva nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 58.º n.º 2 al b) do NCPTA, esgotada o que estaria o prazo de três meses para o efeito. IV – No entanto, estaremos perante um caso de nulidade e não de anulabilidade de acto administrativo, e como tal, tal nulidade pode ser arguida a todo o tempo. Vejamos: V – No âmbito do regime legal do procedimento cautelar, o Recorrente teria, então, um prazo de 90 dias para utilizar a via contenciosa supra referida, contado desde o trânsito em julgado da decisão de concessão da providência cautelar. VI – É, também, este o entendimento do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 05.06.2014, Processo n.º 11101/14, CA – 2º Juízo, Relator: Catarina Jarmela, "II – À impugnação dos actos nulos, na medida em que não está sujeita a prazo (cfr. art. 580 n.º 1, do CPTA), não é aplicável a estatuição prevista na al. a) do nº 1 do art. 123º, do CPTA, mas a estabelecida no respectivo n.º 2, ou seja, só se verifica a caducidade da providência decretada caso a acção principal não seja interposta nos três meses seguintes ao trânsito em julgado da decisão cautelar, (…) Quando se trate de uma acção não submetida a prazo como sucede com a impugnação dos actos nulos ou a impugnação de normas, o requerimento de uma providência cautelar pode ser apresentado a todo o tempo. No entanto, apresentado esse pedido e obtido o seu deferimento, o requerente tem o ónus de intentar a acção principal no prazo de três meses contados desde o trânsito em julgado da decisão de concessão da providência, sob pena de caducidade da mesma (artigo 123.º, nº 2, do CPTA). A falta de cumprimento deste ónus não tem, naturalmente, qualquer repercussão no direito de instaurar a acção principal a todo o tempo, embora possa obstar a que seja garantida novamente tutela cautelar." (…). VII – Desde logo se percebe que, mesmo estando esgotado aquele prazo de 90 dias após a decisão de concessão da providência cautelar, sempre pode o aqui Recorrente utilizar a via contenciosa da impugnação, a todo o tempo. VIII – Não obstante, aquilo que não se permite é uma nova tutela cautelar que tenha por base a mesma causa de pedir que aquela de que se recorre. IX – Na parte em que supostamente o aqui Recorrente não logrou comprovar "que a decisão de não admissão no espaço Schengen inserido pela autoridades suíças foi já removida do sistema, pelo que, também por aqui não se vislumbrará sucesso à acção principal", com o devido respeito deva dizer-se que o juiz a quo limita-se a fazer "futurologia". X – Não pode o juiz a quo afirmar, como afirmou, que a acção principal está votada ao insucesso, pois que, não obstante não ter sido junto o documento para o qual foi notificado (o aqui Recorrente) a verdade é que outras diligências de prova se impunham para depois se poder proferir decisão em conformidade com a verdade material. XI – Isto porque, tendo sido indicada prova documental e testemunhal aquando da providência cautelar, não se compreende como pode o juiz a quo decidir sobre o procedimento cautelar, sem que tenham sido levadas a cabo todas as diligências que se impunham para a tomada da decisão final. XII – Nomeadamente, não foi produzida a prova testemunhal, cuja inquirição se requereu aquando da instauração do procedimento cautelar. XIII – Ora, incumbe ao juiz promover as diligências necessárias à decisão da causa, propostas pelas partes, desde que não sejam impertinentes ou meramente dilatórias, X IV – A inquirição das testemunhas, tal como foi pedida pelo aqui Recorrente, não consubstancia nenhum expediente dilatório. XVI – Aliás, isso mesmo foi reconhecido pelo juiz a quo, por despacho datado de 6-4-2017. XVII – O juiz deverá ter, ao longo de todo o processo, um dever de gestão processual, que inclui este tipo de diligências (artigo 7º-A do CPTA). XVIII – Ora, ao ter tomado uma decisão, sem levar em consideração todos os elementos de prova, o juiz a quo não conjugou os interesses de todos os participantes processuais e da realização da justiça no caso concreto. XIX – Portanto, em nosso modesto entender estão preenchidos os requisitos do fumus boni iuris, até porque tal como já se afirmou e que agora se reforça, o Recorrente reúne todas as condições para que possa beneficiar do pedido principal (Autorização de Residência para o exercício da actividade profissional subordinada, ao abrigo do artigo 88º da Lei 23/2007 de 4/7). XX – Nada em concreto até à data, nos demonstra o contrário: XXI – Pelo que, a decisão proferida e ora recorrida é nula, porque viola o disposto no artigo 95º do CPTA, devendo ser por isso revogada. XXII – Vale isto por dizer que a mesma não decidiu todas as questões suscitadas pelo ora Recorrente, bastando-se com a fundamentação de que não estavam preenchidos os requisitos relativamente ao fumus boni iuris para se eximir à decisão sobre as demais questões suscitadas. (…) ”. * O Recorrido apresentou contra-alegações, concluindo o seguinte:“ (…) 18. Nos presentes autos não é posta em crise a factualidade aferida em primeira instância, nem o aditamento de factos ao probatório. Essa factualidade é aceite, pretendendo, contudo, a Recorrente extrair dessa factualidade resultado diverso do que foi proferido na douta sentença recorrida. 19. E nesse contexto, vem a Recorrente invocar a nulidade da douta sentença recorrida com fundamento em omissão de pronúncia sobre a realização de diligências probatórias, nomeadamente, inquirição de testemunhas arroladas. Não lhe assistindo, contudo, razão na medida em que o Mmo Juiz a quo pronunciou-se sobre a dispensa da inquirição de testemunhas. 20. O objecto processual ficou definido no articulado em que o ora Recorrente veio colocar em crise o acto administrativo de expulsão de território nacional. 21. O Recorrente invoca a verificação do requisito do fumus bonis iuris, na medida em que o acto impugnado está ferido de nulidade. Carece de razão, verificando-se que todas as ilegalidades invocadas seriam geradoras de anulabilidade do acto impugnado, pelo que se mostra aplicável o prazo de impugnação de três meses, e nesse sentido se pronunciou, e bem, o Mmo. Juiz a quo. 22. Em suma, o Tribunal a quo não incorre em erro de julgamento, quer na apreciação dos factos, quer quanto à interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis. O Tribunal a quo subsumiu correctamente o pedido ao direito aplicável. 23. Urge concluir que a sentença recorrida não enferma de quaisquer vícios ou erros de julgamento, não merecendo, pois, censura.”. * O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos previstos no artigo 146.º do CPTA, emitiu douto parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.* Dispensados os vistos – artigo 36.º do CPTA – foram os autos submetidos a julgamento.** II – QUESTÕES DECIDENDAS:Cabe apreciar e decidir, nos limites das conclusões do presente recurso – artigos 5.º, 608.º/2 635º/3/4 637º/2 639º/1/2 e 640º do CPC 2013 ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA – se a decisão recorrida padece de (i) nulidade por omissão de pronúncia (ii) erro de direito ao julgar inverificado o fumus boni iuris, na vertente formal, previsto no artigo 120.º, n.º 1, do CPTA, dado, numa análise perfunctória dos autos, se evidenciar a caducidade do direito de acção de impugnação do acto suspendendo, enquanto circunstância obstativa do conhecimento de mérito do processo principal. ** III – FUNDAMENTAÇÃO1.DE FACTO 1.1. Da falta de inquirição de testemunhas Sustenta a Recorrente que arrolou testemunhas, mas que as mesmas não foram ouvidas, tendo a decisão cautelar sido tomada, sem levar em consideração todos os elementos de prova, e assim todos os interesses de todos os participantes processuais e da realização da justiça no caso concreto. Não obstante, não concretiza que prova pretendia efectuar com a inquirição das suas testemunhas – aliás, fundamentadamente recusada por despacho praticado na mesma data da sentença recorrida, com base na circunstância de o processo reunir todos os elementos necessários à prolação da decisão final – nem impugna a matéria assente seja por defeito, seja por excesso. Daí que se conclua que aceita a factualidade assente. 1.2. Com interesse para a decisão a proferir, o Tribunal a quo julgou indiciariamente provados os seguintes factos: A) O requerente é cidadão brasileiro (fls.8 do PA); B) Em 10-02-2016 o requerente foi detido por elementos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras na Direcção Regional do Norte, por permanência ilegal em território nacional e presente a tribunal a 11-02-2016, que validou a sua detenção (fls. 2 e 4/7 do PA e cujo teor se dá por reproduzido); C) Em 26-02-2016, no âmbito do processo de afastamento coercivo com o nº PAC nº 6/2016DRN, o requerente foi ouvido em auto de declarações (fls. 72/74 do PA e cujo teor se dá por integralmente por reproduzido); D) No dia 09-03-2016 o requerente solicitou ao requerido a reapreciação do acto de indeferimento de pedido de Autorização de Residência para o exercício de actividade profissional subordinada ao abrigo do art. 88º da Lei nº 23/2007, de 04/07 (documento junto a fls.18/21 do processo físico e cujo teor se dá por reproduzido); E) Por ofício datado de 14-04-2016 e recebido pelo requerente em 19-04-2016, este foi notificado pelos serviços do requerido de que se mantinha a decisão de indeferimento do pedido de Autorização de Residência referido supra (documento junto a fls.44 do processo físico e cujo teor se dá por reproduzido); F) O despacho referido em E) foi objecto de acção administrativa que corre termos no TAF do Porto sob o nº 1568/15.5BEPRT, no qual o requerente peticiona a anulação do supra referido despacho e a condenação do requerido à prática do acto de concessão ao requerente da Autorização de Residência Temporária para o exercício de actividade profissional subordinada (facto confessado, cfr. documento nº1 junto ao RI e cfr. informação de fls.313 do SITAF, cujo teor se dá por reproduzido); G) Em 13-07-2016 foi proferida no âmbito do processo referido em C) pela Direcção Regional do Norte o Relatório junto a fls.84/87 do PA e cujo teor se dá por reproduzido, no qual é Proposto o seguinte: “ (…) a) a medida de afastamento de território nacional para o seu país de origem; b) a interdição de entrada em território nacional por um período de três (3) anos, conforme previsto no art. 144º da Lei 23/07, de 04 de Julho, com as alterações introduzidas pela Lei nº 29/12, de 09/08; c) a sua inscrição na lista nacional de pessoas não admissíveis pelo período da referida interdição de entrada; d) a sua inscrição no Sistema de Informação Schengen (S.I.S) para efeitos de não admissão por um período de 3 (três) anos, ao abrigo do disposto no nº3 do art. 96º, apreciável nos termos do art. 112º, ambos da Convenção de Aplicação do Acordo Schengen; Propõe-se ainda o custeio das despesas da medida imposta pelo Estado português, caso se comprove que o expulsando não possui meios económicos que lhe permitam custear as despesas de retorno. (…) ”; H) Em 28-07-2016, pelo Director Nacional Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, foi proferido o seguinte despacho (fls.90 do PA cujo teor se dá por reproduzido): “Abonando-me na factualidade que se considerou adquirida no relatório que aqui se deixa reproduzido para todos os efeitos legais, considero que o cidadão de nacionalidade brasileira JCQS, nascido a 28 de Janeiro de 1977 se encontra em situação irregular no Território Nacional – cf. artigo 134.º, nº 1 al. a) “ex vi” do art. 181º, ambos da Lei n.º 23/07, de 4 de Julho com as alterações introduzidas pela Lei 29/12, de 29/08, e, consequentemente, determino: a) O afastamento do cidadão supra referido do território nacional; b) A sua interdição de entrada em território nacional por um período de três (3) anos. c) A sua inscrição na lista nacional de pessoas não admissíveis pelo período da referida interdição de entrada; d) A sua inscrição no Sistema de Informação Schengen (S.I.S) para efeitos de não admissão por um período de 3 (três) anos, ao abrigo do disposto no nº3 do art. 96º, apreciável nos termos do art. 112º, ambos da Convenção de Aplicação do Acordo Schengen; e) O custeio das despesas da medida imposta pelo Estado português, caso se comprove que o expulsando não possui meios económicos que lhe permitam custear as despesas de retorno. (…) “; I) O requerente foi notificado do despacho supra referido em 25-08-2016 (fls.100 do PA e cujo teor se dá por reproduzido); J) O requerente deu entrada à presente acção em 22-09-2016 no TAF do Porto como preliminar “da respectiva acção administrativa” (fls.3 e 4 do processo físico); K) Até à presente data o requerente não deu entrada à acção administrativa de impugnação do acto referido em H) (facto instrumental extraído da informação de fls.313 do SITAF); L) Não foi instaurado pelo requerente processo cautelar de suspensão de eficácia dos actos referidos em D) e E) (facto instrumental extraído da informação de fls.313 do SITAF); M) Dá-se por reproduzido o teor dos documentos nºs 4 a 10, e 12 a 18 juntos ao RI e o documento junto a fls.266/268 (SITAF). * Inexistem outros factos, indiciariamente, provados ou não provados com relevo para a decisão da causa. ** MotivaçãoO Tribunal julgou, indiciariamente, provada a matéria de facto relevante para a decisão a proferir com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo e, bem assim, na parte dos factos alegados pelas partes que não foram impugnados, cfr. identificado em cada uma das alíneas dos factos considerados provados.”. ** 2. DE DIREITOEstabilizada a factualidade perfunctoriamente assente importa apreciar o mérito do presente recurso, aferindo se assiste razão ao Recorrente quanto à nulidade e erro de julgamento de direito imputado à decisão recorrida. 2.1. DA NULIDADE DA SENTENÇA RECORRIDA Vem a Recorrente invocar a nulidade da sentença recorrida com fundamento em omissão de pronúncia dado a mesma não ter decidido todas as questões suscitadas “bastando-se com a fundamentação de que não estavam preenchidos os requisitos relativamente ao fumus boni iuris para se eximir à decisão sobre as demais questões suscitadas.”. Ora, o Recorrente não concretiza quais sejam as questões suscitadas que não foram decididas, parecendo querer referir-se às questões relativas aos demais pressupostos legais de adopção da requerida providência. Determina a alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, que a sentença é nula quando “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. Este preceito deve ser compaginado com a primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma, segundo o qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”, ou seja, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes no processo que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer acto (processual), quando realmente debatidos entre as partes. O que não se confunde com todos os argumentos apresentados pelas partes – cfr. Antunes Varela ob. cit, p. 112; Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, vol. V, p. 143; entre outros Acórdãos do STJ de 12.05.2005, Rec. 05B840; do STA/Pleno de 21.02.2002, Rec. 034852; do STA, de 14-09-2017, Pº. nº 01249/16; do TCAN, de 07-07-2017, Pº 01218/08.3BEPRT, in www.dgsi.pt. Não se verificando esta nulidade quando a sentença aprecia todas as questões suscitadas, directamente ou por remissão para outras decisões ou doutrina, nem quando o conhecimento de questão considerado omisso se encontre prejudicado pela solução dada a outras questões. É precisamente esta última situação que se verifica nos autos. Com efeito, tendo a decisão recorrida julgado não se verificar a aparência do bom direito, face à caducidade do direito de acção de impugnação do acto suspendendo, e considerando a natureza cumulativa dos requisitos de adopção das providências cautelares (artigo 120.º do CPTA), o conhecimento dos demais pressupostos, mormente o da ponderação dos danos aos interesses em presença em termos de proporcionalidade – artigo 120.º n.º 4 – encontra-se, naturalmente prejudicado. Improcede a invocada nulidade. * 2.2. DO MÉRITO DO RECURSO2.2.1. Alega o Recorrente que a sentença a quo errou ao afastar o fumus boni iuris com o fundamento no facto de não ter sido intentada a acção de impugnação respectiva nos termos do disposto no artigo 58.º n.º 2 alínea b), do CPTA, esgotada o que estaria o prazo de três meses para o efeito, sem tomar em conta que a invalidade do acto suspendendo é sancionada com nulidade, e como tal, pode ser arguida a todo o tempo. Como resulta dos autos, o Recorrente instaurou contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA, preliminarmente à propositura da competente acção administrativa, providência cautelar tendente à suspensão da eficácia do despacho do Director Nacional Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), de 29.07.2016 – que lhe foi notificado em 25-08-2016 – nos termos do qual foi determinado o seu afastamento coercivo do território nacional e a interdição de nele entrar pelo período de três anos, bem assim como a sua inscrição na lista de pessoas não admissíveis no território nacional pelo período referido. Para o efeito, sustentou em sede do fumus boni iuris que o acto suspendendo é ilegal uma vez que o requerente reúne os requisitos previstos no art. 88º da Lei nº 23/2007 com a redacção dada pela Lei nº 29/12, de 09/08, violando ainda, pelo menos, o disposto no art. 78º nº 2 da referida lei, os arts. 2º e 7º da Portaria nº 1536/07, de 11/12 e os arts. 15º e 268º nº 4 da CRP; e assim, que o acto em causa padece de vício de violação de lei, falta de fundamentação, e erro sobre os pressupostos de facto ou de direito. 2.2.2. A decisão recorrida, após sublinhar a instrumentalidade da providência cautelar em causa, tal como as demais, relativamente à pretensão a deduzir no processo principal, uma vez que se destina a assegurar o efeito útil de uma futura decisão favorável ao Recorrente, no âmbito da acção principal, enunciou e desenvolveu os pressupostos de que depende a concessão da requerida providência, julgando não ser provável que a pretensão a formular no processo principal venha a ser julgada procedente, dada a caducidade da propositura da acção instrumental, por decurso do prazo legal de 3 meses para impugnação do acto em causa. Assim, com relevo para os autos, lê-se na sentença recorrida, o seguinte: “Dispõe o artigo 112º, n.º 1 do NCPTA que “Quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adopção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”. São características próprias do processo cautelar a sua instrumentalidade – dependência em face de um processo principal – a provisoriedade – por não visarem a resolução do litígio, estando vedado ao tribunal conceder, através de uma providência cautelar, aquilo que só a sentença final pode proporcionar -, e a sumariedade - cognição necessariamente sumária e perfunctória da situação de facto e de direito - visto que a sua finalidade própria do processo cautelar é assegurar que a demora na tomada da decisão final não acarrete a criação de uma situação de facto consumado com ela incompatível, produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses de quem dela deveria beneficiar. No caso em apreço, estamos perante uma providência cautelar de suspensão de eficácia de acto administrativo prevista no art. 112º nº2 al. a) do NCPTA, sendo esta uma providência conservatória, o que significa que visa manter o status quo existente “à partida”. Os critérios de que a lei faz depender a possibilidade de concessão de uma providência (seja ela conservatória ou antecipatória) foram unificados no âmbito da redacção do NCPTA e encontram-se enunciados no artigo 120º nº1 e nº2 do referido diploma, no qual se dispõe que (nº1) “Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.” e que (nº2) “Nas situações previstas no número anterior, a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.”. Assim, e com a nova redacção do supracitado preceito do NCPTA, no domínio da tutela cautelar foi reconhecido o relevo, além da verificação do periculum in mora, apenas ao fumus boni iuris (ou "aparência de bom direito"), que passou a ser decisivo, tendo sido abandonada a possibilidade de decretamento de uma providência cautelar nas situações de manifesta ilegalidade do acto suspendendo [alínea a) do nº1 do art. 120º do CPTA na anterior redacção] ou no caso de verificação do fumus non malus iuris [alínea b) do nº1 do art. 120º do CPTA na anterior redacção]. Desta forma, com a alteração do artigo 120º do CPTA introduzida no NCPTA para a concessão de uma providência cautelar, é necessário que se verifique cumulativamente: -o periculum in mora; -o fumus boni iuris, e que, -ponderados os interesses em presença, a concessão da providência não cause mais danos do que aqueles que se verificariam com a sua recusa.”. E mais à frente: “Mas se é certo que se mostra preenchido o requisito do periculum in mora, entendemos que o mesmo já não sucede relativamente ao requisito do fumus boni iuris. De facto, diga-se que face aos elementos constantes dos autos e do PA, podemos concluir, numa análise sumária e perfunctória que, desde logo, existem circunstâncias que obstam ao conhecimento de mérito da causa principal. Com efeito, e ainda que se admita que o acto suspendendo poderia padecer de alguma causa invalidante de entre as elencadas pelo requerente (vício de violação de lei, falta de fundamentação, erro sobre os pressupostos de facto ou de direito), não é despiciendo recordar que o regime regra da invalidade do acto administrativo é a anulabilidade dos actos (artigo 163º do NCPA), ou seja, caso se verificasse alguma das causas invalidantes das apontadas pelo requerente ao acto, o prazo para impugnação do acto suspendendo seria o prazo de três meses previsto no artigo 58º nº2 al. b) do NCPTA, contado, in casu, desde 25-08-2016 (aquando da sua notificação ao requerente, cfr. artigo e 59º nº2 do NCPTA), prazo esse contado nos termos do disposto no art. 279º do CC (cfr. art. 58º nº2 do NCPTA).”. Sendo a presente acção um processo de natureza cautelar e constituindo uma das suas características nucleares a da instrumentalidade do mesmo face a um processo principal, no caso uma acção administrativa de impugnação de acto administrativo, resulta do probatório – alínea K) - que a acção administrativa de impugnação do acto suspendendo e m.i. na alínea H) do probatório (e que constituiria a acção principal de que o presente processo cautelar é instrumental e dependente), ainda não foi instaurada até à presente data, ou seja, dentro do prazo de três meses previstos no referido art. 58º nº2 al. b) do NCPTA. Ora, mostrando-se o referido prazo já inexoravelmente ultrapassado, já não poderá a referida acção de impugnação vir a ser instaurada sob pena de verificação da excepção dilatória da intempestividade da prática de acto processual prevista na alínea k) do nº4 do art. 89º do NCPTA, que obsta a que o tribunal conheça do mérito da acção e dá lugar à absolvição da instância.” (…) Finalmente, e ainda relativamente ao requisito do fumus boni iuris também se verifica que, apesar de alegado pelo requerente este não comprovou, como se impunha (e apesar de notificado pelo tribunal para o efeito), que a decisão de não admissão no espaço Schengen inserido pelas autoridades Suíças foi já removida do sistema pelo que, também por aqui, não se vislumbrará sucesso à acção principal. Desta forma, indiciariamente e prima facie o tribunal conclui que a acção principal, ainda que venha a ser instaurada, será extemporânea ocorrendo a excepção dilatória da Intempestividade da prática de acto processual prevista no art. 89º nº4 al. k) do NCPTA, causa que obsta ao conhecimento do mérito da mesma e à absolvição da instância do Réu, pelo que não é provável a que a pretensão a formular no processo principal venha a ser julgada procedente. Assim sendo, como é, forçoso é concluir que não se mostra verificado o pressuposto do fumus boni iuris para que a providência cautelar requerida seja decretada, afigurando-se ao invés e nesta sede, por recurso a um juízo meramente indiciário, ser provável o insucesso do processo principal caso o mesmo venha a ser instaurado em virtude de, sendo quando muito aplicável ao acto suspendendo o regime regra da anulabilidade dos actos administrativos prevista no art. 163º do NCPA e não tendo sido instaurada a acção principal dentro do prazo de três meses previsto no art. 58º nº2 al. b) do NCPTA (contado nos termos do art. 279º do CC e desde a data da notificação do acto ao requerente), mesmo que tal acção venha a ser instaurada verificar-se-á, no caso em apreço, a excepção dilatória da intempestividade da prática de acto processual prevista no art. 89º nº4 al. k) do NCPTA, causa que obsta ao conhecimento do mérito da acção e à absolvição da instância do Réu. Fica prejudicada a análise da verificação do restante requisito (previsto no art. 120º nº2 do NCPTA.”. * Discordando do julgamento efectuado, vem o Recorrente imputar à decisão recorrida erro de julgamento por o acto em causa ser nulo (alegadamente por violação do conteúdo essencial de direitos fundamentais, como esboça agora no corpo das alegações de recurso) e, assim, impor-se a prolacção de decisão cautelar, após análise dos demais requisitos.Carece de razão. Como se nota na decisão a quo e é consensual, em sede dos tipos de invalidade do acto administrativo em consequência de vícios de que padeça, a anulabilidade constitui a invalidade regra e a nulidade a excepção. É o que se depreende do disposto nos artigos 161º a 163º do CPA, nos termos dos quais, respectivamente, são anuláveis os “actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção” e nulos apenas aqueles para os quais a lei comine de forma expressa essa forma de invalidade e os casos especialmente graves, designadamente os previstos no n.º 2 do artigo 163.º: a) Os actos viciados de usurpação de poder; b) Os actos estranhos às atribuições dos ministérios ou das pessoas colectivas referidas no artigo 2.º em que o seu autor se integre; c) Os actos cujo objecto seja impossível, ininteligível ou constitua um crime; d) Os actos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental; e) Os actos praticados com desvio de poder para fins de interesse privado: f) Os actos praticados sob coacção física ou sob coacção moral; g) Os actos que careçam em absoluto de forma legal; h) As deliberações de órgãos colegiais tomadas tumultuosamente ou com inobservância do quórum ou da maioria legalmente exigidos; i) Os actos que ofendam os casos julgados; j) Os actos certificativos de factos inverídicos ou inexistentes; k) Os actos que criem obrigações pecuniárias não previstas na lei. l) Os actos praticados salvo em estado de necessidade, com preterição total de procedimento legalmente exigido.”. Daí que “a sanção geral da invalidade do acto ferido de ilegalidade – ou seja, o acto desconforme com o ordenamento jurídico, por ofensa ou dos princípios gerais de direito ou de normas jurídicas escritas constitucionais, internacionais, comunitárias, legais ou regulamentares (omitindo-se referência paralela às normas consuetudinárias, por não serem consideradas generalizadamente fontes formais de direito administrativo) ou, ainda, por ofensa de vinculações derivadas de acto jurídico ou contrato administrativo anterior – é a da anulabilidade". – cfr. Mário Esteves de Oliveira/Pedro Costa Gonçalves/J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª ed. p. 656. No que cabe as causas de invalidade imputadas ao acto impugnado, como o julgou a sentença recorrida. Do mesmo modo, não se vislumbra a ofensa do conteúdo essencial do direito de equiparação dos direitos e deveres dos cidadãos dos Estados de língua Portuguesa (artigo 15.º da CRP) e do direito ao trabalho (artigos 58.º e 59.º da CRP) como o Recorrente enuncia, nesta sede, no corpo das alegações de recurso, sem qualquer concretização consistente. No entanto, sempre se dirá que não se verifica a causa de nulidade do acto suspendendo, agora invocada. Com efeito, a violação do conteúdo essencial (núcleo essencial) de um Direito Fundamental como causa de nulidade de actos administrativos, anteriormente prevista no artigo 133.º n.º 2 alínea d) pressupõe que o direito em causa seja “aniquilado”, perca o seu sentido útil, a sua finalidade – assim, j.j. gomes canotilho e vital moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., Coimbra, 1997, anotação do artigo 18.º n.º 3. Ou por outras palavras, só se pode “afirmar a nulidade de um acto porque o mesmo viola o conteúdo essencial de um direito dessa natureza quando o mesmo atinja o valor fundamental que justificou a criação do mesmo ou, dito de outro modo, quando a prática do acto tiver por consequência desprover decisivamente o cidadão da protecção que esse direito lhe dá” não sendo assim “qualquer lesão que será apta a gerar tal nulidade” – cfr., J.M. Santos Botelho, A. Pires Esteves e J. Cândido de Pinho in Código do Procedimento Administrativo, 5.ª ed., p. 799, nota 36; e, entre muitos outros, os Acórdãos do STA de 10/03/2010, P. 046262 e de 06/05/2010, P. 06108/10; Acórdão do TCA Norte, P n.º 00235/11.0BEPNF. A previsão da alínea d) do n.º 2 do art. 133.º do CPA (agora artigo 163.º) abrange a violação de direitos, liberdades e garantias do Título II da Parte I da CRP, e dos direitos de carácter análogo àqueles insertos no próprio texto constitucional, ou em norma de direito internacional ou comunitário ou ainda em lei ordinária – cfr. J.C. Vieira de Andrade in Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, p. 87 e ss; Acórdão do TCA Norte, Pº n.º 00235/11.0BEPNF. Sustentando que a extensão da referida previsão a outros direitos fundamentais (económicos, sociais e culturais) suficientemente densificados na lei ordinária e a princípios fundamentais que, em certos casos, devam ter um tratamento de verdadeiros direitos fundamentais vide M. Esteves de Oliveira, Pedro C. Gonçalves e J. Pacheco Amorim in Código do Procedimento Administrativo, 2.ª edição actualizada, revista e aumentada, p. 646. Assim, e, em síntese, o conteúdo essencial de um direito fundamental reporta-se ao núcleo duro de um direito, liberdade e garantia ou análogo, à ofensa chocante e grave de um princípio estruturante do Estado de Direito ou de outro direito fundamental suficientemente densificado na lei ordinária. Ora, revertendo ao caso dos autos, o alegado direito de equiparação dos direitos e deveres dos cidadãos dos Estados de língua Portuguesa pressupõe que o cidadão de país de língua portuguesa se encontre em situação legal em Portugal ou aqui resida, bem como de densificação legal (cfr. artigo 15.º da CRP) – o que não sucede no caso do Recorrente – e quanto ao direito ao trabalho, o acto suspendendo não o privou da titularidade desse direito e consequente exercício. Face ao exposto, mostrando-se a presente providência, como ficou já assinalado, instrumentalizada ao processo principal, esgotado o prazo de 3 meses para a propositura da acção – artigos 58º nº2 al. b) 59º, 60.º e 69.º do CPTA – a caducidade do direito de acção, enquanto circunstância que obste ao conhecimento do mérito no âmbito do processo principal reflecte-se, naturalmente, no processo cautelar, implicando, no caso, a improcedência da mesma por falta de aparência do bom direito ou de probabilidade de procedência da acção principal justificativa da tutela cautelar requerida. Posto o que, face à natureza cumulativa dos requisitos legais de adopção de providências cautelares, e contrariamente ao sustentado pelo Recorrente, não se impunha ao julgador a quo aferir de outros requisitos legais. A sentença recorrida não merece assim qualquer censura, improcedendo os fundamentos de impugnação que lhe foram dirigidos. *** IV – DECISÃOPelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao presente recurso jurisdicional, e, em consequência, manter a decisão recorrida. Custas pelo Recorrente, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido. Notifique. DN. Porto, 17 de Novembro de 2017 Ass. Alexandra Alendouro Ass. João Beato Ass. Hélder Vieira |