| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte - Subsecção Social -:
RELATÓRIO
«AA» instaurou ação administrativa contra a
ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DE SAÚDE DO NORTE, IP. (ARSN,
IP.), indicando como Contrainteressada [SCom01...], SA., ([SCom01...]), todos
melhor identificados nos autos, pedindo que seja declarada a inexistência jurídica, ou caso assim não se entenda, a invalidade da Ata da Reunião entre os representantes da Ré e da Contrainteressada, datada de 04/11/2011, na parte em que determinou que nos termos do Contrato de Gestão celebrado entre o ESTADO PORTUGUÊS e a [SCom01...] a
relação jurídica que o Autor mantinha com o Hospital de S..., S.A., passava a ser gerida pela ARSN, IP. não transitando o Autor para o Novo Hospital ..., mantendo todos os direitos e deveres inerentes à relação jurídica de emprego público, facto que lhe foi comunicado com efeitos a partir do dia 16 de maio de 2011.
Mais pediu a condenação da Ré a ordenar a sua transição para o Hospital ....
Por decisão proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a ação.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões:
(a) o Autor, ora Recorrente, estava afecto ao mapa de pessoal do Hospital de S.
Marcos, com um posto de trabalho no âmbito da ARSN - documento n.° 1;
(b) De acordo com o Decreto Lei n.° 222/2007, de 9/05, as ARS são pessoas
colectivas de direito publico da administração indirecta do Estado;
(c) Os poderes de gestão dos vínculos do pessoal são poderes que o referido diploma defere ao respectivo Conselho Directivo (artigos 4.°, alínea a) e 5.° n.° 1 e n.° 2, alínea r): "Autorizar a mobilidade do pessoal das instituições e serviços prestadores de cuidados de saúde, nos termos previstos na lei geral");
(d) Ao Ministério da Saúde, a lei defere meros poderes de superintendência e de titela (artigos 4.°, alínea a) e 5.° n.° 1 e n.° 2, alínea r): "Autorizar a mobilidade do pessoal das instituições e serviços prestadores de cuidados de saúde, nos termos previstos na lei geral";
(e) De entre os quais não se conta o de transmitir a posição de empregador de um trabalhador de direito público, para uma pessoa colectiva de direito privado, fora do âmbito do Estado;
(f) Mas, segundo a sentença tal teria sucedido através do contrato celebrado com a [SCom01...], SA, homologado ela Ministra da Saúde;
(g) A "não transmissão" nos termos do aludido contrato, viola os artigos 1.°, n.°s 1 e 2 e artigos 4.°, alínea a) e 5.° n.° 1 e n.° 2, alínea r) do Decreto Lei n.° 222/2007, de 9/05, padecendo o acto de incompetência;
(h) Acresce que, da acta de 4 de Maio de 2011, não consta, sequer ontologicamente a definição da situação jurídica concreta entre a ARSN e o aqui Autor;
(i) Como se referiu, o Conselho Directivo da ARSN, SA, não dispôs sobre a transmissão do vínculo do Autor, na medida em que nada constava da acta invocada (Acta de 4 de Maio de 2011);
(j) Trata-se de um acto ontologicamente inexistente (cf. artigo 50.°, n.° 4 do CPTA) que, como ta deve ser declarado;
(k) Ao não entender assim, violou a sentença os sobreditos artogso 1.°, n°s 1 e 2, e 4.°, alínea a) e 5.°, n.° 1 e 2, alínea r) do Decreto Lei n.° 222/2007, de 9/05 e, bem asism, 50.°, n.° 4 do CPTA;
(l) A Administração está sujeita ao princípio constitucional da legalidade - cf. artigo 266.°, n.° 1 - a qual constitui o fundamento e o limite de toda a sua actuação, seja unilateral seja bilateral, sendo que a relação jurídica de emprego público de que o
Recorrente é indiscutível titular, emerge da lei e só a lei a modela;
(m) No âmbito dessa relação jurídica, a vontade das partes da relação só releva nos termos em que a lei prescrever e dentro dos limites que prescreva, sendo que a vontade de terceiros - no caso da ARS Norte, IP e da [SCom01...], SA - sem o concurso ou a anuência do aqui Recorrente - ali aonde a lei permitisse que a sua vontade relevasse - nada vale;
(n) Pelo exposto, nenhuma estipulação contratual firmada entre a ARS Norte, IP, e a [SCom01...] SA, tinha a virtualidade de modificar ou extinguir a relação jurídica de emprego público que de que o aqui Recorrente era titular, a menos que a lei o consentisse e nos termos em que o consentisse;
(o) Tampouco norma regulamentar - designadamente o artigo 4.° da Portaria n.° 40/2012, de 10/02 - pode contrariar norma primária;
(p) Como decorre da Base XXXI, n.° 1, da Lei de Bases da Saúde (Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto): “Os profissionais de saúde que trabalham no Serviço Nacional de Saúde estão submetidos às regras próprias da Administração Pública e podem constituir-se em corpos especiais, sendo alargado o regime laboral aplicável, de futuro, à lei do contrato individual de trabalho e à contratação colectiva de trabalho”. Tendo esta norma valor jurídico superior aos actos legislativos que não sejam dotados de valor reforçado;
(q) A circunstância de a Lei de Bases da Saúde impor que o pessoal do SNS seja regido pelo Direito da Função Pública não só impede que acto legislativo, e por maioria de razão, administrativo, seja ele unilateral ou bilateral, lhe retirem tal estatuto como impõe ao legislador uma orientação no sentido da manutenção do mesmo, sem prejuízo de, no futuro, poder alargar o regime laboral aplicável a o contrato individual de trabalho;
(r) Em consonância com tal norma, o artigo 6.° do Decreto Lei n.° 185/2002, de 20/08, sob a epígrafe “mobilidade” veio dispor em matéria laboral, admitindo que “o pessoal com relação jurídica de emprego público que detenha a qualidade de agente ou funcionário ” fosse “contratado” (sic) num dos seguintes regimes: a) requisição; b) licença sem vencimento; c) comissão de serviço;
(s) Com a publicação da Lei n.° 12-A/2008, de 27/2 e da Lei n.° 59/2008, de 11/09, que aprovaram, respectivamente, os regimes de vinculações, carreiras e remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas e do contrato de trabalho em funções públicas, a generalidade dos funcionários e, designadamente, o ora Recorrente, passaram a estar vinculados através de contrato de trabalho em funções públicas - cf. artigos 2.°, n.° 1, 20.° e 88.°, n.° 4, da Lei n.° 12-A/2008, de 27/02;
(t) E o artigo 88.°, n.° 4, da Lei n.° 12 -A/2008, de 27/02 manteve “os regimes de cessação da relação jurídica de emprego público e de reorganização de serviços e colocação de pessoal em situação de mobilidade especial próprios da nomeação”;
(u) Assim, nem a Constituição da República Portuguesa, nem a Lei de Bases da Saúde nem a Lei n.° 12 -A/2008, de 27/02, determinam a extinção do contrato de trabalho em funções públicas, designadamente dos contratos que vigoravam à data da entrada em vigor da Lei n.° 12-A/2008, de 27/02, pelo facto de haver sido celebrado um contrato de gestão no âmbito da uma parceria público-privada da saúde;
(v) E, por maioria de razão, também não permitem a conversão, ope legis, de tais contratos, em contratos de direito privado sem o concurso da vontade dos trabalhadores interessados;
(w) De onde, os contratos de trabalho em funções públicas celebrados com o pessoal do Hospital de S... e, designadamente o do Recorrente, mantêm-se em vigor enquanto tal, sendo-lhes aplicável o regime jurídico da função pública.
(x) A transmissão do estabelecimento hospitalar conhecido como “Hospital de S...” da ARSN,. IP, para a [SCom01...], SA, determinou que, nos termos dos artigos 1.°, n.° 1, alíneas a) e c) e 3.° da Directiva 2001/23/CE do Conselho de 12 de Março de 2001, se transmitisse ao cessionário o vinculo laboral do qual o Recorrente era sujeito passivo;
(y) Acresce que a Lei n.° 23/2004, de 22 de Junho, que definiu o regime do contrato de trabalho nas pessoas colectivas públicas, foi revogada pelo RCTFP - Lei n.° 23/2004, de 22 de Junho - o qual, porém, manteve porém, em vigor, os seus artigos 16.° a 18.° - artigo 18.°, alínea f) da Lei n.° 58/2008, de 11/09 - preceitos que disciplinam a sucessão nas atribuições, a extinção da pessoa colectiva pública e o despedimento por redução de actividade;
(z) A manutenção em vigor, designadamente, do artigo 16.° da Lei n.° 32/2004, de 22/06, e a falta de norma expressa sobre a matéria de sucessão nas atribuições na pessoa colectiva, no RCTFP, determina, por isso, que o vínculo laboral do Recorrente se tenha transmitido para o cessionário, mesmo tendo este a natureza de entidade de direito privado (n.° 2);
(aa) E o Código do Trabalho (CT), aprovado pela Lei n.° 7/2009, de 12/02, determina, no n.° 1 do artigo 285.°, a transmissão da posição contratual do empregador para o adquirente em caso de transmissão, por qualquer título da empresa ou estabelecimento ou de parte da empresa ou estabelecimento, aliás, em execução da obrigação de transposição da Directiva 2001/23/CE do Conselho, de 12/03 - cf. artigo 2.°, alínea l) da Lei n.° 7/2009, de 12/02;
(bb) Desta forma, ainda que, por absurdo, se entendesse que a Directiva 2001/23/CE não se aplicava directamente, sempre seriam aplicáveis, ao caso concreto, as disposições conjugadas dos artigos 16.°, n°s 1 e 2 da Lei n.° 23/2004, de 22/06 e 285.°, n.° 1, do CT;
(cc) Assim, com a transmissão da gestão do estabelecimento ou parte do mesmo, foi transmitida para a [SCom01...], SA, a posição contratual do empregador público no âmbito dos contratos de trabalho em funções públicas, mantendose, porém, o seu vínculo à função pública, nos termos prescritos no artigo 32.º do Estatuto do SNS;
(dd) A circunstância da transferência implica pois, e desde logo, a desnecessidade da respectiva formalização - porquanto decorre directamente da lei - mantendo-se o conjunto de direitos e de deveres dos funcionários, agora perante a [SCom01...], SA, mas sem prejuízo da manutenção do seu vínculo à Função Pública;
(ee) Desta forma, qualquer acto que, ainda que em execução de contrato celebrado entre a ARS Norte, IP e a [SCom01...], SA, determinasse que o aqui Recorrente não visse a respectiva posição contratual transmitida para a [SCom01...], seria - como é - ilegal;
(ff) Pelo que o acto impugnado da suposta autoria do Conselho de Administração da ARSN, IP, viola o disposto na Base XXX, n.° 1, da Lei de Bases do SNS, 32.° do Estatuto do SNS, 88.°, n.° 4, da Lei n.° 12 -A/2008, de 27/02, 1.°, n.° 1, alínea a) e
3.°, n.° 1, da Directiva 2001/23/CE, 16.° a 18.° da Lei n.° 23/2004, de 22/06 e
285.°, n.° 1, do CT e 116.°, n.° 1, do RCTFP;
(gg) Tendo a sentença a quo, que assim não entendeu violado, em consequência, os preceitos atrás citados;
Termos em que, deve o presente recurso ser julgado procedente, sendo a sentença revogada declarando-se a inexistência jurídica ou, a assim se não entender, a invalidade do acto e condenando-se a que o Autor transite para o Hospital ..., conforme peticionado na petição inicial.
Não foram juntas contra-alegações.
A Senhora Procuradora Geral Adjunta notificada, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS DE FACTO -
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1. No âmbito da ação para reconhecimento de direitos que correu termos no Tribunal Administrativo do Círculo do Porto com o n.º 682/02, proferiu-se, em 30/04/2008, a sentença de fls. 269 a 278 dos autos principais, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzida, na qual se julgou procedente a pretensão formulada pelo Autor, na qual se referiu e decidiu, designadamente, o seguinte:
“(...) Assim sendo, e perante a realidade em equação, entende-se que o R. poderia ter tido uma outra linha de atuação , de modo que, considerando o que fica exposto no domínio em apreço, a pretensão do A. merece acolhimento, o que significa que o R. tem de desencadear os actos e procedimentos necessários no sentido de o A. ser integrado na carreira médica hospitalar como assistente de pediatria, procedendo a sua pretensão com este exacto alcance, pois que o pedido formulado com referência a ser contratado não faz sentido com referência a alguém que já faz parte dos quadros do R.. *
Decisão
Assim e pelo exposto, nos presentes autos de acção de reconhecimento de direito que «AA» intentou contra o Hospital de S... de Braga, decide-se julgar a presente acção procedente, por provada, reconhecendo-se ao A. o direito de ver o R. desencadear os actos e procedimentos necessários no sentido de o A. ser integrado na carreira médica hospitalar como
assistente de pediatria. (...)” [cf. Sentença proferida no processo n.º ...2 de que se tem conhecimento ex officio]
2. Na sequência de concurso público, foi outorgado, em 09/02/2009, entre a Contrainteressada e o Estado Português um documento “Contrato de Gestão” para a conceção, construção, organização e funcionamento do Hospital ..., um contrato de cujo teor se destaca o seguinte:
(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)” [cf. Contrato de Gestão incorporado nos autos a fls. 677 a 871 dos autos (paginação SITAF)]
3. Foi lavrada “Ata”da Reunião de 04/05/2011 entre os representantes da Entidade Pública Contratante do “Contrato de Gestão”referido no ponto anterior e a contrainteressada [SCom01...], com o seguinte teor:
“(...)
(...) [Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)” [cf. Documento junto com a petição inicial e fls. 2 a 30 do PA físico apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido]
4. A Ata referida no ponto anterior foi homologada por Despacho da Ministra da
Saúde de 20/05/2011. [cf. fls. 1 e 2 do PA físico apenso aos presentes autos]
5. Nos termos da Ata referida no ponto 3. o Autor não transitou do quadro de pessoal do Hospital de S... para o Novo Hospital ... emergente do
“Contrato de Gestão”. [cf. Documento junto com a petição inicial e fls. 2 a 30 do PA físico apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido]
6. Em 16/05/2011 foi remetida ao Autor ofício, com o teor do documento n.º 4 Anexo à Ata referida no ponto 3., comunicando-lhe que a relação jurídica de emprego público que mantinha com o Hospital de S... passaria a partir do dia 16 de maio daquele ano de 2011 a ser gerida pela ARSN, IP., não transitando para o Novo Hospital ..., mantendo todos os direitos e deveres inerente à referida relação jurídica de emprego público. [cf. Documento junto com a petição inicial]
DE DIREITO -
É objecto de recurso a sentença que julgou improcedente a ação e absolveu a Entidade Demandada do pedido.
Está em causa nos autos, antes de mais, a forma como esta sentença interpretou e aplicou os preceitos legais que abaixo se indicam como tendo sido violados e, por esse facto, determinam, no entender do Recorrente, vício do acto impugnado.
Antes, porém, e porque está em causa a interpretação de Direito Europeu, foi requerido o reenvio prejudicial.
Vejamos:
Do Reenvio Prejudicial -
Nos termos do artigo 267.°, § 1.°, alínea b) do TFUE, o TJUE é competente para decidir, a título prejudicial, sobre a validade e a interpretação dos actos adotados pelas instituições, órgãos ou organismos da União. Como se viu, é objecto da presente acção a declaração de invalidade de actos administrativos praticados pelo Conselho Directivo da ARSN, IP, pelos quais foi aplicada ao Recorrente, a pena disciplinar de demissão prevista nos artigos 9.°, alínea d) e 10.°, n.° 5, do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, bem como a devolução da quantia de 9.485,55 € resultante de remunerações indevidamente recebidas nos meses de junho a novembro de 2011.
Contestando o Recorrente que a respectiva relação jurídica de emprego tivesse passado a ser gerida pela ARS Norte, IP - entidade cujo órgão executivo aplicou a pena de demissão - e que não pela [SCom01...], SA, entidade que passou a gerir o Hospital ..., atenta a transmissão ope legis de tal relação jurídica de emprego, da qual decorria ter passado a ser a titular de tal poder.
E, por consequência, imputando ao acto extintivo a violação dos artigos 1.°, n.° 1, alínea a) e 3.°, n.° 1, da Directiva 2001/23/CE, 16.° a 18.° da Lei n.° 23/2004, de 22/06 - para além de outos preceitos de direito interno que não interessam ao presente incidente.
A Directiva 2001/23/CE do Conselho de 12 de Março de 2001, tem como âmbito de aplicação a “transferência, para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, quer essa transferência resulte de uma cessão convencional, quer de uma fusão” (cf. artigo 1.°, n.° 1, alínea a).
Segundo dispõe o artigo 3.°, n.° 1, da Directiva “os direitos e obrigações do
cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho à data da transferência são, por esse facto, transferidos para o cessionário”.
Assim, do artigo 3.°, n.° 1, da Directiva citada, resulta que, existindo transferência de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, os direitos e obrigações emergentes das relações de trabalho são transferidos ope legis, para o cessionário ou adquirente. Mais referindo a alínea c) do n.° 1, do artigo 1.°, que a Directiva é aplicável a todas as empresas, públicas ou privadas, que exercem actividade económica, com ou sem fins lucrativos.
De onde resulta que, ocorrendo transferência de “empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento” os direitos e obrigações emergentes de relação de trabalho existente são, pelo facto da transferência, transmitidos para o cessionário.
Ora, o Recorrente estava provido no quadro de pessoal do Hospital de S..., em ..., como assistente hospitalar de pediatria.
Como, aliás, resulta do Preâmbulo da Portaria n.° 40/2012, de 10/02, “Em 1974, por força da aplicação do Decreto -Lei n.° 704/74, de 7 de dezembro, a administração do Hospital de S... passou para a esfera do Estado, adotando este estabelecimento hospitalar a designação de Hospital ..., sendo que, em 1987, conforme declaração publicada no Diário da República, 2.ª série, n.° 76, de 1 de abril de 1987, o Hospital ... voltou a utilizar a designação de Hospital de S..., tendo adquirido em 13 de janeiro de 1993 o estatuto de Hospital Central.”. Nos termos do DL 704/71, de 7 de dezembro, os hospitais que passavam para o Estado tinham a natureza de estabelecimentos públicos, sendo, aliás, como tal designados em vários preceitos do diploma.
Tal estipulação equivaleu a que, por contrato, a Administração Regional de Saúde, IP e a [SCom01...], SA, colocassem uma "portagem" onde a Directiva determina “passagem franca” e, por via do negócio efectuado entre a ARSN, IP e a [SCom01...], SA, o Recorrente não transitou - de facto, que não de iure - para o hospital detido pela [SCom01...], SA. Assim, foi o Recorrente demandado disciplinarmente, e, nessa sequência, foi demitido por deliberação da ARSN, IP, quando, na sua óptica, por via da transmissão da relação contratual de que fora parte com o Hospital de S..., a titularidade de tais poderes era do cessionário [SCom01...], SA. Para o Apelante, o acto de demissão, por ter sido praticado pela ARSN, IP, violou, antes de mais, o disposto nos artigos 1.°, n.°s 1, alíneas a) e c) e 3.°,
n.° 1, da Directiva 2001/23/CE do Conselho de 12 de março de 2001.
Como é sabido, o reenvio prejudicial tem como pano de fundo o facto de o Juiz nacional se confrontar com uma dúvida sobre os termos em que tem de aplicar o direito comunitário e na medida em que a resolução de tal questão contribuir para a solução do litígio subjacente aos autos, o que ora sucede. Dito de outro modo, o reenvio prejudicial só se justifica quando a questão da interpretação de uma norma de direito comunitário se deva considerar pertinente, ou seja, quando o caso sub judice tenha de ser decidido de acordo com aquela regra, mostrando-se necessária para esse efeito, a opinião do TJUE.
Impõe-se, pois, dadas as dúvidas levantadas e conforme peticionado, que, através do reenvio prejudicial a que se refere o artigo 267.°, § 1.°, alínea b) do TFUE, se suscite a interpretação do TJUE sobre os sobreditos artigos 1.°, n.°s 1, alíneas a) e c) e 3.°, n.° 1, da Directiva 2001/23/CE do Conselho de 12 de março de 2001, no seguinte sentido:
(a) O conceito de “empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento” pública ou privada, que exercem actividade económica, com ou sem fins lucrativos, aplica-se a um estabelecimento hospitalar público, como era o Hospital de S...?
(b) Se sim, os artigos 1.°, n.°s 1, alíneas a) e c) e 3.°, n.° 1, da Directiva 2001/23/CE do Conselho de 12 de março de 2001, admitiam que, por contrato entre cedente e cessionário, se excluísse a transmissão da titularidade activa dos vínculos laborais do cedente para o cessionário? Termos em que se ordena reenvio prejudicial ao TJUE no sentido de serem apreciadas as apontadas questões.
DECISÃO
Pelo exposto acorda-se em:
1)Submeter à apreciação do Tribunal de Justiça da União Europeia a questão prejudicial supra enunciada em a) e b); e, em consequência, 2)Suspender os presentes autos, nos termos do art. 267.º do TFUE; 3)Ordenar a passagem de carta com pedido de decisão prejudicial, acompanhada do translado do processo, incluindo cópias da petição inicial, da contestação, da sentença e das alegações de recurso.
Sem custas.
Notifique e DN.
Porto, 04/7/2025
Fernanda Brandão
Rogério Martins
Paulo Ferreira de Magalhães
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