Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00313/16.0BEMDL
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/16/2018
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:DESPEDIMENTO POR INICIATIVA DO TRABALHADOR; JUSTA CAUSA; RESTITUIÇÃO DE SUBSIDIO DE DESEMPREGO;
Sumário:
1 – Nos termos do artigo 2.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro “é considerado desemprego toda a situação decorrente da inexistência total e involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego.”
Determina o artigo 18.º, n.º 1 do referido diploma que “o reconhecimento do direito às prestações de desemprego depende da caracterização da relação laboral, da situação de desemprego e da verificação de prazos de garantia, nos termos dos artigos seguintes.”
Reconhece-se, por outro lado, mas no mesmo sentido, no artigo 9.º, n.º 1 do mesmo diploma, serem situações de desemprego involuntário, designadamente, a “Resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador”, presumindo-se haver desemprego involuntário quando o fundamento de justa causa invocado pelo trabalhador não seja contraditado pelo empregador ou, sendo-o, o trabalhador faça prova de interposição de ação judicial contra o empregador.
2 – Estando dado como provado que a trabalhadora intentou no Tribunal do Trabalho ação judicial onde exatamente peticionou que fosse declarado que a resolução do seu contrato resultou de justa causa, mais tendo peticionado a atribuição de uma indemnização que se cifrava em 42 661,86€, valor que foi reduzido para 15.000€ no acordo obtido, objeto de transação judicialmente homologada, tal redução não tem, nem poderia ter, a virtualidade de alterar o objeto e objetivo da Ação, mantendo-se assim a justa causa do despedimento por iniciativa do trabalhador.
Acresce que a transação judicialmente homologada refere expressamente que a Autora reduziu o pedido “como compensação global pelas quantias peticionadas”, o que evidencia a sua relação com o pedido originário de reconhecimento da justa causa do despedimento. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Instituto da Segurança Social IP
Recorrido 1:MLDC
Votação:Maioria
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I- Relatório
O Instituto da Segurança Social IP, no âmbito da Ação Administrativa intentada por MLDC, na qual peticionou que:
I-sejam anuladas as decisões proferidas pelo Réu de indeferimento das prestações de desemprego e restituição de prestações que lhe foram pagas, com base em violação de lei e/ou falta de fundamentação;
II- sejam, em consequência, pagas pela Ré as prestações de desemprego de junho a setembro de 2016 e as que se lhe sucedam até ao final do período de 18 meses pelo qual lhe foi atribuído o Subsídio Social de Desemprego Subsequente, que lhe foi já deferido, logo que seja declarada a suspensão da eficácia daqueles atos, pedida em requerimento cautelar apresentado com esta p.i., ou, na eventual improcedência daquela suspensão, após o trânsito em julgado da sentença a proferir nos presentes autos, sempre e quando a mesma seja de procedência da ação”, inconformado com a Sentença proferida em 19 de janeiro de 2016, que julgou a Ação procedente, veio a apresentar Recurso Jurisdicional, em 17 de fevereiro de 2016, no qual concluiu (Cfr. fls. 87 a 89 Procº físico):
A) Na decisão de que se recorre, por se entender assistir razão à Recorrida, foi anulado o despacho de indeferimento da concessão do subsídio de desemprego e o consequente pedido de restituição das prestações pagas, praticados pelo aqui Recorrente Instituto da Segurança Social, I.P.
B) Para tanto, entendeu-se que, na sequência de interposição de ação judicial pela Recorrida foi homologado por decisão judicial o acordo realizado entre as partes e que, apesar de no mesmo nada se referir quanto à existência de justa causa para o despedimento “importa atender que a entidade empregadora aceitou pagar à autora compensação no valor de € 15 000,00.”
C) Razão pela qual entendeu o Tribunal a quo, “poder inferir do acordo alcançado que a entidade empregadora reconhece que a resolução foi por justa causa…”e que, em virtude do valor em causa ser ”substantivo” deveria intuir-se a aceitação pela entidade empregadora de que a resolução foi por justa causa pelo que se conclui pela existência de despedimento não imputável ao trabalhador.
D) Entendimento que, salvo melhor entendimento, não pode colher por configurar um erro de interpretação e aplicação da lei.
E) O artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 220/2006 de 3 de Novembro, prevê que, para efeitos de enquadramento no regime da proteção social dos trabalhadores por conta de outrem, o conceito de desemprego relevante engloba “toda a situação decorrente da perda involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego”
F) O Subsídio de Desemprego, é atribuído em situações em que o beneficiário viu cessar o seu contrato de trabalho, encontrando-se em desemprego total, ou seja, sem qualquer atividade profissional e é titular do direito às prestações de desemprego, o beneficiário cujo contrato de trabalho tenha cessado nos termos do art. 9.º reunindo as respetivas condições de atribuição supra referidas à data do desemprego e residindo em território nacional (art. 8.º, n.º1).
G) Há desemprego involuntário, de acordo com o referido art. 9.º, quando a cessação da relação laboral ocorra: por iniciativa do empregador - n.º1, al. a) - por caducidade do contrato não determinada por atribuição de pensão - n.º1, al. B )- por resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador - n.º1, al. c) - e, por acordo de revogação.
H) Paralelamente, estabelece o número 2 do referido artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 220/2006 de 3 de Novembro que, quando a cessação do contrato de trabalho decorra da iniciativa do empregador, “presume-se haver desemprego involuntário desde que o fundamento invocado pelo empregador não constitua justa causa de despedimento por facto imputável ao trabalhador ou, constituindo, o trabalhador faça prova de interposição de ação judicial contra o empregador.”
I) Ora, por despacho do Diretor do Núcleo de Prestações junto do Centro Distrital de Vila Real do Instituto de Segurança Social, I.P., datado de 02/10/2012 foi deferida a atribuição do subsídio de desemprego à Recorrida no montante diário de € 18,63, pelo período de 1140 dias, com início em 18/09/2012 e,
J) Por despacho da Chefe de Equipa de Prestações de Desemprego junto do Centro Distrital de Vila Real do Instituto de Segurança Social, I.P., datado de 05/11/2015, foi deferida a atribuição do subsídio social de desemprego subsequente à Recorrida no valor diário de € 13,97, pelo período de 570 dias.
K) No ano de 2016, foi a Recorrida notificada para remeter aos Serviços da Recorrente cópia da sentença proferida pelo Tribunal no âmbito do processo por si interposto contra a entidade empregadora, tendo a mesma apresentado cópia da ata de audiência final datada de 30 de Outubro de 2013 no âmbito da qual as partes chegaram a acordo – ata esta homologada por sentença com a mesma data.
L) Face ao exposto, e em virtude de, a referida ata de audiência final nada referir quanto à existência de justa causa de despedimento, foi o processo de atribuição do subsídio de desemprego indeferido por despacho de 01/06/2016 do Diretor do Núcleo de Prestações junto do Centro Distrital de Vila Real do Instituto de Segurança Social, I.P. e consequentemente foi também indeferido o processo relativo ao subsídio social de desemprego, por despacho de 01/06/2016 do Diretor do Núcleo de Prestações e emitida a nota de reposição número 9…5, no valor de € 21.963,49.
M) De acordo com o supra referido art. 9.º n.º1, al. a) do Decreto-Lei n.º 220/2006 de 3 de Novembro, considera-se existir desemprego involuntário quando se verifique resolução do contrato com justa causa do trabalhador.
N) E, ao abrigo do artigo 394.º do Código do Trabalho, ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato, constituindo justa causa para este efeito nomeadamente as situações previstas no número 2 deste artigo.
O) Ora, estabelece o número 1 do artigo 398.º do mesmo Código que “A ilicitude da resolução do contrato pode ser declarada por tribunal judicial em ação intentada pelo empregador”, o que poderá por em causa a natureza involuntária do desemprego.
P) Paralelamente, estabelece o número 2 do referido artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 220/2006 de 3 de Novembro que, quando a cessação do contrato de trabalho decorra de resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador “… presume-se haver desemprego involuntário quando o fundamento de justa causa invocado pelo trabalhador não seja contraditado pelo empregador ou, sendo -o, o trabalhador faça prova de interposição de ação judicial contra o empregador” – situação que aconteceu no caso em apreço.
Q) Assim, quando há lugar à resolução do contrato por alegada justa causa do trabalhador, o empregador contesta a existência de justa causa e é intentada ação para declaração da licitude de tal resolução, o caráter voluntário do desemprego procederá da licitude do juízo decisório do trabalhador e, se a resolução for considerada lícita, o desemprego é tido como involuntário.
R) Por outro lado, caso seja declarada a ilicitude da resolução do contrato de trabalho, para além do empregador ter direito a uma indemnização pelos prejuízos causados, ao abrigo do disposto no artigo 399.º do CT, será lícito concluir estarmos numa situação de desemprego voluntário.
S) Sendo certo que, em nosso entendimento só o Tribunal tem e terá legitimidade para apreciar a legalidade da resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador, que decorre da verificação da existência de justa causa, e da regularidade do procedimento pelo cumprimento dos requisitos procedimentais legalmente previstos (artigos 394.º a 399.º do CT).
T) Ora, a ata da audiência final no âmbito da qual a Recorrida chegou a acordo com a sua entidade empregadora, limita-se a mencionar que “1) A Autora reduz o pedido para a importância de 15.000,00€ (Quinze mil Euros), como compensação global pelas quantias peticionadas.- 2) A Ré aceita a redução do pedido apresentado e aceita pagar à demandante esta quantia.-”
U) E, uma vez que, este auto tem força de caso julgado, verificamos que a causa terminou sem que se chegasse a aferir a licitude ou ilicitude do despedimento e sem saber se a justa causa por esta invocada e pela entidade empregadora contestada tinha ou não cobertura legal.
V) Assim, do teor daquela ata não podemos inferir que o desemprego se tem por involuntário, uma vez que, só o Tribunal tem legitimidade para apreciar a legalidade da resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador, o que não aconteceu no presente caso já que a Recorrida, apesar de ter intentado a ação judicial, deu fim à mesma através de transação, o que nos impede de apurar se a situação de desemprego é ou não involuntária.
W) Sendo certo que, nos termos do artigo 85.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, apenas compete aos Tribunais do Trabalho decidir sobre os litígios e questões neles suscitadas, entre trabalhador e entidade empregadora, mormente, in casu, se a resolução do contrato de trabalho operada pela Autora foi lícita ou ilícita.
X) Conforme se refere no Acórdão do TRP de 02/05/2016 no âmbito do processo n.º 58/12.0TTVLG.1.P1 disponível in: www.dgsi.pt: “I – A transação pode envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do direito controvertido e pode resolver litígios para além das partes iniciais do processo, vinculando terceiros. II – Mas, para que uma transação com estes contornos seja eficaz, têm esses terceiros que se vincular validamente, ou dando a sua anuência expressa ao convénio no momento da sua celebração – por si ou através de pessoa munida dos necessários poderes de representação –, ou ratificando posteriormente o ato de quem, em seu nome, mas sem poderes de representação, teve intervenção no negócio. III - No caso de transação, a verdadeira fonte da solução do litígio é o ato de vontade do autor e não a sentença do juiz que não decide a controvérsia substancial, embora seja ela que confere aquele ato de vontade efeitos de caso julgado.”
Y) Assim, não podemos sufragar o entendimento e ilação retirados pela sentença proferida pelo Tribunal a quo no sentido de “poder inferir do acordo alcançado que a entidade empregadora reconhece que a resolução foi por justa causa…”
Z) Por tudo quanto se deixou expendido, sem prejuízo de melhor entendimento, que vá em sentido diverso, entende-se que a decisão recorrida deverá ser anulada em virtude de padecer de erro de interpretação e aplicação da lei, entendendo-se que, o ato administrativo de indeferimento do subsídio de desemprego à Recorrida e os consequentes indeferimentos do subsídio social de desemprego e emissão de nota de reposição se conformam com as disposições legais em vigor.
Termos em que, tendo presentes os fundamentos expendidos, devem as presentes alegações ser julgadas totalmente procedentes, por provadas, e nessa conformidade anulada a sentença recorrida, substituindo-a por acórdão que acolha o entendimento do aqui Recorrente, mantendo o ato administrativo de indeferimento do subsídio de desemprego à Recorrida com legais consequências.
Decidindo desta conformidade farão JUSTIÇA!”
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A aqui Recorrida/Maria não veio a apresentar contra-alegações de Recurso.
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Em 7 de junho de 2017 foi proferido Despacho de admissão de recurso (Cfr. fls. 94 Procº físico).
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O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 6 de setembro de 2017 (Cfr. fls. 104 Procº físico), nada veio a dizer, requerer ou Promover.
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Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, importando verificar, designadamente, o suscitado “erro de interpretação e aplicação da lei”.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade:
1) Desde 1976 que a autora, que tem a categoria profissional de mestre pasteleira, trabalha no estabelecimento comercial denominado “PP”, explorada pela sociedade SD e Companhia, Lda.;
P.A., fls. 8 e ant., 6 e ant.
2) A autora apresentou resolução do contrato de trabalho invocando violação dos deveres do empregador constantes nos artigos 127.º, n.º 1, als. a) e c) e 29.º, n.º 1 do Código do Trabalho, como fundamento de resolução nos termos do artigo 394.º, n.º 2, als. b) e f) do mesmo Código;
P.A., fls. 6 e ant.
3) A autora instaurou a 10.10.2012, no Tribunal do Trabalho de Vila Real ação judicial contra a sociedade referida em 1), onde peticiona, entre o mais, que o Tribunal declare que a resolução do contrato referido em 2) foi com justa causa, bem como a condenar a sociedade referida a pagar-lhe € 42 661,86 a título de indemnização por antiguidade;
Doc. 3 junto com a p.i.; P.A., fls. 14 e ant.
4) A 07.09.2012 a sociedade referida em 1) preencheu a declaração de situação de desemprego, tendo indicado como motivos de cessação do contrato de trabalho: iniciativa do trabalhador «7 Resolução com justa causa» e acrescentando de modo manuscrito «Nota: A trabalhadora invocou justa causa para resolver o contrato. A entidade patronal não aceita a justa causa e vai impugná-la no Tribunal do Trabalho»;
P.A., fls. 6 e ant.
5) Por despacho de 02.10.2012 foi deferida a atribuição de subsídio de desemprego no montante diário de €18,63 por um período de 1140 dias, com início em 18.09.2012;
P.A., fls. 2
6) A 30.10.2013 foi homologado por decisão judicial do Tribunal do Trabalho de Vila Real acordo com o seguinte teor:
P.A., fls. 26 e ant; doc. 4 junto com a p.i.

[imagem omissa]

7) A 05.11.2015 foi deferido à autora a atribuição de subsídio de desemprego subsequente no montante diário de € 13,97 pelo período de 570 dias;
P.A., fls. 32
8) A autora foi notificada por ofício n.º 033128 de 03.06.2016, do qual consta o seguinte:
(Dá-se por reproduzido o documento fac-similado constante da decisão de 1ª instância – Artº 663º nº 6 CPC)
P.A., fls. 34
9) Por despacho de concordância de 01.06.2016, que recaiu sobre a informação de 30.05.2016 foi entendido ser de alterar/revogar o ato de atribuição de prestações de desemprego da autora de deferido para indeferido porque da decisão judicial não resulta qualquer referência quanto à licitude ou não do despedimento;
P.A., fls. 36 e ant.
10) A autora foi notificada do ofício n.º 039309 de 06.07.2016, com o seguinte conteúdo:
(Dá-se por reproduzido o documento fac-similado constante da decisão de 1ª instância – Artº 663º nº 6 CPC)
Doc. 1 junto com a p.i.
11) A 08.07.2016 a autora apresentou junto da entidade demandada requerimento contendo cópia de pedido de aclaração da ata de audiência e julgamento no sentido de na mesma constar o reconhecimento pela entidade empregadora e pelo Tribunal da resolução do contrato por justa causa;
P.A., fls. 58 e ant.
12) E por carta datada de 19.07.2016 ordenou à autora a restituição, em 30 dias, das prestações de desemprego que, na sequência do falado indeferimento, considerou indevidamente pagas, correspondentes às notas de débito números 190 a 244, totalizando o valor global de 21 963,49 €, respeitante ao período que mediou de 18.09.2012 a 31.05.2016.
Doc. 2 junto com a p.i.
*
IV – Do Direito
Analisemos então o suscitado.
Discorreu-se em 1ª instância, no que aqui releva, o seguinte:
“Importa então verificar se a autor tem ou não direito ao subsídio de desemprego requerido. Vejamos.
O artigo 2.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro refere que “é considerado desemprego toda a situação decorrente da inexistência total e involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego.” Determinando-se no artigo 18.º, n.º 1 que “o reconhecimento do direito às prestações de desemprego depende da caracterização da relação laboral, da situação de desemprego e da verificação de prazos de garantia, nos termos dos artigos seguintes.”
O artigo 20.º do mesmo Decreto-Lei refere que “os beneficiários devem encontrar-se em situação de desemprego involuntário e inscritos para emprego no centro de emprego da área de residência.”
O artigo 9.º, n.º 1 do mesmo diploma legal reconhece as seguintes situações de desemprego involuntário:
1- O desemprego considera-se involuntário sempre que a cessação do contrato de trabalho decorra de:
a) Iniciativa do empregador;
b) Caducidade do contrato não determinada por atribuição de pensão;
c) Resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador;
d) Acordo de revogação celebrado nos termos definidos no presente decreto-lei.
E no que se reporta ao despedimento por iniciativa do trabalhador, o número 5 do mesmo artigo refere que “para efeitos do disposto na alínea c) do n.º 1, presume-se haver desemprego involuntário quando o fundamento de justa causa invocado pelo trabalhador não seja contraditado pelo empregador ou, sendo-o, o trabalhador faça prova de interposição de ação judicial contra o empregador.”
Conforme resulta dos autos, a autora, com a categoria profissional de mestre pasteleira, trabalhou desde 1976 no estabelecimento comercial denominado “PP”, explorada pela sociedade SD e Companhia, Lda. A autora apresentou resolução do contrato de trabalho invocando justa causa. Na declaração de situação de desemprego, embora o empregador tivesse feito constar a resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador, fez notar que não reconhecia a invocação de justa causa.
Todavia, a autora demonstrou que interpôs ação judicial no Tribunal do Trabalho, peticionando, entre o mais, o reconhecimento da existência de justa causa, bem como o pagamento da respetiva indemnização.
No âmbito dessa ação foi homologado por decisão judicial acordo entre a autora e a sua entidade empregadora. O acordo em causa nada refere quanto à existência de justa causa para o despedimento. Porém, importa atender que a entidade empregadora aceitou pagar à autora compensação no valor de € 15 000,00.
Muito embora nada se refira quanto à natureza da resolução por iniciativa do trabalhador, afigura-se poder inferir do acordo alcançado que a entidade empregadora reconhece que a resolução foi por justa causa, embora seja utilizado o termo “compensação” e não indemnização a que alude o artigo 396.º do Código do Trabalho.
Repare-se aliás que o valor em causa não é um valor pequeno, mas ainda substantivo, o que permite intuir a aceitação pela entidade empregadora de que a resolução foi por justa causa.
Assim, neste quadro, afigura-se estarmos perante uma resolução do contrato de trabalho que não pode deixar de ser considerada como despedimento não imputável ao trabalhador, por ser com justa causa. É que o acordo alcançado entre a autora e a sua entidade patronal no âmbito de ação judicial reconhece, ainda que implicitamente, a justa causa da resolução contratual. É que de acordo com o artigo 399.º do Código do Trabalho, no caso de o trabalhador não demonstrar em Tribunal a existência da justa causa invocada então terá que indemnizar o empregador. Ora, do acordo alcançado, ainda que exista uma diminuição substantiva do pedido, não resulta que o trabalhador se tivesse comprometido a indemnizar o empregador.
Assim, assiste razão à autora, sendo de anular o ato que indeferiu o pedido de prestações de desemprego subsequente da autora, bem como o ato que determina à autora a reposição de € 21 963,49. (...)”
Refira-se, desde logo, que se não vislumbram razões para divergir do entendimento adotado em 1ª instância, sendo que a precedente matéria transcrita da decisão recorrida se mostra lapidarmente esclarecedora do que aqui está em causa, importando apenas reafirmar e entendimento consolidado.
Há desde logo uma questão incontornável, e que consta do facto 3 da matéria dada como provada e que se consubstancia no facto da aqui Recorrida ter em 10.10.2012, intentado no Tribunal do Trabalho de Vila Real ação judicial onde exatamente peticionou que fosse declarado que a resolução do seu contrato resultou de justa causa.
Se é certo que a indemnização peticionada em resultado da invocada justa causa do despedimento se cifrava em 42 661,86€, valor que foi reduzido para 15.000€ no acordo obtido, objeto de transação judicialmente homologada, tal redução não escamoteia nem altera o pedido inicial de reconhecimento da justa causa do despedimento.
Com efeito, a redução do pedido não tem, nem poderia ter, a virtualidade de alterar o objeto e objetivo da Ação.
Acresce que a transação judicialmente homologada (Facto 6) refere expressamente que a Autora reduziu o pedido “como compensação global pelas quantias peticionadas”, o que evidencia a sua relação com o pedido originário de reconhecimento da justa causa do despedimento.
Assim sendo, uma vez que o artigo 20.º, do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro refere que “os beneficiários devem encontrar-se em situação de desemprego involuntário e inscritos para emprego no centro de emprego da área de residência” para que possam receber o subsídio de desemprego, não se vislumbra que a Recorrida possa ser excluída do seu recebimento, tal como decidido pelo tribunal a quo.
Aliás, o artigo 9.º, n.º 5 do mesmo DL nº 220/2006, concretiza que “para efeitos do disposto na alínea c) do n.º 1 (Resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador), presume-se haver desemprego involuntário quando o fundamento de justa causa invocado pelo trabalhador não seja contraditado pelo empregador ou, sendo-o, o trabalhador faça prova de interposição de ação judicial contra o empregador.”
Tal como sublinhado pelo Tribunal a quo, nos termos do artigo 399.º do Código do Trabalho, no caso de o trabalhador não demonstrar em Tribunal a existência da justa causa invocada, terá então de indemnizar o empregador, situação que aqui não foi colocada, antes tendo o empregador “compensado” o trabalhador pelo despedimento, o que reforça o entendimento de que se estará perante uma justa causa de despedimento.
***
V - Decisão
Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo.
Custas pela Entidade Recorrente
Porto, 16 de março de 2018
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco
Ass. Rogério Martins
Ass. Fernanda Brandão (Voto vencido, conforme projeto de acórdão em anexo)
* * *
RELATÓRIO
MLDC instaurou acção administrativa (impugnação de acto administrativo) contra o Instituto da Segurança social, I.P., ambos melhor identificados nos autos, pedindo que:
I-sejam anuladas as decisões proferidas pelo Réu de indeferimento das prestações de desemprego e restituição de prestações que lhe foram pagas, com base em violação de lei e/ou falta de fundamentação;
II- sejam-lhe, em consequência, pagas pela Ré as prestações de desemprego de junho a setembro de 2016 e as que se lhe sucedam até ao final do período de 18 meses pelo qual lhe foi atribuído o Subsídio Social de Desemprego Subsequente, que lhe foi já deferido, logo que seja declarada a suspensão da eficácia daqueles actos, pedida em requerimento cautelar apresentado com esta p.i., ou, na eventual improcedência daquela suspensão, após o trânsito em julgado da sentença a proferir nos presentes autos, sempre e quando a mesma seja de procedência da acção.
Por decisão proferida pelo TAF de Mirandela foi julgada procedente a acção e, em consequência, anuladas as decisões impugnadas e determinado o pagamento à Autora das prestações de desemprego remanescentes.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, o Réu formulou as seguintes conclusões:
A) Na decisão de que se recorre, por se entender assistir razão à Recorrida, foi anulado o despacho de indeferimento da concessão do subsídio de desemprego e o consequente pedido de restituição das prestações pagas, praticados pelo aqui Recorrente Instituto da Segurança Social, I.P.
B) Para tanto, entendeu-se que, na sequência de interposição de ação judicial pela Recorrida foi homologado por decisão judicial o acordo realizado entre as partes e que, apesar de no mesmo nada se referir quanto à existência de justa causa para o despedimento “importa atender que a entidade empregadora aceitou pagar à autora compensação no valor de € 15 000,00.”
C) Razão pela qual entendeu o Tribunal a quo, “poder inferir do acordo alcançado que a entidade empregadora reconhece que a resolução foi por justa causa…”e que, em virtude do valor em causa ser ”substantivo” deveria intuir-se a aceitação pela entidade empregadora de que a resolução foi por justa causa pelo que se conclui pela existência de despedimento não imputável ao trabalhador.
D) Entendimento que, salvo melhor entendimento, não pode colher por configurar um erro de interpretação e aplicação da lei.
E) O artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 220/2006 de 3 de Novembro, prevê que, para efeitos de enquadramento no regime da proteção social dos trabalhadores por conta de outrem, o conceito de desemprego relevante engloba “toda a situação decorrente da perda involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego”
F) O Subsídio de Desemprego, é atribuído em situações em que o beneficiário viu cessar o seu contrato de trabalho, encontrando-se em desemprego total, ou seja, sem qualquer atividade profissional e é titular do direito às prestações de desemprego, o beneficiário cujo contrato de trabalho tenha cessado nos termos do art. 9.º reunindo as respetivas condições de atribuição supra referidas à data do desemprego e residindo em território nacional (art. 8.º, n.º1).
G) Há desemprego involuntário, de acordo com o referido art. 9.º, quando a cessação da relação laboral ocorra: por iniciativa do empregador - n.º1, al. a) - por caducidade do contrato não determinada por atribuição de pensão - n.º1, al. B )- por resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador - n.º1, al. c) - e, por acordo de revogação.
H) Paralelamente, estabelece o número 2 do referido artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 220/2006 de 3 de Novembro que, quando a cessação do contrato de trabalho decorra da iniciativa do empregador, “presume-se haver desemprego involuntário desde que o fundamento invocado pelo empregador não constitua justa causa de despedimento por facto imputável ao trabalhador ou, constituindo, o trabalhador faça prova de interposição de acção judicial contra o empregador.”
I) Ora, por despacho do Diretor do Núcleo de Prestações junto do Centro Distrital de Vila Real do Instituto de Segurança Social, I.P., datado de 02/10/2012 foi deferida a atribuição do subsídio de desemprego à Recorrida no montante diário de € 18,63, pelo período de 1140 dias, com início em 18/09/2012 e,
J) Por despacho da Chefe de Equipa de Prestações de Desemprego junto do Centro Distrital de Vila Real do Instituto de Segurança Social, I.P., datado de 05/11/2015, foi deferida a atribuição do subsídio social de desemprego subsequente à Recorrida no valor diário de € 13,97, pelo período de 570 dias.
K) No ano de 2016, foi a Recorrida notificada para remeter aos Serviços da Recorrente cópia da sentença proferida pelo Tribunal no âmbito do processo por si interposto contra a entidade empregadora, tendo a mesma apresentado cópia da ata de audiência final datada de 30 de Outubro de 2013 no âmbito da qual as partes chegaram a acordo – ata esta homologada por sentença com a mesma data.
L) Face ao exposto, e em virtude de, a referida ata de audiência final nada referir quanto à existência de justa causa de despedimento, foi o processo de atribuição do subsídio de desemprego indeferido por despacho de 01/06/2016 do Diretor do Núcleo de Prestações junto do Centro Distrital de Vila Real do Instituto de Segurança Social, I.P. e consequentemente foi também indeferido o processo relativo ao subsídio social de desemprego, por despacho de 01/06/2016 do Diretor do Núcleo de Prestações e emitida a nota de reposição número 9612795, no valor de € 21.963,49.
M) De acordo com o supra referido art. 9.º n.º1, al. a) do Decreto-Lei n.º 220/2006 de 3 de Novembro, considera-se existir desemprego involuntário quando se verifique resolução do contrato com justa causa do trabalhador.
N) E, ao abrigo do artigo 394.º do Código do Trabalho, ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato, constituindo justa causa para este efeito nomeadamente as situações previstas no número 2 deste artigo.
O) Ora, estabelece o número 1 do artigo 398.º do mesmo Código que “A ilicitude da resolução do contrato pode ser declarada por tribunal judicial em acção intentada pelo empregador”, o que poderá por em causa a natureza involuntária do desemprego.
P) Paralelamente, estabelece o número 2 do referido artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 220/2006 de 3 de Novembro que, quando a cessação do contrato de trabalho decorra de resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador “… presume-se haver desemprego involuntário quando o fundamento de justa causa invocado pelo trabalhador não seja contraditado pelo empregador ou, sendo -o, o trabalhador faça prova de interposição de acção judicial contra o empregador” – situação que aconteceu no caso em apreço.
Q) Assim, quando há lugar à resolução do contrato por alegada justa causa do trabalhador, o empregador contesta a existência de justa causa e é intentada acção para declaração da licitude de tal resolução, o caráter voluntário do desemprego procederá da licitude do juízo decisório do trabalhador e, se a resolução for considerada lícita, o desemprego é tido como involuntário.
R) Por outro lado, caso seja declarada a ilicitude da resolução do contrato de trabalho, para além do empregador ter direito a uma indemnização pelos prejuízos causados, ao abrigo do disposto no artigo 399.º do CT, será lícito concluir estarmos numa situação de desemprego voluntário.
S) Sendo certo que, em nosso entendimento só o Tribunal tem e terá legitimidade para apreciar a legalidade da resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador, que decorre da verificação da existência de justa causa, e da regularidade do procedimento pelo cumprimento dos requisitos procedimentais legalmente previstos (artigos 394.º a 399.º do CT).
T) Ora, a ata da audiência final no âmbito da qual a Recorrida chegou a acordo com a sua entidade empregadora, limita-se a mencionar que “1) A Autora reduz o pedido para a importância de 15.000,00€ (Quinze mil Euros), como compensação global pelas quantias peticionadas.- 2) A Ré aceita a redução do pedido apresentado e aceita pagar à demandante esta quantia.-”
U) E, uma vez que, este auto tem força de caso julgado, verificamos que a causa terminou sem que se chegasse a aferir a licitude ou ilicitude do despedimento e sem saber se a justa causa por esta invocada e pela entidade empregadora contestada tinha ou não cobertura legal.
V) Assim, do teor daquela ata não podemos inferir que o desemprego se tem por involuntário, uma vez que, só o Tribunal tem legitimidade para apreciar a legalidade da resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador, o que não aconteceu no presente caso já que a Recorrida, apesar de ter intentado a ação judicial, deu fim à mesma através de transacção, o que nos impede de apurar se a situação de desemprego é ou não involuntária.
WW) Sendo certo que, nos termos do artigo 85.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, apenas compete aos Tribunais do Trabalho decidir sobre os litígios e questões neles suscitadas, entre trabalhador e entidade empregadora, mormente, in casu, se a resolução do contrato de trabalho operada pela Autora foi lícita ou ilícita.
X) Conforme se refere no Acórdão do TRP de 02/05/2016 no âmbito do processo n.º 58/12.0TTVLG.1.P1 disponível in: www.dgsi.pt: ““I – A transacção pode envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do direito controvertido e pode resolver litígios para além das partes iniciais do processo, vinculando terceiros. II – Mas, para que uma transacção com estes contornos seja eficaz, têm esses terceiros que se vincular validamente, ou dando a sua anuência expressa ao convénio no momento da sua celebração – por si ou através de pessoa munida dos necessários poderes de representação –, ou ratificando posteriormente o acto de quem, em seu nome, mas sem poderes de representação, teve intervenção no negócio. III - No caso de transacção, a verdadeira fonte da solução do litígio é o acto de vontade do autor e não a sentença do juiz que não decide a controvérsia substancial, embora seja ela que confere aquele acto de vontade efeitos de caso julgado.”
Y) Assim, não podemos sufragar o entendimento e ilação retirados pela sentença proferida pelo Tribunal a quo no sentido de “poder inferir do acordo alcançado que a entidade empregadora reconhece que a resolução foi por justa causa…”
Z) Por tudo quanto se deixou expendido, sem prejuízo de melhor entendimento, que vá em sentido diverso, entende-se que a decisão recorrida deverá ser anulada em virtude de padecer de erro de interpretação e aplicação da lei, entendendo-se que, o acto administrativo de indeferimento do subsídio de desemprego à Recorrida e os consequentes indeferimentos do subsídio social de desemprego e emissão de nota de reposição se conformam com as disposições legais em vigor.
Termos em que,
Tendo presentes os fundamentos expendidos, devem as presentes alegações ser julgadas totalmente procedentes, por provadas, e nessa conformidade anulada a sentença recorrida, substituindo-a por acórdão que acolha o entendimento do aqui Recorrente, mantendo o acto administrativo de indeferimento do subsídio de desemprego à Recorrida com legais consequências.
Decidindo desta conformidade farão JUSTIÇA!

A Autora não juntou contra-alegações.

O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
1) Desde 1976 que a autora, que tem a categoria profissional de mestre pasteleira, trabalha no estabelecimento comercial denominado “PP”, explorada pela sociedade SD e Companhia, Lda;
P.A., fls. 8 e ant., 6 e ant.
2) A autora apresentou resolução do contrato de trabalho invocando violação dos deveres do empregador constantes nos artigos 127.º, n.º 1, als. a) e c) e 29.º, n.º 1 do Código do Trabalho, como fundamento de resolução nos termos do artigo 394.º, n.º 2, als. b) e f) do mesmo Código;
P.A., fls. 6 e ant.
3) A autora instaurou a 10.10.2012, no Tribunal do Trabalho de Vila Real ação judicial contra a sociedade referida em 1), onde peticiona, entre o mais, que o Tribunal declare que a resolução do contrato referido em 2) foi com justa causa, bem como a condenar a sociedade referida a pagar-lhe € 42 661,86 a título de indemnização por antiguidade;
Doc. 3 junto com a p.i.; P.A., fls. 14 e ant.
4) A 07.09.2012 a sociedade referida em 1) preencheu a declaração de situação de desemprego, tendo indicado como motivos de cessação do contrato de trabalho: iniciativa do trabalhador «7 Resolução com justa causa» e acrescentando de modo manuscrito «Nota: A trabalhadora invocou justa causa para resolver o contrato. A entidade patronal não aceita a justa causa e vai impugná-la no Tribunal do Trabalho»;
P.A., fls. 6 e ant.
5) Por despacho de 02.10.2012 foi deferida a atribuição de subsídio de desemprego no montante diário de €18,63 por um período de 1140 dias, com início em 18.09.2012;
P.A., fls. 2
6) A 30.10.2013 foi homologado por decisão judicial do Tribunal do Trabalho de Vila Real acordo com o seguinte teor:
P.A., fls. 26 e ant; doc. 4 junto com a p.i.
7) A 05.11.2015 foi deferido à autora a atribuição de subsídio de desemprego subsequente no montante diário de € 13,97 pelo período de 570 dias;
P.A., fls. 32
8) A autora foi notificada por ofício n.º 033128 de 03.06.2016, do qual consta o seguinte:
P.A., fls. 34
9) Por despacho de concordância de 01.06.2016, que recaiu sobre a informação de 30.05.2016 foi entendido ser de alterar/revogar o ato de atribuição de prestações de desemprego da autora de deferido para indeferido porque da decisão judicial não resulta qualquer referência quanto à licitude ou não do despedimento;
P.A., fls. 36 e ant.
10) A autora foi notificada do ofício n.º 039309 de 06.07.2016, com o seguinte conteúdo:
Doc. 1 junto com a p.i.
11) A 08.07.2016 a autora apresentou junto da entidade demandada requerimento contendo cópia de pedido de aclaração da ata de audiência e julgamento no sentido de na mesma constar o reconhecimento pela entidade empregadora e pelo Tribunal da resolução do contrato por justa causa;
P.A., fls. 58 e ant.
12) E por carta datada de 19.07.2016 ordenou à autora a restituição, em 30 dias, das prestações de desemprego que, na sequência do falado indeferimento, considerou indevidamente pagas, correspondentes às notas de débito números 190 a 244, totalizando o valor global de 21 963,49 €, respeitante ao período que mediou de 18.09.2012 a 31.05.2016.
Doc. 2 junto com a p.i.
X
DE DIREITO
Na óptica do Recorrente a sentença enferma de erro de interpretação e aplicação da lei.
Cremos que lhe assiste razão.
Atente-se no seu discurso jurídico fundamentador:
“Importa então verificar se a autor tem ou não direito ao subsídio de desemprego requerido. Vejamos.
O artigo 2.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro refere que “é considerado desemprego toda a situação decorrente da inexistência total e involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego.” Determinando-se no artigo 18.º, n.º 1 que “o reconhecimento do direito às prestações de desemprego depende da caracterização da relação laboral, da situação de desemprego e da verificação de prazos de garantia, nos termos dos artigos seguintes.”
O artigo 20.º do mesmo Decreto-Lei refere que “os beneficiários devem encontrar-se em situação de desemprego involuntário e inscritos para emprego no centro de emprego da área de residência.”
O artigo 9.º, n.º 1 do mesmo diploma legal reconhece as seguintes situações de desemprego involuntário:
1- O desemprego considera-se involuntário sempre que a cessação do contrato de trabalho decorra de:
a) Iniciativa do empregador;
b) Caducidade do contrato não determinada por atribuição de pensão;
c) Resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador;
d) Acordo de revogação celebrado nos termos definidos no presente decreto-lei.
E no que se reporta ao despedimento por iniciativa do trabalhador, o número 5 do mesmo artigo refere que “para efeitos do disposto na alínea c) do n.º 1, presume-se haver desemprego involuntário quando o fundamento de justa causa invocado pelo trabalhador não seja contraditado pelo empregador ou, sendo-o, o trabalhador faça prova de interposição de ação judicial contra o empregador.”
Conforme resulta dos autos, a autora, com a categoria profissional de mestre pasteleira, trabalhou desde 1976 no estabelecimento comercial denominado “PP”, explorada pela sociedade SD e Companhia, Lda. A autora apresentou resolução do contrato de trabalho invocando justa causa. Na declaração de situação de desemprego, embora o empregador tivesse feito constar a resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador, fez notar que não reconhecia a invocação de justa causa.
Todavia, a autora demonstrou que interpôs ação judicial no Tribunal do Trabalho, peticionando, entre o mais, o reconhecimento da existência de justa causa, bem como o pagamento da respetiva indemnização.
No âmbito dessa ação foi homologado por decisão judicial acordo entre a autora e a sua entidade empregadora. O acordo em causa nada refere quanto à existência de justa causa para o despedimento. Porém, importa atender que a entidade empregadora aceitou pagar à autora compensação no valor de € 15 000,00.
Muito embora nada se refira quanto à natureza da resolução por iniciativa do trabalhador, afigura-se poder inferir do acordo alcançado que a entidade empregadora reconhece que a resolução foi por justa causa, embora seja utilizado o termo “compensação” e não indemnização a que alude o artigo 396.º do Código do Trabalho. Repare-se aliás que o valor em causa não é um valor pequeno, mas ainda substantivo, o que permite intuir a aceitação pela entidade empregadora de que a resolução foi por justa causa.
Assim, neste quadro, afigura-se estarmos perante uma resolução do contrato de trabalho que não pode deixar de ser considerada como despedimento não imputável ao trabalhador, por ser com justa causa. É que o acordo alcançado entre a autora e a sua entidade patronal no âmbito de ação judicial reconhece, ainda que implicitamente, a justa causa da resolução contratual. É que de acordo com o artigo 399.º do Código do Trabalho, no caso de o trabalhador não demonstrar em Tribunal a existência da justa causa invocada então terá que indemnizar o empregador. Ora, do acordo alcançado, ainda que exista uma diminuição substantiva do pedido, não resulta que o trabalhador se tivesse comprometido a indemnizar o empregador.
Assim, assiste razão à autora, sendo de anular o ato que indeferiu o pedido de prestações de desemprego subsequente da autora, bem como o ato que determina à autora a reposição de € 21 963,49.
IV.2.2 – Falta de fundamentação
A autora invoca ainda que os atos impugnados (o que lhe indefere a prestação de desemprego e o que lhe ordena a reposição dos montantes que auferiu a esse título) não estão fundamentados nos termos legais porque a entidade demandada se limitou a referir que a autora foi considerada em situação de desemprego.
Vejamos então.
Nos termos do artigo 268.º, n.º 3 da CRP os atos administrativos “carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegido.”
No desenvolvimento deste preceito constitucional, o legislador consagrou no artigo 124.º do CPA que, salvo exceções expressamente elencadas, os atos administrativos devem ser sempre fundamentados.
Por sua vez o artigo 125.º, n.º 1 do CPA estabelece que “a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato.”
E o número 2 do mesmo artigo refere que “equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.”
Deste modo, os atos administrativos só se consideram fundamentados quando a fundamentação que acompanha a decisão é: expressa, ainda que traduzida numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito, podendo esta consistir na remissão para anteriores pareceres, informações ou propostas; clara, permitindo a apreensão precisa dos factos e normas jurídicas que a sustentam; suficiente, na medida em que permita a um normal destinatário, de acordo com o critério do homem médio, conhecer, em concreto, a motivação da decisão; e congruente, devendo a decisão ser uma conclusão lógica e necessária dos motivos invocados – cfr. Acórdão do STA de 14.09.2011, Proc. 0255/11.
Equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, pela sua obscuridade, contradição ou insuficiência não permitam em concreto esclarecer o destinatário do ato acerca dos motivos da decisão.
Deve considerar-se como fundamentado um ato quando complementado com um parecer, informação ou documento para que remeta ou sobre o qual foi exarado, seja possível a um destinatário normal perceber as razões pelas quais o autor do ato decidiu num determinado sentido, de modo a reconstituir o iter cognoscitivo e valorativo, e poder assim, de forma voluntária e esclarecida, acatar ou reagir contra o ato – cfr. Acórdão do STA de 10.02.2010, Proc. 01122/09.
A fundamentação consiste num critério relativo, com uma função instrumental, a aferir casuisticamente em função do tipo concreto de ato e as específicas circunstâncias em que o mesmo é praticado – cfr. Acórdãos do STA de 16.12.2009, Proc. 0882/09; e do TCA Norte de 16.12.2010, Proc. 00206/08.4BEPNF.
Impõe-se ao autor do ato administrativo a exteriorização das razões ou motivos determinantes do sentido da decisão, de modo a habilitar o destinatário a conscientemente se conformar com a mesma ou reagir, expondo a sua discordância, de modo eficaz – cfr. Acórdão do STA de 23.10.2008,
Proc. 0827/07.
A fundamentação reveste assim um papel instrumental relativamente ao ato, com uma dupla função de garantia: garantia (direito) do destinatário do ato de conhecer as razões subjacentes ao sentido da decisão; e garantia de transparência e legalidade.
Na vertente de garantia de transparência e legalidade da atuação administrativa, está impresso um interesse geral da comunidade de que a administração atue na prossecução do interesse público, a que está, constitucional e legalmente, obrigada nos termos do disposto nos artigos 266.º, nº 1 da CRP e 4.º do CPA.
Impõe-se, neste aspeto, à Administração a consideração das diversas normas legais e interesses, públicos e privados, subjacentes ao caso em concreto de modo a que o decisor realize uma ponderação efetiva de interesses, factos e elementos oferecidos pelos interessados e outros que sejam do seu conhecimento.
Esta ponderação deve ser tanto mais exigente quanto maior for o grau de poder discricionário ao dispor da Administração. É que quando o legislador atribui poderes decisórios à Administração, fá-lo no pressuposto de que esta, estando mais próxima dos elementos variáveis dos casos concretos, está melhor situada para realizar uma efetiva ponderação dos interesses em jogo, de modo a poder optar pela prossecução do interesse público, no respeito dos direitos e interesses dos particulares, o que nem sempre é possível pela via legislativa.
Importa então aferir se, in casu, o ato impugnado carece de fundamentação e, em caso afirmativo, se está fundamentado.
Nos termos do artigo 124.º, n.º 1, al. a) do CPA devem ser fundamentados os atos que total ou parcialmente “neguem, extingam, restrinjam ou afetem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções”
(sublinhado nosso).
Assim, o indeferimento da concessão à autora de prestações de desemprego subsequente e o ato consequente que determina a reposição dos montantes que a autora auferiu a esse título carecem de fundamentação nos termos legalmente descritos.
No ofício n.º 039309 de 06.07.2016, além dos artigos expressamente referidos no item “Matéria de Direito” é apenas referido no item “Matéria de facto” «Não ter sido atribuída a prestação de desemprego necessária para atribuição do subsídio de desemprego subsequente».
No entanto, importa ter em consideração que o mesmo ofício é feita referência ao ofício anterior que é o ofício n.º 033128, de 03.06.2016 notificado à autora, no âmbito do qual são elencados os fundamentos para a não atribuição das prestações em causa. Ora, se atendermos aos dois ofícios, verifica-se que o fundamento invocado pela entidade demandada reside no facto de a decisão judicial não fazer qualquer referência quanto à ilicitude ou não do despedimento.
Portanto, um normal destinatário facilmente poderá compreender por que razão a entidade demandada entendeu que seria de indeferir o pedido de prestações de desemprego à autora.
A isto acresce que a autora apresentou a 08.07.2016 requerimento junto da entidade demandada pelo qual junta ao procedimento administrativo cópia de requerimento dirigido ao processo judicial que correu termo no Tribunal do Trabalho, solicitando aclaração da ata de audiência de julgamento no sentido de na mesma constar o reconhecimento pela entidade empregadora e pelo Tribunal da resolução do contrato por justa causa, o que significa que a autora percebeu a fundamentação que está na origem do indeferimento impugnado e na exigência da reposição das quantias auferidas.
Deste modo, improcede a presente questão.”
X
É univocamente entendido pela doutrina e foi consagrado quer pela lei processual quer pela jurisprudência que o objecto do recurso jurisdicional se encontra delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente, da respectiva motivação, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matéria que nelas não tiver sido versada, com ressalva óbvia dos casos que imponham o seu conhecimento oficioso.
Assim sendo, analisadas as conclusões, resulta que o Recorrente assaca à decisão erro de julgamento de direito.
Vejamos:
O presente recurso tem, pois, por objecto a decisão do TAF de Mirandela que, julgando procedente a acção ali instaurada pela ora Recorrida, anulou os actos de indeferimento da concessão do subsídio de desemprego e os de reposição do quantitativo de € 21.963,49 praticados pelo aqui Recorrente/ISS, I.P..
Daquela decisão resulta que a Recorrida apresentou resolução do seu contrato de trabalho, tendo, em virtude de a sua entidade empregadora não reconhecer a justa causa por si invocada, interposto acção judicial no Tribunal de Trabalho no âmbito da qual foi homologado, por decisão judicial, acordo realizado entre as partes.
Entendeu-se na mesma sentença que, apesar do acordo em causa nada referir quanto à existência de justa causa para o despedimento “importa atender que a entidade empregadora aceitou pagar à autora compensação no valor de € 15 000,00”, razão pela qual considerou o Tribunal a quo, “poder inferir do acordo alcançado que a entidade empregadora reconhece que a resolução foi por justa causa…”
Acrescenta-se ainda na decisão recorrida que, em virtude do valor em causa ser ”substantivo” deverá intuir-se a aceitação pela entidade empregadora de que a resolução foi por justa causa pelo que se conclui pela existência de despedimento não imputável ao trabalhador. Consequentemente foi anulado o despacho de indeferimento da concessão do subsídio de desemprego, do subsídio social de desemprego e o consequente pedido de reposição das prestações pagas, todos praticados pelo Réu/Recorrente.
Este discorda da leitura efectuada pelo Tribunal a quo, por configurar um erro de interpretação e aplicação da lei. Quid Juris?
O DL 220/2006 de 3 de novembro (alterado pelo DL 68/2009 de 20/03, pela Lei 5/2010 de 5/05 e pelos DL 72/2010 de 18/06, 64/2012 de 15/03 e 13/2013 de 5/01) estabelece o quadro legal de reparação da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, com particular incidência nas medidas activas para a reintegração no mercado de trabalho, constantes do Plano Nacional de Emprego.
Neste âmbito, de acordo com o previsto no artigo 2º do referido DL 220/2006 de 3/11, para efeitos de enquadramento no regime da protecção social dos trabalhadores por conta de outrem, o conceito de desemprego relevante engloba “toda a situação decorrente da perda involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego”.
E, as modalidades de prestações previstas no referido diploma legal para proteger o trabalhador na eventualidade de desemprego são: o subsídio de desemprego, o subsídio social de desemprego e o subsídio de desemprego parcial (artigo 7º/1 do DL 220/2006 de 3/11).
Quanto ao Subsídio de Desemprego, o mesmo é atribuído em situações em que o beneficiário viu cessar o seu contrato de trabalho, encontrando-se em desemprego total, ou seja, sem qualquer actividade profissional.
Para aceder às prestações de desemprego, determina-se no artigo 18º/1 e 3 do mencionado DL 220/2006, a obrigatoriedade de verificação dos seguintes requisitos gerais: a caracterização da relação laboral, a situação de desemprego, o cumprimento dos prazos de garantia exigidos por lei e a impossibilidade de acesso à pensão de velhice.
De acordo com a referida lei, são titulares do direito às prestações de desemprego, os beneficiários cujo contrato de trabalho tenha cessado nos termos do artigo 9º, reunindo as respectivas condições de atribuição supra referidas à data do desemprego e residindo em território nacional (artº 8º/1).
E, de acordo com o referido artº 9º, é considerado desemprego involuntário, quando a cessação da relação laboral ocorra: por iniciativa do empregador - nº 1/al. a) - por caducidade do contrato não determinada por atribuição de pensão - nº 1/al. b) - por resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador - nº 1/al. c) - e, por acordo de revogação nos termos definidos no artigo 10º/1/al. d).
Deste modo, conclui-se ficarem, desde logo, excluídos do conceito de desemprego involuntário as denúncias do contrato de trabalho por parte do trabalhador (ou a não solicitação de renovação do contrato, quando esta dependa de requerimento) e os casos em que a revogação do contrato de trabalho é feita por acordo, sem que as partes declarem quais os motivos que lhe estiveram subjacentes ou especificando-os, quando esses motivos não sejam considerados uma situação de desemprego involuntário.
Paralelamente estabelece o nº 2 do referido artigo 9º do DL 220/2006 de 3 de novembro que quando a cessação do contrato de trabalho decorra da iniciativa do empregador “presume-se haver desemprego involuntário desde que o fundamento invocado pelo empregador não constitua justa causa de despedimento por facto imputável ao trabalhador ou, constituindo, o trabalhador faça prova de interposição de acção judicial contra o empregador”, sendo certo que, ao abrigo da alínea c) do número 2 do artigo 42º do mesmo DL, referente a comunicações obrigatórias, “Os beneficiários das prestações de desemprego estão ainda obrigados, durante o período de concessão das prestações, a comunicar ao serviço da segurança social da área de residência ou instituição de segurança social competente...:”
(…)
“c)A decisão judicial proferida no âmbito dos processos nas situações previstas nos nº s 2 e 5 do artigo 9.º”.
Ora, por despacho do Director do Núcleo de Prestações junto do Centro Distrital de Vila Real do Instituto de Segurança Social, I.P., datado de 02/10/2012, foi deferida a atribuição do subsídio de desemprego à Autora/Recorrida no montante diário de € 18,63, pelo período de 1140 dias, com início em 18/09/2012 - data da apresentação do requerimento.
E, por despacho da Chefe de Equipa de Prestações de Desemprego junto do Centro Distrital de Vila Real do Instituto de Segurança Social, I.P., datado de 05/11/2015, foi deferida a atribuição do subsídio social de desemprego subsequente à Recorrida no valor diário de € 13,97, pelo período de 570 dias.
No ano de 2016 foi a Recorrida notificada para remeter aos Serviços da Recorrente cópia da sentença proferida pelo Tribunal no âmbito do processo por si interposto contra a entidade empregadora, tendo a mesma apresentado cópia da acta de audiência final datada de 30 de outubro de 2013 no âmbito da qual as partes chegaram a acordo - acta esta homologada por sentença com a mesma data.
Face ao exposto, e em virtude de a referida acta de audiência final nada referir quanto à existência de justa causa de despedimento, foi o processo de atribuição do subsídio de desemprego indeferido por despacho de 01/06/2016 do Director do Núcleo de Prestações.
Na sequência do indeferimento do processo de atribuição do subsídio de desemprego foi também indeferido o processo relativo ao subsídio social de desemprego, por despacho de 01/06/2016 do Director do Núcleo de Prestações e, consequentemente, o sistema informático da Ré emitiu a nota de reposição número 9612795, no montante de € 21.963,49.
Conforme supra se expôs, de acordo com o referido artº 9º/1/al. a) do DL 220/2006 de 3 de novembro, considera-se existir desemprego involuntário quando se verifique resolução do contrato com justa causa do trabalhador. E, ao abrigo do artigo 394º do Código do Trabalho, ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato, constituindo justa causa para este efeito nomeadamente as situações previstas no número 2 deste artigo. Acresce que estabelece o nº 1 do artigo 398º do mesmo Diploma que “A ilicitude da resolução do contrato pode ser declarada por tribunal judicial em acção intentada pelo empregador”, o que poderá pôr em causa a natureza involuntária do desemprego.
Paralelamente, estatui o número 2 do mesmo artigo 9º que, quando a cessação do contrato de trabalho decorra de resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador “… presume-se haver desemprego involuntário quando o fundamento de justa causa invocado pelo trabalhador não seja contraditado pelo empregador ou, sendo-o, o trabalhador faça prova de interposição de acção judicial contra o empregador”.
Assim, quando há lugar à resolução do contrato por alegada justa causa do trabalhador, o empregador contesta a existência de justa causa e é intentada acção para declaração da licitude de tal resolução, o carácter voluntário do desemprego procederá da licitude do juízo decisório do trabalhador - se a resolução for considerada lícita, o desemprego é tido como involuntário, uma vez que, não obstante a iniciativa da cessação contratual ser do trabalhador, ela advém de um incumprimento contratual do empregador, sendo em última análise, este o causador do fim da relação laboral.
Por outro lado, caso seja declarada a ilicitude da resolução do contrato de trabalho, para além do empregador ter direito a uma indemnização pelos prejuízos causados, ao abrigo do disposto no artigo 399º do CT, será lícito concluir estarmos numa situação de desemprego voluntário, sendo certo que, como bem advoga o aqui Recorrente, só o Tribunal tem legitimidade para apreciar a legalidade da resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador, que decorre da verificação da existência de justa causa, e da regularidade do procedimento pelo cumprimento dos requisitos procedimentais legalmente previstos (artigos 394º a 399º do CT).
Assim como, só através de uma decisão judicial poderá aferir-se e declarar-se que o despedimento do trabalhador foi feito de forma ilícita.
E só com esta prova, verificados os requisitos enunciados anteriormente, será concedido ao trabalhador o subsídio de desemprego.
Ora, neste âmbito, verifica-se que, efectivamente a Recorrida propôs acção judicial contra a sua entidade empregadora na qual solicitou ao Tribunal a declaração de que a resolução do contrato de trabalho por sua iniciativa foi com justa causa, bem como a condenação da mesma ao pagamento de créditos salariais, e com a prova da referida propositura, foi-lhe tal subsídio deferido.
Todavia, verificou-se também que, na sequência e em virtude da interpelação para o efeito, a Autora, no ano de 2016, limitou-se a apresentar cópia da acta de audiência final de julgamento, no âmbito da qual as partes chegaram a acordo, limitando-se tal acta, no que toca aos motivos da cessação da relação laboral, a mencionar que “1)A Autora reduz o pedido para a importância de 15.000,00€ (Quinze mil Euros), como compensação global pelas quantias peticionadas.
2)A Ré aceita a redução do pedido apresentado e aceita pagar à demandante esta quantia.”.
Ora, o Código de Processo do Trabalho prevê, como fase integrante do processo (artºs 55º e 98º/1), uma tentativa de conciliação em audiência de partes, a qual não se logrou alcançar, “por a R, não reconhecer ter havido justa causa na resolução do contrato de trabalho por iniciativa da trabalhadora”. Ademais que, iniciada a audiência de discussão e julgamento, as partes transigiram, resultando que, a Autora/Recorrida decaiu no valor inicialmente peticionado de 52.572,66 €, para o recebimento da soma de 15.000,00 €, nada se referindo quanto à licitude da resolução com justa causa.
Tal transação, como alegado, tem força de caso julgado, pelo que verificamos que o pleito terminou sem que se chegasse a aferir acerca da licitude ou ilicitude da resolução do contrato de trabalho por parte da trabalhadora e sem se saber se a justa causa por esta invocada e contestada pela entidade empregadora tinha ou não cobertura legal.
Assim, a questão que se coloca é a de saber qual o valor desta sentença e se através da mesma se pode concluir que o desemprego se tem por involuntário.
Entendemos, à semelhança do Réu/Recorrente, que não, uma vez que, conforme supra se expôs, só o Tribunal tem legitimidade para apreciar a legalidade da resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador, que decorre da verificação da existência de justa causa e da regularidade do procedimento pelo cumprimento dos requisitos procedimentais legalmente previstos. O que não aconteceu no presente caso já que, a Recorrida, apesar de ter intentado a competente acção na qual solicitou ao tribunal a declaração de que a resolução do contrato de trabalho por sua iniciativa foi com justa causa, acabou por dar fim à mesma através de transacção, o que impedia o Tribunal a quo e nos impede a nós, de apurar se a situação de desemprego é ou não involuntária.
Na verdade, nos termos do artigo 85º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, apenas compete aos Tribunais do Trabalho decidir sobre os litígios e questões neles suscitadas, entre trabalhador e entidade empregadora, mormente, in casu, se a resolução do contrato de trabalho operada pela Autora foi lícita ou ilícita - vide o Acórdão do TRP de 02/05/2016 no âmbito do proc. 58/12.0TTVLG.1.P1, cujo sumário reza assim:
“I- A transacção pode envolver a constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do direito controvertido e pode resolver litígios para além das partes iniciais do processo, vinculando terceiros.
II- Mas, para que uma transacção com estes contornos seja eficaz, têm esses terceiros que se vincular validamente, ou dando a sua anuência expressa ao convénio no momento da sua celebração - por si ou através de pessoa munida dos necessários poderes de representação -, ou ratificando posteriormente o acto de quem, em seu nome, mas sem poderes de representação, teve intervenção no negócio.
III- No caso de transacção, a verdadeira fonte da solução do litígio é o acto de vontade do autor e não a sentença do juiz que não decide a controvérsia substancial, embora seja ela que confere aquele acto de vontade efeitos de caso julgado.”
Logo, o entendimento sufragado e a ilação retirada pela sentença proferida pelo Tribunal a quo no sentido de “poder inferir do acordo alcançado que a entidade empregadora reconhece que a resolução foi por justa causa…”configura um salto no escuro que não tem acolhimento, nem na letra, nem no espírito dos acima elencados preceitos legais.
Procedem, assim, as conclusões da alegação.
A sentença sob escrutínio incorreu no apontado erro de interpretação e aplicação da lei, arredando-se das disposições em vigor, razão pela qual não pode ser mantida na ordem jurídica.
DECISÃO
Termos em que se concede provimento ao recurso, revoga-se a sentença e julga-se improcedente a ação.
Custas pela Recorrida, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.
Notifique e DN.
Ass. Fernanda Brandão