Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00604/09.6BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/07/2025
Tribunal:TAF de Braga
Relator:LUÍS MIGUEIS GARCIA
Descritores:OBRAS COERCIVAS; DISCRICIONARIEDADE;
CASO RESOLVIDO;
PROJECTO DE SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIOS;
Sumário:

I) – É de negar provimento ao recurso quando não triunfa apontado erro de julgamento.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:

Município ..., em acção administrativa comum por si intentada por Condomínio ... (Praça ..., ..., ...), interpõe recurso jurisdicional após o TAF de Braga ter julgado «a presente acção procedente, condenando-se a Entidade Demandada na execução das obras/colocação de equipamentos, em substituição de terceiro obrigado, nas condições impostas pela Informação elaborada pelos Serviços do Município, com vista a que o Edifício em causa cumpra o projecto de segurança contra incêndios».

Conclui:

1. O Recorrente não se conforma com a sentença que o condenou a executar no “Edifício ...” as obras e colocar os equipamentos especificados na petição inicial, relacionados única a exclusivamente com o projecto de segurança contra incêndios, nomeadamente a implementar e colocar a expensas suas o detector automático de incêndios, boca de incêndios, sinalização de emergência, extintores, caixa de areia, câmara corta-fogo e conduta de desenfumagem, previstos no projecto, e que teriam que ter sido colocados pelo empreiteiro.
2. A sentença apenas invoca como fundamento para condenar o despacho proferido em 04.06.2007 pelo Recorrente, segundo o qual o aqui Recorrente interpelou a empresa que fez a edificação do [SCom01...] Lda -, contendo tal notificação a menção que efectivamente caso tal empresa não procedesse ao cumprimento da referida obrigação, a mesma seria executada pelo Réu, ficando neste caso todas as despesas, incluindo indemnizações e sanções pecuniárias por conta dos obrigado.
3. Não explica a sentença, o porquê de a M. ma Juiz, ignorando o invocado pelo Recorrente em sede de contestação, ter partido do pressuposto que estava perante um verdadeiro acto administrativo, e o porquê de não entender que tal acto seria ilegal por inexistência de norma administrativa que impusesse ao aqui Recorrente um dever de executar as referidas obras, e por a condenação aqui em questão ser conforme com o interesse público.
4. O Tribunal a quo deixou de apreciar os problemas fundamentais e necessários à decisão da causa, limitando-se apenas a afirmar que estamos perante um ato administrativo, e que existia um poder-dever da Administração, sem contudo referir qual a “origem” de tal alegado poder-dever.
5. A nulidade de sentença por omissão de pronúncia [art. 615º nº 1 d) do CPC], traduzindo-se no incumprimento, por parte do julgador, do dever consignado no art. 607º nº 2 - 1ª parte - do CPC, ocorre quando o tribunal, pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão que devesse conhecer, o que é o caso.
6. A OMISSÃO DE PRONÚNCIA, PARA ALÉM DE VIOLADORA DO PRECEITUADO NO ART. 94º, N.º 1, E 95º, N.ºS 1 E 2, DO CPTA, É GERADORA, COMO É SABIDO, DE NULIDADE DA SENTENÇA EX VI DO PRECEITUADO NO ART. 668º, N.º 1, AL. D), DO CPC, IN CASU APLICÁVEL POR FORÇA DO DISPOSTO NO ART. 1º DO CPTA.
Sem prescindir,
7. Contrariamente ao afirmado na sentença, não estamos perante um ato administrativo, mas sim perante um ato instrumental, ou quanto muito, perante um projecto de decisão.
8. Nem o despacho de 04.06.2007, nem os actos que o antecederam, reúnem as características de verdadeiro acto administrativo, a saber: não constitui um acto decisório, ou seja, não define, nem decide uma situação jurídico-administrativa.
9. Sob pena de nulidade, o despacho que incidiu sobre a informação técnica deverá ser interpretado no sentido de ordenar a notificação do dono da obra para, no prazo de sessenta dias, proceder à montagem e construção dos elementos em falta, sob pena de, se o não fizer, o Município poder optar por “realizar a execução directamente ou por intermédio de terceiro, ficando neste caso todas as despesas, incluindo indemnizações e sanções pecuniárias, por conta do obrigado”.
10. DITO ISTO, DEVE SER REVOGADA A PRESENTE SENTENÇA, E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE JULGUE IMPROCEDENTE A PRESENTE ACÇÃO.
11. A ordem jurídica em vigor confere o poder-dever à Administração de actuar, de facere, nos casos de situações em que atendendo à gravidade das consequências decorrentes da consolidação de situações ilegais, se conduz, inevitavelmente, à questão da sua “eliminação” da ordem jurídica.
12. A Administração só pode agir quando se verifica a concessão da competência por lei e para realização de fins legalmente fixados, existindo um perigo susceptível de se projectar na vida pública.
13. Por exemplo, no caso dos loteamentos, a lei em vigor, obrigatória e expressamente, impõe a substituição pela Câmara ao titular do alvará para realização das obras de urbanização em falta, consubstanciando tal actuação um poder-dever, que visa a protecção dos interesses de terceiros adquirentes de lotes, mas, também, a protecção do património cultural, a qualidade do meio urbano e do meio ambiente, a segurança das edificações e o público em geral.
14. Ora, o incumprimento de realização de obras de urbanização no âmbito de loteamento nunca pode ser equiparado à situação vertida nos presentes autos, de não realização de obras e colocação de equipamentos de segurança contra incêndios num edifício.
15. Defender, sem mais, que as Câmaras Municipais têm um poder-dever de intervir em subrogação de qualquer empreiteiro, quando estejam em causa incumprimentos de contractos de empreitada, relacionados com os projectos de construções de edifícios, que sustentam qualquer alvará de utilização é completamente absurdo.
16. A Administração não tem o poder-dever, nem a faculdade de intervir neste tipo de situações pois as mesmas não se encontram previstas na lei.
17. Mesmo que se entenda que a Administração tem de intervir, sempre se dirá que esta tem apenas a faculdade de optar “por realizar a execução directamente ou por intermédio de terceiro, ficando neste caso todas as despesas, incluindo indemnizações e sanções pecuniárias, por conta do obrigado”.
18. Trata-se de uma faculdade (opção) que a Administração pode ou não exercer, e não de um qualquer dever jurídico que lhe seja imposto e, muito menos de um dever jurídico a que lhe corresponda do lado oposto da relação um qualquer direito subjectivo de exigir a execução da prestação.
19. Ora, do mesmo modo que perante a situação da realização de obras de conservação de edifícios, elencada no artigo 89º do R.J.U.E., se tem entendido, quer na doutrina quer na jurisprudência, que a Administração tem uma mera faculdade, não vemos por que razão no presente caso temos de defender algo diferente atendendo aos factos dados como provados. Ver Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 24-04-2014, proc. nº 08063/11.
20. Estamos no âmbito da discricionariedade da Administração, tratando-se de situações em que «claramente o legislador remete para a Administração a competência de fazer um juízo baseado na sua experiência e nas suas convicções, que não é determinado, mas apenas enquadrado por critérios jurídicos, e como tal não sindicável por qualquer tribunal.
21. Assim, e em face do non facere quer do condomínio (desde 2004), quer dos proprietários das fracções (desde 2000), devemos concluir que andou bem a Administração em não proferir decisão de despender do erário publico para resolver problemas advindos da ilegalidade praticada pelo vendedor das fracções.

Sem contra-alegações.
*
O Exm.º Procurador-Geral Adjunto foi notificado nos termos do art.º 146º, nº 1, do CPTA, emitindo parecer, sem resposta, no sentido do não provimento do recurso, para aqui se reproduzindo seguintes passagens:
«(…)
7 – Não vemos como pode o Município defender que a implementação da obrigação do cumprimento da legislação sobre a prevenção de incêndios em edifícios se traduz numa mera faculdade que lhe assiste. Parece-nos evidente que esta legislação tem de ser cumprida em todos os edifícios e se não o for voluntariamente pelos particulares o poder público, no caso autárquico, tem de se substituir à incapacidade dos privados, em nome da defesa da segurança, da saúde pública e da qualidade de vida das populações – é o que resulta claramente da conjugação das normas sobre competência dos municípios ( actualmente no artigo 33º als. y) e bb) da Lei 75/3013, de 12.09, com disposições correspondentes no anterior regime do DL 169/99, e do Decreto-Lei n.º 64/90, de 21 de Fevereiro, que aprovou o Regulamento de Segurança contra Incêndio em Edifícios de Habitação, designadamente a partir do seu capítulo III.
8 – A própria notificação que o recorrente enviou por mais de uma vez ao condomínio continha a inequívoca advertência de que, caso não fosse cumprida a referida obrigação no prazo indicado, a mesma seria executada ( e não apenas que poderia ser ) pelo Município, ficando nesse caso todas as despesas, incluindo indemnizações e sanções pecuniárias por conta dos obrigados, nos termos previstos no art. 157.º do Código de Procedimento Administrativo ( anterior versão).
9 – E a afirmação constante da decisão recorrida de que não estamos perante uma mera faculdade, e de que o número 2 do artigo 157.º do CPA não traduz uma escolha sobre a existência e continuação do processo executivo, mas sim que o Município é obrigado a dar seguimento ao processo executivo até à verificação dos fins da execução constitui suficiente e cabal resposta à objecção do recorrente nessa matéria, pelo que não se verifica que a decisão recorrida tenha deixado de apreciar factos ou argumentos que devesse ter tido em consideração para a boa decisão da causa.
9 – Pelo que em nosso entender não se verificam nem a omissão de pronúncia nem o erro de julgamento que foram invocados no recurso.
(…)».
*
Dispensando vistos, cumpre decidir.
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Factos, fixados como provados pelo tribunal “a quo”:
A) O “Edifício ...” é composto por dois blocos com seis pisos cada um – por acordo.
B) Tal edifício, constituído em regime de propriedade horizontal, compreende 37 fracções autónomas – por acordo.
C) Tal edifício foi edificado pela empresa de construção civil “[SCom02...], Lda.” – cf. documento de fls. 11 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
D) Em 2006, os Serviços do Réu Município procederam a uma vistoria ao Edifício, diligência da qual resultou Informação Técnica, cujo teor segue:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cf. de fls. 9 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida.
E) Em 30/5/2007, foi elaborada nova Informação, cujo teor segue:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cf. de fls. 10 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
F) O Município Réu dirigiu a “Dr. «AA»” ofício, datado de 15/06/2007, nos termos que se transcreve:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cf. de fls. 11 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
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Em ordem à melhor compreensão, complementando o que consta em supra em E), merece consignar o que também mais consta do documento, onde - pacífico de leitura das partes - nele consta despacho de concordância do Presidente da Câmara:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
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A apelação.
→ Da omissão de pronúncia.
O recorrente começa por apontar uma patologia da decisão: omissão de pronúncia.
As questões que são submetidas ao tribunal constituem o “thema decidendum”, como complexo de problemas concretos sobre que é chamado a pronunciar-se; os problemas concretos que integram o “thema decidendum”, sobre os quais o tribunal deve pronunciar-se e decidir, devem constituir questões específicas que o tribunal deve, como tal, abordar e resolver, e não doutrinas expostas pelos interessados na apresentação das respetivas posições - Acs. STJ, de 30/11/05, proc. n.º 2237/05; de 21/12/05, proc. n.º 4642/02; de 27/04/06, proc. n.º 1287/06.
«No âmbito da nulidade da sentença por omissão de pronúncia, por questão deve entender-se o problema concreto, de facto ou de direito, a decidir, e não também, os motivos, os argumentos e os pontos de vista invocados pelos sujeitos processuais, em abono das respectivas pretensões, pelo que, só em relação àquela, e não, também, a estes, se pode coloca a possibilidade de o tribunal ter omitido pronúncia.» - Ac. do STJ, de 11-01-2024, proc. n.º 217/22.7PVLSB.L1.S1.
O conceito de “questão”, deve ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, dele sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes (Ac. do STJ, de 11-1-0-2022, proc. n.º 602/15.0T8AGH.L1-A.S1); a nulidade de sentença por omissão de pronúncia refere-se a questões e não a razões ou argumentos (no sentido de simples opiniões, motivos, ou doutrinas expendidas pelos interessados na apresentação das respetivas posições) invocados pela parte ou pelo sujeito processual em defesa do seu ponto de vista; a falta de apreciação das primeiras consubstancia a verificação da nulidade; o não conhecimento dos segundos, será irrelevante. (Ac. do STJ, de 12-12-2024, proc. n.º 127/16.7GCPTM.E3.S1).
Já o Prof. Alberto dos Reis ensinava, a propósito da nulidade de sentença por omissão de pronúncia, que “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.” (“Código de Processo Civil anotado”, vol. V, pág. 143).
O recorrente aduz para convocar a existência de omissão que «Não explica a sentença, o porquê de a M. ma Juiz, ignorando o invocado pelo Recorrente em sede de contestação, ter partido do pressuposto que estava perante um verdadeiro acto administrativo, e o porquê de não entender que tal acto seria ilegal por inexistência de norma administrativa que impusesse ao aqui Recorrente um dever de executar as referidas obras, e por a condenação aqui em questão ser conforme com o interesse público.».
Sem razão.
A respeito do despacho de 04-06-2007, com relação ao qual a recorrente apontou em contestação que “não reúne as características de verdadeiro acto administrativo” (art.º 12º), que se depararia apenas “um acto instrumental, de mera interpelação e/ou não decisório” (art.º 13º), indubitavelmente que a Mmª juiz tomou posição, explicitamente assumindo tratar-se de um acto administrativo; e bem assim entendeu validamente respaldar de fundamento legal para o seu conteúdo o definido em aprovado projecto no processo de obras, havendo de seguir-se disposto nos artºs. 152º e 157º do CPA(96); mais ou menos desenvolto “o porquê”, mais ou menos acertado, o que se lhe deparava em questão não deixou de ter pronúncia; «A omissão de pronúncia geradora de nulidade é apenas aquela que não trata da questão colocada e não também a que não responde a cada um dos motivos, argumentos, usados pelo interveniente.» (Ac. RC, de 14-01-2015, proc. n.º 38/13.8JACBR.C1).
→ Do mérito.
A Mmº Juiz fundamentou:
«Na presente acção, importa aquilatar se o Município Demandado está obrigado a dar seguimento à execução do acto que impunha ao dono da obra obrigação de executar obras e colocar equipamentos nos termos do projecto de segurança contra incêndio, tal como fora oportunamente aprovado no processo de obras para construção do Edifício.
Defende a Autora que, não tendo logrado êxito a advertência dirigida ao responsável pela construção do edifício – [SCom02...], Lda. – para proceder, num determinado prazo, às obras e colocação de equipamentos, o Município terá que ser consequente e, seguindo os termos do Código de Procedimento Administrativo, na redacção à data aplicável, substituir-se ao particular faltoso, sem prejuízo de sobre este recair todas as despesas pelo cumprimento da prestação a que estava obrigado.
A resposta à questão decidenda reclama, desde logo, proceder ao enquadramento do acto que obriga a empresa [SCom02...], Lda., dono da obra, a proceder a todas as diligências necessárias com vista a concretizar em obra o projecto de segurança apresentado no processo de obras respeitante ao Edifício ....
Tal acto consubstancia um acto administrativo, o qual constituiu o destinatário na obrigação de prestação de facto tal qual resulta do projecto de segurança contra incêndios aprovado no processo de obras.
Este acto administrativo consubstanciou inclusivamente pressuposto da legalidade do procedimento executivo levado a cabo pelo Município, para prestação de facto fungível, que se iniciou com a notificação prevista no artigo 152.º do CPA, tendo seguido os seus termos até à aplicação do artigo 157.º do CPA.
Com efeito, por o Executado – dono da obra – não ter prestado o facto fungível a que se referia o acto administrativo exequendo – concretização na obra do projecto de segurança contra-incêndios (designadamente detector automático de incêndios, boca de incêndios, sinalização de emergência, extintores, caixa de areia, câmara corta-fogo e conduta de desenfumagem) tal como previsto no projecto aprovado no processo de obras n.º 103/99, o Município Demandado notificou o obrigado (dono da obra nos termos do disposto no artigo 157.º do CPA, concedendo-lhe novo prazo para o cumprimento de todas as obrigações, e sob advertência: “fica advertido que, caso não cumpra a referida obrigação, a mesma será executada por este Município, ficando neste caso todas as despesas, incluindo indemnizações e sanções pecuniárias por conta dos obrigados, nos termos previstos no art. 157.º do Código de Procedimento Administrativo.
Ora, o uso do disposto no artigo 157.º, n.º 1, do CPA pressupõe a existência de um acto devido.
Por outras palavas, o acto administrativo constituiu o dono da obra na obrigação de adoptar um comportamento devido – obrigação de concretizar em obra o projecto de segurança contra-incêndios – por ser legalmente obrigatório e sem o qual o projecto de obras não seria aprovado.
Não restam dúvidas sobre o fim da execução: o interesse público da segurança reclama da Administração actuação, em substituição, se necessário, do obrigado faltoso para fazer corresponder a realidade ao projecto de segurança contra-incêndios que nunca veio a ser executado.
O número 2 do artigo 157.º do CPA não traduz uma escolha sobre a existência e continuação do processo executivo.
O Município Demandado é obrigado a dar seguimento ao processo executivo até à verificação dos fins da execução.
O sentido e alcance do artigo 157.º, n.º 2, do CPA é o de admitir – na execução para prestação de facto – um poder de escolha quanto ao modo de realização:
- directamente, através dos seus próprios meios;
- indirectamente, através de celebração de contratos com terceiros.
Assim, não tendo o obrigado cumprido as obrigações, o Município Demandado terá que prosseguir com a execução e, em substituição do Executado, realizar a prestação, podendo optar por realizá-la directamente ou por intermédio de terceiros.
Em qualquer dessas duas hipóteses – através dos próprios meios ou por contrato com terceiro – passará a impender sobre o executado uma obrigação administrativa de carácter pecuniário, traduzida no pagamento de todas as despesas que tenham advindo da falta de cumprimento do acto administrativo.
Por não terem sido alegados factos concretos que permitam gerar a convicção de eventual risco de incumprimento da sentença condenatória, temos que, no caso em apreço, não se justifica a condenação do Presidente da Câmara no cumprimento espontâneo desta sentença.».
Vejamos.
O recorrente, divergindo do que foi entendido na decisão recorrida, rejeita que o despacho de concordância de 04-06-2007 supra reproduzido se reconduza a um acto administrativo.
Mas é de todo evidente que, subsumindo-se à definição legal (art.º 120 CPA/96), nele se pode ver uma determinação autoritária de um órgão ou agente da Administração que, ao abrigo de normas de direito público, visa produzir visa produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
A expressa declaração de concordância apropria os fundamentos de facto e de direito da informação onde foi aposta (art.º 125º, n.º 1, do CPA/96).
Coincide a interpretação a tirar com aquela que daí tenha alimento.
Não tem acerto que aquela que o próprio recorrente (também) alcança lhe possa despertar conclusão de que apenas se trata de um “projecto de decisão” (nela própria até patente que se segue à anterior notificação de 19.10.2006)!
Não é pelo cominado de futuro agir administrativo que se perde o carácter decisório; o recorrente confunde o que é projecto de decisão com o que possam ser os efeitos projectados pela decisão, já com ela e nela enunciados, incluindo os modos de execução.
O recorrente, ao que parece, (já) não estará interessado por tal caminho, ao agora contestar a acção em oposição à bondade do que ele próprio obteve em definição a pretérito, pois, afinal, não teria o “poder-dever” pressuposto/anunciado.
Mas nada que destrone ver o acto como consolidado; conforme escreve Tiago Serrão (“A nulidade do acto inconstitucional”, Estudos de Direito Público, Colecção PLML, Coimbra Editora, pág. 189), «enquanto não surgirem decisões juridicamente fortes para isso (…) o acto anulável vai vivendo, vinculando e produzindo os seus efeitos, como se válido e legal fosse».
E que possa ocupar execução, em conformidade, como o tribunal “a quo” viu, com o disposto nos artºs 152º, n.º 2, e 157º, nºs. 1 e 2, do CPA(96), que o próprio acto convocou.
Espaço de discricionariedade que o recorrente pudesse ter, agindo, ou não, em “substituição” na obrigação em falta, está já ultrapassado pelo caso resolvido, com o seu acerto ou desacerto.
Sem embargo, de faculdade que permanece ao alcance (e isso na decisão recorrida vem reconhecido) de “optar por realizá-la directamente ou por intermédio de terceiros.”.
Portanto, e no que se viu até agora, sobre o “an” da conduta, sem erro de julgamento.
E outro não vem imputado.
*
Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas: pelo recorrente.
Porto, 07 de Fevereiro de 2025.

Luís Migueis Garcia, por redistribuição
Catarina Vasconcelos
Celestina Caeiro Castanheira